Organizadora: Laryssa Almeida Coordenação: Felix Araújo Neto Luciano Nascimento
JORNADA de direito público
JORNADA DE DIREITO PÚBLICO
CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO LARYSSA MAYARA ALVES DE ALMEIDA Diretor Presidente da Associação do Centro Interdisciplinar de Pesquisa em Educação e Direito VINÍCIUS LEÃO DE CASTRO Diretor - Adjunto Presidente da Associação do Centro Interdisciplinar de Pesquisa em Educação e Direito LUCIANO DO NASCIMENTO SILVA Coordenador Acadêmico da Associação do Centro Interdisciplinar de Pesquisa em Educação e Direito MARIA CEZILENE ARAÚJO DE MORAIS Coordenador Acadêmico - Adjunto da Associação do Centro Interdisciplinar de Pesquisa em Educação e Direito VALFREDO DE ANDRADE AGUIAR FILHO Coordenador de Política Editorial do Centro Interdisciplinar de Pesquisa em Educação e Direito YULGAN TENNO DE FARIAS Coordenador-Adjunto de Política Editorial do Centro Interdisciplinar de Pesquisa em Educação e Direito
ASSOCIAÇÃO DA REVISTA ELETRÔNICA A BARRIGUDA – AREPB CNPJ 12.955.187/0001-66 Acesse: www.abarriguda.org.br
CONSELHO CIENTÍFICO Adilson Rodrigues Pires Adolpho José Ribeiro Adriana Maria Aureliano da Silva Ana Carolina Gondim de Albuquerque Oliveira André Karam Trindade Alana Ramos Araújo Bruno Cézar Cadê Carina Barbosa Gouvêa Carlos Aranguéz Sanchéz Cláudio Simão de Lucena Neto Daniel Ferreira de Lira Elionora Nazaré Cardoso Ely Jorge Trindade Ezilda Cláudia de Melo Felix Araújo Neto Fernanda Isabela Oliveira Freitas Gisele Padilha Cadé Glauber Salomão Leite Gustavo Rabay Guerra Herry Charriery da Costa Santos
Hipolito de Sousa Lucena Ignacio Berdugo Gómes de la Torre Javier Valls Prieto Jeremias de Cássio Carneiro de Melo José Flôr de Medeiros Júnior Karina Teresa da Silva Maciel Laryssa Mayara Alves de Almeida Luciano do Nascimento Silva Ludmila Douettes Albuquerque de Aráujo Marcelo Alves Pereira Eufrásio Marcelo Weick Pogliese Maria Cezilene Araújo de Morais Raymundo Juliano Rego Feitosa Rodrigo Araújo Reül Rômulo Rhemo Palitot Braga Samara Cristina Oliveira Coelho Suênia Oliveira Vasconcelos Talden Queiroz Farias Thamara Duarte Cunha Medeiros Valfredo de Andrade Aguiar Filho
FELIX ARAÚJO NETO E LUCIANO NASCIMENTO COORDENADORES
LARYSSA ALMEIDA ORGANIZADORA
JORNADA DE DIREITO PÚBLICO
1ª EDIÇÃO ASSOCIAÇÃO DA REVISTA ELETRÔNICA A BARRIGUDA - AREPB
2013 Copyright 2013 by Editor-chefe LUCIANO NASCIMENTO SILVA Organização do Livro FELIX ARAÚJO NETO E LARYSSA MAYARA ALVES DE ALMEIDA Arte FAZ IDEIA Capa YULGAN TENNO DE FARIAS Editoração LARYSSA MAYARA ALVES DE ALMEIDA Diagramação LARYSSA MAYARA ALVES DE ALMEIDA
O conteúdo dos artigos é de inteira responsabilidade dos autores. Data de fechamento da edição: 05-10-2013
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELO BIBLIOTECÁRIO MARCOS PAULO FARIAS RODRIGUES CRB 15 Nº1601
J828
Jornada Direito Público. / Larissa Almeira (Org.) Felix Araújo Neto e Luciano Nascimento (Coord.). – Campina Grande: Associação da Revista Eletrônica A Barriguda (AREPB), 2013. 138 p. ISBN 978-85-67494-00-5 1. Direito Público 2. Direito 3. Jornada I. Título. CDU 342
Todos os direitos desta edição reservados à Associação da Revista Eletrônica A Barriguda – AREPB. Foi feito o depósito legal.
O Centro Interdisciplinar de Pesquisa em Educação e Direito – CIPED, responsável pela Revista Jurídica e Cultural “A Barriguda”, foi criado na cidade de Campina Grande-PB, com o objetivo de ser um locus de propagação de uma nova maneira de se enxergar a Pesquisa, o Ensino e a Extensão na área do Direito.
A ideia de criar uma revista eletrônica surgiu a partir de intensos debates em torno da Ciência Jurídica, com o objetivo de resgatar o estudo do Direito enquanto Ciência, de maneira inter e transdisciplinar unido sempre à cultura. Resgatando, dessa maneira, posturas metodológicas que se voltem a postura ética dos futuros profissionais.
Os idealizadores deste projeto, revestidos de ousadia, espírito acadêmico e nutridos do objetivo de criar um novo paradigma de estudo do Direito se motivaram para construir um projeto que ultrapassou as fronteiras de um informativo e se estabeleceu como uma revista eletrônica, para incentivar o resgate do ensino jurídico como interdisciplinar e transversal, sem esquecer a nossa riqueza cultural.
Nosso sincero reconhecimento e agradecimento a todos que contribuíram para a consolidação da Revista A Barriguda no meio acadêmico de forma tão significativa.
Acesse a Biblioteca do site www.abarriguda.org.br e confira E-Books gratuitos.
SUMÁRIO PREFÁCIO ................................................................................................................................. 09 Luciano Nascimento Silva
APRESENTAÇÃO ...................................................................................................................... 14 Felix Araújo Neto e Laryssa Mayara Alves de Almeida
1. A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER E A PERCEPÇÃO SOCIAL QUANTO À LEI MARIA DA PENHA NO CONTEXTO DO MUNICÍPIO DE CAMPINA GRANDE – PB ........................ 16 Félix Araújo Neto e Kamylla da Silva Bezerra
2. MAPEAMENTO DOS IMPACTOS NEGATIVOS E OMISSÃO DO PODER PÚBLICO DO AÇUDE DE BODOCONGÓ NO MUNICÍPIO DE CAMPINA GRANDE – PB ........................................................ 34 Angélica Cardoso Carlos, Esther Maria Barros de Albuquerque e Laryssa Mayara Alves de Almeida
3. A EXTRAFISCALIDADE DOS TRIBUTOS E SUA ESTRUTURAÇÃO NAS CONCEPÇÕES DO NEOLIBERALISMO ................................................................................................................... 50 John Tenório Gomes e Saulo Medeiros da Costa Silva
4. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS MEDIANTE DECISÕES DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO SOB O INFLUXO DO REALISMO JURÍDICO CARDOZIANO .................... 62 Lorena de Melo Freitas e Wanda Helena Mendes Muniz Falcão
5. A EDUCAÇÃO COMO UM DEVER FUNDAMENTAL DO ESTADO BRASILEIRO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE UNIVERSALIZAÇÃO ............................................................................................ 76 Daniel Ferreira de Lira e Kamila Kelly Dos Santos
6. DIREITO E FEMINISMO: INTRODUÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO DE UMA TEORIA CRÍTICA
.................................................................................................................................................. 83 Fernanda Isabela Oliveira Freitas e Kamylla da Silva Bezerra
7. A HOMOLOGAÇÃO DE DIVÓRCIO REALIZADO NO ESTRANGEIRO NO BRASIL APÓS A EMENDA CONSTITUCINAL 66/2010 ........................................................................................................... 94 Marcelo Vieira da Silva e Olívia Maria Cardoso Gomes
8. REFLEXÕES SOBRE O DIREITO FUNDAMENTAL À ACESSIBILIDADE NO BRASIL ............ 104 Daniel Ferreira de Lira e Tâmara Mirely Silveira Silva
9. PROCESSO DE EXECUÇÃO E CUMPRIMENTO DA SENTENÇA: A EFETIVAÇÃO DA PRETENSÃO DO DIREITO MATERIAL E SEUS NOVOS RUMOS ...................................................................... 114 Lírida Carla Moreira de Góes e Plínio Nunes de Souza 10. A CONCRETIZAÇÃO
DOS DIREITOS HUMANOS COM A EFETIVIDADE DO DIREITO SOCIAL
FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO NAS INSITUIÇÕES PRISIONAIS .......................................................... 124 Delane Silva da Matta Bonfim
PREFÁCIO A ciência é, ao mesmo tempo, uma enorme caixa de ferramentas e, mais importante que suas ferramentas, um saber de como se fazem as ferramentas.O uso das ferramentas científicas que já existem pode ser ensinado. Mas a arte de construir ferramentas novas, para isso há de saber pensar. A arte de pensar é a ponte para o desconhecido. Assim, tão importante quanto a aprendizagem do uso das ferramentas existentes – coisa que se pode aprender mecanicamente – é a arte de construir ferramentas novas. Na caixa das ferramentas, ao lado das ferramentas existentes, mas num compartimento separado, está a arte de pensar. RUBEM ALVES. “As tarefas da educação”. Jornal da Ciência. Publicação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Rio de Janeiro, ano XVIII, nº 533, p.3, 16 de Julho de 2004.
Entre os dias 20 e 21 de março de 2013, no Auditório da Justiça Federal, em Campina Grande, a Revista Científica A Barriguda realizou a 1ͣ Jornada Paraibana de Direito Público. O evento contou com uma diversidade temática fundada nas “ferramentas existentes” e com a proposição de construir “ferramentas novas” para o Direito Público. Os eventos sob organização da Revista Científica A Barriguda têm uma preocupação nuclear, qual seja a construção da Ciência Jurídica, a interpretação e construção do Direito como Ciência. 1ͣ Jornada Paraibana de Direito Público traduz inequivocamente esta preocupação, a ideia do Direito como Ciência. A obra jurídico-científica que surge pelas prestigiosas centenas de páginas da Editora A Barriguda – que tem sua fundação na 1ͣ Jornada Paraibana de Direito Público – com o título Jornada de Direito Público, aparece com a proposição científica de abrir a “caixa” da Ciência do Direito Público à luz das perspectivas construídas pelas letras de autores nacionais. A exposição de uma série de saberes que exigem não apenas o manuseio e a sua operação, mas sim a arte de formular perspectivas sobre perspectivas já existentes, sempre sob o mandamento de um saber jurídico, a saída de um saber jurídico para a entrada de outro, a
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construção de um cosmos de saberes jurídicos. E assim a Ciência do Direito mostra sua transformação, assim o Direito Público busca apresentar sua reengenharia jurídica. O livro intitulado Jornada de Direito Público traz uma diversidade temática que é a tradução de uma proposta de renovação interpretativa dos temas sob a égide do Direito Público. O quadro temático que apresenta nove perspectivas discursivas inaugura o debate com um tema que tem se tornado caro à Ciência do Direito, que é a questão cultural, sociológica e, recentemente, jurídica da violência doméstica contra à mulher. O tema é tratado à luz da Lei nº 11.340/06, instrumento normativo que se tornou a “carta magna” do reconhecimento dos direitos fundamentais da mulher. A popularmente denominada Lei Maria da Penha aparece como a carta cidadã da mulher contemporânea e a sua ressignificação de Ser autônomo no papel social. As páginas barrigudianas da Jornada de Direito Público lançam um desafio ao enfocar um tema de realidade local (cidade de Campina Grande), relacionado a um patrimônio da cidade e da população, que é o açude de bodogongó, os estudos surgem à luz da preocupação do que a linguagem jurídica intitula de impactos negativos de uma expansão urbana desenfreada, tema por demais intrigante para o Direito Público na perspectiva municipal como espaço inicial da vida em comunidade. A obra não foge de um dos desafios mais intrigantes para o Direito Público, que é a questão jurídico-política da tributação. O livro procura realizar uma incursão no instituo da extrafiscalidade com a proposição de analisar sua estrutura (estudo jurídico de raridade) conectada com os pilares do pensamento neoliberal. Para em seguida versar sobre debate jurídico dos mais acesos na atualidade, o tema do direito à saúde debatido pela questão do fornecimento de medicamentos, pelo poder público, numa realização material pela decisão CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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judicial como declaração de um realismo jurídico. O desenvolvimento da obra jurídicocientífica concede espaço para temáticas que diminuem a distância entre Sociologia e Direito. Em seguida os estudos versam sobre a educação como Direito Fundamental, a função do Estado em implementar políticas públicas que construam a ideia da universalização. Pode-se perfeitamente notar a preocupação científica da Jornada de Direito Público ao priorizar temas que provocam a análise de evolução dos sistemas jurídicos, ao trazer o tema Direito e Feminismo por uma perspectiva crítica, a obra formata uma reunião de pensamentos críticos que ora se avizinham e ora se distanciam nos discursos jurídicos. Em páginas à frente o leitor se depara com o tema da homologação de divórcio quando este realizado no exterior, a preocupação do texto é de caráter constitucional. Nos momentos que conduzem à conclusão da obra, a preocupação inicial de caráter científico e de aproximação com a sociologia pode ser, mais uma vez, identificada no texto que trata sobre reflexões acerca da acessibilidade como Direito Fundamental que ampara os portadores de deficiência. E, conclusivamente, pode-se encontrar no livro letras jurídicas direcionadas à preocupação com a execução e cumprimento da sentença prolatada, realidade jurídica que se expande por todo o sistema jurídico no sentido dos olhares quanto à efetividade e à realização material do Direito. A reunião de textos intitulada Jornada de Direito Público, publicada pelas páginas da Editora A Barriguda intenciona a formulação de uma moldura jurídica que seja interpretada como reunião de teorias científicas, busca novas conquistas científicas como postulados de uma teoria do conhecimento. Poder-se-ia dizer que a proposição é de uma reconstrução do “mundo” do Direito Público por intrigantes formulações jurídicosociológicas. O debate inter e transdisciplinar da função do Direito Público como instrumento
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jurídico de organização da civilidade. Construir saberes a serem operacionalizados pelo Direito Público com a finalidade de produzir o equilíbrio nas relações sociais, a função de desenhar os limites a serem reconhecidos como fronteiras da civilidade. A Jornada de Direito Público, pela reunião de textos, objetiva identificar as fenomenologias sociais que apresentam estrutura para sofrerem o processo de transformação e assumirem a condição de construção jurídica, o que implica numa diminuição da distância entre Sociedade e Direito. A obra, com a sua proposta dialética quer indagar: Que é Direito Público. Que estuda e disciplina o Direito Público? Enfim, a Ciência do Direito e a Teoria da Sociedade, entre estas duas fenomenologias como se posiciona o Jurídico? Aqui o desafio para a construção de um Direito Público moderno. A proposição da obra Jornada de Direito Público é saber quanto há de Jurídico no Direito Público, é saber quanto há de cientificidade no Direito Público. A reunião de textos que compõem a obra expressa esta preocupação através da linguagem produzida para interpretar o momento atual do Direito Público na juridicidade nacional.
Os escritos da Jornada de Direito Público empregam uma linguagem que
objetiva a construção de um espaço de investigação científica acerca da potência do Direito Público em organizar toda a complexidade das relações sociais por meio de estruturas normativas infraconstitucionais, constitucionais e internacionais, e seu reconhecimento garantido por intermediação da decisão judicial. Não se encontram, por ora, outras expressões, outras palavras que possam traduzir o sentido jurídico da obra Jornada de Direito Público. A Revista Científica e a Editora A Barriguda têm o orgulho de ofertar ao público jurídico uma obra que surge com a proposta de fornecer um relevante contributo para o fortalecimento do culturalismo jurídico brasileiro. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Objetiva-se, portanto, que a presente obra (reunião de textos jurídico-científicos) de natureza do Direito Público consiga sua expansão aos mais distantes territórios de leitura crítica, estudos renovadores e pesquisas jurídicas moduladoras de civilidade. Luciano Nascimento Silva Editor-chefe da Revista Científica A Barriguda Professor UEPB/UFPB
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APRESENTAÇÃO A I Jornada de Direito Público foi uma iniciativa da Revista Jurídica e Cultural A Barriguda para promover a discussão sobre temáticas atuais do Direito, em particular do Direito Público, em um viés inter e transdisciplinar. Durante os dias 20 e 21 de março de 2013, estudantes e profissionais se reuniram no auditório da Justiça Federal - subseção de Campina Grande-PB, para debater sobre diversos assuntos, em especial, as reformas do Código Penal e Código de Processo Civil, problemas relativos à preservação da Caatinga, improbidade administrativa, pacto federativo, hermenêutica constitucional, tráfico de pessoas, incentivo a produção cultural, entre outros, buscando a integração de pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento para concretizar o intercâmbio científico e cultural de saberes. Para concretização do evento supracitado foi imprescindível a parceria com o Centro de Ensino Superior e Desenvolvimento – CESED/FACISA e com a Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional da Paraíba que contribuíram com seu apoio institucional além do patrocínio. Também tiveram relevante participação no sucesso da I Jornada Paraibana de Direito Público o Centro de Ciências Jurídicas da UEPB, o Centro Acadêmico Sobral Pinto e o Diretório Acadêmico Paulo Lopo Saraiva. Todas essas entidades, através dos seus representantes, juntamente com a Associação da Revista Eletrônica A Barriguda, proporcionaram um amplo debate jurídico em Campina Grande, assim como, a apresentação de artigos científicos orientados por professores universitários, os quais compõem esta obra juntamente com os demais artigos de professores e bacharéis membros da comissão científica e organizadora do evento. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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A edição desta obra consolida o trabalho árduo de toda a equipe organizadora em prol da realização do evento e publicação deste livro com os melhores artigos apresentados durante a sua primeira edição, além dos artigos elaborados pelos conferencistas, razão pela qual a excelência do seu conteúdo constitui uma forma singular de pesquisa e atualização aos estudantes e profissionais da área jurídica e afins. Nossos sinceros agradecimentos a toda equipe organizadora do evento: Camilo de Lélis Diniz de Farias Esther Maria Barros de Albuquerque Fábio Rolim Peixoto Flávio André Alves Britto Fernanda Rocha Torres Jéssica Priscila Santana Cavalcante José Flor de Medeiros Júnior
Jurandi Ferreira Neto Maria Izabel Alves Santos Nájila Medeiros Bezerra Paulenir Alves Pessoa de Andrade Thais Viana Diniz Tess Carvalho Mendes Vinícius Leão de Castro
Ao leitor, fica o convite para acessar os endereços www.abarriguda.org.br e www.ojs.abarriguda.org.br. Nesses canais estão disponíveis para download gratuito o conteúdo dos livros digitais e artigos científicos publicados pela revista.
Felix Araújo Neto Editor da Revista Científica A Barriguda Professor da UEPB/FACISA Laryssa Mayara Alves de Almeida Editora da Revista Científica A Barriguda Diretor Presidente da Associação do CIPED
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A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER E A PERCEPÇÃO SOCIAL QUANTO À LEI MARIA DA PENHA NO CONTEXTO DO MUNICÍPIO DE CAMPINA GRANDE – PB Félix Araújo Neto1 Kamylla da Silva Bezerra2
Sumário: 1 Introdução. 2 Metodologia. 3. Resultados obtidos. 4 Conclusão. Referências.
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INTRODUÇÃO
A violência doméstica contra a mulher, fenômeno social que acarreta inúmeros malefícios à saúde, desenvolvimento e sociabilidade das mulheres, vem chamando a atenção de estudiosos e pessoas competentes pelo desenvolvimento das políticas públicas brasileiras. Tratando-se, como se disse, de um fenômeno social, porém acrescentamos o fato de que o mesmo não se apresenta de forma simples, visto ser construído dentro de uma complexidade, percebida ao aferimos à apenas um fato (a violência) aspectos de diferenciadas áreas de estudo (ciências humanas, sociais aplicadas e da saúde). É válido ressaltar que apesar do aumento de interesse da sociedade no tema, o índice da violência doméstica contra a mulher não tem diminuído. A caráter exemplificativo pode-se citar os resultados da pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo em parceria com o Serviço Social do Comércio, em 2011, que inferem que a cada dois minutos, cinco mulheres são agredidas no Brasil. Ademais, de cada dez mulheres brasileiras, quatro já foram vítimas de violência doméstica, segundo o “Anuário das Mulheres brasileiras” divulgado pela Secretaria de Políticas para Mulheres do Governo Federal junto ao Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos, do ano de 2011. Ademais, em tese, é incontroverso que a região nordeste do Brasil ainda apresenta uma formação social gestada pelo signo do patriarcalismo, com atitudes e costumes contaminados de machismo e preconceito, fazendo com que o passionalismo assuma posição de destaque e justificativa nos episódios de violência contra as mulheres, o que acarreta o elevado índice de ocorrência de violência doméstica contra o gênero feminino na região 1
Doutor em Direito Penal e Política Criminal pela Universidade de Granada, Espanha (Título revalidado pela UERJ). Professor da Universidade Estadual da Paraíba e Facisa. E-mail: felixaraujoneto@hotmail.com 2 Pesquisadora – PIBIC. Acadêmica do Curso de Direito da Universidade Estadual da Paraíba. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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(Sharaiber, et. All. 2007). Da mesma forma, no que tange ao Estado paraibano, de acordo com o Ministério Público da Paraíba (MPPB), mais de 1,3 mil denúncias de violência doméstica contra mulheres foram oferecias entre dezembro de 2011 e janeiro de 2012. Deste modo, ainda segundo o MPPB, a cada seis horas, uma ação penal contra agressores de mulheres foi instaurada no período supracitado. Nesta linha de pensamento, sendo a violência contra a mulher um problema da sociedade, e a violência do tipo doméstica a de maior incidência, é de suma importância o estudo e a análise de suas causas e consequências as a curto e longo prazo em localidades gerais e específicas, com a finalidade de subsidiar o objetivo da extirpação deste mal da sociedade. Seguindo o mesmo sentido, é declarado pela ONU que “a Conferência Mundial de Direitos Humanos e as Nações Unidas sublinha a importância de estudar e eliminar as situações de violência contra a mulher”. Por outro lado, tem-se que a temática da violência contra a mulher vem sendo estudada, ao longo do tempo, a partir de uma perspectiva feminista. A história do feminismo, por sua vez, abarca uma série de teorias que apontam sua herança filosófica comum no liberalismo do séc. XIX. Na perspectiva de Nye (1995) podemos destacar algumas das teorias feministas mais importantes a nível histórico e que explicam, por si só, a evolução deste movimento durante as revoluções e modificações sociais. A saber, temos os chamados: feminismo liberal; feminismo marxista; feminismo existencialista e; finalmente, o feminismo estruturalista. Na primeira grande onda de feminismo do séc. XIX a principal questão discutida era o voto livre para as mulheres, caracterizando o feminismo liberal. Logo após, com o advento do feminismo marxista, acreditava-se que o antídoto da opressão feminina não estava no voto ou nas leis, mas na organização de trabalhadores. As mulheres deveriam trabalhar para destruir as estruturas capitalistas que fomentavam a exploração de uma classe por outra. Já o feminismo existencialista, tendo como principal propulsora Simone de Beauvoir (1945), acreditava que luta de classe não é por si explicativa, pelo contrário, a apropriação masculina da propriedade privada só é inteligível como projeto do indivíduo de autoafirmação e transcendência. Já o feminismo estruturalista assevera que não é a “natureza” ou qualquer realidade física que determinaria a posição inferior das mulheres, mas uma diferença de “pensamento”, como afirmava Lacan (1982), acrescentando que a única diferença real entre os indivíduos de sexo distinto era que “as mulheres não sabem o que estão dizendo” (LACAN, 1982). Tal fato se justifica pela existência de componentes semânticos de CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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dominância masculinizados nas palavras, fazendo com que a inferioridade das mulheres seja codificada na linguagem utilizada na sociedade. Ainda dentro da seara feminista, dois conceitos se fazem de extrema relevância por sua intensa utilização: patriarcado e gênero. A respeito do patriarcado, diz-se que as relações entre os gêneros feminino e masculino são desiguais e hierárquicas, emitindo uma ordem que configura a opressão do feminino (SAFIOTTI, 2004). Essas desigualdades e hierarquias são explicadas com base nas diferenças físicas, sexuais e biológicas apresentadas entre homens e mulheres. A construção sociocultural da identidade feminina e a definição dos seus papéis como figura passiva e submissa cria o espaço propício para o exercício da opressão masculina. Além disso, o patriarcado concede direitos sexuais sobre as mulheres aos homens, fazendo parte de um poder que tem por base a ideologia e a violência. Gênero, por sua vez, é um conceito mais vasto do que o de patriarcado, não se resumindo a uma única categoria de análise. Assim, diz respeito a uma categoria histórica, podendo ser concebido em várias instâncias: como aparelho semiótico (LAURETIS, 1987); como símbolos culturais de interpretação de significados, organizações e instituições sociais, identidade subjetiva (SCOTT, 1988); como divisões e atribuições assimétricas de características e potencialidades (FLAX, 1987); como gramática sexual, regulando também relações homem-homem e mulhermulher (SAFIOTTI, 1992). Cada estudioso enfatiza um determinado aspecto do gênero, mas o consenso é de que este conceito representa a construção social do masculino e do feminino (SAFIOTTI, 2004). No que tange especificamente à violência doméstica contra a mulher, tema desta pesquisa, foram utilizados os ensinamentos de Heleieth Saffioti como embasamento teórico. Saffioti (2004) recusa o uso exclusivo do conceito de gênero para trabalhar as questões femininas. Para a autora, tal conceito, que representa a construção social do feminino e do masculino, não explicita, necessariamente, desigualdade entre homens e mulheres, devendo ser diretamente relacionado ao conceito de patriarcado, que fundamenta a completude da análise. Assim, deve-se trabalhar considerando a história como um processo, e se admitir a utilização do conceito de gênero para toda a história, como categoria geral, e o conceito de patriarcado como categoria específica de determinado período da humanidade (LERNER, 1986; JOHNSON, 1997; SAFIOTTI, 2004). Assim, em geral, acredita-se que pode ter havido primazia masculina no passado, significando que as desigualdades atuais entre homens e mulheres são resquícios de um patriarcado não mais existente ou em seus últimos suspiros. Além disso, Saffioti (2004) CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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preceitua que o patriarcado também está em constante transformação, visto que se antes, na Roma antiga, por exemplo, o patriarca detinha poder de vida e morte sobre sua esposa e filhos, hoje tal poder não mais existe. No entanto, homens continuam matando suas parceiras, ao passo que o julgamento desses criminosos sofre influência do sexismo reinante na sociedade, acabando a vítima sendo vista, não raras vezes, como a culpada. Fora isto, tomando como base os estudos acerca da violência doméstica contra a mulher, foram utilizados conceitos sociológicos e jurídicos que se relacionam a esta problemática e que merecem atenção para que possamos dirimir possíveis equívocos que venham a ocorrer durante a empreitada científica que segue. Assim, segundo Minayo (2006), a violência não é uma, mas múltipla. Seu vocábulo possui origem latina e vem da palavra vis, que quer dizer força e se refere às noções de constrangimento e de uso da superioridade física sobre o outro. Ainda segundo a autora, quem analisa os eventos violentos descobre que eles se referem a conflitos de autoridade, à lutas de poder e à vontade de domínio, de posse e de aniquilamento do outro ou de seus bens. Destarte, quanto ao tema da violência contra a mulher se faz necessário atentar para a distinção dos conceitos: violência contra a mulher e violência doméstica. Saffioti (2004) comete a imprecisão de tratar esses conceitos como sinônimos, sendo que é inegável que tratam de objetos relacionados entre si, sendo, entretanto, distintos. Assim, Bianchini (2013) trata a violência contra a mulher como violência de gênero, ou seja, aquela ligada ao papel social imposto pela sociedade ao feminino e ao masculino. Da mesma forma, segundo Teles & Melo (2002), a violência de gênero representa uma relação de poder de dominação do masculino e de submissão do feminino. Violência doméstica, por sua vez, representa o âmbito protegido pela Lei 11.340/2006, ocorrendo em contextos específicos. Assim, a violência do tipo doméstica é aquele que ocorre em âmbito doméstico, representado pelo domicílio; familiar; ou em relação íntima de afeto. Bianchini (2013) afirma que há certa vulnerabilidade da mulher no lar, visto sua maior exposição ao agressor e a distância das vistas do poder público. Acrescenta, ainda, que a violência contra a mulher ocorre predominantemente no lar, notadamente praticada por maridos e companheiros, aumentando, assim, o fator de risco, pois o agressor possui enorme proximidade com a vítima. Assim, é de suma importância que existam instrumentos legais como a Lei 11.340/2006 que visem o combate à esta forma inaceitável de subjugação. Sumariamente pode-se dizer que a violência doméstica é aquela que é perpetrada em ambiente doméstico, familiar ou de intimidade de afeto; enquanto, violência de gênero CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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significa aquela perpetrada em razão do gênero feminino, em ambiente doméstico ou não. Apesar de apresentarem distinções, a Lei Maria da Penha se utilizou das duas formas de violência para caracterizar a sua incidência jurídica, prevendo em seu art. 5º que “configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. Assim, se esclarece que para que a aplicação da Lei Maria da Penha seja possível é necessário que a violência perpetrada contra a mulher tenha ocorrido em âmbito de violência doméstica, e ainda que tenha por base a questão de gênero. Por este e outros motivos se faz tão importante o estudo das relações entre as teorias de gênero e o direito. Outra peculiaridade inerente às inovações trazidas pela Lei 11.340/2006 diz respeito à previsão das formas de violência doméstica contra a mulher. Os incisos do art. 5º da referida lei traz cinco formas de violência doméstica contra a mulher que são meramente exemplificativas: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. Por violência física entende-se toda e qualquer conduta que ofenda a integridade física ou saúde corporal da mulher, com uso da força, podendo abranger “socos, tapas, pontapés, empurrões, arremesso de objetos, queimaduras, etc., deixando marcas ou não, sendo denominada, tradicionalmente, como “vis corpolis” (CUNHA & PINTO, 2011). A violência psicológica é entendida como qualquer conduta que cause dano emocional e diminuição da autoestima, que prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar ações, comportamentos, crenças e decisões. Poderá ocorrer mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir, ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação. Quanto à violência sexual, refere-se às condutas praticadas mediante a) intimidação; b) ameaça; c) coração ou; d) uso da força, que constranja a mulher à presenciar, manter ou participar de relação sexual não desejada. Da mesma forma são consideradas violência sexual condutas praticadas mediante a) coação; b) chantagem; c) suborno ou; d) manipulação, que induza a mulher a comercializar ou utilizar de qualquer modo sua sexualidade; a impeça de usar métodos contraceptivos; que lhe force ao matrimonio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição. Por fim, também são formas de violência sexual qualquer conduta que limite ou anule o exercício dos direitos sexuais e reprodutivos da mulher. Os direitos sexuais dizem CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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respeito à livre exploração da orientação sexual, e os direitos reprodutivos levam em conta conceitos de natalidade. Constitui violência patrimonial contra a mulher toda conduta que configure retenção, subtração ou destruição dos objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores, direitos ou recursos econômicos da vítima. A violência moral é entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. A calúnia, segundo Greco (2010), é o mais grave de todos os crimes contra a honra previstos pelo vigente Código Penal brasileiro, ocorrendo com o ato de imputar falsamente a alguém fato definido como crime. Por outro lado, a difamação se caracteriza com a imputação de fato ofensivo à reputação de outrem. Já a injúria se dá com ofensa da dignidade ou decoro da vítima. Por outro lado, cumpre acrescentar que violência doméstica contra a mulher, é considerada como uma afronta à dignidade da pessoa humana (princípio suprajurídico), devendo ser combatida e eliminada do seio social. Nesse diapasão, o direito deve adentrar nesta problemática atuando tanto de forma que possa resolver conflitos, quanto evitando que ocorram, ou seja, prevenindo-os. E é nesse sentido que se preceitua os ordenamentos da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, concluída em 9 de Julho de 1994, em Belém do Pará, e posteriormente assinada pelo Estado brasileiro. Dessa forma, acreditando que não basta que os direitos sejam assegurados formalmente, Pandolfi (1999) afirma que é necessário que a população conheça, reconheça e possa usufruir dos seus direitos. E é exatamente nesse critério que entra o estudo das percepções e representações sociais, atuando sempre no sentido de identificar a analisar a caracterização do entendimento da sociedade sobre determinados fatos, atos, normas e preceitos. Nesse sentido, Abdala et all (2011) ressalta que a falta de informação por parte da mulher em relação à Lei Maria da Penha acaba por deixá-la vulnerável a sofrer interferências em suas decisões no momento da denúncia de alguma forma de agressão. O direito, então, deverá se preocupar não só com o aspecto normativo de sua ciência, mas também com seu aspecto social, psicológico, antropológico, entre outros, visando sempre compreender a complexidade desses sistemas aleatórios que findam por se encontrar e se fundir nos fatos sociais e que são, por si só, objetos da ciência jurídica.
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Deste modo, esta pesquisa tem como escopo analisar a distribuição espacial das diferentes formas de violência doméstica contra a mulher denunciadas e a percepção social quanto a Lei nº 11.340 de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha) no contexto da cidade de Campina Grande – PB, no intuito aparelhar a busca de possíveis medidas que possam vir a auxiliar na luta contra este mal.
2
METODOLOGIA
Tendo em vista os objetivos propostos e a necessidade de triangular diferentes impressões para o desenvolvimento desta pesquisa, foi necessário realizar os seguintes procedimentos metodológicos: a) coleta de dados referentes à denunciação da violência doméstica contra mulher no município de Campina Grande – PB; b) mapeamento de dados em ambiente de Sistemas de Informações Geográficas (SIGs); c) aplicação de questionários nos bairros que apresentaram maior e menor incidência do tipo de violência analisada e; d) análise de conteúdo dos dados coletados. No que tange à coleta de dados referentes à realização de denúncias de violência doméstica contra mulher, esta foi possibilitada na Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher do Município, durante um período correspondente a três meses. Na totalidade foram analisados 901 inquéritos policiais referentes aos anos de 2010 e 2011, dos quais se extraíram dados relacionados às formas de violência doméstica perpetradas (física, psicológica, sexual, patrimonial, moral) e a localidade de ocorrência (bairro) da mesma. Neste processo, paulatinamente foi desenvolvido um banco de dados com as informações supracitadas, com o objetivo de organizar os elementos condizentes à pesquisa. Outro fator que exigiu a formulação e agrupamento destes dados foi a necessidade de vinculálos a um SIG para que, posteriormente, fosse possível a espacialização dos índices de denunciação da violência doméstica contra mulher em Campina Grande-PB. É imperioso ressaltar que para organização dos dados foram consideradas as informações relativas à quantificação das formas de violência doméstica contra a mulher que se apresentavam nas ocorrências registradas nos autos dos inquéritos policiais estudados. Em outras palavras pode-se dizer que ao identificar as informações relevantes para esta pesquisa, verificou-se que na maioria dos casos, em uma só ocorrência registrada havia a incidência de diversas formas de violência previstas em lei, sendo, assim, exceção os casos em que se perpetuava contra a mulher apenas uma forma de violência doméstica por agressão. Assim, CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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em suma, para a elaboração dos mapas que representavam a incidência deste tipo de violência em Campina Grande – PB, foi considerado não o número de queixas prestadas durante o lapso temporal estudado, mas o número de formas de violência doméstica contra a mulher (física, psicológica, sexual, patrimonial e moral) incididos em cada bairro. Uma vez instituído o banco de dados e os mapas da incidência e formas de violência doméstica contra mulher, foi viabilizada a aplicação de questionários nos bairros que apresentaram maiores e menores índices de denunciação. Sendo assim, a partir dos resultados foram selecionados os bairros Catolé e Distrito dos Mecânicos, representando maior e menor incidência, respectivamente. Na sequência, foi necessário efetivar uma análise estatística para justificar a amostragem dos dois bairros correspondentes. Para isto, foi utilizada a amostra não probabilística por quotas, que sugere que se as pessoas são representativas em termos de características, elas também poderão ser representativas em termos das informações procuradas em determinada pesquisa (COCHRAN, 1965). Assim, a amostra por quotas constitui um tipo especial de amostra intencional (MATTAR, 1996; AAKER, et all, 1995; KINNEAR & TAYLOR, 1979), em que o pesquisador procura obter uma amostra que seja similar à população sob algum aspecto. Neste caso, são consideradas várias características da população, sendo as variáveis mais comuns: áreas geográficas, sexo, idade, raça e uma medida qualquer de nível econômico (COCHRAN, 1965). Em suma, a amostra pretende incluir proporções similares de pessoas com as mesmas características. Dessa forma, para fins desta pesquisa foram vislumbradas as seguintes características como quota para aplicação do questionário: individuo do sexo feminino, maior de 14 anos e que convivam nos bairros a serem estudados. Assim, segundo dados do IBGE, a população feminina do bairro do Catolé é constituída por 11.123 (onze mil cento e vinte e três) indivíduos, enquanto que no Distrito dos Mecânicos temos X mulheres. Dessa forma, utilizando-se de uma margem de erro de 10%, foram aplicados 100 (cem) e 81 (oitenta e um) questionários nos bairros Catolé e Bairro das Nações, respectivamente. Finalmente, quanto ao procedimento de análise das informações pertinentes aos questionários utilizou-se a análise de conteúdo. Esta, de acordo com Franco (2008) se caracteriza a partir de uma organização interpretativa de dados e informações de determinados itens que se queira observar através de categorias de análise. Logo, através destas indicações metodológicas foram estruturados os itens de observação a partir do conteúdo dos próprios questionários. Nesta etapa procurou-se também identificar os diferentes níveis que CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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determinado aspecto se manifestou nos dois bairros dos quais se desenvolveram as análises comparativas.
3.
RESULTADOS OBTIDOS
Inicialmente, a partir de uma análise geral dos dados referentes à denunciação de violência doméstica contra mulher nos bairros de Campina Grande – PB, chegou-se a primeira conjuntura espacial desta problemática. Assim, o mapeamento da distribuição espacial das diferentes formas de violência doméstica contra mulher surge como uma maneira de observação de como este problema é condicionado no Município sem, no entanto, levar em consideração os índices de qual forma desta violência é mais preponderante em cada bairro correspondente, mas apenas uma incidência geral (Mapa 01).
Mapa 01: Distribuição espacial da violência doméstica contra mulher em Campina Grande – PB
Assim, percebe-se que pode ser destacada a existência de disparidades quanto à ocorrência de queixas nos diferentes bairros do Município. A maioria destes (30) apresentaram incidência variante entre 0 e 20 casos registrados. Na sequência, destacaram-se os bairros com percentual de 41 a 60 casos, enquanto as porcentagens referentes ao índice de CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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21 a 40 e 61 a 80 foram observadas, ambas, em três localidades distintas. Por fim, três bairros apresentaram estatísticas variantes entre 81 e 118 casos. Os bairros que mais se destacaram em termos de incidência de queixas foram Catolé, Malvinas e Bodocongó, com 118, 103 e 93 casos, respectivamente. Já os bairros com menores ocorrências registradas correspondem ao Distrito dos Mecânicos, Bairro das Nações e Jardim Tavares. Este resultado inicial atrela-se a uma análise da qual só é possível avaliar o número total de queixas relativas às diferentes formas de violência doméstica contra mulher. Entretanto, mesmo identificado os bairros em termos quantitativos de queixas de violência doméstica, têm-se a necessidade de indicar as diferentes impressões acerca desta problemática, o que ocorre, principalmente, para possibilitar a identificação, interpretação e discussão dos aspectos característicos deste cenário em Campina Grande – PB. Assim, podem ser apresentadas outras cinco espacializações que são relativas ao número total de violência incidida quanto à sua forma: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral.
Mapa 2: As formas de perpetuação da violência doméstica contra a mulher no município de Campina Grande – PB:
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Relacionando-se especificamente a violência física, destacam-se os bairros Catolé e Liberdade. No que tange à violência psicológica, observa-se novamente a ênfase no bairro Catolé, além de Bodocongó e Malvinas. Já a violência sexual só foi ressaltada no Alto Branco, enquanto a patrimonial novamente no Catolé e Malvinas. Por fim, o maior percentual de violência moral se refere ao Catolé, Liberdade, Bodocongó, Jardim Paulistano e Malvinas. Neste contexto, verifica-se a sobreposição do bairro Catolé com relação às quatro formas de violência citadas, o que também foi substancial para sua escolha na fase de aplicação dos questionários. Outra discussão que pode estar presente nesta perspectiva é o fato de que os bairros que foram indicados como os mais incidentes em queixa de violência doméstica contra mulher, apresentam a violência psicológica como a mais recorrente, além de serem dotados de níveis socioeconômicos elevados, o que ressalta o pressuposto que relaciona as condições sociais como um aspecto que interfere na percepção social quanto a Lei, e consequentemente nos índices de denunciação do tipo de violência estudado.
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Decorrida a fase inicial desta pesquisa, que correspondeu ao mapeamento das ocorrências de queixas acerca da violência doméstica contra a mulher no município de Campina Grande – PB, passou-se a identificação e análise da percepção social quanto à Lei Maria da Penha, assim como dos propulsores e inibidores do tipo de violência estudado. Primeiramente, foram identificados os bairros que apresentam maior e menor índice de incidência das variadas formas de violência doméstica contra mulher previstas em lei, para que fosse possível a aplicação dos questionários. Em suma, como se sabe, o bairro Catolé apresentou maior índice de denunciação das variadas formas de violência doméstica contra a mulher, com uma incidência de 118 (cento de dezoito) casos. Dessa forma, tomando-se por base que a população feminina deste bairro corresponde a 11.123 mulheres, e utilizando-se da amostragem não probabilística juntamente com um índice de erro de 10%, chegou-se à amostra de que 100 mulheres deveriam responder ao questionário desenvolvido por esta pesquisa. No que tange ao bairro Distrito dos Mecânicos, temos que este apresentou o menor índice de denunciação do tipo de violência estudado, concretizando-se na realização de uma queixa e uma forma de perpetuação da violência doméstica contra a mulher (moral) durante os anos de 2010 e 2011. Assim, sabendo-se que, segundo dados do IBGE a população feminina deste bairro corresponde à X mulheres, e utilizando-se do mesmo procedimento descrito quanto ao bairro Catolé, chegou-se a amostragem de que 81 mulheres deveriam responder ao questionário referente à percepção social quanto à Lei Maria da Penha e a violência doméstica contra a mulher. Outrossim, a partir dos ensinamentos de Franco (2008) e da análise de conteúdo dos questionários aplicados com as populações identificadas, foi possível chegar aos seguinte resultados:
Quadro 01: Análise de conteúdo dos questionários acerca da percepção da comunidade quanto a Lei Maria da Penha
Bairros Categorias de análise acerca da percepção da comunidade feminina acerca da Lei Maria da Penha
Catolé
Distrito dos Mecânicos
Auto-reconhecimento quanto ao entendimento sobre a Lei Maria da Penha
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Lei Maria da Penha como um instrumento de proteção às mulheres vítimas violência física praticada apenas por homens. Lei Maria da Penha como um aparato preventivo e assistencial à vítima feminina de violência doméstica Reconhecimento das variadas formas de violência doméstica contra mulher (física, psicológica, sexual, moral, patrimonial e outras) Conhecimento dos direitos assegurados à vítima de violência doméstica contra mulher. Percepção de que podem ser aplicadas medidas de assistência social ao agressor (programas de recuperação e reeducação). Crença de que podem ser aplicadas medidas brandas ao agressor, como o pagamento de cestas básicas. Reconhecimento de que filho, irmão, pai, padrasto e outros indivíduos que convivam em relação doméstica, familiar ou de afeto íntimo podem configurar o pólo ativo nos casos de violência doméstica contra a mulher. Reconhecimento da incidência da Lei Maria da Penha em casos de agressão no seio de relação homoafetiva entre mulheres.
Na busca pela caracterização do grau de conhecimento e percepção social quanto à Lei Maria da Penha, observa-se uma diferenciação que contempla, ao mesmo tempo, determinados níveis de informações referentes à Lei e aos bairros que foram destacados como menor e maior incidência de denunciação. O bairro Catolé, onde as queixas foram mais recorrentes, apresentou um elevado nível de auto-conhecimento sobre a Lei Maria da Penha e de entendimento quanto aos âmbitos de incidência violência doméstica contra a mulher (doméstica, familiar, relação íntima de afeto), relacionando os pólos ativo e passivo, enquanto que no Distrito dos Mecânicos, houve a representação de nível médio para os mesmos itens. Igualmente, no que tange ao conhecimento social quanto aos direito inerentes e assegurados à vítima de violência doméstica, Catolé apresenta grau alto, enquanto, Distrito dos Mecânicos aparece em nivelamento baixo quanto a esta caracterização. No que tange especificamente à percepção que as duas populações têm acerca da Lei Maria da Penha, para o bairro Catolé surge o acepção de que a referida lei se constitui em um aparato preventivo e assistencial à vítima feminina de violência doméstica (nivelamento médio), enquanto que para a comunidade feminina do bairro Distrito dos Mecânicos a mesma emerge como um instrumento de proteção às mulheres vítima de violência física praticada apenas por homens (nivelamento médio). Quanto ao reconhecimento das comunidades femininas dos bairros estudados no que diz respeito às variadas formas de violência doméstica contra a mulher e ao entendimento de que a Lei Maria da Penha pode incidir em casos de agressão entre mulheres homoafetivas,
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temos para o bairro Catolé níveis de percepção altos, enquanto que no Distrito dos Mecânicos os mesmos se apresentaram de forma baixa. Por fim, o último item analisado nesta etapa diz respeito aos questionamentos que relacionavam a situação do agressor quanto à Lei 11.340/2006, e foi possível a identificação de nível médio no que tange à identificação das mulheres da comunidade do bairro Catolé acerca da possibilidade de aplicação de medidas assistenciais, educacionais e de recuperação, enquanto que para os indivíduos femininos do bairro Distrito das Nações o item se apresenta em nível baixo. Da mesma forma, a crença de que podem ser aplicadas medidas brandas ao sujeito ativo na relação de violência doméstica contra a mulher, apresenta-se de forma elevada no Distrito das Nações, enquanto que baixa no Catolé. No que se refere ao último objetivo específico desta pesquisa, investigou-se a identificação dos principais propulsores e inibidores da violência doméstica contra a mulher na percepção das mulheres que vivenciam a realidade social dos dois bairros estudados, foi possível a visualização do seguinte resultado:
Quadro 01: Análise de conteúdo dos questionários acerca da percepção da comunidade quanto aos principais propulsores da violência contra mulher Bairros Itens observados na percepção da população quanto aos fatores propulsores da violência doméstica contra mulher
Catolé
Distrito dos Mecânicos
Não denunciação. Falta de informação. Dependência financeira. Cultura machista. Utilização de drogas psicoativas. Sentimento de impunidade da justiça. Traição conjugal. Rompimento do relacionamento Itens observados na percepção da população quanto aos fatores inibidores da violência doméstica contra mulher Denúncia Políticas públicas de prevenção e combate Aplicação de medidas severas aos agressores Divulgação de informações sobre os direitos das mulheres Maior rigor no cumprimento da Lei Maria da Penha Apoio familiar Maior conhecimento sobre os institutos da Lei Maria da Penha
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Quanto à percepção das mulheres das duas comunidades acerca dos possíveis propulsores da violência doméstica contra a mulher, destacaram-se em grau elevado os seguintes itens: não denunciação, falta de informação, utilização de drogas psicoativas e traição conjugal. No bairro Catolé, os itens dependência financeira e cultura machista aparecem com identificação em grau médio, enquanto que no Distrito dos Mecânicos em grau alto e baixo respectivamente. Com baixo grau de identificação no bairro que apresentou maior índice de denunciação de violência contra a mulher, aparecem os itens referentes ao sentimento de impunidade quanto à justiça e rompimento do relacionamento. Os mesmo itens apresentaram nível médio e baixo, respectivamente, no bairro que apresentou o menor índice. Por outro lado, no que diz respeito aos possíveis fatores inibidores do tipo de violência que é tema desta pesquisa, foi observado que segundo opinião da representação feminina do Catolé, denúncia, políticas públicas de prevenção e combate, divulgação de informações sobre os direitos das mulheres e o maior conhecimento sobre os institutos da Lei Maria da Penha, emergem como os itens de identificação elevada. Quanto à representação do bairro Distrito dos Mecânicos destacamos como de grau elevado os itens: denúncia, aplicação de medidas severas aos agressores e maior conhecimento dos institutos da Lei Maria da Penha. O item relacionado ao maior rigor no cumprimento da Lei Maria da Penha apresenta grau de identificação médio nos dois bairros. Por outro lado, Distrito dos Mecânicos incide que a divulgação de informações sobre os direitos das mulheres e o apoio familiar também se classificam em grau médio quando se busca os coibentes do tipo de violência analisado. O bairro Catolé, por sua vez, entende que a aplicação de mediadas severas aos agressores e o apoio familiar se classificam como importância de grau baixo, enquanto que a parte representativa do Distrito dos Mecânicos concebeu que são as políticas públicas de prevenção e combate que se classificam em grau baixo de importância.
4
CONCLUSÃO
Observa-se que a violência doméstica contra mulher incide de forma diferenciada nos bairros de Campina Grande-PB. Ademais, os bairros Catolé e Distrito dos Mecânicos
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representaram o maior e o menor índice de denunciação quanto à ocorrência deste tipo de violência, respectivamente. No que diz respeito à incidência das formas de violência doméstica contra mulher, constata-se que com relação à violência física destacam-se os bairros Catolé e Liberdade. No que tange à violência psicológica, observa-se novamente a ênfase no bairro Catolé, além de Bodocongó e Malvinas. Já a violência sexual só foi ressaltada no Alto Branco, enquanto a patrimonial novamente no Catolé e Malvinas. Por fim, o maior percentual de violência moral se refere ao Catolé, Liberdade, Bodocongó, Jardim Paulistano e Malvinas. Quanto ao conhecimento e percepção social acerca da Lei Maria da Penha das duas comunidades estudadas percebe-se que a representação feminina do bairro Catolé apresentou uma maior inteligência acerca dos aspectos inerentes à referida Lei ao indicarmos, por exemplos, os resultados com alto nível de identificação dos itens relacionados ao entendimento sobre os diferenciados âmbitos de incidência da violência doméstica e de suas variadas formas de perpetuação; conhecimento dos direito da mulher e a possibilidade de incidência da Lei 11.340/2006 em casos de agressão entre mulheres homoafetivas. Enquanto, por outro lado, no que diz respeito à representação do bairro Distrito dos mecânicos apresentou identificação média e baixa relacionada aos mesmos itens. Em suma, a partir dos resultados que dizem respeito à incidência da denunciação da violência doméstica contra a mulher e à percepção social quanto à Lei Maria da Penha, partese do pressuposto de que um maior entendimento, conhecimento, uma melhor percepção acerca da Lei Maria da Penha e seus institutos refletem nos índices de ocorrência do tipo de violência em estudo, visto que a representação do bairro Catolé apresentou maior denunciação, assim como melhores indicativos referentes à especificação “conhecimento acerca da Lei” do que o bairro Distrito dos Mecânicos. Por fim, quanto à opinião das mulheres das duas comunidades acerca dos possíveis propulsores e inibidores da violência doméstica contra a mulher, destacaram em alto grau de identificação quanto ao primeiro: não denunciação, falta de informação, utilização de drogas psicoativas e traição conjugal. Quanto aos inibidores, as duas representações aferem estes podem se constituir em: denúncia, políticas públicas de prevenção e combate, divulgação de informações sobre os direitos das mulheres e o maior conhecimento sobre os institutos da Lei Maria da Penha.
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MAPEAMENTO DOS IMPACTOS NEGATIVOS E OMISSÃO DO PODER PÚBLICO DO AÇUDE DE BODOCONGÓ NO MUNICÍPIO DE CAMPINA GRANDE – PB Angélica Cardoso Carlos1 Esther Maria Barros de Albuquerque 2 Laryssa Mayara Alves de Almeida3 Sumário: 1 Introdução. 2 Material e Métodos. 2.1 Localização. 2.2 Açude. 2.3 Metodologia. 3 Resultados e Discussão. 3.1 Qualidades da água. 3.2 Resíduos sólidos. 3.3 Usos diversos. 3.4 Complexo industrial. 3.5 Pesca. 3.6 Urbanização. 3.7 Omissão do poder público. 4 Conclusão. Referências.
1.
INTRODUÇÃO
A água é um dos recursos naturais de maior importância, sendo o constituinte principal de todas as formas de vida. Sabe-se que a água possui uma vasta utilização para a sobrevivência da humanidade e de todos os seres vivos, assim como para o desenvolvimento socioeconômico. Entre os principais usos da água destaca-se a irrigação, o abastecimento da água, as indústrias, a geração de energia, e transportes, como a navegação (MORAES e JORDÃO, 2002). Nos últimos anos, o consumo da água aumentou drasticamente, modificando de maneira significativa a sua disponibilidade e qualidade. Em incontáveis atividades, o homem aproveita este recurso natural essencial à vida, que está sendo mal utilizado em várias partes do globo, através do consumo irracional e práticas de poluição que o tornam inadequado ao uso humano. A deterioração dos recursos hídricos é fato influenciado pelo crescimento das áreas urbanas, atividades agrícolas, explosão de atividades industriais e do sistema de transporte, que tornam vulneráveis as fontes de água disponíveis, podendo acarretar problemas de saúde pública, ambiental e socioeconômicos, resultando em prejuízos para a própria humanidade (FREITAS et al., 2001; TOMITA; BEYRUTH, 2002; PRINZ; SINGH, 2003). Segundo Mazzini (2013), dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) aponta que em 2010 o consumo médio de água no Brasil era de 163 litros por habitante/dia. Dados da ONU apontam que o ser humano precisa em média de 110 litros
1
Bióloga. Especialista em Meio Ambiente. E-mail: angelicacardoso.uepb@gmail.com Bióloga. Doutoranda na UFCG. E-mail: esther_barros@hotmail.com 3 Advogada. Especialista. Aluna especial do Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas da UFPB. Email: laryssalmeida@gmail.com 2
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de água por dia para consumo e higiene. O Brasil, no entanto, fica atrás do consumo médio dos Estados Unidos (em torno de 500 litros por pessoa/dia), e Canadá (613 litros por pessoa/dia). Conforme Carvalho (2007), este e outros fatores exercem grandes pressões sobre os recursos hídricos e começam a comprometer a disponibilidade deste, como têm alertado inúmeros cientistas nas diversas regiões do planeta. Desta forma, novas abordagens, novos métodos de conservação e gestão se fazem necessários. No Brasil, a Lei 6938/81 que dispõe sobre a Política Nacional de Meio Ambiente conceitua degradação ambiental como “a alteração adversa das características do meio ambiente”. Esta mesma Lei também define poluição como sendo “a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos”. De acordo com Philippi et al. (2004), o descaso das autoridades quanto à gestão dos resíduos sólidos torna vulnerável a disponibilidade dos recursos hídricos para o homem, na maneira que, a presença de resíduos sólidos interfere na qualidade destes recursos. Diante disso, tem-se o açude de Bodocongó, situado na cidade de Campina Grande e, de acordo com Costa (2011), originalmente criado com o intuito de abastecer a mesma cidade devido à escassez de água na região, uma vez que o Açude Novo e o Açude Velho já não estavam suprindo as necessidades da população. Para a sua criação, o prefeito da época, Cristiano Lauritzen, trouxe da Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas (IFOCS) um engenheiro que instalou no antigo Sítio Ramada o novo açude. Em 1915 se deu início a sua construção, que teve término no dia 15 de janeiro de 1917, sendo entregue à população em 11 de fevereiro do mesmo ano. Inativado para esse fim por sua alta salinidade para o consumo humano, é recentemente alvo de impactos ambientais. O açude de Bodocongó recebe, principalmente, lançamentos de esgotos sem tratamento e de resíduos sólidos pelos moradores próximos às margens. Adicionalmente, estudos mostram que a qualidade da água do açude encontra-se fora dos padrões da qualidade da água determinados pela Resolução CONAMA 357/05 para águas salobras classe um, dois e três (CARVALHO, 2008). Além disso, é considerado um ambiente de usos múltiplos, destacando-se pela recreação, a pesca e a lavagem de roupas e utensílios (DINIZ, 2006). Ressalta-se, ainda, que alimenta o horto florestal, o complexo industrial instalado em seu CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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entorno e, também, é um elemento paisagístico de enorme relevância para os habitantes do município (CARVALHO, 2007). Filho et al. (2012), considera o diagnóstico ambiental um instrumento que permitirá interpretar a realidade das condições naturais de determinado ambiente, apontando os problemas que interferem em sua qualidade. Neste contexto, buscou-se avaliar, por meio de um diagnóstico ambiental, os principais impactos encontrados nas margens do açude de Bodocongó, bem como contribuir com informações sobre a ação do poder público e as possíveis melhorias a ser implantadas na área.
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MATERIAL E MÉTODOS
2.1 Localização
A cidade de Campina Grande é a segunda maior do Estado da Paraíba (Figura 1), localizando-se no trecho mais alto das escarpas orientais do Planalto da Borborema, com altitudes variando entre 500 e 600m, com latitude Sul de 7º13’50” e longitude Oeste de 35º52’52”; apresenta um clima do tipo equatorial semiárido, com temperaturas médias em torno de 25 ºC. Dista 120 km de João Pessoa, Capital do Estado, com uma população estimada em 400.002 habitantes (IBGE, 2014), dos quais a maior parte residindo na área urbana. O município polariza um universo de cinco microrregiões homogêneas perfazendo um total de 23.960 km2 que corresponde a 43% do território paraibano e 40% da população do Estado. Consiste em um dos centros urbanos de maior desenvolvimento tecnológico do Nordeste Brasileiro (PMCG, 2007 apud CARVALHO, 2007). Campina Grande é o segundo município em população e exerce grande influência política e econômica sobre outros 57 municípios do Estado da Paraíba. O município de Campina Grande e sua zona urbana apresentam, respectivamente, áreas de 621 km2 e 98 km2 aproximadamente (SILVA, 2013).
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Figura 1. Localização geográfica da área de estudo
Fonte: Silva, 2013.
2.2 Açude
Como uma das soluções ao problema do abastecimento de água no Nordeste brasileiro, surgiram os açudes. O crescimento na quantidade de açudes no Nordeste, especificamente no semiárido, foram marcadas pelas secas de 1825, 1827 e 1830, perdurando até os dias de hoje, com uma concentração maior nos Estados do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte (MOLLE e CADIER, 1992). O açude de Bodocongó (Figura 2) localizado na cidade de Campina Grande-PB, construído na confluência do rio Bodocongó com o rio Caracóis, entre 1915 e 1917, teve seu objetivo de abastecimento doméstico para a região desviado, devido à alta concentração de sais (CARVALHO, 2007). O município pertence ao domínio da bacia hidrográfica do Rio Paraíba, na qual um dos seus afluentes é o riacho Bodocongó, e onde se encontra o açude (FILHO et al., 2012), com uma área de 371.897 m2, perímetro de 3.877m e volume 873.308 m3 (DINIZ, 2006). O açude de Bodocongó tornou-se um fator determinante para o surgimento de um novo bairro e do complexo industrial no seu entorno. Em 1930 emergem em suas margens o curtume Vilarim, a fábrica têxtil de Bodocongó, o matadouro e todo o bairro de Bodocongó. Atualmente, encontram-se ao redor do açude os bairros: Bodocongó e Novo Bodocongó (Vila dos Teimosos) e, o complexo industrial com empresas que dependem, exclusivamente, do açude para abastecimento de água, dentre estas a indústria de reciclagem de papel (CARVALHO, 2007).
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Figura 2. Mapa de localização do munícipio de Campina Grande-PB, com destaque no açude de Bodocongó
Fonte: IBGE; Google Earth, acesso em 20 de jan. de 2014
2.3 Metodologia
Para a identificação e sintetização qualitativa dos impactos negativos no meio ambiente, ocorridos nas margens do açude de Bodocongó, no município de Campina Grande/PB, utilizou-se o método de listagem descritiva (check-list), utilizada em estudos de avaliações de impactos ambientais. Por se adequar ao objetivo do trabalho, esse método, de acordo com Carvalho e Lima (2010), consiste na identificação e enumeração dos impactos a partir da diagnose ambiental feita por especialistas, categorizando-os em positivos ou negativos, conforme o tipo da modificação antrópica no sistema analisado. Esta metodologia, conforme La Rovere (2001), apesar de constituir uma forma concisa e organizada de relacionar os impactos, é um método por demais simples e estático, que não evidencia as inter-relações entre os fatores ambientais. Apresentam como vantagem o emprego imediato na avaliação qualitativa dos impactos mais relevantes, sendo adequados somente para avaliações preliminares (COSTA, 2005). A partir de visitas in loco, realizadas no mês de Janeiro de 2014, com o objetivo de identificar e diagnosticar os principais problemas advindos das ações antrópicas e da omissão CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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do Poder Público, foram listadas através de registros fotográficos do local os principais impactos ambientais ocorridos ao redor do açude de Bodocongó.
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RESULTADOS E DISCUSSÃO
Verificou-se uma diversidade de impactos ambientais ocorridos nas margens do açude de Bogocongó, dentre eles:
3.1 Qualidade da água
Na caracterização da qualidade da água de um sistema, é necessário uma definição rigorosa dos usos a que este está submetido (KLING, 2005). Nos dias de hoje é comum que os grandes problemas relacionados a poluição da água aconteçam por má utilização deste recurso, enfocando a presença de resíduos sólidos solúveis, como descaso pela comunidade e o Poder Público. Portanto, ambientes submetidos a impactos causados por atividades antrópicas constantes, normalmente estão entre aqueles de maiores necessidades de acompanhamento (KLING, 2005), que deve dedicar uma atenção especial, principalmente, ao processo de eutrofização que é comum em reservatórios de água urbano, como açudes. O processo de eutrofização é resultado do enriquecimento de nutrientes em consequência de atividades humanas (AGOSTINHO, 2012). A grande presença de resíduos sólidos solúveis totais incorporados na água do açude reduzem a quantidade de oxigênio, contribuindo para a invasão de plantas macrófitas, resultando na diminuição da biodiversidade local (FILHO, 2012). O açude de Bodocongó tem um histórico de utilização intensiva, principalmente com o crescimento urbano em seu contorno, tornando o processo de eutrofização um dos principais problemas de gerenciamento da qualidade de suas águas (Figura 3). Figura 3. Poluição nas águas do açude de Bodocongó. Fonte: Elaborada pelas autoras.
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3.2 Resíduos sólidos
Resíduos sólidos são todos os materiais que não fazendo falta ao seu detentor, este se queira desfazer. Compreende resíduos resultantes da atividade humana e animal, normalmente sólidos, sem utilização ou indesejáveis pelo seu detentor, no entanto com capacidade de valorização (RUSSO, 2003). A rápida e desordenada urbanização nas margens do açude de Bodocongó reflete em um processo de degradação ambiental. A presença de resíduos sólidos, dispostos inadequadamente nas margens ou diretamente no açude, a carência de serviços de saneamento adequado, que incluem a coleta de lixo e o tratamento de esgotos domiciliares e industriais, comprometem a saúde dos ecossistemas e a qualidade de vida dos moradores da região. Segundo Dias e Filho (2008), tem-se prevalecido o entendimento de que cabe apenas ao Poder Público, principalmente municipal, a destinação adequada dos resíduos sólidos produzidos em seu território, tanto que existem centenas de ações judiciais visando compelir os municípios a implantar programas de coleta seletiva ou a construir aterros sanitários, usinas de reciclagem e compostagem, incineradores, tudo para destinar resíduos sólidos sem causar dano ao meio ambiente.
3.3 Usos diversos
Em se tratando dos diversos usos da água do açude para os moradores do entorno é comum observar o uso para lazer e recreação, como a prática de banhos (Figura 4). Tal situação submete a população a múltiplos riscos, comprometendo a sua saúde. Além disso, a água do açude é usada para a lavagem de carros e caminhões (Figura 5), o que agrava ainda mais a poluição do açude de Bodocongó. Conforme Silva et al. (2011), a prática de lavagem de veículos no açude ocorre há cerca de 5 anos. Em média, são lavados seis caminhões diariamente e nos finais de semana existe um aumento. Os lavadores, desconhecendo a contaminação que estão provocando, derramam o óleo provindo dos caminhões no solo das margens do açude e utilizam sabão para a lavagem. Por ser uma atividade extremamente poluidora é exigido um licenciamento ambiental para exercer essa função (Filho et al, 2012).
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Figura 4. Prática de banhos no açude de Bodocongó. Fonte: Elaborada pela autora.
Figura 5. Lavagem de caminhões às margens do açude de Bodocongó. Fonte: Elaborada pela autora.
3.4 Complexo Industrial
A poluição industrial constitui-se de poderosos coquetéis químicos com alto poder de toxidez capaz de exterminar a vida aquática. É também uma ameaça à vida dos seres humanos que utilizam estas águas, sobretudo porque alguns dos produtos utilizados nos processos industriais possuem metais pesados em suas composições como, por exemplo, o cromo, o qual em elevadas concentrações, provoca distúrbios neurológicos (CARVALHO, 2009). CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Com a crescente urbanização e a falta de fiscalização por parte do poder público, o complexo industrial de Bodocongó vem ganhando espaço e pode ser visto nas proximidades do açude, no qual se fazem presentes diversos tipos de indústrias, dentre estas encontra-se a indústria de reciclagem de papel e a fábrica de sabão em barra. A presença das indústrias comprometem a água do açude, com o lançamento de esgotos sem tratamento, sendo uma das fontes de degradação mais perigosa a essas águas.
3.5 Pesca
De acordo com COTRIM (2008), os pescadores, em sua atividade de pesca, sofrem influências das externalidades ambientais geradas pelos diversos fatores sociais que ocupam o mesmo sistema. Entretanto, essa situação é pouco diagnosticada e invariavelmente subavaliada em estudos disciplinares sobre o tema. Segundo Sudepe (2003), a pesca se divide em industrial e artesanal. A pesca artesanal é realizada pelo pescador artesanal ao qual não é empregado de empresas e que muitas vezes é uma atividade de subsistência da família. Apesar da crescente poluição no açude de Bodocongó, a pesca artesanal ainda é uma atividade praticada intensamente pelos moradores da região (Figura 6), que por serem mais carentes desconhecem os riscos a sua saúde.
Figura 6. Atividade de pesca no açude de Bodocongó. Fonte elaborada pelas autoras.
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3.6 Urbanização
A ocupação desordenada é vista como o principal motivo dos problemas ambientais urbanos. Apesar desta constatação, não foi internalizado na urbanização brasileira, seja legal ou informal, os procedimentos que impedem estes impactos negativos sobre o meio físico com desdobramentos sociais, muitas vezes pelo desconhecimento dos aspectos que devem ser observados na ocasião da ocupação (DEL PRETTE, 2006). A degradação ambiental em uma urbanização descomprometida com os condicionantes físico-ambientais pode ser constatada por meio de erosão, deslizamento de encostas, com o consequente comprometimento da qualidade da água, alteração do curso e assoreamento dos corpos hídricos, que podem provocar enchentes, causando prejuízos sociais e danos materiais (MOLFI, 2009). O açude de Bodocongó vem sofrendo intensa urbanização (Figura 7), com moradias sem infraestrutura, crescimento desordenado de bairros e ocupação de áreas sem planejamento. Tal ocupação ocasiona uma superpopulação no local, gerando agressões ao ecossistema, sem saneamento adequado, comprometendo a saúde dos moradores locais. Figura 7. Urbanização às margens do açude de Bodocongó. Fonte: Elaborada pela autora.
3.7 Omissão do poder público De acordo com a Constituição Federal, art. 225, “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de 43efende-lo e preservá-lo para CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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as presentes e futuras gerações”. Portanto, esta lei incumbe ao Poder Público, entre outras competências, o dever de: “I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”. O açude de Bodocongó encontra-se em descaso e por conseguinte perdendo sua função ecológica, sem nenhum tipo de preservação e garantia de uso para a presente e futura geração. Segundo Filho et. Al (2012) as atividades antrópicas aliadas à falta de consciência por parte da população, a ausência de fiscalização e a omissão dos Poderes Públicos são fatores que contribuem significativamente para a intensificação dos processos de degradação do açude. O art. 23 da Constituição Federal compete à União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras atribuições, o comprometimento de: “ III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; IV – impedir a evasão, a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural; VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII – preservar as florestas, a fauna e a flora; IX – promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico; XI – registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões de direitos de pesquisa e exploração de recursos hídricos e minerais em seus territórios”; Mesmo sendo patrimônio histórico de Campina Grande devido ao tempo e utilidades de seu manancial, a crescente urbanização em seu entorno está acelerando a poluição e descaracterizando o açude. Atualmente existem instrumentos dos mais diversos tipos para o CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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controle e o gerenciamento da poluição hídrica, porém a aplicação dos instrumentos legais deixa a desejar, e não é por falta de leis, normas e resoluções, mas sim por falta de controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras, por parte dos órgãos responsáveis (PEREIRA, 2004). Por fim, o art. 200 compete ao Sistema Único de Saúde (SUS) como particularidades relevantes: “II – executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador; III – ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde; IV – participar da formulação da política e da execução das ações de saneamento básico; V – incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico e tecnológico; VI – fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu teor nutricional, bem como bebidas e águas para consumo humano; VII – participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos; VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho”. A omissão desses deveres reflete de maneira significativa na saúde dos moradores do açude de Bodocongó que utilizam a água para lazer e fonte de alimento, consumindo peixes que podem ser livremente comercializados na cidade, aumentando severamente o índice de doenças para toda a população. Esta realidade evidencia a necessidade de medidas urgentes por parte do poder público que visem à recuperação do açude. Deste modo, é necessário de fato vontade e interesse político para colocar projetos já existentes, em prática. Em novembro de 2013, ambientalistas usaram a tribuna livre da Câmara Municipal de Campina Grande (CMCG), para debater sobre o projeto de revitalização do açude de Bodocongó. O manancial têm a preocupação dos especialistas em meio ambiente em garantir os benefícios da recuperação do açude em sua estrutura física e na melhoria da qualidade da água do reservatório. Esse projeto de revitalização e urbanização, prevista para começar no primeiro semestre de 2014, deve passar a se chamar Parque de Bodocongó, uma vez que vai envolver ações de meio ambiente, lazer, cultura e educação (JORNAL DA PARAÍBA, 2013).
4.
CONCLUSÃO
A partir dessas exposições, permite-se afirmar que o grande desafio é, portanto, o de conscientização do Poder Público e da população no que se refere a sua obrigação e dever de CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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proteger o meio ambiente que já é respaldado juridicamente. A omissão de planejamento urbano e ambiental faz do açude de Bodocongó palco da degradação ambiental, o que implica tanto no comprometimento da qualidade de vida da população presente, como também das gerações futuras. O presente estudo de impacto ambiental aponta algumas considerações, sugeridas a Prefeitura Municipal de Campina Grande:
Um projeto de conscientização da população local sobre os riscos da água contaminada e os benefícios da preservação e conservação do açude, enfatizando a questão da poluição, consumo de peixes e utilização da água para banhos.
Uma avaliação e controle da qualidade da água do açude.
Um acompanhamento e avaliação dos impactos ambientais no açude, visando a recuperação da área.
Implantação de um sistema de saneamento básico como forma de mitigar os impactos ambientais.
Um projeto de acompanhamento para o planejamento urbano e ambiental como forma de prevenir impactos ambientais.
Implantar a coleta seletiva de maneira eficiente.
Aumentar a fiscalização das legislações vigentes no açude.
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A EXTRAFISCALIDADE DOS TRIBUTOS E SUA ESTRUTURAÇÃO NAS CONCEPÇÕES DO NEOLIBERALISMO John Tenório Gomes1 Saulo Medeiros da Costa Silva2 Sumário: 1 Introdução. 2 A Extrafiscalidade e as doutrinas econômicas modernas. 3 O Neoliberalismo como movimento propulsor na função extrafiscal dos tributos. 4 Conclusão. Referências.
1
INTRODUÇÃO
Hodiernamente, busca-se um Estado em que sua atuação seja estritamente norteada pela supremacia do interesse público em detrimento do particular, princípio máximo, ao lado da dignidade da pessoa humana, nos Estados, ditos, Democráticos de Direito. Tal princípio, caracterizado pelo insigne Bandeira de Melo (2009, p. 96) como inerente a qualquer sociedade e condição para sua própria existência, permite a intervenção do Estado, nos casos legalmente previstos, na esfera privada. Essa intervenção pode: (i) restringir direitos, (como os institutos da desapropriação e da requisição, expressamente elencados no art. 5º, incisos XXIV e XXV, de nossa Lei Maior); (ii) garantir direitos (nos casos em que o Estado interventor, assim age para possibilitar a efetivação de direitos fundamentais, tais como a elaboração do Código de Defesa do Consumidor, repleto de normas interventivas na iniciativa privada, para possibilitar uma paridade de armas entre a parte hipossuficiente e os fornecedores do produto ou serviço) 3; e (iii) ampliar direitos (quando na busca do interesse público o Estado cria novos direitos para suprir determinada insatisfação social ou desordem econômica). Logicamente, nunca podemos dissociar por completo as ideias de restringir, garantir e ampliar direitos através da intervenção do Estado, pois, por incontáveis vezes, este, ao criar, também limita, ao garantir, também cria e ao limitar, também garante. No entanto, para fins 1
Acadêmico do 9° período em Direito da CESREI. Monitor da disciplina Direito Constitucional II. E-mail: jt_cg@hotmail.com. 2 Professor Orientador. Doutorando em Direito e Ciências Sociais pela Universidad Del Museo Social Argentino - AR; Mestrando em Desenvolvimento Regional pela UEPB; Pós-graduado em Direito Tributário pelo IESP; Membro da Comissão de Estudos Tributários da OAB/PB; Professor de Direito Tributário da FARR/CESREI, da Escola Superior da Advocacia – ESA/CG e dos Cursos Jurídicos Misael Montenegro e da Fundação de Apoio ao Ensino Pesquisa e Extensão Da Unisul – Faepesul; Palestrante, Consultor Jurídico e Autor de livro e artigos jurídicos e tributário. E-mail: saulomedeiros@add.adv.br 3 Art. 170, V, CF. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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didáticos e puramente acadêmicos elaboramos tal compreensão, pois a extrafiscalidade tributária, instituto norteador deste estudo ganha fundamento na supremacia do interesse público, permitindo que o Poder Público atue na ordem econômica, sobretudo ampliando e/ou restringindo direitos - o que será com maior clareza abordado em momento posterior - em prol de um interesse coletivo, a saber: o equilíbrio na ordem econômica. Em vista disso, percebe-se a atuação do Estado regulador de influência neoliberal, que se abstém da atuação direta na economia, em preferência às agências reguladoras. Porém, a invasão do público sobre o privado, em tempos passados, quase nunca se dava pela busca do bem comum, pois, na verdade, o que se pretendia não era o interesse público, mas o interesse do Estado ou do soberano e tal interesse nem sempre condizia com os anseios sociais, como acontecia nas grandes monarquias europeias em momentos anteriores as revoluções do século XVIII.
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A EXTRAFISCALIDADE E AS DOUTRINAS ECONÔMICAS MODERNAS.
Os últimos séculos foram marcados por diversas transformações na esfera política e econômica global. Tais mudanças, por serem frutos de uma consciência social, logicamente, estão em constante evolução e fazem parte da história humana desde os seus primórdios. Todavia, a partir dos séculos XVIII e XIX é que vamos nos confrontar com verdadeiros estrondos intelectuais e revolucionários que ganharam proporção tamanha ao ponto de transpassar as barreiras do tempo e espaço, transformando ideias, anteriormente tidas como imutáveis, em concepções inconcebíveis e inaceitáveis. Foi assim, que um grupo de intelectuais, sobretudo na França, impôs limites no poderio da monarquia europeia que se acreditava ser absoluta e divinamente escolhida, iniciava-se a “era das luzes” ou Iluminismo. Movimento surgido pela insatisfação com o modo de vida aparatoso da realeza, dentro dos suntuosos castelos, enquanto a grande massa da população padecia com a fome e a elevada tributação que lhes era imposta pelo governante, com o único objetivo de custear suas despesas com material bélico ou, na esmagadora maioria, em banquetes, festas e roupas luxuosas.
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Vinda a Revolução Francesa em 1789 e publicada a Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão4 que elencava em seu art. 3º que o princípio de toda a soberania reside, essencialmente, na nação. Nenhum corpo, nenhum indivíduo pode exercer autoridade que dela não emane expressamente. Estava evidente a repulsa da população francesa com a forma extremamente interventiva do governo absolutista e centralizador, reinando agora uma ânsia por um non facere do Estado, eclodindo da França para o mundo a primeira dimensão de direitos, os direitos civis e políticos, também conhecidos como “direitos de liberdade”. Dessa forma consolidam-se as bases para o primeiro grande movimento econômico moderno, o Liberalismo. Movimento que já ganhava forças com a Revolução Americana e a Declaração de Independência dos Estados Unidos exposta ao mundo em 1776, mesmo ano da primeira publicação do clássico A Riqueza das Nações do ilustre economista escocês Adam Smith, considerado “pai” do Liberalismo Clássico. Doutrina que pregava a ideia do Estadomínimo, ou seja, a ordem econômica não necessitaria da intervenção do Estado, pois uma força natural que Smith chamava de mão invisível regularia toda a atividade econômica desenvolvida e esta, por si só, encontraria o equilíbrio e a ordem. O Estado agora já não é mais concentrado em um único governante político, a tripartição dos poderes de Montesquieu exterioriza a necessidade de imposição de limites a este monstro, como assim o compreendia Thomas Hobbes, que se vê encarcerado pela estrita legalidade, pois esta, ao emanar de representantes do povo, único ente dotado de Poder legítimo, tem o condão de assim deliberar. O distanciamento do Estado nas esferas sociais, evidentemente também da econômica, fortaleceu o caráter extremamente fiscal dos tributos, tendo estes, sobretudo, finalidades arrecadatórias. Pouco se via uma atuação direta na órbita econômica, sendo necessário, com isso, e indispensável para manutenção da máquina estatal, a tributação com função explicitamente fiscal. A extrafiscalidade, portanto, não era necessária, tendo em vista que a doutrina predominante à época não abria margem para essa função, pois as leis naturais da economia Sobre a nomenclatura e análise deste instrumento normativo, destaca José Afonso da Silva que Seu título – ‘Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão’ – dá a impressão de que contém dois tipos de direitos: Direitos do Homem e Direitos do Cidadão, que seriam distintos. Os primeiros, de caráter pré-social, concernentes ao homem independentemente de sua integração em uma sociedade política, são, nos seus termos, a liberdade, a propriedade e a segurança, isto é: tudo que os franceses chamam hoje, com duvidosa pertinência, de liberdades públicas. Os segundos são direitos que pertencem aos indivíduos enquanto participantes de uma sociedade política, e são o direito de resistência a opressão, o direito de concorrer, pessoalmente ou por representantes, para a formação da lei, como expressão da vontade geral, o direito de acesso aos cargos públicos, a despeito de Duguit declarar que os direitos do cidadão, segundo a Declaração de 1789, não são os que nós hoje denominamos direitos políticos, mas, antes, são aquilo que se nomeia, por vezes direitos civis. (2004, p. 09) 4
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eram autorreguladoras e não cabia ao Estado intervir nesse equilíbrio natural, sob pena de desestabilizar o sistema. Com isso, verifica-se um grande avanço na iniciativa privada e cada vez mais a necessidade de arrecadação do Estado, cabendo a este apenas um mero exercício de fiscalização e defesa territorial. Na concepção do ilustre DALLARI (2008, p. 185):
O Estado liberal, com o mínimo de interferência na vida social, trouxe de início, alguns inegáveis benefícios: houve um progresso econômico acentuado, criando-se as condições para a revolução industrial; o indivíduo foi valorizado, despertando-se a consciência para a importância da liberdade humana; desenvolveram-se as técnicas de poder, surgindo e impondo-se a ideia do poder legal em lugar do poder pessoal.
No entanto, a grande valorização do individuo geraria um desequilíbrio extremamente avassalador, do ponto de vista social, pois, ainda nas diretrizes do renomado autor, a valorização do indivíduo chegou ao ultra-individualismo o que favoreceu determinadas classes afortunadas em detrimento da grande massa trabalhadora. Fato que culminaria nas barbáries trazidas pela Revolução Industrial. Tais como, crianças enfrentando jornadas de trabalho que chegavam a dezesseis horas diárias, com breves repousos noturnos de quatro horas. Mulheres abandonando seus lares para se submeterem a regimes explicitamente desumanos, que tornavam irrelevantes sua estrutura física, dentre outras desordens sociais que clamaram por uma aproximação do Estado, um facere, exsurgindo os direitos de segunda dimensão, os assim chamados direitos sociais ou “direitos de igualdade”. A insatisfação com a teoria liberal era evidente, e esta estava fadada ao declínio, sobretudo após a “Grande Depressão” de 1929 e a instalação do programa de governo conhecida como New Deal, instituída em 1932 pelo presidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt. Na verdade, o New Deal, nada mais era, do que um plano extremamente intervencionista com o objetivo de conter os males que sucederam 1929. A intervenção do Estado era imprescindível, e este tomou para si todos os anseios sociais, passando agora a atuar de forma direta no contexto econômico. Instituía-se assim o Welfare State, segundo modelo econômico moderno, em que já não há a predominância de um Estado distante da economia e dos fenômenos sociais, mas evidentemente comprometido com o bem-estar da população, em consequência dessa nova concepção, tal modelo econômico ficou conhecido como Estado de bem-estar social. Dava-se início a um novo momento no que conhecemos por tributação, haja vista a maior liberalidade do ente Político em delimitar ou ampliar sua atuação tributária. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Sobre o assunto, Plauto Faraco de Azevedo (2000), em obra singular, destaca a evolução econômica do Liberalismo para o Welfare State de forma bastante esclarecedora, ao evidenciar que:
Neste contexto de crise econômica manifesta com sérios desdobramentos políticos e sociais, o Estado liberal, a fim de conjurar o perigo que lhe ameaçava a mesma existência, vai pouco a pouco se transformando, mediante a progressiva intervenção na economia, até tornar-se Estado Social ou Welfare State, cujos contornos vão ganhando maior nitidez a partir da Segunda Guerra Mundial. (AZEVEDO,
2000, p. 91) No momento anteriormente vivido, o Liberalismo distanciou o Estado das atividades econômicas, o que implicou em grandes reformas no sistema tributário. O que era arbitrado pelo soberano no Estado absolutista de forma extremamente desequilibrado, já não era mais acolhido no Estado liberal. A função clássica arrecadatória dos tributos permaneceu, no entanto, com menos vigor, sendo realizada com certa timidez e extremamente vigiada pela burguesia detentora do poderio econômico, apoiada pelos pensadores liberais tradicionais. Em contrapartida, com a instalação do Estado de bem-estar social a fiscalidade tributária ganha força e a atuação do Estado volta a ter caráter intervencionista, diferenciandose do Estado Absolutista, por estar evidentemente compromissado com a harmonia e o bem coletivo, o que não se verificava neste. Porém, ainda não podemos chegar à origem de uma real função extrafiscal, pois esta só se efetivará em um momento seguinte na evolução história dos sistemas econômicos mundiais. De certo, é inegável o avanço jurídico na transição do Absolutismo para o Liberalismo, e do Liberalismo para o Estado interventor, ou de bem-estar social, prevalecendo neste a preocupação inconteste pela realidade entre o que está exposto na norma e o que realmente está sendo efetivado no contexto social. Mesmo com todas as contribuições trazidas pelo Estado interventor, a extrafiscalidade tributária não tinha qualquer fundamento, uma vez que o mesmo atuava de forma direta nos sistemas econômicos, portanto, não havia que se falar em intervenção com finalidade reguladora na economia, tendo em vista que o próprio Estado avocava para si atividades tipicamente econômicas. Os Estados onde imperava o sistema interventivo demonstraram no decurso do tempo, inúmeros déficits financeiros, o que acarretou insatisfação por parte de alguns pensadores que buscaram retorno a uma atuação estatal de menos proporção, movimento conhecido como Neoliberalismo, atual sistema econômico que fundamenta a extrafiscalidade CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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tributária, tendo em vista ser nesse contexto que tal função ganha maior proporção. Sendo o idealizador dessa corrente teórica Friedrich Hayek, como bem preleciona Perry Anderson (1996): O neoliberalismo nasceu logo depois da II Guerra Mundial, na região da Europa e da América do Norte onde imperava o capitalismo. Foi uma reação teórica e política veemente contra o Estado intervencionista e de bem-estar. Seu texto de origem é O Caminho da Servidão, de Friedrich Hayek, escrito já em 1944. Trata-se de um ataque apaixonado contra qualquer limitação dos mecanismos de mercado por parte do Estado, denunciadas como ameaça letal à liberdade, não somente econômica, mas também política. (ANDERSON, 1996, p. 12)
A gênese da crise, nas concepções de Hayek e bem evidenciadas por Anderson (1996, p. 11), encontrava-se no excesso poder dos sindicatos ligados ao movimento operário que haviam corroído as bases da acumulação capitalista com suas pressões reivindicatórias sobre os salários e sua pressão parasitária para que o Estado aumentasse cada vez mais os gastos sociais.
3 O NEOLIBERALISMO COMO MOVIMENTO PROPULSOR NA FUNÇÃO EXTRAFISCAL DOS TRIBUTOS
Discorrer sobre extrafiscalidade tributária é relatar a intervenção do Estado no domínio econômico. Tal intervenção sempre esteve presente nas Constituições brasileiras, sobretudo a partir da Constituição de 1934, uma vez que a mesma sofreu grande influência da Constituição alemã de Weimar, promulgada em 1919 e caracterizada, sobretudo, pelo rol de direitos trabalhistas que só foi possível através da atuação direta na seara econômica pelo Estado. Para demonstrar as evidências interventivas nas Constituições brasileiras utilizaremos das inegáveis contribuições do professor Albino de Souza (2002, p. 416), adiante expostas. Quanto à presença do vocábulo intervenção na Constituição de 1934 encontra-se no art. 116. Na Constituição de 1937 em seu art. 135: A intervenção do Estado no domínio econômico poderá ser mediata ou imediata, revestindo a forma do controle, do estímulo ou da gestão direta. Na Constituição de 1946 o art. 146 evidenciou que A União poderá [...] intervir no domínio econômico [...]. Vindo a Constituição de 1967, informou esta no art. 157, § 8º: são facultados a intervenção no domínio econômico e o monopólio de determinada CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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indústria ou atividade, mediante lei da União, quando indispensável por motivos de segurança nacional, [...]. E, por fim, com a Emenda Constitucional nº 1 de 1969 no seu art. 163 repetindo ipse litteris o teor do art. 157, §8º da Constituição de 1967. Com isso, fica evidente, que no transcurso das constituições brasileiras a intervenção sempre esteve presente. No entanto, as finalidades de tais intervenções, bem como seus fundamentos, até a Emenda de 1969, sempre foram mais voltadas às ideias de Estado interventor do que Estado neoliberal, o que inicialmente pode parecer contradição ao enfatizarmos que a extrafiscalidade tem fundamento com a intervenção do Estado na ordem econômica, ao passo que buscamos uma influência neoliberal para tanto, haja vista que este nos remete a uma ideia de menor atuação dos entes estatais na economia. Porém, o neoliberalismo, diferentemente do liberalismo clássico não anuncia a total abstenção do Estado quanto aos assuntos econômicos. Ainda nas lições de Albino de Souza (2002, p. 446) sobre O Discurso Neoliberal na Constituição de 1988, os fundamentos da “economia de mercado”, a saber: “ofertante”, “procurante”, “objeto” e “concorrência”, na doutrina liberal prende-se à ideia de um mecanismo autorregulador, sem qualquer interferência estranha. No entanto, após a experiência do Estado social e atuante na economia e demais áreas que lhe fosse conveniente, buscou-se um novo modelo de liberalismo, onde o Direito tem importância decisiva para corrigir os efeitos dos mecanismos econômicos indiferentes à condição humana e social, imposta pela própria realidade. A afirmativa evidenciada acima tem uma razão lógica para se subsistir, uma vez que o neoliberalismo teve seu pontapé inicial em um contexto marcado pelas experiências ocasionadas pelo Estado Social, sobretudo pela preocupação com as desigualdades sociais engendradas pelo modelo abstencionista liberal. Nesse ínterim, o neoliberalismo mesmo pretendendo, inicialmente, um retorno aos princípios liberais, estes, dificilmente seriam reestabelecidos em sua totalidade, pois, as conquistas disponibilizadas pelo Welfare State ganharam contornos políticos e econômicos indissociáveis do atual contexto social. No plano jurídico, com a conquista dos direitos sociais, vindo estes a ocupar o plano de direitos fundamentais, não se poderia admitir o retorno à situação de maior desvantagem social, em razão de outro princípio/característica adotado pelos Estados constitucionais no pós-guerra, da proibição do retrocesso social aplicado aos direitos e garantias fundamentais. Este princípio é veementemente defendido pelos constitucionalistas modernos, tais como J. J. Gomes Canotilho, cuja lição merece destaque:
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[...] a idéia aqui expressa também tem sido designada como proibição de contrarevolução social ou da evolução reacionária. Com isto quer dizer-se que os direitos sociais e econômicos (ex: direito dos trabalhadores, direito à assistência, direito à educação), uma vez obtido um determinado grau de realização, passam a constituir, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjectivo. (CANOTILHO, 2003, p. 587)
Com isso, qualquer mudança patrocinada pelo retorno ao modelo liberal que, inviabilizasse qualquer direito social conquistado em decorrência do Welfare State, seria encarada, como uma afronta aos direitos subjetivos dos cidadãos e a uma garantia institucional, cuja supressão seria, do ponto de vista democrático, uma aberração jurídica. Na ânsia de desenvolver um modelo econômico que se aproximasse dos princípios liberais, ao passo que a adequação ao atual contexto social e jurídico era necessária, o Direito teve de ser um instrumento para que a abstenção do Estado na seara econômica fosse gradativamente estabelecida, mas de uma forma que não mitigasse os direitos fundamentais pretéritos. Sendo assim, em decorrência da tentativa ao retorno da economia liberal, mas sob a pressão imposta pelos valores sociais já conquistados pelo Welfare State, surge o que se entende hoje por neoliberalismo. Sobre os supostos benefícios que tal modelo econômico tem acarretado, as dúvidas ainda são frequentes, havendo quem se porte no sentido de que é impraticável o que se entende por justiça social tomando como parâmetro o retorno ao liberalismo, ainda que em uma nova roupagem e com um discurso pretensamente inovador motivado pela globalização, assim como evidencia Azevedo (2000, p. 115), ao informar que a globalização, tal como a quer o neoliberalismo, está associada à exclusão social. O argumento acima evidenciado encontra-se embasado na premissa de que o neoliberalismo acarretou um aumento significativo na desigualdade social, uma vez que “nas faixas melhor aquinhoadas da população, cerca de dez ou vinte por cento de seus componentes, estão crescendo de modo significativo”, em contrapartida, os rendimentos das pessoas, que integram os vinte ou até quarenta por cento menos favorecidos, estão diminuindo (DAHRENDORF, 1995, p. 33). Ressalte-se que, grosso modo, a representação da realidade feita pelo neoliberalismo – em que avulta o caráter central e prescritivo do mercado, de que decorrem a escala de valores e as regras segundo as quais os homens devem viver –, constitui uma visão unilateral de determinada categoria de homens, atentos fundamentalmente à realização de seus
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interesses pessoais, que pretendem fazer passar pelos interesses universais do gênero humano, a qual teria o condão de pôr termo à história. A nossa Constituição de 1988 elenca diversas características que nos fazem chegar à conclusão que o modelo econômico de maior afinidade com as normas por ela insculpidas é o neoliberal. Uma delas é apontada com grande propriedade por Albino de Souza (2002, p. 449), uma vez que está claramente revelado no texto constitucional de 1988 que a ‘regra’ adotada incorpora a exploração direta da atividade econômica pelo Estado, porém este só poderá fazê-lo se desvestido de suas peculiaridades de poder público e sua competência para ‘regulamentação’ e ‘fiscalização’ submete igualmente todos os participantes dos negócios e os integra na política econômica geral. Pois bem, esta possibilidade de exploração direta da atividade econômica incorporada pelos ideais do Estado Social e a consagração do status positivus dos direitos ali conquistados, mas limitada pela Constituição quando assumi esta forma atuante na “economia de mercado”, na seara tributária, acarretou o afloramento de uma função, até então, pouco conhecida e aplicada dos tributos. Esta nova forma de vislumbrar a tributação decorre da utilização das normas de direito tributário para direcionar a incidência de determinado tributo, com uma finalidade específica de regulação econômica.
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CONCLUSÃO
Diversamente do que muitas vezes se prega, a extrafiscalidade tributária não se limita apenas a estimular ou desestimular determinados comportamentos fiscais. A aplicabilidade deste requer todo aparato jurídico, de atuação, não só do poder Legislativo, quando da elaboração de tal direcionamento, mas do Executivo, ao instituir políticas públicas tributárias, bem como do Judiciário, ao assegurar a eficaz aplicação da norma, quando for provocado, além de, nos casos em que a legislação for obscura, proporcionar uma interpretação à luz dos princípios constitucionais da supremacia do interesse público e da justiça social. Nesse norte, obtempera Marcus de Freitas Gouveia (2006, p. 80) ao disciplinar que a extrafiscalidade tributária:
[...] é o princípio ontológico da tributação e epistemológico do Direito Tributário, que justifica juridicamente a atividade tributante do Estado e a impele, com vistas na realização dos fins estatais e dos valores constitucionais, conforme as políticas públicas constitucionalmente estabelecidas, delimitada (a atividade estatal) pelos princípios que revelam as garantias fundamentais do contribuinte. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Com isso, a noção implementada pelo neoliberalismo, almejando retornar ao ideário liberal, mas limitado pelas conquistas do Estado Social, possibilitou a atuação veemente da tributação com fins que excedem a simples arrecadação e manutenção estatal, pois o Estado, tendo a liberalidade para atuar na ordem econômica, passou a ser um interessado direto na economia de mercado, uma vez que, em decorrência das limitações constitucionais, não podendo agir ao seu bel prazer, em decorrência das premissas liberais de limitação do poder soberano, a forma encontrada por este para direcionar o mercado foi o Direito, sobretudo o tributário, dando uma nova roupagem à tributação. Vale salientar, que o clamor social deve influir na finalidade à qual será destinada a tributação extrafiscal, por ser a justiça social o objetivo precípuo de todo o Direito. Em razão disso, diversas são as especulações relacionadas a tributos com o objetivo de fazer cumprir a função social de determinado imóvel, como o já conhecido IPTU progressivo; a alta carga tributária incidente sobre determinadas drogas líticas; além de outros mais futurísticos decorrentes da hodierna preocupação ecológica, tais como os tributos ambientais, visando à preservação ambiental inibindo determinadas condutas, tendo em vista que:
Os tributos ambientais em sentido próprio ao atuarem sobre os comportamentos, promovendo a sua alteração para moldes mais compatíveis com o ambiente, são determinantes para prevenir futuros danos no continuum naturale. Mas a política ambiental não pode também abdicar do uso de gravames ambientais em sentido impróprio. Uma vez que estes tributos, ao incidirem sobre bens ou comportamentos aos quais está associado um custo externo e uma procura inelástica, não só tornam possível ao Estado financiar-se de um modo menos maléfico para a economia do que lhe permite a tributação do trabalho, e.g., como também sinalizam aos agentes econômicos o sentido da evolução tecnológica desejado pela sociedade. (SOARES, 2001, p. 16)
Diante do exposto, é facilmente perceptível a grande proporção que a extrafiscalidade tributária tomou pela influência ocasionada em decorrência do modelo econômico neoliberal, que proporcionou um campo de atuação fértil para a mesma, tendo em vista que o auxílio da legislação tributária para fins estatais específicos sempre existiram, mas não com tamanha nitidez. No entanto, no modelo hodierno, ainda que criticado pela possível contribuição às desigualdades sociais e a perda, pela grande parte da população, do contato com a esfera da cidadania, os chamados marginalizados sociais (AZEVEDO, 2000, p.116), fez com que o Estado buscasse dentro do Direito, um método que lhe possibilitasse conduzir o contribuinte a uma conduta que, ao menos, tenha um escopo social.
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O poder de normatização utilizado pelo Estado com fins econômicos pode levar a certos benefícios para a sociedade como um todo. No entanto, o que se teme é que, no Estado Liberal, sempre atuaram discreta, mas decisivamente, as forças econômicas, notadamente as empresas nacionais e transnacionais. Com isso, no quadro do neoliberalismo global, em que se busca certa diminuição do Estado, o que dele restar poderá se transformar em instrumento, não do cidadão, mas das empresas transnacionais, na busca de vantagens em seu proveito, à margem dos mecanismos institucionais, através do Poder Executivo e de pressões que este exerce sobre o Legislativo e o Judiciário.
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FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS MEDIANTE DECISÕES DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO SOB O INFLUXO DO REALISMO JURÍDICO CARDOZIANO Wanda Helena Mendes Muniz Falcão1 Lorena de Melo Freitas2 Sumário: 1 Introdução. 2 O Direito fundamental à saúde. 2.1 Fornecimento de medicamentos. 2.2 A Judicialização da saúde no Brasil. 3 Realismo jurídico norte-americano. 3.1 Benjamin Nathan Cardozo (1870-1938). 3.2 Realismo Jurídico Cardoziano. 4 A força das decisões para a o fornecimento de remédios e o influxo do Realismo Cardoziano. 5 Conclusão. Referências.
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INTRODUÇÃO
O escopo deste trabalho reside na análise do fenômeno da judicialização do direito fundamental à saúde, em específico ao fornecimento de medicamentos à população carente. No artigo 6° da Constituição Federal, é nítida a intenção do legislador quando positivou a saúde como direito social, sendo esta seleção parte do conjunto de direitos e garantias inerentes ao homem. Contudo, há uma substancial divergência entre a realidade e norma; o Estado negligente macula o seu próprio fim que é o de dar provimento às políticas públicas construtivas para a sociedade civil. Ao longo deste trabalho, é realizado o exame da falta da prestação eficaz de saúde pública, através da concessão de remédios para o tratamento e 1
Acadêmica do Curso de Direito da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas (FACISA), Campina Grande, PB. Membro do Núcleo de Estudos de Direito Internacional e Direitos Humanos (FACISA). Membro do Grupo de Pesquisa "Pragmatismo e Realismo Jurídico" vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba (PPGCJ/UFPB), João Pessoa, PB. Membro do Grupo de Pesquisa do Observatório de Direitos Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, SC. Pesquisadora do Centro de Direito Internacional (CEDIN), Belo Horizonte, MG. Associada ao Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Direito (CONPEDI). Estagiária do Ministério Público Estadual da Paraíba. E-mail: wanda.helenammf@bol.com.br 2 Professora com dedicação exclusiva da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), ensinando na Graduação e Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) em Direito. Graduada (UNICAP), Mestra e Doutora (UFPE) em Direito. Desenvolve pesquisas voltadas à atividade judicial desde o mestrado quando defendeu Dissertação intitulada Ideologia e direito: uma pesquisa empírica sobre a Associação Juízes para a Democracia e no Doutorado com tese sobre a atividade de formação da decisão por juízes e tribunais sob o título - O realismo jurídico como pragmatismo: A retórica da tese realista de que direito é o que os juízes dizem que é direito. Tem livros publicados e organizou obras coletivas sobre estas temáticas, tendo, para realização de suas atividades fundado o Grupo de Pesquisa ligado ao PPGCJ/UFPB: Realismo Jurídico. Participa como pesquisadora de vários grupos de pesquisa ("Marxismo e Direito", "Pragmatismo Jurídico, Teorias da Justiça e Direitos Humanos" e "Fundamentos e Métodos do Pragmatismo: uma abordagem interdisciplinar dos fenômenos jurídicos") e tem como foco de pesquisa os seguintes temas: Realismo jurídico, teoria geral e sociologia do direito, direito do trabalho. Integra GT Ética e Cidadania da ANPOF. Coordena a área de concentração em Direitos Humanos no PPGCJ/ UFPB. E-mail: lorenamfreitas@hotmail.com CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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prevenção de doenças e, uma vez chegada à demanda ao Poder Judiciário (em específico ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região), se pode vislumbrar – dada a análise - a decisão dos magistrados à luz do Realismo Jurídico Cardoziano. Ademais, dedica-se tópico sobre a biografia de Benjamin Nathan Cardozo, jurista norte-americano, contemporâneo de grandes julgamentos e um dos percussores do Realismo Jurídico. Diante da elucidação do quadro, emerge-se a situação-problema: As decisões judiciais proferidas pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região sobre fornecimento de medicamentos têm influência do Realismo Jurídico Cardoziano? destarte, a lesão da garantia constitucional em foco necessita ser examinada e debatida, tendo em mira as fontes sociológica e filosófica como norte para as discussões justificando o fim deste trabalho. Este artigo detém o objetivo geral: Compreender a afirmação do direito fundamental à saúde pública no Estado brasileiro; e o objetivo específico: Discutir a exequibilidade do direito à saúde pública através das sentenças sob a perspectiva realista cardoziana, mormente, ao provimento de remédios à população nos anos de 2011 e 2012. Logrou-se o método indutivo, que consubstancia vasta possibilidade de aproveitamento do conteúdo, pois parte do geral (direito fundamental à saúde) para a temática específica, no caso, eficácia da concessão de medicamentos mediante do decisões judiciais baseado no Realismo Jurídico Cardoziano. Utiliza metodologia qualitativa e quantitativa com pesquisas bibliográfica e documental – com análise jurisprudencial sobre o tema.
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O DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE
A saúde faz parte do rol de Direitos Fundamentais eleitos pela Assembleia Nacional Constituinte de 1988. É intimamente ligada a ideia de dever-ser do Estado em dar provimento às políticas públicas que atendam aos anseios da população. Nos artigos 6°, 196 ao 200 da Carta Magna brasileira, adota como direito fundamental a saúde, demonstrando assim, o interesse do Estado em viabilizar meios que deem melhores condições de vida aos indivíduos. Este valor reside na segunda dimensão – para fins doutrinários – como uma peça-chave para a vida digna. É fundamental para que haja equilíbrio social, o Estado cumprir seu dever, ora na órbita protetiva, ora na combativa. A necessidade de desenvolver políticas públicas eficazes na área da saúde pública aos cidadãos é imperiosa, conforme entendimento do Min. Celso de Mello: CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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EMENTA: O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (art. 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve velar, de maneira responsável o Poder Público, a quem incumbe formular – e implementar – políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir, aos cidadãos, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico-hospitalar. – O direito à saúde – além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas – representa consequência indissociável do direito à vida3.
Embora exista toda esta previsão normativa e posicionamento jurisprudencial, há uma ineficácia dos serviços prestados, uma vez que não é sentida a real proteção à garantia em foco, pois para “gerar efeitos jurídicos, ao passo que a eficácia social [...] efetiva aplicação da norma [para ser um] resultado concreto decorrente”4. Dessarte, é frutífero o debate sobre o direito fundamental à saúde e seus desdobramentos para o seio social pátrio. Nesta seção discute-se a ineficácia do fornecimento de remédios aos cidadãos desprovidos de boas condições financeiras e, deste modo, as demandas ao Poder Judiciário em busca de assegurar tal direito.
2.1 FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS
Como dito alhures, o direito à saúde é basilar para o Estado democrático de Direito, neste sentido, “as prestações que fazem do mínimo existencial – sem o qual restará violado o núcleo da dignidade da pessoa humana, compromisso fundamental do Estado brasileiro – são oponíveis e exigíveis dos poderes públicos constituídos”5. Portanto, ter serviços prestacionais que visem esta concreção é indelével. Um ponto intrigante da garantia constitucional discutida é o acesso aos remédios para tratamentos àqueles que não têm condições financeiras. O uso de medicamentos de alto custo entrava o desenvolvimento de mecanismos benéficos ao paciente e, nesta esteira, os indivíduos que detêm mitigadas condições financeiras são os mais atingidos. Nos estados do Nordeste brasileiro, precisamente naqueles que compõem o Tribunal Regional Federal da 5ª Região: Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe, a demanda é maior. Percebe-se no “caso extremo [que] aconteceu em Natal, no Rio 3
STF – 2ª T., RE-AgR 393175/RS, Rel. Min. Celso de Mello, DJU 02.02.2007, p. 140.
4
SARLET, I. W., 2004, p. 229.
5
BARCELLOS, A. P., 2008, p. 304. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Grande do Norte. Num dos principais hospitais públicos da capital, os depósitos de remédios estavam vazios, e pessoas eram atendidas nos corredores”6. O quadro se agrava e as políticas governamentais para os ditos hipossuficientes não atingem seus objetivos, a título de exemplificação,
em termos absolutos, o cearense gasta, em média, R$ 69,95 por mês com saúde. Desse valor, R$ 38,01 são com despesas para compra de remédios e R$ 16,55 para plano de saúde. A cifra é a menor do Nordeste. [...] Já o brasileiro gasta, em média, R$ 153,81 com assistência à saúde mensalmente. 7
Os dados expostos no estado do Ceará lançam luz sobre o problema existente. É pertinente, portanto, que ao chegar ao Poder Judiciário, sejam examinados os fatores sociais e econômicos do demandante, os impactos sobre a renda, dada a necessidade da medicação para o enfermo.
2.2
A JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE NO BRASIL
O fenômeno da judicialização da saúde evidencia a necessidade que há em obter respostas às falhas na saúde pública brasileira. O artigo 196 expõe que legislador constituinte originário colocou o direito à saúde como direito fundamental, devendo ser acessível a todos indistintamente, ainda na Carta de 1988, artigo 197, o dever do Estado em executar tais medidas dando-as eficácia. Contudo, a realidade se distancia. Nos últimos anos, cresce o número de ações judiciais que pleiteiam a concessão de medicamentos, embora haja “nos estados do Paraná, Espírito Santo e Rio de Janeiro, a via administrativa [...], seja por dentro do próprio setor saúde, como é o caso dos dois primeiros estados, seja por acordo entre a secretaria de saúde e a Defensoria Pública, como acontece no Rio de Janeiro”8, recorrer ao Poder Judiciário ainda é predominante, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) verificou que até o ano de 2011 havia mais de 240 mil processos tramitando referente à área da saúde pública9.
6
REVISTA NORDESTE [online], 2013.
7
DIÁRIO DO NORDESTE [online], 2012
8
PEPE et al, 2010, p. 01.
9
Dados disponíveis em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/14096-brasil-tem-mais-de-240-mil-processos-naarea-de-saude>. Acesso em: 17 mar. 2013 CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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A grande quantidade de demandas revela a ineficácia das proposições e execuções de políticas públicas – leia-se Poder Legislativo e Executivo –, dessarte, “afigurando-se até mesmo hilária a pretensa tese que atribui ao Judiciário, através de decisões que visam garantir irrestritamente o direito à saúde, a culpa (ou parcela dela) pelo emperramento das políticas em tela”10 e como quase a última forma dos cidadãos terem acesso aos remédios. Esta gama de processos é também recorrente no Tribunal Regional Federal da 5ª Região, tendo em vista a circunstâncias precárias de vida dos seus jurisdicionados e a necessidade da concessão de medicamentos pelo Poder Público. Nas próximas linhas deste trabalho, serão examinadas decisões judiciais do E. Tribunal sobre a matéria e o influxo do Realismo Jurídico Cardoziano.
3
REALISMO JURÍDICO NORTE-AMERICANO
A jusfilosofia do Realismo faz parte do rol dos movimentos primeira metade do século XX, apresenta como ponto fulminante o fato social, o delinear do Direito seria fundado nas produções histórico-sociais, buscando a compressão dos fatos sociais para a devida e real aplicação da Lei. Ressalta-se, porém, que “o realismo jurídico norte-americano não é assunto que tem preocupado a indagação jusfilosófica brasileira, que já foi vítima de monoglossia crônica e patológica, centrada em traduções de textos europeus”11. O conceito e suas deliberações no âmbito norte-americano se solidificam com grandes representantes, a exemplo de Gray, Llewellyn, Frank, Lloyd e Benjamin N. Cardozo - o último cristaliza este trabalho. Neste passo, os realistas norte-americanos aduzem que primeiro os juízes julgam, depois partem para a dedução lógica, pois o refletir seria o princípio para a resolução dos casos in concrecto.
3.1 BENJAMIN NATHAN CARDOZO (1870-1938)
Quase 100 anos após ter tomado posse na Suprema Corte americana as ideias de Benjamin Nathan Cardozo são bastante atuais. Nasceu em 1870, em uma família judia de ascendência ibero-espanhola, que se estabeleceu em Nova York antes da revolução americana. Seu pai, Albert Cardozo, conquistou o posto de juiz da Suprema Corte de Nova 10
GUGLINSKI, V., 2010, p. 01.
11
GODOY, A. S. M., 2012, p. 01. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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York, por conta de conexões políticas e foi forçado a renunciar ao cargo antes de ser condenado ou afastado, por supostamente, favorecer determinados grupos políticos em suas decisões. Após o escândalo envolvendo o patriarca, Benjamin e seus irmãos passaram a viver em situação financeira difícil até que seu pai, mais uma vez favorecido por suas conexões políticas, conseguiu reverter o quadro de miséria da família. Aos 15 anos de idade, seu pai veio a falecer. A magistratura surgiu por acaso. Em 1913, devido a sua influência junto à comunidade judaica de Nova York, Cardozo foi convidado a intermediar as negociações entre dois grupos políticos opositores que pretendiam obter o controle da prefeitura local. Em 1914, chegou à Suprema Corte de Nova York, após 23 anos de experiência como advogado e sólida base intelectual. Cardozo destacou-se como advogado, e bons relacionamentos nos meios jurídicos foram determinantes para a judicatura. Durante seus primeiros anos na Corte de Apelação, o movimento realista estava em ascensão no mundo acadêmico e influenciou consideravelmente a arte de tomar decisões. Em fevereiro de 1921, na Escola de Direito da Universidade de Yale, proferiu quatro palestras que foram subsequentemente publicadas no livro “A natureza do processo judicial”. Foi o primeiro trabalho publicado que descrevia com detalhes o processo judicial, despertando interesse tanto na comunidade acadêmica como no público em geral. Cardozo baseou suas ideias em Holmes, The Common Law (1881), John Chipman Gray, The Nature and Sources of the Law (1909) e os escritos de Roscoe Pound. O objetivo de Cardozo era explicar a arte de julgar a partir do ponto de vista de juiz e ex-advogado militante. Em 1932, “foi indicado para a Suprema Corte pelo presidente Herbert Hoover; Cardozo ocupou a vaga de Oliver Wendell Holmes Jr.”12, compartilhando raciocínio semelhante a outros colegas do Tribunal, aduziu que a Constituição deveria suprir necessidades futuras e que seu significado poderia ser alterado à medida que a sociedade mudasse. Esta foi sua última contribuição na Suprema Corte americana. Em 1937, sofreu uma parada cardíaca, seguida de um acidente vascular cerebral e alguns meses depois veio a falecer aos 68 anos de idade.
12
KAUFMAN, A. L., 2002, p. 88. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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3.2
REALISMO JURÍDICO CARDOZIANO “O Direito não é lógica, é experiência”, Holmes Jr. resume o raciocínio filosófico
realista norte-americano, no qual a empiria, os fatos sociais são, em verdade, o caminho ao ideal de justiça. Nesta esteira, o ato de decidir as lides implica na visão pragmática do Direito, isto é, o utilitarismo europeu mais aprimorado que consubstancia a realidade sociológica, tendo em vista que
[...] as ideias do realismo jurídico são um desenvolvimento da filosofia pragmática aplicadas ao direito, apesar da teoria tradicional desconhecer este raciocínio abdutivo e apenas conceber a dedução como operação lógica de subsunção da norma ao caso13
Deste modo, é latente a presença do quesito utilidade pública nas sentenças, pois é um meio de aproximar a decisão judicial ao que de fato levou o ensejo do conflito, por conseguinte, do processo, no caso da saúde, deve-se observar o nível de acesso da população às prestações de serviços – para este trabalho, o foco perpassa os medicamentos. O juiz persegue o silogismo lógico: examina a premissa maior (a norma) inserindo-a premissa menor (litígio) e, por fim, conclui seu dever com o julgamento – visão formal ao processo judicial. Novamente, símiles aos pragmáticos, os realistas analisam o Direito – mais precisamente na fase da prolação da sentença – como um enquadramento do fato social à norma, sendo um contraponto ao formalismo mencionado. O jurista em foco comunga com as premissas pragmáticas, faz uma leitura semelhante à relatada ao passo que afirma pontualmente em sua principal obra, The nature of the judicial process, somos lembrados por William James em substancial passagem de suas aulas sobre o pragmatismo, que cada um de nós possui verdadeiramente uma subjacente filosofia de vida, até mesmos aqueles de nós para quem são desconhecidos os nomes e as noções de filosofia. Há em todos nós uma tendência, [...] que nos confere coerência ao nosso pensamento e às nossas ações. Os juízes não conseguem escapar desse fato que ocorre com todos os mortais.14
Logo, há um liame entre a filosofia pragmática e a realista cardoziana, confidenciando assim, a perspectiva de linear entre as duas correntes. 13
FEITOSA, E.; FREITAS, L., 2009, p. 02.
14
CARDOZO, B. N., 1991, p. 12. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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O Realismo condena a adoção de um procedimento judicial automático e formal, independente de reflexos sociais que estas decisões poderiam acarretar naquele momento. O jurista em tela reconheceu a importância de fontes além de precedentes no processo judicial e o caráter discricionário inerente à tomada de decisões. Destarte, considera quatro fontes principais no processo judicial: lógica, história, costume e sociologia. A aplicabilidade da história e do costume estaria reduzida a um número limitado de casos. De outra face, a lógica ou o uso da dedução lógica a partir de princípios gerais estaria relacionada a argumentos que faltassem na história, costume ou sociologia. Seus textos estão centrados na sociologia, na adoção de valores contemporâneos no processo de decisão judicial, a relevância dos fatos sociais, “sustenta que o direito é o conjunto de normas efetivamente aplicadas pelos tribunais de uma determinada comunidade e, nesse sentido, efetivamente seguidas”15. Na visão de Cardozo, o juiz é o agente de mudança, porém, este procedimento deverá ser adotado de maneira comedida, visto que em uma democracia, os Poderes Legislativo e Executivo deveriam ser os principais vetores para a transformação social. O juiz passaria a legislar, apenas nos casos, em que o avanço era pequeno, a inovação não violava as prerrogativas dos outros poderes e estes, de alguma forma, já sinalizam nesta direção. Um outro fator apontado por Cardozo é o da excentricidade dos magistrados, atribuindo-lhes responsabilidade pelos bens jurídicos, pois a decisões são fulcrais para a resolução dos conflitos,
um determinado juiz olha para os problemas a partir de um ponto de vista histórico, outro sob um prisma filosófico, um terceiro a partir da utilidade social; um deles é formalista, outro é latitudinário, um deles tem medo da mudança, outro é insatisfeito com o presente; a partir do atrito de diversas mentes alcança-se algo que tenha constância e uniformidade bem maiores do que seus componentes individuais. 16
O pensamento de Benjamin N. Cardozo, como já antevisto delibera novas faces ao Realismo, pois quebra o ideal do formalismo, do mecanicismo à sentença, permite uma amplidão ao magistrado, a influência da empiria, de ciências afins ao Direito (sociologia, história, ética). Deste modo, permitira a possibilidade de julgar as lides envolvendo a aquisição de medicamentos de modo mais justo, pois analisa os fatos e contexto em que os requerentes estão inseridos. 15
CAVALCANTI, H. C.; RIBEIRO, F. T. C.., 2007 ?, p. 16.
16
CARDOZO, B. N., op. cit, p. 143. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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4
A FORÇA DAS DECISÕES PARA A O FORNECIMENTO DE REMÉDIOS E O
INFLUXO DO REALISMO CARDOZIANO
Após a análise supra, vem-se ao fulcro deste trabalho: a influência do Realismo Jurídico Cardoziano. Em outrora foi elucidado a teoria norte-americana de caráter filosófico e de aplicação ao universo jurídico, seus principais aspectos e relevância do seu estudo. Embora seja direito fundamental o acesso aos remédios para os fins de tratamento e combate às enfermidades, há um fosso de tal garantia e a realidade, como fora demonstrado neste artigo. Ora, esta ineficácia social viola o ideário proposto na Constituição Federal vigente, revelando que as camadas sociais mais pobres tendem a sofrer mais com a ausência de medicamentos, ademais,
ainda que os gastos com saúde representem parcela semelhante das despesas de pobres e ricos, os mais pobres gastam mais com remédios e os mais ricos têm despesa maior com plano de saúde. Do total gasto com saúde, o peso de medicamentos era de 74,2% entre os 40% mais pobres e só de 33,6% para aqueles que estavam no topo da pirâmide - os 10% mais ricos. [...] Os gastos com remédios entre os paraibanos correspondem a 62,4% dos gastos com saúde, o maior índice entre os estados do Nordeste.17
Esta situação reforça o grande número de ações objetivando a aquisição de medicamentos – como dito anteriormente, cerca de 240 mil até o ano de 2011. De modo pontual, faz-se recorte de algumas decisões do Tribunal Regional Federal da 5ª dos anos de 2011 e 2012 pertinentes ao tema (grifo nosso):
PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES PÚBLICOS - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DEFESA DE DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL - POSSIBILIDADE - PONDERAÇÃO DE INTERESSES PREVALÊNCIA DO DIREITO À VIDA SOBRE INTERESSE FINANCEIRO DO ESTADO - AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.- Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo ativo, interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, contra decisão que indeferiu pedido de tutela antecipada para fornecimento de medicamentos para a menor Josyene Melo dos Santos.- Aduz o agravante que propôs AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido de antecipação de tutela, em face da UNIÃO FEDERAL e do ESTADO DE PERNAMBUCO, pretendendo a prestação da tutela jurisdicional para garantir à menor Josyene Melo dos Santos, usuária do Sistema Único de Saúde, portadora de diabetes DMI-1, o tratamento medicamentoso com a INSULINA LANTUS, NOVORAPID e FITAS REAGENTES (PARA GLICOSÍMETRO), conforme dosagem recomendada na prescrição médica, em regime de gratuidade, tudo em consonância com a Constituição Federal, a Lei nº 8.080/90 e a NORMA OPERACIONAL DA 17
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ASSISTÊNCIA À SAÚDE - NOAS/SUS nº 01/2002.- [...] No mérito, estão presentes fundamentos suficientes a justificar a concessão da medida liminar indeferida em 1o grau, passando-se a determinar, assim, o fornecimento dos medicamentos postulados.- Em um juízo de ponderação acerca do conflito entre o interesse financeiro do estado e o direito à vida da menor, deve-se prestigiar o direito à vida, dada sua índole fundamental e inerente irreversibilidade.. 18 CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. PORTADOR DE DIABETES TIPO 1. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO PELO PODER PÚBLICO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. 1. Decisão que antecipou os efeitos da tutela "para determinar à União, ao Estado de Pernambuco e ao Município do Recife, de forma solidária, que assegurem o fornecimento gratuito" à ora agravada, nas dosagens recomendadas pelos seus médicos, "da insulina glargina e da insulina asparte, acompanhadas das fitas reagentes e glicosímetro, pelo tempo necessário ao tratamento, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, sob pena de multa diária no valor de R$ 5000,00 (cinco mil reais) por dia de atraso, para cada um dos réus. [...] 3. É possível a concessão de liminar contra o Poder Público, mesmo que ela tenha natureza satisfativa, quando for necessária para garantir o direito à vida. 4. A saúde é "direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" (Art. 196, CF). 5. A promoção, proteção e recuperação da saúde, prerrogativa jurídica indisponível, é dever do Estado, compreendidos no termo todos os entes políticos que compõem a organização federativa. 6. Incumbe ao Poder Público o dever de garantir a observância ao direito à vida e à saúde por meio de políticas públicas que visem à proteção e recuperação da saúde, nas quais se incluem os programas de fornecimento de medicamentos/tratamentos aos necessitados, sejam eles de alto custo ou não. 7. Na espécie, houve laudo e receita médica indicando a necessidade do remédio e sua adequação ao tratamento, o que se revela suficiente para impor a obrigação de fornecimento ao Poder Público, considerando, inclusive, a condição de hipossuficiência da parte agravada. 19 CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. COMPETÊNCIA SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTO. TERIPARATIDA (FORTÉO) MEDICAMENTO NÃO CONSTANTE DE PROGRAMA PÚBLICO. IRRELEVÂNCIA. DIREITO FUNDAMENTAL À VIDA E À SAÚDE. DEVER DO ESTADO. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ARTIGO 196. PRECEDENTES. 1. Responsabilidade solidária dos Entes Públicos em fornecer medicamentos ao autor. A Carta Magna de1988 erige a saúde como um direito de todos e dever do Estado (art. 196). Daí, a seguinte conclusão: é obrigação do Estado, no sentido genérico (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária para a cura de suas mazelas, em especial, as mais graves. [...] a Reumatologista que acompanha a paciente, respondendo às indagações da Defensoria Pública, informou que as opções terapêuticas disponibilizadas pelo SUS não oferecem resultados satisfatórios; que o medicamento indicado, FORTÉO, tem evidência científica e resposta terapêutica eficaz com ganho substancial de massa óssea, evitando fraturas com grande segurança; que não há qualquer outro medicamento com a mesma indicação clínica (fls. 25). Acrescente-se, ainda, à condição de hipossuficiência da autora e o alto custo do medicamento. Tratando-se de questão de enfermidade, o médico que acompanha o paciente é quem melhor tem condições de analisar o caso e recomendar a medicação mais adequada. 4. [...]. O administrador público não pode recusar-se a fornecer um medicamento 18
AG 00070557420104050000, Des. Federal Sérgio Murilo Wanderley Queiroga, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data: 12/05/2011 - Página: 362. AG 00107344820114050000, AG - Agravo de Instrumento – 117354, Des, Federal Francisco Cavalcanti, TRF 5 – Primeira Turma, DJE - Data: 19/12/2011 – Página: 489. 19
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comprovadamente indispensável à vida do requerente, usando como argumento a sua excessiva onerosidade, ainda mais sendo este o seu dever. 20 CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUSTEIO DE TRATAMENTO MÉDICO. PESSOAS CARENTES. DIREITO À SAÚDE. LEGITIMIDADE PASSIVA 'AD CAUSAM' DA UNIÃO. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. ATENDIMENTO AOS REQUISITOS AUTORIZADORES. POSSIBILIDADE. 1. Agravo de instrumento manejado em face da decisão que concedeu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela para determinar ao Estado do Ceará, o fornecimento do medicamento Herceptin (TRASTUZUMAB) à Agravada, com posterior ressarcimento das despesas pela União. [...] Há material probatório bastante a configurar a necessidade de atendimento da pretensão, na medida em que se cuida de necessidade legítima, e constitucionalmente protegida, uma vez assegurado o direito social à saúde e, em última análise, o direito fundamental à vida. 5. Presentes os requisitos legais para concessão da tutela antecipada, e visualizando o risco na demora da providência jurisdicional tenho possível a concessão da medida inaudita autera pars, não merecendo atenção a alegação da Agravante de existência de nulidade, pela citação posterior.21
Percebe-se que há uma leitura das questões econômicas, ver-se o caso em específico, pois a hipossufiência é preponderante para decisão e o direito ao fornecimento de remédios, à vida. Há possibilidade, seguindo as luzes realistas, da quebra do formalismo no tocante a vislumbrar o caso e logo após a norma - não se fala em negar a existência ou a coercibilidade, a força da lei, mas de exame do caso in loco. É percebido nitidamente que se abarca a dignidade da pessoa humana e aos demais princípios, retirando a órbita de interpretação mecanicista de aplicação do Direito. Deste modo, se sob o influxo de Realismo Jurídico Cardoziano, as decisões tendem a alcançar o ideal de justiça, a aproximação das partes à decisão tomada pelo magistrado. Cultua-se, neste sentido, o diálogo do trabalho desempenhado pelo juiz e a sociedade, isto é, que as decisões sejam condizentes com a localidade, que se estabelece um vínculo entre a norma, às experiências do julgador e sua decisão, por conseguinte.
5
CONCLUSÃO
Ante aos fatos expostos e a problemática dissertada ao longo deste artigo, percebe-se o quanto a saúde é preceito fundamental para a sociedade e que, na ausência de políticas públicas que visem sua concretização, há flagrantes danos ao corpo social. O Estado tem o AC 00051667120114058400, AC - Apelação Cível – 545911, Des. Federal Manoel Erhardt, TRF 5 – Segunda Turma , DJE - Data:13/09/2012 - Página: 230. 20
AG 00043341820114050000, AG - Agravo de Instrumento – 114363, Des. Federal Geraldo Apoliano, TRF 5 – Terceira Turma, DJE - Data: 23/07/2012 - Página: 325. 21
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dever de fornecer serviços de qualidades, dentre eles, o fornecimento de remédios aos que não têm condições de comprar os medicamentos. Por sua vez, com a dificuldade de adquirir os fármacos, dar-se o ingresso de ações pleiteando o direito ao uso destas substâncias para o tratamento de doenças. A judicialização da saúde demarca o movimento de repassar ao Poder Judiciária a possibilidade de, através das decisões, executar as políticas insatisfatórias dos gestores públicos. No aspecto de fornecimento de medicamentos os casos são mais gravosos, pois há grande onerosidade, mormente, aos cidadãos sob a jurisdição do Tribunal Regional Federal da 5ª Região - Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe. É imprescindível que se julgue vislumbrando as necessidades locais e os vetores socioeconômicos. As circunstâncias imanentes ao povo nordestino exige uma maior diligência por parte do magistrado ao emitir sua decisão, deve revestir-se de caráter sociológico e de não distanciamento da realidade. O Realismo Jurídico Cardoziano é norteado por estas características além de, p. ex., a quebra do formalismo exacerbado que entrava o andamento do processo – no caso de saúde geralmente com urgência do pedido -, da empiria e da visão mais próxima do magistrado aos promoventes. Apesar de norte-americana, tal orientação jusfilosófica tem possibilidade de aplicação ao Direito brasileiro. Para Cardozo, atenta-se, haveria direito no momento do julgamento, por excelência. Dessarte, acerca da temática, adquirira eficácia o direito à medicação a partir da prolação do juiz. Na análise feita com uma pequena – ressalta-se – mostra de jurisprudência do Egrégio Tribunal é compreensível a sua utilização e visível se faz ao instante que se concede o pleito aos hipossufientes. O magistrado imbuído de suas perspectivas, experiências e examinando caso a caso contribui para perseguição à justiça social. Conclui-se que há sim, respondendo ao problema, possibilidade de influência do Realismo Jurídico Cardoziano nas decisões examinadas. É inilidível que provocar novos paradigmas para a efetivação e melhor atendimento aos direitos fundamentais são, indubitavelmente, indissociáveis ao cotidiano pátrio. REFERÊNCIAS BARCELLOS, A. P. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais: O princípio da dignidade da pessoa humana. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.
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1413-8123. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232010000500015>. Acesso em: 09 mar. 2013.
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A EDUCAÇÃO COMO UM DEVER FUNDAMENTAL DO ESTADO BRASILEIRO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE UNIVERSALIZAÇÃO Kamila Kelly Dos Santos1 Daniel Ferreira de Lira2 Sumário: 1 Introdução. 2 O Panorama Educacional no Brasil de hoje. 3 Do Direito a Educação Básica. 4 Conclusão. Referências.
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INTRODUÇÃO
Refletindo um pouco sobre o que seja educar, pode-se destacar o que alguns teóricos revelam sobre a temática. Para Forquin (2005, p. 88), por exemplo: [...] Educar, ensinar é colocar alguém em presença de certos elementos da cultuara a fim de que ele dele se nutra, que ele os incorpore as suas substancias, que ele construa sua identidade intelectual e pessoal em função deles¹. Cabe ainda destacar que, a escola se propõe a ver a cultura letrada com alguma reverência; é também onde se produz e se difunde o conhecimento. Ao retrocedermos um pouco no tempo, nota-se a discussão dessa temática pelos franceses no século XVIII, de modo que, a escola desenhada pelos revolucionários franceses, era tida por universal e única para todos. Surgiu como bandeira de luta da escola moderna do Estado, o sonho republicano por um sistema de ensino público, gratuito, laico, universal, único, e obrigatório. Seria universal por pretender colocar na mesma classe, todas as crianças, todos os jovens – meninos e meninas, ricos e pobres, loiros e morenos, católico, protestante, judeu ou mulçumano. Supunha-se único, porque o ensino ministrado, no conjunto, deveria ser o mesmo quanto a seus conteúdos e métodos, para todos os estudantes, independente de quaisquer identidades e ideais comunitários por eles abraçados. A cerca da definição de educação formulada por Durkheim, a despeito de forjada no início do século XX, mantém-se ainda toda a sua atualidade, pois, segundo o pai da Sociologia: A educação tem por objeto suscitar e desenvolver na criança um certo numero de condições físicas, intelectuais e morais que dela reclamam seja a sociedade política em seu conjunto, seja o meio social a que ela se destina particularmente. [...] poder1
Graduanda em Direito. E-mail: kamilaksantos@gmail.com Professor Universitário. Membro do Ministério profdaniellira@hotmail.com 2
Público
do
Estado
do
Ceará.
E-mail:
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se-á dizer, que em cada um de nós, existem dois seres que, [...] não deixam de ser distintos. Um é constituído por todos os estados mentais que apenas se referem a nós próprios e aos conhecimentos relacionados com a nossa vida pessoal: e aquilo que poderíamos chamar de ser individual. O outro é um sistema de idéias², de sentimentos e de hábitos que expressam em nós, não a nossa personalidade, mas sim o grupo, ou os diferentes grupos de que fazemos parte; é o caso das crenças religiosas, credos e práticas morais, [...], opiniões coletivas de qualquer espécie. O seu conjunto constitui o ser social. A constituição desse ser em cada um de nós, eis a finalidade da educação’ ³. (DURKHEIM, 1984, p. 17)
No entanto, em pleno século XXI, observa-se ainda crianças e jovens, que ao em vez de estarem na escola, estão perambulando pelas perigosas ruas das cidades desenvolvendo algum tipo de trabalho informal, enquanto os pais estão esperando a ajuda financeira que os filhos conseguem, quando conseguem, porque quando não levam nada para casa, na maioria das vezes acabam sendo vítimas de agressões, o que vai de encontro com o disposto na Constituição, no seu art. 226 § 8º, segundo o qual: O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. Os pais, muitas vezes fazem uso de suas competências, para eximir do filho o direito de, por exemplo, ir à escola, principalmente as famílias que se encontram em estado de severa precariedade social, que em muitos casos, ainda os obrigam ao trabalho, porém, os filhos submetem-se ao poder dos pais, nos limites de direitos e deveres estabelecidos em lei, esperando que eles atuem em prol de seu benefício, zelo e proteção integral.
2
O PANORAMA EDUCACIONAL NO BRASIL DE HOJE
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no último censo realizado em 2010, o Brasil tem mais de quatro milhões de crianças e adolescentes no mercado formal e informal do trabalho, destes 6,22% tem entre 10 e 14 anos. Como consequencia, segundo dados, do Ministério da Saúde, 52,17% dos acidentes graves de trabalho, tem criança e adolescente com vítimas, a maioria destes 29,73% não completou sequer o ensino médio. Ainda segundo dados do IBGE, 966 mil crianças e adolescentes de 6 a 14 anos não frequentavam a escola, o que equivale a 3,3% do total da população nessa faixa etária, na Paraíba, estado no Nordeste brasileiro, por sua vez, de um universo de 133.922 pessoas de 5 a 19 anos 20,5 estão fora das instituições de ensino, ou seja, mais de 15% do total. Percebe-se, portanto, que com tais estatísticas, certas consequências são inevitáveis, podendo-se elencar a CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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geração de graves prejuízos ao desenvolvimento cognitivo, cultural e psicológico, provocando retração no desenvolvimento da criança e do adolescente a médio e longo prazos; e ainda as crianças, adolescentes e jovens que são obrigados a ingressarem cedo no mercado de trabalho estudam menos, tendo acesso na sua fase adulta a empregos em condições precárias, acabando dessa forma, por engrossar o contingente de mão de obra desqualificada, em um ciclo de pobreza e abandono, pois estes adultos terão uma menor renda per capita, produzindo menor rendimento e reproduzindo como resultado maiores níveis de desigualdades. Outro ponto a ser observado, é que, a rigor, as famílias que submetem seus filhos a algum tipo de trabalho possuem condições econômicas precárias, assim, muitas delas, recebem por parte do governo ajuda de programas assistenciais, a exemplo do Programa Bolsa Família (PBF), que é um programa que beneficia famílias em situação de pobreza e extrema pobreza no país. Este programa impõe condições que reforçam o acesso a direitos sociais básicos nas áreas de educação, saúde e assistência social. Uma das condições que deve se cumprida pela família beneficiada é: a frequência escolar de 85% (oitenta e cinco por cento) em estabelecimento de ensino regular, disposto pelo art. 3o A da lei 10.836, que regulamenta o programa e acentuado pelo que dispõe o art. 55 do ECA e art. 1.634, I do Código Civil: os pais, os responsáveis têm a obrigação de matricular seus filhos na rede regular de ensino; dirigir-lhes criação e educação. Mas, Por que, mesmo assim, ainda existem tantas crianças e jovens fora das salas de aula no Brasil, segundo o CENSO/IBGE/2010. A resposta encontrada é plúrima, mas é preciso, primeiramente, lembrar que compete ao Poder Público, junto aos pais ou responsáveis, zelar pela frequência à escola dos educandos (art. 54 § 3º do ECA); bem como cabe aos dirigentes de estabelecimento de ensino fundamental comunicar ao Conselho Tutelar em caso de reiteração de faltas injustificadas (art. 56, II do ECA), para que desta forma possa-se apurar os fatos e comunicá-lo à justiça; Há, nesse ponto, uma falha na execução da política pública de educação gratuita no Brasil, que conta com uma SecretariaExecutiva com a finalidade de coordenar, supervisionar e
avaliar cumprimento das
condicionalidades do PBF (Art. 5o da lei 10.836) . Porém, tal vistoria parece não estar ocorrendo a contento, pois encontra-se falhas ou inobservância das condições impostas. Aponta-se como possível solução, um efetivo movimento da sociedade na luta para que a educação ocupe papel principal na vida das crianças e jovens, que estes possam ter asseguradas condições para que tal dever fundamental do Estado e da família brasileira, se concretize; que mais recursos sejam aplicados nesse setor, e que o governo ofereça não apenas CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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programas assistenciais, mas sobretudo, ofereça condições para a geração de emprego e renda para estas famílias. Voltando a atenção para o governo e demais órgãos competentes, percebemos certa ineficiência do disposto na Constituição, que dispõe no seu art. 226: A família, base da sociedade tem especial atenção do Estado. Contudo, tal atenção parece não existir adequadamente, uma vez que é grande o número de crianças e adolescentes longe dos cuidados e proteção familiar e do amparo estatal. Tal situação deve ser revista, pois, compete privativamente à União legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional (art.22, XXIV, CF), cabendo também tanto a União quanto aos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: proporcionar meios de acesso à cultura, à educação, e à ciência (art. 23, V, CF), assim como é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Publico assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar (art. 4º ECA). Assim sendo, percebe-se que entre o que está garantido por lei e o que de fato está sendo efetivado, há uma enorme lacuna, de modo que a educação pública básica acaba sendo de má ou baixa qualidade e os recursos destinados à educação são, muitas vezes, insuficientes. De acordo com o art. 212 da Constituição Federal: a União aplicará nunca menos de 18%, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios 25%, no mínimo, da receita resultante de impostos, em educação. Encontra-se ainda na Carta Magna, no art. 227:
É dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar a criança, ao adolescente e ao jovem com absoluta prioridade o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, além de colocá-lo a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Mais uma vez, a contrariedade do que existe com o que é garantido por lei é evidente, pois uma criança ou adolescente, que se encontra na rua ou desempenhando algum tipo de trabalho, está distante de ter assegurado quaisquer itens básicos para uma melhor condição de vida como saúde, boa alimentação, cultura, lazer, educação, e muito menos profissionalização, pois, muitos deles nunca foram sequer à escola, quando na verdade, esses menores e a sociedade como um todo, deveria perceber a cada dia a o cumprimento e respeito CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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da lei. Num país como o Brasil, que ambiciona o desenvolvimento pleno e sustentável, é importante a expansão do número das escolas, para que se ampliem também as possibilidades daqueles que não tiverem acesso a ela desfrutar desse direito fundamental. De maneira geral a sociedade na pós-modernidade ainda acredita na existência e na competência do Estado para concretização dos seus objetivos básicos, tais como: saúde, segurança, educação de qualidade, entretanto, tem seus objetivos frustrados, contribuindo dessa forma para aumentar o número de excluídos e de crianças e jovens sem horizontes.
3
DO DIREITO À EDUCAÇÃO BÁSICA
Por estarmos inseridos numa sociedade, que possui regras postas por autoridades competentes, que tem por objetivo a efetivação de direitos sociais básicos, podendo-se destacar dentre outros: cultura, lazer, esporte, segurança, saúde, educação, etc. No tocante a este último, constitui dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente a educação básica obrigatória gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiverem acesso na idade própria (art. 208, I, CF, alterado pela EC 59/2009; art. 54, I, ECA). A norma deixa claro que a educação básica, engloba também, educação infantil – prestada às crianças de zero aos cinco anos de idade, e de acordo com o julgamento do RE 436.996/2005, relatado pelo Ministro Celso de Mello, o STF garantiu o direito constitucional à educação, e que os Municípios e o Poder Público têm o dever de oferecer creche e acesso à pré-escola a todas as crianças que delas precisarem – ensino fundamental – se inicia aos seis anos e terá duração de nove anos, assegurada a todos os que não tiveram acesso na idade própria – e ensino médio – terá duração de três anos, assegurada a todos os que não tiveram acesso na idade própria, bem como, a universalização deste tipo de ensino, ou seja, que possa ser estendido a todos sem distinção (art. 208, I, CF; art. 54, II, ECA). A educação infantil constitui a primeira etapa da educação básica, sendo extremamente importante para o processo de desenvolvimento e aprendizagem posteriores. Para tanto, requerem-se melhoria da qualidade da orientação pedagógica, maior compromisso dos governantes com as crianças, ampliação dos recursos destinados ao desenvolvimento de atividades artísticas, ao lazer, a cultura, entre outros, ampliação do número de vagas, bem como implementação de programas que visem erradicar ou amenizar o problema do trabalho CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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infantil.
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CONCLUSÃO Assim, em meio ao que foi tratado ao longo deste artigo em relação aos nossos
jovens, adolescente e crianças, e a constatada falha do Estado em não cumprir efetivamente com seus deveres fundamentais e observar, com exatidão, o que se encontra na Constituição Federal, pode-se apontar alguns possíveis caminhos para atenuar estes problemas tais como: maior atenção dos governantes para com nossas crianças e jovens, repasse maior de verbas destinadas ao ensino, maior número de órgãos de assistência e amparo para os menores, geração de maior número de emprego, sobretudo para as famílias com condições econômicas inferiores. Especialistas têm apontado ainda a implantação de escolas com ensino integral e o aperfeiçoamento daquelas em que já existe esse tipo de ensino, para que os educandos, além do estudo e da alimentação, disponham também de cultura, lazer, cursos profissionalizantes para os estudantes do ensino médio, para que através os jovens sejam encaminhados para o mercado de trabalho. Acrescentando por fim para melhoria dessa situação, o estabelecimento de oficinas pedagógicas para crianças e adolescentes, e o oferecimento de mais espaços destinados à cultura, à arte, o lazer, o entretenimento e, sobretudo educação já que esta constitui a base para o desenvolvimento do nosso país. Só dessa forma poderemos construir uma sociedade mais digna e com possibilidades de avanço.
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DIREITO E FEMINISMO: INTRODUÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO DE UMA TEORIA CRÍTICA Kamylla da Silva Bezerra1 Fernanda Isabela Oliveira Freitas 2 Sumário: 1 Introdução. 2 Os propósitos da(s) teoria(s) feminista(s) ao longo do tempo. 3 Teoria Feminista do Direito. 4 Conclusão. Referências.
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INTRODUÇÃO
Não são poucas as entidades e organizações que trabalham com o tema dos direitos das mulheres em nosso país, realizando intervenções na prática. No entanto, quando se trata do interesse pela reflexão teórica feminista sobre o direito a carência é quase absoluta. Tal afirmação se concretiza nas pesquisas realizadas por Buglione (2008), onde ficou constatado que raras são as publicações dedicadas ao tema; faltam revistas especializadas e praticamente inexistem grupos de pesquisa na área. Pode-se explicar a existência de uma desconfiança dos estudos feministas em relação à ciência jurídica pelo fato de que nela ainda perdura uma representação do direito como técnica de controle social neutra, universal e abstrata, quando, na realidade, o direito já representa um ponto de vista sexualizado. Ademais, segundo Revillard e Lempen (2008), aos olhos dos juristas o feminismo parece prescrever mais “uma teoria contra o direito do que propriamente uma teoria no direito”. Rabenhorst (2010)preceitua que no interior da abordagem de algumas feministas acerca do direito, encontra-se a suspeita de que este serviria para instaurar e manter um sistema de dominação que subjugaria as mulheres e os grupos com sexualidades divergentes em relação aos padrões tradicionais. Tal análise é exposta por Olsen (2000), a partir da premissa de que o pensamento liberal é dividido em pares hierarquizados numa sobreposição do masculino em relação ao feminino. O autor explica segundo os pares opostos racional/irracional, ativo/passivo, pensamentos/sentimentos, razão/emoção, cultura/natureza, poder/sensibilidade, objetivo/subjetivo, abstrato/concreto, universal/particular, que os Graduanda em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. Bolsista de Iniciação Científica do CNPq. E-mail: mylla_74@hotmail.com 2 Professora da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas – FACISA. Mestre em Letras pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. Graduada em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. E-mail: professorafernanda.isabela@hotmail.com 1
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primeiros – superiores – são atribuídos aos homens, ao passo que os segundos, às mulheres e o direito é associado aos primeiros, – racional, objetivo, abstrato e universal - o que leva a concluir que o direito, de fato, tem sexo e que este é masculino. No entanto, cabe salientar que nem todas as perspectivas feministas são tão descrentes em relação ao meio jurídico. Para Williams (2004), por exemplo, a linguagem jurídica desempenha papel fundamental no processo de emancipação dos sujeitos subalternos, na medida em que para quem nunca teve sua dignidade reconhecida, poder-se ver como sujeito de direitos é uma aquisição fundamental que não deve ser desprezada nem por aqueles que desfrutam confortavelmente do formal mundo jurídico. Nesse ponto de vista, entendendo a teoria feminista como uma categoria analítica e crítica do direito das mais importantes entre aquelas produzidas no séc. XX, convém citar um apurado inventário das principais transformações passadas pelo campo jurídico nas últimas décadas, e que contaram com a decisiva atuação do movimento feminista: compreensão renovada da relação igualdade/diferença; questionamento da separação público/privado e reivindicação de interferência do judiciário na esfera doméstica; propositura de outras formas de solução de conflitos; entre outros. Dessa forma, apontando a teoria feminista como um projeto concreto de transformação do direito, suscita-se que sua abordagem constrói uma teoria crítica que não deve ser negligenciada pelos juristas brasileiros, visto que esta proporciona uma reflexão produtiva sobre os limites do formalismo jurídico e da teoria liberal que lhe oferece sustentação.
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OS PROPÓSITOS DA(S) TEORIA(S) FEMINISTA(S) AO LONGO DO TEMPO
Cabe inicialmente esclarecer que falar em feminismo no singular, como foi feito até agora, é incorrer em grande equívoco. Estar diante de um pensamento que não se caracteriza de forma singular, ou de uma prática política homogênea ,justifica tal fato, pois a história do feminismo abarca uma série de teorias que apontam sua herança filosófica comum no liberalismo do séc. XIX. Na perspectiva de Nye (1995), algumas das teorias feministas mais importantes na perspectiva histórica e que explicam a evolução desse movimento durante as revoluções e modificações sociais, podem ser destacadas. A saber, têm-se os chamados: feminismo liberal; CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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feminismo marxista; feminismo existencialista e, finalmente, o feminismo dos estruturalistas da linguagem. As primeiras justificações sistemáticas dos direitos das mulheres foram tomadas de empréstimo à teoria liberal e democrática. A panaceia democrática do voto era o foco da luta feminista. John Locke, Jean-Jacques Rousseau e os utilitaristas modelaram um mundo no qual os homens podiam ser livres e iguais e uma sociedade onde estes determinariam seus próprios destinos. No entanto, essas ideias jamais pretendiam aplicar-se às mulheres. As reformas democráticas da Revolução Francesa foram teorizadas como que beneficiando apenas as mulheres indiretamente: por serem dependentes dos homens, logo, estarão em melhor situação porque os homens estarão em melhor situação. Na primeira grande onda de feminismo do séc. XIX, a principal questão era o sufrágio. Outras questões (direito de propriedade, reforma do casamento e liberdade sexual) eram discutidas, mas o foco era o voto como modo correto e mais prático para as mulheres atingirem suas metas, acreditando que quando estivessem aptas a votar, o fariam em favor de uma legislação que corrigiria as injustiças praticadas (NYE, 1995). Assim, a primeira defesa sistemática dos direitos das mulheres veio de John Stuart Mill e Harriet Taylor.Mill era utilitarista na tradição bethamista, membro do grupo Radical Filosófico, e após encontrar-se com Harriet aproximou-se cada vez mais dos Radicais Unitaristas. Estes eram mais literários, mais radicais e mais libertários que os utilitaristas, sobretudo em questões de família e sexualidade. Com argumentos por uma sociedade na qual os interesses de todos os homens fossem considerados e, ao mesmo tempo, na qual os direitos individuais de cada homem fossem protegidos, Mill e Taylor descobriram a justificação para uma correspondente revolução feminista. Seus argumentos formaram agenda para os anos seguintes de feminismo liberal. O utilitarismo de Bentham (1979) serviu de base para a construção teórica de Mill, onde se entendia que as coisas humanas eram governadas por dois senhores soberanos: o prazer e o sofrimento. A partir da perspectiva benthamista pretende-se que a sociedade nada mais é do que um punhado de indivíduos que procuram o prazer e evitam o sofrimento, e uma sociedade justa é aquela na qual se produz o máximo de prazer e o mínimo de sofrimento. Assim, toda lei ou ação que cause a máxima felicidade e o mínimo sofrimento é justa. Dessa forma, são esclarecidos dois princípios importantes da reforma política: nenhum prazer deve ser superior a qualquer outro, exceto quanto à quantidade, e cada pessoa deve ser considerada o melhor juiz do seu próprio prazer. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Como se disse, o voto feminino era o mecanismo pelo qual as outras reformas seriam conquistadas e os interesses das mulheres alcançados, assim, reivindicava-se que o voto deveria ser para todos, e todos não podia significar a metade masculina. Os argumentos de Bentham (1979) se aplicam nesse contexto: as mulheres têm interesses, sofrem, desfrutam prazer e, em que base não seriam elas o melhor juiz de como esses interesses devam ser atendidos? No entanto, o utilitarismo de Bentham tinha uma fragilidade, como observara Mill (1961). E se as mulheres não quisessem votar, ter empregos, serem educadas? Em meados do séc. XIX a maioria das mulheres não apoiava o sufrágio feminino. Assim, se a avaliação que a mulher faz do seu próprio prazer não é confiável, então o utilitarismo que servia de base para a teoria liberal, por si só, é inadequado para a defesa dos direitos das mulheres. Já em 1900, outro tipo de feminista existia: a mulher que trabalhava. É o caso da feminista socialista Flora Tristan, que podia falar por experiência própria de miséria, más condições de trabalho e do desespero da prostituição. Podia-se também comparar a Emma Goldman, nascida na Rússia em 1869 em uma família pobre. Essas mulheres não tinham quaisquer das vantagens da posição da classe ou riqueza das feministas liberais. Nessa etapa, acreditava-se que o antídoto para a opressão das mulheres não era a legislação, mas uma organização de trabalhadores. As feministas não deviam tentar descobrir nas estruturas socioeconômicas existentes os meios legais de defender os interesses das mulheres, mas trabalhar para destruir aquelas estruturas. Argumentava-se que a opressão das mulheres era só superficialmente causada pelas leis ou falta delas e que, no entanto, a exploração de uma classe por outra encontrava-se na base da essência do capitalismo (GOLDMAN,1970). Nascia, assim, o feminismo marxista. Seguidor de Friedrich Engels, o social-democrata August Bebel influenciou feministas como Alexandra Kollatai e Clara Zektin, com seu livro “Womanundersocialims”. Bebel se empenhava em tentar convencer seus companheiros socialistas de que as mulheres trabalhadoras deviam ser iguais aos homens no Estado socialista. Bebelse inspirava na genealogia de Engels (1884) do sexismo: a família monogâmica, chefiada pelo homem, advém da propriedade privada3.
Os defeitos das
mulheres seriam advindos de sua situação degradada e podiam ser corrigidos na nova 3
Engels mostrava que o sexismo não era universal, visto que houve tempo que a terra era possuída comunalmente, quando a herança era através da mãe, quando o trabalho da mulher tinha mesmo valor que o dos homens. A família, tal qual como conhecemos, nasceu com a propriedade privada, que também causa “a derrota histórica mundial do sexo feminino”. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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sociedade socialista (BEBEL, 1904). Assim, o autor pretendia que com o alvorecer do socialismo, as mulheres teriam direitos trabalhistas iguais aos dos homens, seriam educadas e teriam participação à semelhança masculina. Entretanto,a teoria marxista deixa de lado as questões de família e sexo por se tratarem de assuntos privados e nada terem a ver com a produção. A sugestão de que novas formas sexuais e familiares pudessem ser criadas pelas mulheres enfrenta desaprovação, visto que tais discussões não eram consistentes com o modelo sindicalista de organização dos trabalhadores, sendo tratadas como atividades não produtivas (NYE, 1995). Desse modo, embora nessas análises a ideologia ou o discurso estejam relacionados com estruturas econômicas, as categorias analíticas feministas devem pouco à teoria marxista, visto que esta não oferecia uma explanação histórica da opressão de mulheres ou um modo de situar a opressão em realidades materiais específicas, nem um programa de ação. Não era possível, assim, analisar a reprodução da personalidade humana na família, porque na teoria marxista não são as personalidades, responsáveis pela mudança social. Ademais, existe uma lacuna na exposição de Friedrich Engels sobre o momento em que a estirpe feminina foi derrubada. Se as relações de propriedade é que devem ser culpadas, para que estas não sejam um simples demônio machista, como esclarece Nye (1995),deve-se explicar também o porquê de as relações de propriedade terem sido constituídas em primeiro lugar contra a comunidade, e especificamente entre os homens. Sem essas explicações as ligações entre o sexismo e relações produtivas não prevalecem, e a produção assume uma precedência automática que assegura a correção do sexismo independente da real situação das mulheres. Assim, não tendo explicado o fenômeno em questão, o marxismo é incapaz de elaborar um programa adequado para a libertação das mulheres. Por conseguinte, surge Beauvoir (1949) tentando repensar as condições de existência feminina num contexto onde não sobra nenhuma certeza. Deus foi destronado pela razão científica, e agora a religião não tinha nem mesmo a validade subjetiva de outrora. Ao mesmo tempo, a batalha pela igualdade jurídica foi amplamente vencida; as mulheres votavam, podiam ter propriedade, eram juridicamente iguais no casamento e a sociedade civil parecia aceitá-las como membros atuantes. Assim, o enfoque representado por Simone de Beauvoir em O segundo sexo, não tinha como base ideológica a economia ou a política, mas a filosofia. O existencialismo seria a perspectiva pela qual se teriam condições de compreender a situação das mulheres. E isto será possível porque trata de indivíduos humanos, e não de coletividades mudas como fazia a CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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teoria marxista. Assim, um feminismo existencialista poderia oferecer um estudo tanto da opressão das mulheres como de sua emancipação. Qualquer exame que Beauvoir faz em seu livro, envolve o existencialismo. Para a autora a luta de classes não é por si explicativa, pelo contrário, a apropriação masculina da propriedade privada só é inteligível como projeto do individuo de autoafirmação e transcendência. A autora afirma que a alteridade da mulher é anterior às relações de propriedade e que esta se faz necessária para obter o entendimento da razão pela qual, as relações de propriedade assumem as formas que têm. Da perspectiva existencialista pode-se dar uma exposição alternativa das origens do sexismo que responde à questão de por que não foram as mulheres a firmar direitos de propriedade. Isso não se deve, dizia Beauvoir (1949), a qualquer tipo de essência feminina, mas à situação da mulher. Assim, se explica que a inferioridade da mulher não é natural, fisiológica ou psicológica. A mulher não tem essência, tanto quanto nenhum ser humano tem. A opressão das mulheres fica ainda mais poderosa naquilo em que é mascarada por trás da natureza, por trás da crença de que o destino das mulheres é a passividade, pois não se pode rebelar contra a natureza. Beauvoir (1949) não negava a existência do feminino e do masculino, mas afirmava que a aceitação dessas categorias (institucionalização na família e no trabalho) é que perpetuavam a inferioridade das mulheres. De acordo com Nye (1995), do existencialismo de Beauvoir surge o feminismo radical, que herda uma fragilidade teórica que a torna inevitável na prática. Segundo a autora, em primeiro lugar, o poder como artifício teórico é por demais rústico para explicar a complexidade da interação humana. Mesmo que fosse verdade que os homens precisem representar o papel opressor, como afirmava Beauvoir (1949), as origens sociais e ideológicas dessa necessidade devem ser examinadas. A teoria feminista radical não consegue explicar porque desde o inicio da história existencialista foram os homens que se afirmaram. Beauvoir (1949) recorreu ao determinismo biológico para tal esclarecimento: as mulheres devem dar à luz e por isso estão em desvantagem, o que acaba por enfraquecer tal linha de abordagem pela falta de inovação. Entretanto, surge a perspectiva de que não é a “natureza” ou qualquer realidade física que determina a posição inferior das mulheres, mas uma diferença de “pensamento”, como afirmava Lacan (1982), acrescentando que a única diferença real é que as mulheres não sabem o que estão dizendo. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Essa linha de pensamento, pertencente aos estruturalistas da linguagem, observa que são comuns os pares de palavras semelhantes ao significado, mas diferentes em relação ao gênero. Era de se esperar que o conteúdo semântico dessas palavras não se alterasse, e que apenas o gênero mudasse, no entanto, não é isso que acontece. Nye(1995) exemplifica as palavras “solteirona” e “solteirão”, onde a primeira nada tem de aspecto satisfeito e requintado da segunda, indicando mais fracasso e inatratividade. Assim, segundo essa abordagem, fica a impressão de que não existem palavras neutras com que se possa tentar indicar uma relação masculino/feminina na qual a mulher seja dominante ou igual. Acredita-se que poder e feminilidade são contraditórios, que o componente semântico da dominância é masculinizado e que a inferioridade das mulheres é codificada na linguagem. Nesse diapasão, a força semântica dos sufixos femininos é semelhante na vinculação de feminilidade e impotência. Exemplificando, há herói e heroína, garçons e garçonetes, sacerdote e sacerdotisa, poetas e poetisas. A transição sexual é indicada na força diminutiva do sufixo acrescentado. Nye (1995) aponta que os títulos são mais uma maneira de denotar a diferença masculino/feminino codificada na linguagem. Cada indivíduo é tratado como masculino (senhor) ou feminino (senhorita e senhora). Entretanto, a diferença é assimétrica: o estado civil da mulher é codificado, ao passo que o do homem não. Isto reflete a expectativa de que a identidade da mulher depende da identidade do seu marido. O exemplo mais frequentemente criticado do sexismo linguístico é o emprego genérico de “homem”. No caso, persiste a valorização do masculino, não tanto a codificação da inferioridade do feminino. “Evolução do homem”, “direito do homem” e expressões afins indicam que o ser propriamente humano é masculino. Dessa forma, esses e outros exemplos fizeram com que, no ponto de vista das linguísticas feministas, houvesse a conclusão de que a diferença de sexos encontra-se embutida no vocabulário disponível, tornando improvável que no atual estado essa linguagem possa ser um veículo de expressão das mulheres.
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TEORIA FEMINISTA DO DIREITO
As teorias feministas do direito ocupam lugar de destaque no meio acadêmico norte americano, no entanto, elas são praticamente ignoradas nos estudos jurídicos de nosso país. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Segundo Rabenhorst (2010), este fato pode ser justificado pela falsa representação de que tal abordagem seria parcial, atendendo apenas aos interesses de um grupo específico. Mas, na realidade, as teorias feministas questionam exatamente essa suposta imparcialidade do direito. Por outro lado, falar em “crítica feminista” implica pensar em um conjunto nada homogêneo de ideias que procuram compreender porque as mulheres “continuam a ocupar uma posição/condição subordinada (BANDEIRA, 2008). Facio (1999) observa que as correntes feministas são denominadas como “críticas” por buscarem algum grau de transformação do status das mulheres e pretenderem modificar as relações de poder entre os gêneros, o que, por sua vez, alteraria radicalmente a estrutura da sociedade e do pensamento. Em suma, o feminismo é uma teoria crítica por se apresentar como uma denúncia da situação de opressão das mulheres. Young (2000) afirma que tal opressão ocorre em cinco níveis básicos: exploração, marginalização, carência de poder, imperialismo cultural androgênico e violência.Em seguida,o autor define, sobre “prática teórica”, que o pensamento não é apenas uma ferramenta para a produção de conceitos, mas que representa também um instrumento tático a serviço da transformação do mundo e da emancipação do gênero humano. Ademais, conforme preceitua Horkheimer (1983), as teorias se caracterizam como críticas porque procuram tornar os indivíduos conscientes da relação de dominação sob a qual se encontram. Em seguida, o autor declara que as teorias são críticas, também, porque são emancipatórias, ou seja, buscam libertar os indivíduos. Assim, esclarecido o porquê de a teoria feminista ser considerada como crítica ao direito, cabe ressaltar que segundo Smart (2000) existem três correntes que explicam o direito dentro do feminismo: feminismo igualitário; feminismo radical e feminismo pós moderno. O feminismo igualitário traz das teorias democrática e liberal a noção de que o direito não é sexista por natureza e que pode ser reformado em busca de igualdade e liberdade. Daí, surgem as reivindicações pelas mudanças na legislação referente aos direitos das mulheres do séc. XIX, como o direito ao voto, à propriedade, ao divórcio, entre outros. Ademais, a partir dessa perspectiva tinha-se a crença de que o meio legal seria a principal porta para a emancipação feminina. Já o feminismo radical se divide em duas correntes: feminismo da diferença e da feminilidade. A partir da primeira perspectiva, tem-se que as mulheres devem ter direito ao voto não por serem iguais aos homens, mas ao contrário, justamente por serem diferentes não podem por eles ser representadas em suas escolhas perante a sociedade (HIGGINSON, 1882). CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Já, na concepção do feminismo da feminilidade, Gillian (1990) afirmava que existia um jeito feminino de se resolverem os conflitos morais e jurídicos, e que este não devia ser inferiorizado. O feminismo pós-moderno surge em meados da década de 90, marcado pelo desaparecimento do ativismo dos anos 60 e 70, e constituindo um período de consolidação da teoria feminista. A partir daí abre-se uma nova perspectiva analítica do conceito de gênero, inicialmente utilizado para a compreensão dos limites impostos às mulheres pelas normas da feminilidade e organização da família e trabalho, agora estendido à compreensão dos limites impostos aos homens pelas normas de masculinidade (CONNELL, 1995). Ademais, essa orientação feminista questiona os valores sobre os quais se fundamenta a noção tradicional de ciência, apontando a necessidade de superação da visão positivista entre conhecimento e valor, reclamando um novo entendimento sobre a noção de objetividade científica. Não se trata, no entanto, de questionar o rigor exigido da ciência, mas sim da delimitação entre os saberes majoritários e minoritários. Assim, no que tange ao aspecto jurídico, percebe-se que se faz necessária a crítica à teoria do direito tradicional, sugerindo, dessa forma, mudanças na maneira de se perceber o direito. Além disso, a crítica feminista coloca como desafio principal a correção do nosso olhar, mirando menos a norma jurídica e mais as relações sociais.
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CONCLUSÃO
Portanto, tem-se como certo que o feminismo sempre se posicionou de forma extremamente questionadora em relação ao mundo jurídico, o que justifica sua denominação como teoria crítica do direito. Dessa forma, inúmeros institutos fazem uso dos conceitos utilizados pelas teorias feministas, a exemplo do conceito de gênero, que está longe de ser apenas um detalhe de aspecto normativo, devendo assumir uma postura nevrálgica em qualquer leitura que seja feita da lei 11.340/2006. Igualmente, uma teoria feminista do direito, pautada pela militância intrínseca das demais teorias críticas, contribui para a concretização dos direitos humanos e fundamentais das mulheres no Brasil, os quais são constantemente violados em nosso país em atos advindos do próprio Estado ou de particulares. Ademais, a partir desse ponto, pode-se dizer que ao contrário do que sustenta o formalismo jurídico, o direito é indeterminado, inconsistente e ambíguo em relação às CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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questões de gênero. No entanto, frisa-se que mesmo apresentando pontos em comum, as feministas ainda não encontraram um acordo quanto à função do direito, mas deixam claro que alguns de seus institutos devem ser repensados para que seja possível assegurar os direitos fundamentais de cada cidadão no Estado de Direito. Para além das modificações, se faz necessário que os operadores de direito se façam aptos a entender e por consequência combater as atuais discriminações, promovendo, inclusive dentro do próprio Sistema de Justiça brasileiro, a igualdade material entre homens e mulheres.
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SENTENÇA DE DIVÓRCIO REALIZADO NO ESTRANGEIRO: HOMOLOGAÇÃO NO BRASIL APÓS A EMENDA CONSTITUCIONAL 66/2010 Marcelo Vieira da Silva1 Olívia Maria Cardoso Gomes2 Sumário: 1 Introdução. 2 A homologação de sentença estrangeira no estado brasileiro. 3 O divórcio realizado no estrangeiro segundo a lei de introdução às normas do Direito Brasileiro. 4 O Divórcio após a emenda constitucional nº. 66 e sua disposição na Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. 5 Conclusão. Referências.
1
INTRODUÇÃO
O presente estudo versa sobre a hodierna necessidade de interpretar o § 6º do art. 7º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro – Decreto-lei 4.657, de 26 de dezembro de 1977, conforme a Constituição da República Federativa do Brasil, tendo em vista a alteração legislativa ocorrida no âmbito constitucional. O novo instituto ensaiado pela Carta Magna não exige prévia separação judicial por mais de um ano nem a separação de fato por mais de dois anos. Diante da inovação constitucional, a redação do § 6º do artigo 7º do Decreto-lei 4.657/1942 resta mais uma vez dissonante do § 6º, art. 226 da Constituição Federal. Esse empasse se instala na medida em que as exigências do citado texto infraconstitucional para o reconhecimento de divórcio ocorrido no estrangeiro não mais se adequa aos requisitos para deferimento de divórcio ocorridos no Brasil. Tendo em vista a morosidade, bem como a complexidade do processo legislativo para os fins de equalizar o texto infraconstitucional com o novo texto emanado do § 6º, artigo 226 da Constituição Federal, vislumbra-se no ofício hermenêutico realizável em cada caso concreto a solução no sentido de harmonizar o ordenamento jurídico. Assim, o princípio hermenêutico da interpretação conforme a essência constitucional deve ser a via mais acertada ao propósito, como se vislumbra demonstrar nesse estudo. Diante do exposto, o presente estudo tem por objetivo apresentar os principais aspectos relacionados à homologação do divórcio realizado no estrangeiro e sua evolução Graduando em Direito pelo Centro de Educação Superior Reinaldo Ramos – CESREI. Monitor de Direito Civil – Parte Geral. Estagiou no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Monitor de Direito Civil: Parte Geral. Estagiário da Defensoria Pública do Estado da Paraíba. E-mail: max.silva-@hotmail.com 2 Mestre. Professora Universitária. E-mail: oliviamcgomes@hotmail.com 1
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histórica no ordenamento pátrio, bem como seu tratamento e interpretação após a promulgação da Emenda Constitucional nº 66/2010. Para tanto, foi utilizado o método analítico-descritivo com pesquisa em livros, artigos, sentenças e normas legais.
2 A HOMOLOGAÇÃO BRASILEIRO
DE
SENTENÇA
ESTRANGEIRA
NO
ESTADO
Entende-se por Estado a pessoa jurídica de direito público externo, dotado de autoridade no âmbito interno e soberania em suas relações internacionais (BARRETO, 2008), dessa forma, Estado algum está obrigado a reconhecer, no seu território, decisão emanada de juízo estrangeiro (RECHSTEINER, 2009), contudo, diante das perspectivas globais do mundo aumenta a cada dia a dependência entre os Estados, resultando em ações no Poder judiciário de cunho transnacional, com reflexo em mais de um ente soberano (ARAUJO, 2008). O Estado Brasileiro, em respeito ao princípio da cooperação internacional (artigo 4º, inciso IX, da Constituição Federal de 1988) prevê, através do ordenamento jurídico pátrio infraconstitucional (artigo 483 do Código de Processo Civil), a possibilidade de acolher no seu território os efeitos da sentença proferida por juízo estrangeiro, desde que seja homologada pelo Poder Judiciário, ato que era realizado pelo Supremo Tribunal Federal. Hodiernamente a competência para a homologação de sentença estrangeira, a partir da Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004, compete ao Superior Tribunal de Justiça, conforme descrito no artigo 105, inciso I, alínea “i”, da Constituição Cidadã, vejamos:
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça: (...) i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias; (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
O instituto da homologação de sentença estrangeira tem como fonte para sua interpretação a nova redação da Constituição Federal, o Código de Processo Civil e a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, bem como a Resolução nº 09, de 04 de maio de 2005, do Superior Tribunal de Justiça, norma infralegal transitória. Da conjugação dos diplomas legais que normatiza a matéria, pode-se afirmar que são pressupostos formais, essenciais à homologação de sentença estrangeira: i) que a sentença seja proferida por autoridade competente; ii) que as partes tenham sido validamente citadas ou que CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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se tenha verificado legalmente a revelia; iii) que a sentença estrangeira tenha sido transitada em julgado; iv) que esteja autenticada pelo cônsul brasileiro; e v) que esteja acompanhada de tradução oficial ou juramentada no Brasil. O primeiro requisito é que a sentença tenha sido prolatada por autoridade competente. Nesse quesito, o Superior Tribunal de Justiça deve analisar se o tribunal ou juiz do qual emanou a decisão que se pretende homologar tinha competência para proceder a análise e julgamento do caso. O segundo requisito é que as partes tenham sido validamente citadas ou que se tenha legalmente verificado a revelia, seguindo logicamente o princípio processual do contraditório e da ampla defesa, contido no artigo 5º, inciso LV, da Constituição da República Federativa do Brasil. O terceiro requisito versa sobre a obrigatoriedade da comprovação do trânsito em julgado do título judicial alienígena, fundamentando-se na exigibilidade da estabilidade da decisão para fins de homologação, entendimento já firmado pelo Supremo Tribunal Federal através da Súmula 420, pela qual “não se homologa sentença proferida no estrangeiro sem prova do trânsito em julgado”. O quarto requisito é a autenticação, diga-se legalização, pelo cônsul brasileiro, da sentença estrangeira que se pretende homologar, considerando a fé pública de seus atos. O último requisito a ser observado versa sobre a tradução oficial ou por tradutor juramentado no Brasil, constante no artigo 15 da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro. Dessa forma, torna-se indispensável a análise de todos os requisitos, bem como observar os limite estabelecido no artigo 17 da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro, o qual versa que leis, atos e sentenças bem como quaisquer declarações de vontade não terão eficácia no Brasil quando ofenderem a soberania federal, a ordem pública e os bons costumes, para que o título judicial tenha efeito jurídico no Estado brasileiro.
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O DIVÓRCIO REALIZADO NO ESTRANGEIRO SEGUNDO A LEI DE
INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO O Decreto-lei nº 4.657 – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, antiga Lei de Introdução ao Código Civil (LICC) – promulgado em 04 de setembro de 1942,
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disciplina, em seu artigo 7º, § 6º, o instituto da homologação de divórcio realizado no estrangeiro. O texto embrionário vedava o reconhecimento no Brasil de divórcio caso os cônjuges fossem brasileiros ou apenas um dos cônjuges o fosse, neste último caso só se reconheceria o divórcio em relação ao cônjuge não brasileiro, com a ressalva de que esse último não poderia contrair casamento no Brasil. Vejamos a redação primária: Art. 7º, § 6º. “Não será reconhecido no Brasil o divórcio, se os cônjuges forem brasileiros. Se um deles o for, será reconhecido o divórcio quanto ao outro, que não poderá, entretanto, casar-se no Brasil”. A primeira alteração do dispositivo referenciado ocorreu com o surgimento da Lei 6.515, de 26 de dezembro de 1977, que introduziu ao ordenamento brasileiro a possibilidade de dissolução do casamento por meio de divórcio. Dessa forma, havendo a permissão de divórcio no ordenamento pátrio não havia justificativa para não reconhecer os divórcios realizados no exterior. Desse modo, a referida lei através do artigo 49 efetivou a seguinte alteração legislativa:
Art. 49. Os §§ 5º e 6º do art. 7º da Lei de Introdução ao Código Civil passam a vigorar com a seguinte redação: "Art. 7º. (...) § 6º - O divórcio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cônjuges forem brasileiros, só será reconhecido no Brasil depois de três anos da data da sentença, salvo se houver sido antecedida de separarão judicial por igual prazo, caso em que a homologação produzirá efeito imediato, obedecidas as condições estabelecidas para a eficácia das sentenças estrangeiras no País. O Supremo Tribunal Federal, na forma de seu regimento interno, poderá reexaminar, a requerimento do interessado, decisões já proferidas em pedidos de homologação de sentenças estrangeiras de divórcio de brasileiros, a fim de que passem a produzir todos os efeitos legais."
Conforme descrito no texto normativo, a lei 6.515/1977 possibilitou o reconhecimento do divórcio efetivado no exterior desde que verificados os mesmos requisitos exigidos pelo ordenamento brasileiro para o deferimento de divórcio em nossa pátria. Portanto, era imprescindível que houvessem decorrido ao menos três anos da sentença estrangeira ou que entre a separação judicial e a sentença de divórcio tivesse havido uma dilação temporal de três anos. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 estreou uma importante mudança no que tange ao instituto do divórcio em nosso ordenamento jurídico. A Carta Magna disciplinou, no título VIII – Da Ordem Social – em seu capítulo VII, os princípios fundamentais que regem a relação familiar. Previu expressamente, no § 6º do art. 226, que o casamento poderia ser dissolvido pelo divórcio, mas modificou as exigências para o CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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deferimento do divórcio de modo que passou a exigir apenas o decurso de mais de um ano da separação judicial ou a separação de fato por mais de dois anos. É o que se registra no texto constitucional originário: Art. 226, § 6º. “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos”. Com o escopo de adequar o texto da lei 6.515/1977 à nova disposição constitucional o Poder Legislativo editou em 1992 a lei 8.408 que extinguiu a exigência do decurso de três anos da separação judicial, diminuindo esse prazo para um ano, em consonância com o novo ditame da Carta Magna. Todavia, a redação do § 6º, do art. 7º do decreto-lei 4.657/1942 não sofreu qualquer alteração, gerando assim uma discrepância entre as exigências para o deferimento do divórcio no Brasil e as exigências para o reconhecimento de divórcio ocorrido no estrangeiro, configurando uma violação do princípio constitucional da isonomia na medida em que tratava brasileiros em situações semelhantes de forma diferenciada. Ora, como explicar que aos brasileiros residentes no Brasil exige-se o decurso de mais de um ano da separação judicial para obter o deferimento do divórcio e aos brasileiros que promovam os seus divórcios no exterior se requer o decurso de três anos da sentença de divórcio ou de igual período entre tal sentença e a separação judicial? A desarmonia existente entre o § 6º, art. 7º do Decreto-lei 4.657/1942 e a Constituição Federal de 1988 deu ensejo ao surgimento de demandas judiciais de contestação de sentença estrangeira de divórcio sob o fundamento do não atendimento ao requisito da norma infraconstitucional, que exigia um decurso de prazo entre a separação judicial e a sentença de divórcio dissonante do exigido pela Constituição Federal. A priori tais demandas eram promovidas no âmbito do Supremo Tribunal Federal, uma vez que a competência para homologar sentença estrangeira era originariamente desse órgão. No exercício dessa competência, a Suprema Corte teve a oportunidade de decidir sobre o problema ora arguido no sentido de aplicar ao reconhecimento de divórcio ocorrido no estrangeiro a exigência do texto da Carta Magna ao invés do contido no Decreto-lei 4.657/1942, como se demonstra na Sentença Estrangeira Contestada 7.782-6: SENTENÇA ESTRANGEIRA – DISSOLUÇÃO DE CASAMENTO – ACORDO. Estando a sentença estrangeira autenticada pelo consulado brasileiro e coberta pela preclusão maior, passado o período previsto no § 6 do art. 226 da Constituição Federal, impõe-se a homologação. (STF, Sentença estrangeira contestada 7.782-6 – Estados Unidos da América, Rel. Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgamento em 18/11/2004). CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Conforme adrede verificado, com o advento da Emenda Constitucional nº 45/2004, essa competência passou a ser do Superior Tribunal de Justiça, que seguiu o entendimento já adotado pelo Supremo Tribunal Federal e diante da inércia do legislador em promover a atualização do texto do § 6º, art. 7º do decreto-lei 4.657/1942 o deu interpretação em consonância com o § 6º do art. 226 da Constituição Federal. Vejamos:
SENTENÇA ESTRANGEIRA. DIVÓRCIO. HOMOLOGAÇÃO. 1. Homologa-se sentença estrangeira de divórcio que não viola a soberania nacional, os bons costumes e a ordem pública. 2. Alegação de ausência de citação que não tem procedência. O requerido compareceu à audiência de instrução e julgamento realizada pelo juízo estrangeiro e formulou reivindicações. 3. Preenchimento das condições legais para a homologação da sentença estrangeira que se reconhece. 4. O divórcio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cônjuges forem brasileiros, produzirá efeitos ao Brasil somente após um ano da sentença, ou mais de dois anos de separação de fato. 5. Sentença homologada para que produza os seus jurídicos e legais efeitos. (STJ, SEC 2259 / CA, Rel. Ministro José Delgado, Corte Especial, julgamento em 04/06/2008).
Finalmente foi editada a lei 12.036 que alterou o § 6º, art. 7º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. A mudança promovida adequou ao procedimento de reconhecimento de divórcio ocorrido no estrangeiro às exigências constitucionais para o deferimento do divórcio no Brasil. Dessa forma, o referido artigo passou a veicular o seguinte texto:
Art. 7º. (...) (...) § 6º. O divórcio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cônjuges forem brasileiros, só será reconhecido no Brasil depois de 1 (um) ano da data da sentença, salvo se houver sido antecedida de separação judicial por igual prazo, caso em que a homologação produzirá efeito imediato, obedecidas as condições estabelecidas para a eficácia das sentenças estrangeiras no país. O Superior Tribunal de Justiça, na forma de seu regimento interno, poderá reexaminar, a requerimento do interessado, decisões já proferidas em pedidos de homologação de sentenças estrangeiras de divórcio de brasileiros, a fim de que passem a produzir todos os efeitos legais.
Hodiernamente permanece a redação retro transcrita, concluindo-se, portanto, que a transitoriedade é característica intrínseca às normas legais, uma vez que os fatos sociais não são perenes, competindo, assim, ao legislador originário adequar as normas às novas concepções ideológicas e, no caso de sua omissão, cabe ao Poder Judiciário adequar suas decisões aos preceitos constitucionais.
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4 O DIVÓRCIO APÓS A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66 E SUA DISPOSIÇÃO NA LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO
Diante das mudanças ideológicas acerca do conceito de família e consequentemente de casamento, o constituinte derivado promulgou a Emenda Constitucional nº 66 de 2010 que modificou o § 6º do art. 226 da Constituição Federal suprimindo a exigência de prévia separação judicial, por mais de um ano, ou separação de fato, por mais de dois anos, para o deferimento do pedido de divórcio. Vejamos como o novo texto ficou registrado: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”. Certamente a adoção do divórcio direto representou importante avanço na medida em que representa a atualização do instituto civil do casamento à realidade hodierna em que a mobilidade dos relacionamentos vem sofrendo mutabilidade. Diante deste avanço, o texto do § 6º do art. 7º do Decreto-lei 4.657/42 está, uma vez mais, em desconformidade com a Constituição Federal. Podemos concluir que o objetivo central para a aprovação da recente Emenda Constitucional foi garantir menos burocracia ao ato de dissolução do casamento, facultando, assim, que outros laços familiares fossem constituídos sem maiores delongas. A problemática que ora arguimos não é incomum em nosso ordenamento, uma vez que o processo legislativo que proporciona a inovação do texto constitucional não é seguido obrigatoriamente para também alterar o ordenamento infraconstitucional, conformando-o às alterações promovidas. Esse fato chega a ser compreensível se considerarmos a complexidade funcional do Poder Legislativo e todas as nuances que perfazem o caminho até a edição de uma lei, pois é necessária a edição de lei nova para alteração de texto de lei em vigor, em consonância com o § 4º do artigo 1º do Decreto-lei 4.657/42. Diante da morosidade do processo legislativo, cumpre ao concretizador do direito aplicar uma interpretação conforme a Carta Magna e não mais exigir para o reconhecimento do divórcio ocorrido no estrangeiro os requisitos anteriormente vinculativos de tal reconhecimento, ou seja, o decurso de mais de um ano da prolação da sentença no estrangeiro ou que tal sentença tenha sido antecedida de separação judicial por igual prazo não pode inibir o ato homologatório. Dessa forma, o aplicador do direito no exercício do ofício hermenêutico deve utilizar o princípio da interpretação conforme a Constituição que consiste em interpretar a lei infraconstitucional preservando os valores constitucionalmente veiculados. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Não se pode deixar de observar que o papel do magistrado não é o de elaborar um novo texto legal, nem de interpretar texto já existente de modo a dar-lhe um novo sentido, sob pena de caracterizar violação ao princípio da separação dos poderes. Nesse sentido, GOMES CANOTILHO (2003) é claro ao afirmar: Daqui se conclui também que a interpretação conforme a constituição só permite a escolha entre dois ou mais sentidos possíveis da lei mas nunca uma revisão do seu conteúdo. A interpretação conforme à constituição tem, assim, os seus limites na letra e na clara vontade do legislador, devendo respeitar a economia da lei e não podendo traduzir-se na reconstrução de uma norma que não esteja devidamente explícita no texto.
É oportuno ressaltar que desconsiderar os requisitos que a norma constitucional não mais exige ao divórcio não significa modificação da essência do texto legal. Isso é constatável na medida em que o escopo da prescrição do § 6º, art. 7º do Decreto-lei 4.657/1942 é tratar o reconhecimento do divórcio ocorrido no estrangeiro com o mesmo rigor do divórcio normatizado na legislação interna. Dessa forma, não sendo exigido para o divórcio ocorrido no Brasil determinados requisitos, não se pode exigir para o reconhecimento de divórcio ocorrido em território alienígena o preenchimento dos mesmos, pois estaríamos diante de clara afronta ao princípio da isonomia que apenas autoriza tratamento legal diferenciado entre iguais, em situações idênticas, dentro da mais evidente razoabilidade, caso não constatado no presente instituto. Sendo assim, surgindo novas ações para homologação de sentença de divórcio ocorrido no exterior perante o Superior Tribunal de Justiça em que qualquer das partes alegue descumprimento dos requisitos do hodierno texto do § 6º do artigo 7º do Decreto-lei 4.657/1942, o tribunal deve ter por improcedente a alegação fundamentando-se no texto do § 6º do art. 226 da Carta Suprema. Nesse sentido se pronuncia o ilustríssimo doutrinador PORTELA (2011, pag. 626): “Com isso, acreditamos que o divórcio realizado no estrangeiro, se um ou ambos os cônjuges forem brasileiros, poderá ser reconhecido no Brasil independentemente de prazo de separação judicial prévio, dependendo, obviamente, da homologação do provimento jurisdicional estrangeiro que declarou o divórcio”.
5
CONCLUSÃO
A legislação infraconstitucional e constitucional foi alvo de inúmeras alterações. Na mais recente delas, ocorrida no plano da Constituição Federal com a modernização do CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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divórcio, ocorreu uma desatualização da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro – Decreto-lei 4.657/1942, artigo 7º, § 6º, que disciplina o reconhecimento de sentença de divórcio ocorrido no estrangeiro. Ante a morosidade do processo legislativo, bem como sua complexidade, cumpre ao garantidor do direito fazer uso de uma interpretação conforme o texto emanado da Carta Magna para, assim, produzir uma decisão que se harmonize à nova moldagem constitucional do divórcio. Notadamente a desconsideração da interpretação literal da lei infraconstitucional e respectivo ato decisório em contrário não configura uma usurpação da função legislativa, haja vista que a essência da norma encontra-se em exigir dos cônjuges brasileiros divorciados no exterior o mesmo tratamento legal que se exige dos brasileiros residentes no Brasil. Dessa forma, tal ato terá por fundamento a garantia do princípio fundamental da isonomia. Diante de todo o exposto, a solução mais adequada ao problema da flagrante dissonância entre o mandamento constitucional exarado do § 6º do art. 226 da Constituição Federal e a norma registrada no § 6º do artigo 7º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro parece ser a da interpretação conforme a Constituição que ocorrerá em cada caso concreto posto à apreciação do Superior Tribunal de Justiça.
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GOMES CANOTILHO, José Joaquim. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2003. BARRETO, Alex Muniz. Direito Administrativo Positivo. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. OCTAVIO, Rodrigo. Direito Internacional Privado. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1942. RECHSTEINER, Beat Walter. Direito Internacional Privado: teoria e prática. 12ª edição, revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2009. VALLADÃO, Haroldo. Direito Internacional Privado: em base histórica e comparativa, positiva e doutrinária, especialmente dos Estados americano. Volume I. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1978. PORTELA, Henrique Gonçalves Portela. Direito Internacional Público e Privado. 3ª ed. rev. ampl. e atual. Salvador: 2011.
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REFLEXÕES SOBRE O DIREITO FUNDAMENTAL À ACESSIBILIDADE NO BRASIL Tâmara Mirely Silveira silva1 Daniel Ferreira de Lima2 Sumário: 1 Introdução. 2 A acessibilidade e os portadores de deficiência. 3 O princípio da dignidade da pessoa humana.
1
INTRODUÇÃO
Indivíduos com deficiência física enfrentam constantemente limitações em sua vida diária. Essas limitações estão intimamente relacionadas a problemas de acessibilidade, ou seja, às condições que permitam o exercício da autonomia e a participação social do sujeito, podendo interferir ou prejudicar no seu desenvolvimento ocupacional, cognitivo e psicológico, contribuindo para o processo de exclusão social. O direito fundamental à acessibilidade tem promovido discussões recentemente, ocasionadas por uma série de inovações jurídicas implementadas no ordenamento jurídico brasileiro. O presente artigo tem como objetivo realizar um breve estudo sobre o direito fundamental à acessibilidade e abordar a importância da educação da sociedade para que haja a efetiva integração da pessoa com deficiência na sociedade.
2
A ACESSIBILIDADE E OS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA
O termo acessibilidade originou-se na década de 1940, para designar a condição de acesso das pessoas com incapacidades funcional atrelada ao surgimento dos serviços de reabilitação física e profissional. Inicialmente era descrita como condição de mobilidade e eliminação das barreiras arquitetônicas e urbanísticas, numa clara alusão às condições de acesso a edifícios e meios de transporte (ARAÚJO, 2009; TORRES, 2002). No plano normativo brasileiro, a significação de acessibilidade está grafada na Lei nº 10.098, de 19.12.2000, cujo artigo 2º, I, a enuncia nos seguintes termos: “possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e
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Graduanda em Direito pela UEPB. E-mail: tamaramirely@gmail.com Professor Universitário. Membro do Ministério Público profdaniellira@hotmail.com 2
do
Estado
do
Ceará.
E-mail:
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equipamentos urbanos, das edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de comunicação, por pessoas portadoras de deficiência e com mobilidade reduzida”. O Decreto nº 5.296/04 assim define o termo acessibilidade, [...] condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida.
A Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes estabelece por meio das Resoluções ONU 2.542/75 e 3.447\75 que é portador de deficiência “qualquer pessoa incapaz de assegurar por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência congênita ou não, em suas capacidades físicas, sensoriais ou mentais”. Desta forma, pessoa portadora de deficiência é um termo genérico e se refere a todo o segmento, independente da característica da deficiência ou do tipo de sua sequela. Assim, cegos, surdos, paraplégicos, paralisados cerebrais, mudos, dentre outros são agrupados em áreas de deficiência física, mental ou sensorial. Outra denominação recebida é a de “pessoa portadora de necessidades especiais” (FIGUEIREDO, 1997, p. 47), termo este adotado dentro da área técnica. O Decreto-lei nº 5.296/04 assim define o termo deficiência física, em seu art.5º, §1º:
[...] alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções;
A questão da acessibilidade é um tema social cada vez mais relevante e presente em nossa sociedade. De acordo com Nonato (2013),
[...] Isso se justifica pelo fato de que as cidades brasileiras, em sua grande maioria, não estão preparadas para possibilitar que as pessoas com deficiência possam acessar permanecer e utilizar os múltiplos espaços, das edificações, dos mobiliários urbanos, dos elementos da urbanização, dos equipamentos urbanos e dos serviços de uso público e coletivo, com autonomia, segurança, independência e comodidade. Soma-se a isso, existe a barreira cultural, exterirorizada pela sociedade através da demonstração de indiferenças, de atitudes estigmatizantes, de esteriótipos que consideram essas pessoas incapazes de atender com êxito aos objetivos de desenvolvimento econômico e social do país. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Os problemas de acessibilidade são ampliados principalmente nas periferias das grandes cidades, de modo assustador, devido a questões estruturais e culturais. A baixa renda, aliada aos problemas educacionais e de segurança, resulta em dificuldade dos moradores de se apropriarem do seu território e exigirem seus direitos (ALMEIDA & OLIVER, 2001). A falta global de alternativas institucionais que deem conta da acessibilidade leva a comunidade a construir suas próprias alternativas, nem sempre adequadas a esta finalidade.
3
O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
A dignidade da pessoa humana é entendida o fundamento maior do Estado Democrático Social de Direito brasileiro (artigo 1º, inciso III, da CF/88). É um princípio intangível, pois a dignidade humana é vista como um valor que deve ser preservado e fortalecido. Enquanto valor supremo, estando diretamente relacionada com a satisfação das necessidades básicas do ser humano. Os direitos humanos dizem respeito aos direitos de todos os indivíduos, no tocante à dignidade, à igualdade, à liberdade e à inclusão social da pessoa humana. Tais direitos lhes são próprios e o Estado, assim como o restante da sociedade, têm a obrigação de respeitá-los. De acordo com Brito Filho (2002; p.20),
Os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade, são as bases dos Direitos Humanos, como se pode observar, por exemplo, do preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, onde consta: Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.
A questão fundamental dos direitos humanos é a valoração da pessoa humana. O Ser humano é essencialmente dotado de valores próprios e intrínsecos que o acompanham durante a vida. Tais princípios são valores humanos que devem guardar entre si uma relação de interdependência e complementaridade, de modo a funcionarem de maneira imbricada. De acordo com Nonato ( 2013),
Atualmente, há um consenso doutrinário em relação à interdependência entre a democracia, o desenvolvimento e os direitos humanos. Não há direitos humanos sem democracia e tampouco democracia sem direitos humanos.Direitos humanos, democracia, desenvolvimento e acessibilidade são indissociáveis, pois representam o CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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respeito e a valorização da diversidade humana, como instrumento de bem-estar social e econômico das pessoas com deficiência, especificamente.
A dignidade humana está profundamente atrelada ao respeito à liberdade e à igualdade dos seres humanos. De acordo com Moraes (2003, p. 60), A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.
A dignidade da pessoa humana se expressa na noção de que o ser humano é sempre um valor em si e por si, e exige ser considerado e tratado como tal. 4
O DIREITO À ACESSIBILIDADE E A ISONOMIA CONSTITUCIONAL
O direito constitucional de acessibilidade é, antes de tudo, uma materialização do direito constitucional de igualdade. Surgiu com a Emenda n.º 12 à Constituição de 1967, promulgada em 17/10/78, verbis:
Artigo único - É assegurado aos deficientes a melhoria de sua condição social e econômica especialmente mediante: I - educação especial e gratuita; II - assistência, reabilitação e reinserção na vida econômica e social do País; III - proibição de discriminação, inclusive quanto à admissão ao trabalho ou ao serviço e a salários; IV - possibilidade de acesso a edifícios e logradouros públicos.
O direito à acessibilidade é regulamentado, no Brasil, pela Norma Brasileira 9050 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT/NBR, 2004). É um direito universal, solidificado no direito constitucional de igualdade. Fundamenta-se nos direitos humanos e de cidadania, a começar pela Constituição Federal de 1988, que garante o direito à cidadania e à dignidade da pessoa humana. O artigo 5º discorre que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (Constituição Federal, 2013). Canotilho (2000) afirma que esta igualdade não deve ser
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compreendida em um sentido de igualdade formal, mas como uma isonomia de oportunidades sociais, acesso a trabalho, educação e lazer. Dessa forma, a partir da Constituição da República de 1988, a sociedade civil e o Estado passaram a visualizar o homem como um sujeito de direitos. O direito de acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência veio para representar a implementação, a efetivação dos princípios e objetivos traçados pela própria Constituição. Daí a grande relevância do caráter de indissociabilidade dos direitos fundamentais, porquanto a Constituição, que objetiva construir uma cidadania plena, acessível a todos os brasileiros, terá mais possibilidade de materialização (RAMOS, 2013). Só é possível entender o tema da proteção excepcional das pessoas portadoras de deficiência se a compreensão do princípio da igualdade for uma realidade, pois igualdade é a regra mestra e superior a todo o direito à inclusão social do portador e sempre estará presente na aplicação do direito. Essa proteção excepcional não geraria privilégios, que são “situações de vantagem não fundadas”, diz Miranda (1998, p. 213-214), mas sim “discriminações positivas” por serem “situações de vantagem fundadas, desigualdades de direito em consequência de desigualdades de fato e tendentes à superação destas”. Como foi dito, os direitos dos cidadãos são os mesmos, mas as condições para exercê-los não. Daí a importância do princípio da igualdade ser aplicado nos demais direitos expostos, como o de acessibilidade, a fim de proporcionar ao portador uma vida o mais natural possível. Segundo Miranda (1998, p. 202) “os direitos são os mesmos para todos; mas, como nem todos se acham em igualdade de condições para exercê-los, é preciso que essas condições sejam criadas ou recriadas através da transformação da vida e das estruturas dentro das quais as pessoas se movem”. A lei nº 3.732/98, de São Luiz – MA, que obriga os estabelecimentos comerciais, supermercados e similares a destinarem um caixa especial para atendimento prioritário a gestantes, idosos e portadores de deficiência; a Lei n.º 3.354/94 que obriga a adequação dos edifícios públicos e equipamentos urbanos de São Luís às necessidades de locomoção de pessoas portadoras de deficiência; a Lei n.º 3.442/96 que estabelece o surgimento de áreas nos cinemas e teatros destinadas às pessoas que se locomovem em cadeiras de rodas, bem como a adaptação de suas estruturas (construção de rampas, pisos demarcados, bilheterias, sanitários) para permitir o acesso; e por fim, a Lei n.º 3478/96 (veda a instalação ou construção de
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obstáculos em calçadas no perímetro urbano), são exemplos de atos normativos na esfera municipal. Dessa forma, criar maneiras para que uma pessoa portadora de deficiência exerça plenamente sua cidadania significa fazer cumprir os direitos humanos já reconhecidos. O espaço concreto dos Municípios é o local onde se desenvolve esta ação. Introduzir medidas de acessibilidade, principalmente no espaço urbano, democratizando seu uso, possibilita que os ambientes se tornem acessível a todos, em seu sentido mais amplo. A legislação federal destinada a atender as pessoas deficientes apresenta grande extensão, com especial atenção para três leis fundamentais: a Lei n.º 7.853/89, a Lei n.º 7.405/85 e o Decreto n.º 3.298/99. A primeira dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração e sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE). De acordo com esta Lei fica transferida aos Estados e Municípios a responsabilidade pela adoção de medidas que eliminem as barreiras de acesso dos portadores a edificações, espaços urbanos e meios de transporte. Além disso, faz com que a CORDE desenvolva ações no sentido de defender os valores básicos de igualdade e da justiça social, valorizando e assegurando o exercício dos direitos conquistados pelas pessoas portadoras de deficiência. Já pela Lei n.º 7.405/85, torna-se obrigatória a colocação do "Símbolo Internacional de Acesso" em todos os locais e serviços que permitam sua utilização por pessoas portadoras de deficiência, além de dar outras providências. Finalmente, o Decreto n.º 3.298/99 que regulamenta a Lei n.º 7.853/89, dispõe sobre a política nacional para integração da pessoa portadora de deficiência e consolidando as normas de proteção. Esta política trata de conjunto de orientações normativas que têm por objetivo assegurar o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiência (art. 1º do Decreto n.º 3298/99). A luta pelo Direito é algo que compele a todos os cidadãos e não somente dos portadores de limitações físicas. Por tais motivos torna-se importante a presença de órgãos representativos e do Ministério Público na busca pelo atendimento e respeito dos direitos urbanos conquistados e na elaboração, execução e fiscalização das políticas municipais. O papel do Ministério Público na defesa dos direitos das pessoas portadoras de deficiência adquiriu novo referencial com a Constituição de 1988, sendo que a Lei n.° 7.853/89 acabou por permitir tal legitimidade, estabelecendo as regras para a ação civil pública e inquérito civil nesta área (FERREIRA, 2013). Em suma, de acordo com Ferreira CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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(2013)“ o trabalho do Promotor de Justiça deve ser no sentido de buscar a efetividade dos direitos fundamentais consignados na constituição e garantidos pela legislação ordinária, com vista à aplicação do princípio da igualdade, como expressão máxima da cidadania e dignidade da pessoa humana”. Segue o mesmo exemplo o trabalho da Defensoria Pública, que deve garantir aos portadores de deficiência o acesso à justiça. A exemplo da Lei Complementar estadual n.º 988 de 09 de janeiro de 2006, do Estado de São Paulo cujo artigo quinto define como sendo atribuição da defensoria pública promover:
b) a tutela dos direitos humanos em qualquer grau de jurisdição, inclusive perante os sistemas global e regional de proteção dos Direitos Humanos; c) a tutela individual e coletiva (...) das pessoas com necessidades especiais e das minorias submetidas a tratamento discriminatório.
Portanto, tal instrumento apresenta-se como fundamental para que a pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida defenda seus interesses, pois visa efetivar os direitos a ela assegurados, principalmente o de acessibilidade, tais como: o direito de acesso aos serviços de transportes coletivos (rodoviário, aquaviário, metroferroviário, ferroviário e aéreo), aos edifícios públicos ou de uso coletivo e aos edifícios de uso privado.
5 CONCLUSÃO
Pessoas com deficiência enfrentam comumente limitações em sua vida diária que podem estar intimamente relacionadas a problemas de acessibilidade, podendo interferir ou prejudicar no seu desenvolvimento ocupacional, cognitivo e psicológico, contribuindo para um inevitável processo de exclusão social. Acima da conquista dos direitos humanos está a problemática de torna-los universais. Esse desafio exige a atuação dos Poderes Públicos sem, contudo, excluir a participação democrática da sociedade. O Ministério Público surge pela Constituição Federal de 1988, como um dos guardiões da cidadania e da dignidade da pessoa humana, propiciando-lhe meios para a efetivação dos direitos das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, quer constitucionais, quer infraconstitucionais. A situação é agravada, quando quem mais descumpre a Constituição e a legislação infraconstitucional é o próprio Poder Público, de quem deveria surgir o exemplo para o resto da população. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Portanto, todos esses fatores, associados a um sistema processual ineficaz, ultrapassado e com vastos procedimentos e recursos – por vezes - faz enfraquecerem-se, pelo tempo, as esperanças de um verdadeiro processo de inclusão social, através do direito de acessibilidade, por mais inovador e importante que seja o instituto, como o da ação civil pública. Se medidas não forem tomadas para modificar o atual sistema, os direitos fundamentais não passarão de simples retórica constitucional.
REFERENCIAS ARAÚJO, Luiz Alberto David. A proteção constitucional das pessoas portadoras de deficiência. 2. ed. Brasília: CORDE, 1997. ARAÚJO, Carolina Dutra de; CÂNDIDO, Débora Regina Campos Cândido; LEITE, Márvio Fonseca Leite. Espaços públicos de lazer: um olhar sobre a acessibilidade para portadores de necessidades especiais. Licere (Online),v. 12, n. 4, dez. 2009. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). Norma Brasileira (NBR) 9050. Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. 2004. BRASIL. Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Brasília, DF, 20 dez. 2000. Disponível em: <http://www.preseidencia.gov.br/legislaçao/>. Acesso em: 20 de fevereiro de 2013. ______. Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999. Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3298.htm>. Acessado em 25 de fevereiro de 2013. ______. Decreto-Lei no 5296, de 02 de dezembro de 2004. Regulamenta as Leis nos 10.048, de 8 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 03 dez. 2004. ______. Lei n.º 7.853, de 24 de outubro de 1989. Dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE), institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes e dá outras providências. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Leis/L7853.htm>. Acesso em: 25 de fevereiro de 2013. ______. Lei n.º 7405, de 12 de novembro de 1985. Torna obrigatória a colocação do ‘’Símbolo Internacional de Acesso” em todos os locais e serviços que permitam sua utilização CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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PROCESSO DE EXECUÇÃO E CUMPRIMENTO DA SENTENÇA: A EFETIVAÇÃO DA PRETENSÃO DO DIREITO MATERIAL E SEUS NOVOS RUMOS Lírida Carla Moreira de Góes1 Plínio Nunes de Souza2 Sumário: 1 Introdução. 2 Análise propedêutica da execução. 3 Autonomia do processo de execução. 3.1 Cumprimento da Sentença e Processo de Execução. 3.2 Modos e Procedimentos da Execução. 4 Fase de instrução. 5 Eventualidades do processo de execução. 6 Conclusão. Referências.
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INTRODUÇÃO
O exercício da jurisdição dentro do processo de execução no Direito Processual Civil brasileiro encontra-se segmentado na ação executiva e no cumprimento da sentença, podendo ocorrer incidentalmente e complementariamente dentro do processo ou como objeto principal na forma da execução dos títulos extrajudiciais. Encerrado o processo de conhecimento, analisado o mérito da causa, passa-se as vias de efetivação do direito pleiteado. Com a abolição da actio iudicati, que foi extirpada do nosso ordenamento jurídico em nome da melhor celeridade de conclusão das demandas judiciais que acabavam por iniciar um processo autônomo dentro da lide e atrasar a rápida solução do conflito, novas direções foram dadas a fase que se sobrepõe ao processo de conhecimento. A reforma unificou o processo de condenação e execução e realizou o que era esperado, a razoável durabilidade da prestação jurisdicional e as medida s cumpriram o papel de acelerar o desfecho da prestação jurisdicional. Todavia, há uma grande diferença entre a implementação da norma e a situação dos serviços que são prestados no judiciário, pois é fato que a mudança da lei não é suficiente para sanar a procrastinação e a leniência de tais serviços. A mudança foi introduzida com a Lei nº 11.232, de 22/12/2005, que trouxe o procedimento de “cumprimento da sentença” para as obrigações de quantia certa. A inovação consistiu na sumariedade do modo e na extinção da necessidade de nova relação processual. Tais inovações vêm projetando seus reflexos nas demandas, modificando-as, e deve-se atenção aos processos de transformação pelos quais o Direito perpassa. Deve-se a esta nova possibilidade de atendimento às pretensões materiais, um estudo mais condizente com a nova natureza do processo de execução.
1 2
Graduanda em Direito pela UEPB. E-mail: carla_mgoes@hotmail.com Advogado. Professor universitário. E-mail: plinion@gmail.com CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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ANÁLISE PROPEDÊUTICA DA EXECUÇÃO
O poder de exigir de uma pessoa que ela cumpra determinada prestação advém do direito das obrigações, que gera um vínculo jurídico entre um determinado número de envolvidos, estudado no plano do direito material. A sentença condenatória é aplicada para solucionar um conflito nascido da relação obrigacional e do inadimplemento do devedor que se ausenta do dever acordado. O papel da sentença condenatória é, em suma, restaurar o direito ferido ou prevenir que isso venha a ocorrer. Na classificação das sentenças em declaratórias, constitutivas e condenatórias, o que se levava em consideração era o conteúdo da sentença. Quando se fala em sentenças executivas ou mandamentais, o que conta são os efeitos das sentenças. Uma sentença condenatória produz dois tipos de efeito: efeito imediato ou diferido, e isto nada têm a ver com o conteúdo da lide, pois diferença apenas se mostra no campo dos efeitos. Com a introdução no ordenamento jurídico da Lei nº 10.444, de 07/05/2002, responsável pela inserção do artigo 461-A no Código de Processo Civil, a sentença que determina a entrega de coisa deixou de ser sentença condenatória, a qual era formalizada pelo processo da actio iudicati e passa a ter natureza de sentença executiva, exequível desde logo sem maiores burocracias. O que se deve obedecer chegada a hora do cumprimento da sentença condenatória é o que prescreve o artigo 475-1, que por sua vez faz alusão aos artigos 461 e 461-A, no que tange as obrigações de fazer e não fazer e obrigações de entrega de coisa, e os artigos 475-I a 475-R dispõem sobre as obrigações por quantia certa. Outro ponto indispensável para que se possa passar à execução d a ordem de sentença, é que a condenação corresponda a uma obrigação certa, líquida e exigível. Caso a sentença prescinda de algo que seja exigido, tal como o valor devido, ter-se-á que completá-la através do procedimento de liquidação. Na inveterada tripartição das sentenças, apenas às sentenças condenatórias se dava a qualificação de título executivo, dado ao fato de elas compeliam o devedor ao adimplemento da prestação. As sentenças declaratórias sempre foram limitadas a sua incerteza, necessitando de uma confirmação. As constitutivas também não seriam títulos executivos, pois não objetivam a comprovação de direito, mas tão somente ao estabelecimento de uma nova situação jurídica. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Tais formas de vislumbrar estas sentenças também acabaram por sofrer abalo em suas estruturas que pareciam tão já definitivamente desenhadas. Desta releitura, adveio uma doutrina que projetou impactos visíveis na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. O próprio Código Processual Civil abria espaço para quebrantar a teoria de somente as sentenças condenatórias podem ser vistas como títulos executivos. O artigo 584 inseria em seu rol de títulos executivos judiciais sentenças em que não havia modo do juiz pensá-las como um tipo consistente de prestação (sentença homologatória de conciliação, sentença penal condenatória). Há ainda dois outros indicadores que corroboram com a fragilização da teoria: primeiro, a ação declaratória, de acordo com o artigo 4º, parágrafo único do Código de Processo Civil, passou a ser aceita inclusive quando a obrigação já for exigível, dando à parte a declaração de seu direito quando já estava disponível a fase de reclamar o cumprimento da obrigação pelo réu. Segundo, devido à quantidade de reformas que o Código de Processo Civil enfrentou nos últimos anos do século XX, foram estabelecidos em legislações extravagantes um grande número de novos títulos extrajudiciais. A exemplo, no rol do art. 585 do CPC, o seu inciso II, trazido com a Lei 8.953, de 13/12/1994, se concedeu valor de título executivo a qualquer documento público ou particular que contiver a assinatura do devedor, com a ressalva de que, no caso de ser documento particular, seja assinado também por duas testemunhas. Há que ser observado, contudo, que não é qualquer sentença condenatória que tem valor de título executivo, mas somente aquela que faça referência a existência de relação obrigacional que já se encontra violada pelo devedor.
3
AUTONOMIA DO PROCESSO DE EXECUÇÃO
A estrutura integral do processo civil comporta duas partes, a saber, a cognição e a execução, que funcionam como meio para a restituição da ordem e da paz, concluído o litígio. As duas me apresentam como modo de ser da jurisdição contenciosa. A cognição diz respeito à resolução da contenda, enquanto a execução liga-se à consumação do resultado sentenciado. É indispensável esclarecer que o que se dispensou foi o processo de execução para o caso de cumprimento forçado de sentença. Mas esse processo não perdeu sua autonomia plena no tocante aos títulos executivos extrajudiciais. Isto se mostra evidente pelo seguinte: primeiro, o próprio processo de conhecimento, variadas vezes, leva fim em sim mesmo, dando CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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reparação completa à pretensão do querelante (sentenças declaratórias e sentenças constitutivas), segundo, a prévia definição realizada durante o processo de conhecimento não é necessariamente pressuposto para o processo de execução, pois os títulos executivos extrajudiciais autorizam o acesso à jurisdição executiva, sem que para isso tenha que haver um anterior acordo judicial sobre o pedido do exequente).
3.1
CUMPRIMENTO DA SENTENÇA E PROCESSO DE EXECUÇÃO
Outro importante ponto a ser elucidado sobre o assunto em estudo, é o fato de que a consumação do direito material do credor não se apresenta mais como o único objeto de processo de execução. Durante o processo de conhecimento, quando chega o momento propício para que haja a condenação, o processo não se encerra com a prolação da sentença, ele continua ainda na mesma r elação processual, até alçar o cumprimento material da prestação a que faz jus o c redor e a que se obriga o devedor. A execução da prestação jurisdicional executiva é caracterizada por princípios gerais específicos. O primeiro deles é o princípio da realidade, que significa dizer que toda execução é real, incidindo sobre o patrimônio do réu e não sobre a sua pessoa. A pessoa também se encontra protegida pelo princípio da satisfatividade, que garante que a incidência sobre o patrimônio do réu, primeiramente se faça de modo parcial, na porção que não se possa dispensar do cumprimento da obrigação. A execução deve ser útil ao credor, não se admitindo que seja utilizada meramente como instrumento punição do credor. Além disto, a execução deve ser econômica e específica, pois deve oferecer ao credor o que especificamente ele obteria, caso não houvesse a violação da obrigação por parte do devedor. Há uma inviabilidade de que sempre que a prestação puder ser realizada in natura, ela não se apresente de forma diversa da presente n o título executivo. O devedor deve arcar com todas as consequências de sua mora no cumprimento de sua prestação, caracterizando o princípio do ônus da execução, correndo a expensas dele o custo da demanda. Porém, não pode a execução conduzir ao executado uma situação contrária a dignidade humana, o que é largamente entendido pela jurisprudência. A execução não pode ocasionar a decadência, a fome e a falta do lar para o devedor e sua família. Cabe ao credor a disponibilidade de exigir a execução do título e continuar no seu intento. Diferentemente do processo de conhecimento, o credor não precisa do consentimento do devedor para desistir do processo de execução ou de algumas de suas medidas, em nenhuma fase. Contudo, ao fazê-la, CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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assume conseguintemente as custas e, se houver embargos do devedor, além destas assume também os honorários advocatícios do outorgado da parte contrária. Importante não confundir desistência com renúncia, pois na primeira, desiste-se do processo, o qual poderá ser posteriormente renovado com execução forçada sobre o mesmo título, enquanto a renúncia se opera sobre o direito da ação, causando o desaparecimento do crédito e impossibilitando a reabertura pelo credor renunciante de outra execução embasada pelo mesmo título executivo. A execução provisória de sentença em autos próprios. O credor deve apresentar uma petição acompanhada de cópias autenticadas pelo cartório ou através de declaração do próprio advogado signatário, das peças do processo originário, quais sejam: I - sentença ou acórdão exequendo; II – certidão de interposição do recurso que não possui efeito suspensivo; III – procurações outorgadas pelas partes; IV – decisão de habilitação, quando houver; V – opcionalmente, demais peças processuais
que
o
exequente
considere
pertinentes. Não há espaço para execução ex officio, no processo civil, de modo que, sendo definitiva ou provisória, o credor sempre deverá promover a execução forçada. Quando se tratar de execução definitiva de título extrajudicial ou execução provisória de sentença, o credor promoverá petição inicial. No caso de execução definitiva de título judicial, não existe petição inicial, porque ocorre simples e incidentalmente na relação processual que já existia antes da sentença. O título executivo possui função coativa no que tange a concretização do direito do credor, tendo ele uma função tripartida: 1) autorizar a execução; 2) definir o fim da execução; 3) fixar os limites da execução. O título executivo assume a representação de certificação de um crédito, pois ele se constitui como a declaração de certeza do direito do credor, que também pode estar contida numa sentença ou em outro documento que a lei atribua equivalência com sentença. Tal ocorre devido a atual situação do direito que permite às próprias partes aplicar efetivamente a lei, criando documentos onde reconhecem sua obrigação, aceitando, consequentemente, que está vulnerável suportar um abatimento patrimonial. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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3.2
MODOS E PROCEDIMENTOS DA EXECUÇÃO
A execução para entrega de coisa relaciona-se às obrigações de dar, não se levando em consideração a natureza do direito a ser realiza do. O objeto da prestação, em muitos casos, não se apresenta de forma individualizada, d e modo que o Código separa a execução da entrega de coisa certa no artigo 621 e a de coisa incerta no artigo 629. Após o cumprimento da citação pode haver entrega ou depósito da coisa, ou a inércia do devedor, que deixa o prazo se esgotar sem cumprir a sentença. Nesse caso, o credor receberá mandado de imissão de posse se tratar de imóvel, ou de busca e apreensão, se móvel. Se houver embargos de efeito suspensivo, a imissão e a apreensão serão de caráter provisório e a solução definitiva ficará na pendência da decisão do incidente. Com referência às obrigações de fazer, há uma problemática que consiste nos raros meios que o Estado possui para se controlar a atuação compulsória do devedor omisso para que se realize a prestação, que fica na dependência de sua vontade. A ordem jurídica apresenta aversão ao emprego de violência para coagir ima pessoa ao cumprimento de qualquer obrigação, como mostra o princípio nemo potest cogi ad factum. O conceito de fungibilidade das obrigações veio par a colaborar na resolução dessa questão de cunho tão dificultoso. Prestações fungíveis são aquelas que por convenção entre as partes ou por sua disposição natural, pode m ser prestadas por terceiros, no caso de abstenção do obrigado. Sendo a obrigação fungível, o credor poderá se valer de serviços de terceiros para executá-la especificamente, ficando, todavia responsável pelo custeio dos gastos. Se, contudo, a obrigação for in fungível, a mora do devedor será convertida em perdas e danos, levando a execução pela obrigação subsidiária. Uma forma criada pelo direito para se coagir o devedor ao cumprimento da sua obrigação é a astreinte, que impõe multas. O devedor tem sua integridade corporal respeitada, mas a coação moral e econômica se faz sentir através de multa diária que o compele a prestação do fazer ou não fazer. A multa é prevista na sentença condenatória e, em casos omissos, será arbitrada no momento do cumprimento da condenação. Na execução por quantia certa, o patrimônio do devedor está genericamente garantido ao credor, pois dívida está ligada a pessoa, enquanto a responsabilidade liga-se ao patrimônio. Trata-se de uma obrigação representada por uma importância em dinheiro, não CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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importando se a dívida se origina de relação contratual ou extracontratual, ou que seja embasada por negócio jurídico unilateral ou bilateral. É preciso que haja uma quantia expressa em valor monetário. O fim da execução por quantia certa consiste em expropriar bens do devedor para averiguar judicialmente os recursos que serão necessários ao pagamento do credor. O credor não é obrigado a propor execução concursal, podendo preferir a execução singular, mesmo no caso de o devedor ter sofrido déficit patrimonial. Sempre que o oficial de justiça não conseguir localizar o devedor, ele poderá arrestar seus bens na quantidade suficiente para assegurar a execução. Trata-se de medida cautelar realizada ex officio.
4
FASE DE INSTRUÇÃO
O primeiro ato expropriatório da execução é a penhora. Este ato fundamental do processo executivo tem a função de especificar e individualizar os bens ou o bem sobre os quais o ofício da execução incidirá para satisfazer o credor e sujeitá-los à transferência coativa. É o ato executivo que inicia fatalmente o processo de execução, deforma coativa. A genérica garantia da disposição dos bens do devedor para saldar o débito com o credor agora passa a ser direta, mediante apreensão física. A penhora também é considerada como um ato de afetação. Na doutrina, há três posicionamentos a cerca da natureza jurídica da penhora, a saber: 1) penhora vista como medida cautelar; 2) penhora unicamente como ato executivo; 3) intermediariamente, a penhora é vista como ato executivo com efeitos conservativos. O entendimento dominante na doutrina mais bem quista e mais atualizada é de que a penhora é simples ato executivo, para assegurar, preservar e especificar os bens a serem subjugados ao processo de execução. Não se pode atribuir a penhora uma natureza mista, executiva e cautelar, devido ao fato de que a prevenção que ela produz causa efeito secundário. O que deve ser levado em consideração para a classificação da natureza da penhora é o seu objetivo principal que é dar início ao processo expropriatório. Na análise do conceito de adjudicação temos que, assemelhada à dação em pagamento, trata-se de uma forma indireta de satisfação do crédito do credor, através da transferência do bem penhorado, levando à extinção de seu direito. A adjudicação permite que CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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ao invés de dinheiro, o exequente receba outros bens do executado, através de uma relação não contratual, pois se coaduna com a natureza da arrematação, efetivando a transferência forçada de bens, pela sua expropriação. O exequente deve apresentar requerimento para dar início à adjudicação. A adjudicação de bens penhorados sofreu os efeitos da reforma da lei nº 11.382/2006, no que diz respeito às preferências dos credores para execução de quantia certa. As clássicas modalidades de levantamento de numerário para quitação do débito do exequente para com o credor. A adjudicação do bem penhorado se mostra possível de ocorrer independentemente de sua natureza. O artigo 685-A traz duas exigências: primeiramente, o requerimento do interessado, pois não cabe ao juiz obrigar o credor a aceitar como forma de pagamento algo diferente do que constitui o objeto da obrigação, se houver substituição, ela deve partir do interessado; em segundo lugar, o preço da oferta do aspirante à adjudicação não pode ser inferior ao da avaliação. Se for da pretensão do credor alcançar a posse do bem por valor inferior ao da avaliação, isto só poderá ocorrer em hasta pública, submetendo-se ao processo de licitação e a concorrência. A legitimação para adjudicar pertence: I) ao exequente, prioritariamente, pois este promove a execução; II) ao credor com garantia real sobre o bem penhorado, pese ou não penhor sobre ele; III) a outros credores que, também tenham penhora sobre o mesmo bem. Se a alienação estiver em andamento por outro credor, isso não impede a adjudicação. A preferência será dado ao credor que primeiro depositar o preço para sobre o produto da expropriação ter direito de preferência com relação aos outros concorrentes; IV) ao cônjuge, descendente ou ascendente do executado; V) a sociedade ou o sócio, no caso de haver execução promovida por terceiro, com penhora de quota, para exigir crédito contra um sócio. A própria sociedade pode tomar tal iniciativa, com o objetivo de amortizar o capital social, ou transferi-lo para outra pessoa, havendo previsão estatutária ou obedecendo a lei aplicável ao tipo societário. A iniciativa direta também pode partir de outro sócio da mesma sociedade, se sua cota tiver sido atingida pela penhora.
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EVENTUALIDADES DO PROCESSO DE EXECUÇÃO
Entre as vicissitudes do processo executivo, pode vir a ocorrer a suspensão da execução, que consiste em uma situação jurídica temporária e provisória, que não extingue o processo e nem impede que seus efeitos sejam normalmente produzidos. A paralisação no curso do processo, não admite que nenhum ato seja realizado na constância da suspensão. A suspensão pode ter natureza voluntária ou necessária. É necessária ou ex lege a suspensão que a lei impõe, contundentemente, e voluntária ou convencional a que advém de ajuste feito pelas partes movidas por sua vontade. O art. 791 prevê três casos para suspensão da execução: a) integral ou parcialmente, quando os embargos à execução tiverem efeito suspensivo; b) nas hipóteses do art. 265, I a III; c) quando o devedor não possuir bens sujeitos à penhora. De forma irregular e antecipada, a extinção do processo de execução extingue o crédito do exequente, quando ocorre a satisfação coativa do direito do credor. Ocorre quando o devedor satisfaz a obrigação; quando o devedor, através de transação ou outro meio variado, consegue a remissão total da dívida, ou quando o credor renuncia ao seu direito de crédito.
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CONCLUSÃO
A metódica originada pela Lei número 11.382, de 06/12/2006 foi responsável pela radical reformulação da vetusta executio per officium iudicis, a qual perceptivelmente se sobrepõe a romana actiu iudicati, que por sua vez tinha como principal fim, atrasar e complicar a fase de satisfação do direito do credor, levando a Justiça ao descrédito em seu ofício de prestar a tutela jurisdicional. O Código de Processo Civil, de fato, foi elaborado sob a concepção de plena autonomia da execução forçada no que diz respeito ao processo de conhecimento, contudo, a mudança que veio a implantar a reforma que começou em 1994, estabeleceu-se no sentido de subtrair a tradicional partilha entre as fases de acertamento e consumação do direito subjetivo dentro das lides. O Direito Processual seguiu os caminhos da rápida efetividade e ganhou auxílio ao melhor desempenho de suas ações, ganhando uma remodelagem que o levou a um processo unitário, onde a formação do conflito comporta atividades cabíveis dentro de uma única relação processual. O juiz responsável pela sentença condenatória é também encarregado de fazer CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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cumprir sua decisão logo após o trânsito em julgado. O direito positivo brasileiro só tem a ganhar com os novos rumos do processo de execução de sentença, em nome da celeridade processual, para que se locuplete antigas lacunas há muito carentes de atenção, de modificação. Um aperfeiçoamento eficaz da função jurisdicional requer isso, contudo, tal objetivo só poderá ser logrado quando se verificar, em conjunto, uma modernização dos órgãos judiciais de acordo com as atuais técnicas da administração. As mudanças discutidas aqui não tratam de nenhuma sedição radical e contraditória com as tradições de nosso direito processual. Há exemplos bem comuns e que com frequência aparecem na forma de processos unitários: as ações possessórias e as ações locatícias (despejo, revisional e renovatória), e a inda há as ações cautelares, que promovem sentenças que são cumpridas de plano, sem normas rígidas de ações executivas separadas. Para que a plena mudança se instale permanentemente, é preciso mais que o amparo de textos legais, mas sim dos meios adequados à sua efetivação. A reforma da ação executiva não pode ficar estagnada, apenas sendo discutida e publicizada sem que se altere os caminhos que se instrumentalizam para sua realização. Para que não fique esquecida nas linhas da história do direito processual civil brasileiro, é preciso buscar o modus faciendi que levará o processo às melhores vias de execução.
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A CONCRETIZAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS COM EFETIVIDADE DO DIREITO SOCIAL FUNDAMENTAL EDUCAÇÃO NAS INSITUIÇÕES PRISIONAIS
A À
Delane Silva da Matta Bonfim1 Sumário: 1 Introdução. 2 Educação: Direito Humano Fundamental. 3 Direitos assegurados por lei aos presos nas instituições prisionais. 4 A efetividade do direito à educação como Direito Social do preso. 5 Conclusão. Referências.
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INTRODUÇÃO
A história dos direitos humanos é marcada por contextos de lutas e conflitos na sua afirmação histórica universal. A historicidade é uma característica de tais direitos, pois passaram por processos evolutivos e progressivos de conflitos, afirmações e conquistas sucessivas e cumulativas de direitos. Nesse contexto, encontramos instrumentos viabilizaram a proteção e garantia de direitos, como é o caso das Declarações, Convenções e Pactos internacionais. As declarações de direitos tiveram importantíssimo papel nas afirmações dos direitos humanos, resultando no processo de internacionalização da proteção dos direitos humanos. Um relevante instrumento foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, que salvaguarda vários direitos. Entre tais direitos, encontramos os direitos sociais que são considerados de segunda dimensão, pois se caracterizam pelo direito do indivíduo exigir prestações estatais, sendo verdadeiras liberdades materiais, fazendo-se existir um Estado prestacionista. São direitos de igualdade, frutos de uma reação ao Estado Liberal, ultrapassando a passividade estatal de outrora, surgindo uma real função de prestação estatal, não só prestações materiais, bem como prestações jurídicas. Revelam-se como direitos públicos subjetivos que possuem a característica de exigência da prestação e respeito do indivíduo frente ao Estado. O direito à educação encontra-se reconhecido como um direito humano fundamental, de maneira que abrange todas as pessoas indistintamente dentro de sua amplitude e universalidade. Possui orientação basilar dos valores sociais da igualdade e dignidade da 1
Graduando em Direito pela Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas ( FACISA ). Foi pesquisador bolsista do Programa de Bolsas de Iniciação Científica Júnior (PIBICjr - CNPq/FAPESQ ) em 2010/2011. Este trabalho foi orientado pelo professor Marcelo Alves Pereira Eufrásio (Doutorando em Ciências Sociais - UFCG, Mestre em Ciências da Sociedade - UEPB, Especialista em História da Filosofia - UFPB). E-mail: delane_silva@hotmail.com CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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pessoa humana, sendo considerado direito social fundamental. Destarte, é direito subjetivo do preso ter acesso à educação nas unidades prisionais. A negação do direito à educação aos presos é uma violação aos direitos humanos, de modo que são graves as consequências decorrentes da privação desses direitos, pois por serem fundamentais, guardam a característica da inviolabilidade, demonstrando a relevância do tema. O direito à educação é meio de garantir o exercício da cidadania e de direitos civis, culturais e políticos dos presos, de modo que é notável a indispensabilidade do acesso à educação, pois é um direito humano dos apenados, norteado pelos valores da dignidade da pessoa humana e igualdade, sendo um meio de evitar o desrespeito e violação dos direitos fundamentais dos presos. Diante isto, há concretização do direito humano à educação nos estabelecimentos prisionais, sendo esse direito social fundamental efetivado? Temos como objetivo geral analisar a concretização dos direitos humanos mediante a efetividade do direito social fundamental à educação nas instituições prisionais, de modo que analisamos preceitos legais que tutelam e garantem tal direito no contexto nacional e, outrossim, internacional, além de trazer à baila discussão doutrinária. Nesse contexto, aplicamos a este trabalho uma pesquisa bibliográfica quanto aos procedimentos técnicos, com enfoques quantitativos e qualitativos. Utilizamos o método indutivo, sendo que os dados da pesquisa foram coletados, indiretamente, de fontes primárias e secundárias A nossa pesquisa realizou um estudo interdisciplinar, tendo como referencial teórico as disciplinas Direitos Humanos, Direito Constitucional, entre outras disciplinas.
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EDUCAÇÃO: DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL
Historicamente os direitos humanos passaram por uma construção histórica normativa, de maneira que essa está ligada umbilicalmente à própria evolução humana. A historicidade é uma característica de tais direitos, pois passaram, e passam, por processos evolutivos e progressivos de lutas, conflitos e afirmações sucessivas e cumulativas. Existindo, assim, precedentes históricos, e não apenas um fato determinado e específico numa terminado momento ou época. Encontramos em alguns desses precedentes instrumentos e documentos formais de implementação dos direitos fundamentais da pessoa humana, ente os quais as Declarações. É mister reconhecer que as declarações tiveram papel importante da afirmação dos direitos fundamentais, pois traçaram, e traçam, diretrizes para os Estados internacionais para a CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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implementação dos direitos humanos em combate à sua violação e inobservância, reconhecendo-se, até, suas forças normativas. Um marco histórico determinante, em ordem internacional, na proteção de direitos fundamentais foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948. Essa representou um avanço protetivo na temporalidade do período pósguerra, no qual ocorreram graves violações a direitos fundamentais das pessoas. A declaração foi responsável pela amplitude e universalidade dos direitos humanos, garantindo respeito ao princípio universal da dignidade da pessoa humana, cujo é inerente à condição humana, sendo um documento internacional importante na concretização dos direitos fundamentais, não representando mera carta de intenções. A DUDH consagra valores imprescindíveis marcados pela universalidade e transnacionalidade, devendo os Estados internacionais normatizá-los e protegê-los. Aduz o jurista Fábio Konder Comparato (2010, p. 240)
Inegavelmente, a Declaração Universal de 1948 representa a culminância de um processo ético que, iniciado com a Declaração de Independência dos Estados Unidos e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Revolução Francesa, levou ao conhecimento da igualdade essencial de todo ser humano em sua dignidade de pessoa, isto é, como fonte de todos os valores, independentemente das diferenças de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.
A Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948 reuniu não só direitos individuais, civis, econômicos e políticos como outrora, mas também direitos sociais e culturais, tornando-se modelo internacional influenciador das cartas constitucionais internas dos Estados, como a Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988. Essa que tem convencionado interesse em assinar tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos (Art. 5°, § 3º). São reflexos do processo de internacionalização dos direitos humanos (PIOVESAN, 2010, p. XXI), como aduz Richard B. Bilder (apud PIOVESAN, p. 6)
O movimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos é baseado na concepção de que toda nação tem a obrigação de respeitar os direitos humanos de seus cidadãos e de que todas as nações e a comunidade internacional têm o direito e a responsabilidade de protestar, se um Estado não cumprir suas obrigações. O Direito Internacional dos Direitos Humanos consiste em um sistema de normas, procedimentos e instituições internacionais desenvolvidos para programar esta concepção e promover o respeito dos direitos humanos em todos os países.
O
processo de internacionalização dos direitos humanos decorre de uma
normatização protetiva e assecuratória de ordem internacional. A normatividade, em sentido CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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amplo, possui grande papel na tutela e garantia do individuo perante o poder do Estado. Além de ser um instrumento limitador do poder intervencionista estatal, é, outrossim, meio de forçálo a respeitar os direitos e proteger os direitos das pessoas. Preleciona o jurista Konder Comparato que:
Ora, essa convicção de que todos os seres humanos têm direito a ser igualmente respeitados, pelo simples fato de sua humanidade, nasce vinculada a uma instituição social de capital importância: a lei escrita, como regra geral e uniforme, igualmente aplicável a todos os indivíduos que vivem numa sociedade organizada (2010, p. 24)
Portanto, a normatividade possui imprescindível função de salvaguardar os direitos humanos, protegendo os valores essenciais da pessoa humana, como a dignidade e igualdade, de modo que cria deveres e responsabilidades para os Estados internacionais. Entre os direitos sociais e culturais proclamados, a Declaração Universal de Direitos do Homem, em seu artigo 26 (XXVI), declara que toda pessoa possui o direito à educação, garantindo a instrução como instrumento de desenvolvimento dos demais direitos fundamentais da pessoa humana. É sem dúvidas um instrumento de reconhecimento e afirmação dos direitos humanos na realidade social. Além da DUHD, outro importante instrumento de defesa internacional do direito à educação foi a Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem[1], que prescreve no art. XII:
Toda pessoa tem direito à educação, que deve inspirar-se nos princípios de liberdade, moralidade e solidariedade humana. Tem, outrossim, direito a que, por meio dessa educação, lhe seja proporcionado o preparo para subsistir de uma maneira digna, para melhorar o seu nível de vida e para poder ser útil à sociedade. O direito à educação compreende o de igualdade de oportunidade em todos os casos, de acordo com os dons naturais, os méritos e o desejo de aproveitar os recursos que possam proporcionar a coletividade e o Estado. Toda pessoa tem o direito de que lhe seja ministrada gratuitamente, pelo menos, a instrução primária.
A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem corrobora e expande o ideal protetivo e assecuratório dos valores essenciais da pessoa humana. A ela se somam outros documentos (declarações, convenções e pactos) que reforçam a indispensabilidade do direito humano à educação, além de significarem avanços normativos no âmbito internacional. O Estado Democrático de Direito brasileiro assentado no dispositivo do artigo 1° caput, da Constituição Federal de 1988, possui fundamentos que orientam ordenamento CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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jurídico, entre eles, o principio da dignidade da pessoa humana e a cidadania. Além dos fundamentos basilares, elenca no artigo 3°, os objetivos, tais como: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Podemos ver a preocupação do legislador constituinte em traçar objetivos para o Estado Democrático de Direito brasileiro. Com maestria preleciona José Afonso da Silva (2010, p.27):
É a primeira vez que uma Constituição assinala, especificamente, objetivos do Estado brasileiro, não todos, que seria despropositado, mas os fundamentais, e entre eles, uns que valem como base das prestações positivas que venham a concretizar a democracia econômica, social e cultural, a fim de efetivar na prática a dignidade da humana.
O direito à educação encontra-se entre os direitos fundamentais sociais da pessoa humana. A Constituição Federal de 1988 prescreve em seu texto normativo no artigo 6° o direito à educação como um direito social. No artigo 205, a Carta Magna dispõe que a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Devemos entender a universalidade do direito à educação como processo de desenvolvimento da cidadania. Destarte, deve existir igualdade no acesso e permanência das pessoas aos meios educacionais para a promoção humanística e cidadã como proclama a Carta Magna de 1988 (Art. 206, I e Art. 214, V CF/88).
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DIREITOS ASSEGURADOS POR LEI AOS PRESOS NAS INSTITUIÇÕES PRISIONAIS Historicamente a condenação está associada à imposição das penas (privativa de
liberdade, restritiva de direito e multa). Sendo a condenação compreendida como efeito primário da sentença condenatória. Exercitando o ius puniendi, ao satisfazer a sua pretensão punitiva, surge para o Estado a pretensão executória, isto é, executar a pena. Prescreve o artigo 3° da Lei 7.210 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal) que ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei. Da mesma forma, o Código Penal em seu artigo 38 preceitua que o preso conserva todos os
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direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral. Os diplomas legais supramecionados asseguram que o preso não perde os seus direitos, somente tem restringidos os direitos afetados pela sentença penal condenatória. Assim o é, que o artigo 41 da Lei de Execução Penal elenca os direitos assegurados do condenado, in verbis:
Art. 40 - Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios. Art. 41 - Constituem direitos do preso: I - alimentação suficiente e vestuário; II - atribuição de trabalho e sua remuneração; III - Previdência Social; IV - constituição de pecúlio; V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado; X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; XI - chamamento nominal; XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena; XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento; XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito; XV - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes.
Encontramos no inciso VII do artigo supratranscrito, que é direito do preso ter assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa. Sobre a assistência educacional, os artigos 17 ao 21 corroboram tal direito, in verbis:
Art. 17. A assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado. Art. 18. O ensino de 1º grau será obrigatório, integrando-se no sistema escolar da Unidade Federativa. Art. 19. O ensino profissional será ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico. Parágrafo único. A mulher condenada terá ensino profissional adequado à sua condição. Art. 20. As atividades educacionais podem ser objeto de convênio com entidades públicas ou particulares, que instalem escolas ou ofereçam cursos especializados. Art. 21. Em atendimento às condições locais, dotar-se-á cada estabelecimento de uma biblioteca, para uso de todas as categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativos e didáticos.
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O diploma legal prescreve normas garantidoras que têm como escopo assistir aos presos condições mínimas de respeito à dignidade durante a execução da pena. Devem-se respeitar valores e bens inerentes à pessoa humana. É de cunho moral e social amparar em quaisquer condições e circunstâncias os direitos mínimos dos presos, observando a justiça social e valores de solidariedade, que se expressa na consciência coletiva de realizar o processo de humanização no âmbito carcerário, evitando perpetrar violações e desigualdades a direitos. Assim, é imprescindível o amparo legal do dispositivo supracitado em assegurar à assistência educacional aos presos. A LEP prescreve, no artigo 1°, que a execução penal tem por objetivo proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado. Incumbindo ao Estado o dever de assistência ao preso e ao internado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade (art. 10). Portanto, o privado de liberdade é um sujeito de direitos e deveres, como tal é dever do Estado não violar ou desrespeitar a sua integridade física e moral, além de garantir e assegurar os seus direitos existentes constitucionalmente garantidos.
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A EFETIVIDADE DO DIREITO À EDUCAÇÃO COMO DIREITO SOCIAL DO PRESO Em momento anterior, vimos que a Carta Magna de 1988 proclama a educação como
um direito social (art. 6°). Em uma delimitação terminológica e conceitual, ensina Moraes que Direitos Sociais (2011, p. 206):
São direitos fundamentais do homem, caracterizando-se como verdadeiramente liberdades positivas, de observância obrigatória em um Estado Social de Direito, tendo por finalidade a melhoria de condições de vida aos hipossuficientes, visando à igualdade social.
Os direitos sociais se caracterizam pelo direito do indivíduo exigir prestações sociais estatais, sendo verdadeiras liberdades materiais, fazendo-se existir um Estado prestacionista. São direitos de igualdade, frutos de uma reação ao Estado Liberal, ultrapassando a passividade estatal de outrora, surgindo uma real função de prestação estatal, não só prestações materiais, bem como prestações jurídicas. Revelam-se como direitos públicos subjetivos que possuem a característica de exigência da prestação e respeito do indivíduo frente ao Estado. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Analisamos anteriormente que o artigo 26 da Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948, que declara toda pessoa possui o direito à educação. Garantindo, portanto, a instrução como instrumento de exercício e desenvolvimento dos demais direitos civis, políticos e sociais fundamentais da pessoa humana. A educação é valor social fundamental garantidor da cidadania conforme estatui a declaração de 1948, entre outros instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos. Não há dúvidas de que educação possui primazia na formação cidadã do indivíduo para a sua autodeterminação social. Servindo de sustentáculo para o desenvolvimento e exercício dos demais direitos sociais, como assim preleciona Machado e Oliveira (apud DIAS, 2007) “Além de ser um direito social, a educação é um pré-requisito para usufruto dos demais direitos civis, políticos e sociais emergindo como um componente básico dos Direitos do Homem.” O Estado Democrático e Social de Direito deve ter o desiderato de assegurar o direito social à educação a toda sociedade, para garantir o exercício da cidadania e respeitar os princípios que fundamentam a própria existência do Estado, quais sejam, a dignidade da pessoa humana, a igualdade formal e material. Assim é, que a Constituição Federal do Brasil, em seu artigo 3°, intenta como objetivo construir uma sociedade justa, democrática e igualitária Por ser um direito humano inerente à condição humana, a educação deve alcançar os presos, pois é tal direito goza de universalidade, a qual é indissociável. A acessibilidade ao ensino educacional aos presos além de assegurar à igualdade, outrossim salvaguarda o princípio democrático da cidadania. Assim, o acesso à educação no ambiente carcerário se apresenta como uma promoção dos valores consagrados pela Constituição e de Tratados e Convenções internacionais, aos quais o Estado brasileiro tem ratificado e incorporado ao ordenamento jurídico interno.. Devemos ressaltar que existem alguns problemas que dificultam a disponibilidade de ensino nas penitenciárias. Porém, não podemos negar avanços no sentido de promoção da acessibilidade ao ensino. Vimos em momento anterior, que a Lei de Execução Penal assegura a assistência educacional. Esse diploma legal sofreu algumas alterações no que diz respeito ao tema assistência educacional. No ano de 2010, a lei nº 12.245/2010 alterou a LEP, determinando no artigo 83, IX, a instalação de salas de aulas nas instituições prisionais. Essas alterações legislativas representam instrumentos assecuratórios que cumprem o desiderato de garantir os direitos CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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constitucionais garantidos à educação e à cidadania aos presidiários, propiciando, portanto, a efetividade e concretização de tais direitos fundamentais. Em 11 de março de 2009, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) publicou a Resolução N°03, que dispõe sobre as Diretrizes Nacionais para a oferta
de educação nos estabelecimentos penais. No ano de 2010, foi publicada as Diretrizes Nacionais para a oferta de educação para jovens e adultos em situação de privação de liberdade nos estabelecimentos prisionais, da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, que ulteriormente configurou-se na Resolução CNE/CEB N° 2/2010. Essas resoluções representaram uma evolução importante na busca da efetividade do direito à educação aos presos, sendo um meio de concretização do ensino nas instituições prisionais. No ano de 2009, foi publicada as Diretrizes Nacionais para a oferta de educação para jovens e adultos em situação de privação de liberdade nos estabelecimentos prisionais, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, que ulteriormente configurou-se na Resolução CNE/CEB n° 2/2010. Essa resolução representa uma evolução importante na busca da efetividade do direito à educação aos presos e, também, um meio de concretização do ensino nas instituições prisionais. Em 30 de junho de 2011, foi publicada a lei 12.433, que alterou a Lei de Execução Penal brasileira, permitindo a aplicação do instituto da remição da pena privativa de liberdade ao tempo de estudos educacionais nas instituições prisionais. O artigo 126 da LEP prescreve que o condenado pode, em alguns casos (pena em regime fechado ou semiaberto), remir dias da sua pena de prisão por tempo que ele frequenta e exerce atividade escolar (ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional), podendo ser de forma presencial ou à distancia a modalidade de ensino. No mesmo ano de 2011, em 24 de novembro foi publicado o Decreto n° 7.626 que Institui o Plano Estratégico de Educação no âmbito do Sistema Prisional (PEESP), com a finalidade de ampliar e qualificar a oferta de educação nos estabelecimentos penais. O PEESP contemplará a educação básica na modalidade de educação de jovens e adultos, a educação profissional e tecnológica, e a educação superior (art. 2°). São algumas diretrizes do PEESP, conforme estatui o artigo 3° do Decreto n° 7.626: I - promoção da reintegração social da pessoa em privação de liberdade por meio da educação; II - integração dos órgãos responsáveis pelo ensino público com os órgãos responsáveis pela execução penal. CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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Além das diretrizes, o mesmo decreto proclama alguns objetivos (art. 4°), como: incentivar a elaboração de planos estaduais de educação para o sistema prisional, abrangendo metas e estratégias de formação educacional da população carcerária e dos profissionais envolvidos em sua implementação; contribuir para a universalização da alfabetização e para a ampliação da oferta da educação no sistema prisional; fortalecer a integração da educação profissional e tecnológica com a educação de jovens e adultos no sistema prisional; viabilizar as condições para a continuidade dos estudos dos egressos do sistema prisional. Essas alterações legislativas realizaram mudanças que sinalizam e revelam um avanço à prestação do direito social fundamental à educação nas instituições prisionais. São mecanismos que servem para garantir a efetividade e concretização de tais direitos, de modo que aglutinam e reforçam a indispensabilidade do direito humano à educação. No Brasil, vislumbramos uma situação educacional nos estabelecimentos prisionais de forma tímida, porém com algumas iniciativas concretas e efetivas. Existem em nosso país instituições prisionais que oferecem acesso às atividades educacionais de escolarização formal e informal aos detentos. Existem alguns estados que oferecem aos presos atividades educacionais - alfabetização, ensino fundamental, ensino médio etc.. Estado como Paraná (Penitenciária do Paraná Espen/Depen-Pr), Mato Grosso do Sul (Penitenciária Federal em Campo Grande), Rondônia (Penitenciária Federal em Porto Velho), Rio Grande do Norte (Penitenciária Federal em Mossoró), entre outras[2]. Diante algumas dificuldades encontradas que empatam a acessibilidade ao ensino, o Decreto 7.626, de 24 de novembro de 2011, prescreve em seu artigo 6°, que compete ao Ministério da Educação, na execução do PEESP:
I - equipar e aparelhar os espaços destinados às atividades educacionais nos estabelecimentos penais; II - promover a distribuição de livros didáticos e a composição de acervos de bibliotecas nos estabelecimentos penais; III - fomentar a oferta de programas de alfabetização e de educação de jovens e adultos nos estabelecimentos penais; IV - promover a capacitação de professores e profissionais da educação que atuam na educação em estabelecimentos penais.
Da mesma forma, o artigo 7° prescreve que: Compete ao Ministério da Justiça, na execução do PEESP:
I - conceder apoio financeiro para construção, ampliação e reforma dos espaços destinados à educação nos estabelecimentos penais; CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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II - orientar os gestores do sistema prisional para a importância da oferta de educação nos estabelecimentos penais; III - realizar o acompanhamento dos indicadores estatísticos do PEESP, por meio de sistema informatizado, visando à orientação das políticas públicas voltadas para o sistema prisional.
De acordo com o parágrafo único do artigo 3° do mesmo decreto, para o alcance dos objetivos serão adotadas as providências necessárias para assegurar os espaços físicos adequados às atividades educacionais, culturais e de formação profissional, e sua integração às demais atividades dos estabelecimentos penais. Assim, enxergamos ações que sinalizam prestações positivas para a concretização material do direito à educação. Existe um movimento de ações e iniciativas políticas, de ordem internacional, que demonstra atenção e preocupação de efetivar e viabilizar o acesso à educação aos presos. Vemos a imprescindibilidade de discutir a concretização e efetivação de direitos sociais fundamentais inerentes à pessoa humana, incluindo assim, os presidiários.
A atenção voltada para educação de jovens e adultos privados de liberdade é um tema de imensa importância no campo da redução de desigualdades de oportunidades educativas, e, ainda mais, a educação em estabelecimentos penitenciários é, sobretudo, um direito e como tal deve ser garantidos a todos que manifestam seu desejo de aceder à escolarização. (UNESCO apud SARAIVA e LOPES, 2011, p.29)
Há um processo articulado, em âmbito internacional, para promover ações voltadas à implementação do direito à educação no ambiente carcerário. No plano internacional, foi elaborado o documento Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros, documento aprovado em 1957 pelo Conselho Econômico e Social da ONU[3]. Esse documento institui regras mínimas para o tratamento de reclusos, prescrevendo medidas a serem tomadas para viabilização do acesso à educação. No Brasil, as regras mínimas de tratamento para os presos foi objeto da Resolução N°14, de 11 de novembro de 1994, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP). É fundamental o acesso à educação pelos presos para o desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205 CF/88), além de propiciar a sua reinserção social, como expõem Daniela Duarte e Jorge Teles:
No caso de presos e presas, esta educação é decisiva na restauração da autoestima e na sua reintegração na sociedade, por meio da potencializarão da capacidade do indivíduo em superar psicológicas e socialmente as adversidades e converter-se em sujeito de sua própria história. (apud SARAIVA e LOPES, 2011, p.29)
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Através da aprendizagem os presos desenvolvem suas potencialidades e aptidões, tornando-os agentes da realidade civil e política, estimulando sua autodeterminação social, sendo ferramenta de transformação e capacitação, além de configurar o meio carcerário, tornando-o um ambiente melhor do que ele tem se apresentado sem a presença de atividades educacionais. A negação do direito à educação aos presos é uma violação aos direitos humanos, de modo que são graves as consequências decorrentes da privação desses direitos, pois por serem fundamentais, guardam a característica da inviolabilidade. Preleciona Katarina Tomasevki (apud HADDA e GRACIANO, p. 17):
A exclusão educacional aponta para a necessidade de perguntas por que as pessoas pobres, permanecem pobres ou tornam-se pobres. A prática comum ainda é identificá-las como vulneráveis, mais do que discutir os fatores que as tornam vulneráveis. Quando a pobreza resulta da negação dos direitos, e esse é normalmente o caso, a solução é necessariamente a afirmação e a realização de todos os direitos humanos. É impossível combater as desigualdades nas condições de vida sem direito à educação. Quando o direito à educação é garantido, opera como multiplicador, fortalecendo o exercício de todos os direitos e de todas as liberdades individuais. Quando o direito à educação é negado, priva as pessoas de muitos direitos e liberdade.
O preso se encontra entre aqueles desprovidos de condições sociais que propiciem sua sobrevivência digna e justa, sendo rotulado como o mal da sociedade, merecedor de exclusão do convívio social, de modo que essa concepção é geradora de desigualdade e exclusão social, violadora dos princípios da dignidade humana e igualdade.
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CONCLUSÃO
É possível vislumbrar, no plano nacional e internacional, ações concretas que sinalizam o cumprimento dos diplomas legais, internos e externos, que protegem e garantem à concretização e efetividade do direito à educação nas instituições prisionais. Há uma tendência de ampliação da acessibilidade desse direito humano no ambiente carcerário, pois é uma exigência democrática e social de respeito aos direitos universais. Outrossim, é possível enxergar alguns avanços normativos na tutela e garantia do direito social à educação aos presos. Por ser um direito social fundamental, não há dúvidas que o acesso à educação nas instituições prisionais é uma prestação que deve o Estado realizar, propiciando, jurídica e CENTRO INTERDISCIPLINAR DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO E DIREITO - REVISTA A BARRIGUDA ____________________________________________________________________________________________________________
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materialmente, condições indispensáveis ao exercício concreto e efetivo dos direitos humanos. Ressaltando a importância que a escolarização possui como um meio de inclusão social, ferramenta de sociabilidade e de exercício da cidadania e dos demais direitos civis, culturais e políticos.
REFERÊNCIAS AFONSO DA SILVA, Paulo José. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Malheiros, 2010. BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 2007. BRASIL. LEI N° 10.172, DE 9 DE JANEIRO DE 2001, que aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10172.htm>. Acesso em: 13 de abril, 2013. BRASIL. LEI N° 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984, que institui a Lei de Execução Penal Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7210.htm>. Acesso em: 18 de jan, 2013. BRASIL. LEI Nº 12.245, DE 24 DE MAIO DE 2010, que altera o art. 83 da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal, para autorizar a instalação de salas de aulas nos presídios. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20072010/2010/Lei/L12245.htm>. Acesso em: 20 de fev. 2013. BRASIL. LEI Nº 12.433, DE 29 DE JUNHO DE 2011, que permite a remição da pena pelo tempo de estudo. Disponível em: <http://www.leidireto.com.br>. Acesso em: 19 de jan, 2011. BRASIL. DECRETO Nº 7.626, DE 24 DE NOVEMBRO DE 2011, que Institui o Plano Estratégico de Educação no âmbito do Sistema Prisional. BRASIL. RESOLUÇÃO Nº 03, DE 11 DE MARÇO DE 2009, que dispõe sobre as Diretrizes Nacionais para a Oferta de Educação nos estabelecimentos penais. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={E9614C8C-C25C-4BF3-A23898576348F0B6}&BrowserType=NN&LangID=pt-br&params=itemID%3D%7BD4BA0295587E-40C6-A2C6-F741CF662E79%7D%3B&UIPartUID=%7B2868BA3C-1C72-4347BE11-A26F70F4CB26%7D>. Acesso em: 22 de fev. 2013 BRASIL. Conselho Nacional de Educação (CNE). Câmara de Educação Básica (CEB). RESOLUÇÃO N° 2, DE 19 DE MAIO DE 2009, dispõe sobre as Diretrizes Nacionais para a oferta de educação para jovens e adultos em situação de privação de liberdade nos estabelecimentos penais. Disponível em:
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