Edição 13

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EDIÇÃO 13

CONHEÇA OS VENCEDORES

PERSONAGEM

O pesquisador de novas variedades de alface

ESTRUTURA

A viabilidade da automação na Hidroponia

ESPECIAL

A redescoberta da Aquaponia


ESPECIAL

Especial

A REDESCOBERTA DA AQUAPONIA A criação de peixes associada ao cultivo de hortaliças pode economizar até 90% de água em relação à agricultura convencional

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ESPECIAL

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Aquaponia, um sistema de produção de alimentos que combina a aquicultura convencional (criação de organismos aquáticos tais como caramujos, peixes, lagostas e camarões) com a Hidroponia (cultivo de plantas em água) em um ambiente simbiótico, tem raízes antigas e a primeira ocorrência gera debates. Entre os séculos 11 e 12, os astecas, até então um povo nômade, assentaram-se às margens do lago Tenochtitlan, hoje México Central. Como as margens do lago eram de colinas íngremes, eles superaram este desafio recolhendo arbustos, galhos e fibras e construíram ilhas flutuantes, as chinampas. Os indígenas cultivam as plantas em ilhas fixas ou móveis em lagos rasos, e os dejetos eram dragados dos canais das chinampas e cidades ao redor, e utilizados para irrigar as plantas manualmente. Os campos de arroz inundados em combinação com peixes no Sul da China, Tailândia e Indonésia também são considerados exemplos de sistemas aquapônicos remotos. O desenvolvimento da Aquaponia - palavra derivada da combinação das palavras “aquicultura” (produção de organismos aquáticos) e Hidroponia (produção de plantas sem solo) - é atribuída aos diversos trabalhos do New Alchemy Institute e do Dr. Mark McMurtry e colaboradores, da Universidade Estadual da Carolina do Norte, nos Estados Unidos. Inspirado pelos sucessos do New Alchemy Institute, e pelas técnicas alternativas de Aquaponia desenvolvidas por McMurtry, outros institutos seguiram o exemplo. Em 1997, o Dr. James Rakocy e seus colegas da Universidade das Ilhas Virgens, também nos EUA, pesquisaram e desenvolveram o uso de canais de Hidroponia por DWC (Deep Water Culture), floating ou ambiente flutuante em sistemas aquapônicos de larga escala. Eles descomplicaram a Aquaponia. Mostraram que, o que antes parecia complicado, na verdade é bastante simples. A Aquaponia está crescendo em várias partes do mundo. Na Alemanha, uma fazenda urbana com uma estufa de 1,8 mil metros quadrados produzirá anualmente 35 toneladas de verduras e legumes e 25 toneladas de peixe. Desde maio de 2015, os moradores de Berlim podem adquirir os primeiros legumes produzidos na maior fazenda aquapônica urbana da Europa. Na região de Auvergne, na França, o projeto Osmose pretende produzir 5 mil alfaces e até 200 filés de trutas por semana. Nos Estados Unidos, grandes centros urbanos já produzem peixes e hortaliças em terraços no topo de prédios.

INICIATIVAS NO BRASIL No Brasil, porém, a técnica somente começou a ser difundida há pouco tempo. O interesse dos produtores fez que empresas lançassem equipamentos, como filtros, tanques e bombas usados em sistemas aquapônicos, e também estimularam a criação de vários cursos sobre Aquaponia, oferecendo um conteúdo diferenciado daquele encontrado na internet.

Manuel dos Santos Pires Braz Filho, instrutor do Senar-SP

Em parceria com sindicatos rurais, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) de São Paulo há cerca de dois anos promove cursos de Aquaponia. As inscrições são limitadas e a aula oferecida em três dias - 8 horas/aula – quase sempre tem lista de espera. “Já tivemos alunos de oito Estados brasileiros, da França e dos Estados Unidos”, salienta o instrutor Manuel dos Santos Pires Braz Filho, do Senar-SP.

Braz Filho com alunos e instalações aquapônicas do Senar-SP

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ESPECIAL Braz Filho montou um sistema próprio de Aquaponia, usando um decantador e um filtro biológico rizosférico com brita e argila expandida de substrato. Ele usa pacu e tilápia. Já a planta utilizada no experimento é a lêmina, que tem 40% de proteína. “Com o aumento do preço da ração, a Aquaponia é a melhor alternativa para a aquicultura. Usando a lêmina, consigo reduzir em 40% o custo com ração e ainda tenho lucro de R$ 1,00 por quilo de peixe produzido”, ressalta o instrutor, explicando que a produção de países como China e Vietnã entra no Brasil com preços mais competitivos, devido ao menor custo de produção. Várias instituições de pesquisa e universidades vêm realizando seus primeiros ensaios experimentais. A Embrapa Tabuleiros Costeiros, de Aracaju (Sergipe), começou a pesquisar sobre o tema em maio de 2014, com a implantação do Laboratório de Pesquisa em Aquaponia (Lapaq) e está validando e desenvolvendo vários sistemas modulares para a produção em nível familiar e comercial.

Peixe usado na Aquaponia da Embrapa

O sistema de Aquaponia é composto por um tanque no qual são produzidos os peixes. Alimentados com ração, eles liberam dejetos ricos em nutrientes que, por sua vez, bombeados para uma parte superior, nutrem os vegetais. As raízes, ao retirar os nutrientes, purificam a água, que retorna por gravidade para o local onde são produzidos os peixes. A técnica pode economizar até 90% de água em relação à agricultura convencional e ainda eliminar completamente a liberação de efluentes no meio ambiente, pois trata-se de um sistema fechado, diferentemente das criações convencionais. Ele pode ser desenvolvido para consumo próprio, em sistemas caseiros para produção familiar, inclusive no meio urbano, em casa ou varanda de apartamento, desde que receba ao menos cinco horas diárias de sol. E também com objetivo comercial, em larga escala, com altas densidades de peixes e vegetais, para a produção de alimentos diferenciados, livres de agro32 |

Paulo Carneiro, pesquisador da Embrapa Tabuleirtos Costeiros

tóxicos e antibióticos. “O manejo é fácil e o produtor tem pouca coisa para monitorar, tanto na produção vegetal quanto de peixes. Hortaliças de ciclo curto, como alface, podem ser colhidas após quatro a seis semanas”, ensina o pesquisador em piscicultura Paulo Carneiro, da Tabuleiros Costeiros. Vários ensaios experimentais já foram realizados e outros estão sendo executados, com foco na produção integrada de hortaliças dos grupos das folhosas (alface, manjericão, coentro e rúcula), das raízes (cenoura, rabanete e cebola) e dos legumes (tomate, pimentão, pepino e quiabo) com peixes. “Os resultados desses trabalhos são animadores, indicando a possibilidade de crescimento dos vegetais em patamares semelhantes ou superiores aos obtidos em cultivos hidropônicos”, avalia. O mesmo vem sendo observado no crescimento dos peixes dentro dos vários sistemas de Aquaponia em avaliação, sendo possível o alcance do peso comercial em período de tempo semelhante ao observado nos sistemas tradicionais, seja em viveiros escavados ou em tanques-rede. Carneiro aposta que a Aquaponia se tornará popular no Brasil a exemplo do que já acontece há mais de dez anos em vários países, embora ela ainda seja pouco conhecida por aqui. “O Brasil tem muito potencial para a Aquaponia, especialmente em tempos de crise hídrica”, diz o pesquisador. Pesquisador Fábio Sussel, da APTA


ESPECIAL

PLANTAS MAIS INDICADAS No início dos estudos com Aquaponia, os pesquisadores pensavam que apenas plantas menos exigentes como as folhosas poderiam ser cultivadas neste sistema. Hoje, porém, já se sabe que é possível produzir uma grande variedade de espécies vegetais como alface, manjericão, agrião, repolho, rúcula, morango, pimenta, tomate, quiabo, pepino e muitas outras. Espécies vegetais adaptadas à Hidroponia são sempre recomendadas para a Aquaponia. Com base nas necessidades do mercado é possível desenhar um sistema de Aquaponia capaz de produzir, teoricamente, qualquer vegetal de pequeno e médio porte. Basicamente o desenho dos sistemas deve observar as necessidades e limitações das plantas relacionadas a espaço, nutrição, aeração, temperatura e radiação solar.

PEIXES MAIS ADEQUADOS Na Aquaponia, as espécies de peixe devem ser tolerantes a altas densidades de estocagem e a manejos frequentes. A tilápia do Nilo, por ser um peixe rústico e resistente, apresentar boa conversão alimentar, tolerar altas densidades de estocagem, ter seu pacote tecnológico de cultivo difundido por todo o mundo e por ter bom valor comercial, tem sido o peixe mais utilizado em sistemas de Aquaponia, com resultados animadores. Nos experimentos da Embrapa também são usadas espécies de peixes nativas, como o tambaqui. “Ele é mais resistente do que a tilápia, principalmente em relação ao manejo”, explica o pesquisador. O gosto da espécie nativa foi outro fator que explica a preferência. “A tilápia tem gosto de tempero. O tambaqui tem gosto de peixe, um sabor mais suave”, observa Carneiro. A truta e a carpa também podem ser usadas nas regiões mais frias. Caso haja resistência em abater os peixes, o produtor pode criar peixes ornamentais. “Uma única carpa colorida para ornamentação pode ser vendida por valores que vão de R$ 200, 00 a R$ 300,00”, destaca o pesquisador.

A Tabuleiros Costeiros articulou parcerias com outras unidades da estatal que também pesquisam sobre o tema. Fez uma parceria com o Colégio Amadeus, de Aracaju, e pretende também levar o projeto às escolas da rede pública da capital sergipana. “Acredito que, no contexto educacional, professores do ensino fundamental e médio podem transformar a Aquaponia em uma eficiente ferramenta de ensino em disciplinas como biologia, meio ambiente, física, química, matemática, economia e engenharia”, vislumbra. A unidade também se uniu a Brotar Sempre (Associação dos Produtores de Hidroponia e Cultivo Protegido do Estado de Sergipe) para transferência de tecnologia a produtores familiares que produzem vegetais com Hidroponia e pretendem migrar para o cultivo de hortaliças folhosas em Aquaponia. A entidade conta com 14 pessoas que trabalham com a técnica do cultivo sem solo, em Aracaju, Nossa Senhora do Socorro, Lagarto, Itabaiana e Laranjeiras. Dois desses agricultores estão participando da iniciativa. Um deles possui dois telados com cultivo hidropônico e construiu um terceiro para Aquaponia. “Ele já está trabalhando há seis meses e aprovou o projeto. A ideia dele é fazer uma solução para todas e depois transformar tudo em Aquaponia”, comemora o pesquisador da Embrapa Tabuleiros Costeiros. | 33


ESPECIAL

PRODUÇÃO INTEGRADA DE LAMBARIS E HORTALIÇAS

Cultivo aquapônico com lambaris, da APTA

A Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA), que é vinculada à Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo, desenvolveu um sistema de cultivo com a integração de lambari e hortaliças. O trabalho iniciou em 2014, em parceria com o pesquisador Fernando André Salles. A espécie utilizada no experimento é o lambari, que necessita da metade do tempo que a tilápia, por exemplo, para ter tamanho comercial. O projeto da APTA consiste em utilizar os resíduos do sistema de produção do lambari para o cultivo hidropônico. Com isso, é possível cultivar peixes e plantas gastando até 95% menos de água. A ideia dos pesquisadores é introduzir o sistema em São Paulo, por ser um Estado bastante populoso e possuir demanda crescente por alimentos e por água. “A agricultura é uma atividade extremamente dependente de água para conseguir adequada produtividade de alimentos, o que acaba competindo com recursos hídricos para a população urbana. Qualquer técnica que consiga reduzir a quantidade de água na produção de alimentos é extremamente bem-vinda”, afirma Salles. O uso de lambari para o sistema também é interessante, já que 70% da produção nacional de lambari é para abastecer o mercado paulista. O peixe é usado, principalmente, como isca viva na pesca esportiva.

A principal diferença entre o uso do lambari e outros peixes é o tempo necessário para atingir tamanho comercial. O lambari precisa de três a quatro meses, enquanto espécies como a tilápia, precisam de oito meses. “Os resultados em termos de produção é que podemos ter maior número de ciclos ao longo do ano”, afirma o pesquisador Fábio Sussel, da APTA. Soma-se a isso, a redução do tempo de cultivo das hortaliças, facilitação da mão de obra e reaproveitamento dos nutrientes presentes na solução aquosa. Para se ter ideia, o custo de fertilizante para produzir mil plantas está estimado entre R$ 30,00 a R$ 40,00. O custo total de produção por planta na Hidroponia varia de R$ 0,20 a R$ 0,40. Para o consumidor, a vantagem está no maior tempo de conservação das folhosas e facilidade na higienização, pois não há contato com o solo. Os pesquisadores da APTA estão, a princípio, propondo a produção aquapônica em módulo familiar, em compartimentos de 1 metro cúbico onde se trabalha com 600 litros de água e é possível produzir 400 lambaris e três ciclos de hortaliças em três meses. Esse modelo representaria uma opção prática, moderna e sustentável de produzir alimentos de qualidade no próprio quintal, conforme Sussel, que é zootecnista formado pela Universidade Estadual de Maringá, no Paraná, com mestrado na área de nutrição de peixes pela Universidade Estadual Paulista, de Botucatu, e doutorado também em nutrição de peixes pela Universidade de São Paulo. “No entanto, em sistemas comerciais de Aquaponia, o lambari é mais rentável quando comparado com outras espécies, por ter valor agregado por unidade, já que é comercializado como isca viva para a pesca esportiva, não havendo perdas e nem custos com abate e processamento”, explica.

Raízes de planta em aquaponia

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ESPECIAL

PRODUÇÃO DE ALFACE CRESPA EM AQUAPONIA COM DIFERENTES SUBSTRATOS Na Aquaponia, podem ser utilizados substratos orgânicos e inorgânicos. As características desses materiais afetam diretamente e indiretamente o desenvolvimento e produção dos vegetais, sendo que a aeração é um importante fator que influencia a produtividade. O oxigênio é um elemento necessário para a atividade celular, envolvido no processo de respiração, e quando ausente no sistema radicular, provoca prejuízos ao desenvolvimento metabólico do vegetal, então a estrutura do substrato influência o desenvolvimento dos cultivos, principalmente, cultivos sem solo. Assim, explica o professor doutor Luciano Oliveira Geisenhoff, da Faculdade de Ciências Agrárias (FCA) da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), a escolha do substrato em um sistema aquapônico deve respeitar as proporções adequadas de água e ar que satisfaçam as necessidades das plantas. Visando estabelecer o substrato que melhor se ajuste ao cultivo aquapônico, uma pesquisa da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), no Mato Grosso do Sul, avaliou o efeito de dois substratos sobre no rendimento da alface cultivada em sistema aquapônico. O experimento foi realizado em 2014, na FCA, conforme Geisenhoff. Os substratos experimentados foram: Pedra Brita Número 3 (PB3) e Espuma Flexí-

vel de Poliuretano (EFP). A alface utilizada no experimento foi Lactuca sativa cv. Verônica, do tipo crespa. Os pesquisadores construíram uma estufa com 100 metros quadrados, sob a qual foi instalado o sistema de criação intensiva com recirculação, composto por dez tanques de fibra de 500 litros cada. Os tanques de criação foram conectados a um sistema de filtragem para remoção de sólidos e amônia, onde a água circula em um sistema fechado, retornando posteriormente aos tanques de criação. A espécie de peixe usada pelos pesquisadores no sistema foi a tilápia, linhagem Gift. A água residuária fora enviada para dois reservatórios de 1000 litros, onde fora misturada com o biofertilizante que sai do biodigestor, sendo então utilizada no sistema aquapônico de cultivo de alface. Duas telhas de fibrocimento, com ondas de 5 centímetros de altura e espaçadas a 18 centímetros, montadas sobre uma bancada com inclinação de 3%, serviram como canal para o cultivo. O tratamento onde foi utilizada EFP resultou em maior massa fresca da parte aérea (95,48 g planta-1), maior número de folhas (14,90) e maior produtividade (23,87 t ha-1). “A EFP se mostrou como um substrato mais adequado para a integração entre a criação de peixes e a produção de alface aquapônica”, ressalta Geisenhoff.

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