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As lições de Carlos Lemos, um ícone do jornalismo carioca Em 47 anos de carreira ele participou da grande reforma do JB, criou um novo conceito de rádio FM e acha que o repórter deve ser sempre um “agente provocador”. Páginas 28, 29 e 30

Órgão oficial da Associação Brasileira de Imprensa

Jornal da ABI

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CRIMES CONTRA A IMPRENSA

Quem será a próxima vítima? Nos últimos sete anos, nada menos que 16 jornalistas foram assassinados no Brasil. A última vítima foi Luiz Carlos Barbon Filho, que denunciou políticos e empresários de Porto Ferreira, no interior de São Paulo, e foi morto à queima roupa, em maio, por um pistoleiro de aluguel. O repórter Gil Campos viajou a Porto Ferreira e relata nesta edição o clima de medo que domina a imprensa local. A ABI pediu ao governador de São Paulo, José Serra, que intervenha com rigor na apuração do crime e enviou moção no mesmo sentido ao Ministério Público paulista. Segundo o Instituto News Safety, o Brasil já ocupa o11º lugar na lista dos países onde mais se matam jornalistas. Páginas 3, 4, 5 e 6 e Editorial na página 2

MEMÓRIAS DE CARLOS FINO, CORRESPONDENTE DE GUERRA JORNALISTA PORTUGUÊS FICOU MUNDIALMENTE FAMOSO PELO “ FURO ” SOBRE A INVASÃO AMERICANA AO I RAQUE , EM 2003. PÁGINA 22

JUSTIÇA CONTINUA A IMPOR

PAULO PATARRA Criador da Realidade solta o verbo: “Jornalismo é transgressão” Páginas 14, 15, 16 e 17

CENSURA PRÉVIA ABI ACUSA JUÍZA DE JUNDIAÍ DE TER VIOLADO CONSTITUIÇÃO AO PROIBIR PUBLICAÇÃO DE ENTREVISTA NA TRIBUNA DE VINHEDO. PÁGINA 27

CEM ANOS DE ABI

AQUECIMENTO GLOBAL

O LEGADO DE OCTÁVIO FRIAS

Foi dada a partida para as comemorações do centenário da Casa

O que a mídia pode fazer contra este mal que assola o planeta?

ELE SE DIZIA EMPRESÁRIO E NÃO JORNALISTA, MAS RENOVOU A IMPRENSA À FRENTE DA FOLHA DE S. P AULO. P ÁGINA 23

Páginas 12 e 13

Páginas 8 e 9


Editorial

AQUI O CRIME COMPENSA O NOTICIÁRIO QUE O J ORNAL DA ABI publica costumeiramente está enriquecido nesta edição pela reportagem que o companheiro Gil Campos fez acerca do assassinato do jornalista Luiz Carlos Barbon Filho, elimier reira, intenado no Município de P orto F Porto Fer erreira, rior de São P aulo, onde morava e trabalhava, Paulo, por dois sicários empreitados para essa tor tor-pe missão por pessoas que se consideravam agredidas ou prejudicadas pelas matérias que ele fazia e publicava ou divulgava. Gil Campos, que fez um trabalho jornalístico eex xemplar emplar,, relatando fatos diretamente ligados ao crime e situando situando-- o no quadro de exercício da liberdade de imprensa no P aís, País, mostra que Barbon era um jornalista de combate, espécie em processo de extinção entre nós, e pagou o preço de sua coragem, de sua coragem,de determinação de expor à execração pública e submeter ao julgamento da Justiça auto auto-res de crimes repulsivos – no caso, figurões da área empresarial e da vida política de P orto Porto Fer reira, que abusavam da ingenuidade e da erreira, dependência econômica de adolescentes para saciar seus apetites e suas aberrações sexuais. A té ser abatido, Barbon colocava sua Até atividade profissional na busca de justiça, que do escândalo por ele denunciado há uns poucos anos resultara a punição apenas de um personagem menor e despossuído: um garçom. Como faz em todos os casos em que a liberdade de imprensa é vulnerada ou restringida, a ABI pleiteou a intervenção direta do Gover nador do Estado de São P aulo, Governador Paulo,

Associação Brasileira de Imprensa

José Serra, para que as autoridades policiais agissem com diligência e competência na apuração do crime. Não seria esta uma tarefa difícil, que encontrasse dificuldades de execução pela penumbra de algum mistério: o crime teve motivação amplamente conhecida; o silenciamento do jornalista interessava a personalidades conhecidas de Porto F er reira; não há nesse Município um Fer erreira; número eex xorbitante de proprietários de mo mo-tocicletas que desencorajasse a possibilidade de investigação de todos, exatamente todos, para conhecer seus hábitos, seu cír cír-culo de relações, suas formas de sustento, e saber que envolvimento algum dos investigados pudesse ter com o crime. P or fim, Por os projéteis utilizados pelos matadores poderiam e podem indicar de que arma saíram e quem dela detivesse a posse. Não estávamos nem estamos diante de algum caso revestido da sutileza presente nas criações de Conan Doyle, Simenon ou Agatha Christie: o que falta na apuração dos autores do crime ainda insolúvel não é inteligência, raciocínios refinados e singulares, mas apenas determinação, disposição de chegar aos autores da sentença de execução de Barbon. O Gover no do Estado de São P aulo até agora Governo Paulo não revelou nem uma nem outra. Essa omissão é típica do Brasil dos nossos dias, em que a impunidade estimula, alimenta e engorda a produção de crimes. Entre nós, aqui e agora, o crime compensa, como visível no noticiário cotidiano dos meios de comunicação.

Nesta Edição A morte por atacado no jornalismo: Luiz Carlos Barbon, a última vítima Artigo: Papel da mídia no combate ao aquecimento terrestre Artigo: Inferno na Terra Mais um general adverte: A Amazônia está sob risco A Cultura pára. E o Planejamento não se mexe. Ano Inaugural do Centenário: Nossa Casa: 99 anos Ano Inaugural do Centenário: Niemeyer na Comissão de Honra Paulo Patarra: O transgressor bendito Fernando Barbosa Lima conta em livro o que fez e viu na televisão Japiassu reúne crônicas de paixão Como Mário Barata salvou a carreira de Gustavo Barroso Edgar Rodrigues, anarquista, sim, sem graças a Deus Repórter deve ser sempre um agente provocador SEÇÕES ACONTECEU NA ABI Um voto de confiança As lições de Fino, autor do furo mundial da guerra do Iraque Um convênio para festejar os 200 anos da nossa imprensa LIBERDADE DE IMPRENSA É preciso sonhar com um Brasil ético Jornalista agredido por denunciar nepotismo Juíza de Jundiaí impôs censura em Vinhedo, SP DIREITOS HUMANOS A violência do Rio em debate Tributo a Modesto, 80 anos / Uma demora perversa VIDAS Octávio Frias, um renovador da imprensa

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OBSERVAÇÃO - Esta edição foi finalizada e impressa na segunda quinzena de julho de 2007, quando começou a circular nacionalmente.

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DIRETORIA – MANDATO 2007/2010 Presidente: Maurício Azêdo Vice-Presidente: Audálio Dantas Diretor Administrativo: Estanislau Alves de Oliveira Diretor Econômico-Financeiro: Domingos Meirelles Diretor de Cultura e Lazer: Jesus Chediak Diretor de Assistência Social: Paulo Jerônimo de Sousa (Pajê) Diretor de Jornalismo: Benício Medeiros CONSELHO CONSULTIVO Chico Caruso, Ferreira Gullar, José Aparecido de Oliveira, Miro Teixeira, Teixeira Heizer, Ziraldo e Zuenir Ventura CONSELHO FISCAL Luiz Carlos de Oliveira Chester, Presidente; Argemiro Lopes do Nascimento, Secretário; Jorge Saldanha e Manolo Epelbaum CONSELHO DELIBERATIVO (2007-2008) Presidente: Fernando Barbosa Lima 1º Secretário: Lênin Novaes 2º Secretário: Zilmar Borges Basílio Conselheiros efetivos (2006-2009) Antônio Roberto Salgado da Cunha, Arnaldo César Ricci Jacob, Arthur Cantalice, Aziz Ahmed, Cecília Costa, Domingos Augusto Xisto da Cunha, Domingos Meirelles, Fernando Segismundo, Glória Suely Alvarez Campos, Heloneida Studart, Jorge Miranda Jordão, Lênin Novaes de Araújo, Márcia Guimarães, Nacif Elias Hidd Sobrinho e Pery de Araújo Cotta. Conselheiros efetivos (2005-2008) Alberto Dines, Amicucci Gallo, Ana Maria Costábile, Araquém Moura Rouliex, Arthur José Poerner, Audálio Dantas, Carlos Arthur Pitombeira, Conrado Pereira (in memoriam), Ely Moreira, Fernando Barbosa Lima, Joseti Marques, Mário Barata, Maurício Azêdo, Milton Coelho da Graça e Ricardo Kotscho Conselheiros efetivos (2007-2010) Artur da Távola, Carlos Rodrigues, Estanislau Alves de Oliveira, Fernando Foch, Flávio Tavares, Fritz Utzeri, Jesus Chediak, José Gomes Talarico, José Rezende Neto, Marcelo Tognozzi, Mário Augusto Jakobskind, Orpheu Salles, Paulo Jerônimo de Sousa, Sérgio Cabral e Terezinha Santos Conselheiros suplentes (2006-2009) Antônio Avellar, Antônio Calegari, Antônio Carlos Austregésilo de Athayde, Antônio Henrique Lago, Carlos Eduard Rzezak Ulup, Estanislau Alves de Oliveira, Hildeberto Lopes Aleluia, Jorge Freitas, Luiz Carlos Bittencourt, Marco Aurélio Barrandon Guimarães, Marcus Miranda, Mauro dos Santos Viana, Oséas de Carvalho, Rogério Marques Gomes e Yeda Octaviano de Souza. Conselheiros suplentes (2005-2008) Anísio Félix dos Santos (in memoriam), Edgard Catoira, Francisco Paula Freitas, Geraldo Lopes (in memoriam), Itamar Guerreiro, Jarbas Domingos Vaz, José Amaral Argolo, José Pereira da Silva, Lêda Acquarone, Manolo Epelbaum, Maria do Perpétuo Socorro Vitarelli, Pedro do Coutto, Sidney Rezende, Sílvio Paixão e Wilson S. J. Magalhães Conselheiros suplentes (2007-2010) Adalberto Diniz, André Moreau Louzeiro, Arcírio Gouvêa Neto, Benício Medeiros, Germando de Oliveira Gonçalves, Ilma Martins da Silva, José Silvestre Gorgulho, Luarlindo Ernesto, Luiz Sérgio Caldieri, Marceu Vieira, Maurício Cândido Ferreira, Yacy Nunes e Zilmar Borges Basílio COMISSÃO DE SINDICÂNCIA Ely Moreira, Presidente; Carlos di Paola, Jarbas Domingos Vaz, Maria Ignez Duque Estrada Bastos e Maurílio Cândido Ferreira COMISSÃO DE ÉTICA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO Alberto Dines, Artur José Poerner, Cícero Sandroni, Ivan Alves Filho e Paulo Totti COMISSÃO DE LIBERDADE DE IMPRENSA E DIREITOS HUMANOS Audálio Dantas, Presidente; Arthur Cantalice, Secretário; Arcírio Gouvêa Neto, Daniel de Castro, Germando Oliveira Gonçalves, Gilberto Magalhães, Lucy Mary Carneiro, Maria Cecília Ribas Carneiro, Mário Augusto Jakobskind, Martha Arruda de Paiva, Orpheu Santos Salles, Wilson de Carvalho, Wilson S. J. Magalhães e Yaci Nunes

Jornal da ABI Rua Araújo Porto Alegre, 71, 7º andar Telefone: (21) 2220-3222/2282-1292 Cep: 22.030-012 Rio de Janeiro - RJ (jornal@abi.org.br) Editores: Francisco Ucha, Maurício Azêdo e Benício Medeiros Projeto gráfico, diagramação e editoração eletrônica: Francisco Ucha Apoio à produção editorial: Ana Paula Aguiar, Fernando Luiz Baptista Martins, Guilherme Povill Vianna, José Ubiratan Solino, Maria Ilka Azêdo e Solange Noronha. Diretor responsável: Maurício Azêdo Impressão: Gráfica Lance Rua Santa Maria, 47 - Cidade Nova - Rio de Janeiro, RJ.

As reportagens e artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do Jornal da ABI.


IMPUNIDADE

A morte por atacado no jornalismo

o segundo dia de maio, a reforma na casa de três quartos, no ermo Jardim Rosário, em Porto Ferreira, interior paulista, fora concluída. A residência de classe média ganhou do pedreiro "Moita" (ele não quis revelar o nome completo) um reforço substancial no muro: mais quatro metros de altura. Desde 2004, quando um "coquetel Molotov" (tipo de bomba caseira) atingiu a moradia, o dono da casa, jornalista Luís Carlos Barbon Filho, vivia apreensivo. Telefonemas anônimos, ameaças de seqüestro de seus filhos – Felipe e Juliana, de 10 e 14 anos, respectivamente. Desde dezembro do ano passado, quando Felipe sonhou que o pai morria e lhe contou, Barbon procurava comprar um colete à prova de balas. Ultimamente, demonstrando nervosismo, impaciência com os filhos e sofrendo de insônia, ele varava a noite escrevendo artigos para a imprensa. Escrevia à mão (não usava computador)

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ASSASSINATOS, EXECUÇÃO EM PRAÇA PÚBLICA, AGRESSÕES, AMEAÇAS, ATENTADOS, CENSURA E OUTROS TIPOS DE CRIMES, QUE ATENTAM CONTRA A LIBERDADE DE IMPRENSA, ESTÃO CADA VEZ MAIS COMUNS NESTE SÉCULO; 16 JORNALISTAS FORAM EXECUTADOS NOS ÚLTIMOS SETE ANOS NO BRASIL. BARBON FOI SILENCIADO EM PORTO FERREIRA, NO INTERIOR PAULISTA. POR GIL CAMPOS DA R EPRESENTAÇÃO DE S ÃO P AULO ENVIADO ESPECIAL A P ORTO FERREIRA, SP

e "conversava" com o bicho de estimação da família, o gato "Marcelo". Desde que Barbon denunciou, há quatro anos, um suposto esquema de corrupção de menores na cidade, distante 228 quilômetros da capital paulista, e que levou à prisão vereadores, empresários e um servidor público municipal, sua mulher, Katia, recepcionista de uma emissora de rádio, vivia com os nervos em frangalhos. A tensão aumentava a cada denúncia que o marido fazia pela imprensa. Nos primeiros meses deste ano, repetidamente, ela ouvia do marido: "Estou numa investigação muito importante. Vai ser outra bomba em Porto Ferreira". Barbon voltou a cutucar o caso de corrupção. Investigava uma provável farsa nas investigações, que teriam beneficiado tão somente o Delegado Mauricio Sponton Rasi, presidente do inquérito e atualmente prefeito petista de Porto Ferreira. Mas não só isso. Nos últimos meses, o jornalista havia denunciado um Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

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IMPUNIDADE - A MORTE POR ATACADO NO JORNALISMO

advogado, que, segundo ele, agia de má-fé contra aposentados; um tenente da Polícia Militar, que praticava arbitrariedades na cidade, conforme Barbon, além de um vereador que, segundo ele, não estaria trabalhando em benefício da população. Suas últimas denúncias também atingiam diretamente a administração municipal, ao colocar em dúvida a lisura de um concurso público recém-realizado e a locação de um caminhão com motorista pela Prefeitura, a preço que entendia estar superfaturado. Este último fato foi denunciado por ele ao Ministério Público. Seus artigos eram publicados nos semanários Jornal do Porto e JC Regional. Suas entrevistas e comentários também iam ao ar pela Rádio Porto FM. Os colegas sempre lhe pediam cautela, mas ele respondia que tinha compromisso com o povo e que "falava em nome do povo". Barbon não era uma unanimidade em Porto Ferreira. Seu estilo de trabalhar e de escrever, seus erros gramaticais eram criticados pela maioria dos colegas. O jornalista Cleber Sebastião Fabbri, do A Semana, afirma que Barbon "apurava mal e não ouvia o outro lado". Carlos Augusto Colussi, do Jornal do Porto, diz que "o tesão dele era 'atirar' contra o status quo, e fazia isso sem ter nenhuma formação intelectual". Mas seu trabalho também era elogiado. "Repórteres aqui relatam boletins de ocorrência da polícia; ele investigava", defende o radialista e jornalista Delci Gonçalves Melara, na imprensa desde 1959. "Barbon era terrível, ia atrás da notícia, incomodava, trazia várias matérias por semana. Era um grande repórter investigativo", acrescenta Gustavo Braga, do JC Regional. Para o repórter policial Paulo Correia, o colega sempre foi "polêmico". Correia foi testemunha de uma briga entre

vírus do jornalismo ao se tornar sócio do falido jornal Realidade, em 2001 –, sua casa, no afastado bairro do Jardim Rosário, vai passar por mais uma reforma: os muros estão sendo adaptados para a instalação de uma cerca elétrica.

Luiz Carlos Barbon era um jornalista polêmico com talento para investigar. Suas denúncias, publicadas na imprensa local, levaram à prisão vereadores e empresários de Porto Ferreira.

Barbon e um vereador, dentro da Câmara. "Os dois foram às vias de fato", lembrou. Um dia antes do término da reforma de sua residência, 1º de maio, Barbon foi ameaçado. No começo da noite, quando ia para casa, dois carros emparelharam com a sua moto, na Rua 29 de Julho, no centro. Um dos ocupantes fez disparos para o alto. A família e os amigos mais próximos ficaram sabendo do episódio, o que aumentou ainda mais a tensão e a angústia que envolvia o jornalista nos últimos meses. Dias depois, Barbon seria executado por pistoleiros, com dois tiros de escopeta. A execução, em plena praça pública, chocou a cidade. Nas ruas, comentava-se que "encontraram um jeito de calar o Barbon";

A viúva Katia e o filho Felipe: antes de Barbon ser assassinado, à queima roupa, no dia 5 de maio último, telefonemas anônimos e ameaças de seqüestro infernizaram a vida da família.

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nas rádios e nos jornais, falava-se que o assassinato fora um recado para a imprensa e para os jornalistas. A morte de Barbon engrossou a triste estatística de profissionais de imprensa assassinados no Brasil nos sete primeiros anos do século 21. Entre 2000 e maio deste ano, 16 jornalistas e radialistas foram mortos. Destes crimes, apenas dois não constam nos relatórios consultados de entidades que lutam pela liberdade de imprensa no Brasil. O clima de apreensão em Porto Ferreira foi além das redações. A cidade quase silenciou, pouco fala a respeito da execução. Os colegas evitam fazer comentários em público. Depois da missa de sétimo dia, a viúva foi surpreendida por uma Blazer preta que dava voltas em torno de sua residência com o som e os faróis altos, por volta das 11 horas da noite. A polícia foi chamada e o veículo desapareceu. O pai do jornalista, de 68 anos, também denunciou ter sido ameaçado, três dias depois do crime. O repórter do Jornal da ABI, que esteve em Porto Ferreira para verificar o comportamento da imprensa, dezoito dias após o assassinato do jornalista, recebeu um conselho de um colega da imprensa local: "Não saia do hotel à noite, é melhor você ficar assistindo sua novelinha por lá mesmo". As investigações estão sob responsabilidade do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa de São Paulo, que decretou sigilo no inquérito policial. Passados mais de dois meses ninguém foi indiciado pelo crime, embora existam suspeitas da participação de policiais militares no assassinato. Agora, quase dois meses depois da execução de Barbon – um ex-funcionário de pet shop que foi contagiado pelo

"Não me deixe morrer" Barbon passou todo o dia 5 de maio em sua casa, com dois pedreiros que preparavam o local onde iria instalar uma piscina. O sonho de criança estava sendo realizado, graças à venda de um Fusca 84 branco ao jornal A Semana. O amigo Albino Bruno Júnior, o Billy, responsável pelo departamento comercial da publicação, assumiu a dívida, repassando cinco cheques de R$ 1.000 para a empresa em que o jornalista escolheu o modelo do reservatório. Às sete da noite, Barbon foi à lanchonete de seu amigo Luis Fernando Sartori, para conversar. Depois comprou um maço de cigarros e, de moto, se dirigiu ao Bar das Araras, do sargento PM reformado Alcino Ântico, que fica a poucos metros da rodoviária, em frente à movimentada Praça Maria Libertucci Salzano. Ele pediu ovos cozidos e sentou-se à mesa da calçada, de frente para a rua. Fazia muito calor, mesmo assim ele nada bebeu. Pouco depois se aproximou João Batista Oliveira, pai de duas meninas vítimas no caso de aliciamento de menores, denunciado em 2003 por Barbon. Naquela época, ele teria descoberto que menores eram "recrutadas" para participar de orgias em

Para Cleber Fabbri, crime foi um recado aos jornalistas: “Não se metam a besta!”

um rancho nos arredores da cidade. As festas eram regadas a bebidas e patrocinadas por empresários e vereadores da cidade. A denúncia levou Barbon à final do Prêmio Esso de Jornalismo, em 2003. Nos últimos três meses, Barbon e Batista se encontravam quase diariamente no estabelecimento. Naquela noite, Batista sentou-se de frente para o jornalista, de costas para a rua.


A conversa girava em torno da política local e da construção da piscina, até que, tenso, Barbon contou que havia sido ameaçado naquela semana. Já se aproximava das nove horas quando uma moto com dois ocupantes se aproximou em alta velocidade pelacontramão,parandodiantedo bar. Os motoqueiros usavam capacetes, cujas viseiras estavam preparadas com insul-film. O garupa desceu. Tudo muito rápido. O jornalista arregalou os olhos, no mesmo instante em que seu amigoouviuoabrirdozíperdajaqueta (que mais parecia um sobretudo) do criminoso. Barbon fez menção de se levantar. Não teve tempo. O pistoleiro apertou o gatilho e um disparo, à queima-roupa, atingiu seu abdome. Batista se jogou de lado e conseguiu entrar no bar, enquanto Barbon tentava correr, mesmo ferido. Mas um segundo tiro o derrubou ao lado da mesa. Os cartuchos foram preparados com "balotes", grandes esferas de ferro. Banhado em sangue, o jornalista agonizou durante minutos na calçada, enquanto era aguardada a chegada do Resgate. Batista tentava conversar com o amigo, mas Barbon mal articulava as palavras. Quando conseguia, suplicava: só conseguia dizer "Não me deixe morrer. Não me deixe morrer". Barbon não resistiu. Morreu pouco depois da meia-noite. Depois de ter sido velado por algumas horas em Porto Ferreira, o corpo foi sepultado na vizinha Tambaú, onde ele nasceu a 21 de março de 1970. Pouquíssimos colegas da imprensa participaram da cerimônia. Um "cala-a-boca" Para a imprensa de Porto Ferreira, onde existem três jornais semanais e quatro emissoras de rádio (duas FM, uma AM e

prensa da cidade assimilou bem o "aviso". Ele entende que os colegas vão pensar mudou duas vezes diante de uma denúncia. "É algo como escolher entre viver e morrer. Candidato a ocupar o lugar de Barbon, neste momento, não existe". Carlos Colussi, do Jornal do Porto, no qual o jornalista escrevia há mais de dois anos, afirmou que Barbon não representava a imprensa, mas a liberdade de imprensa, e que "o clima na cidade mudou depois do crime, pois

Porto Ferreira perdeu o cara que atuava na prestação de serviços e, ao mesmo tempo, era uma metralhadora cospe-fogo". O diretor do JCRegional,GustavoBraga, que preparava Barbon para sair candidato a vereador nas próximas eleições pelo seu partido, o PTB, sugere "que a imprensa de Porto Ferreira só vai ter mais coragem depois que descobrirem quem o matou". Os colegas negaram que Barbon vivesse de extorsão, segundo boatos surgidos após sua morte. Ele vendia publicidade para os jornais em que escrevia.

Quem empreitou os dois pistoleiros?

Imprensa de Porto Ferreira lamentou morte de jornalista, executado numa lanchonete, por um motoqueiro, quando conversava com um amigo.

uma comunitária), apenas dois casos, desde sua fundação, em 1896, causaram grande impacto na cidade e a colocaram no noticiário nacional e internacional: a denúncia do esquema de aliciamento de menores, feita pelo jornalista Luís Carlos Barbon Filho, em 2003, e o seu assassinato, quatro anos depois. Diretor-proprietário do A Semana, que tem tiragem média de3.000exemplares,ojornalista Cleber Sebastião Fabbri diz que o assassinato foi um forte recado para a imprensa, algo como: "Nãosemetamabesta!".Paraele, a execução em praça pública foi uma forma de intimidar a todos. "Agora, os amigos de Barbon estão mais preocupados. Quem temdenúnciaparafazervaipensar duas vezes". Na opinião do radialista Jota Reis, da Rádio Porto FM, a morte foi muito mais que um recado, foi um "cala-a-boca". QuiJota Reis: “É como escolher entre viver e morrer. Candidato seram avisar: "O próximo pode a ocupar o lugar de Barbon, neste momento, não existe”. ser você". Em sua opinião, a im-

Várias entidades de defesa da liberdade de imprensa, nacionais e internacionais, se pronunciaram a respeito do assassinato do jornalista Barbon. Todas repudiaram, veementemente, o crime e exigiram a prisão dos responsáveis pela morte. O Vice-Presidente da República José Alencar também condenou o fato. A Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas) e o SJPSP (Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo), que enfatizou o fato de Barbon não possuir o diploma de jornalista (aliás, na cidade, apenas dois jornalistas possuem o diploma), lançaram nota em conjunto, em que afirmam que "não é possível que crimes e ilegalidades só sejam alvo de ação efetiva do poder público após se tornarem fenômenos midiáticos". O Presidente da Associação ABI, Maurício Azêdo, enviou telegrama ao Governador José Serra solicitando "apuração rigorosa e eficaz" do assassinato. "Tratando-se de jornalista que denunciava crimes e irregularidades de políticos locais, bastará eficiência e determinação para identificar quem empreitou os dois pistoleiros que o mataram à queima-roupa", diz o telegrama. A Ordem dos Advogados do BrasilOAB no Estado de São Paulo afirmou que a execução do jornalista "deve ser vista como uma tentativa de intimidação, que toda a sociedade brasileira deve rechaçar

na defesa da liberdade de imprensa – que serve de respaldo para todas as demais liberdades e garantias individuais e coletivas". O Conselho Federal da OAB também se manifestou: "Toda vez que um jornalista sofre qualquer tipo de violência ou constrangimento em face do exercício de sua profissão, a vítima não é apenas ele: é a sociedade e o Estado Democrático de Direito". A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo-Abraji repudiou o crime, que representa, na opinião da entidade, riscos à liberdade de imprensa. "O fato de ter sido realizado [o assassinato] em local público, de modo premeditado e com extrema violência revela uma tentativa clara de intimidação da imprensa e de impedi-la de cumprir sua obrigação de relatar fatos à sociedade", assinala a nota da Abraji. O jornalista Nelson Sirotsky, Presidente da Associação Nacional de JornaisANJ, lamentou a execução de Barbon, que classificou de "um covarde crime por encomenda, que vitimou um profissional exemplar e atingiu a liberdade de imprensa". A nota ainda diz que é "vergonhoso que um jornalista seja morto por exercer sua profissão em favor da sociedade, em defesa dos menores e contra o crime organizado. É lamentável também que as autoridades policiais, apesar das seguidas reportagens de Luiz Carlos, não tenham colocado fim a esse esquema que o acabou vitimando" e exige providências imediatas da polícia.

A ABI pede a intervenção de Serra Este é o texto do telegrama enviado pela ABI ao Governador José Serra: "Encarecemos a inter venção pessoal de V ossa Ex celência intervenção Vossa Excelência para apuração rigorosa e eficaz do assassinato do jornalista orto Luiz Carlos Barbon F ilho, repórter do Jornal do P Filho, Porto orto,, do Município de P orto F er reira, morto com dois tiros na noite Porto Fer erreira, de sábado, num bar nas proximidades da rodoviária local. Tratando -se de jor nalista que denunciava crimes e ir reguratando-se jornalista irregularidades de políticos locais, bastará eficiência e determinação para identificar quem empreitou os dois pistoleiros que o mataram à queima-roupa. Agradeço manifestação de V ossa Vossa Excelência acerca de violação tão grave da liberdade de imprensa. Cordialmente, Maurício Azêdo, Presidente da ABI."

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IMPUNIDADE - A MORTE POR ATACADO NO JORNALISMO

BRASIL, 11º EM MORTES O assassinato do jornalista Luís Carlos Barbon Filho ainda não foi computado pelo Instituto Internacional News Safety, com sede em Bruxelas, que colocou o Brasil na 11ª posição da lista de países em que mais morreram jornalistas entre 1996 e 2006. Nestes dez anos, contabiliza a entidade, 27 jornalistas foram mortos no País. No mesmo período, foram assassinados mais de mil profissionais de imprensa no mundo, 456 deles executados a tiros; 101 vítimas de explosões; 681 trabalhando em campo e 117 próximos aos seus locais de trabalho. Ainda de acordo com a pesquisa, 731 jornalistas foram mortos "em tempos de paz", dos quais 97 apuravam casos de corrupção e 46 trabalhavam em reportagens políticas. O balanço anual 2004 da entidade Repórteres Sem Fronteiras, com sede na França, divulgou o número de 53 jornalistas mortos em todo o mundo naquele ano e mais de 100 presos até janeiro de 2005. No Brasil, diz o relatório, foram verificados dois assassinatos de profissionais de imprensa naquele ano. "No México, Brasil e Peru, os assassinatos de jornalistas têm adquirido de novo uma dimensão preocupante", apontou o documento. Desde que criou o Programa de Defesa da Liberdade de Imprensa, em 1997, a ANJ (Associação Nacional de Jornais) registrou até o último mês de março 208 casos de violência contra a imprensa, que vão desde escuta telefônica em jornais, censura e até seqüestro, como o que aconteceu no dia 12 de agosto do ano passado, do repórter Guilherme Portanova e do auxiliar-técnico Alexandre Coelho, da Rede Globo, em São Paulo. A organização criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) assumiu o crime. Portanova só foi libertado após a divulgação pela emissora de uma fita de vídeo, na qual um homem encapuzado lia um manifesto do PCC e reivindicava ações do Governo na política penitenciária do Estado. No relatório Violência e Liberdade de Imprensa no Brasil, divulgado no dia 1º de junho pela Fenaj, Federação Nacional dos Jornalistas foram catalogados 68 casos de violência e de cerceamento de liberdade de imprensa no País em 2006, além de seis casos sobre cobertura de risco. "Em 2006 foram quatro casos de assassinatos de profissionais da área, o dobro do número registrado no ano anterior", destacou o documento. O relatório acentua que "por trás das notícias que recebemos em nossas casas há profissionais que são vítimas das mais diversas formas de pressão, dentro e fora das redações, para manipular a informação ou até mesmo não divulgá-la". 6

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Mapa das execuções SERGIPE O radialista José Wellington Fernandes, o Zezinho Cazuza, foi assassinado a tiro de escopeta no dia 13 de março de 2000. Ele havia feito várias denúncias de corrupção contra o prefeito da cidade de Canindé do São Francisco, Genivaldo Galindo, que fugiu após ter a prisão decretada. A execução custou R$ 3 mil.

programa de entrevistas na Rádio Timbaúba FM, no qual denunciava e criticava a criminalidade na região. Hélton Jonas Gonçalves de Oliveira, 18, teria confessado o crime, alegando que matou pelo fato da vítima "falar demais".

RIO DE JANEIRO Mário Coelho de Almeida Filho, editor do jornal A Verdade, da cidade de Magé, foi assassinado a tiros em agosto de 2001, na véspera do seu depoimento à Justiça em um processo de difamação, do qual era réu. O jornalista Tim Lopes (foto), da Rede Globo, foi torturado, teve o corpo perfurado por uma espada, as pernas cortadas e foi queimado ainda vivo por narcotraficantes no dia 2 de junho de 2002, na cidade do Rio de Janeiro. Quando foi capturado, o repórter investigava a exploração sexual de menores e o livre consumo de drogas em um baile funk. O jornalista Ajuricaba Monassa de Paula, 73, foi morto a pancadas pelo vereador Osvaldo Vivas, no dia 24 de julho de 2006, no município de Guapimirim. O acusado é faixa-preta em luta marcial. O jornalista vinha denunciando práticas ilegais do vereador. MATO GROSSO O diretor-presidente da Folha do Estado e da Rádio Cidade, Domingos Sávio Brandão de Lima Júnior, 40, foi morto a tiros no centro de Cuiabá, em plena luz do dia, no dia 30 de setembro de 2002. Seus veículos de comunicação denunciavam o jogo do bicho e o crime organizado no Estado. Ex-PMs são acusados do crime, supostamente a mando do bicheiro João Arcanjo Ribeiro, o "Comendador". A execução custou R$ 85 mil.

MATO GROSSO DO SUL Na cidade de Coronel Sapucaia, fronteira com o Paraguai, o radialista Samuel Roman foi morto com 11 tiros no dia 20 de abril de 2004. Ele comandava o programa "A Voz do Povo", em uma das rádios da cidade e, ultimamente, denunciava o tráfico de drogas e a alta criminalidade na região. André Felipe foi assassinado a tiros em Campo Grande, no dia 4 de fevereiro de 2006. A vítima era funcionário das rádios Mega 94 e Cultura AM. Dois militares teriam confessado o crime, alegando que "queriam fazer medo" a Felipe. Na cidade de Ponta Porã, no dia 13 de março de 2006, José Késsio, radialista da Amambay FM, foi morto com 11 tiros, no local de trabalho. PERNAMBUCO O radialista José Cândido Amorim Pinto, o Jota Cândido, tombou sem vida ao ser atingido com 19 tiros no dia 1º de julho de 2005, em Carpina, interior pernambucano. A vítima, que trabalhava na Rádio Comunitária Alternativa FM, vinha denunciando casos de nepotismo na prefeitura. No dia 24 de abril de 2004, em Timbaúba, interior de Pernambuco, José Carlos Araújo foi assassinado a tiros. O jornalista comandava um

SÃO PAULO O repórter-fotográfico Luiz Antônio da Costa foi assassinado na frente de um acampamento dos sem-teto no terreno da Wolkswagen, em São Bernardo do Campo. Ele estava a serviço da revista Época quando foi atingido por um tiro à queima-roupa, no dia 23 de julho de 2003. Dois assaltantes, que haviam roubado um posto de gasolina, mataram por achar que a vítima os tinha fotografado. O jornalista Luiz Carlos Barbon Filho foi executado por pistoleiros, em plena praça pública, na cidade de Porto Ferreira. O crime ocorreu no dia 5 de maio de 2007. A vítima foi atingida por dois tiros de escopeta. Barbon havia denunciado, em 2003, um esquema de corrupção de menores envolvendo vereadores e empresários. Ultimamente, vinha denunciando a administração pública, advogados, vereadores e policiais. Um dos investidores do Hoje Jornal, de Guarujá, Manuel Paulino, foi assassinado a tiros no dia 20 de julho de 2006, juntamente com a advogada Camila Francisco. CEARÁ O motorista José Maria Ramos da Silva foi morto a tiros no dia 26 de outubro de 2005, quando conduzia o repórter Aécio Santiago e o repórter-fotográfico José Leomar, do jornal Diário do Nordeste, de Fortaleza. O trio estava na Favela dos Sandras, fazendo reportagem.


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ARTIGOS JUPITERIMAGES

Papel da mídia no combate ao aquecimento terrestre PINHEIRO JÚNIOR *

Há fortes sinais na mídia mundial, americana inclusive, de que – finalmente! – algo poderá ser intentado para desacelerar o chamado aquecimento global. Dirão que esses sinais ficaram mais fortes a partir do documentário-campanha do exvice norte-americano Al Gore ainda em cartaz no Brasil. Imagine que até as proverbiais insensibilidades, traduzidas em apatia, ganância, brutalidade ou que qualificativos se possam dar ao comportamento de Bush, teriam sofrido ligeira mudança em benefício da humanidade. É verdade que, se a atmosfera terrestre poderá ser aquecida em 10 graus Celsius até por volta do fim do século, isso indica que estamos no mínimo atrasadíssimos em providências capazes de assegurar para nossos filhos, netos e bisnetos condições razoáveis de habitabilidade/sobrevivência. Pois ninguém duvida mais - nem Bush! – que a verdadeira interpretação da luta desenvolvida para impedir as catástrofes que advirão com o aquecimento terrestre em curso não está – como às vezes querem fazer crer, principalmente na mídia ainda comprometida com poluidores e predadores – numa atitude simplesmente beatífica e até idealisticamente desinteressada para salvar nosso maravilhoso Planeta. Não. Provavelmente a Terra não 8

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precisa ser salva de desaparecimento nenhum, já que antes do bicho homem surgir, nosso Planeta foi mais quente, foi mais frio, ficou gelado, voltou a se aquecer confortavelmente etc. É evidente, assim, que o mundo não vai acabar, a Terra não vai se desintegrar, desaparecer do sistema solar, sumir do universo, pelo menos tão cedo ou antes de alguns bilhões ou quintilhões de milênios. O homem, com sua congênita estupidez, é que estaria fadado a arder em companhia de outros (e inocentes) animais nas cinzas tóxicas das chaminés industriais, nas labaredas dos escapamentos automobilísticos, nos cogumelos solares das desintegrações atômicas, de Hiroxima a Chernobil. Sobreviveriam,quemsabe?asbaratasdomésticas que já foram trilobitas e têm adaptabilidade de trilhões de anos nestas praias de muitos lixos, humanos ou não. E, após esses infernos extintores de atos ilícitos e ínvias burrices, sem seres humanos, portanto, sem carros e sem fábricas, sem usinas e armas, a Terra impoluta continuaria girando espaço e universo afora em busca – quem sabe? – de novos e mais sensíveis habitantes. Há uma pesquisa na internet mostrando que os brasileiros são os terrestres mais especificamente conscientizados para a seriedade da insanidade que a emissão de gases na atmosfera representa para a sobre-

vivência humana. Viva, portanto, o Brasil! Enquanto 81% dos brasileiros acham que a luta pela preservação ecológica tem que passar imediatamente a providências práticas em termos mundiais, nos EUA apenas 42% da população consideram grave o aquecimento que derrete geleiras multimilenares e levanta oceanos ainda incógnitos. Assim, ou tomamos providências logo ou vamos nos afundar em inesperados catrinas e insuspeitadas nevascas, incontroláveisincêndiosflorestais,crescentes desertos e tempestades de areia lá dentro mesmo da pátria amada bushiana. Os jornalistas, mundo inteiro e Brasil em particular, têm papel relevante nesta cruzada ecológica acima de interesses políticos e econômicos. Principalmente porque, apesar do exemplo brasileiro, ainda estamos longe de uma autêntica conscientização ecológica, já que apenas 50% da opinião mundial culpam a ação do homem pela presente devastação climática e pelas futuras catástrofes que poderão mexer mais com os destinos dos homens nos próximos 90 anos do que poderiam prever filósofos como George Bernard Shaw, que suspeitava da coletiva sanidade mental dos homens. Aliás, estamos em plena loucura climática mundo afora com os especialistas culpando efeitos estufas e aquecimentos oceânicos incontroláveis. Chove no

verão como nunca e de forma estranha, ora como verdadeira caudal, ora com a persistência de chuviscos impertinentes com jeito de inverno transviado. Não obstante e apesar da campanha de Al Gore, garoto propaganda às avessas do efeito estufa majoritariamente provocado por despropositadas emissões ligadas a interesses bem nacionais, há 13% de americanos que nunca ouviram falar desse troço chamado aquecimento global. Militantes ecológicos, no entanto, propugnam por uma imediata moratória na produção de veículos consumidores de combustíveis fósseis. A GM e a Toyota, maiores vilãs do mundo como fautoras de emissões de CO2, que se apressem no aperfeiçoamento de seus veículos alternativos – elétricos, solares, a hidrogênio etc. Que se apressem também os industriais poluidores da China, do Japão, da Alemanha, da Rússia e da Inglaterra porque o mundo – como mostram os jornais, rádios e TVs todos os dias – está sentindo o aquecimento global na própria carne. E, o que poderia parecer agora apenas desconfortos climáticos, estranhezas pluviais e até histeria ecológica bem abrigada em jornais, por certo vai se revelar como gritos de dor. Ranger de dentes, Mr Bush! Pinheiro Júnior é jornalista e escritor.


AGECOM

A melhor solução contra o aquecimento global é a mais simples de todas: plantar árvores e não queimá-las, como acontece na Amazônia. Preservar esse ecossistema é vital para a humanidade.

INFERNO NA TERRA POR P AULO RAMOS D ERENGOSKI

Até há bem pouco tempo, chamar alguém de "ecochato" era uma ofensa... Agora é um elogio. Pois até o Papa, o Lula, o Príncipe Phillip (que é um chato) – menos o Bush – todos são defensores da natureza. Está na moda ser ecologista. E um dos motivos que tornou todos defensores do meio ambiente foi o onipresente e assustador "efeito estufa". Com aumento das secas, enchentes, degelos, calorões, incêndios, friagens, tormentas, furacões, desequilíbrios. O aumento da "quantidade" de calor, a partir de determinada temperatura,

transforma a "qualidade" do meio ambiente. Mas tudo na vida tem suas contradições. Enquanto algumas regiões, como o Brasil, serão prejudicadas, outras, como a Sibéria, tornar-se-ão férteis. Caso o derretimento do Permafrost (terras congeladas) não libere metano... Para o combate ao efeito estufa estão surgindo as mais estapafurdias sugestões. Como construir tubulações gigantes para canalizar todo o gás carbônico em algum bolsão no fundo do mar. Ou colocar um espelho gigante em órbita da terra para refletir os raios solares. Ou derramar um óleo de fictoplâncton sobre os oceanos à guisa de produtor de oxigênio. Há quem pense em jogar sobre as nuvens bastante

sal grosso em forma de gel para refletir a luz. Outros querem lançar todo o ferro de Carajás dentro do mar para criar microorganismos. Mas a melhor solução sempre é a mais simples. Basta aumentar – e muito – o florestamento com árvores de corte, para que elas, durante o crescimento, seqüestrem o dióxido de carbono. Como são renováveis, não necessitam adubos químicos e podem ser plantadas em regiões montanhosas, não agriculturáveis, farão um permanente trabalho de limpeza do ar. Além de gerarem empregos em massa. Neste sentido, Santa Catarina tem sido um Estado exemplar. Pois foi dos que mais

florestou e reflorestou no Brasil dos últimos anos. Bem ao contrário do que está acontecendo com a queima de milhões e milhões de árvores, sem replantio, na Amazônia. Como mostra a reportagem de repercussão mundial dos jornalistas Scott Wallace e Alex Webb em recente edição da internacional revista National Geographic. O que é mais um indício de que se não soubermos preservar o ecossistema amazônico, que é vital, fundamental, para a saúde da humanidade, ele será questionado e talvez se transforme em "casus belli". Paulo Ramos Derengoski é jornalista. Vive em Lages, Santa Catarina.

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DENÚNCIA

Para o general Eduardo Villas Boas, a bela paisagem amazônica esconde mazelas de toda sorte, que vêm ameaçando a soberania do país.

Mais um general adverte: A Amazônia está sob risco Ex-Comandante do Exército na região clama por medidas em defesa do “nosso maior patrimônio ambiental”. Em relatório que encaminhou à Diretoria da ABI, o associado Bernardino Capell Ferreira expressou seu entusiasmo diante da conferência proferida no Instituto de Geografia e História do Brasil pelo General-de-Brigada Eduardo Dias da Costa Villas Boas, ex-comandante do Exército na Amazônia,que discorreu sobre o tema Amazônia, Ameaças e Desafios e deu “uma bela e inflamada aula de nacionalismo”. Revelou Capell que o General Villas Boas, convidado pelo Presidente do Instituto, General-de-Divisão Aureliano Pinto de Moura, empolgou os presentes ao enumerar “fatos que no momento distinguem a nossa Hiléia Amazônica como uma área de risco e preocupações no que diz respeito à salvaguarda do nosso maior patrimônio ambiental”. O General Eduardo Villas Boas é mais um chefe militar que denuncia os riscos a que está exposta a Amazônia, denunciados também pelos Generais-de-Exér-

cito Luiz Gonzaga Lessa e Cláudio Barbosa Figueiredo, ex-Comandantes do Exército na Amazônia, que se pronunciam com freqüência sobre o tema e já o expuseram, sempre com alta preocupação patriótica, em conferências na ABI. “Referindo-se à extensa linha de fronteira da Amazônia com os países vizinhos – Peru, Bolívia, Colômbia, Venezuela, Suriname, Guiana e Guiana Francesa –, com uma extensão de 11.250 quilômetros – disse Capell –, lembrou o General Villas Boas que os Estados Unidos possuem na área fronteiriça ao México 80 mil soldados perfeitamente equipados e adestrados, enquanto o Exército Brasileiro na faixa fronteiriça com os sete países citados dispõe apenas de 28 pelotões de fronteira, embora se pretenda implantar duas brigadas, na foz do Amazonas e no Acre, a fim de assegurar a defesa de uma área equivalente a mais da metade do território brasileiro.”

“Falou-nos ainda o General dos problemas imigratórios na Amazônia, no desleixo das instituições governamentais para comaspopulaçõesindígenas,asquais,após terem suas terras demarcadas, vivem miseravelmente, como o ilustre militar demonstrou com provas irrefutáveis, ao fazer exibir, por projeção, fotos de interiores de malocas e da vida íntima dos índios em sua luta pela sobrevivência.” Contou Capell que o General citou Rockefeller como exemplo de “poder dos que pretendem dirigir o mundo à sua feição” e contagiou a assistência pela veemência com que descreveu os problemas que estão sendo observados na região, incluídos os relacionados com o tão propalado efeito do aquecimento global, o latifúndio, a construção de gasodutos, oleodutos e novas hidrelétricas, as queimadas e o desflorestamento. “Não deixou o General Villas Boas de comentar também a expansão do que chamou de ilícitos transnacionais, como

venda e consumo de drogas, contrabando de armas, prostituição de menores e muitas outras calamidades, as quais, disse peremptoriamente, embora não diretamente afetas às Forças Armadas, são por elas coibidas, na medida que lhes seja factível”, acrescentou Capell, informando que Villas Boas defendeu a execução de um projeto global para a Amazônia do qual participem homens que possam preencher os vazios da região. Capell, que, além de jornalista, é engenheiro e historiador e tem representado a ABI nas sessões do Instituto de Geografia e História do Brasil, concluiu seu relatório sobre a conferência do dia 8 de maio com imagens poéticas: “Brilhante expositor, o General Eduardo Villas Boas nos mostrou a Amazônia tal qual uma medalha cuja face original, extremamente bela pela ação da mãe natureza que a imprimiu, tem em seu reverso, contudo, o espelho das mazelas criadas,pormaisdasvezes,pelasmãosdesse grande predador – o homem”.

INSENSIBILIDADE

A Cultura pára. E o Planejamento não se mexe. O Ministro Paulo Bernardo e sua equipe sentaram sobre o Plano de Cargos que o Ministro Gilberto Gil encaminhou. Na Cultura o salário-base mais alto é de R$ 565. E há salário-base de R$ 79. Reunidos em assembléia-geral no dia 25 de junho, no Rio de Janeiro, os servidores da Cultura resolveram manter, por tempo indeterminado, a paralisação iniciada no dia 15 de maio. De acordo com o comando nacional de greve, os grevistas reclamam da inércia do Governo Federal, que vem protelando uma solução para as reivindicações dos servidores. A principal queixa da categoria é a não implantação do Plano Especial de Cargos da Cultura, instituído pela Lei nº 11.233, de 2005 e encaminhado pelo Ministro Gilberto Gil ao Ministério do Planejamento, mas até agora não implementado integralmente. Segundo Jorge Paixão, representante do comando nacional de greve, durante a assembléia foi decidido que um grupo técnico, com três representantes dos servidores e três funcionários do Ministério do Planejamento, teria um encontro nos dias 2 e 10 de julho, para discutir os pontos convergentes e os que não chegaram a um consenso. Revelou Paixão que o Plano prevê a estruturação de cargos, a concessão de gratificações e uma nova tabela de remuneração: 10 Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

— O Governo está querendo desconsiderar o que foi elaborado e aprovado há dois anos e encaminhado ao Governo pelo próprioGoverno,ouseja,peloMinistroGilberto Gil, que é o titular da Cultura. Dele serácobradaumaposiçãomaisfirme,jáque o Plano foi desqualificado pelo pessoal do Planejamento. Se o Ministro não é respeitado, então que pegue o boné e vá embora. Três dias antes da assembléia, em passagem pelo Rio para participar da solenidade de assinatura do Protocolo de Intenções com o Tribunal Superior Eleitoral para restauração de sua antiga sede, o Ministro Gilberto Gil não revelou se tem alguma alternativa para o fim da paralisação, mas declarou-se preocupado com a greve, que, segundo ele, poderia prejudicar os serviços aos turistas durante a realização dos Jogos Pan-Americanos. Jorge Paixão, por sua vez, afirma que o Governo nunca se dispôs a negociar qualquer ponto com os grevistas: — A postura, até o momento, tem sido uma farsa para atropelar as negociações. É pura enrolação da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento.

O Ministério do Planejamento, comandado pelo Ministro Paulo Bernardo, nem está aí para a crise. Pouco se lhe dá se muses, bibliotecas e tratos estão pardos e sem servir ao público. Para Bernardo, pelo visto, cultura não é coisa importante. Paixão chamou a atenção para o fato de que, sem a implantação do Plano, o Ministério da Cultura corre o risco de, em dez anos, perder a maioria dos seus servidores: — O último concurso aconteceu em 2006, para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-Iphan. Dos cem candidatos aprovados e contratados, 60% já desistiram do trabalho, devido aos baixos salários e à falta de estrutura administrativa para exercer a função. Para se ter uma idéia da situação salarial, dou como exemplo a Biblioteca Nacional, onde o salário-base de nível superior de uma bibliotecária é de R$ 267 e pode chegar a R$ 1,8 mil, com gratificações como vale-transporte e auxílio-alimentação, canceláveis a qualquer momento, enquanto na Câmara Federal a remuneração para mesma função é de R$ 9 mil. Trabalham na BN — que recebe em

média 8 mil usuários por mês – cerca de 380 funcionários. O salário-base mais alto é de R$ 565 para servidores de nível superior; o menor, R$ 79,00 para nível elementar. Com a paralisação da Cultura, estão prejudicados os serviços de consulta nos setores de Obras Gerais, Obras Raras e Periódicos, muito procurados por jornalistas e pesquisadores, entre outros. O Ministério da Cultura tem em torno de 2,2 mil servidores em atividade em todo o País. No Estado do Rio, mil funcionários aderiram à greve, que envolve o setor regional do Ministério e todos os órgãos vinculados à Pasta – além da BN e do Iphan, a Fundação Nacional de ArtesFunarte, a Fundação Cultural Palmares e outros. A Fundação Casa de Rui Barbosa ficou fora da paralisação, que fechou as portas dos Museus Histórico Nacional, Nacional de Belas-Artes, da República, do Folclore, Villa-Lobos e do Açude, da Casa Benjamim Constant, da Chácara do Céu e do Paço Imperial. No domingo 24 de junho a Escola Nacional de Circo abriu uma exceção e fez uma apresentação.



NOSSA CASA, 99 ANOS POR A NTONIO DOMINGUEZ C ALVO

A Associação Brasileira de Imprensa (ABI), à qual tenho a honra de pertencer como sócio militante e remido há 50 anos e sendo também Conselheiro em alguns mandatos, foi fundada no dia 7 de abril de 1908, por seu perseverante idealizador Gustavo de Lacerda, com o objetivo de abrigar e garantir à categoria jornalística os direitos assistenciais e se tornar um poderoso centro de ação. Desde então, passaram pela Casa 18 presidentes. Os primeiros passos para a elaboração do estatuto da ABI foram dados pelo próprio Gustavo de Lacerda, juntamente com Mário Galvão e Amorim Júnior, que se reuniam numa pequena sala da sobreloja onde funcionava a Caixa Beneficente dos Empregados do jornal O Paiz. Aí foi a nossa primeira sede provisória. Com a criação desta entidade de classe, coube à primeira Diretoria consolidar e ampliar sua atuação, o que foi conseguido, mas a duras penas, pois, nessa época, seus fundadores sofriam muitas hostilidades e descasos, inclusive da classe patronal. O meio jornalístico encontrava-

Todos os Presidentes da ABI Gustavo de Lacerda (1908-1909) Francisco Souto (1909-1910) Dunshee de Abranches (1910-1911 e 1911-1913) Belisário de Souza (1913-1915 e 1915-1916) Raul Pederneiras (1915-1917 e 1920-1926) João Guedes de Melo (1917-1920) Barbosa Lima Sobrinho (1926-1927, 1930-1932 e 1978-2000) Gabriel Loureiro Bernardes (1927-1928) Manuel Paulo Filho (1928-1929) Alfredo Neves (1929-1930) Herbert Moses (1931-1964) Celso Kelly (1964-1966) Elmano Cruz (1966 e 1974-1975) Danton Jobim (1966-1972) Adonias Filho (1972-1974) Líbero Osvaldo de Miranda (1975) Prudente de Moraes, neto (1975-1977) Fernando Segismundo (1977-1978 e 2000-2004) Maurício Azêdo (2004)

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Jornalista Gustavo de Lacerda foi o fundador e primeiro presidente da ABI.

se disperso e, portanto, desfavorável a qualquer ideal de solidariedade profissional. Mas em busca de autodefesa e de prestigiar a classe à qual pertenciam, os homens de imprensa foram aderindo à entidade em proporções cada vez mais animadoras e o prestígio da instituição, consolidando o sonho de Lacerda, que se deu com a admissão no quadro social da Casa de nomes representativos na vida nacional, como o Chefe da Polícia, o Comandante da Polícia Militar, o Prefeito, o Comandante do Corpo de Bombeiros e até o Ministro da Guerra. Nas duas décadas que se sucederam, a ABI acomodava-se em espaços alugados e, em algumas ocasiões não tinha o dinheiro para o aluguel, mas nem isso fez com que os dirigentes abdicassem de seus ideais. Só em 1931, sob a liderança de Herbert Moses, que assumiu a presidência da Casa nesse ano, é que o sonho da sede própria se tornaria realidade, com a construção de um arrojado prédio, na Rua Araújo Porto Alegre, o qual representou um marco na arquitetura moderna brasileira. A execução das obras no Edifício Herbert Moses, que durou três anos (1936 a 1939), honrou a tecnologia nacional. Técnicas pioneiras apresentadas por Le Corbusier foram adotadas, além de outras características representativas da evolução arquitetônica brasileira. O prédio destaca-se inclusive por ter sido nele utilizada pela primeira vez a solução apresentada pelo legendário Le Corbusier para o problema do excesso de luz — o brise-soleil, quebra-sol através de persianas de concreto na fachada — e outras características que marcam a evolução da arquitetura moderna, como estrutura independente, teto-jardim, fachada livre e plano livre. Os recursos para a construção do edifício-sede foram conseguidos pelo próprio Moses através de solicitação pessoal ao Presidente Getúlio Vargas, por intermédio do Ministro Osval-

do Aranha. O empréstimo foi levantado no Banco do Brasil. Na ocasião, Getúlio Vargas recebeu o título de Presidente de Honra da Casa e Moses foi agraciado como Grande Benemérito. A amplitude do hall de entrada da ABI, que surge de repente numa esquina movimentada, tem um caráter de praça. Essa disposição marca também as demais peças do projeto, convidando à reunião e ao congraçamento das pessoas. Pelos fundos, dá passagem para a Rua Pedro Lessa, no terraço havia um jardim concebido como ponto de lazer. O edifício-sede da ABI que foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico Estadual em 1965, permanece até hoje como um prédio ímpar na cidade. Tão necessário a ela quanto o Pão de Açúcar e o Corcovado. Em 1984, foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional–Iphan. Não poderíamos deixar de citar aqui o outro importante ícone da história da ABI que foi Alexandre José Barbosa Lima Sobrinho, o qual lutava por ideais nacionalistas e via sua profissão como um meio de levar a população brasileira à conscientização política e social. Em 1926, aos 29 anos de idade, assumiu pela primeira vez a Presidência da Casa. Durante seu quarto mandato, em 1992, foi o responsável direto pelo pedido da abertura do impeachment de Fernando Collor de Mello e o primeiro orador inscrito para defender o processo. A ABI jamais deixou de cumprir os objetivos que a originaram, mas foi se adaptando ao longo dos tempos, ajustando seu Estatuto às diversas situações socioeconômicas da indústria jornalística, preservando, no entanto, a dignidade profissional dos jornalistas e seu relevante papel nos fatos da história de nosso País. A Diretoria da ABI está nas mãos de Maurício Azedo desde 13 de maio de 2004, quando foi eleito com quase 60% dos votos, para o triênio 2004-2007; na eleição do último dia 27 de abril de 2007, se reelegeu para o triênio seguinte (20072010), ocasião em que também foram eleitos os membros da diretoria, do Conselho Consultivo, Conselho Deliberativo e do Conselho Fiscal. A nova Diretoria, que tem Maurício Azêdo como Presidente, conta com Audálio Dantas (Vice-Presidente); Estanislau Alves de Oliveira (Diretor-Administrativo); Domingos Meirelles (Diretor Econômico-Financeiro); Jesus Chediak (Diretor de Cultura e Lazer); Paulo Jerônimo de Souza (Diretor de Assistência Social) e Benício Medeiros (Diretor de Jornalismo). Antonio Dominguez Calvo é jornalista e sócio da ABI desde 1956

Em 2007, reafirmação do ideário de 1908 A ABI declarou iniciado a partir de 7 de abril, data do seu 99º aniversário de fundação, o Ano Inaugural do seu centenário, que será comemorado em 7 de abril do ano que vem. A instituição do Ano Inaugural do Centenário foi aprovada pela Comissão Executiva do Centenário da ABI por proposta do publicitário Marcelo Silva, da Agência Giacometti, de São Paulo, que integra a Comissão, como colaboradora voluntária, por indicação do Conselho Nacional de Propaganda. Para assinalar a passagem de seu aniversário, a ABI divulgou declaração em que reafirma o compromisso da entidade com a defesa da liberdade de imprensa, dos direitos humanos e do interesse nacional. Informou a ABI que a programação do Ano Inaugural inclui a inauguração das obras de reforma da sua Biblioteca (Biblioteca Bastos Tigre) e o descerramento de uma placa em homenagem ao seu antigo funcionário Jorge Vianna Bastos, que serviu à instituição por mais de 50 anos, até seu falecimento, como responsável pelo Salão de Estar da Casa, no 11º andar do Edifício Herbert Moses. A declaração comemorativa do aniversário da ABI tem o seguinte teor: “Ao completar seus 99 anos de existência, transcorridos em 7 de abril corrente, a Associação Brasileira de Imprensa reafirma o seu compromisso com a defesa da liberdade de imprensa, dos direitos humanos e do interesse nacional, causas que norteiam a sua atuação desde a sua fundação em 7 de abril de 1908 por Gustavo de Lacerda e um grupo de idealistas por ele liderado. A ABI considera necessário reafirmar que entende que o Estado Democrático de Direito instituído pela Constituição de 5 de outubro de 1988 terá e manterá a sua plenitude na medida em que prevalecerem no País os direitos que integram a liberdade de imprensa: o direito de informação, o direito de acesso às fontes de informação, o direito de opinião. Esses bens imateriais não pertencem aos órgãos de informação nem à comunidade jornalística, mas ao conjunto da sociedade, ao qual os meios de comunicação buscam servir. É com especial motivação que a ABI, neste ensejo, declara iniciado o Ano Inaugural do Centenário, que a Casa celebrará com as galas devidas em 7 de abril de 2008, fixando desde já a divisa que ornará sua ação agora e sempre: imprensa livre, povo livre. Rio de Janeiro, 7 de abril de 2007. (a) A Diretoria.”


O presidente da ABI, Maurício Azêdo (à direita), visita o grande arquiteto: Comissão de Honra do Centenário, presidida por Niemeyer, reunirá nomes de destaque nas diversas áreas da cultura.

Niemeyer na Comissão de Honra Sócio da ABI desde 1953, Oscar dirigia a revista Módulo quando Moses assinou sua proposta de filiação O arquiteto Oscar Niemeyer aceitou o convite para presidir a Comissão de Honra do Centenário da ABI, que transcorrerá no ano que vem, em 7 de abril, quando também se comemora o Dia Nacional do Jornalista. Niemeyer já havia comunicado sua decisão em e-mail dirigido à ABI, no qual, com modéstia, declarou que se sentia homenageado com a indicação, e a reafirmou no dia 29 de março, ao receber em seu escritório o Presidente da ABI, Maurício Azêdo. Niemeyer é sócio da ABI desde 1953, quando ingressou na Casa por proposta do próprio Herbert Moses, Presidente da Casa. Ele fundou, editava e dirigia a revista Módulo, especializada em arquitetura e que contemplava também temas culturais, como na edição que dedicou aos 60 anos do poeta Joaquim Cardoso, que era também engenheiro e foi o calculista de concreto das obras de Niemeyer desde a Pampulha, em Belo Horizonte, aos palácios e edifícios públicos de Brasília, nos anos 50 e 60. Após a aceitação de Niemeyer, a ABI vai convidar para integrar a Comissão de Honra do Centenário personalidades dos diferentes campos da vida cultural – literatura, teatro, cinema, artes plásticas, música, arquitetura e engenharia, Direito e Justiça, esportes –, da área de comunicação e do meio empresarial. A Comissão de Honra não terá qualquer encargo de caráter administrativo ou financeiro: como sua denominação indica, terá caráter honorífico, para testemunhar o apreço da ABI e da comunidade jornalística aos variados setores da vida do País desde a fundação da Casa, em 1908. A indicação de nomes para a Comissão de Honra está aberta às sugestões dos sócios da ABI e aos próprios membros que a Casa começará a convidar nos próximos dias. Além da Comissão de Honra, a ABI constituiu a Comissão Executiva do Centenário, da qual participam diretores e associados da Casa. Por designação do Conselho Nacional de Propaganda, a agência de publicidade Giacometti, sediada em São Paulo, integrou-se à Comissão como colaboradora voluntária. A Comissão Executiva é aberta a participação dos sócios. Foi por proposta do publicitário Marcelo Silva, um dos especialistas da Giacometti vinculados à Comissão Executiva, que a Casa decidiu declarar que o dia 7 de abril de 2007, data de seu 99º aniversário, marca o início do Ano Inaugural do Centenário da ABI.

O AGRADECIMENTO DA ABI No encontro com Niemeyer a ABI entregou-lhe um ofício de agradecimento formulado nos seguintes termos: “A ABI vem manifestar agradecimento por sua decisão de aceitar o convite para que Você seja o Presidente de Honra da Comissão do Centenário da Casa, a ser completado em 7 de abril de 2008 e que ensejará desde logo a realização de uma série de eventos de caráter cultural, integrando aquilo que denominamos de Ano Inaugural do Centenário da ABI. Para planejar as comemorações, que se estenderão por todo o ano de 2008, organizamos duas Comissões, uma Comissão de Honra, de caráter honorífico e que não terá qualquer encargo de caráter administrativo e financeiro, e uma Comissão Executiva, que executará as tarefas decorrentes do planejamento; vai carregar o piano. Dada a expressão da ABI nos diferentes campos da vida nacional, à qual tem prestado inestimável contribuição, queremos que a Comissão de Honra seja integrada por personalidades de relevo nas áreas mais destacadas do País: na literatura, os acadêmicos jornalistas e sócios da ABI, como Carlos Heitor Cony, Murilo Melo Filho, Arnaldo Niskier, Cícero Sandro-

ni, Lygia Fagundes Telles; na música, Chico Buarque, Arthur Moreira Lima, Hermínio Belo de Carvalho, Ney Lopes, Beth Carvalho; no teatro, Tônia Carrero, Paulo Autran, Sérgio Brito, Augusto Boal, Fernanda Montenegro; no cinema, Nelson Pereira dos Santos, Cacá Diegues, Ruy Guerra, Sérgio Rezende, Eduardo Coutinho, Vladimir Carvalho, entre outros. Ao convidá-lo para Presidente de Honra da Comissão, temos em conta não apenas a sua expressão como a personalidade cultural brasileira de maior renome mundial (Oscar Niemeyer é o único brasileiro de que o mundo falará no ano 3000, dizia Darci Ribeiro), mas também a circunstância de que sua presença dará à ABI a repercussão que ela merece, sensibilizará os demais convidados e indicará que a Casa do Jornalista, em consonância com a trajetória do Presidente da Comissão de Honra do Centenário, mantém compromisso inarredável com os ideais que marcam os seus 100 anos de existência: a defesa das liberdades e dos direitos humanos e a defesa do interesse nacional em todos os campos. Com a nossa gratidão, renovamos as expressões do nosso elevado e justificado apreço. Cordialmente (a) Maurício Azêdo, Presidente”

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PERFIL PAULO PATARRA

O TRANSGRESSOR BENDITO POR GIL CAMPOS

O jornalista Paulo Patarra não tem mais os ralos cabelos e a barba que o acompanharam na maior parte dos seus mais de meio século de jornalismo. Mas a inteligência, o perfil de líder, o bom humor, o olhar crítico e a língua afiada estão ainda mais aguçados no velho Patarra, hoje com 73 anos. No início do segundo semestre do ano passado, ele descobriu um câncer na garganta, provocado pelos 61 anos de tabagismo. “Fumei perto de 1 milhão de cigarros. Fiz as contas”, escreveu, esboçando um sorriso. “Escreveu” porque Patarra não fala mais — e foi escrevendo que concedeu esta entrevista ao ABI Online, que o Jornal da ABI agora reproduz. Seu último cigarro, há nove meses, foi fumado no hospital, horas antes de ser submetido a uma laringectomia — procedimento cirúrgico para retirada da laringe e das cordas vocais. Mesmo assim, ele não demonstrou desânimo e avisou aos amigos: “Não é um ‘pobre’ câncer que vai me derrubar. Só pode me matar.” Patarra começou a fumar aos 12 anos, idade em que, depois de estudar em um colégio de padres, se tornou ateu convicto. Aconvicção,aliás,foimotivodemuitasdiscussões entre ele, o criador e Diretor da revistaRealidade,eorepórterCarlosAlberto Libânio Christo, o Frei Betto: — Bettinho (só eu o chamo assim) e eu “brigamos” muito; coisa de religioso versus ateu. Frei Betto, cuja amizade com o diretor ultrapassou as barreiras da Redação, comenta: — Paulo é comunista, ateu convicto, e sempre me disse ter inveja da minha fé. Curioso. Ao ouvir isso, eu tinha a impressão de que ele se queixava não a mim, mas a Deus, por não lhe ter concedido o dom da fé. Nunca, entretanto, ele deixou de respeitar minha postura cristã, e temos em comum o patrimônio, hoje olvidado, das idéias de esquerda. Patarra militou no PCB, entre 1957 e 1960, e foi preso no Governo JK ao ser flagrado pichando a frase “Anistia para Prestes”. Em 1968, pouco antes de estourar o AI-5, assinou a entrevista com Luís Carlos Prestes que foi capa da Realidade. Apesar de ter sido uma das mais importantes de sua vida de repórter, a matéria trouxe a decepção com o Partidão: — O PCB 14 Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

Criador de Realidade, revista que revolucionou o jornalismo, ele rejeita o título de “jornalista maldito”. Há colegas que o consideram um Telê do jornalismo.


me enganou, disse que o Prestes tinha feito plástica. Não vi o rosto dele e a foto é quase de costas. Com a revista nas bancas, cara desenhada na capa, com a chamada Este rosto não existe mais, estourou o Ato 5. Fugi durante seis, sete meses. Fiquei no Hotel Delfim, em Guarujá, por conta da Editora Abril. Tinha medo de que os militares mepegassemetorturassemparasaberonde estava o Velho. A reportagem, seu último trabalho na Realidade, rendeu um Prêmio Esso de Jornalismo, que Patarra se esquivou de receber: — Tive que pedir que esquecessem. Se não, de novo, os milicos iam ficar p... Por leitura labial, era fácil perceber alguns palavrões, não só quando o assunto era ditadura, mas também jornalismo, jornalistas e veículos de comunicação na atualidade — “jornalista precisa é saber ler”, escreveu com furor. A entrevista foi interrompida três vezes: quando uma enfermeira se aproximou para verificar a pressão arterial e a temperatura do paciente, quando outra pessoa lhe trouxe um copo de vitamina — ele fez careta no primeiro gole — e quando se escutou o único gol da Seleção Brasileira contra a equipe de Gana, naquela tarde de 27 de março — Patarra correu para perto da pequena tv da enfermaria no Centro de Hematologia. Ao final, depois de quatro horas, escreveu nas anotações do repórter: “Falamos, não? Imagina só se eu não estivesse mudo!” As respostas que se seguem foram entregues em um segundo encontro com Patarra, que um dia tentou ser poliglota, mas nunca concluiu os cursos de Inglês, Francês e Italiano.

“Jornalista precisa é saber ler” ABI Online — Qual a sua análise sobre a imprensa brasileira na área política? Paulo Patarra — É tempo de “fitagem”: quem ganha (ou compra) gravação — de som e/ou imagem — tem manchete. E cadê a reportagem? No mais, tomem-se frescuras, cerco às celebridades, exaltações aos imbecis, dedo no gatilho até pra esquerdóides. ABI Online — Como ser jornalista em tempos de computador, internet e globalização? Patarra — Todos podem mentir. Máquina é que nem gente. E globalização é coisa velha. Só se cai nela por interesse de uns poucos. Aqui e mundo afora. Uma coisa acho certa: o jornal vai ser impresso na casa dos leitores. Não é óbvio? Mas quando dei aula na Universidade San Marcos proibi ‘pesquisa’ na internet. ABI Online — Como se “fabrica” jornalista? No dia-a-dia ou nas faculdades de Comunicação? Patarra — Tanto faz. Jornalista precisa é saber ler. Muito. De tudo. Se fizer qualquer faculdade, talvez ajude. ABI Online — Você é a favor do diploma para exercer o jornalismo? Patarra — Não. Comecei pela Cásper Líbero, que se apresentava como “escola

de jornalismo”. Era tão ruim que acabei expulso, de tanto reclamar. Dizem que a ECA (da USP) é a tal. Pelo que vi, não vi. ABI Online — Qual é a sua análise sobre as revistas semanais da chamada grande imprensa? Patarra — Carta Capital corre só, pela meia-esquerda. Época — com o canhão da Globo abrindo caminho — já deixou IstoÉ a comer poeira, muita poeira. Quanto à Veja, quanto dinheiro jogado fora numa redação pedante; é só boba ironia e triste reacionarismo. Está à direita dos ACMs. Em direitismo, bate Época e IstoÉ, uma tarefa difícil... ABI Online — Quatro Rodas foi um ensaio para a Realidade? Patarra — Foi. Tanto Mino Carta (que foi para o Grupo Estado) como eu — e os outros — estávamos lá de passagem, à espera do lançamento de uma revista de interesse geral. Quando assumi a Direção de Quatro Rodas, trocamos turismo por índios: “O povo deve morrer”. Carlos Azevedo (repórter que assinou a matéria) ficou com o fotógrafo (maravilhoso) Luigi Mamprin quatro meses no mato, às escondidas da cúpula. Também compramos carteiras de motoristas para uma outra reportagem. Levei para Realidade quase todos os que tinha enfiado na Quatro Rodas e em outras revistas da

Abril: o “maluco beleza” do Narciso Kalili veio de Intervalo, Eduardo Barreto estava escondido em Claudia e Hamilton Almeida Filho, um gênio diabólico, como outros, veio da rua. ABI Online — Faltam hoje grandes repórteres ou espaço para eles? Patarra — Faltam é repórteres. Todos os bons viraram colunistas, o que é mais barato para os patrões. Reportagem é coisa cara, mas os melhores jornais deste planeta continuam a fazê-los. Já por aqui... ABI Online — Como foi seu trabalho com Roberto Civita e Roberto Marinho? Patarra — Com o Robert (naquele tempo ele não tinha o “o”) Civita foi ótimo. Afinal, fui eu que o indiquei para comandar a revista, quando o primeiro Diretor, o publicitário e escritor Hernani Donato, caiu por incompetência, comprovada no número zero, em novembro de 1965. “Nomear” Robert foi o pulo-dogato: nunca faltou dinheiro na revista. Para nós e para qualquer doida matéria que nascesse das reuniões de pauta, que jamais acabavam antes de se começar a edição seguinte. Quanto ao Dr. Marinho, só estive com ele uma vez. Quem mandava na Rio Gráfica — futura Editora Globo — era o atual Presidente das Organizações Globo, Roberto Irineu. Foi com ele que tratei da minha ida para o Rio e foi dele que recebi carta-branca. Na então Guanabara, em 1972, descobri que a empresa tinha um tripé manco de duas pernas. Da redação, impressão e distribuição, só funcionava a primeira. Falei com o Roberto Irineu e fui — pela primeira vez — encontrar com o Doutor Roberto. Expus a situação ao homem, ele ficou de pensar. No dia seguinte, a resposta simples, em um bilhete: “Demita um terço da redação.” Fiz a maleta e fui para a praia, deixando meu nome no papel de demissão. O mais notável: depois disso, trabalhei mais sete vezes nas Organizações Globo — quase 20 anos na tv, em São Paulo e no Rio de Janeiro. ABI Online — Você se considera um “jornalista maldito”? Patarra — De jeito nenhum. Veja o meu currículo. Sou um transgressor bendito.

Paulo Patarra (à direita), com o jornalista Hamiltinho de Almeida e o escritor João Antônio.

ABI Online — Como um ateu foi educado numa escola de padres? Ou sua descrença surgiu depois do colégio? Patarra — Fiz o então ginásio em Taubaté, no Vale do Paraíba, de 1941 a 45. Quatro anos como interno, dos melhores tempos de minha vida. Fiquei ateu na então segunda série ginasial, aos 12 anos. De tanto ver como os padres eram falsos, injustos, pedófilos de alma. E de ler a Bíblia todo santo dia, durante a chatíssima santa missa. Amém! Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

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PERFIL PAULO PATARRA

“A vida e o talento de Paulo Patarra são gritantes na história do jornalismo brasileiro.” FREI BETO

A fama de maldito Nascido em São José dos Campos, no interior paulista, no dia 21 de outubro de 1933, órfão do pai Manoel, vítima da tuberculose, em 1937, Paulo de Carvalho Patarra estudou no Seminário de Cinema do Masp, aos 20 anos, ao mesmo tempo em que cursava o Centro de Preparação dos Oficiais da Reserva (CPOR) do Exército. Também fez curso de operador de raio X e nunca concluiu Ciências Sociais, na USP, muito menos Jornalismo, na Cásper Líbero, de onde foi expulso em 1956, por agitar e encabeçar um movimento de reivindicação e greve. Mas não é daí que vem a fama de “jornalista maldito”. O termo atingiu toda a equipe da revista Realidade, liderada por Patarra, por conta do jornalismo de contracultura praticado pela equipe, que fugia dos “bons modos” do jornalismo da época. E é com orgulho que seu filho Ivo Patarra, 48 anos e também jornalista, admite: “Meu pai sempre foi meio maldito.” Se foge do rótulo e prefere se intitular um transgressor, Patarra, ou P.Pat — “minha rubricaassinatura pode ser reconhecida no 1º Cartório, na Rua das Palmeiras, em Santa Cecília (bairro de São Paulo)”, diz ele — no entanto, não foge da fama de bom bebedor que envolve a maioria dos jornalistas brasileiros: — No tempo de Realidade, o primeiro gole era uísque Old Eight, triplo. Até ter uma pancreatite. Quase fui. Fiquei anos sem tocar em álcool até descobrir o vinho. Agora, nunca bebi antes ou na hora do trabalho. Nunca! Mas depois... Avesso a computador, celular e outros avanços tecnológicos — “sou o que nas velhas redações chamavam de dinossauro” —, Patarra condenava até o uso de telefone para entrevistas na década de 60, quando era repórter da Quatro Rodas, revista em que foi repórter, fotógrafo, motorista — quebrou e capotou mais de uma dezena de carros em reportagens — , secretário de Redação e redatorchefe: — Nesse tempo, como repórter, se eu tinha que entrevistar alguém nem que fosse para uma só pergunta, “carioca ou mineiro?”, pegava a Rural Willys da Redação e ia pro Rio ou pra BH. Um pouco por malandragem, confesso. 16 Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

As boas histórias de P. Pat “Uma figura rara no jornalismo dos nossos dias. Talvez, inexistente”, na opinião de Sérgio de Souza, editor da revista Caros Amigos. “Um ícone da nossa imprensa”, diz George Duque Estrada, diretor de Arte da Carta Capital. Elogios não faltam quando se fala de Paulo Patarra. Muito menos boas histórias.

A GREVE O repórter José Hamilton Ribeiro foi enviado ao Vietnã, em 68, pelo então editor de Realidade, Paulo Patarra, seu amigo desde 1955, quando se conheceram na Escola de Jornalismo Cásper Líbero. Ali o futuro correspondente de guerra era Vice-Presidente do Centro Acadêmico, que comandou uma greve dos estudantes. No segundo dia da mobilização, o Presidente renunciou e deixou o “abacaxi” com Zé Hamilton. Depois de duas semanas, as aulas retornaram. A Direção da escola chamou Zé Hamilton e mais três estudantes que encabeçaram o movimento — dois deles eram Paulo e sua futura esposa, Judite. A decisão foi não expulsar o quarteto, mas, no ano seguinte, a Cásper Líbero não aceitou a matrícula de nenhum deles. “Este foi nosso primeiro contato. Patarra sempre foi um grande líder”, diz Zé Hamilton, que foi para o Globo rural a convite do amigo. A importância de Patarra para a imprensa Zé Hamilton registrou no oferecimento que fez para ele em seu último livro, O repórter do século, em que publicou as grandes reportagens de sua carreira, sete das quais premiadas com o Esso: “Dessas oito reportagens, seis foram feitas com a sua criatividade. Nas outras duas aproveitei coisas que aprendi com você”, escreveu.

A QUASE PRISÃO

Entrevistas memoráveis de Paulo Patarra que foram capa da Realidade: Adhemar de Barros e Luís Carlos Prestes, fotografado de costas: “O PCB me enganou, disse que ele tinha feito plástica”.

Frei Betto conheceu Paulo Patarra em 1966, na Realidade. Em seu primeiro contato com uma redação, o religioso foi incumbido das matérias internacionais, como a visita do Papa Paulo VI à Colômbia, em 1968. “Ao retornar, prestei-lhe contas dos gastos. Levei uma senhora bronca, pois a verba de representação da Abril não exigia prestação de contas. Patarra ficou furioso porque, ao devolver o excedente, eu punha em risco a possibilidade de outros jornalistas gastarem em viagem com noitadas e uísque”, lembra ele. Mais tarde, Frei Betto foi trabalhar na Folha da Tarde, publicação de esquerda que se contrapunha ao Jornal da Tarde, de direita. Lá, ao saber que uma equipe do Deops ia prender “um tal de Paulo Patar-

José Hamilton é amigo de Patarra desde os tempos da Cásper Líbero. Os dois foram afastados da faculdade por causa de uma greve.

ra”, foi de táxi a Higienópolis, onde o amigo morava, e fez que ele saísse de casa. Pouco depois, policiais invadiram o local. O relato está no livro Batismo de sangue e no filme homônimo, que tem roteiro da filha de P.Pat, Dani. Sobre o amigo, Frei Betto diz: “Tenho por ele profundo afeto e, embora a saúde precária o impeça, hoje, de falar, a vida e o talento de Paulo Patarra são gritantes na história do jornalismo brasileiro. A revista Realidade, paradigma da imprensa nacional, não seria o que foi sem as qualidades de Patarra e de Sérgio de Souza, editor de texto”.

O PETRÓLEO O caso aconteceu com Sérgio de Souza, editor da Caros Amigos, que conheceu Patarra em 1964, na revista Quatro Rodas. Quando era editor de texto na Realidade, Sérgio se apaixonou pela secretária de Patarra, Switlana Nowikow, a Lana. Ambos eram casados e o romance causou burburinho na Redação. Veio a Copa de 66 e ele foi escalado para cobrir a Seleção Brasileira na Inglaterra. Patarra decidiu apoiar o amigo e propôs


Frases e conceitos: “Ninguém é neutro”

Todos os amigos têm uma boa história para contar sobre Patarra. Sérgio de Souza diz que deve o seu casamento a ele. Carlos Alberto Azevedo (na foto à direita) impressionouse, desde o primeiro momento, com o dinamismo do mestre: “Ele sempre foi o nervo estratégico, o ser pensante do jornalismo”.

“Deixa o senhor no céu. Eu, pessoalmente, acho que nem lá ele está!” Ao receber o ABI Online no hospital e ser tratado como “senhor”

“Jornalista é bicho ladrão de pauta.” Alerta ao profissional que tem alguma reportagem exclusiva

“Acho esta história de diploma uma besteira.” Sobre a exigência do curso superior de Jornalismo

que Lana fosse ao encontro do repórter em Londres. Nada muito anormal, até que Sérgio descobriu: “Paulo estava tão empenhado em contribuir para o sucesso do meu romance que, para custear a passagem aérea e despesas de viagem, pôs à venda o seu Gordini. No entanto, toda a equipe foi contra, como me conta a Lana, que, aliás, até hoje é minha companheira—entreoutrasrazões,porcausadoPaulo Patarra”, conta o jornalista. Em 1960, Carlos Alberto Azevedo era estagiário do Estadão e foi aluno de Patarra em um cursinho preparatório para o vestibular. “A primeira imagem daquele homem magrinho era de dinamismo”, lembra Azevedo, hoje com 67 anos. Quando trabalhava em O Cruzeiro, em 1964, ele foi convidado pelo ex-professor para a Quatro Rodas, onde escreveria a seção de corrida Alta rotação. A verdadeira idéia de Patarra, porém, era fazer da publicação o embrião da Realidade. Azevedo, então, foi escalado para fazer uma matéria sobre a mortandade dos índios brasileiros. “Mas fazer isso num guia turístico?”, indagou o repórter ao editor. Patarra não pensou duas vezes, entregou-lhe uma pilha de dinheiro e o enviou para as aldeias. “Vá e não vamos contar para os Civita”, advertiu. Meses depois, a reportagem foi capa: Paz para o índio vencido, com título interno O povo deve morrer. “O episódio mostra a visão de Patarra. Era o cara do convencimento, não havia distância entre ele e os subordinados. Sempre foi o nervo estratégico, o ser pensante do jornalismo,

o fazedor de grandes projetos, o organizador de equipes”, diz Azevedo. Outra reportagem que ele não esquece envolveu a campanha O petróleo é nosso. Como não se podia falar abertamente da campanha nas publicações dos Civita, Patarra teve uma idéia: enviou Azevedo para a extração em Sergipe e, diante de uma bela foto de um operário todo sujo de petróleo ao descobrir um poço, jogou a manchete: “Esse petróleo é meu”. “Patarra marcou o jornalismo brasileiro nos últimos 50 anos. Sempre foi um Telê Santana, reunindo os melhores em campo”, afirma Azevedo, fazendo alusão ao inesquecível técnico de futebol.

O CARÁTER O alagoano Bernardo Severiano da Silva, semi-analfabeto e militante do PCB, estava preso em 1964 enquanto seu filho Mylton (anos depois, Myltainho) trabalhava na Folha de S. Paulo à noite e estudava Direito pela manhã. Três meses após o golpe militar, o funcionário da Folha foi chamado para a Quatro Rodas, depois de ter sido apresentado a Patarra pelo amigo Otoniel Santos Pereira. O salário era tentador: cinco vezes mais do que ganhava no jornal. “O lema de Patarra era ‘só vem para o nosso grupo bom texto e bom caráter’, o que necessariamente não significa ser do Partido Comunista”, conta Myltainho, orgulhoso. Quando a equipe de Realidade começou a ser montada, Myltainho foi peça

“O Victor era um italiano mafioso. Ótimo pra se trabalhar. Ele queria que Realidade vendesse 100 mil. Quando beiramos os 500 mil, virei ‘Patarrinha’.” Sobre seu trabalho com Victor Civita, da Abril

“Jornalismo é transgressão. E jornalista não é neutro. Isso é bobagem. Ninguém é neutro. Exemplo: Seu Bial (Pedro Bial, da TV Globo) é neutro? Crachá, p....!” Sobre a imparcialidade no jornalismo

“Ouvir o segundo lado é papagaiada. Onde ficam o terceiro, o quarto, o quinto etc.?” Sobre uma das regras do bom jornalismo, de ouvir “os dois lados”

“Jornalismo é a profissão mais fácil do mundo. Basta saber juntar letrinhas. E antes ver, pra depois contar” “Jornalista não presta! De regra, é isto”

importante do projeto. As pautas da revista eram discutidas, principalmente, em mesas de bar como o Sand Churra, localizado na Galeria Metrópole, no Centro de São Paulo. “Patarra dormiu muito no mezanino de lá depois de uns pileques”, lembra o jornalista, sorrindo. Depois da Realidade, veio o jornal Ex, bancado posteriormente por P.Pat. A primeira capa trazia um sósia de Hitler tomando banho pelado na praia; outra, o Presidente norte-americano Richard Nixon vestido de presidiário... Isso até começar a pressão dos militares. ”Muitas vezes o jornal era feito na máquina elétrica, diretamente no papel. O fotolito era feito a partir do cuchê. Não podia errar. Patarra colocou uma grana preta na publicação, o dinheiro de um apartamento. A tiragem foi crescendo, até que a edição que vincularia o melhor do Ex foi apreendida na gráfica. Isto foi determinante para o fechamento do jornal. Suspeitamos até que houve deduragem”, revela Myltainho. “Na invasão, todos tremeram com a chegada dos agentes da Polícia Federal, em especial um negro, alto, cujos dedos pareciam cinco cassetetes. O cara não precisava nem de arma.” Sob censura, Patarra fechou um jornal e criou outro, o Mais Um, com seus últimos tostões. Um pequeno selo no alto da página trazia a palavra “Ex” na nova publicação, rodada na gráfica de Raduan Nassar, em Pinheiros. Generoso, o autor de Lavoura arcaica não cobrou um débito que a equipe tinha na empresa, fruto das últimas edições do Ex. “Quando lançamos o primeiro número com uma matéria sobre o Esquadrão da Morte, eu e o Half (Hamilton Almeida Filho) fomos chamados pelo Coronel Barreto, que, parecendo que ia rasgar o jornal com os dentes, gritou: ‘O que é isso?’ Um dos dois respondeu: ‘Coronel, é um outro jornal’ A réplica do militar foi imediata: ‘Ou vocês param com isso ou não respondo mais pela integridade física de vocês.’ Todos pararam e a turma, liderada por Patarra, se tornou ‘maldita’.” Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

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Aconteceu na ABI

Acima, Murilo Mello Filho e Maurício Azêdo. Ao centro, o jornalista e locutor de tv Berto Filho. À direita, Domingos Meirelles, Milton Sales e o Deputado e Conselheiro da ABI, Miro Teixeira.

UM VOTO DE CONFIANÇA

grandes momentos da minha vida foram A eleição para a Diretoria, o Conselho vividos aqui. Consultivo, o Conselho Fiscal e um terBenício Medeiros, novo Diretor de ço dos membros efetivos e suplentes do Jornalismo, conta que a eleição da ChaConselho Deliberativo da ABI foi marcapa Prudente de Moraes, neto trouxe à da por um clima de paz e tranqüilidade. Direção da ABI pessoas com represenA Chapa Prudente de Moraes, neto, únitatividade: — A gestão de Maurício ca a concorrer, foi confirmada como a Azêdo promoveu grandes mudanças na dirigente da Casa pelos votos dos associABI. Desde 2004 a Casa vem reassuminados, que compareceram em peso à sessão do sua importância no debate das quesrealizada no dia 27 de abril, das 10h às 20h, tões nacionais e consolidando sua funno saguão do Auditório Oscar Guanabação de trincheira na luta pelas liberdarino, no 9º andar do edifício-sede da ABI. des democráticas. Liderada pelo atual Presidente, jornaEntre os 147 associados que comparelista Maurício Azêdo, a Chapa Prudente ceram à ABI nesta sexta-feira, dois dos pride Moraes, neto está na Diretoria da ABI meiros a chegar foram Milton Sales — que desde 2004. Os dirigentes reeleitos da Difez questão de votar, mesmo estando em retoria, do Conselho Consultivo, do Concadeira de rodas — e Severino Mendes da selho Fiscal e de terço do Conselho DeliRocha — que comberativo ocuparão pletaria 97 anos de o cargo no triênio idade em junho e 2007-2010, enorgulha-se de mosquanto os memtrar sua carteira de bros do Conselho sócio datada de Fiscal permane1941 e assinada cem no exercício por Barbosa Lima social 2007-2008. Sobrinho. Antônio RoQuando inberto Salgado da gressou na ABI, SeCunha, Conseverino, além de lheiro da ABI, diz jornalista, era que é fundamenfuncionário da tal mobilizar os Polícia Civil e dejornalistas em torsempenhou alguno da entidade: — mas tarefas espiOs eventos cultunhosas, como a de rais, cursos e palesatender com fretras estão revitaliqüência aos chazando a Casa. É esmados de quem sencial que busAziz Ahmed deposita seu voto. Audálio Dantas, Vice-Presidente da ABI, assina a ata da eleição. Do lado, o jornalista Antônio Roberto Cunha. morava próximo quemos aumenà Praça dos Govertar o quadro de ase Direitos Humanos, destaca as obras de nadores, atual Praça João Pessoa (Avenida não apenas na entidade, mas também sociados, pois só assim poderemos manconservação e manutenção realizadas na da Mem de Sá com Avenida Gomes Freinas pessoas: — Os atuais dirigentes têm ter a vitalidade da Associação. entidade: — As reformas nas escadarias re), que reclamavam de Dercy Gonçalves, pensamentos alinhados, são competentes O repórter-fotográfico Raul Rodrigues do prédio e na Biblioteca Bastos Tigre são que costumava importunar a vizinhane habilitados a levar a gestão da ABI por Azêdo, que saiu de Itapeva, no interior a comprovação de que a ABI está em ça gritando palavrões. Apesar da admiramais um período. O que se vê são melhode São Paulo, para votar no Rio, reforça evolução constante. Outra prova da reção pela hoje centenária atriz, Severino rias administrativas e operacionais e que a importância da reeleição da Diretoria, vitalização é o trabalho feito pelo ABI relembra que cumpria seu dever. a Associação tem resgatado a sua forte atuque, diz, é a responsável pelos avanços da Online, que tem ganhado bastante auJá Milton Sales, que foi chefe de reação em questões da vida nacional. ABI nos últimos anos: — Foram os atudiência com reportagens bem-produziportagem do Jornal dos Sports e responAncelmo Gois, colunista de O Globo ais dirigentes que conseguiram tirar a ABI das e trazido gente nova para a Casa. Além sável pela famosa coluna Mexericos da Cane Conselheiro da ABI, diz que se emodas dívidas e reverter a queda do número disso, a ABI continua sua campanha em dinha na hoje extinta Revista do Rádio, ciona sempre que vem à Casa do Jornade associados. Prova deste sucesso na defesa da liberdade de imprensa e da conta que, mesmo com dificuldades de lista em momentos importantes: — A administração é o fato de não haver chapas manutenção dos direitos humanos. locomoção, continua trabalhando na ABI foi minha grande universidade, concorrentes nesta disputa. Para o jornalista e locutor de tv Berto imprensa como colaborador e produzinonde construí minha formação polítiDaniel de Castro, membro da Defesa Filho, a revitalização tem sido promovido textos em seu computador. ca e meu caráter. É um pedaço de mim, da Comissão de Liberdade de Imprensa

Corpo social reelege a Diretoria e faz elogios ao seu desempenho.

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“Vim aqui cumprir meu dever de votar, mais uma vez, na chapa encabeçada por Maurício Azêdo. Ele está fazendo um trabalho realmente admirável na ABI, porque congrega toda uma classe jornalística ansiosa por suas reivindicações e mantém isso aqui num controle absoluto, numa habilidade espantosa. Enfim, está conduzindo a nossa Academia nos mesmos rumos de Barbosa Lima Sobrinho, de Prudente Moraes, neto, de Herbert Moses e assim por diante.”

Cinema ganha a tela que foi do Macunaíma

MURILO MELLO FILHO

Jornalista e membro da Academia Brasileira de Letras “Maurício Azêdo já fez uma renovação grande na ABI e aguardo uma renovação ainda maior, até uma revolução. Entre as coisas que ainda precisam ser feitas está uma mudança nos estatutos que permita que os associados votem em qualquer lugar do Brasil. É difícil a pessoa que mora em outra cidade, em outro Estado, vir ao Rio para votar e acho que uns 80% dos associados acabam ficando de fora nesse processo. Essa é uma mudança importante também para dar ainda mais transparência e democratizar ainda mais a gestão do Maurício.” JOSÉ SILVESTRE GORGULHO

Secretário de Cultura do Distrito Federal e Conselheiro da ABI “Acho que a única coisa a lamentar tem um aspecto positivo, porque, se não houve chapa de oposição, é porque certamente se reconheceu o trabalho dessa Diretoria, que eu acho que teve um papel importantíssimo na recolocação da ABI no lugar de destaque que sempre teve na História deste País. O trabalho feito pela atual Diretoria é uma coisa absolutamente visível e é uma satisfação ver que a esta hora (11 da manhã) há um movimento tão significativo de votantes.” AUDÁLIO DANTAS

Vice-Presidente da ABI e Diretor da Representação em São Paulo “A ABI tem sido uma trincheira em defesa das liberdades públicas e o Maurício Azêdo tem feito um trabalho extraordinário nessa direção. Acho até que essa eleição ter uma chapa única legitima o processo de liderança e o trabalho que vem sendo feito. Voto no Maurício e nos colegas dele como quem vota numa pessoa íntegra com uma proposta de realmente dar continuidade ao trabalho inspirado por Barbosa Lima Sobrinho.” ADOLFO MARTINS

Presidente da Folha Dirigida “É um grande prazer estar aqui votando nesta Casa democrática que é a ABI e com essa chapa que está fazendo esse trabalho maravilhoso, um bom serviço que merece ter continuidade. A ABI está de parabéns.” AFONSO FARIA

Diretor de Promoções e Relações Externas da Folha Dirigida “É com muita satisfação que venho aqui votar no nosso Maurício Azêdo, que fez um trabalho magnífico de recuperação da ABI. Agora é a hora de consolidar esse trabalho e jogar mais

Severino Mendes da Rocha, um dos sócios mais antigos da ABI, exibe sua carteira datada de 1941, assinada por Barbosa Lima Sobrinho; e Adolfo Martins, Presidente da Folha Dirigida.

pra frente, tornando a ABI cada vez maior. Sinto-me honrado de fazer parte desse processo.” PAULO JERÔNIMO DE SOUSA (PAGÊ)

Diretor de Assistência Social da ABI “Os colegas estão comparecendo em peso para sufragar o nome de Maurício Azêdo e da Diretoria.” ITAMAR GUERREIRO

Jornalista, advogado e Conselheiro da ABI “É mais um momento democrático na vida da ABI, que é uma casa da democracia, e eu vim cumprir com a minha obrigação de votar, para consolidar a eleição, para dar o quórum necessário e ajudar o nosso Maurício Azêdo, que está claramente fazendo uma excelente administração.” AZIZ AHMED

Diretor do Jornal do Commercio e Conselheiro da ABI

prossegue com essa tradição de fazer da ABI um marco da opinião nacional. Você vê que a ABI continua seu trabalho em momentos democráticos, quando o talento é até mais necessário. Nas ditaduras, nós nos organizamos sempre contra um adversário comum — então é fácil, de certa maneira, se organizar, embora com riscos muito maiores. Nas democracias, é o talento que une as pessoas e organiza as lutas. E é isso que o Maurício vem fazendo aqui: ele que é um resistente da ditadura, que se colocou em todas as lutas contra a ditadura, neste momento democrático parte para a discussão com os pontos de vista bem expostos, as teses bem apresentadas. Então, dá um grande prazer ser associado a esta instituição que se preocupa e se mantêm ainda como um dos ícones da representação do pensamento brasileiro.” MIRO TEIXEIRA

“O Maurício Azêdo conseguiu reunir aqui um grupo de pessoas que

Deputado Federal (PDT-RJ) e membro do Conselho Consultivo da ABI

Os eleitos A Chapa Prudente de Moraes, neto, que dirige a ABI desde 2004, reelegeu cinco dos atuais diretores: Maurício Azêdo, Presidente; Audálio Dantas, Vice-Presidente; Domingos Meirelles, Diretor Econômico-Financeiro; Paulo Jerônimo de Souza (Pagê), Diretor de Assistência Social, e Jesus Chediak, Diretor de Cultura e Lazer. A eles se somaram os recém-eleitos Estanislau Alves de Oliveira, Diretor Administrativo, e Benício Medeiros, Diretor de Jornalismo. Para o Conselho Consultivo foram reeleitos todos os seus membros: Chico Caruso, Ferreira Gullar, José Aparecido de Oliveira, Miro Teixeira, Teixeira Heizer, Ziraldo e Zuenir Ventura. No Conselho Fiscal continuam Adriano Barbosa, Argemiro Lopes, Arthur Nery Cabral, Geraldo Pereira, Jorge Saldanha e Luiz Carlos Chesther, com a inclusão do novo membro, Manolo Epelbaum. Foram também reeleitos oito membros efetivos do Conselho Deliberativo: Artur da Távola, Flávio Tavares, Fritz Utzeri, José Gomes Talarico, José Rezende Neto, Paulo Jerônimo de Souza, Sérgio Cabral e Terezinha Santos, aos quais se somam agora Carlos Ro-

drigues, Estanislau Alves de Oliveira, Fernando Foch, Jesus Chediak, Mário Augusto Jakobskind, Marcelo Tognozzi e Orpheu dos Santos Salles. Como suplentes do Conselho Deliberativo assumem Adalberto Diniz, Aluízio Maranhão, Ancelmo Gois, André Moreau Louzeiro, Arcírio Gouvêa Neto, Benício Medeiros, Germando Conçalves, Ilma Martins da Silva, Luarlindo Ernesto, Luiz Sérgio Caldieri, Marceu Vieira, Maurílio Cândido Ferreira, Silvestre Gorgulho, Yacy Nunes e Zilmar Borges Basílio. Na forma do Estatuto, a Diretoria e os demais eleitos foram empossados em reunião extraordinária no dia 14 de maio, na qual foram eleitos por aclamação o Presidente da Mesa do Conselho Deliberativo, Fernando Barbosa Lima, e seu Primeiro e Segundo Secretários, Lênin Novaes e Zilmar Borges Basílio. Na mesma sessão foram eleitos os membros da Comissão de Ética dos Meios de Comunicação, da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos e a Comissão Diretora do Departamento de Assistência Social. (Rodrigo Caixeta e Rômulo Nascimento)

A estréia do Cine ABI movimentou o Auditório Oscar Guanabarino, o principal da ABI, na noite de 11 de junho. Na abertura da sessão, foi exibido um vídeo de seis minutos intitulado Olho no olho, em que se destaca, entre outros, o depoimento de Jesus Chediak, Diretor Cultural da ABI, sobre os objetivos do novo projeto e recordando o sucesso do Cineclube Macunaíma, que costumava lotar a Casa do Jornalista nos anos 70 e 80. O Cine ABI foi inaugurado com a exibição de A paz é dourada, longa de Noilton Nunes, que narra a saga de Euclides da Cunha. Entre os convidados para a estréia, destacava-se Nélson Pereira dos Santos, que ocupa atualmente na Academia Brasileira de Letras, a cadeira nº 7 que foi do autor de Os sertões. Jesus Chediak abriu oficialmente a cerimônia, reforçando a idéia de que o Cine ABI vai dar espaço para as produções nacionais que não têm espaço no circuito aberto: — É uma forma de manter o Brasil mais próximo dos brasileiros, de estarmos contribuindo com a justiça social. Não pretendemos aqui repe- Nelson Pereira dos Santos foi o convidado especial tir o Cineclube na estréia do Cine ABI Macunaíma, porque a história não se repete, mas queremos criar uma nova cultura de exibição de filmes num espaço sagrado e consagrado. Nélson Pereira dos Santos, convidado especial da noite, reviveu grandes momentos do Auditório da ABI, citando, entre outros temas, a campanha pela redemocratização do País e a realização do 2º Congresso Brasileiro de Cinema, nos anos 50: — Aqui aconteceram reuniões políticas importantes e este palco foi cenário de batalhas e discussões de diversos assuntos de interesse nacional. Hoje, fazemos uma homenagem a todos os amigos que passaram por aqui e desejamos vida longa ao cineclube. Viva o Cine ABI! Noilton Nunes exaltou a importância do Cine ABI como forma de valorizar os filmes produzidos no Brasil. Para ele, as novas gerações de cineastas são massacradas pela violência da indústria norte-americana. Em seguida, convidou ao palco o sambista Edeor de Paula, compositor da trilha que embala o filme, e que, na opinião do cineasta, faz a tradução visceral de Os sertões. Edeor emocionou cantando seu samba à capela, foi intensamente aplaudido e disse que as 23 estrofes da letra foram compostas em 17 dias. Mesmo conhecendo a obra original de Euclides, com mais de 200 páginas, inspirou-se numa sinopse com 42 e buscou fazer algo diferente: — Em 1975, ganhei os prêmios de melhor Samba de Quadra, melhor Samba-Enredo e melhor Samba de Terreiro. Na seqüência, teve início a exibição de A paz é dourada. Após o filme, os convidados participaram de um coquetel no Salão João Mesplé. Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

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Aconteceu na ABI

As lições de Fino, autor do furo mundial da guerra do Iraque Há três anos no Brasil, ele falou de sua experiência a 200 estudantes de Jornalismo em curso organizado pela Universidade Federal Fluminense. Mais de 200 estudantes de Jornalismo lotaram o Auditório Oscar Guanabarino, no 9º andar do Edifício Herbert Moses, em 21 e 22 de junho, para participar do curso O jornalismo internacional em tempos de guerra e política depois da queda das Torres, ministrado pelo jornalista Carlos Fino, que ficou mundialmente conhecido por seu trabalho como correspondente da Rede de Televisão Portuguesa (RTP) no Oriente Médio, quando deu o furo de reportagem sobre a invasão norte-americana no Iraque, em março de 2003. Proposto pelo Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense–UFF, com o apoio da ABI, o curso foi aberto pela professora de Jornalismo da Uff Sylvia Moretzsohn, que explicou que as aulas visavam a fornecer informações sobre as condições de trabalho do correspondente e a necessidade de preparo do jornalista para o convívio com diferentes culturas, de forma a evitar a reprodução de estereótipos tão comuns nessa atividade. – A cobertura de Carlos Fino sobre o conflito em Bagdá alia a competência jornalística à capacidade de reflexão, o que é raro entre jornalistas que valorizam a prática pela prática e não mantêm nenhum distanciamento crítico, disse Sylvia. Carlos Fino deu início à sua apresentação falando sobre a presença predominantemente feminina no auditório, o que, segundo ele, é uma tendência na profissão e, de alguma forma, o estimulou a permanecer em Bagdá quando teve início o bombardeio à cidade: – Tivemos a opção de deixar o país ou ficar lá, pois estávamos no centro do alvo.

Carlos Fino: “A guerra abre as portas do inferno e pode inclusive nos levar ao sacrifício”.

Muitos jornalistas não agüentaram e partiram, mas quando percebi que algumas correspondentes estavam decididas a permanecer no Iraque, também me encorajei — brincou o jornalista, que exibiu algumas de suas principais reportagens e flashses ao vivo feitos enquanto estava no Oriente Médio. Disse Fino que a carreira de jornalista é associada a brilho e glamour, mas também há dificuldades pesadas como carregar equipamentos, acordar cedo, enfrentar longas filas em aeroportos etc. – Há quem pense que cobrir uma guerra pode ser a coroação de seu trabalho, mas não devemos nos iludir pelo sucesso, porque a guerra é o pior que se pode ver, ela abre as portas do inferno e pode nos levar

Entre nós, mais alunos de Arquitetura 22 Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

inclusive ao sacrifício. Há muitos perigos. Fino contou que no dia em que os bombardeios a Bagdá tiveram início não havia indícios de que o conflito de fato começaria: – Talvez a imprensa norte-americana ou a britânica soubessem, mas não a de outros países. Nós ficamos alertas a noite inteira e reagimos na hora em que tudo começou. Transmitimos tudo por videofone, da varanda do Hotel Palestina, onde estavam hospedados todos os jornalistas estrangeiros. Ele lembrou que há teóricos que dizem que a informação se tornará o quinto elemento na planificação de uma guerra, devido ao caráter instantâneo e em tempo real que atualmente a tecnologia proporciona: – O jornalista servindo como instrumento de guerra é perigoso. Durante os três meses de cobertura, mantive-me eqüidistante e imparcial. QuandoBushimplantou a guerra contra o terrorismo, dizia que quem não estivesse ao lado dos Estados Unidos estaria contra eles. Algumas autoridades norte-americanas chegaram a dizer que os jornalistas que não estivessem integrados às suas tropas não deveriam nem estar lá. Era uma maneira de controlar as informações sobre o conflito. Conselheiro de Imprensa da Embaixada de Portugal em Brasília há três anos, Fino já foi correspondente em Moscou e em Bruxelas. Ele conta que, após a queda das torres do World Trade Center, cresceram as limitações ao trabalho dos jornalistas. – Há quem pense que, num próximo conflito, os militares estarão nas redações orientando as ações dos profissionais de imprensa. Em Bagdá, felizmen-

A ABI recebeu no dia 11 de junho a visita de quatro alunos da faculdade de arquitetura da Stetson University, da Flórida. Rachel McCallman, Esther Kelty, Gregory Adams e Derick Ostrenko vieram acompanhados do professor Cyriaco Lopes (na foto maior, à esquerda), brasileiro radicado nos Estados Unidos. Cyriaco explicou que a visita faz parte de um programa da universidade, que oferece, anualmente, oportunidade para alguns de seus alunos visitarem um país na América Latina, para estudar História da Arte e Arquitetura. Carolina Klocker (foto menor), estudante de Arquitetura da Escola da Cidade, de São Paulo, também visitou a Casa do Jornalista. Ela esteve na ABI para dar continuidade a um trabalho que desenvolve sobre a produção arquitetônica dos irmãos Roberto – Marcelo e Milton, que projetaram o atual Edifício Herbert Moses, e Maurício, o caçula, que ser formou depois dos irmãos.

te, havia uma dicotomia entre os que eram a favor ou contra a guerra, o que permitiu uma cobertura equilibrada — explicou Fino, que, junto com sua equipe, chegou a ser seqüestrado e teve seus equipamentos roubados. Ele considera que os jornalistas devem denunciar todas as tentativas de controle e cerceamento às liberdades democráticas. A criação da TV Al-Jazeera, disse como exemplo, quebrou a hegemonia das grandes organizações midiáticas e propiciou a difusão de diferentes modos de pensar. Ao fim da apresentação do primeiro dia, Fino disse que o jornalista pode, com sutileza, fazer a diferença em suas coberturas, produzindo reportagens contextualizadas com a realidade em que se encontra. Em resposta à pergunta de um estudante, que pediu que o correspondente traçasse um paralelo entre a cobertura de uma guerra e a da violência cotidiana numa cidade como o Rio, comentou: – O que observo é que a cobertura aqui tem aspecto mais policial do que no sentido de aprofundar as questões que estão por trás da violência. É claro que a dimensão dos acontecimentos é completamente diferente, mas independentemente disso deve-se buscar a origem dos fatos. O segundo dia do curso foi aberto pelo Presidente da ABI, Maurício Azêdo, que aproveitou a oportunidade para convidar Sylvia Moretzsohn para assumir a Direção dos Cursos Livres de Jornalismo da entidade. Maurício lembrou ainda que estava em Portugal quando assistiu à primeira entrada ao vivo de Carlos Fino para noticiar o bombardeio a Bagdá. Em seguida, passou a palavra para o jornalista dar seqüência à aula. Na pauta do dia, o assunto principal era a Europa. Fino exibiu reportagens que produziu sobre a Polônia e a Estônia, quando da adesão destes países à União Européia. Ele lembrou que a partir de 1º de julho Portugal assumirá a presidência da UE e, entre as propostas da gestão portuguesa, pretende-se elevar o diálogo político entre o Brasil e a União Européia: – Além disso, penso que deve haver mais relações entre Brasil e Portugal, no sentido de um país conhecer mais o outro, seu mecanismo de funcionamento e sua produção cultural. Durante a aula, Fino exibiu um documentário sobre as mulheres de Bagdá, produzido por uma televisão portuguesa. O jornalista pretendia mostrar a importância da Antropologia para o ensino de Jornalismo, já que assim se pode observar “o outro dentro de seu próprio contexto”: – É preciso observar o desconhecido a partir de sua própria lógica, para não corrermos o risco de banalizar o seu comportamento tendo como parâmetro os nossosprópriospadrões.Ojornalistadeveestar atento a isso, a questão cultural é crucial. Ao fim do curso, Fino agradeceu emocionado a presença dos estudantes, que participaram ativamente dos debates nos dois dias de aula. Aproveitou o ensejo para recomendar aos futuros jornalistas que não se esqueçam do caráter nobre da profissão e disse: “Propaganda não. Jornalismo sempre!”


Um convênio para festejar os 200 anos da nossa imprensa A ABI e o instituto cultural do Jornal de Brasília vão comemorar vários bicentenários, entre eles o do Correio Braziliense de Hipólito da Costa e o da Imprensa Nacional A ABI e o Instituto Câmara Filho, de Goiânia, assinaram em 27 de junho um Convênio de Cooperação visando aos festejos do bicentenário da chegada da imprensa ao Brasil, da criação da Imprensa Nacional e da Gazeta do Rio de Janeiro primeiro jornal impresso no País, e do lançamento, em Londres, do Correio Braziliense, por Hipólito José da Costa, que serão celebrados juntamente com o centenário da Casa do Jornalista, em 2008. Participaramdoatodeassinatura,nasede da ABI, Fernando Carvalho, Diretor-Executivo do Instituto Câmara Filho; Fernando Câmara, Diretor-Presidente do Jornal de Brasília; Fernando Tolentino, DiretorGeral da Imprensa Nacional; e José Quarterolli Vice-Presidente, e Omar Martins, da Associação dos Servidores Aposentados e Pensionistas da Imprensa Nacional. Eles foram recebidos pela Diretoria da ABI, representada pelo Presidente, Maurício Azêdo, o Diretor de Assistência Social, Paulo Jerônimo, o Diretor Cultural, Jesus Chediak, e os Conselheiros José Rezende Neto, Mário Barata, Ilma Martins e Luiz Carlos Chesther. Ao chegar ao encontro, Fernando Tolentino presenteou Maurício Azêdo com um exemplar do livro Imprensa Nacional — da linotipia à era digital. Após a assinatura do convênio, o Presidente da ABI fez uma saudação a Tolentino, Câmara e Carvalho, falando da satisfação da Casa em ter sido convidada para participar do projeto: — A ABI considera que foi distinguida com a visita dos três e se sente muito confortada com a possibilidade de estabelecer uma colaboração com instituições tão importantes da área da imprensa, como o Instituto Câmara Filho e o Jornal de Brasília e com essa instituição bicentenária que é a Imprensa Nacional. Da parte da ABI, nossa disposição é de adotar todas medidas que sejam necessárias para tornar fecundo e frutífero esse princípio de colaboração que estamos estabelecendo neste momento. Para o Diretor-Executivo do Instituto Câmara Filho, a participação da ABI e da Imprensa Nacional no convênio vai facilitar a busca de outros parceiros, para viabilizar a realização da série de eventos programados para o bicentenário, que incluem um ciclo de palestras, a publicação de obras, pesquisas e a produção de documentários sobre a história da imprensa brasileira: — Em função da credibilidade que têm junto à opinião pública, essas duas instituições fazem com que o projeto tenha mais facilidade de execução. Firmamos

esta parceria com o intuito de estar fazendo um levantamento da evolução da imprensa no Brasil nos últimos 200 anos. A idéia é convidar historiadores para fazer essa pesquisa, cujo produto final, em forma de livro, será entregue ao Presidente da República no dia 10 de setembro do ano que vem. Informou Fernando Carvalho que a obra será também distribuída nas universidades e escolas públicas de todo o País. Espírito de modernidade Foi de inteira descontração o clima do encontro que reuniu os jornalistas Maurício Azêdo, Presidente da ABI, Fernan-

do Tolentino, Diretor-Geral da Imprensa Nacional, e Fernando Câmara, DiretorPresidente do Jornal de Brasília, para tratar do convênio de cooperação entre as entidades nas comemorações dos 200 anos da chegada da imprensa ao Brasil. O primeiro a chegar à reunião foi Fernando Câmara, acompanhado de Fernando Carvalho, Diretor-Executivo do Instituto Câmara Filho, organização civil de interesse público, que leva o nome do primeiro jornalista do Planalto Central com registro em carteira. Oriundo de uma família de profissionais da imprensa, Câmara foi felicitado por Maurício Azêdo por sua trajetória no jornalismo e seu desempenho à frente do Jornal de Brasília, lançado em

10 de dezembro de 1972, em pleno regime militar. Por este e outros motivos, lembrou ele, o empreendimento enfrentou muitas dificuldades no início: — O jornal nasceu com espírito de modernidade, com equipamentos novos. Os concorrentes, que à época eram os Diários Associados, não nos aceitavam. Mas o jornal era muito lido pela classe política, devido à sua credibilidade, e acabou alcançando grande sucesso. Hoje ele vai bem. O Correio Braziliense é o líder do mercado e nós somos um bom segundo lugar. (risos) Tradição familiar Fernando contou ainda que o pai, Câmara Filho, engenheiro-agrônomo que se tornou jornalista e o tio Jaime Câmara fundaram o Grupo Popular, que lançou em 1938, em Goiânia, o jornal O Popular, semanário que virou bimensal e depois ganhou circulação diária: — Foi o primeiro diário de Goiás e em 2008 completará 70 anos de circulação ininterrupta. Aos domingos, tem tiragem de 60 mil exemplares e, durante a semana, alcança 48 mil. O Grupo Popular é uma empresa tradicional, que é responsável também pelo Jornal do Tocantins, que completou 20 anos, e o recente Jornal Daqui, que em três meses de circulação em Goiânia atingiu a tiragem de 4 mil exemplares, o que para nós é um sucesso. Está quase alcançando O Popular, que é já um veículo septuagenário. (risos) O Jornal Daqui tem o formato tablóide, com visual leve e moderno e que também oferece como atrativo ao leitor um sistema de distribuição de prêmios. O Popular tem outro perfil: é standard e, de acordo com Fernando Câmara, firmouse como um veículo de comunicação que tem como marca a seriedade.

A velha Impressão Régia sobreviveu a FHC Governo Fernando Henrique implantou um processo de liquidação da Imprensa Nacional, doando seus bens, privando-a de sede e reduzindo seus serviços, até no campo cultural. Depois de quase ser extinta em 2002, a Imprensa Nacional vive hoje um momento especial com o Projeto de Comemoração dos seus 200 anos. Seu DiretorGeral, Fernando Tolentino de Souza, instituiu pela Portaria nº 100, de 30 de abril, a Comissão Interna do Bicentenário da Impressão Régia, que está encarregada de cuidar do planejamento, coordenação e execução das ações referentes à celebração do aniversário da instituição, fundada em 13 de maio de 1808. A palavra de ordem na Casa é o resgate de seu prestígio como órgão responsável pela difusão das informações oficiais do Estado brasileiro. No encontro na sede da ABI, Fernando Tolentino mostrou-se entusiasmado não só com a celebração do bicentenário da chegada da imprensa no Brasil, mas

também do centenário da ABI, em 7 de abril. Ele assumiu a Direção-Geral da Imprensa Nacional em 2003, após um processo de instabilidade muito grande vivido pela instituição, com o fechamento da área de produção de obras e prestação de serviços gráficos, do núcleo de recuperação de obras raras e da Biblioteca Machado de Assis e a transferência da área de editoração eletrônica para a sede do Palácio do Planalto. O prédio onde funcionava a Imprensa Nacional foi doado à Advocacia Geral da União-AGU e os equipamentos, avaliados em R$ 15 milhões, doados ao Senado e leiloados. Houve ainda redução no orçamento e cerca de 50% dos servidores foram redistribuídos para outros órgãos da União:

— Entendo que se pretendia que a atividade de imprensa oficial da Presidência da República ficasse também cumprida, exclusivamente, por meio eletrônico e restrito ao Governo Federal. Essas medidas foram tomadas no Governo Fernando Henrique Cardoso, lembra Tolentino: — Para se ter a idéia da gravidade da ação, interrompeu-se a produção da edição da antiga Revista Brasileira, veículo do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil que era produzido pela Imprensa Nacional. Paralisaram-se também, por decreto presidencial, outras atribuições do órgão, como a elaboração das atas da Academia Brasileira de Letras, além das revistas de jurisprudência e legislação, que eram atividades cumpridas pela IN e desapa-

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LIVROS LANÇAMENTOS

A VELHA IMPRESSÃO RÉGIA

receram naquele momento. A Associação Brasileira de Indústria Gráfica fez um agradecimento ao então Senador José Roberto Arruda, por seu esforço para que esse processo de desmantelamento da IN acontecesse: — É um indício claro de que o Senador teve um comprometimento com esse processo — observou Tolentino. Reconstrução A Imprensa Nacional passa agora por um processo de reconstrução. Parte dos servidores retornou (atualmente, são cerca de 400 funcionários) e estão sendo feitos investimentos de R$ 9 milhões na área gráfica, para a reforma de equipamentos e de processos eletrônicos, o que garantiu ao site direito à certificação digital e acessibilidade quase plena (portadores de deficiência visual, por exemplo, têm acesso ao material por áudio). Revelou Tolentino que quando a Imprensa Nacional tornou pública sua intenção de realizar um grande evento pelo bicentenário logo recebeu diversos apoios, como o das Embaixadas de Portugal, Alemanha e China: — Agora estamos tentando articular nossos esforços com os da Prefeitura do Rio, que está se preparando para comemorar os 200 anos da vinda da Família Real para a cidade, onde se instalou a sede do Reino. Sem contar que 2008 é também o ano do bicentenário da Gazeta do Rio de Janeiro, em 10 de setembro, e do centenário da morte do nosso patrono, Machado de Assis, em 29 de setembro. Com essas atividades, cumpriremos o papel histórico da Imprensa Nacional, que é o rompimento do silêncio que havia no Brasil Colônia antes de a Família Real se transferir para o País. Foi esta vinda que deu às pessoas a possibilidade de comunicação, que na época era proibida até por meio de panfletos. Personalidade jurídica A Imprensa Nacional também está em entendimentos com a Casa Civil da Presidência da República, à qual está subordinada, sobre a aquisição de sua personalidade jurídica como autarquia ou empresa pública, com capital exclusivamente do Governo da União. Isto, diz, viabilizaria a defesa, a modernização e o princípio de cidadania da instituição. Tolentino anunciou em primeira mão na ABI que haverá um pequeno reajuste, calculado em 2%, no preço de publicação do Diário Oficial da União (o último aconteceu há oito anos), para dar suporte a uma redução no preço de capa que ele considera drástica: — Em Brasília, o preço do jornal será mantido, mas nas outras capitais queremos atingir uma redução de cerca de 40% do preço. Então, o DO passaria a custar cerca de 60% do preço atual, medida que se incorpora ao patrimônio popular, porque é mais cidadania e mais acesso à informação pública.

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Fernando Barbosa Lima conta em livro o que fez e viu na televisão Referência na história da televisão brasileira, Fernando Barbosa Lima criou mais de cem séries de programas em cinqüenta anos de carreira. O jornalista, publicitário, artista gráfico e Presidente do Conselho Deliberativo da ABI lançou no Rio, no dia 21de junho, o livro Nossas câmeras são seus olhos, em que faz reflexões sobre a mídia televisiva e relata experiências memoráveis ao lado de Sérgio Porto, Ibrahim Sued e Glauber Rocha. No livro, Fernando Barbosa Lima divide a trajetória da TV no País em “antes e depois do golpe militar de 1964”. O relato de sua experiência apresenta fatos e personagens que fizeram a história da televisão. Esta mídia, sustenta, não pode ser encarada apenas como uma máquina que ajuda o público a escolher entre este ou aquele produto, como um “supermercado colorido”, mas deve vender principalmente idéias, contribuindo para que o progresso encontre a civilização. Um dos pontos altos da publicação são as histórias das pessoas com quem Fernando conviveu, como Sérgio Porto; Oswaldo Sargentelli, “a voz do trovão”; Ibrahim Sued, estreando o colunismo social na TV; o charme de Luiz Jatobá; o irreverente Glauber Rocha, entre outros. O livro conta também a história de emissoras que não existem mais e de seus melhores programas. À medida que a leitura avança, com a chegada da tv em cores, as novas tecnologias e o futuro, o espaço é reservado para discutir a importância da televisão como instrumento capaz de elevar o nível cultural do nosso povo — o principal sentido da te-

O romance de Garibaldi e Anita, por Derengoski No ano em que se comemora o bicentenário de nascimento do revolucionário Giuseppe Garibaldi, o jornalista e escritor catarinense Paulo Ramos Derengoski lança Garibaldi e Anita — amantes da liberdade em dois mundos de guerras. A Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul instituiu 2007 como o Ano Garibaldino, já que o italiano teve participação intensa na história da Guerra dos Farrapos e da formação do Uruguai e da Argentina. Garibaldi é o patrono do Partido Socialista da Itália, hoje no Governo do país, na figura do Primeiro-ministro Romano Prodi, e a catarinense Anita é uma heroína ítalo-brasileira, morta em meio às lutas pela unificação italiana. Com 105 páginas, o livro custa R$ 20 e pode ser solicitado pelo telefone (49) 3222-4838.

Os jornalistas Sérgio Cabral e Zuenir Ventura no lançamento de Nossas câmeras são seus olhos, de Fernando Barbosa Lima (ao centro), grande realizador e testemunha ocular da história da TV brasileira.

levisão para Fernando. Junto com o livro vem um DVD, produzido e dirigido pelo publicitário Carlos Alberto Vizeu, que reuniu, em 120 minutos, depoimentos e farto material de arquivo dos programas de Fernando Barbosa Lima. O conjunto de texto e imagem torna Nossas câmeras são seus olhos uma obra imperdível para todos os que se interessam não apenas por comunicação, mas também pelo avanço intelectual que a televisão pode representar para os brasileiros.

O autor

A trajetória de Fernando Barbosa Lima se confunde com a história da televisão brasileira. Trabalhou na Rede Excelsior, Rede Bandeirantes, Rede Manchete e na TVE do Rio de Janeiro, onde foi diretor por três vezes. Preto no branco, Jornal de vanguarda, Abertura, Sem censura, Conexão internacional e Xingu estão entre os programas criados por ele e que marcaram época. Um deles, Sem censura, está no ar há mais de 20 anos, sob o comando de Leda Nagle.

Japiassu reúne crônicas de paixão

MP gaúcho mostra ao povo como fiscalizar

Moacir Japiassu, um dos maiores prosistas brasileiros, lançou em 19 de junho, em São Paulo, Carta a uma paixão definitiva, livro que reúne suas melhores crônicas escritas ao longo de mais de uma década. Ambientadas na década de 80, relatando fatos irreverentes e apaixonados. O amor é o eixo de organização, resgatando sobretudo a sensibilidade feminina através dos tempos, e remetendo a diversos assuntos, como o desabrochar do próprio amor, as várias faces da paixão e as recordações e saudades de laços pregressos. Inspirado nos acontecimentos diários, o autor aborda também outras temáticas, como as políticas públicas que geram fenômenos insólitos e as suas experiências como jornalista, visitando ambientes e tempos diversos. Através de uma narrativa repleta de humor, o texto de Moacir Japiassu traz elementos de ficção, fantasia e crítica. Há detalhes inusitados e referências a artistas da cultura ocidental, transpondo preconceitos quando o assunto é a vida, uma vez que o cronista pode ser considerado o poeta dos acontecimentos do dia-a-dia: — Sob o vidro de minha mesa de trabalho protejo alguns poemas. Estrofes, versos, palavras capazes de erguer o astral quando a manhã se apresenta duvidosa mas é necessário persistir — diz ele.

Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul lançou recentemente um informativo chamado Orçamento: ajude a fiscalizar, cujo objetivo é incentivar e auxiliar a população no controle e na fiscalização da arrecadação e aplicação dos recursos públicos. A publicação encontra-se disponível também online no endereço www.tce.rs.gov.br/ MPE/Informativo. A primeira edição traz abordagens sobre os mecanismos de elaboração dos orçamentos públicos — incentivando a população rio-grandense a participar ativamente do processo —, visando à “efetiva execução dos projetos neles aprovados”. O informativo é produzido e editado pelo MPE e se trata do primeiro de uma série de edições temáticas que serão publicadas pelo órgão sobre assuntos ligados à administração pública. A publicação esclarece que todo cidadão pode participar da fiscalização, valendo-se dos artigos 5º e 37º da Constituição Federal, que permitem que qualquer pessoa tenha acesso a informações relativas aos órgãos públicos, assim como da Lei de Responsabilidade Fiscal, que prevê a realização de audiências públicas e a prestação de contas das ações do Governo.


LIVROS DOAÇÃO

Eco 21 no acervo da ABI Entre os autores de textos na publicação, de defesa ambiental, Fidel Castro e Ségolène Royal A Biblioteca Bastos Tigre ganhou as edições 122, 123, 125 e 126 da revista ECO 21, publicação voltada para assuntos ligados ao meio ambiente e que reúne artigos de jornalistas, políticos, cientistas e pesquisadores, entre outros. Os exemplares foram doados em nome da Diretora da revista, Lúcia Chayb, e do editor, René Capriles, que afirma que, agora, a Biblioteca da ABI receberá a revista todo mês. Na edição 125, destaca-se o artigo de Fidel Castro, A internacionalização do genocídio, que fala sobre a reunião de trabalho entre os Presidentes George W. Bush e Luiz Inácio Lula da Silva em Camp David, nos Estados Unidos. Publicado na íntegra, o texto do Presidente de Cuba questiona quem vai fornecer a matéria-prima para produzir o etanol a ser distribuído para o mercado mundial, comenta os efeitos das mudanças climáticas e prevê uma guerra para garantir o fornecimento de gás e petróleo, entre outros temas. O artigo de Ségolène Royal, atuante e respeitada militante européia que esteve à frente do Ministério do Meio Ambiente francês e era então candidata à Presidência de seu país, é o destaque da edição 122. Em Meu compromisso com uma França ambiental, ela mostra como suas propostas de desenvolvimento estavam vinculadas à sustentabilidade, à luta contra as mudanças climáticas, à proibição dos organismos geneticamente modificados, à redução da energia nuclear e à educação ambiental. Também na edição 122, o jornalista Julio Godoy, da Agência Terramérica, publicou um artigo em que fala sobre a proposta de criação da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente-Onuma, feita pelo ex-Presidente da França Jacques Chirac. O articulista faz um contraponto com a opinião daqueles que consideravam útil a iniciativa de Chirac para enfrentar os desafios da deterioração global, como daqueles que observavam a proposta como uma manobra política, com vista às eleições gerais francesas. Já na edição 126, há um artigo do editor da ECO 21, René Capriles, sobre o trabalho do repórterfotográfico Araquém Alcântara — um dos entrevistados da seção “Em foco”, do ABI Online —, destacando-o como um memorialista e naturalista contemporâneo.

Como Mário Barata salvou a carreira de Gustavo Barroso Dando uma de cigana, o jovem professor do Curso de museus leu a mão do mestre e lhe fez um mau presságio. Barroso acreditou, abandonou o integralismo e salvou a pele no Estado Novo. inspiração e modelo as organizações da Ao doar à Biblioteca da ABI o volume Alemanha de Adolf Hitler e da Itália de A lembrança de Ouro Preto continua semBenito Mussolini. Além de militante do inpre comigo, publicação póstuma de um tegralismo, Barroso era jornalista, contisrelato memorialístico do museólogo ta, ensaísta, romancista, folGeraldo Pitaguary, o jornaclorista, historiador e memlista, professor e museólobro da Academia Brasileira go Mário Barata revelou de Letras. Foi o criador do Mucomo conseguiu afastar o seu Histórico Nacional em escritor e acadêmico Gus1922 e o dirigiu até sua mortavo Barroso da militância te, em 1959, com um breve no movimento integralisinterregno entre 1930-1932, ta e assim salvá-lo de persequando o Governo da Revoguições na vida pública, sob lução de 30 confiou a direo Estado Novo. Durante a ção do órgão a Rodolfo Garviagem de trem para Ouro cia, responsável pela instituiPreto, o jovem Mário Baração do Curso de Museus. ta, por pura galhofa, leu a Em 1944, no âmbito da mão de Barroso e vaticinou grande reforma do Curso de que ele se daria mal se continuasse como adepto do inMário Barata: trote salvador Museus instituída pelo Governo Getúlio Vargas, o curtegralismo e do nazifascisrículo do curso passou a contar com a remo. Barroso acreditou, fugiu à militânalização de excursões a áreas e órgãos culcia política e assim pôde manter-se na Diturais de interesse para a formação dos reção do Museu Histórico Nacional. futuros servidores e dirigentes dos museus Membro do Conselho Deliberativo da do País. A primeira excursão foi essa a Ouro ABI, Mário Barata era professor do Museu Preto narrada por um dos alunos, Geraldo Histórico Nacional, no qual se formara em Pitaguary, em anotações que a Escola de 1940 pela sétima turma do Curso de Museus Museologia da Universidade Federal do do MHN, criado em 1932 por Rodolfo Estado do Rio de Janeiro houve por bem Garcia. Já a partir de 1939, ele se tornou editar, com organização e preciosas notas professor da disciplina Artes Menores do de Ivan Coelho de Sá, que já na apresenCurso de Museus, que era dirigido por tação do volume oferece minudentes inGustavo Barroso. formações sobre o Museu Histórico NaNo auge do integralismo, proscrito após cional, o Curso de Museus, o memorialiso frustrado assalto ao Palácio Guanabara e ta Geraldo Pitaguary e dezenas de pessoas tentativa de assassinato do Presidente Gee órgãos referidos na publicação. túlio Vargas, em 1938, Barroso militara com Ao volume agora disponível na Bibliotedestaque na Ação Integralista Brasileira, ca Bastos Tigre foram acrescentados dois criada por Plínio Salgado e que tinha como

Edgar Rodrigues, anarquista, sim, sem graças a Deus Autor de mais de 50 livros, o jornalista e historiador português fala em duas novas obras da militância social das mulheres e das lutas de grupos e personagens libertários. As origens e o desenvolvimento das lutas travadas pelo movimento social no Brasil e em Portugal são os temas preferenciais do jornalista e historiador português Edgard Rodrigues, militante anarquista que vive no Brasil desde os anos 50, quando deixou seu país de origem fugindo das perseguições do regime ditatorial salazarista. Rodrigues chegou ao Brasil em 1951, e logo empregou-se como mestre-de-obras, para depois se dedicar a uma extensa pesquisa sobre documentos e informações sobre a História Social portuguesa e brasileira. Este trabalho resultou em diversos artigos que acabaram publicados na imprensa e foram usados como fonte primária para mais de 50 livros que escreveu sobre o tema. Este ano, foram dois lançamentos: Mulheres e anarquia e Lembranças incompletas. O primeiro, uma coletânea de artigos sobre as diversas situações da representação social feminina, é dedicado às duas mulheres mais importantes da vida do autor: sua mãe, Albina

anexos, um com o depoimento de Mário Barata sobre o alerta que deu a Gustavo Barroso durante a viagem, outro de José do Nascimento Júnior, Diretor do Departamento de Museus e Centros Culturais do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-Iphan, que salienta a importância do projeto Memória da Museologia, desenvolvido pela Escola de Museologia em parceria com esse Departamento do Iphan e no âmbito do qual foi editado o texto de Pitaguary. Diz a evocação de Mário Barata: “Depoimento sobre meu contato essencial na ida a Ouro Preto, com o Diretor do Museu Histórico Nacional. Durante a longa viagem de trem, o prof. Gustavo Barroso aceitou ter uma leitura de suas mãos feita pelo Prof. Mário Barata, o qual declarou-lhe que o destino dele, Gustavo Barroso, seria mau e que o mesmo deveria abandonar as atividades políticas; o Diretor ficara atento e calado nessa ocasião, sem qualquer protesto. Os pormenores da viagem estão bem descritos neste livro de Geraldo Pitaguary — com organização de Ivan C. de Sá — os quais merecem parabéns! Tenho gratas lembranças da excursão e da turma. M.B.” Indagado pelo ABI Online se tinha algum ascendente cigano que lhe tivesse ensinado a arte de leitura das mãos, o professor Mário Barata respondeu negativamente e esclareceu que Gustavo Barroso não lhe fez nenhuma pergunta a esse respeito: — Fiz a leitura por mera brincadeira, mas o professor Gustavo Barroso ficou impressionado com o presságio que fiz e parece que o levou a sério. Desde então ele arrefeceu o ardor com que defendia as idéias do integralismo.

da Silva Santos, e Ondina dos Anjos da Costa Santos, “companheira de 65 anos de cumplicidade”. O outro lançamento, na opinião de Marcolino Jeremias — companheiro de Rodrigues no movimento anarquista —, é a primeira obra que trata das iniciativas libertárias entre 1930 e 2005. Ao contrário do que sugere o título, porém, Lembranças incompletas não é uma obra autobiográfica. Trata-se de um relato da militância anarquista, seus principais grupos e personagens com que Rodrigues se relacionou ao longo de sua trajetória. Uma série de documentos registra a história do movimento no Brasil e no exterior, como cópias de O Nihilista, órgão dos operários do Exército e da Marinha, de 16 de março de 1883; da edição de 28 de fevereiro de 1835 de O Anarchista Fluminense; e do Journal Officiel de La Comune de Paris, com data ilegível. Edgar Rodrigues diz que, quando pensou em escrever Lembranças incompletas, não tinha pretensão de resgatar todos os episódios de que tomou conhecimento ou em que se envolveu: — Mas procurei me esforçar para ser justo em meus conceitos, juízos e interpretações, a fim de não cometer equívocos que enfeiem a conduta ideológica de militantes e/ou personalidades com quem convivi, mesmo discordando de alguns, pela sua irracionalidade. Sócio colaborador da ABI, à qual se associou em 25 de julho de 1978, Edgard Rodrigues chegou ao Brasil trazendo metade do livro já rascunhada. Ele conta encontrou no Brasil “liberdade e companheiros muito cultos, com muita projeção na vida brasileira, como o José Oiticica”, e teve oportunidade de assistir a reuniões da Ação Direta, que servia como mentora de ações de grupos anarquistas. Foi a partir dessas experiências que começou a escrever artigos para jornais e, mais tarde, livros.

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Liberdade de imprensa

É preciso sonhar com um Brasil ético A ABI comemora o Dia da Imprensa salientando a necessidade de construção de um país com mais ética e menos desigualdade sociais

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petição do advogado do BRB dizia que a notícia era “uma inescrupulosa verdade, uma manchete abusiva em letras garrafais estampando ‘Escândalo na boca do caixa do BRB — Banco de Brasília vai assinar contrato de R$ 108 milhões, superfaturado e sem licitação’”. Naquele mesmo ano, foram também condenados na 4ª Vara Criminal o Presidente do DF Notícias, José Vieira Barreto,

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Amaral, que disse que a notícia era flagrantemente falsa. A condenação do DF Notícias aconteceu mesmo após manifestação do Tribunal de Contas do Distrito Federal apontando irregularidades no contrato. Em 2004, o Juiz Iran Lima, da 5ª Vara da Fazenda Pública do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, condenou o jornal a pagar indenização de R$ 10 mil por difamação. A

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A direção do DF Notícias enviou carta à ABI, em que pede reparação de seus direitos constitucionais, após condenação na Justiça por denunciar um contrato superfaturado e sem licitação feito entre o Banco de Brasília (BRB) e a Associação Brasileira de Bancos Estatais e Regionais (Asbace). Uma ação contra o jornal foi impetrada na Justiça pelo advogado do BRB, André Campos

A ABI lamentou noticiar em 25 de junho mais um caso de agressão a jornalista e atentado à liberdade de imprensa. A nova a vítima foi Arnaldo Ribeiro, da Rádio Comunitária CEM FM, do Município de Campo Maior, no Piauí. O motivo da agressão ao jornalista foi sua denúncia de manipulação do concurso público realizado dois meses antes para preenchimento de cargos na Prefeitura de Campo Maior. O agressor foi um indivíduo conhecido apenas como Demerval, irmão de Keila Souza, que teria sido beneficiada pela suposta fraude denunciada por Arnaldo. Esta teria sido a segunda tentativa de intimidação contra Arnaldo Ribeiro por causa das denúncias de improbidade em órgãos do serviço público de Campo Maior. Há dois anos, de acordo com o testemunho do jornalista, o Prefeito, Joãozinho Félix, acompanhado por diversos capangas, invadiu o estúdio da CEM FM quando Arnaldo estava no ar, apresentando seu programa para contestar denúncias de nepotismo feitas contra sua administração. As denúncias ganharam o apoio do Vereador Fernando Miranda, que resolveu listar e afixar na parede de sua residência todos os parentes contratados irregularmente por Joãozinho Félix. A decisão virou assunto na mídia, com reportagens na rádio CBN e no jornal Correio Braziliense, que publicou, na edição de 5 de abril a matéria Nepotismo no paredão, mostrando os nomes dos parentes do Prefeito que recebem supersalários tanto em Campo Maior quanto na cidade Jatobá do Piauí, comandada pela mesma família. Arnaldo Ribeiro diz que há provas contundentes demonstrando as irregularidades de Joãozinho Félix no Tribunal de Contas do Estado do Piauí e na Prestação de Contas da Câmara de Vereadores dos dois Municípios citados.

DF Notícias condenado, mas disse a verdade

Jornalista agredido por denunciar nepotismo

Ao pôr em relevo esse fato histórico, tem em vista a ABI destacar o papel que cabe à imprensa e aos profissionais que a produzem, tal como se deu ao tempo de Hipólito da Costa, de atuar como instrumentos e agentes da construção de um país que avance em progresso material, no aperfeiçoamento dos costumes políticos, no respeito à ética na administração pública e na iniciativa privada e na busca da justiça social, com a redução das gritantes desigualdades hoje existentes entre as pessoas e as regiões do País. É certo que tais aspirações têm sido tisnadas nos últimos tempos por episódios que comprometem a possibilidade de sua efetivação num horizonte próximo, mas é preciso sonhar. Neste Dia da Imprensa de 2007, Ano Inaugural do seu centenário, a ser completado em 7 de abril de 2008, a ABI reafirma seu propósito de manter vigorosa defesa da liberdade de informação, da liberdade de acesso às fontes de informação e da liberdade de opinião, bens essenciais para a edificação de um efetivo Estado Democrático de Direito no País, e de contribuir para a construção de um Brasil melhor. Rio de Janeiro, 1 de junho de 2007 (a) Maurício Azêdo, Presidente."

cou a sua publicação, enviada clandestinamente para o Brasil, à sustentação da idéia da independência e do progresso nacional, sem subordinação política a potências estrangeiras. A ABI considera que bem agiram os legisladores do País ao oficializar o Dia da Imprensa tendo como paradigma o jornal de Hipólito da Costa, o primeiro editado em língua portuguesa sem submissão à censura e sem obediência ao poder, como ocorria com o veículo antes adotado como referencial do surgimento do jornalismo entre nós, a Gazeta do Rio de Janeiro, que começou a circular em 10 de setembro de 1808 e inspirou a transformação dessa data em marco da criação da imprensa no Brasil. Ao contrário da Gazeta, criada pela Corte portuguesa instalada no País após a chegada de Dom João VI e que constituía a folha de divulgação dos atos oficiais, numa antecipação do futuro Diário Oficial, o Correio de Hipólito foi expressão do pensamento livre e se devotou a uma grande causa, a da independência nacional. Foi esse viés da atuação do Correio que valeu ao seu criador o reconhecimento, feito por Barbosa Lima Sobrinho, de que foi ele, Hipólito, o pioneiro da independência do Brasil.

Em declaração comemorativa do Dia da Imprensa, em 1º de junho, a ABI reafirmou seu compromisso de vigorosa defesa da liberdade de informação, da liberdade de acesso às fontes de informação e da liberdade de opinião, para construção de um Brasil melhor, com mais ética na administração pública e na iniciativa privada e menos desigualdades entre as pessoas e as regiões do País. Assinalou a ABI que o Dia da Imprensa era anteriormente festejado em 10 de setembro, data de criação da Gazeta do Rio de Janeiro, criada pelo Governo do Príncipe Regente Dom João VI, e passou a ser comemorado em 1 de junho para celebrar o Correio Braziliense de Hipólito da Costa, o primeiro editado em língua portuguesa sem censura nem obediência ao poder. Eis a declaração: "A Associação Brasileira de Imprensa dirige sua saudação fraternal aos jornalistas de todo o País por motivo da passagem, neste 1 de junho, do Dia da Imprensa, que celebra o aparecimento em 1808, em Londres, do primeiro jornal brasileiro, o Correio Braziliense, editado por um sonhador de espírito libertário, o gaúcho Hipólito José da Costa Pereira Furtado de Mendonça, que dedi-

e o editor do jornal, Afonso Herdy. Já em 2007, o mesmo contrato denunciado pelo jornal foi uma das causas da Operação Aquarela, deflagrada pela Polícia Civil, o Ministério Público do Distrito Federal e a Receita Federal, que investigavam um esquema comandado pelo então Presidente do BRB e o Presidente da Asbace, Tarcísio Franklin de Moura, que foi preso.

Deputado açula colegas contra a imprensa A edição de 16 de maio do Jornal da Câmara publicou matéria em que o Deputado Ernandes Amorim (PTBRO) estimula parlamentares a reagirem a injustiças cometidas pela imprensa. Durante um discurso no plenário, ele criticou a imprensa privada brasileira e anunciou ter ganhado um processo judicial que moveu contra o Correio Braziliense. Informou também que, por decisão da 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e da 1ª Câmara Cível, o jornal foi condenado a lhe pagar, por reparação a danos morais, R$ 198 mil. De acordo com informações dos advogados que cuidam das ações do Correio Braziliense, a reparação por danos morais – paga em 2004, após um acordo entre o Deputado e o jornal – foi de R$ 180 mil; os outros R$ 18 mil são referentes a honorários advocatícios. Durante o processo, Ernandes recorreu das decisões em todas as ins-

tâncias e só aceitou o acordo após julgamento do Supremo Tribunal Federal. Ainda na sessão, o Deputado disse já ter acionado a Enciclopédia Britânica - também condenada, segundo informou -, o Jornal do Brasil, O Globo e o Jornal da Tarde. Os processos contra os jornais, segundo Ernandes, estão em andamento e foram motivados por denúncias publicadas em 1995, quando ele assumiu o mandato de Senador. Na época, ele era acusado de extração ilegal de madeira e de cassiterita em Rondônia. A reportagem publicada no Jornal da Câmara informa que o Deputado disse esperar que seu pronunciamento sirva como exemplo para que outros parlamentares não se calem diante dos "maus profissionais" da imprensa e recorram à Justiça para contestar o que não é verdade.


Juíza de Jundiaí impôs censura em Vinhedo, SP Jornal foi proibido de publicar textos que ela não conhecia, sob pena de multa de R$ 500 mil por dia.

Luiz Carlos Barbon: crime continua impune.

CONSELHO

Moção reclama a apuração da morte de Barbon Em sua reunião mensal de junho, realizada no dia 26, o Conselho Deliberativo da ABI aprovou um relatório da Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e Direitos Humanos, em que é solicitado à Diretoria da Casa do Jornalista o envio de uma moção ao Ministério Público de Ribeirão Preto e de São Paulo, pedindo informações sobre o andamento das investigações da morte do jornalista Luiz Carlos Barbon Filho e das ameaças que seu pai, Luiz Carlos Barbon, tem recebido. Luiz Carlos Barbon Filho foi assassinado com dois tiros, em represália às denúncias sobre um esquema de aliciamento de menores em Porto Ferreira-SP, no qual estavam envolvidos políticos e empresários da cidade. Após a morte do jornalista, seu pai passou a sofrer ameaças. (ver a reportagem A morte por atacado no jornalismo). O relatório da Comissão também pede que a Diretoria da ABI entre em contato com o Sindicato dos Jornalistas de Alagoas, para obter mais informações sobre o fim das atividades da Tribuna de Alagoas que demitiu 110 empregados, entre jornalistas, gráficos e pessoal administrativo, que não receberam salários integrais e indenizações trabalhistas nos últimos cinco meses, embora os donos do jornal mantivessem outros negócios a pleno vapor. Outro ponto apresentado no relatório pelo Secretário da Comissão, Conselheiro Arthur Cantalice, diz respeito ao ato de violência praticado contra a empregada doméstica Sirley Carvalho, espancada, assaltada e roubada por um grupo de jovens de classe média alta enquanto esperava um ônibus na Barra da Tijuca. Os agressores são estudantes universitários e moram num condomínio de luxo no mesmo bairro onde Sirley foi atacada.

Em declaração emitida em 18 de junho, a ABI condenou a censura prévia imposta ao jornal Tribuna de Vinhedo pela Juíza Ana Lúcia Xavier Goldman, da 1ª. Vara Cível de Jundiaí, São Paulo. A ABI considera que a juíza cometeu grave agressão à Constituição, que em seus artigos 5° e 220 veda expressamente a censura prévia. A seguir, a íntegra da declaração da ABI: “A Associação Brasileira de Imprensa lamenta que a Juíza Ana Lúcia Xavier Goldman, da 1ª. Vara Cível de Jundiaí, São Paulo, tenha proibido o jornal Tribuna de Vinhedo, da cidade de Vinhedo, interior do Estado, de publicar uma entrevista com denúncia de irregularidades que teriam sido cometidas por autoridades do Judiciário e do Executivo do Município e por empresários locais. Na primeira das duas sentenças que firmou sobre o caso, uma expedida no dia 1°, outra no dia 15 de junho susten-

tou a Juíza Xavier Goldman que a publicação do texto iria “macular a credibilidade do Poder Judiciário e do Ministério Público de Vinhedo”. Para impor o respeito à sua decisão, a Juíza decretou segredo de Justiça no processo e fixou em R$ 500 mil a multa por publicação e por dia de veiculação das matérias por ela vetadas antes de conhecê-las. A ABI entende que a Juíza Xavier Goldman cometeu grave agressão à Constituição da República, que em seu artigo 5°, inciso IX, estabelece que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”, preceito reafirmado com nitidez e clareza no parágrafo 2° do artigo 220 do texto constitucional, que proclama que “é vedada toda a qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”. Além de violar a Constituição, a autora dessas sentenças reve-

lou extremado autoritarismo, ao proteger os denunciados pelo segredo de justiça atribuído ao processo e pela exorbitância da multa que fixou para os casos de descumprimento de suas arbitrárias decisões. Espera a ABI que em instância superior sejam reformadas as sentenças da Juíza Xavier Goldman, cujo teor inconstitucional reforça a nossa convicção de que atualmente o principal inimigo da liberdade de expressão e de informação no Brasil é a primeira instância do Poder Judiciário, na qual juízes desatentos aos mandamentos constitucionais têm prolatado sentenças que colidem com disposições claríssimas da Constituição. É desejável que, através de seus órgãos de correição, o Poder Judiciário assuma de ofício a retificação dessas decisões lesivas ao Estado Democrático de Direito. Rio de Janeiro, 18 de junho de 2007. (a) Maurício Azêdo, Presidente.”

Empresários protestam

e criminosa se não estiver revestida dos requisitos previstos na Lei n° 9.296/96, Considerando que "a produção fonográfica que reproduz a conversação entre pessoas, sem qualquer induzimento ou interceptação por terceiro no diálogo, deve ser admitida como meio de prova", como decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo (JTJ 184/224 ), Considerando que os arts. 5°, IX, e 220, § 2°, da Constituição Federal consagram a liberdade de expressão, asseguram a livre manifestação da informação e proíbem toda e qualquer censura (arts. 5°, IX, e 220, § 2°), Considerando que o Supremo Tribunal Federal, em diversas decisões (ADI 392, ADI 956), tem repudiado essa censura prévia judicial sobre os meios de comunicação, até porque a reparação do dano é o instituto constitucional consagrado como decorrência da impossibilidade da censura, que, conseqüentemente, não pode existir em qualquer regime de plena liberdade com responsabilidade, Considerando que nesse regime, diversamente do arbítrio praticado no passado, ao Poder Público não compete interditar, a priori, o livre exercício do pensamento por ato supostamente ofensivo, porque isso é olvidar a histórica conquista do povo brasileiro, a de que no confronto entre o direito à proteção da imagem e os direitos público e político à informação e de liberdade de expressão, prevalece o sistema da responsabilização pelos abusos a posteriori, como está nas raízes profundas do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, Considerando que com esse sinal vermelho nos meios de comunicação e no próprio âmbito jurídico a decisão judicial retroage aos tempos ditatoriais

do Ato Institucional n° 5 (AI-5) e reforma, por conta própria, nossa democrática Constituição Federal à revelia do Congresso Nacional, Considerando que essa decisão judicial é triplamente desastrosa, primeiro porque entre os jornais locais não há evidência de desequilíbrios editoriais, segundo porque, se os autores que pediram essa liminar tiverem alguma razão, ‘o seu direito posterior na esfera cível e penal já terá se esvaído sem que, em benefício de sua imagem, a censura prévia tenha ajudado’, e terceiro porque disso tudo só se tem a lamentar pela imagem de todo o Judiciário, Considerando os últimos acontecimentos que envolveram o Congresso Nacional e o Governo da Venezuela, transcrevemos parte de memorável discurso do Senador e ex-Presidente da República do Brasil José Sarney: ‘Uma democracia não se constrói com medo, nem com o fechamento ou censura dos meios de comunicação. No momento em que um governo tem o poder de silenciar qualquer órgão e qualquer título, deve-se temer pelo conceito que se tem da democracia nesse país.’ Esta Associação, pela unanimidade de seu plenário, vem de público manifestar sua indignação e veemente repúdio a esse ato de censura prévia da decisão judicial que violou o direito público, político e, até mesmo, subjetivo à informação sobre fatos de interesse público, agrediu a Liberdade de Imprensa e desconsiderou o primeiro artigo da Constituição Federal, em que expressamente se prevê que o Estado de Direito, no Brasil, é democrático. Vinhedo, 8 de junho de 2007. (a) Diretoria.”

Associação Empresarial de Vinhedo mostra as ilegalidades contidas na decisão judicial. A Associação Empresarial de Vinhedo divulgou moção de repúdio ao ato de censura prévia à Tribuna de Vinhedo tomado por decisão da Juíza Ana Lúcia Xavier Goldman, da 1ª Vara Cível de Jundiaí. Foi esta a manifestação da entidade: “A Associação Empresarial de Vinhedo (AEVI), entidade de direito privado, localizada neste Município, na Rua Comendador João Lucas, nº 101, Lj. 12, ao reunir-se no dia 4 de junho de 2007, tomou conhecimento de que todos os jornais locais, inclusive dois dos quais nossos associados, por decisão judicial de 1º de junho, foram proibidos de divulgar qualquer notícia relacionada com a gravação de diálogo em dvd entre um alto funcionário da Prefeitura Municipal, um vereador desta cidade e um jornalista. Considerando a gravidade do fato que, naquele mesmo dia 1° de junho, foi noticiado no jornal Tribuna de Vinhedo, a mencionada conversa com "...mais de três horas de gravação, no qual o funcionário conta diversas situações da Prefeitura, acusando diversas pessoas da cidade, até mesmo o Poder Judiciário" (página A2 I, Sic), Considerando que, na gravação acima citada, não houve nenhuma interceptação telefônica, esta sim, prática proibida pelo art. 5°, inciso XII, da Constituição Federal,

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DEPOIMENTO CARLOS LEMOS

Repórter deve ser sempre um agente provocador Jornalista que tirou os fios do JB só foi trabalhar nas Organizações Globo porque Roberto Marinho aceitou uma proposta feita para ser recusada. ENTREVISTA A RODRIGO CAIXETA

Carlos Lemos começou no jornalismo há 47 anos. Naquela época, era estudante de Direito e buscava um curso que oferecesse boa formação em cultura geral, quando atentou para a recém-criada graduação em Jornalismo da Puc-Rio. Seu primeiro emprego como repórter foi na Tribuna da Imprensa, em que começou como estagiário e teve a primeira Jornal da ABI – Quando o senhor estreou no jornalismo? Carlos Lemos – Prestei vestibular para Direito na UFRJ, pois minha mãe queria que eu estudasse. Então, li num jornal uma segunda chamada para Jornalismo da Puc. Quando vi as disciplinas, pensei que pudesse ser uma boa forma de adquirir cultura geral. Naquela época, havia oito candidatos e acho que fomos a segunda turma a se formar, pois o curso era recente. De manhã, eu trabalhava na Fundação Getúlio Vargas; à tarde, era camelô; de noite, alternava as aulas nas faculdades de Direito e Jornalismo. 28 Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

reportagem publicada com chamada de capa. Alguns anos e veículos depois, Lemos teve importante participação na grande reforma do Jornal do Brasil. Foi também no grupo JB, onde permaneceu 27 anos ininterruptos, que criou a Rádio Cidade, com o estilo musical que revolucionaria o estilo das FMs brasileiras.

Jornal da ABI – E como decidiu que carreira seguir? Lemos – As aulas de Jornalismo eram muito práticas. Comecei a deixar de lado o Direito, já que o Jornalismo era muito objetivo. E era o melhor aluno da classe, modéstia à parte. No meio do primeiro ano, o Professor Nilson Viana perguntou se alguém queria fazer estágio. Vários quiseram e eu fiquei quieto, na minha. O Nilson me perguntou novamente se queria estagiar e expliquei que precisaria abandonar um dos meus empregos, o de camelô. Ele então disse que eu não deveria fazer isso, pois o estágio não era remunera-

do, mas acabei topando assim mesmo e pedi 15 dias para resolver a situação. Jornal da ABI – Então o senhor foi para a Tribuna da Imprensa? Lemos – Fui fazer estágio na Geral da Tribuna e virei Lemos. Explico: meu nome completo é Carlos Lemos Leite da Luz. Leite da Luz do meu pai, Lemos da minha mãe. O chefe de reportagem me perguntou qual o meu nome de guerra. Respondi que era Carlos. Ele então disse que não poderia ser, pois o único Carlos que havia lá era o Lacerda, dono do jornal. Então eu disse Leite, e ele respondeu que

também não dava, pois seu nome era Hilcar Leite. Carlos Luz eu não queria ser, porque homônimo de um político mineiro do PSD, que chegou a ser Presidente interino da República. Então, restou-me o Lemos, não exatamente o nome prevalecente, pois, segundo nossa lei, o que prevalece é o do pai. Cheguei em casa e expliquei ao meu pai por que estava sendo chamado de Lemos, para ele não pensar que estava rejeitando seu nome. Jornal da ABI – Qual foi a sua primeira reportagem? Lemos – A primeira reportagem que fiz deu primeira página. Era sobre o aniversário do Forte de Copacabana. Quando voltei à Redação, o Hermano Vianna, que me dava aula na faculdade, viu meu lead e disse que queria algo diferente, pois o que eu tinha feito qualquer um podia fazer. Então me mandou de volta ao Forte para apurar mais informações. Peguei um bonde, fui lá para o Posto 6, procurei um ângulo diferente e aí o Hermano gostou. Trabalhei uns dois ou três meses e disse que, se não começassem a me pagar um salário, eu sairia, pois não trabalharia mais de graça. Então o Hilcar me ligou em casa e disse que eu passaria a ganhar um salário-mínimo e meio. Continuava na FGV e fui abandonando aos poucos o curso de Direito. Jornal da ABI – Nesse tempo o senhor também já acumulava funções em outras redações, não é? Lemos – Comecei a conciliar a Tribuna com a Manchete, que era a melhor revista da época. Em seguida, o Amaral Neto criou o Maquis, um jornal semanal em que também trabalhei simultaneamente, mas como freelancer. Resolvi largar a FGV e fiquei nesses três empregos. Então começou a reforma no Jornal do Brasil, que já usava técnicas modernas como o lead, a pirâmide invertida e os períodos curtos, criando um estilo que se tornou referência para o jornalismo brasileiro e mundial, além de fundir o estilo poético do Diário Carioca com o estilo oposição da Tribuna da Imprensa. Era principalmente destes dois jornais que o Diretor do JB, Odilo Costa, filho, estava convidando os melhores jornalistas da imprensa fluminense. Fiquei chateado por nunca ter sido chamado e fui apurar o motivo. Descobri que o Hermano Vianna havia dito para o Odilo que eu era vedete, temperamental e escolhia as matérias que queria fazer. Confesso que era perfeccionista e escrevia quantas vezes fossem necessárias até que o texto me agradasse. Um dia, só faltava eu para entregar a matéria e o editor de Economia da Tribuna falou que era para eu lhe passar os dados que ele escreveria, pois o jornal não podia esperar. Disse-lhe que só eu escrevia matéria minha; quando entreguei o texto, mandei tudo às favas, saí batendo a porta e disse que ali não trabalharia mais. Fui para o JB e pedi para conversar com o Odilo. Eu me apresentei e disse logo que não era vedete, nem temperamental, muito menos escolhia


matéria – isso minutos depois da confusão que havia feito na Tribuna. Perguntei se tinha lugar para mim, ele respondeu que sim e comecei no mesmo dia no JB, onde fiquei por 27 anos. Jornal da ABI – Ininterruptos? Lemos – Sim. Quando veio a Copa do Mundo de 1958, fui cobrir escrevendo e fotografando. Eu tenho mania de fotografia e queria dar uma visão diferente do que o esporte tinha naquela época. As matérias eram enviadas por telegrama. Os negativos chegavam aqui dois dias depois e a radiofoto era publicada no dia, em condições péssimas. Quando o Brasil foi campeão, escrevi o seguinte lead: "Tal como Gighia ganhou para o Uruguai em 1950, Garrincha acaba de ganhar para o Brasil a Copa do Mundo de 1958" – ambos eram pontas-direitas. Quando voltei, o Odilo virou para mim e perguntou se eu não queria chefiar a editoria de Esportes. Eu nunca havia sido repórter esportivo, embora gostasse de esporte. Concordei, desde que levasse o Jânio de Freitas, que era mais experiente que eu. Jornal da ABI – Houve um episódio curioso nesse tempo em que vocês trabalharam juntos... Lemos – Jânio e eu diagramávamos o caderno de Esportes, mas eu também queria mostrar que tinha participação na reforma do jornal. Quando o Jânio se acidentou na Redação e ganhou quatro dias de licença, eu precisava mostrar que ele não trabalhava ali sozinho. Jornal da ABI – Ou seja, o senhor tinha quatro dias para promover uma revolução. Lemos – Se perguntarem quem é o pai da reforma do Jornal do Brasil, há milhares. Mas se houver um único, é o Amílcar de Castro, que era diagramador e foi um dos maiores escultores do Brasil. Ele diagramava o JB já seguindo a ordem de leitura da esquerda para a direita, de cima para baixo. Era a verticalização da informação. O Amílcar defendia tirar os fios que separavam as colunas do jornal. Foi a brecha que eu tive para imprimir a minha mudança. Fui à oficina, pedi para aumentar a medida entre as colunas e tirar os fios, responsabilizando-me por qualquer problema que acontecesse – como de fato fiz quando o Odilo me chamou para saber o que era aquilo. Jornal da ABI – Qual foi sua justificativa? Lemos – Disse a ele que há tempos o Amílcar defendia a retirada dos fios do jornal e que eu resolvi tirar. Ele disse que eu havia abusado da minha autoridade, passando por cima dele, e devia ser punido. Como eu era um profissional competente, ele mandou retirar todos os fios do jornal.... Jornal da ABI – E como o Jânio reagiu? Lemos – Não houve problema. Ele pertencia à escola do Amílcar, era redator mas diagramava.

“Cometi um erro desgraçado: disse que em dois meses a rádio estaria em primeiro lugar; em cinco dias ela já era top. Foi um negócio alucinante.” Jornal da ABI – Naqueles tempos era possível sobreviver como jornalista? Lemos – Eu trabalhava feito um cachorro. Era chefe de Esportes e subchefe de reportagem. Chegava ao jornal às 7h para fazer a pauta e distribuir para os repórteres. Houve uma época em que eu ainda acumulava isso tudo com a edição do Caderno B, quando o Reinaldo Jardim estavadeférias.Apautaseconsubstancia como tal a partir do Jornal do Brasil e eu sou responsável por isso. Costumava brincar muito com minhas pautas e o Reinaldo sugeriu que elas fossem editadas para publicação como coluna, tirando os detalhes íntimos. Naquela época o País tinha comprado um porta-aviões e estava o maior bateboca para saber quem o pilotaria, se a Marinha ou a Aeronáutica. Eu sacaneava toda aquela situação até que um dia o Dr. Nascimento Brito elogiou minha coluna, mas mandou acabar com ela, pois a Marinha e a Aeronáutica haviam se unido contra mim. Minha coluna durousetedias–aúnicacoisaqueconseguiu foi unir as duas Forças...

no modelo americano. Queria um modelo sofisticado, estilo BBC, mas esta é estatal, não sofre com a falta de recursos; o nosso era um projeto hiperdimensionado para uma televisão comercial. Hoje a Globo tem o Projac, mas antigamente tudo era produzido em dois estúdios, enquanto a BBC tinha oito. Era um projeto grande para os padrões comerciais. Na BBC eram feitos dez ensaios para uma hora

rava o carro nos sinais e procurava ouvir o que tocava nos outros carros. Só dava a Cidade. No dia em que ela inaugurou, monitorei o funcionamento e orientei os locutores até encontrar o ponto de equilíbrio, sem esculacho; não era um programa Pânico. Depois, fui assistir ao jogo Fluminense X Bangu ouvindo a Cidade e fazendo observações num caderno para passar aos apresentadores. Jornal da ABI – A emissora já ia ao ar em cadeia? Lemos – Fiz São Paulo, Belo Horizonte, Salvador e Porto Alegre, além do Rio. Aí virei radialista, sem ter voz para locutor... E houve um fato interessante: o Dr.

Carlos Lemos, sob a chuva, acompanhando um amistoso da Seleção.

Jornal da ABI – O senhor também fez cursos para jornalistas no exterior. Havia algum preconceito contra os profissionais brasileiros? Lemos – Eu ganhava bem e cheguei a fazer um curso na Universidade de Colúmbia, em Nova York. A Sociedade Interamericana de Imprensa tinha um curso sobre o uso da fotografia e o aspecto gráfico dos jornais. Fui lá e quem o dirigia era um sujeito ítalo-americano, competente, mas cheio de empáfia. Eu o achei muito folgadinho e, quando ele acabou a palestra inaugural e a discussão foi aberta para debate, logo levantei a mão. Antes de responder à minha pergunta, ele disse que, embora não entendesse qualquer palavra impressa no JB, considerava-o um dos melhores do mundo em apresentação gráfica e uso da fotografia. Depois eu acabei dando aula nesse curso em Buenos Aires e em outra cidade que já não me lembro qual foi. Jornal da ABI – Como essas experiências internacionais se refletiram em sua carreira? Lemos – Passei a chefe de Redação no JB. O jornal ganhou um canal de televisão e eu fui fazer um curso na BBC de Londres. Foram 11 meses de estágio. Uma dessas antenas que existem hoje no Sumaré foi posta por nós, mas um dia desistiram da TV. Jornal da ABI – Por quê? Lemos – O Dr. Nascimento Brito havia cometido um erro grave. Ele não queria seguir o padrão da TV Globo, inspirada

de apresentação. Aqui se faz tudo na hora, na pauleira, sem ensaiar, porque custa muito dinheiro. Quando o Dr. Brito soube dos custos, devolveu os canais ao Governo. Jornal da ABI – E quando o senhor foi para o rádio? Lemos – Quando voltei ao Brasil, o José Antônio, filho do Dr. Brito, dirigia as rádios AM e FM do grupo JB. Ele ia viajar e o Dr. Brito me botou na rádio. Dei uma força no Jornalismo até que um dia ele avisou que ganharíamos um novo canal de FM e que eu ficaria encarregado da programação. Ele queria algo dirigido ao público jovem... Jornal da ABI – Foi quando surgiu a Rádio Cidade. Em que o senhor se baseou para criá-la? Lemos – FM no Brasil era sinônimo de música de elevador. A FM Nacional, que só tocava música brasileira, apareceu como inovação. De tanto ir aos Estados Unidos, eu queria criar uma rádio de improviso, onde ninguém lesse texto. As músicas seriam baseadas no Top Twenty, os maiores sucessos nacionais e internacionais. No lançamento do briefing da rádio, me perguntaram qual era o público alvo. Respondi que era todo mundo, pois ela tomaria conta da cidade e em dois meses seria líder de audiência. Ninguém acreditou. Cometi um erro desgraçado: disse que em dois meses a rádio estaria em primeiro lugar; em cinco dias ela já era top. Foi um negócio alucinante. Eu pa-

Roberto Marinho me pediu que pusesse num papel o que eu queria para dirigir o Sistema Globo de Rádio. Fiz o contrário. Pus no papel tudo o que ele não poderia me dar, como luvas, participação no faturamento bruto etc. Um absurdo, dinheiro para ninguém botar defeito! Jornal da ABI – Já pensando na recusa dele... Lemos – Ele não poderia aceitar aquilo. Passados três dias, o Dr. Roberto mandou me chamar. Cheguei ali na TV Globo, no Jardim Botânico, e entreguei a lista. Ele olhou e disse que eu estava pedindo muito. Disse que escrevi o que eu queria, como ele havia pedido e completei: "Se o senhor me der isso, venho pra cá; se não, continuamos camaradas." Ele simplesmente escreveu "De acordo, Roberto Marinho". Quando passei na sala do Roberto Irineu, filho dele, este me garantiu que eu seria o último a entrar nas Organizações Globo ganhando aquilo, pois qualquer contratação semelhante o levaria a brigar com o pai. Nunca assinei um contrato com a Globo, valeu aquele papel. Fiquei lá dois anos e criei a 98 FM, com programação popular. Mas me estressava demais e muitos faziam intrigas entre mim e o Dr. Roberto. Então, resolvi sair. Jornal da ABI – Qual foi a reação dele? Lemos – Ele concordou com minha saída da rádio, mas não da organização. Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

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DEPOIMENTO CARLOS LEMOS

E eu continuava ganhando o que estava previsto no contrato. Depois de um mês em que fiquei sem fazer nada, ele me perguntou se eu queria ser subeditor de O Globo. Eu disse que topava, desde que o Evandro Carlos de Andrade não tivesse nada contra. Fiquei uns dois meses como subeditor, o Luiz Garcia como editor e o Evandro acima de nós. Naquela época, fiz uma das grandes besteiras da minha vida, num plantão de fim de semana: editei uma legenda em que chamei o piloto de corridas de Nelson Piquet Carneiro. Piquet Carneiro é o nome de um advogado amigo meu. Foi um dos maiores deslizes que cometi. Jornal da ABI – O senhor também foi diretor da sucursal do Globo em Brasília. Lemos – Depois de dois meses no Rio, o Evandro me pediu para ir a Brasília por dez dias, pois era a posse do Tancredo e o diretor de lá, que era seu irmão, havia saído. Foi então que resgatei aquela paixão pelo jornalismo, após ocupar vários cargos executivos. No meio daquela confusão da internação do Tancredo, o Dr. Roberto foi a Brasília e pediu para que eu ficasse como diretor da sucursal. Jornal da ABI – E como o senhor foi para a Agência Globo? Lemos – Um tempo depois, voltei ao Rio e pedi ao Dr. Roberto que arrumasse um lugar para mim, pois estava cansado de Brasília. Mais tarde, quando saí da agência, fui trabalhar numa empresa de assessoria que prestava serviços para a CBF. Fui convidado para ir à Copa da França, em 1998, e acabei me tornando exclusivo da Confederação, em que trabalhei com técnicos como Vanderlei Luxemburgo, Leão e Felipão. Também fui assessor de imprensa da Companhia Caminhos Aéreos do Pão de Açúcar.

Jornal da ABI – Como o senhor vê a atual formação dos estudantes de Jornalismo? Lemos – Eu acho que o curso de Comunicação não deveria ser obrigatório. Deveria ser apenas um curso de extensão, mas exigindo que o candidato a jornalista tenha formação superior na área de Ciências Sociais, de preferência em Letras. O maior repórter que já conheci na minha vida – e olha que o repórter é o principal para uma Redação funcionar, sem ele nada existe – chamou-se Oldemário Touguinhó, filho de Oldema e Mário. Embora cometesse erros de português, podia trabalhar com sucesso em qualquer editoria. Ele começou no jor30 Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

Jornal da ABI – O senhor diz que o repórter é que faz o jornal funcionar. Como acha que ele deve desempenhar seu papel? Lemos – O repórter deve ser sempre o agente provocador, deve jogar verde. Perante o entrevistado, tem que parecer burro, analfabeto. Se um sujeito diz "a bola é redonda", você deve perguntar por quê. Teoricamente, você não sabe e seu entrevistado é o especialista. Outro grande aliado do repórter é o telefone, instrumento essencial no trabalho de apuração e no contato com os colegas. Jornal da ABI – Qual foi a sua maior reportagem? Lemos – Foi aquela em que perdi o Prêmio Esso, sobre a Transamazônica. Ao longo da rodovia há três fusos-horários e eu começava a reportagem escrevendo: "São tantas horas, em tal lugar (...)". Em certo ponto da viagem, encontrei uma professora carioca, cujos pais haviam se mudado para lá durante a construção da estrada. Ela era a única pessoa que sabia ler e escrever na região, por isso lecionava. Foi uma grande matéria. Outra grande reportagem foi sobre estudantes americanos que formavam o Students for Democratic Society, em que entrevistei Martin Luther King num carro, a caminho do aeroporto. Lá, ele viu que perdera o avião por questão de minutos. A atendente então chamou o gerente da companhia que, quando viu a passagem e olhou para ele, disse: "He is a very important man." E mandou o avião, que já estava taxiando na pista, voltar para ele embarcar. Comecei minha matéria escrevendo "Ele é um homem muito importante (...)" e narrando o que tinha acontecido. Jornal da ABI – O senhor já recebeu um Prêmio Esso. Lemos – Ganhei o Prêmio Esso de Reportagem, juntamente com a equipe que chefiava, pela cobertura de uma das grandes enchentes do Rio de Janeiro, no tempo de Governo do Negrão de Lima. Jornal da ABI – Como o senhor vê o comportamento da mídia no momento atual? Lemos – A mídia está cumprindo o seu papel. Como a opinião pública se manifesta? Sobretudo através dos veículos de comunicação. O jornalista não tem que saber tudo, mas perceber antes o que está acontecendo. Os veículos de comunicação representam a opinião pública, apesar de não terem mandato ou procuração para isso; eles são as antenas que captam o que o povo está pensando. Podem cometer um certo exagero aqui ou ali, mas cumprem a sua função. Por isso precisamos ter vários veículos, com pensamentos diferentes, para expressar vários pontos de vista.

CONGRESSO

História da mídia em debate em São Paulo A participação da ABI no V Congresso Nacional de História da Mídia foi considerada, por seus organizadores, como uma grande contribuição aos propósitos do evento, criado para celebrar os 180 anos da imprensa paulista e encerrado no dia 2 de junho, em São Paulo. O Vice-presidente da ABI, Audálio Dantas, foi o principal orador da sessão especial presidida pelo Dr. Luiz Gonzaga Bertelli, do Centro de Integração Empresa Escola (CIEE). O Congresso foi uma iniciativa da Rede Alfredo de Carvalho para o Resgate da Memória da Imprensa e a Construção da História da Mídia no Brasil e reuniu cerca de 500 participantes para debate do tema central Mídia, indústria e sociedade: desafios historiográficos brasileiros. A conferência inaugural coube ao Professor Antonio Costella, membro da Academia Paulista de História, que falou sobre os 180 anos da imprensa no Estado de São Paulo, discorrendo sobre as mutações tecnológicas enfrentadas pela comunicação coletiva no Brasil, da tipografia à internet. A mesa diretora dos trabalhos foi presidida por José Marques de Melo, Presidente do Comitê Dirigente da Rede Alfredo de Carvalho, membro do Conselho Consultivo da Representação da ABI em São Paulo e titular da Cátedra

Unesco/MetodistadeComunicação.Ao seu lado estavam Francisco Karam (Cátedra de Jornalismo Fenaj/Universidade Federal de Santa Catarina), Ana Arruda Callado (Presidente do Conselho Estadual de Cultura do Estado do Rio de Janeiro), Esther Bertoletti (Coordenadora do Projeto Resgate do Ministério da Cultura) e Marialva Barbosa (Universidade Federal Fluminense). As atividades acadêmicas do evento (conferências e mesas-redondas) foram realizadas no Teatro CIEE e nas dependências da Faculdade de Comunicação Social Cásper Líbero (Facasper), onde se reuniram grupos de estudos e colóquios temáticos. José Marques de Melo aproveitou o encontro para relatar o trabalho realizado pela Rede Alcar, por meio dos Grupos de Estudos Temáticos e Núcleos Regionais de Pesquisa, responsáveis pela inclusão da História da Mídia na agenda das universidades, associações profissionais e entidades culturais de todo o País. Disse Marques de Melo que, as unidades de ensino, pesquisa e extensão cultural estão empenhadas na elaboração de uma enciclopédia sobre a Historiografia Midiática Brasileira, prevista para circular durante as comemorações do bicentenário da imprensa, em 2008.

CUMPRIMENTOS

Aplausos a Skaf pela reeleição A ABI cumprimentou o empresário Paulo Skaf (foto) por sua reeleição para a Presidência da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo–Fiesp e sua eleição para o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo– Ciesp, que voltou a ter direção unificada com a Fiesp. Diz a mensagem enviada pela ABI a Skaf no dia 3 de junho: “A Associação Brasileira de Imprensa congratula-se com Vossa Senhoria pela

RENATA CASTELO BRANCO

Jornal da ABI – Entre os dois trabalhos, o senhor foi professor, não foi? Lemos – Isso mesmo: dei aulas de Assessoria de Imprensa na Faculdade da Cidade. Eram aulas muito práticas com mais dois professores: debatíamos um assunto e depois dávamos 30 minutos para os alunos escreverem sobre o que havíamos conversado. Às vezes pedíamos para eles irem às ruas apurar e voltar à sala para escrever.

nalismo comigo, viajou o mundo inteiro e não havia problema que não pudesse resolver. Era compadre do Pelé, de quem costumava carregar fotos para distribuir em suas viagens.

consagradora reeleição para a Presidência da Fiesp, agora cumulada com a eleição para a Presidência do Centro das Indústrias (Ciesp). Uma constitui o reconhecimento do eficiente desempenho de sua gestão; a outra prova a imagem de respeito e a liderança com que Vossa Senhoria se afirmou perante o empresariado de São Paulo. Cordialmente (a) Maurício Azêdo, Presidente da ABI.”

MENSAGEM

Roberto Civita agradece por homenagem a VC Em mensagem endereçada à ABI o empresário Roberto Civita, Presidente da Editora Abril e jornalista, manifestou seu agradecimento pela matéria sobre o centenário de nascimento de Victor Civita, publicada na edição de fevereiro/março do Jornal da ABI. (a reportagemtambémsaiunositedaABI). Diz a mensagem: “É gratificante ver

a trajetória de VC, como carinhosamente o chamávamos, registrada no jornal da Associação Brasileira de Imprensa, patrimônio do jornalismo brasileiro, também às vésperas da comemoração do seu centenário, em abril de 2008. Com meus cumprimentos — e de todos os demais amigos da Abril — receba um grande abraço. (a) Roberto Civita.”


Direitos humanos

A VI OLÊNC IA NO RI O EM DE BATE POR MÁRCIA MARTINS

Movimento Rio Unido Contra a Violência traz ao Rio o Secretário Nacional de Justiça para discutir a crise da segurança na capital fluminense A ABI abriu as portas do Auditório Oscar Guanabarino, no 9º andar de sua sede, no Rio, para o debate Violência e direitos humanos, promovido pelo movimento Rio Unido Contra a Violência. Estiveram presentes à mesa o Secretário Nacional de Justiça, Antônio Carlos Biscaia; o Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil-RJ, Wadih Damous; o jornalista da TV Globo e Diretor Econômico-Financeiro da ABI Domingos Meirelles; e o Presidente da Casa, Maurício Azêdo, mediador do debate. A decisão de promover o debate partiu do jornalista e membro do Conselho Deliberativo da ABI Lênin Novaes, que teve um filho morto por uma bala perdida recentemente. Na abertura do evento, ele lamentou a ausência do “Detonauta” Tico Santa Cruz, que estava fazendo uma apresentação num presídio em Bangu, na Zona Oeste do Rio. O jornalista da TV Globo Caco Barcellos também comporia a mesa, mas foi escalado para uma reportagem de última hora. O Presidente da ABI, Maurício Azêdo, lembrou que nas décadas de 60, 70 e 80 os direitos e a integridade física dos militantes políticos e sociais eram desrespeitados pelo regime militar. Hoje, restabelecido o Estado de Direito, as agressões aos direitos humanos passaram a atingir as pessoas comuns: — A organização deste ato contribui para permitir que a sociedade faça algo não para acabar, mas sim diminuir a violência que atinge a sociedade — disse. O primeiro conferencista a falar foi o Secretário Nacional de Justiça, Antônio Carlos Biscaia, que lembrou o dia em que o guitarrista do Detonautas, Rodrigo

Netto, morreu. Ele contou que voltava de um debate em uma igreja na Zona Norte do Rio quando viu os bandidos perseguirem o carro do músico. O Secretário disse que ficou estarrecido com a ação dos bandidos, que não queriam somente assaltar, “até porque atiraram no veículo e fugiram sem roubar nada”: — Não se pode admitir os índices atuais da violência no País e, principalmente, no Rio. A falta de ocupação para os jovens é um fator que preocupa. Hoje, existem no Brasil 40 milhões de pessoas entre 16 e 24 anos. Desse total, 5 milhões estão desempregados e não estudam. Esta realidade faz com que o jovem se aproxime do crime. O êxodo rural e a ausência de direitos básicos de cidadania são outros fatores que geram a violência, disse Biscaia, que afirmou ainda que há locais no Rio onde ocontrolepertenceaosbandidos,comtotal ausência do Estado: — Até mesmo nos estabelecimentos prisionais há o domínio de criminosos — denunciou. A situação atual da violência no Rio de Janeiro é o resultado de 23 anos de uma política de segurança equivocada, disse o Secretário Nacional de Justiça que defen-

deu um sistema unificado de segurança pública no País, com formação, inteligência e fiscalização das policiais. E concluiu afirmandoqueasociedadetemmesmoque se mobilizar: — Temos que defender a democracia e o objetivo tem que ser a dignidade dos seres humanos. O Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio-RJ, Wadih Damous, leu um documento em que criticava o que chamou de endurecimento das leis penais por causa de crimes brutais que acontecem no dia-a-dia. Wadih Damous fez referência ao caso do menino João Hélio Vieites, que morreu após ser arrastado por bandidos, do lado de fora do carro, preso ao cinto de segurança: — Se seguirmos nesta direção, estaremos indo por um caminho vingativo, que remete a uma suposta eficácia do poder penal. Leis feitas desta maneira são casuísticas. Ressaltou Wadih Damous algumas medidas que podem levar a diminuição da violência no estado: — Um plano de redução de homicídios, com o fortalecimento das delegacias, medidas para a redução de letalidade durante as ocorrências policiais, estabelecendo gratificações

Domingos Meirelles, diretor da ABI e apresentador do Linha Direta, na TV Globo, disse que a segurança pública no país está hoje relegada a um segundo plano.

onde acontecerem prisões e apreensões e a criação de um programa para a retirada das ruas de policiais que participem de confrontos são algumas propostas que devem ser pensadas pelo governo. Damous concluiu seu depoimento afirmando que, apesar do momento grave pelo qual a população do Rio está passando, é preciso buscar uma forma democrática para resolver este problema, da qual “o Governo não pode se omitir”. Em falta O jornalista Domingos Meirelles, que apresenta o programa Linha direta na TV Globo, acredita que a segurança pública do País é posta em segundo lugar: — Alguns policiais ainda saem às ruas para “fazer um ganho”, ao invés de cuidar da população. E muitos crimes deixam de ser investigados devido à falta de uma polícia técnica, como vi durante várias reportagens. Domingos relembrou o ex-Chefe de Polícia Civil do Rio Hélio Luz, que falou à imprensa que não se investigava crime no Rio quando os envolvidos tinham salários inferiores a dez salários mínimos: — Nós temos um tipo de polícia e investigação que interessa somente às classes dominantes — ressaltou. O jornalista concluiu lembrando a força que as mães da Praça de Maio, em Buenos Aires, tiveram ao fazer vigília exigindo notíciais de seus filhos desaparecidos durante a ditadura militar: elas conseguiram mudar leis para punir os torturadores da época da repressão na Argentina. — Assim como as mães da Praça de Maio, só vamos conseguir reverter este quadro de violência com a pressão da sociedade. Após a explanação dos debatedores, o público presente pôde fazer perguntas. Maurício Azêdo finalizou o evento ressaltando a importância de as duas entidades, ABI e OAB, participarem de um debate sobre violência, com a participação de destacada autoridade federal, o Secretário Nacional de Justiça. Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

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Direitos humanos

Tributo a Modesto, 80 anos Com freqüência apontada como dividida por questões de princípio e concepções táticas, a esquerda uniu-se no dia 31 de maio para homenagear o advogado Antônio Modesto da Silveira, que foi nos anos 60, 70 e 80, até à redemocratização, um dos mais destacados defensores de presos e processados políticos, ao lado de seus colegas Alcyone Barreto, Evaristo de Morais Filho, George Tavares, Humberto Jansen Machado, Marcelo Cerqueira e Osvaldo Sussekind de Mendonça, entre outros. O motivo da unidade incomum: a comemoração dos 80 anos de Modesto, realizada na Ordem dos Advogados do Brasil-Seção do Estado do Rio de Janeiro. A diversidade política, ideológica, cultural e profissional dos presentes ao ato fezse notar já na constituição da mesa da solenidade, presidida pelo Vice-Presidente da OAB-RJ, Lauro Schuch, e integrada pelo Presidente do Partido Popular Socialista-PPS, Roberto Freire; pelo ex-Governador e exPresidente da OAB-RJ, Nilo Batista; Juiz João Batista Damasceno, Presidente da Associação dos Juízes Democráticos; advogado e ex-Deputado Marcelo Cerqueira, Procurador-Geral da Assembléia Legislativa do Estado; Benedito Calheiros Bonfim, decano dos advogados trabalhistas do Estado do Rio, e Carlos Henrique de Carvalho, diretor de departamento da OAB. Entre os presentes, muitos dos quais não

Prêmio Herzog: inscrições até 25 de agosto

O Vice-Presidente da OAB-RJ, Lauro Schuch, entrega placa ao homenageado, Modesto da Silveira

assinaram as folhas de presença em razão da longa fila formada com esse fim, encontravam-se os advogados Herman Baeta, exPresidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; Técio Lins e Silva, ex-Secretário de Estado de Justiça e representante da OAB-RJ no Conselho Federal da OAB; Ivan Alkimin, ex-Presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas; Eni Moreira, também defensora de presos políticos na época da ditadura; Flora Strozemberg; Humberto Jansen Machado; Ivan Pinheiro, ex-Presidente do Sindicato dos Bancários do Município do Rio de Janeiro e Presidente do Diretório Estadual/ RJ do Partido Comunista Brasileiro-PCB; José Luiz Milhazes, membro do Conselho da OAB-RJ; Débora Salvador, Assessora da Câmara Municipal do Rio de Janeiro; Givaldo Siqueira, ex-membro do Comitê Central do PCB. Além destes compareceram os médicos Irum Sant'Anna, antigo dirigente do PCB, Ana Burstyn e João Américo Alvim; os engenheiros Heitor Manoel Pereira, Presidente, e Fernando Siqueira, ex-Presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás-

Uma demora perversa POR CRISTINO C OSTA

É de justa revolta o sentimento que reina entre o pessoal contemplado com a reparação simbólica de que trata a Lei estadual nº 3.744, de 21 de dezembro de 2001. Decorrido tempo mais que suficiente para o pagamento dos procedimentos deferidos, poucos foram os que tiveram seus pleitos honrados. Nos governos dos Garotinhos, assim como no de Dona Benedita da Silva, não faltaram recursos financeiros para bancar projetos clientelistas e eleitoreiros. No entanto, faltaram para honrar o pagamento dos anistiados. Apenas uma parte ínfima teve acesso aos numerários reclamados, mesmo assim por força de pressões com manifestações inflamadas e materiais contundentes veiculados por mídia institucional. O pagamento desses procedimentos é uma determinação legal, e não uma dádiva dos governos que se instalam. Aliás, deve-se cobrar também dos Deputados Chico Alencar (Psol), Edmilson Valentim (PCdoB) e Carlos Minc (PT), autores da lei, os dois primeiros eleitos deputados federais para a atual Legislatura e outro elevado ao Secretariado estadual. Em trecho da matéria intitulada Os Perseguidos Apelam ao Governo, do Jornal 32 Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

da ABI, nº 315, página 26, de dezembro de 2006, aqui reproduzida, há um implícito compromisso de pagamento firmado a partir do quarto mês da nova administração. Rememoremos: “Em petição que dirigiram em 13 de dezembro ao Governador eleito Sérgio Cabral, instituições de defesa dos direitos humanos e das liberdades civis do Estado do Rio pediram que ele apresente nos quatro primeiros meses de sua gestão um cronograma de pagamento das indenizações de reparação moral instituída pela Lei nº 3.744, de 21 de dezembro de 2001, em favor das vítimas de prisão e torturas em dependências do Estado entre a data do golpe militar de 1964 e a anistia de 1979. Desde a regulamentação da Lei, em 10 de outubro de 2002, foram pagas apenas 140 (12%) das indenizações aprovadas. No documento, o Fórum de Reparação do Estado do Rio de Janeiro, constituído por essas entidades, lembra que um representante do Governador eleito firmou em 13 de setembro, durante a campanha eleitoral, em ato realizado na ABI, o compromisso de cumprir integralmente a Lei nº 3.744/2001, a qual só foi totalmente respeitada até agora numa disposição restritiva: a que limitava a 180 dias após a sua regulamentação o prazo de apre-

Aepet, e Raimundo de Oliveira, ex-Presidente do Clube de Engenharia; os Vereadores Aspásia Camargo (PV), Eliomar Coelho (Psol), Pedro Porfírio (PDT) e Stepan Nercessian (PPS); o ex-Vereador Ricardo Maranhão (PSB); a Professora Zuleide Faria de Melo, Presidente Nacional do PCB; a socióloga Vera Malaguti; Rosa Maria Cardoso da Cunha; José de Arimatéia Coradello de Lima; Carlos Augusto Coimbra de Melo; Fernando Fernandes; Fernando Fernandes Filho; Fernando Isak Zecklo; Raquel Niskier; Jarbas Silva Marques; Rubin Aquino; Olga Amélia Teles; Regina Von Der Weit; Wilmar Torres; economista Paulo Passarinho, apresentador do programa Faixa Livre, na Rede Bandeirantes; Carlos Henrique Tibiriçá Miranda; Manoel Sérgio Valim, Diretor do Instituto Alberto Pasqualini/PDT. Também levaram seu abraço a Modésto sócios e dirigentes da ABI que com ele lutaram ou foram por ele defendidas durante a ditadura militar, como Altenir Santos Rodrigues, Antônio Carlos de Carvalho, Henrique João Cordeiro Filho, entre outros.

sentação de requerimentos de postulação da reparação moral. O apelo dirigido ao Governador, que contém cinco reivindicações, tem o seguinte teor: “Exmo. Senhor Governador eleito pelo Estado do RJ Sérgio Cabral, Em 13 de setembro último realizamos, com o apoio da ABI-Associação Brasileira de Imprensa e do GTNM RJ-Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, o ‘Dia do Compromisso com os Direitos Humanos’ na própria ABI. Nós – do Fórum de Reparação do Estado do Rio de Janeiro, movimento que reúne atingidos pela tortura e violência praticadas por agentes do Estado durante a ditadura militar – e mais algumas dezenas de entidades e movimentos sociais. Na ocasião compareceram candidatos à Alerj, à Câmara e ao Senado, que ouviram, leram e assinaram várias pautas de reivindicações. O Sr. candidato ao Governo do Estado Sérgio Cabral enviou representante, que assinou nossa pauta de reivindicações demonstrando, desta forma, que se preocupa com as questões ali explicitadas. Neste dia 13 de dezembro – data que, há 38 anos, marcou gravemente o nosso País com a assinatura do Ato Institucional nº 5 – estamos lembrando ao futuro Governador Sérgio Cabral de seu compromisso, firmado por seus representantes no dia 13 de setembro, de zelar pelo cumprimento da Lei nº 3.744/01 e decreto, que dispõem sobre as reparações simbólicas às

Para marcar o Dia da Imprensa, em 1 de junho, foram abertas as inscrições para a 29ª edição do Prêmio Jornalístico Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos e para o III Prêmio Vladimir Herzog de Novos Talentos do Jornalismo, voltado para estudantes. O Prêmio, instituído quatro anos depois do assassinato de Vlado por agentes da ditadura militar, é o principal do jornalismo brasileiro voltado para o tema direitos humanos. Neste ano, a premiação acontece em meio às comemorações dos 70 anos de fundação do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo e também de nascimento de Herzog, em 27 de junho de 1937. Os trabalhos de profissionais podem ser inscritos até 25 de agosto, à exceção daqueles pertencentes à categoria Livroreportagem, cujo prazo termina em 20 de julho. No caso do Prêmio de Novos Talentos, as inscrições vão até 20 de setembro e podem concorrer estudantes de Jornalismo das faculdades do Estado de São Paulo que tenham veiculado matérias sobre direitos humanos em jornais-laboratório entre setembro de 2006 e setembro de 2007. Para conhecer os regulamentos e as categorias de inscrição, acesse www. jornalistasp.org.br. Os prêmios são uma realização do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, em parceria com a ABI, a Fenaj, a Comissão de Direitos Humanos da OAB/ SP, a Arquidiocese de São Paulo e a família Herzog.

pessoas que tenham seus processos deferidos pela Comissão Especial de Reparação do Rio de Janeiro. Vários Estados brasileiros incorporaram leis que garantiram aos ex-presos políticos e seus familiares tão-somente reparações pecuniárias reduzindo a questão da reparação. Não houve em nosso País a plena abertura dos arquivos da ditadura, condição necessária ao processo de resgate da memória histórica, sequer a criação de uma Comissão da Verdade – a despeito do envolvimento de centenas de agentes que agiram em nome do Estado brasileiro e que foram denunciados como torturantes. Ainda não se efetivou, apesar das reivindicações dos movimentos de direitos humanos, o processo de esclarecimento das circunstâncias das mortes e desaparecimentos e a punição dos responsáveis, a exemplo do que acontece com os nossos vizinhos latino-americanos: a Argentina, o Chile, o Uruguai e o Paraguai.” O que não se aceita é que titulares desses pleitos depois de incomensuráveis sofrimentos morram sem usufruírem daquilo que de direito lhes pertença. O atual Governador, segundo seu próprio discurso, vem de vertente ideológica perseguida pelo autoritarismo; portanto, tem que mostrar sensibilidade ante o problema. Cumpra a palavra empenhada, Governador, porque essa demora é uma perversidade! Cristino Costa, sócio da ABI, é jornalista e advogado.


Vidas Sob o seu comando, a Folha de S.Paulo inovou na tecnologia de produção de veículos impressos, abriu espaço para a pluralidade de vozes, conquistou a liderança em circulação e se tornou um dos jornais mais respeitados do País.

Frias, em 1972, dez anos depois de ter comprado o jornal Folha de S.Paulo.

Sem ser jornalista, mas com grande sensibilidade em relação às notícias e com aguda percepção da influência que um veículo com forte capacidade de buscá-las e difundilas pode alcançar na vida social, ele transformou o jornal que adquiriu sem grandes entusiasmos um dos mais importantes e o de maior circulação no País. Era assim Octávio Frias de Oliveira, que morreu no dia 29 de abril, aos 94 anos, e foi sepultado no dia seguinte após uma vigília em que se pôde ver o prestígio que o jornal lhe deu: lado a lado, Presidente e ex-Presidente da República lhe prestaram homenagem e reverência. Frias não conseguiu recuperar-se de um quadro de insuficiência renal grave, que o deixou inconsciente dois dias antes de sua morte. Depois de atuar no serviço público e nos ramos financeiro e imobiliário, Frias adquiriu a Folha de S.Paulo em 1962, em sociedade com Carlos Caldeira Filho. Em algumas décadas, saneou as contas da empresa e a reorganizou em termos industriais, levando o jornal a se tornar o maior e um dos mais influentes do País. À frente do grupo, formou a base para a criação de um conglomerado que hoje abrange o portal UOL, o jornal Agora, o Instituto Datafolha, a editora Publifolha, a gráfica Plural e o diário Valor Econômico, este em parceria com as Organizações Globo. Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

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De personalidade inquieta e dinâmide Maria Helena, hoje médica. Meses deca, Frias continuava a receber visitantes, pois, foram morar juntos — os dois forsupervisionar as empresas e emendar pesmalizariam o casamento em 1965, quando soalmente os editoriais até ser hospitaela ficou viúva — e tiveram os filhos Otálizado em novembro de 2006, depois de vio, Diretor de Redação da Folha desde ser operado para remoção de um hema1984, Maria Cristina, jornalista especitoma craniano, provocado por uma quealizada em Economia, e Luís Frias, que se da doméstica. Em agosto do ano passado tornou o principal executivo do Grupo foi lançada sua biografia, A trajetória de Folha em 1990. Octávio Frias de Oliveira, de autoria de Em 13 de agosto de 1962, Frias e CarEngel Paschoal. O livro traz 332 páginas los Caldeira Filho deram o primeiro redigidas com base em depoimentos do cheque ao antigo proprietário da Folha, próprio biografado e de pessoas que tesJosé Nabantino Ramos, e compraram o temunharam sua carreira. jornal. Eles renegociaram dívidas e adoA atuação de Frias na imprensa foi taram uma série de medidas para estamarcada pela independência em relação bilizar a empresa. Compraram jornais a governos e grupos econômicos, assim como Última Hora e Notícias Populares, como pela pluralidade das visões que abripara baratear a distribuição e ocupar nigou em seus veículos de informação. chos em que a Folha não atuava, e invesUma nota publicada na Folha no dia de tiram em novos equipamentos — em 1º seu passamento diz que ele foi “protade janeiro de 1968, o jornal começaria gonista da modernização da mídia braa ser rodado em offset. sileira na segunda metade do século XX Na década de 1970, Frias comandou e pertenceu a uma geração de empreeno processo que levou a Folha a assumir dedores pioneiros dos quais era um dos um papel de destaque na abertura políúltimos remanescentes”. tica. Com a Direção de Redação nas mãos Octavio Frias de Oliveira preferia a do jornalista Claudio Abramo, em 1975 designação de empresário à de jornaliso jornal começou a se destacar pela pluta. No comando do Grupo Folha, fez a ralidade de vozes e por um posicionaempresa se estabilizar economicamenmento político que incomodou os mite — tornando-se uma das peças mais imlitares. Criou em 1976 uma seção de arportantes na circulação de opiniões no tigos na página 3 que abriu espaço para final do regime militar, quando o País se opiniões divergentes, abrigando tamredemocratizava — e se expandir. bém textos de intelectuais e políticos que Em 1926, Frias começou a trabalhar faziam oposição ao regime. como office-boy na Companhia de Gás, Em 1986, a Folha alcançou a liderança onde ficou até o em circulação no início dos anos 30. mercado de jornais, Extremamente háposição que manA atuação de Frias na bil no uso de máquitém até hoje. Aos nas de calcular, foi poucos, a Direção da imprensa foi marcada trabalhar na Recebeempresa foi sendo doria de Rendas, pela independência em assumida pelos fiórgão da Secretaria lhos. Otávio, desde relação a governos e da Fazenda. Fez car1984, é o Diretor de reira no setor públiRedação do jornal, grupos econômicos, co até 1946, quando, em que comandou, em sociedade com assim como pela enfrentando no iníOctavio Orozimbo cio fortes resistêncipluralidade das visões Roxo Loureiro, funas de diferentes sedou o BNI (inicialtores, a implemenque abrigou em seus mente, Banco Natação do chamado cional Imobiliário veículos de informação. Projeto Folha, que e, depois, Banco Nadefende a realização cional Interameride um jornalismo cano), projeto que se concretizou em crítico, apartidário e pluralista. Em 1990, 1948. O BNI comandou empreendimenLuís, que já ocupara vários postos da adtos imobiliários importantes, como o ministração da empresa, tornou-se o edifício Copan, um dos cartões-postais principal executivo do grupo e, em 1996, de São Paulo, cujo projeto é assinado por comandou a criação do Uol. Oscar Niemeyer. Octávio Frias de Oliveira deixa viúApós perder a sua primeira mulher, va, Dagmar Frias de Oliveira, e quatro Zuleika Lara de Oliveira, num acidente filhos, Maria Helena, Otávio, Luís e Made carro em 1955 — mesmo ano em que ria Cristina. Estiveram presentes ao velesionou a coluna e ficou engessado por lório o Presidente da República, Luiz Ináseis meses —, Frias afastou-se da direção cio Lula da Silva, o ex-Presidente Fernando BNI e recomeçou na Transaco, empredo Henrique Cardoso, o Governador de sa que fundara anos antes para negociar São Paulo, José Serra, o Prefeito da capiações e que ficara sob o comando de um tal paulista, Gilberto Kassab, além de misobrinho. Com Octávio Frias, a Transanistros de Estado, deputados estaduais co, que também vendia assinaturas da Foe federais, representantes do Judiciário, lha, prosperou — o número de novas asempresários de todos os setores da ecosinaturas permanentes por mês pulou de nomia, líderes das áreas de educação, saú150 para 6.000. Na Transaco, Frias conhede e cultura e dirigentes dos principais ceu Dagmar de Arruda Camargo, já mãe órgãos de comunicação. 34 Jornal da AB ABII 319 Maio/Junho de 2007

O repórter que não se achava jornalista POR C LÓVIS R OSSI

Ele se autodefinia empresário ou comerciante, mas era um tremendo repórter

Clóvis Rossi é colunista da Folha e sócio da ABI. Este texto foi publicado na Folha de S. Paulo no dia do sepultamento de Frias.

Octávio Frias de Oliveira foi o empresário mais jornalista que jamais conheci, mais jornalista de verdade que muito jornalista diplomado. Era como empresário ou, às vezes, como comerciante que se autodefinia, sempre que as personalidades que visitavam a Folha — e não foram poucas, de todas as cores e de todos os calibres — o chamavam de “doutor” ou o tratavam de jornalista. “Não sou doutor, não sou jornalista”, reagia, no jeito direto e franco de ser. Mas era, sim, jornalista, um tremendo repórter, como fui descobrindo rapidamente nos exatos 20 anos de convivência praticamente diária e próxima, a partir do instante em que ele e seu filho, Otávio, Diretor de Redação, me convidaram para escrever a chamada “coluna São Paulo”, da página 2 da Folha, pouco depois da morte de Cláudio Abramo, em 1987. Antes, conheci uma outra faceta que me conquistou de imediato. Comecei na Folha em 1980, no exato momento em que a extrema-direita cometia atentados a bomba contra bancas de jornal, escritórios de oposicionistas e até a Ordem dos Advogados do Brasil, no Rio de Janeiro. Escrevi, apenas semanas depois de contratado, um texto em que dizia que, se se quisesse chegar aos autores, bastava bater às portas do Doi-Codi, o coração do sistema repressivo montado no regime militar (no ano seguinte, o atentado frustrado ao Riocentro provou que a informação era corretíssima). Na noite em que o texto foi publicado, “seu” Frias telefonou para minha casa, me oferecendo refúgio em sua granja de São José dos Campos. Contou que a reportagem provocara muito ruído e que talvez fosse prudente asilar-me por uns dias. Preferi ficar em casa, mas me surpreendeu um patrão, tido como duro e inflexível, darse ao trabalho de tentar proteger um funcionário que ele nem sequer conhecia pessoalmente e que havia acabado de começar na empresa que ele comandava. Proteção que continuou ao longo do tempo. Sei, por terceiras pessoas, jamais por ele, que houve várias queixas a meu respeito por parte de autoridades (algumas até amigos pessoais dele). Jamais me transmitiu uma só que fosse. Durante a ditadura Pinochet, por exemplo, sei que funcionários diplomáticos chilenos mais de uma vez estiveram na Folha para reclamar. A única vez em que ele se manifestou sobre os constantes textos que fazia sobre o Chile foi para dizer que estivera no país e não vira exatamente o que eu estava relatando. Mas, acrescentou, “você é livre para escrever o que viu


Frias não se considerava um jornalista mas foi autor de vários “furos”. Foi ele que descobriu que a doença de Tancredo Neves era um tumor e não diverticulite, como foi anunciado oficialmente.

E continuei escrevendo o que estava vendo. as pessoas que pudessem ter alguma informação. O horário Muitos anos depois, Fernando Henrique Cardoso, já de fechamento da edição nacional já havia passado, toex-Presidente, contou que desistira de reclamar do jordos os demais ocupantes do nono andar já haviam ido emnal para o seu “publisher”, embora fosse muito amigo bora, e eu não tinha nada. Até que “seu” Frias saiu de sua dele: “Com o Frias, não adianta reclamar”. sala, com aquela sanha de repórter de filme de antigamente, Já o repórter Frias revelou-se, inicom a confirmação: “O Gustavo já cialmente, num “furo” célebre, o está até limpando as gavetas. Você de descobrir que o mal que levara pode fazer o texto?”. O gosto pela informação o Presidente Tancredo Neves ao Fiz. Mas confesso que, como o combinava com o zelo hospital, na véspera da posse, era um pessoal que cobria a internação de leiomioma (um tumor, portanto) pelo texto dos editoriais, Tancredo Neves, tinha um certo e não uma diverculite, como foi medo de que a informação fosse anunciado oficialmente. exagerada, prematura. Tanto que que corrigia, com Alguns dos repórteres da própria a principal decorrência da queda de os editorialistas, Folha que acompanhavam o caso Gustavo Franco — o fim do câmem Brasília acharam que era imprubio fixo — foi tratada em apenas linha por linha, dência o jornal sair com a manchete uma linha da notícia, sem o aproanunciando o leiomioma. Era fundamento. vírgula por vírgula. “furo”, não era imprudência. Outro episódio envolvendo o Em outro momento, o repórter Banco Central ocorreu no GoverFrias passou pela minha salinha no nono andar do préno Sarney. Eu tinha a informação de que o Brasil transdio da Folha e comentou: “Fulano me disse que um diretor ferira suas reservas para um lugar seguro. Era a evidêndo Banco Central está caindo. Vamos apurar”. cia óbvia de que o País entraria em moratória, e por isso Não vou contar quem era o “fulano” porque é, ainprecisava pôr as reservas longe do alcance de eventuda hoje, figurão importante na República. Como era ais tentativas de confisco. raro que “seu” Frias me contasse a fonte de uma inforEstava escrevendo o texto quando “seu” Frias me mação sigilosa ou de bastidor que recebia — e recebiachamou a um almoço no nono andar (que ainda não era as por quilo —, imediatamente comentei com ele: “Não meu habitat) para expor o que eu sabia aos economistas é um diretor, é o Presidente do BC que vai cair ” (o da casa, muitos deles então membros do Conselho Presidente era Gustavo Franco, aquele que torrou Editorial. Expus. Houve uma chuva de dúvidas e resisbilhões de dólares das reservas brasileiras para defentências, menos aos fatos expostos e mais à lógica da der um valor irreal para o real ante o dólar). moratória. Eu não estava interessado na lógica da Passei a tarde e parte da noite telefonando para todas moratória, mas nos fatos.

Logo descobri que “seu” Frias também queria fatos. Desci para continuar escrevendo, já meio desanimado, imaginando que o texto não sairia. Nem meia hora depois, ele me ligou: “Conferi com fulano a tua informação. Pode ir em frente”. (Desta vez, não me disse quem era o “fulano”.) Depois, de tanto em tanto, ligava de novo, para passar novas informações. Tantas informações que o texto ficou enorme, contrariando aliás o gosto dele por textos mais curtos. O gosto pela informação combinava com o zelo pelo texto dos editoriais, que corrigia, com os editorialistas, linha por linha, vírgula por vírgula. Sempre que embatucava com alguma frase que achava pouco clara, usava um bordão: “Será que sua excelência vai entender?”. (“Sua excelência” era a maneira de referir-se ao leitor.) Já as outras “excelências” — os Presidentes da República —, conheceu-as todas, de Getúlio Vargas em diante. Sem, no entanto, achar-se ele próprio “doutor” ou “personalidade”. Seu jeito de ser era tão despojado que permitiu uma cena muito engraçada quando Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à Presidência em 1989, almoçou na Folha. Terminado o almoço, longo, com direito à incomum repetição do cafezinho, estávamos todos começando a levantar das cadeiras quando Lula passou o braço em torno dos ombros de “seu” Frias e disse: “Frias, você ainda vai se orgulhar desse petezinho”, como se estivesse abraçando um entusiasmado militante-fundador do PT. Não sei quem fará mais falta agora, se o repórter Frias ou se o “publisher” capaz de deixar à vontade os Presidentes e também ficar à vontade com eles, sem, no entanto, transmitir suas queixas aos jornalistas.

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