Tecnologia de desidratação solar

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ACÁCIO FIGUEIREDO NETO DAVID YURI DE MELO NUNES MORAIS NATALI MOURA COSTA SILVA ALEXSANDRO GOMES PEREIRA

TECNOLOGIA DE DESIDRATAÇÃO SOLAR PRINCÍPIOS E APLICAÇÕES



ACÁCIO FIGUEIREDO NETO DAVID YURI DE MELO NUNES MORAIS NATALI MOURA COSTA SILVA ALEXSANDRO GOMES PEREIRA

TECNOLOGIA DE DESIDRATAÇÃO SOLAR PRINCÍPIOS E APLICAÇÕES

JUAZEIRO-BA UNIVASF 2 0 21


©Copyright 2021 by Organização do Livro ACÁCIO FIGUEIREDO NETO DAVID YURI DE MELO NUNES MORAIS NATALI MOURA COSTA SILVA ALEXSANDRO GOMES PEREIRA Capa DAVID YURI DE MELO NUNES MORAIS Editoração DAVID YURI DE MELO NUNES MORAIS Diagramação DAVID YURI DE MELO NUNES MORAIS O conteúdo dos artigos é de inteira responsabilidade dos autores. Data de fechamento da edição: 25-05-2021

F475s

Figueiredo Neto, Acácio. Tecnologia de desidratação solar: princípios e aplicações. 1ed. / Organizadores, Acácio Figueiredo Neto, David Yuri de Melo Nunes Morais, Natali Moura Costa Silva, Alexsandro Gomes Pereira – Juazeiro: AREPB, 2021. 74 f. : il. color. ISBN: 978-65-87070-16-2 1. Produtos agrícolas. 2. Secagem. I. Figueiredo Neto, Acácio. II. Morais, David Yuri de Melo Nunes. III. Silva, Natali Moura Costa. IV. Pereira, Alexsandro Gomes. V. Título. CDU 631.5

Dados internacionais de catalogação na publicação (CIP) Ficha Catalográfica Elaborada pela Direção Geral da Revista Eletrônica A Barriguda - AREPB Todos os direitos desta edição reservados à Associação da Revista Eletrônica A Barriguda – AREPB. Foi feito o depósito legal.


AUTORES Acácio Figueiredo Neto Engenheiro Agrônomo, Doutor em Engenharia Agrícola, Professor do departamento de Engenharia Agrícola da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), Juazeiro - BA. David Yuri de Melo Nunes Morais Engenheiro Mecânico, Mestre em Dinâmicas de Desenvolvimento do Semiárido (UNIVASF) e doutorando no Programa de Pós-Graduação em Ciência dos Materiais (UNIVASF). Atualmente desenvolve projetos de mecanização e automação agrícola na empresa Performance Agro. Natali Moura Costa Silva Engenheira Agrônoma pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e Tecnóloga em Viticultura e Enologia pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano (IF-Sertão). Experiência em gestão agroindustrial e controle de qualidade na indústria de alimentos. Alexsandro Gomes Pereira Engenheiro Mecânico pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF). Atualmente engenheiro de projetos de mecanização e automação agrícola na empresa Performance Agro. Gilson Macedo Alencar Graduando em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF). Pesquisador do Laboratório de Armazenamento de Produtos Agrícolas (LAPA-UNIVASF). Experiência em projetos de pesquisa em secagem solar. Carlos Henrique Freitas Alencar Graduando em Engenharia Agrícola e Ambiental pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF). Pesquisador do Laboratório de Armazenamento de Produtos Agrícolas (LAPA-UNIVASF). Experiência em projetos de pesquisa em secagem solar. Filipe Alves Barboza Engenheiro Mecânico e mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ciência dos Materiais (UNIVASF).



APRESENTAÇÃO O crescimento da produção de produtos processados no Brasil e a expectativa de aproveitamento de diversas frutas nas áreas agrícolas estão cada vez mais ganhando força entre os produtores. Atualmente, os produtos agrícolas processados possuem um enorme potencial para ganhar mais espaço na comercialização e opções de alimentos nas gôndolas dos diversos mercados. Este trabalho foi realizado para dar suporte ao projeto de divulgação e acompanhamento técnico que o Laboratório de Armazenamento de Produtos Agrícolas juntamente com a empresa Performance Agro estão fazendo para vários produtores no Vale do São Francisco, no intuito de apresentar métodos de secagem de alguns dos produtos agrícolas com técnicas e alternativas para processamento de produtos que possam ser armazenados e conservados para agregar maior valor comercial quando comparados aos produtos ‘in natura’. Esta cartilha teve como base experimentos, contatos e visitas técnicas a várias propriedades rurais para subsidiar o tema em questão. Pois, a secagem solar e a capacitação de pequenos e médios produtores tem sido um dos nossos principais focos.



PREFÁCIO A região do Submédio São Francisco é mundialmente conhecida pela fruticultura irrigada. O emprego constante da tecnologia aplicada à produção, assim como a alta taxa de empregabilidade fazem da atividade agrícola o principal vetor de desenvolvimento dessa zona semiárida do Nordeste brasileiro. Essa região é singular para produção de frutas, tendo em vista uma conjunção de fatores naturais como características de solo, disponibilidade de água e condições de clima, com destaque para as altas taxas de insolação e baixos índices pluviométricos. O resultado é expresso na pluralidade de culturas com potencial produtivo em escala comercial no Vale do São Francisco. O potencial solar aliado à capacidade produtiva de frutas in natura abre espaço para aplicação de tecnologia no sentido da utilização consciente dos recursos energéticos e dinamização da atividade agrícola com a exploração de novos produtos. Entra em cena a energia solar, utilizada como fonte primária na produção de frutas secas, uma interessante alternativa para diversificação econômica na fruticultura. Nós da GrandValle apoiamos trabalhos como este, que colocam o conhecimento científico a serviço do desenvolvimento de uma região, respeitando os recursos naturais com o uso de energia renovável e abrindo espaço para uma nova gama de produtos.

Lara Secchi Diretora Administrativa GrandValle Casa Nova-BA, Brasil



ÍNDICE TECNOLOGIA DE DESIDRATAÇÃO SOLAR: PRINCÍPIOS E APLICAÇÕES

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Introdução

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Capítulo 01: O que é Secagem Solar? Contexto • Origens • Princípios • Vantagens

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Capítulo 02: Como funcionam os Secadores Solares? Ciência da Secagem Solar •Tipos de equipamento • Eficiência

Capítulo 03: Frutas, Legumes e Vegetais: Como desidratá-los utilizando a Secagem Solar? Secagem • Procedimentos • Controle de qualidade

Capítulo 04: Secagem Solar é viável? Mercado • Estudo de caso

Conclusão - Secagem Solar: Por onde começar? Instituições • Parcerias • Projetos



INTRODUÇÃO

O agronegócio brasileiro clama por inovação e alternativas de diversificação da produção. Produtores rurais de diversas regiões do país tem buscado maneiras de lidar com o ambiente desafiador que é a comercialização de sua produção, vislumbrando no processamento de frutas, legumes e verduras uma opção lucrativa e com melhores condições de negociação e distribuição do produto final. Dentre as várias técnicas de processamento, uma das mais buscadas pelos produtores rurais é a desidratação. A desidratação é uma excelente maneira de aproveitamento do excedente da produção agrícola, visto que proporciona a obtenção de um produto de alto valor agregado, custos de armazenamento, distribuição e comercialização reduzidos quando comparados a outros produtos processados, além de um tempo de prateleira maior em relação aos produtos frescos. Ainda há, entretanto,

cenário brasileiro com potencial para atender os anseios dos produtores rurais. Os secadores solares são dispositivos que utilizam aquecedores solares de ar para fornecer energia térmica à secagem dos produtos agrícolas. Como será visto adiante, constituem um "meio termo" entre os inconvenientes da secagem natural e os custos elevados dos sistemas de desidratação artificial. A utilização de energia renovável é o que torna a tecnologia tão atrativa. Mesmo funcionando em conjunto com outras fontes de energia, o emprego de energia solar na secagem é o ponto chave para redução dos custos operacionais, garantindo a rentabilidade do empreendimento.

Desidratação Solar

dificuldades em encontrar soluções de baixo custo para desidratação, e também problemas de produtividade e controle de qualidade no processamento, decorrente muitas vezes de assistência técnica rural incipiente durante o planejamento e execução de projetos agroindustriais dessa natureza. Nesse contexto, considerando a necessidade de técnicas simples de processamento e de baixo custo operacional, a secagem solar desponta no

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Assim, o presente trabalho tem o objetivo de apresentar esta tecnologia inovadora, introduzindo desde os principais conceitos relacionados ao funcionamento dos secadores solares aos aspectos relativos a agroindústria de produtos desidratados, proporcionando ao produtor maior familiaridade com a tecnologia e informações úteis para decidir qual solução se adequa melhor a sua realidade. O livro está organizado nos seguintes capítulos: Capítulo 01: O que é Secagem Solar? Neste capítulo são apresentados os principais conceitos relativos à secagem solar, suas origens, vantagens e limitações. Capítulo 02: Como funcionam os Secadores Solares? Aqui serão discutidos os princípios de funcionamento dos secadores solares, a ciência por trás dos secadores, tipos de secadores solares disponíveis atualmente e como utilizar a tecnologia de maneira eficiente. Capítulo 03: Frutas, Legumes e Vegetais: Como desidratá-los utilizando a Secagem Solar? Este capítulo é dedicado a orientar o produtor sobre boas práticas agroindustriais no que diz respeito à desidratação solar de frutas, legumes e vegetais de maneira a garantir qualidade no produto final e bom rendimento no processamento. Capítulo 04: Secagem Solar é viável? Neste capítulo são discutidos aspectos de mercado, investimentos e comercialização de produtos desidratados através de um estudo de caso. Conclusão: Secagem Solar: Por onde começar? Finalmente, de modo a orientar o produtor rural como seguir adiante projetos de secagem solar, são apresentadas instituições de apoio e assistência técnica na área.

Desidratação Solar

Espera-se que este trabalho motive produtores e profissionais da agricultura a desenvolverem projetos desta natureza, fortalecendo a adoção de práticas sustentáveis no processamento de produtos agrícolas e proporcionando diversificação e inovação para o agronegócio brasileiro.

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O QUE É SECAGEM SOLAR? CONTEXTO • ORIGENS • VANTAGENS • PROCESSOS Acácio Figueiredo Neto David Yuri de Melo Nunes Morais Natali Moura Costa Silva



O QUE É SECAGEM SOLAR?

1. SECAGEM SOLAR 1.1 CONTEXTO: O PRODUTOR RURAL E OS DESAFIOS DA ETAPA PÓS-COLHEITA O desperdício de alimentos continua sendo um desafio para a agricultura mundial, apesar dos grandes avanços conquistados na melhoria da produtividade agrícola e redução dos impactos ambientais da atividade. No Brasil, especialmente a fase pós-colheita enfrenta grandes níveis de desperdício de alimentos. Segundo Fernandes (2016) e Costa (2015), no agronegócio brasileiro as etapas da póscolheita com maior índice de perdas são o manuseio e armazenamento; processamento e acondicionamento e distribuição. Diversas técnicas de processamento têm sido desenvolvidas tendo em vista esses pontos críticos, objetivando-se alternativas de aproveitamento para aumentar o tempo de

Figura 01 - O desperdício de alimentos está presente em diversas cadeias, como no caso da viticultura de uva de mesa, embora a indústria de sucos e vinhos seja capaz de absorver o

Desidratação Solar

comercialização do produto final (Figura 01).

excedente da produção, é possível aproveitar esse mesmo excedente em produtos de maior valor agregado.

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Desperdício de alimentos na cadeia de frutas e hortaliças ao longo das etapas de produção, logística e comercialização na América Latina

Campo

Pós-colheita

Distribuição

Consumo 0

10

20

30

Percentual de perda (%) Figura 02 - Desperdício de alimentos na cadeia de frutas e hortaliças ao longo das etapas de campo, pós-colheita (manuseio, armazenamento, processamento e embalagem), distribuição e consumo na América Latina, segundo dados da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, 2011).

Conforme a Figura 02, verifica-se que a realidade brasileira é também vivida na América Latina no que diz respeito ao desperdício de alimentos, segundo

Desidratação Solar

dados da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). A etapa pós-colheita, compreendendo ações de manuseio, armazenamento, processamento e embalagem, chega a níveis de 30% de desperdício considerando a cadeia de frutas e hortaliças. Como se sabe, nesta cadeia de frutas e hortaliças, há um desafio constante de oferecer ao consumidor final produtos frescos de qualidade nutricional, boa aparência e sabor e ao mesmo tempo, lidar com a alta perecibilidade desses

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alimentos. Por isso, é notório que, devido aos altos padrões de qualidade exigidos no mercado consumidor, boa parte dos produtores sofrem por não conseguirem aproveitar produtos de qualidade inferior em soluções de alto valor agregado, optando pelo desperdício ou comercialização a baixo custo. Outros produtores, buscando alternativas para vencer o desperdício, empreendem esforços para aproveitar como matéria-prima o excedente para produtos agroindustriais, no entanto esbarram nos custos de instalação, operação e manutenção agroindustrial, ou mesmo na complexidade que envolve a diversificação da produção.


1.2 SECAGEM SOLAR: ALTERNATIVA EFICAZ A desidratação tem sido uma das técnicas adotadas por produtores para processamento do excedente de sua produção. Uma forma simples de aproveitamento consiste na secagem natural, isto é, a exposição dos produtos agrícolas à ação do vento e incidência direta da radiação solar, seja num terreiro de concreto ou terra batida, ou até mesmo na própria planta. Esta técnica, entretanto, não é recomendada quando se busca atingir padrões de produtividade e qualidade do produto, dadas as perdas por variações climáticas e ataques de pragas (Figura 03), sendo necessário o uso de técnicas cujos parâmetros de secagem possam ser mais bem acompanhados.

Figura 03 - Secagem natural para produção de uvas-passas no Vale do São Francisco - Brasil. As técnicas de secagem natural são amplamente empregadas em todo o mundo, no entanto enfrenta sérios problemas de ataque de pragas e constantes intempéries.

fornecer energia térmica à secagem dos produtos agrícolas. Através do fluxo do ar aquecido, da condução de calor pelas superfícies aquecidas em contato com o produto ou da incidência direta de radiação solar, os secadores solares proporcionam o aumento da pressão de vapor do produto e consequente remoção de umidade do produto para o ambiente, sem que ele esteja exposto às intempéries como na secagem solar a céu aberto.

Desidratação Solar

Assim, há algumas décadas, em várias partes do mundo tem se desenvolvido projetos e pesquisas com secadores solares, visto que a secagem solar é realizada dentro de um ambiente cujas variáveis do processo possam ser controladas. Os secadores solares são dispositivos que utilizam aquecedores solares de ar para

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Figura 04 - Produção de uvas-passas através de secador solar de sistema direto no Vale do São Francisco - Brasil. O controle dos parâmetros de temperatura e umidade, aliado ao controle sanitário e baixo custo de energia empregada faz da tecnologia uma alternativa promissora.

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Um exemplo do potencial de utilização de secadores solares é mostrado na Figura 04. A produção de uvas-passas em várias partes do mundo utiliza em sua maioria métodos de secagem natural (PANAGOPOULOU, 2018). Os métodos de

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secagem natural abrangem tanto a secagem natural na própria planta, em que o produto seca na planta logo após atingir o ponto de maturação fisiológica, sem qualquer interferência humana, como também a secagem em lona seca na qual o produto é exposto ao sol ou à sombra. Entretanto, há uma série de inconvenientes associados a esse sistema de produção (FIGUEIREDO NETO, et al., 2020): em 2020, cerca de 140 toneladas de uvas-passas importadas pelo Brasil foram barradas devido a presença da substância ocratoxina A, produzida por fungos (AGROLINK, 2021), demonstrando o deficiente controle de qualidade associado a sistemas de produção via secagem natural. A utilização de secadores solares tem o potencial de melhorar a qualidade da produção visto que as frutas verduras ou hortaliças são desidratadas em um ambiente controlado, garantindo diminuição do ataque de pragas, exposição a intempéries, além de permitir que a secagem se realize de maneira uniforme e o produto final atinja valores de umidade final adequados, de modo que diminuam as chances de presença de fungos e outros patógenos.


1.3 VANTAGENS DA SECAGEM SOLAR A Figura 05 apresenta um quadro comparativo da secagem solar em relação a outros sistemas de secagem: secagem natural , isto é, exposição do produto ao clima natural, e a secagem artificial, em estufas ou secadores de convecção forçada.

SECAGEM NATURAL

SECAGEM SOLAR

SECAGEM ARTIFICIAL

Investimentos iniciais baixos;

Investimentos iniciais

Investimentos iniciais altos;

Custo de mãode-obra elevado; Tempo longo para o processo de secagem; Variações no tempo de

intermediários; Baixo custo de mão-de-obra; Tempo de secagem adequado; Variações no

Baixo custo de mão-de-obra; Custos com energia elétrica ou biomassa para o sistema de aquecimento dos

secagem em virtude de variações no clima; Baixo controle de qualidade durante a secagem devido a intempéries e ataques de pragas;

tempo de secagem em virtude de variações no clima; Controle de temperatura e umidade durante a secagem; Qualidade da matéria-prima preservada de ataques de pragas e intempéries.

secadores; Tempo de secagem adequado; Controle de temperatura e umidade durante a secagem; Qualidade da matéria-prima preservada de ataques de pragas e intempéries.

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TIPOS DE SECAGEM

Figura 05 - Quadro comparativo entre diferentes tipos de secagem.

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Entende-se pela Figura 05 que os processos de secagem naturais tem como principal vantagem o baixo custo com investimentos iniciais, visto que pode ser feita em lona, ou estruturas de sombrite como na Figura 03. Há, no entanto, necessidade de mão-de-obra compreendendo operações pré-secagem (seleção, descascamento, dentre outras), espalhamento e revolvimento, o que pode acarretar em elevação nos custos operacionais, como também perdas na produção devido a intempéries e pragas, conforme discutido anteriormente. Já a secagem artificial em geral, embora tenha como principal vantagem a garantia de elevada qualidade do produto final, emprega alto investimento inicial com a aquisição de desidratadores elétricos ou fornos com instalação a gás, além de custos operacionais relativamente elevados, sobretudo os custos com energia elétrica ou de biomassa. De maneira que a secagem solar é capaz de reunir as vantagens dos dois sistemas, com os seguintes benefícios: Emprego de energia solar térmica para aquecimento do ar, que é uma fonte de energia limpa, sem custos, praticamente inesgotável e de perturbação ambiental mínima quando comparada à utilização de aquecimento a gás ou biomassa. Isso representa uma economia significativa de energia, visto que, segundo Silva (2008), a secagem artificial em altas temperaturas pode consumir 60% do total de energia empregada numa produção agrícola. Secagem em ambiente controlado: Os equipamentos utilizados na secagem solar permitem tanto monitoramento das condições de secagem (temperatura, velocidade do ar e umidade) quanto o controle sanitário. Isso acaba refletindo em redução de operações durante a secagem, diminuindo significativamente custos com mão-de-obra

Desidratação Solar

(Figura 06).

Figura 06 - O emprego de secadores solares reduz operações durante a secagem.

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1.4 EVOLUÇÃO DA SECAGEM SOLAR

Histórico da secagem solar Secagem natural ao Sol Desde os tempos antigos há relatos da utilização da exposição direta ao Sol de produtos agrícolas para secagem e posterior conservação, além da produção de frutas desidratadas para consumo.

TEMPOS ANTIGOS

- - - --- - - - - - - Protótipos de Secagem Solar

1960

Nessa época, o petróleo já mostrava os primeiros sinais de crise. Iniciam-se os esforços de pesquisa e desenvolvimento de protótipos de secadores solares no intuito de estudar o funcionamento destes dispositivos. A viabilidade econômica ainda não era uma prioridade.

- - - --- - - - - - - Crise do petróleo: o despertar das energias renováveis Com a crise do petróleo na década de 70, o mundo experimentou avanços tecnológicos no uso de fontes alternativas de energia. Houve a diversificação nos projetos de secagem solar e aumento significativo nas pesquisas.

1970

- - - --- - - - - - - -

2000

Os projetos de secagem solar na atualidade buscam cada vez mais conciliar eficiência energética e viabilidade econômica. Projetos em larga escala, com utilização híbrida de energia solar e outras fontes de energia, tem tornado os secadores solares cada vez mais competitivos com outras tecnologias convencionais.

- - - --- - - - - - - Figura 07 - Linha do tempo dos projetos de secagem solar

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Atualidade: projetos híbridos

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A Figura 07 ilustra as principais fases da evolução dos projetos de secadores solares. Os primeiros relatos de secagem solar remontam a pré-história, quando as frutas eram deixadas para secar ainda na planta, como no caso das uvas-passas, ou espalhadas e secas em chão batido. As produções de café e cacau ainda conservam esse sistema de secagem. Produtos agrícolas como grãos e sementes também eram secos ao Sol para retirar a umidade e assim facilitar a conservação. Os projetos de dispositivos de secagem utilizando a energia térmica do Sol tiveram maior incentivo já a partir de 1960. Nesse período, o petróleo já mostrava os primeiros sinais de crise, demandando pesquisas científicas que esclarecessem o funcionamento dos secadores solares. Sayigh (1977) apresenta algumas aplicações da secagem solar em vários tipos de projetos de pesquisa entre as décadas de 60 e 70: Lawand (1966, apud SAYIGH, 1977, p. 180) propôs um projeto de secador tipo gabinete para produção agrícola; Williams (1964, apud SAYIGH, 1977, p. 180) realizou secagem de feno e milho com coletor solar de plástico de 1500 pés². Sayigh (1977) também destaca alguns projetos com bons resultados, como os secadores tipo prateleira com forros de plástico utilizados amplamente na Austrália (SZULMAYER, 1973, apud SAYIGH, 1977, p. 181) e a secagem de algumas culturas em um projeto com cobertura de vidro no Brasil (GOSH,1975, apud SAYIGH, 1977, p. 181). A partir da década de 70, com a crise do petróleo, houve a conscientização de que era preciso "superar a histórica dependência de combustíveis fósseis para um maior e melhor aproveitamento dos recursos energéticos nos processos agrícolas, especialmente as fontes renováveis, como a eólica, solar, geotérmica e

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de biomassa" (MORAIS, 2018). Assim, houve também a busca energética na secagem dos produtos agrícolas, e, no caso do resolução de 1980 do Conselho Nacional do Petróleo foi proibido derivados do petróleo na secagem de alguns produtos agrícolas,

madeira e fumo (SOUZA, 2008). Foi justamente nessa época que houve o desdobramento de projetos de secagem solar em várias partes do mundo, tendo alguns deles inclusive contado com apoio governamental para execução: Duffie & Beckman (2013) destaca alguns projetos de escala industrial da época, como a fábrica Gold Kist em Decatur, Alabama. Esta fábrica consistia em uma instalação industrial experimental de secagem de soja utilizando energia solar térmica para aquecer o ar de secagem, e contou com o apoio do Departamento de Energia dos Estados Unidos. Conforme Guinn (1978), o secador recebia o ar aquecido por 672 coletores de aquecimento a ar, cobrindo uma área de 1200 m².

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por eficiência Brasil, com a o emprego de como cereais,


Outro projeto bem sucedido apresentado por Duffie & Beckman (2013), foi a utilização de secagem solar para diminuir a umidade de madeira serrada, de modo a atender padrões necessários para uso na construção e fabricação. A partir dos estudos de Simpson e Tschernitz (1985), foi desenvolvido e instalado um secador solar em uma indústria de móveis no Sri Lanka, tendo resultados do seu desempenho descritos em um estudo posterior (Simpson e Tschernitz, 1989). Além deste projeto, Yang (1980) apresentou um projeto de secagem solar de madeira de pinos de pinheiro-bravo em Ontário, Canadá, com duração de 12 dias de secagem no verão e 100 dias no inverno, obtendo grande vantagem em termos de tempo de secagem, visto que a secagem natural possuía ciclos de 240 dias, como também na qualidade da madeira, visto que a madeira seca no forno solar apresentou-se melhor do que a da secagem natural ao ar. Esses estudos formaram bases para o desenvolvimento dos atuais projetos de secagem solar, cujo foco maior consiste em cada vez mais conciliar eficiência energética e viabilidade econômica. Considerando a característica intermitente da energia solar especialmente em regiões subtropicais, a utilização híbrida de energia solar com outras fontes de energia, tem tornado os secadores solares cada vez mais competitivos com outras tecnologias convencionais. Um estudo publicado por Prakash e Kumar (2013) revisou extensivamente os projetos de secadores solares ao longo da história e as tendências atuais nos projetos. Para esses autores, um dos destaques de utilização híbrida de energia é a secagem solar com ventilação forçada, alimentada por painéis fotovoltaicos (Figura 08): "Na maioria dos secadores solares ativos, o ventilador é acionado pela célula solar fotovoltaica. Isso torna o secador ativo totalmente independente da

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dependência de combustível fóssil / eletricidade. Portanto, o secador solar fotovoltaico-térmico (PV / T) é considerado adequado para aplicação em fazendas rurais remotas na maioria dos países em desenvolvimento" (PRAKASH e KUMAR, 2013).

Figura 08 - Secador Solar híbrido: tendência atual nos projetos de secagem solar. A ventilação é acionada por painéis solares, e o aquecimento é feito pelo calor do Sol, tornando a estrutura independente.

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Referências AGROLINK. Brasil barra 140 toneladas de uva passa. Disponível em: <<https://www.agrolink.com.br/noticias/brasilbarra-140-toneladas-de-uva-passa_443622.html>>. Acesso em Janeiro de 2021. COSTA, C. C. da; GUILHOTO, J. J. M.; BURNQUIST, H. L. Impactos Socioeconômicos de Reduções nas Perdas Póscolheita de Produtos Agrícolas no Brasil. Rev. Econ. Sociol. Rural, Brasília, v. 53, n. 3, p. 395-408, Set. 2015. DUFFIE, John A.; BECKMAN, William A. Solar engineering of thermal processes. John Wiley & Sons, 2013. FAO. Global food losses and food waste – Extent, causes and prevention. Rome. 2011. FERNANDES, C. C.; MAZZOLA, B. G.; OLIVEIRA JÚNIOR, M. de M.. Resíduos alimentares e as mudanças climáticas. Organizações e Sustentabilidade, Londrina, v. 4, n. 2, p. 116-141, Jul./Dez. 2016. FIGUEIRÊDO NETO, A. ; MORAIS, D. Y. M. N. ; FARIAS, V. M. O. ; SANCHEZ-SAENZ, C. M. . Deshidratación Solar: principios y aplicaciones. 1. ed. Petrolina: Fundação UNIVASF, 2020. v. 1. 104p . GOSH, W. A new glass roof dryer for cocoa beans and other crops. UNESCO, Congr. Sun in the Service of Mankind, Paris, n. V30, 1973. GUINN, G. R., in Proceedings of the Solar Industrial Process Heat Conference (D. K. Anand and R. W. Allen, eds.), College Park MD, Conf-770966 p. 63 (1978). ‘‘Process Drying of Soybeans Using Heat from Solar Energy. LAWAND, T. A. How to make a solar cabinet dryer for agricultural produce. Brace Experiment Station, St. James Barbados, 1-9, 1966. MORAIS, D. Y. M. N.; ALENCAR, C. H. F. ; Figueirêdo Neto, A. Recurso solar das cidades de Petrolina-PE e JuazeiroBA para tecnologias de aproveitamento de energia: análise de diversas bases de dados. In: IV Congresso Brasileiro de Educação Ambiental Interdisciplinar, 2018, Juazeiro - BA. Anais do 4º Congresso Brasileiro de Educação Ambiental e 7º Workshop de Educação Ambiental Interdisciplinar., 2018. v. 1. PANAGOPOULOU, E. A. et al. Corinthian raisins (Vitis vinifera L., var. Apyrena) antioxidant and sugar content as affected by the drying process: a 3?year study. Journal of the science of food and agriculture, v. 99, n. 2, p. 915-922, jul./2018. PRAKASH, Om; KUMAR, Anil. Historical review and recent trends in solar drying systems. International journal of green energy, v. 10, n. 7, p. 690-738, 2013. SAYIGH, A. A. M. Solar Energy Engineering. Nova Iorque, EUA: Academic Press, 1977. 506 p. SILVA, J. S (Ed.). Secagem e Armazenagem de Produtos Agrícolas. Viçosa: Aprenda Fácil, 2008.

Desidratação Solar

SIMPSON, W. T. e J. L. TSCHERNITZ, Forest Products Laboratory Report FPL-44, U.S. Department of Agriculture, Forest Service (1985). Madison, WI, ‘‘FPL Design for Lumber Dry Kiln Using Solar/Wood Energy in Tropical Latitudes". SIMPSON, W. T. and J. L. TSCHERNITZ, Forest Products J., 39, 23 (Jan. 1989). ‘‘Performance of a Solar/Wood Energy Kiln in Tropical Latitudes". SZULMAYER, W. Thermodynamics of sun drying. UNESCO, Congr. Sun in the Service of Mankind, Paris, n. V24, 1973. WILLIAMS, L. G. Applications of solar collectors to hay and corn drying. Agr. Eng. Dept. Univ. Idaho Rep., out. 1964. YANG, K. C., Forest Products J., 30, 37 (Mar., 1980). ‘‘Solar Kiln Performance at a High Latitude, 48◦N"

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COMO FUNCIONAM OS SECADORES SOLARES? CIÊNCIA DA DESIDRATAÇÃO SOLAR • TIPOS DE SECADORES • EFICIÊNCIA Acácio Figueiredo Neto David Yuri de Melo Nunes Morais Alexsandro Gomes Pereira Carlos Henrique Freitas Alencar



COMO FUNCIONAM OS SECADORES SOLARES? 2. SECADORES SOLARES 2.1 A CIÊNCIA DA SECAGEM SOLAR Para entender o funcionamento dos secadores solares é necessário entender a ciência por trás desses equipamentos. Sim, existe muita ciência por trás dos secadores solares! Embora sejam dispositivos aparentemente simples do ponto de vista construtivo, entender seu funcionamento e garantir viabilidade e eficiência na secagem exigem compreensão de diversas áreas do conhecimento, como veremos adiante. Várias empresas e institutos de pesquisa ao redor do mundo tem se dedicado a este tema, com profissionais altamente qualificados aplicandose a desenvolver novos projetos viáveis de secagem solar. O objetivo deste tópico não é trazer minuciosamente aspectos científicos, ou fazer a secagem solar

técnico especializado para garantia de sucesso no empreendimento. A secagem solar é uma ciência interdisciplinar. Quando se fala de interdisciplinaridade, significa dizer que várias áreas do conhecimento estão envolvidas no seu entendimento, e essas áreas interagem entre si. O potencial da tecnologia de secagem solar para desidratação de produtos agrícolas só é perfeitamente entendido quando se consideram desde aspectos físicos, como os processos de transferência de calor, secagem e radiação solar, passando por aspectos técnicos, envolvendo os conhecimentos de segurança e qualidade dos alimentos, bem como a engenharia dos secadores solares e, finalmente, aspectos econômicos e de viabilidade, como a estimativa de desempenho econômico de projetos de secagem ao longo do tempo, mercado consumidor, impactos ambientais, dentre outros. A análise em conjunto desses aspectos é o que permite chegar a projetos eficientes e viáveis.

Desidratação Solar

parecer algo difícil. Através dos conteúdos a seguir, será possível ter uma noção ampla dos pontos principais na hora de decidir implantar um projeto de secagem solar, e sobretudo despertar no produtor a necessidade de acompanhamento

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Figura 09 - A ciência da secagem solar e suas várias áreas de conhecimento (Fonte: Figueiredo Neto et al, 2020 - adaptado).

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Conforme a Figura 09, verifica-se que a secagem solar abrange áreas que vão desde a meteorologia, física, engenharia, tecnologia de alimentos, até outras áreas como meio ambiente e economia. Não se trata de algo novo para o produtor

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rural: mesmo aqueles que não receberam uma educação formal sabem que qualquer atividade agrícola envolve desde conhecer a terra, o clima, a planta, até a hora certa de colher e a hora certa de vender seu produto. Ou seja, quem está inserido na atividade rural conhece muito bem o que é interdisciplinaridade! Vamos ver agora como cada uma dessas áreas se relaciona com a secagem solar, enfatizando sempre a necessidade de ir além de analisar cada área de maneira individual, mas compreender como a operação conjunta dessas áreas irá interferir no projeto final de secagem solar.


Recurso solar: O estudo do recurso solar de uma determinada região e sua variação ao longo do ano tem impacto direto não só no desempenho de tecnologias que empregam energia solar, mas também no projeto e adaptações necessárias a essas tecnologias (Figura 10). É necessário compreender como a disponibilidade de radiação solar ao longo do ano varia e a variação diária devido a rotação da Terra em torno do seu eixo, como também entender como a interação da radiação solar com a atmosfera terrestre interfere no recurso solar que chega a uma determinada superfície. Por fim, é preciso reconhecer que, sendo a radiação solar uma variável meteorológica, é importante estudar o recurso solar a partir de séries temporais geradas através de dados meteorológicos, e analisar que tipos de dados são apropriados para o dimensionamento de projetos na área de energia solar. Meteorologia: O desenvolvimento de tecnologias de aproveitamento de energia solar depende principalmente da disponibilidade de informações confiáveis do recurso solar de uma região. Os dados de radiação solar de uma região podem ser apresentados em termos de uma componente específica da radiação solar (radiação direta ou difusa) ou na forma global, como também em várias bases temporais (base diária média mensal, base horária média mensal, entre outras). De qualquer forma, para uma avaliação coerente do desempenho de sistemas de aproveitamento de energia solar, é necessário o levantamento de dados medidos em superfície e, de preferência, de cada componente da radiação solar. A maioria das estações meteorológicas, disponibilizam apenas médias mensais de irradiação solar global diária, ou

Desidratação Solar

dados de irradiação solar global acumulada ao longo de um dia.

Figura 10 - Secador solar tipo distribuído em diferentes épocas do ano: a radiação solar, o clima e o tempo podem interferir no desempenho dos secadores solares.

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Física: Tanto o processo de secagem quanto o de aproveitamento térmico de energia solar exigem um conhecimento prévio dos fundamentos da transferência de calor e de massa. Para compreender a natureza da energia solar, suas interações com a atmosfera e os mecanismos de aproveitamento dessa energia, é também necessário um aprofundamento no modo de transferência de calor por radiação térmica. Só assim é possível elucidar os meios pelos quais a energia solar pode ser aproveitada termicamente e as limitações envolvidas no processo de secagem solar. O conhecimento da física envolvida na transferência de calor é o que permite entender os diferentes tipos de secadores solares e os materiais adequados na construção desses equipamentos. Também nos permite compreender os 3 diferentes processos pelo qual o produto agrícola pode ser desidratado: condução, convecção e radiação (Figura 11). Na condução, a transferência de calor ocorre devido ao gradiente de temperatura através de um meio estacionário, que pode ser um sólido ou um fluido. Na convecção, o transporte de energia térmica se dá de modo superficial, de um fluido em movimento para uma superfície a uma determinada temperatura. Finalmente, a radiação térmica, consiste na transferência de calor por meio de ondas eletromagnéticas emitidas por um corpo de temperatura não nula. A radiação solar é composta em parte de radiação térmica.

Figura 11 - A física na secagem solar: Modos de transferência de calor: a) condução, b) convecção

Desidratação Solar

e c) radiação (Fonte: Figueiredo Neto et al, 2020 - adaptado).

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Tecnologia de Secagem: A secagem de produtos agrícolas surge da necessidade de armazenar o produto agrícola sem que ele perca suas qualidades nutricionais e organolépticas, conservando-o para a etapa de comercialização e consumo. No processo de secagem, há transferência de calor e de massa entre o produto e o ar de secagem de modo que a umidade do produto é retirada, acarretando na diminuição da atividade metabólica do produto agrícola e, consequentemente, sua conservação (SILVA, 2008). Este assunto será melhor discutido no capítulo 03.


Tecnologia de Alimentos: É sabido que a qualidade da matéria-prima influencia sensivelmente no perfil dos produtos finais após a secagem (Figura 12). Isto é verdadeiro, quando distingue a importância de operações prévias, as quais incluem nos métodos de colheita, seleção, classificação de natureza biológica, química, física, bem como alterações das características organolépticas. Esta ultima refere-se parâmetros como: aparência, textura, consistência, sabor, odor e cor, peculiares ao produto ou produtos alimentícios. O capítulo 03 também oferecerá mais informações sobre o tema.

Figura 12 - Manga em desidratação solar: as características da matéria-prima e a forma de processamento interferem na qualidade do produto final.

Engenharia: Os projetos de secadores solares passam por técnicas e conceitos de engenharia, sendo necessário obedecer normas técnicas regulamentadoras para fabricação e instalação desses equipamentos. Além disso, no que diz respeito à fase de projeto, há vários aspectos a serem considerados: utilização de um sistema de ventilação forçada ou natural, posicionamento da ventilação, definir tipo de secador solar a ser empregado, tipos de materiais, dimensões, plano de fabricação, área ocupada pela secagem, estudo do isolamento térmico e das interfaces, dentre muitos outros parâmetros de projeto. A simulação computacional e os testes experimentais (Figura 13)

Desidratação Solar

também fazem parte da engenharia de secadores solares.

Figura 13 - Engenharia dos secadores solares: (a) as simulações computacionais e (b) os testes experimentais facilitam a otimização dos projetos de secadores solares (Fonte: Figueiredo Neto et al, 2020 - adaptado).

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Economia: Embora existam vários métodos para avaliar a viabilidade econômica de projetos agrícolas, em diversos estudos (BRANDÃO 2018; PAZ, 2016; REIS, 2016) verifica-se a utilização dos seguintes indicadores: Valor presente líquido (VPL), Taxa Interna de Retorno (TIR) e Payback descontado. Esses indicadores são determinados a partir das estimativas de fluxo de caixa ao longo do tempo, levando em consideração a receita bruta, calculada a partir da produção e do preço médio de venda, bem como custos operacionais, investimentos e depreciação. A avaliação econômica do uso de secadores solares pode consistir em um estudo comparativo de substituição de tecnologias (HAO, 2018), ou seja, utilizando secagem solar em vez de um método de secagem natural, ou desenvolvimento de uma nova atividade econômica. O capítulo 4 trará um exemplo detalhado da análise de viabilidade de projetos de secagem solar. Meio ambiente: Sabe-se que o uso da energia solar representa uma alternativa adequada para superar os problemas socioambientais atuais. Miller (2007), com base na compreensão das lições fundamentais da natureza, lista quatro princípios de sustentabilidade inter-relacionados defendidos por ambientalistas: reciclagem de nutrientes, controle populacional, biodiversidade e uso de energia solar, a principal fonte de todas as outras formas de energia. Entre as vantagens de usar esta energia são: perturbação térmica ambiental mínima em comparação com o uso de energia fóssil; aplicação versátil, seja como energia térmica para vários processos, aquecimento de ambientes ou geração de eletricidade por sistemas fotovoltaicos. Mesmo assim, na utilização de energia solar para secagem, é

Desidratação Solar

preciso considerar alguns impactos ambientais associados à utilização de área para os painéis de aquecimento e destinação de resíduos associados as etapas de processamentos. Vale ressaltar que os benefícios ao meio ambiente associados à secagem solar são muitos, como: maior período disponível para armazenamento, levando a redução de perdas pós-colheita devido ao mau tempo, animais e insetos; melhor planejamento da colheita, inclusive permitindo antecipação; vida mais longa de produto por meio de um processo barato e fácil de operar; e finalmente no uso de energia renovável e mínima perturbação ambiental no processo. Além disso, como é uma tecnologia simples e barata, é de fácil uso e acesso na agricultura familiar. Outros aspectos: Finalmente, outros aspectos também são importantes na secagem solar, dentre eles, por exemplo, o estudo de patentes, isto é, projetos de secadores solares que já detém propriedade intelectual e por isso não podem ser utilizados comercialmente sem autorização, questões de segurança do trabalho na operação de secadores, etc.

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2.2 TIPOS DE SECADORES SOLARES Para compreendermos o funcionamento de um secador solar, é preciso compreender que há diferentes tipos de secadores. Segundo Kalogirou (2009), os secadores solares podem ser classificados quanto à sua estrutura, e também pela maneira que a energia solar térmica é utilizada. Eles são classificados em secadores ativos, se utilizam o calor do sol apenas para aquecer o ar, valendo-se da ventilação forçada para permitir fluxo do ar sobre o produto, ou secadores passivos, quando o aquecimento do ar também é necessário para haver fluxo natural do ar e, com isso, o ar quente circule pelo produto. Quanto ao arranjo estrutural, basicamente há três tipos: Arranjo distribuído, em que há uma unidade para captar a energia térmica do Sol e uma unidade ou câmara de secagem; arranjo integrado, no qual uma mesma unidade capta energia solar e proporciona o processo de secagem; por fim, o arranjo misto, que traz um melhoramento do sistema integrado com o uso de um aquecedor solar de ar. A Figura 14 apresenta secadores distribuído e integrado. A Figura 15 traz um resumo dos principais tipos de secadores solares.

a)

Desidratação Solar

b)

Figura 14 - Tipos de secadores solares: (a) integrado (b) distribuído.

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TIPOS DE SECADORES

ATIVO DISTRIBUÍDO

ATIVO INTEGRADO

ATIVO MISTO

Utiliza ventilação

Utiliza ventilação

Utiliza ventilação

artificial (ventiladores);

artificial (ventiladores);

artificial (ventiladores);

Coletor de aquecimento de ar é separado da câmara de secagem; A câmara de

Coletor de aquecimento de ar é integrado à câmara de secagem; A câmara de

Coletor de aquecimento de ar é separado da câmara de secagem; A câmara de

secagem não permite incidência direta

secagem permite incidência direta de radiação solar.

secagem permite incidência direta de radiação solar.

de radiação solar.

Desidratação Solar

PASSIVO DISTRIBUÍDO

PASSIVO INTEGRADO

Utiliza apenas fluxo natural do ar; Coletor de aquecimento de ar é separado da

Utiliza apenas fluxo natural do ar; Coletor de aquecimento de ar é integrado à

Utiliza apenas fluxo natural do ar; Coletor de aquecimento de ar é separado da

câmara de secagem; A câmara de secagem não permite incidência direta de radiação solar.

câmara de secagem; A câmara de secagem permite incidência direta de radiação solar.

câmara de secagem; A câmara de secagem permite incidência direta de radiação solar.

Figura 15 - Quadro comparativo entre diferentes tipos de secadores.

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PASSIVO MISTO


2.3 FUNCIONAMENTO DE UM SECADOR SOLAR Conforme vimos anteriormente, os secadores solares podem ter um sistema de aquecimento direto, no arranjo integrado, e indireto, no arranjo distribuído. Assim, é possível explicar o funcionamento básico dos secadores solares a partir das duas situações: aquecimento direto e indireto. No aquecimento direto (Figura 16), o ar ambiente entra diretamente na câmara de secagem por dutos com filtros de ar, ainda na temperatura mais baixa. A radiação solar penetra a superfície transparente da câmara de secagem e sofre uma série de reflexões, no mesmo princípio do "efeito estufa." Isto provocará o aumento de temperatura do ar, de maneira que o produto agrícola será aquecido tanto pela passagem de ar aquecido quanto pela incidência direta de radiação solar no produto. Assim, normalmente os secadores solares diretos possuem maior gradiente de temperatura em relação ao ambiente, podendo chegar a 30 °C de diferença em relação à temperatura ambiente. Ar ambiente (entrada da Câmara de Secagem) Radiação Solar

Desidratação Solar

Ar na saída da Câmara de Secagem

Figura 16 - Aquecimento solar direto em secadores integrados.

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Ar ambiente (entrada do coletor solar a ar)

Coletor Solar a Ar Dutos

Radiação Solar Ar na saída da Câmara de Secagem

Câmara de Secagem Exaustores

Desidratação Solar

Figura 17 - Aquecimento solar indireto em secadores distribuídos (Fonte: Morais, et al. 2019).

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Conforme a Figura 17, verifica-se que a secagem solar em secadores distribuídos ocorre de maneira diferente. O ar ambiente passa primeiramente por um coletor de radiação solar térmica (Figura 18), que tem a função de aquecer previamente o ar. Em seguida, o ar passa por dutos até chegar na câmara de secagem, hermeticamente fechada. Assim, o produto agrícola será aquecido apenas pela passagem de ar aquecido proveniente do coletor solar a ar. Após passar pelo produto, o ar é retirado da câmara de secagem naturalmente ou por exaustores.


Professional 2014. Esquema de um coletor solar: Placa absorvedora frisada de metal, vidro e caixa

Desidratação Solar

Figura 18 - Projeto de aquecedor solar desenvolvido no software Autodesk® Inventor® de material isolante são alguns dos materiais utilizados (Fonte: Figueiredo Neto et al, 2020 adaptado).

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2.4 EFICIÊNCIA DE SECADORES SOLARES O desempenho da secagem solar pode ser avaliada em termos de: Eficiência em função da energia solar recebida e correspondente umidade (massa de água) retirada do produto; Eficiência de absorção da energia solar pelo coletor solar; Tempo total de secagem exigido para atingir um determinado valor de umidade. Esses fatores podem ser quantificados através de características do secador, do produto a ser desidratado e de dados meteorológicos do local da secagem. Mais uma vez, percebe-se a importância de avaliar a secagem solar de maneira conjunta com outras áreas do conhecimento. O desempenho de um secador solar irá variar conforme o tipo e a quantidade de produto agrícola a ser submetido à secagem: Por exemplo, num mesmo secador solar e mesma condição climática, frutas com umidade inicial mais alta irão requerer maior tempo de secagem que frutas com umidade inicial mais baixa. Outro exemplo comum é na secagem de uvas: uvas escuras tendem a absorver maior radiação e secam mais rápido que uvas claras (Figura 19). No caso de secadores solares de sistema distribuído, a eficiência do processo de secagem pode ser melhorada com a correta orientação do coletor solar utilizado para aquecer o ar. Um coletor solar deve ser orientado diretamente para o equador, de frente para o Sul no Hemisfério Norte e de frente para o norte no Hemisfério Sul, e, segundo Kalogirou (2009), sua inclinação deve ser igual à latitude local, sendo toleradas variações de 10° a 15° para mais ou para menos, dependendo da aplicação. Evidentemente, o coletor solar deve funcionar em um local amplo, sem sombras, para um melhor aproveitamento da energia solar. Para que isto seja possível, antes de instalar o secador é preciso fazer uma avaliação no

Desidratação Solar

local de instalação, isto é, o estudo de sombreamento. Através desse estudo é possível identificar épocas do ano em que eventualmente poderá haver sombras sobre o secador solar, no caso de instalações próximas a prédios e áreas industriais.

Figura 19 - O desempenho da secagem solar varia de acordo com o produto a ser desidratado.

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Vale ressaltar que a eficiência de um secador solar é diretamente afetada pela variação da radiação solar durante o dia e ao longo do ano. Em dias muito nublados, o aproveitamento de energia será bem menor do que em dias de céu limpo e sem nuvens. Consequentemente, países com boa incidência de radiação solar ao longo do ano, como o Brasil, tem condições oportunas para a utilização de secadores (Figura 20). Assim, todo projeto de um sistema de secagem solar deve ser antecedido de um estudo prévio do recurso solar da região na qual será desenvolvido. De qualquer forma, no que diz respeito ao aquecimento promovido pelo secador solar, segundo Dina et al. (2014), um bom projeto de um secador solar pode resultar em uma elevação de temperatura de 10 a 25ºC acima da ambiente. O tipo de secador também pode interferir no nível de eficiência da secagem. As principais diferenças entre os tipos de secadores solares quanto ao desempenho são: Os secadores passivos podem operar usando inteiramente fontes renováveis de energia, enquanto os secadores ativos necessitam normalmente de energia elétrica para forçar a circulação, o que também pode ser superado com a utilização de geração fotovoltaica de energia elétrica. Quanto às diferenças na secagem, no sistema distribuído é possível controlar o processo de

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forma simples, além de obter produtos de melhor qualidade em relação ao integrado, visto que há certos tipos de frutas e legumes que sofrem danos devido à incidência direta de radiação. Entretanto, os de arranjo integrado são de mais simples construção. Finalmente, no que diz respeito ao tempo de secagem, os secadores solares podem ter seu desempenho melhorado caso seja adotado o sistema de convecção forçada, isto é, ventilação mecânica em vez de simplesmente ventilação natural.

Figura 20 - Secador solar direto em operação em Casa Nova - BA, Fazenda Grand Valle. O clima tropical brasileiro é oportuno para utilização eficiente dessa tecnologia.

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Referências BRANDÃO, T. S. D. O. et al. Estudo de viabilidade econômico-financeira para im-plantação de uma microindústria produtora de bebida alcoólica fermentada de umbu-cajá (Spondias bahiensis). Custos e @gronegócio on line, Recife, v. 14, n. 3, p. 2-20, sep./2018. DINA, S. F. et al. Study on effectiveness of continuous solar dryer integrated with desiccant thermal storage for drying cocoa beans. Case Studies in Thermal Engineering, v. 5, p. 32-40, mar. 2014. FIGUEIRÊDO NETO, A. ; MORAIS, D. Y. M. N. ; FARIAS, V. M. O. ; SANCHEZ-SAENZ, C. M. . Deshidratación Solar: principios y aplicaciones. 1. ed. Petrolina: Fundação UNIVASF, 2020. v. 1. 104p . HAO, W.; LU, Y.; LAI, Y.; YU, H.; LYU, M. Research on operation strategy and per-formance prediction of flat plate solar collector with dual-function for drying agricul-tural products. Renewable energy, v. 127, p. 685-696, 2018. IAPAR. Instituto Agronômico do Paraná. Secador solar IAPAR. Londrina: IAPAR, [1980?] KALOGIROU, S. A. Solar Energy Engineering: Processes and Systems. 1 ed. EUA: Academic Press/ Elsevier, 2009. 760 p. MILLER JR., G. Tyler. Ciência ambiental. 11. ed. São Paulo: Cengage Learning, c2007. 501 p. MORAIS, D. Y. M. N. et al. Viabilidade técnica de secador solar no contexto do semiárido Brasileiro. Brazilian Journal of Development, v. 5, n. 2, p. 1036-1045, 2019. PAZ, Marlon Vidal; ARAGÃO, T. R. D. P. Viabilidade econômica da construção de uma unidade armazenadora em propriedade rural de Lagoa Vermelha (RS). Revista IPecege, Piracicaba, v. 2, n. 1, p. 66-79, mar./2016. REIS, Leonardo Pequeno; REIS, P. C. M. D. Viabilidade econômica do cultivo de uva irrigada no município de Petrolina, PE. Enciclopédia Biosfera, Goiânia, v. 13, n. 24, p. 1089-1099, dec./2016.

Desidratação Solar

SILVA, J. S (Ed.). Secagem e Armazenagem de Produtos Agrícolas. Viçosa: Aprenda Fácil, 2008.

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FRUTAS, LEGUMES E VEGETAIS: COMO DESIDRATÁ-LOS UTILIZANDO A SECAGEM SOLAR? SECAGEM • PROCEDIMENTOS • CONTROLE DE QUALIDADE Natali Moura Costa Silva Acácio Figueiredo Neto David Yuri de Melo Nunes Morais Filipe Alves Barboza



FRUTAS, LEGUMES E VEGETAIS: COMO DESIDRATAR UTILIZANDO A SECAGEM SOLAR? 3. SECAGEM DE FRUTAS, LEGUMES E VEGETAIS 3.1 O PROCESSO DE SECAGEM DE PRODUTOS AGRÍCOLAS

Quando se trata de produtos agrícolas, especialmente frutas, legumes e vegetais, observamos uma variedade de produtos que podem ser obtidos a partir

secagem, há transferência de calor e de massa entre o produto e o ar de secagem de modo que a umidade do produto é retirada, acarretando na diminuição da atividade metabólica do produto agrícola e, consequentemente, sua conservação. Na secagem podem ser observados os três meios de transferência de calor: condução, no contato direto do produto com uma superfície sólida de maior temperatura, convecção, com a passagem de fluxo de ar aquecido, e radiação, com incidência direta de radiação, seja natural ou artificial. A condição básica para que ocorra o processo de secagem é que a pressão de vapor sobre a superfície do produto seja maior do que a pressão do vapor d’água no ar de secagem, levando à retirada de umidade do interior do produto para a superfície, e da superfície para o ar de secagem. O processo continua até estabelecer-se uma condição de equilíbrio entre pressão de superfície e a pressão de vapor do ar de secagem (SILVA, 2008).

Desidratação Solar

de sua desidratação: uvas-passas, bananas chips, tomates secos são alguns dos mais populares. A obtenção desses produtos com a qualidade exigida pelo mercado consumidor passa pelo entendimento do processo de secagem e seus parâmetros principais. A secagem de produtos agrícolas surge da necessidade de armazenar o produto agrícola sem que ele perca suas qualidades nutricionais e organolépticas, conservando-o para a etapa de comercialização e consumo. No processo de

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Conforme a Figura 21, o processo de secagem pode ser dividido em três fases:

Temperatura de bulbo do produto

Velocidade de secagem Teor de água no produto (%b.u. ou % b.s.)

tempo de secagem (t) Figura 21 - Curvas típicas do processo de secagem (Fonte: PARK et al., 2007)

Etapa (a): Início da secagem: Há elevação gradativa da temperatura do produto e da pressão de vapor de água. Essas elevações tem prosseguimento até o ponto em que a transferência de calor equivale à transferência de massa de água. Etapa (b): Taxa constante de secagem: A transferência de massa e transferência de calor é equivalente e, portanto, a velocidade de secagem é constante. Enquanto houver quantidade de água na superfície do produto

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suficiente para acompanhar a evaporação, a taxa de secagem será constante. Etapa (c): Taxa decrescente de secagem: A transferência de massa é reduzida e não consegue compensar a transferência de calor. Isso acontece porque a quantidade de água presente na superfície torna-se menor que nas etapas anteriores, devido à redução de migração de umidade do interior para a superfície do produto. O processo de secagem finaliza quando o produto atinge o ponto de umidade de equilíbrio em relação ao ar de secagem. A secagem possui parâmetros que determinam a qualidade final do produto agrícola submetido a esse processo. É desejável, ao final do processo de secagem, que o produto preserve suas qualidades nutricionais, tenha distribuição uniforme de umidade e, no caso de sementes, não percam o poder de germinação (SILVA, 2008). Esses parâmetros são temperatura do ar de secagem, vazão do ar de secagem, umidade relativa do ar de secagem e, finalmente, umidade inicial e final do produto. Cada um deles interfere na secagem da seguinte forma:

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Temperatura do ar de secagem: A temperatura ideal para um processo de secagem deve levar em conta o tipo de produto agrícola a ser secado, seu uso final, bem como seu teor de umidade antes da realização do processo. Temperaturas elevadas podem levar a: perda do poder germinativo (para o caso de sementes), descoloração do produto, diminuição do teor de amido, óleo e proteína, podendo ainda levar a danos físicos, como quebras e trincas. No caso da secagem solar, essa temperatura pode variar ao longo do dia em virtude do clima (Figura 22). Vazão do ar de secagem: É preciso garantir que o ar de secagem percorra uniformemente toda massa do produto, de modo a garantir a uniformidade do processo e a qualidade do produto ao final do processo. Umidade relativa do ar de secagem: A premissa básica para que haja a secagem do produto é que a pressão de vapor do ar de secagem seja menor que a pressão na superfície do produto agrícola. Para atingir essa condição, a umidade relativa do ar de secagem deve ser menor que a umidade de equilíbrio. Umidade inicial e final do produto: Além dos parâmetros pertinentes ao ar de secagem, também é importante observar a umidade inicial e final do produto.

Figura 22 - Medição de temperatura superficial dos produtos durante a secagem solar através de câmera térmica. O acompanhamento da temperatura é fundamental para preservar a qualidade do produto.

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Isso porque um produto muito úmido não deve ser secado em altas temperaturas, pois pode secar rapidamente de modo a não proporcionar a migração de água do interior para superfície, induzindo ao aparecimento de trincas e rachaduras, como se observa em grãos, por exemplo.

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3.2 PERECIBILIDADE E QUALIDADE DOS ALIMENTOS A grande extensão do Brasil, que propicia longas distâncias entre os centros de produção e consumo, a perecibilidade da maioria dos vegetais aliadas às perdas pós-colheita são fatores que justificam a elaboração de novos produtos como alternativa para agregar valor e atender as demandas do consumidor que busca por alimentos com propriedades sensoriais e nutritivas próximas aos in natura e com maior vida de prateleira. Nesse sentido, a secagem solar para desidratar alimentos, tais como frutas, legumes, verduras, carnes, produtos lácteos, demonstra ser viável por ser uma técnica antiga, de baixo custo e simples de conservação. A técnica consiste em reduzir a disponibilidade de água que atua na degradação dos produtos alimentícios, mantendo-os nutritivos e saborosos, ainda tem como vantagem a redução dos custos com logística, pois dispensa a cadeia de frio e reduz significativamente o volume de estocagem, já que os vegetais apresentam mais de 80% de água em sua composição, Os produtos podem ser comercializados em diferentes formas (rodelas, palitos, fatias, cubos, granulado, pó). A qualidade do produto desidratado depende basicamente dos aspectos relacionados à qualidade da matéria-prima e dos cuidados com higiene durante as etapas de manipulação. As principais alterações que ocorrem durante a secagem

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são mudança de cor, por causa do escurecimento enzimático que ocorre naturalmente em muitas frutas e alteração da textura devido o teor de umidade final. Com teores baixos de umidade, a textura é muito dura, enquanto que, com teores mais elevados, tornam-se mais atraentes, porém mais suscetível a contaminação microbiológica, por isso é fundamental estabelecer o teor de umidade final ou atividade de água do produto. Para uma secagem uniforme é

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necessário que o produtor corte ou selecione os produtos em tamanhos semelhantes. O secador solar apresenta uma série de vantagens quando comparados com a secagem natural ao sol. Além de reduzir o tempo de secagem, diminui os riscos de contaminação por oferecer proteção ao produto contra chuva, vento, poeiras, insetos, pássaros, roedores e outros animais, entre outros contaminantes que comprometem a qualidade do produto e coloca em risco a saúde do consumidor. Para o produtor que deseja fornecer alimentos naturais e com qualidade excepcional, é recomendado produzir de acordo com o giro dos produtos, para evitar as alterações que ocorrem na estocagem ao longo do tempo, e escolher uma boa embalagem que evite a passagem de oxigênio, luz e umidade.


Assim, uma das vantagens oferecidas pela secagem é a do aumento do tempo de prateleira do alimento, isto é, a redução de sua perecibilidade. Como se sabe, a perecibilidade diz respeito à susceptibilidade da matéria-prima do alimento a alterações que esta pode sofrer frente a fatores adversos do meio, como contaminações, efeitos de agentes físicos, químicos e biológicos. Agentes de ordem biológica reúnem os microrganismos como as bactérias, fungos e leveduras, que sob condições satisfatórias de temperatura, oxigênio e PH podem acarretar fermentações indesejáveis, putrefações na cor, aparência, textura, etc. Por outro lado, os insetos também podem introduzir alterações, através de picadas ou infestações. Existem ainda, as alterações provenientes de roedores, efetivadas por meio da presença de excrementos, urina ou pelos, que inviabilizam a matéria-prima. Alterações de natureza química dizem respeito a mudanças entre substâncias da própria matéria-prima, se expostas a agentes como oxigênio, temperaturas elevadas, calor, etc. que contribuem para acelerar o mecanismo de reações entre os constituintes de um produto “in natura”. Por fim, as alterações físicas se referem àquelas decorrentes dos meios mecânicos ou físicos. Os agentes que promovem este tipo de alteração são as facas, ganchos, calor, frio e outros. Estes são capazes de promover lesões, queimaduras, cortes, machucões, colorações inadequadas, etc. É sabido que as qualidades das matérias-primas influenciam sensivelmente no perfil dos produtos desidratados. Por isso, ressalta-se a importância de operações prévias (Figura 23) antes de executar a secagem solar, como: métodos de colheita, seleção, classificação de natureza biológica, química, física, peculiares ao produto

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ou produtos alimentícios. Matérias-primas impróprias para consumo não devem ser utilizadas em secagem solar.

Figura 23 - As operações prévias são essenciais para a qualidade final do produto desidratado.

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3.3 BOAS PRÁTICAS DE FABRICAÇÃO EM AGROINDÚSTRIAS E CONTROLE DE QUALIDADE Como se pode observar até agora, a secagem solar consiste em uma atividade agroindustrial, exigindo do produtor a observância de leis, normas e procedimentos ligados à agroindústria. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) prevê a observância de Boas Práticas de Fabricação (BPF). Boas Práticas de Fabricação é um conjunto de padrões e medidas a serem adotadas pelas indústrias de alimentos e serviços de alimentação em cada etapa da produção para reduzir os riscos físicos, químicos e biológicos, diminuir prejuízos através de reduções de falhas da cadeia produtiva, manter a conformidade dos alimentos com os regulamentos técnicos, garantir a qualidade do produto e a segurança alimentar para o consumidor. Dentre alguns aspectos importantes dessa norma (BRASIL, 2004), é possível enfatizar: Local de trabalho: O local de trabalho deve ser limpo, organizado, bem ventilado e iluminado. As superfícies de parede, portas, janelas, móveis, equipamentos, utensílios, devem ser lisas, cores claras e fáceis de limpar. As janelas devem ser dotadas de telas para evitar a entrada de insetos e/ou outros animais. Prevenção e controle químicos são outras medidas importantes para o controle de pragas urbanas. Abastecimento de água: Usar somente água potável nas operações

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prévias e posteriores à secagem. Quando utilizar água de fonte alternativa de abastecimento (rio, poços, cisternas) a potabilidade deve ser atestada semestralmente mediante laudos laboratoriais, sem prejuízo de outras exigências previstas em legislação específica. O reservatório de água deve ser tampado e revestido de materiais que não comprometam a qualidade da água, conforme legislação específica. Deve ser higienizado, em um intervalo máximo de seis meses, devendo ser mantido registros da

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operação. Recomendações aos manipuladores: Devem utilizar uniformes compatíveis à atividade (Figura 24), conservados, limpos e usados exclusivamente nas dependências internas do estabelecimento, manter as mãos sempre higienizadas, cabelos presos e cobertos com toucas, sem barba, retirar brincos, pulseiras, anéis, aliança, colares, relógio e maquiagem, manter as unhas curtas e sem esmalte. Cartazes de orientação sobre a correta higienização das mãos e demais hábitos de higiene devem ser afixados em locais de fácil visualização, inclusive nas instalações sanitárias e lavatórios. Todos os manipuladores devem manter bons hábitos de higiene, boas condições de saúde e ser, continuamente, treinados em Boas Práticas de Fabricação.


Figura 24 - As Boas Práticas de Fabricação (BPF) incluem a utilização de uniformes para evitar contaminação.

Manejo de resíduos: O estabelecimento deve dispor de recipientes identificados e íntegros, dotados de tampas acionadas com pedal, de fácil higienização e transporte, em número e capacidade suficientes para conter os resíduos. Os resíduos devem ser coletados diariamente para evitar focos de contaminação e atração de vetores e pragas urbanas. Preparação, armazenamento e transporte: Os ingredientes e embalagens devem estar devidamente limpos, assim como o ambiente de trabalho.

local limpo e organizado, sobre prateleiras, respeitando-se o espaçamento mínimo necessário para garantir adequada ventilação e limpeza. Na identificação do produto para ser comercializado deve constar, no mínimo, o nome do produto, ingredientes, lote e o prazo de validade. Os serviços de alimentação devem dispor de Manual de Boas Práticas e de Procedimentos Operacionais Padronizados (POP) com os seguintes itens: higienização das instalações, equipamentos, móveis e utensílios; controle da potabilidade da água; higiene e saúde dos manipuladores; manejo dos resíduos; manutenção preventiva e calibração de equipamentos; controle integrado de vetores e pragas urbanas; seleção das matérias-primas, ingredientes e embalagens; programa de recolhimento de alimentos.

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Fazer imediatamente a limpeza depois do trabalho e quando houver necessidade. Utilizar produtos de limpeza regularizados pela ANVISA. O estabelecimento deve manter documentado o controle e garantia da qualidade dos alimentos preparados, de modo que, em caso de uma necessidade de retirada do mercado, ou qualquer outro problema, o produtor identifique imediatamente o produto (lote). O produto acabado, matérias-primas, ingredientes e embalagens, devem ser armazenados em

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Em agroindústrias, também é necessário haver controle de qualidade dos alimentos, o que também é necessário para produtos desidratados. A análise de qualidade dos produtos desidratados pode ser feita principalmente através da determinação da umidade final do produto. A legislação vigente no Brasil (BRASIL, 2005) exige apenas o teor de umidade máximo de 25% para frutas secas. No caso de uvas-passas, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) prescreve diferentes parâmetros de qualidade para dois tipos de uvas-passas: sem semente, isto é, as que são produzidas de variedades de uvas sem semente, e as com semente ou semente removida, correspondendo às passas produzidas a partir de variedades com semente (CODEX STAN 67, 1981) . Para estas, o valor final de umidade não pode ultrapassar o máximo de 19%, já para as sem sementes o máximo é de 18%. Além da umidade final, segue abaixo alguns parâmetros físico-químicos necessários para analisar a qualidade de alimentos submetidos à secagem, conforme Celestino (2010): Parâmetros determinados em ensaios não-destrutivos: Cor: Através de aparelhos como colorímetros ou espectrofotômetros é possível calibrar em diferentes escalas de cores para observar as

Desidratação Solar

características dos alimentos. Uma escala comumente utilizada é a L* (Luminosidade), a*(vermelho/verde) e b* (amarelo / azul). Parâmetros determinados em ensaios destrutivos: Geralmente determinados a partir de preparação de amostras segundo a Association of Official

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Agricultural Chemists (AOAC). Sólidos solúveis totais: Corresponde ao teor de proteínas, carboidratos, gorduras, minerais e ácidos orgânicos, também chamado de teor de açúcar do alimento. São determinados com o auxílio de um refratômetro em escala ºBrix. Atividade de água: Parâmetro importante para determinar o tempo de prateleira do produto, pois corresponde ao teor de água ou umidade de equilíbrio do produto. Determinado em escala adimensional através de um medidor específico. Potencial hidrogeniônico (pH): Trata-se de uma medida da basicidade ou acidez de uma solução, determinado em escala adimensional através de um medidor de pH. Acidez Total Titulável: Determinada através de titulação e expressa em gramas de ácido por 100 mL ou 100 g de amostra.


3.4 FRUTAS, LEGUMES E VERDURAS: PROCEDIMENTOS PARA A SECAGEM SOLAR Seguem abaixo recomendações específicas de preparo e procedimentos para a realização de secagem solar para frutas, legumes e verduras. Em todo caso, a sequência de passos para o processamento é similar entre os produtos a serem desidratados: recepção, pesagem, seleção, lavagem, enxague, descasque e corte, pré-tratamento (opcional), secagem, embalagem e armazenamento (SOUZA NETO, 2006).

SECAGEM SOLAR DE FRUTAS LEGUMES E VERDURAS

Manga

PROCEDIMENTOS

Após recepcionar as frutas em contentores e efetuar a pesagem, deve-se selecionar as frutas que estejam adequadas para a secagem (ausência de danos mecânicos, podridões, estágio de maturação adequado); Após a lavagem para eliminar resíduos, insetos e poeira do campo, efetua-se o descasque e cortes (em cubo ou em camadas finas). Pesa-se o material para calcular o rendimento após a secagem; O material deve ser espalhado em camada única em bandejas apropriadas para indústria alimentícia e em seguida desidratados no secador solar (temperatura não deve ultrapassar 65°C. O tempo de secagem vai de 2 a 5 dias); Após a secagem, o material deve ser pesado para o cálculo do rendimento. Finalmente, as porções de manga-passa devem ser armazenadas em sacos em local seco e temperatura ambiente. A embalagem não deve permitir ataque de insetos e ganho de umidade pelo produto.

Desidratação Solar

FRUTA

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FRUTA

Banana

PROCEDIMENTOS

Utilizar as mesmas recomendações citadas anteriormente para manga nas etapas de recepção, seleção, lavagem, procedimentos de secagem e pesagens para calcular o rendimento. Utilizar bananas no máximo grau de maturação fisiológica; A banana pode ser seca inteira (passa) ou em fatias (chips). Para evitar o escurecimento associado à oxidação, recomenda-se mergulhar as fatias em soluções a base de suco de limão (IAPAR, 1980?); O tempo de secagem vai de 2 a 5 dias; Quanto ao rendimento, de 1 kg de banana é possível obter de 200 a 300 g de bananapassa (IAPAR, 1980?). Finalmente, pode-se polvilhar os chips com canela após a secagem e embalar em pequenas porções.

Desidratação Solar

Maçã e caqui

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Além das recomendações citadas para as outras frutas, no caso da maçã e do caqui a desidratação deve ser feita ainda antes de atingir a maturação fisiológica; Após o descascamento, o miolo deve ser retirado e a fruta descascada e cortada em fatias. No caso da maçã, utiliza-se mergulho em soluções antes da secagem para evitar o escurecimento (exemplo: bissulfito de sódio); É importante enfatizar que o corte de fatias deve ser feito de maneira a terem uma fina espessura, de modo a acelerar o processo de secagem; O tempo de secagem varia de 2 a 3 dias.


FRUTA

PROCEDIMENTOS

Uva

A produção de uvas-passas é uma das mais antigas entre as frutas desidratadas, por isso há material especializado de secagem para cada tipo de uva (com ou sem semente, clara ou escura, etc). O rendimento gira em torno de 20 a 30%, e o tempo de secagem é longo, de 10 a 20 dias. Pode-se utilizar pré-tratamentos para acelerar o processo de secagem.

Cenoura e beterraba

Após tirar as raízes e o topo, descascar e cortar em fatias ou rodelas e secar. O tempo

Tomate

O rendimento da secagem é em torno de 20%. O tempo de secagem pode variar de 2 a 4 dias. O corte em fatias diminuirá o tempo de secagem. O descascamento pode ser feito utilizando tratamento térmico, usando vapor de água e posterior resfriamento.

Flores e folhas

O tempo de secagem é rápido, 1 a 2 dias. Devem ser desidratadas imediatamente após a colheita. Não se pode receber radiação direta do Sol, por isso só devem ser utilizados secadores solares distribuídos. Para preservar o aroma natural das flores ou folhas, deve-se secar um único tipo de folha no secador, nunca duas ou mais simultaneamente.

Desidratação Solar

de secagem pode variar entre 2 a 3 dias. O rendimento da operação normalmente é abaixo de 20%

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3.5 PRÉ-TRATAMENTOS: ALTERNATIVA PARA OTIMIZAR O PROCESSO DE SECAGEM A utilização de pré-tratamentos no processo de secagem das frutas podem se apresentar como procedimentos muito importantes para controlar diversos parâmetros de qualidade do produto final como cor, sabor, textura e aroma, bem como reduzir o tempo de secagem necessário (ALMEIDA, 2013). Os pré-tratamentos, ou tratamentos pré-secagem, podem variar de acordo com o método e sua finalidade, existem processos que objetivam preservar características iniciais da fruta antes da secagem, através da utilização de antioxidantes, como a imersão da fruta em ácido ascórbico para repor a vitamina C perdida no processo de secagem e assim manter sua coloração inicial (CELESTINO, 2010). Seguem abaixo alguns tipos de pré-tratamentos empregados na desidratação de frutas e produtos agrícolas em geral. Muitos desses pré-tratamentos tem sido empregados tanto em agroindústrias como em sistemas de produção mais rudimentares, como no caso da uva em que se emprega imersão em solução de hidróxido de sódio antes da secagem natural.

PRÉ-TRATAMENTOS

NOME

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Branqueamento

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PROCEDIMENTOS

Consiste no aquecimento da fruta para potencializar a permeabilidade das membranas celulares e consequentemente facilitar o processo de secagem. É utilizada imersão em água fervente ou vapor o que também provoca redução na presença de microrganismos e prolonga o tempo de prateleira do produto final.


NOME

Desidratação osmótica

PROCEDIMENTOS

Caracteriza-se pela imersão da fruta numa solução com alto teor de concentração de soluto para que, através do processo de osmose, a fruta venha a apresentar uma perda parcial de água. A solução osmótica pode ser preparada tanto para provocar a perda de água quanto para preservar características desejáveis da fruta, evitando, por exemplo, o escurecimento provocado pela secagem.

Consiste na imersão da fruta em uma solução alcalina para remover a camada que a envolve. Segundo Gabas (1998), a utilização deste tratamento é muito comum em uvas, pois estas apresentam uma camada cerosa com comportamento hidrofóbico devido a sua natureza apolar, que dificulta a perda de água no processo de secagem, assim a uvas são imersas em solução diluída de hidróxido de sódio (NaOH) em alta temperatura, para que a camada cerosa possa reagir com a solução alcalina em processo de saponificação, assim resultando em uma película polar de natureza hidrofílica, potencializando a velocidade do processo de secagem. Desidratação Solar

Solução alcalina

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Embora haja vários benefícios associados aos pré-tratamentos, é importante chamar atenção a alguns problemas associados à incorreta operação desse processo. Gabas (1998) aponta que a imersão da uva na solução de hidróxido de sódio quente pode ocasionar o rompimento da sua casca, acarretando na perda de suco e afetando o aspecto final do produto, porem o rompimento da casca intensifica ainda mais a velocidade do processo de secagem, devido a exposição do interior da fruta (Figuras 25 a 27).

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Figura 25 - Solução de hidróxido de sódio a ser diluída em água.

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Figura 26 - Imersão de uvas em solução de água e baixo percentual de hidróxido de sódio.


Desidratação Solar

Figura 27 - A imersão incorreta leva a um rompimento excessivo da casca da uva.

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Referências ALMEIDA, L. C. P. Desidratação osmótica e secagem convectiva de uvas da cultivar crimson. 2013. Tese de Doutorado. Universidade Federal De Santa Catarina. BRASIL, Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC nº 216, de 15 de setembro de 2004. Dispõe sobre Regulamento Técnico de Boas Práticas para Serviços de Alimentação. BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC nº 272 de 22 de setembro de 2005. Aprova o regulamento técnico para produtos de vegetais, produtos de frutas e cogumelos comestíveis. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 23 set. 2005. CELESTINO, Sonia Maria Costa. Princípios de secagem de alimentos. Embrapa CerradosDocumentos (INFOTECA-E), 2010. CODEX STAN 67-1981. Codex Standard for Raisins. FIGUEIRÊDO NETO, A. ; MORAIS, D. Y. M. N. ; FARIAS, V. M. O. ; SANCHEZ-SAENZ, C. M. . Deshidratación Solar: principios y aplicaciones. 1. ed. Petrolina: Fundação UNIVASF, 2020. v. 1. 104p . GABAS, A. L. Secagem de uva Itália em leito fixo. 1998. Dissertação de Mestrado. Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Engenharia de Alimentos. IAPAR. Instituto Agronômico do Paraná. Secador solar IAPAR. Londrina: IAPAR, [1980?] PARK, K. J.; ANTONIO, G.C.; OLIVEIRA, R.A. De. Conceitos de processo e equipamentos de secagem. 2007. SILVA, J. S (Ed.). Secagem e Armazenagem de Produtos Agrícolas. Viçosa: Aprenda Fácil, 2008. SOUZA NETO, M. A. Manga e Melão Desidratados. Embrapa Informação Tecnológica, Brasília,

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DF : , 2006.,34 p.

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SECAGEM SOLAR É VIÁVEL? MERCADO • ESTUDO DE CASO Acácio Figueiredo Neto David Yuri de Melo Nunes Morais Gilson Macedo Alencar



SECAGEM SOLAR É VIÁVEL? 4. RENTABILIDADE DA SECAGEM SOLAR 4.1 AVALIANDO A RENTABILIDADE ATRAVÉS DE UM ESTUDO DE CASO . Avaliar a rentabilidade da secagem solar perpassa pela discussão de diversos fatores: modo de produção, comercialização, logística, tipo de empresa (cooperativa, empresa rural, etc.), disponibilidade de matéria-prima, clima, dentre outros fatores. Por isso, é mais fácil compreender esses fatores a partir de estudos de casos: situações reais ou previsões de cenários que apresentem como a tecnologia pode ou não ser viável. A seguir será apresentado um estudo de caso retirado do livro Deshidratación Solar (FIGUEIREDO NETO, et al., 2020) que aponta viabilidade da utilização de secagem solar para produção de uvas-passas em pequenas empresas rurais familiares. Para outros modos de produção e culturas, recomenda-se de forma veemente consultoria técnica especializada antes de implantação. ESTUDO DE CASO - UVAS-PASSAS DO VALE DO SÃO FRANCISCO: PLANO DE NEGÓCIOS ATRAVÉS DO MODELO “NEGÓCIO CERTO RURAL” PARA EMPRESAS RURAIS FAMILIARES

O presente plano de negócios contextualiza-se na tendência de aumento na demanda por alimentos com alto valor agregado, sendo as frutas secas um importante nicho de mercado (CENTRO, 2008). Com respeito ao potencial do Vale do São Francisco nesse cenário, Feldberg et al. (2008) conclui que mesmo as variedades de uvas produzidas na região que não atingem os padrões de qualidade para exportação, sendo comercializadas a preço baixo no mercado interno, ou mesmo descartadas, são perfeitamente adequadas para a produção de uvas-passas.

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INTRODUÇÃO

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Também é importante citar a relevância do projeto na ampliação do leque de oportunidades para os produtores de uvas da região, em especial os pequenos produtores. Araújo et al. (2013) observou que os pequenos produtores enfrentam bastantes dificuldades para inserção no mercado, seja por não disporem de recursos para arcar com custos de produção de uva para exportação, ou por não possuírem condições e técnicas adequadas para o manejo da uva. Assim, acabam sujeitando-se aos preços estabelecidos pelos atravessadores e as empresas de exportação para escoar sua produção agrícola. A produção de uva-passa pode mudar esta realidade: tomando como exemplo a experiência do Chile, um dos maiores exportadores mundiais de uvas-passas, em que a maior parte da matériaprima vem do descarte da uva de mesa, os pequenos produtores podem avistar uma alternativa rentável, devido ao valor agregado à sua produção, como também viável, visto que o manejo da uva para produção de uvas-passas apresenta custos menores e técnicas mais simples. Portanto, devido aos custos do Brasil com importação de quase 100% da uva-passa consumida no país (SOUZA et al., 2015), e diante do potencial ainda inexplorado do Vale do São Francisco para produção de uvas-passas, objetiva-se através deste plano de negócios apresentar uma alternativa viável do ponto de vista técnico e econômico para a produção e comercialização de uvas-passas na região através do aproveitamento do excedente da produção de uvas de mesa. O plano de negócios está baseado no modelo Negócio Certo Rural, utilizado pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR) na assistência técnica de produtores que almejam diversificar sua fonte de renda.

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DESENVOLVIMENTO

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De acordo com a capacidade operacional da produção e período de funcionamento do investimento à longo prazo, foi possível verificar a partir de estimativas da produção anual, margem bruta, custos (fixos e variáveis) e investimentos em instalações para produção, que a produção de uvas-passas por empresas familiares é um negócio rentável e lucrativo. Almeja-se, com isso, motivar estudos em diferentes arranjos de produção, bem como incentivar produtores ou cooperativas de produtores à produção de uvas-passas.

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CONCLUSÃO

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Referências ARAÚJO, G. J. F.; SILVA, M. M. Crescimento econômico no semiárido brasileiro: o caso do polo frutícola Petrolina/ Juazeiro. Caminhos de Geografia. Minas Gerais, v.24, n.46, pp.246-264. jul. 2013. CENTRO de Conhecimento em Agronegócios (PENSA). Projeto integrado de negócios sustentáveis – PINS: cadeia produtiva de frutas secas/ desidratadas. Brasília, DF: CODEVASF, 2008. 36 p. FELDBERG, N. P. ; MOTA R. V.; SIMÕES, W. L. ; REGINA, M. A. Viabilidade da utilização de descartes de produção de uvas sem sementes para elaboração de passas. Revista Brasileira de Fruticultura. São Paulo, v.30, n.3, pp.846-849. set. 2008. FIGUEIRÊDO NETO, A. ; MORAIS, D. Y. M. N. ; FARIAS, V. M. O. ; SANCHEZ-SAENZ, C. M. . Deshidratación Solar: principios y aplicaciones. 1. ed. Petrolina: Fundação UNIVASF, 2020. v. 1. 104p . SEBRAE. Como montar um negócio de frutas desidratadas. Disponível em: <https://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/ideias/como-montar-um-negociode-frutasdesidratadas,aae9e05452c78410VgnVCM1000003b74010aRCRD>. Acesso em: 07 Dez. 2019. SOUZA, R. T.; CORNEJO, F. E. P.; NOGUEIRA; R. I.; FREITAS, D. G. C.; PROTAS, J. F. S.; MAIA, J. D. G.; MATTOS, C. T. G. B.; LEAL, W. F.; RITSCHEL, P. Uvas-passas brasileiras: matéria-prima e

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processamento. Comunicado Técnico. Rio Grande do Sul. abr. 2015.

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SECAGEM SOLAR: POR ONDE COMEÇAR? INSTITUIÇÕES • PARCERIAS • PROJETOS Acácio Figueiredo Neto David Yuri de Melo Nunes Morais



SECAGEM SOLAR: POR ONDE COMEÇAR? CONCLUSÃO . Chegamos ao final dessa jornada de conhecimento sobre secagem solar. Foi possível aprender sobre a importância desta tecnologia no contexto de escassez e desperdício de alimentos que vivemos, a trajetória de desenvolvimento dessa tecnologia, suas bases científicas, detalhes construtivos e eficiência. Também aprendemos um pouco sobre os vários aspectos a serem observados na secagem de alimentos: controle de qualidade, boas práticas de fabricação e questões sanitárias. Finalmente, com o estudo de caso é possível vislumbrar viabilidade e rentabilidade econômica desta atividade. Depois de toda essa jornada, a pergunta que fica é: por onde devemos começar a por em prática projetos de secagem solar? Talvez, depois de toda essa discussão, projetos dessa natureza possam parecer complexos demais para serem levados adiante. De fato, a chave para o sucesso de projetos inovadores é contar

a universidades. As universidades dispõem de pessoas capacitadas para auxiliar na compreensão dos secadores solares, desenvolver testes em laboratório e interpretar os resultados de maneira coerente. A Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), por exemplo, através do Laboratório de Armazenamento de Produtos Agrícolas (LAPA - UNIVASF) dispõe de pesquisadores e material publicado especializado nesta área (Figura 25).

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com apoio técnico especializado que possa nos fornecer diretrizes necessárias para superar os obstáculos de implantação de agroindústrias de secagem solar. Desde o planejamento das etapas industriais de processamento, planejamento de comercialização, capacitação na tecnologia, tudo passa por um denso planejamento de modo a garantir efetividade nestes projetos. O primeiro passo pode ser aprofundar-se ainda mais nessa tecnologia junto

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Figura 28 - Livro "Deshidratación Solar: principios y aplicaciones" lançado em 2020 de autoria de pesquisadores do Laboratório de Armazenamento de Produtos Agrícolas (LAPA - UNIVASF) em parceria com a Universidade Nacional de Colômbia.

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Também é importante citar o papel relevante das instituições públicas e privadas de assistência técnica ao produtor rural. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR),

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Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), dentre outras instituições, dispõem de material técnico especializado e consultores prontos a atender demandas de diversificação da atividade rural, dentre elas, a utilização de secagem solar para produtos desidratados. Produtores interessados podem contar com o apoio dessas instituições no sentido de orientação técnica. A empresa Performance Agro, apoiadora desta publicação, também dispõe de serviços de projetos de secadores solares e consultoria especializada. Parcerias também são importantes para aprender lições fundamentais de quem já tem experiência nesses projetos: a Fazenda Grand Valle, fomentadora desta publicação, dispõe de projetos de secagem solar em andamento com resultados promissores. Assim, finalizamos essa jornada incentivando cada leitor a comprometer-se com o tema da sustentabilidade e redução de desperdício de alimentos, com a utilização da tecnologia da secagem solar. Caminhemos sempre na direção de oferecer soluções tecnológicas viáveis para as crises do mundo.


ORGANIZADORES TECNOLOGIA DE DESIDRATAÇÃO SOLAR: PRINCÍPIOS E APLICAÇÕES

ACÁCIO FIGUEIREDO NETO Engenheiro Agrônomo, Doutor em Engenharia Agrícola, Professor do departamento de Engenharia Agrícola e Ambiental da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), Juazeiro - BA.

DAVID YURI DE M. N. MORAIS Engenheiro Mecânico, Mestre em Dinâmicas de Desenvolvimento do Semiárido (UNIVASF) e doutorando em Ciência dos Materiais (UNIVASF). Atualmente desenvolve trabalhos de consultoria e projetos na empresa Performance Agro.

NATALI MOURA COSTA SILVA Engenheira Agrônoma pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e Tecnóloga em Viticultura e Enologia (IF-Sertão). Experiência em gestão agroindustrial e controle de qualidade.

ALEXSANDRO GOMES PEREIRA Engenheiro Mecânico, Mestrando em Dinâmicas de Desenvolvimento do Semiárido (UNIVASF). Atualmente desenvolve projetos de mecanização e automação agrícola na empresa Performance Agro.




TECNOLOGIA DE DESIDRATAÇÃO SOLAR PRINCÍPIOS E APLICAÇÕES

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