JORNAL EXPERIMENTAL DO CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA UNISC - SANTA CRUZ DO SUL VOLUME 19 nº 3 AGO/SET 2013 - EDIÇÃO ESPECIAL
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EDITORIAL
CONTO
No cenário da paixão
OPINIÃO
Não há pessoas sonhadoras desprovidas de paixão. Até mesmo o coração mais frio emociona-se com o calor deste sentimento. A construção da cena da paixão começa a partir de encontros – seja entre amigos durante uma feira, entre um casal no meio da praça ou entre leitor e autor. Ninguém sabe explicar o conceito de paixão. Muitos acreditam entendê-lo quando um beijo acontece depois de uma briga sem razão. Outros afirmam senti-lo ao escutar o choro da criança recém-nascida. Já alguns admitem acreditá-lo se uma pessoa apresentar provas concretas de amor. No Unicom e nos 10 dias da 26ª Feira do Livro de Santa Cruz do Sul, o conceito de paixão é abordado e entendido por meio de algo tradicional, mas pouco valorizado: o livro. Amores estabelecidos por preferências literárias. Culturas guardadas no coração, com boa dose de sentimento. O processo de construção de um livro, motivado pelo desejo de publicar. Jornalismo construído em cima de uma estrutura diferente, na qual a criatividade, o conhecimento e o dom de desenhar tornam-se instrumentos básicos de trabalho. A brincadeira de criança que desencadeia paixões. E, também, paixões que se transformam em amor e geram forças para seguir em frente. Enquanto os pássaros voam acima das árvores que envolvem a praça, a água do chafariz escorre intensamente e várias pessoas tornam-se leitoras, em frente à catedral. Paixões surgem. Nesse espetáculo literário, encontram-se visitantes de diferentes cidades, gostos, propósitos e idades: a avó, que procura um livro para seu neto, e o namorado, que aproveita o evento para comprar o presente de aniversário da amada. Esse evento se apoia na vontade de compartilhar conhecimento e fazer com que os diferentes visitantes se apaixonem pelo mundo literário. Nesta edição do Unicom, também aproveita-se o tema da Feira – Ler apaixona – para a produção de matérias em torno deste sentimento. A publicação aborda a popularidade dos sebos de livros e dá dicas de diferentes culturas. Relembra patronos de outras edições e apresenta o de 2013, Affonso Romano de Sant’Anna, assim como o homenageado, Mauro Klafke. O Núcleo de Jornalismo da Agência A4 está na praça Getúlio Vargas, durante os dias da Feira. O conteúdo pode ser acompanhado pelo site <hipermidia.unisc. br/26feiradolivro>. Boa leitura!
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Feito de papel
ANDRESSA BANDEIRA*
Foi o primeiro presente que Sebastião recebeu. Não era muito grande, nem muito pesado. Era bem simples e costumava passar despercebido por ele. Até ganhá-lo. Fazia frio e uma amiga lhe dissera que seria uma boa ideia ter um destes para as noites de inverno, para fazer companhia. Ele se lembra de ter duvidado, mas, mesmo assim, aceitado o presente; jogado-o em cima da mesinha de centro e se deitado no sofá. Começara a ficar frio e tedioso no apartamento. A solidão parecia querer acompanhar Sebastião naquela noite. Então, olhou para o presente da amiga. Qual era o problema, afinal? Pegou-o. Abriu. Analisou. Parecia valer a pena perder seu tempo nisso.
Depois de anos de resistência, de julgar inadequado, fora de moda, Sebastião finalmente se rendia. Achara que ele tinha o pegado, escolhida companhia. Mas, na verdade, Sebastião que foi pego. Escolhido. Engolido. E não tinha volta. Agora, ele era o centro de suas atenções. Da sua noite. Da sua vida. Sebastião estava, totalmente, loucamente e literalmente apaixonado. Ah, pobre Sebastião, caído de amores por essa coisinha feita de papel. Pobre Sebastião, apaixonado por algo que é impossível deixar de amar. Apaixonado por livros. *Estudante de Jornalismo, Unisc
CRÔNICA
A caminho da liberdade
Poucas coisas são livres. Pouquíssimas. Uma delas é o hábito da leitura. Uma jovem de 60 anos pode não ter o prazer de pedalar em um dia ensolarado, mas pode se sentir satisfeita lendo as gozadas loucuras de Christian Grey. Um homem de negócios pode usar um terninho risca de giz o dia inteiro. Pode ter que comandar uma empresa o dia inteiro. E pode deitar-se em seu colchão, tirar da cabeceira a poesia do Leminski e lê-la a noite inteira. Um esposo pode não ter tempo para amar. Pode ter uma esposa ocupada e um cargo pesado. Pode não ter uma amante, mas pode ter a Clarice Lispector ao lado da cama. Uma menina levada pode preferir o cutuque da varinha do Harry Potter a cutucadas em redes sociais. Pode preferir uma Cerveja Amanteigada a refrigerantes calóricos. Pode querer a invisibilidade e encontrá-la em um livro aberto.
BRUNO MEDEIROS *
Um soldado pode ter um dia amargo no campo e uma noite doce com Nicholas Sparks. Um menino magricela pode se sentir afeiçoado pela Bella Swan. Pode encontrar o amor da sua vida em uma página amarelada com várias palavras negras. E pode, repentinamente, escrever poemas para expressar sua paixão ficcional. Um adolescente intrigado pode tomar café com as crônicas do Juremir Machado e, à noite, deitar-se com a bela Fernanda Young. Pode, à tarde, tomar chá e ler Bukowski, intercalando a leitura com a visita da Cecília Meireles. Ler apaixona porque não precisa de pré-requisitos. A imaginação cria o que o cotidiano impede. Lendo, tudo se pode; e quem lê, pode tudo. *Estudante de Engenharia de Software, campus Unipampa – Alegrete/RS Criador do site www.importunobruno.com.br
CONTO
Eu apaixono
MARTINA WRASSE SCHERER*
Oi, meu nome é Livro. É, isso mesmo: Livro. Provavelmente, você já me conhece – a mim ou a um de meus irmãos. Estou em sua gaveta, na sua estante. Ali, no sebo, na biblioteca, na livraria. Estou aqui, nestas bancas, aqui na praça. Na mão da criança que, encantada com as cores, pede à mãe o seu primeiro “Eu”. Na mão do senhor que tenta adivinhar o tipo de “Eu” que a filha vai gostar. Ou, então, da namorada, que pensa que serei um bom presente para sua amada. Mas, também estou em alguns lugares que não gostaria. Estou no lixo, esquecido debaixo da cama. Na rua, esfolado, machucado, arrebentado. E, enquanto isso, milhares de pessoas não me tiveram em suas mãos. Ainda. Que tal fazer de mim um instrumento de alfabetização? E mais: de alegria? Não
falam tanto que o Brasil é um país com baixa escolaridade, com pouca educação e com grande número de analfabetos? Então? Várias iniciativas bem bacanas já nasceram. Estão até me distribuindo junto com sacos de arroz e feijão. Junto com tudo aquilo que é fundamental à vida. E eu fico bem faceiro. Pelo menos, assim, estou sendo valorizado. E você? O que está esperando? Leia-me para uma criança, para um adulto, para um vovô. Leve-me para a casa de alguém que não pode me comprar ou, ainda, para pontos de distribuição onde serei bem aproveitado. Ah, e pode ter certeza, viu?! Eu apaixono. Eu sou apaixonante! *Estudante de Jornalismo, Unisc
EXPEDIENTE UNISC– Universidade de Santa Cruz do Sul Av. Independência, 2293 Bairro Universitário Santa Cruz do Sul – RS CEP 96815-900
Editor-chefe: Hélio Etges
Curso de Comunicação Social Jornalismo: Bloco 15 Sala 1506 Telefone: 51 3717-7383
Infográfico: Frederico Silva e Jackson Winck
Coordenador do curso: Demétrio de Azeredo Soster
Edição e Revisão: Cristiane Lautert
Subeditora: Luiza Adorna Arte da Capa: Frederico Silva Arte da Contracapa: Rudinei Kopp
Diagramação: Daiana Carpes
Editora de Fotografia: Andressa Bandeira Reportagem: Andressa Bandeira Angelita Borges Caroline Fagundes Eduarda Pavanatto Frederico Silva Ingrid Jank João Pedro Kist
Júlia Beling Luiza Adorna Martina Scherer Maurício Beskow Mônica da Cruz Paula Turcatto Stephanie Severo Thiene Hermes Viviane Fetzer
Este Jornal foi produzido pelos monitores da A4 Agência Experimental de Comunicação Núcleo de Jornalismo, sob a supervisão do professor Hélio Etges. Impressão: Grafocem Tiragem: 1.000 exemplares
LUIZA ADORNA
Conquistados à primeira leitura
Inspirados no tema da Feira, leitores falam da sua relação com a literatura
EDUARDA PAVANATTO LUIZA ADORNA REPORTAGEM
De todos os tempos
Rafael e a esposa Tuize: amor movido por preferências culturais
trocados entre o jornalista e a esposa são livros. “É prazeroso. Não é aquela história de ah, eu não sei o que te dar, vou te dar um livro”. Rafael Hoff e a leitora apaixonada de O tempo e o vento, Renata Guterrez, são exemplos de pessoas que já se apaixonaram por algo ou alguém devido ao gosto pela literatura. A estudante deixa um recado para aqueles que ainda não descobriram sua paixão pelos livros: “Quem não tem o hábito de ler perde uma boa parte da vida. Perde a oportunidade de descobrir um novo mundo”. Identidade visual Durante as 26 edições da Feira do Livro de Santa Cruz do Sul, vários slogans foram usados para nomear o evento. Neste ano, a Comissão Organizadora do Serviço Social do Comércio (Sesc) definiu o tema Ler apaixona. De acordo com Roberta Pereira, gerente do Sesc, o objetivo é incentivar os jovens à leitura. A repetição do verbo “ler”, nos slogans, foi usado para “criar identificação, relembrar tudo o que significa a leitura para o aprendizado, para a qualidade de vida e para o enriquecimento de um povo”, explica. Para Rudinei Kopp, a construção da identidade visual – sob sua responsabilidade – foi motivada pelas manifestações de paixão, através de símbolos, por bandas, cidades, celebridades e, até mesmo, por filhos. “Podem ser botons, camisetas, canecas, faixas, uma infinidade de objetos. Decidimos usar as camisetas porque nos pareciam mais conhecidas, próximas da vida e com bom apelo visual”.
FÁBIO GOULART
Em 26 anos, a Feira do Livro de Santa Cruz do Sul já recebeu milhares de pessoas, mas, segundo Roberta Pereira, gerente do Sesc, a de maior sucesso sempre será a mais recente. “Falamos da última, pois, a cada ano, tentamos nos superar, surpreender as pessoas, trazer novos autores. A melhor feira foi a de 2012 e a próxima melhor será a deste ano”. Pelo jeito, não falta motivação para que esta Feira seja a melhor de todos os tempos.
uma e outra. Aos 13 anos, ela começou a ler a história, por influência da tia. O amor por Capitão Rodrigo também aconteceu por Bolívar, filho do protagonista da trama. No entanto, com menor intensidade. A estudante explica: “Nenhuma paixão se compara com a do Capitão, pois várias coisas que eu penso, ele fala”. O fato de o herói de O tempo e o Vento estar sempre preparado para um duelo ou uma guerra, ao mesmo tempo em que está ao lado dos amigos, é uma das qualidades que Renata mais admira. O jornalista Rafael Hoff também experimentou a paixão por meio da literatura. Na história dele, a relação não aconteceu com um personagem, mas com alguém da vida real: uma professora de língua portuguesa, quando ele tinha 17 anos. Hoff ouviu falar dela, no ensino médio. “Era bem mais velha do que eu, mas estimulava os alunos em sala de aula, com aulas diferentes, usando música, cinema e teatro”. Os anos se passaram e, por acaso, descobriu o nome da professora, ao ser seu aluno na faculdade. “Através desta experiência, decidi ser professor”, revela. A relação de Hoff com a professora foi além da sala de aula. Ele e mais dois amigos se reuniam na casa dela. “Guris de 20, 21 anos fazendo churrasquinho com a professora de 60, escutando Beatles e discutindo filosofia, sociologia e política”, descreve. Hoff também teve outra paixão estabelecida através de preferências literárias. “Casei com alguém que tem muitas afinidades comigo em termos de literatura e música”, conta. Se a esposa não gostasse de literatura, música e cultura, os dois não estariam juntos. “Nossa intimidade é pautada por essas intertextualidades. Por essa troca, por essa combinação”. Nas datas comemorativas, os presentes
PAIXÃO
Capitão Rodrigo, Capitu, Harry Potter, Robert Langdon. Os nomes citados não fazem parte de um único livro, nem foram criados pelo mesmo autor; muito menos se classificam num gênero em comum. Os personagens literários já conquistaram milhares de leitores e continuam a apaixoná-los. Não importa a idade: quem lê se identifica, sente algum tipo de carinho, afeição ou amor por algum personagem fictício. Por isso, o tema da 26ª Feira do Livro de Santa Cruz do Sul não poderia ser outro: Ler apaixona. Ser apaixonado por um personagem é ter um amor platônico, impossível e não correspondido, como aquele que muitos sentem pelo professor ou professora da escola. O sentimento nem sempre é ruim. Por meio dele, muitos tomaram gosto pela leitura. Por causa do pequeno bruxo da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts, vários jovens passaram a gostar de ler. Outros, sentiram-se atraídos por enigmas e mistérios: afinal, Capitu traiu Bentinho ou não? Talvez, por gostar muito de um personagem, alguns quiseram saber tudo sobre ele, ler todos os livros nos quais aparece. Sempre existe um motivo: a paixão está presente. Renata Guterrez, estudante do 3º semestre de Letras - Inglês da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) é apaixonada por literatura. Um personagem, em especial, prendeu seu coração. “Ao mesmo tempo que tem sede de liberdade e de ser um cidadão do mundo, andar ‘peleando’ pelo Rio Grande, ele tem vontade de estar com Bibiana, o amor da sua vida”. Dessa forma, Renata descreve Capitão Rodrigo, do livro O tempo e o Vento, de Érico Verissimo. Para a acadêmica, a leitura faz as pessoas se apaixonarem pelos personagens e, também, pela própria vida, ao identificarem a similaridade entre
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Poemas enfeitam a Praça
Poesia e jornalismo na vida de patronos da Feira do Livro ANGELITA BORGES REPORTAGEM
Para algumas pessoas, os sentimentos desabrocham com as poesias. As palavras rimadas já foram motivo de destaque em cinco edições da Feira do Livro de Santa Cruz do Sul. Neste ano, voltam aos holofotes com o patrono, Affonso Romano de Sant’Anna. A sensibilidade encontrada na Praça Getúlio Vargas está nos versos e estrofes, que podem servir de inspiração a quem lê-los. A poesia apareceu pela primeira vez na 9ª edição da Feira do Livro, em 1996, com o alegretense Mário Quintana. Seis anos mais tarde, Luiz de Miranda, natural de Uruguaiana, esteve à frente do evento. Já em 2004, o Sesc convidou o porto-alegrense Mário Pirata. Luiz Coronel, nascido em
Bagé, veio a ser o nome da Feira em 2006. O amazonense Thiago de Mello, em 2011, desembarcava em Santa Cruz do Sul para ser o patrono. Cada escritor tem suas preferências quanto à temática e ao estilo. Para Elenor José Schneider, coordenador do curso de Letras da Unisc, “a leitura dos versos de nossos patronos não oferece maiores dificuldades: são simples, mas sem nunca perder a emoção e o encantamento estético”. Quem lê poemas participa de um universo muito particular – o do próprio artista, com seus anseios, desejos, sonhos. Segundo Schneider, sem a poesia e a arte, o mundo seria “sem música, sem sons, sem cores, sem aromas”.
PERSONAGENS
Realidade e ficção de mãos dadas
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Se você nunca trocou de profissão, talvez saiba de alguém que já o tenha feito ou conheça um amigo talentoso em mais de uma área. Situações desta natureza acontecem com certa frequência e, no mundo das letras, não seria diferente. Desde 1988, primeira edição da Feira do Livro, 12 patronos pisaram em terras santa-cruzenses. Destes, seis já se dedicaram ao exercício do jornalismo. Ao prefaciar o livro Zero Hora: 45 reportagens que fizeram história, Luis Fernando Verissimo, patrono em 2005, comentou sobre sua breve passagem pelos caminhos do noticiário. “Em mais de 40 anos de jornalismo, só fiz uma reportagem. Foi o bastante para passar a admirar os (e as) repórteres, que obviamente pertenciam a uma raça diferente da minha, ou de qualquer outra criatura da Redação”. O escritor não se encaixava no perfil. Faltava-lhe “iniciativa, perseverança, cara de pau, instinto e energia, muita energia”. Após fazer uma “pergunta banal” e obter uma “resposta insossa” de Christiaan Barnard – médico que fizera o primeiro transplante de coração
–, Verissimo foi para casa tomar banho, “para desespero de Lauro Schirmer”, chefe de redação à época. Outros nomes da Feira também se aventuraram em meio às redações de jornais, nas quais a realidade é a matéria-prima para a produção textual. Mário Quintana, aos 23 anos, foi trabalhar no jornal O Estado do Rio Grande (Porto Alegre), com Raul Pilla. Ficou lá de 1929 a 1932, quando a empresa fechou por ordens do governo. Em 1935, Quintana era colaborador do suplemento literário da Gazeta de Notícias (Rio de Janeiro), dirigido pela também poetisa Cecília Meireles. Ainda trabalhou no Correio do Povo (Porto Alegre), de 1953 até o fechamento do jornal, em 1984 (a publicação voltou a circular dois anos depois). O poeta faleceu em 1994 e foi homenageado na Feira do Livro de 1996. Em suas
andanças pelo mundo, o poeta Luiz de Miranda chegou ao Rio de Janeiro em 1976, onde trabalhou em O Globo, na composição do Segundo Caderno. Passou por Santa Cruz do Sul em 2002, ano no qual foi patrono. Já Moacyr Scliar, representante do evento em 2007, trilhou caminhos profissionais mais distintos. A primeira formação acadêmica, em medicina, de certa forma, contribuiu para sua entrada no campo literário: o primeiro livro, Histórias de médico em formação (1962), foi publicado no mesmo ano em que concluiu o curso. O talento com as letras levou Scliar a ser colaborador da Folha de São Paulo por mais de três décadas. Doutor em Letras, Luiz Antonio de Assis Brasil também transitou entre a ficção e a realidade. Em 2010, o escritor assinava uma coluna quinzenal na Zero Hora (Porto Alegre). Sua passagem pela Feira do Livro ocorreu dois anos antes de trabalhar para o jornal. Outro autor que se dedicou ao jornalismo foi João Ubaldo Ribeiro, sétimo ocupante da cadeira nº 34 da Academia Brasileira de Letras. Patrono da Feira em 2010, Ribeiro exerceu diversas funções jornalísticas – redator, repórter, editorchefe, colunista – em jornais brasileiros e estrangeiros.
Eles curtem poesia Dilso dos Santos, professor de Literatura Cada poeta vê o mundo a partir de seus sextos sentidos: a sensibilidade. Cada um é único dentro disso. Produzem unidades plurais diferentes a cada nova leitura. Jackson Winck, 3º semestre de Jornalismo Escrevo pelo sentimento colocado nos poemas. Pelo drama, pela ambição, morte e revolta. É na tragédia e na tristeza que a inspiração floresce. Julia Rauber, 2º semestre de Direito Uma professora de literatura, no ensino médio, costumava dizer que a poesia não foi feita para ser lida, mas para ser sentida. Ela interage com o que sentimos de forma muito sutil. Giovana Goretti, publicitária especialista em Gestão de Marcas Na minha vida profissional, a poesia é significativa. A elaboração das campanhas, a gestão das marcas e a criação das peças publicitárias exigem uma aura mais poética, emocional, que comunique a essência da marca. Priscila Morais Kellermann, 3º semestre de Jornalismo Trabalho em assessoria de comunicação, então, tenho de ser objetiva. Mas os textos que escrevo durante as aulas, com certeza, sempre têm algum tipo de influência da poesia. Rodrigo Bartz, professor de Língua Portuguesa e Língua Espanhola No ensino médio, uma professora de literatura, chamada Ivania, nos apresentou não somente à poesia, mas ao amor que ela tinha pelo gênero. Vimos que a poesia não era nada de anormal, difícil, chato. Desde então, não parei mais. Irineu Di Mario, professor de Filosofia, Sociologia e História Há um tempo, comecei a recitar poesias nas minhas aulas e alguns rejeitaram. Depois, tornou-se um hábito. A poesia está dentro de cada um de nós. Penso que, na adolescência, ela é mais latente.
Comissão homenageia o convidado especial, Mauro Klafke
JÚLIA CAROLINA BELING INGRID JANK REPORTAGEM
A Unidade de Serviço Social do Comércio (Sesc) de Santa Cruz do Sul, neste ano, escolheu Mauro Klafke como homenageado para a 26ª Feira do Livro. O poeta, natural de Santa Cruz do Sul, nasceu em 9 de novembro de 1952 e vive em Gramado Xavier desde 1971, onde leciona e escreve. Professor estadual, fez dissertação de mestrado no qual aproxima a geografia – área na qual é graduado – à literatura. Defendeu a dissertação Do Idílio ao Exílio, em que realiza uma reflexão da espacialidade contida nos textos literários. O escritor publicou os livros Nordeste para salmos de viola, Invenção de Santa Cruz, Canções de um certo cotidiano, Uma história não oficial, Baixo relevo, Não é proibido pisar na grama, Fábula Americana, O Sino e o Galo e Cantares de espera. Estes cinco últimos são os mais conhecidos. Klafke foi escolhido por uma comissão de parceiros que apoiam a Feira e pelos organizadores da programação. Conforme Janine Pfaffenzeller, uma das responsáveis das Unidades do Sesc de Santa Cruz do Sul e organizadora da Feira do Livro deste ano, o homenageado, geralmente, é alguém da região de Santa Cruz do Sul ou do Vale do Rio Pardo. Para a escolha, são levados em conta os trabalhos já feitos. Escritores homenageados uma vez não podem ser homenageados novamente. Klafke é um visitante assíduo do evento e participa de atividades gerais sobre literatura em Santa Cruz do Sul, conta Janine. Neste ano, tanto o patrono
Recado para o autor
“Os barcos são para o mar. Os barcos parecem pássaros a buscar os ninhos”. E nós, gaúchos, quando nos direcionamos a lugares desconhecidos, sempre navegamos buscando as “ondas do pampa”. “Os barcos parecem fantasia a navegar sobre as ondas, sempre ao lado do sonho ou perto de naufragarem”.
Cercado de Literatura “Sujeito analógico, do mato”. É assim que o poeta Mauro Klafke se caracteriza. Ele acredita que este modo de vida equivale a viver recluso, rodeado de familiares e amigos. Passa boa parte do tempo em uma cabana, à margem do Rio Pardo, onde não possui internet. Se lhe falta a web, livros têm de sobra. Sempre esteve cercado por eles. Klafke chegou ao mundo das letras através da leitura de revistas e jornais que seu pai – operário – assinava. Lia livros emprestados da Biblioteca do Serviço Social da Indústria (Sesi) e fazia incursões na pequena biblioteca do seu tio, Edmar. “Havia uma ilusão em minha família de que o avanço social dependia do acesso ao livro, à leitura e ao conhecimento. Esta ilusão, de certa forma, eu mantenho”. O poeta sempre teve relação com a leitura e a escrita. “Nunca fui de oralizar muito, não sou bom contador de histórias de forma oral”. Costumava escrever diários, redações, artigos, anotações e cartas, muitas cartas. Escreveu poemas e alguma prosa. Lá pelas tantas, fez uma recolha de poemas, que resultou em seu primeiro livro, Baixo Relevo (1982). A segunda obra, Nordeste para salmos de viola, publicado no mesmo ano, já tinha uma unidade temática, o que aconteceu a todos os demais. Há muito tempo,
Klafke trabalha com a literatura e, com isso, acredita que valeu muito a pena trilhar o caminho dos livros. “A satisfação pessoal foi enorme, nunca tive ilusões. Consigo concretizar meus projetos aos poucos. Só pelas amizades de escritores e leitores, reconhecimento em 22 prêmios, relações e trocas que tive como escritor, já me gratificou”. Para o poeta, autor que se preza tem de ser movido por ideias generalizantes, para refletir sobre a condição humana. Mesmo morando em Gramado Xavier, suas raízes literárias estão em Santa Cruz do Sul. A cidade está mais presente em dois livros. Em Invenção de Santa Cruz, os poemas apresentam a cidade nos seus primeiros 10 anos de colonização alemã. A obra foi uma tentativa de fixar o imaginário de um povo ou de uma população que estava sendo inventada, num cenário promissor; às vezes, hostil. Já em Uma história não oficial, de 2012, apresenta, na forma de contos, a atuação de uma comunidade envolvida com a ditadura militar. O período coincidiu com o início de sua atuação no magistério. Klafke escreve regularmente e está cercado de literatura. Seu horizonte é a criação de um eixo literário entre Santa Cruz do Sul e a região de Cima da Serra em episódios sobre a ocupação do território, sua manutenção e evolução. Ele não se considera o grande nome da poesia do Vale do Rio Pardo. Na opinião do escritor, há outros poetas importantes, cujo trabalho é reconhecido. Para Mauro Klafke, ler apaixona. Segundo ele, o amor pelos livros é fundamental no ser humano. “Só que, às vezes, ele se viabiliza na forma da oralidade; outras, na forma de escrita; e outras, ainda, na forma virtual”. A leitura e a escrita têm grande importância, à medida que, com elas, armazenam-se o conhecimento, os relatos e a emoção. Também são necessárias para o entretenimento, a reflexão e o relacionamento interpessoal.
HOMENAGEADO
Há um ano, eu e minha família resolvemos “mudar de ares” e fomos de “mala e cuia” para Lajeado. Lá, conheci várias pessoas interessantes, mas, uma delas, muito especial, me deu a oportunidade de conhecer a obra de Mauro Klafke. Dela, recebi de presente Cantares de espera. Deliciei-me com seu puro e intenso lirismo e logo percebi que seus poemas, carregados de metáforas e imagens, tinham sido inspirados na obra da Leticia Wierzschowsky – A casa das sete mulheres e Um farol no pampa. Um poema, entre tantos que li e reli – Travessia – remeteu-me, através das palavras poéticas de Mauro, ao momento em que estava vivendo:
quanto o homenageado são poetas. Mauro Klafke é destaque na poesia do Vale do Rio Pardo. Para a organizadora, “a importância dos trabalhos dele faz valer a pena sua vinda para a Feira, pois as pessoas poderão conhecê-lo mais e bater um papo com o escritor, algo que vá além dos livros publicados”. O poeta conta que, a partir do convite, resolveu publicar mais dois livros: Era uma vez, de contos; e Jacarandás de Novembro, de poesia.
ANDRESSA BANDEIRA
Cidade agracia filho poeta
Hoje, depois que voltamos, reflito: Será que naufragamos? Rosa Helena Martinez – Alegrete/RS.
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Poesia para promover MAURÍCIO BESKOW REPORTAGEM
O patrono da 26ª edição da Feira do Livro de santa Cruz do Sul é o poeta, jornalista, escritor e cronista mineiro Affonso Romano de Sant´Anna. Suas mais de 40 obras foram reconhecidas pelas principais comandas brasileiras, entre elas, a Ordem Rio Branco, Medalha Tiradentes, Medalha da Inconfidência e a Medalha Santos Dummont. Porém, a trajetória literária do patrono não é valorizada apenas pela beleza das palavras ou pelos versos bem estruturados, mas por desper-
Unicom: O senhor é poeta, cronista e ensaísta, além de atuar como teórico e jornalista. Qual dessas perceptivas o atrai mais? A. R. S.: A palavra é o meu oficio, seja escrita ou oral. Isto vai do poeta ao cronista e ao professor. Só verbalizando começo a me entender e entender o mundo.
PATRONO
FÁBIO GOULART
Unicom: Desde a publicação do ensaio O desemprego da poesia (1962), o que modificou em sua narrativa? A. R. S.: O “desemprego” varia com o momento histórico. Quando fiz poemas para TV, sobretudo nos anos 80 e 90, tentava expandir a esfera da comunicação poética. Fiz poemas para o rádio, para companhia de publicidade. Tenho CD de poesia. Meus 70 anos, comemorei-os lendo poemas na Gruta da Lapinha, em Minas Gerais, e, agora, vim de duas apresentações com a cravista Elisa Freixo, na Serra do Cipó e no Mu-
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tar o senso de cidadania em momentos conturbados, em especial, durante a ditadura militar. Durante o período, poemas como A implosão da mentira e Que país é este? personificaram os anseios de um povo que buscava mudanças sociais e, por isso, se transformaram em hinos adotados pelas massas descontentes com a estrutura de sociedade mais igualitária. “A glória do artista é virar folclore, cair no anonimato”. Confira, a seguir, a entrevista concedida pelo escritor ao Unicom.
seu do Oratório. Já fiz concertos com Turibio Santos A poesia livresca limita muito o poeta. Unicom: O processo de inspiração se torna melhor depois de tantas obras publicadas ou o prestígio chega a limitar o processo criativo? A. R. S.: Ela [a inspiração] está em todas as partes, até na música popular. Por sinal, saiu mais reedição de Música Popular e Moderna Poesia Brasileira (Ed. Alexandria), publicado originalmente em 1977. Unicom: Fazendo alusão a este título, se dedicar à poética tem sido mais valorizado no mercado editorial brasileiro? A. R. S.: As pessoas têm necessidade da linguagem poética e, nessa sociedade pragmática, a poesia descobre sortilégios para sobreviver.
Unicom: Como enxerga essa nova geração de escritores? A. R. S.: É incrível como aumenta o número de poetas desta despassarada sociedade pós-moderna. Descobriram que qua ndo alguém tem Alzheimer, só não esquece os poemas da infância. Unicom: Em uma sociedade tecnológica com ênfase nas mídias sociais onde tudo é compartilhado, qual é a importância da expressão individual e artesanal como a poesia? A. R. S.: A internet está infestada de poetas. Começa-se a publicar eletronicamente onde antes se publicava num jornalzinho de jovens. E creio que a poesia vai, formalmente, ganhar com essa tecnologia. É como dizia Jorge de Lima: “Sal tirei do mar, luz tirei do céu, poesia tirei de tudo, abancai-vos, meus irmãos!?”. Unicom: Como a literatura e a poesia podem influenciar na realidade social? (a relação de A implosão da mentira ou Que país é este? com a abertura política, por exemplo?) A. R. S: A glória do artista é virar folclore, cair no anonimato. Outro dia, apareceu um movimento dos pescadores da Baía da Guanabara usando o poema Que pais é este? dado como sendo de um autor desconhecido. Nas últimas eleições, usaram Implosão da mentira para vários candidatos. Muitas de minhas crônicas, como A mulher madura e Antes que elas cresçam já não me pertencem mais. Ainda bem. Unicom: O que te instigou a lecionar sobre literatura infanto-juvenil? A. R. S.: Quando diretor do Departamento de Letras da PUC/RJ, tentei co-
a cidadania
Unicom: Como incentivador da leitura, de que maneira avalia feiras do livro? A. R. S.: Essas feiras são fundamentais e, felizmente, ocorrem fora do eixo Rio/São Paulo. Há feiras incríveis como as de Belém, Fortaleza e Rio Grande do Sul. São um exemplo para todos os estados. Não é à toa que têm o melhor plantel de escritores.
Affonso Romano de Sant’Anna nasceu em 27 de março de 1937, em Belo Horizonte, mas foi criado em Juiz de Fora. De origem humilde, teve que trabalhar desde a infância para garantir os estudos. O tempo livre era usado para ler os livros que conseguia nas bibliotecas do Serviço Social da Indústria (Sesi). Posteriormente, formou-se bacharel em Letras Neolatinas, na Faculdade de Filosofia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Em 1964, tornou-se doutor em Literatura Brasileira, pela mesma instituição, com tese sobre Carlos Drummond de Andrade. Além do reconhecimento nos círculos literários, também é conhecido pela atuação acadêmica como professor em di-
versas universidades, tanto no Brasil (UFMG, PUC/RJ, URFJ, UF) quanto no exterior – Califórnia (UCLA), Alemanha (Köln), França (Aix-en-Provence). Devido ao ativo engajamento em questões políticas e sociais desde a década de 60, Sant’Anna foi considerado um dos 10 jornalistas que mais influenciaram a opinião pública, pela Revista Imprensa, em 1990. Enquanto presidente da oitava maior biblioteca do mundo, a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, Sant’Anna criou o Sistema Nacional de Bibliotecas, que reúne 3.000 instituições e o Programa de Promoção da Leitura (Proler). A iniciativa contou com mais de 30 mil voluntários e estabeleceu-se em 300 municípios
brasileiros. Concebeu, também, programas de tradução de obras de autores brasileiros, bolsa de estudos para jovens escritores e encontros internacionais com agentes literários. Alguns dos seus trabalhos foram adaptados para o teatro, balé e música. Sant’Anna possui diversos CDs de literatura, gravados por ele e por famosos interpretes, como Tônia Carrero e Fagner. Fontes: http://www.affonsoromano.com. br/livros.php http://www.gargantadaserpente.com/autores/affonso_romano. shtml http://www.releituras.com/arsant_bio.asp
Livros a Canto e palavra. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, MG, 1965. a Poesia sobre poesia. Rio de Janeiro: Imago, 1975.
a Sísifo desce a montanha. Rio de Janeiro: Rocco. 2011. a Como andar no labirinto. Porto Alegre: L&PM editores,2012.
PATRONO
Unicom: Qual a sua opinião quanto ao tema da Feira, Ler Apaixona? A. R. S.: Sem paixão não se faz nada que conta. E escrevi um livro todo sobre isto: Ler o Mundo (Ed.Global).
Da inspiração à ação social
FÁBIO GOULART
Unicom: Por ser um escritor traduzido em muitos idiomas e trabalhado em grandes publicações como o Jornal do Brasil, Manchete e Veja, como vê o reconhecimento de ser patrono em uma cidade que não pertence aos grandes centros urbanos? A. R. S.: Um luxo. Coisas como essas são mais importantes do que muitas condecorações. Por exemplo, desfilar na Comissão de Frente da Mangueira, quando Drummond foi homenageado, foi um grande prêmio. Ser lido no interior do meu país é um luxo. E tenho dito que a nossa saída cultural está no conhecimento do nosso interior e da América Latina. Estou indo, agora, por exemplo, para a Feira do Livro em Lima, dedicada ao Brasil, que antecede a Feira de Frankfurt. Vocês colocaram sua cidade no mapa da literatura brasileira.
BANCO DE IMAGENS
brir várias lacunas: como você pode menosprezar a literatura infantojuvenil, cujo mercado é maior do que o da literatura adulta? Como não estudar isto? De igual maneira, levei para dentro da universidade o estudo da música popular. Trouxe, para o setor de Letras, o estudo da “carnavalização”. Propus que se começasse a estudar os best-sellers. Acabar com o divórcio entre a vida e a literatura. Por isto, num encontro nos anos 70, apresentei uma tese: ”Por um novo conceito de literatura brasileira”.
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2013
Quando cinema e literatura apaixonam
Duas artes capazes de se unirem para encantar leitor e espectador ANDRESSA BANDEIRA REPORTAGEM
Uma das definições do dicionário Larousse para o verbete paixão é “atração muito viva”. No século XIX, os irmãos Louis e Auguste Lumière inventaram a arte que, ainda hoje, atrai pessoas do mundo todo: a sétima delas, o cinema. A primeira sessão cinematográfica pública, organizada pelos Lumière, foi no ano de 1895 e durou cerca de 20 minutos. A entrada custou um franco e ocorreu no subsolo de um café, em Paris. De lá para cá, o cinema e as suas histórias evoluíram. Outra arte uniu-se a ele para ganhar o mundo e muitos fãs: a literatura. Com registros de obras muito anteriores ao cinema, a arte das palavras, hoje, movimenta não só o mercado literário, mas o cinematográfico. Tabajara Ruas, roteirista, diretor e escritor, é apaixonado tanto pela literatura quanto pelo cinema. Para ele, a literatura é “a principal das artes”. Envolvido com o cinema desde 1978, Ruas tem o Rio Grande do Sul como principal tema de suas obras literárias e audiovisuais. “O que me atrai é que eu nasci aqui. Imagino que, se eu fosse groenlandês, escreveria livros sobre a neve, sobre o gelo, sobre os ursos polares, mas eu nasci aqui. O que me atrai é que esse é meu mundo”, explica o cineasta. Ruas já trabalhou em adaptações de histórias literárias para o cinema, dentre elas, Netto perde sua alma, escrita por ele. Nela, encarregou-se do roteiro e da direção da obra. A mais recente, O tempo e o vento, do gaúcho Erico Verissimo, tem estreia prevista para 27 de setembro. No filme baseado nos livros de Verissimo, Ruas é responsável pelo roteiro, em parceria com Leticia Wierzchowski, autora de A casa das sete mulheres. “Tanto o filme pode levar para o livro quanto o livro pode levar para o filme. O que eu acho importante é que a literatura desbrava os caminhos da mente
CINEMA
PAOLLA SALLES
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Tabajara Ruas durante a 1ª Mostra Sesc/Unisc de Cinema e Televisão
com mais profundidade, com mais autenticidade”, comenta. Para Ruas, a literatura “ainda é uma das diversões que atinge diretamente o cérebro, que faz a pessoa pensar, que faz a pessoa se transformar de dentro para fora”. O cinema e a literatura não são paixões apenas de quem atua nas áreas. Fabrício Nunes, estudante de Publicidade e Propaganda da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), é fã de cinema desde a infância. “É de família, meus irmãos sempre gostaram”. Filmes e livros sempre estiveram presentes em sua vida. Prova disso é que Fabrício ainda se lembra da primeira animação que assistiu na telona: Dinossauros, da Disney. A literatura anda de mãos dadas com o gosto cinematográfico de Fabrício. Muitas vezes, após ver a adaptação de uma obra literária para o cinema, ele se interessa pelo livro. “Com Harry Potter foi assim: li os dois primeiros livros depois dos filmes”. Na opinião do acadêmico, os livros são sempre melhores do que os filmes. O gênero favorito de Fabrício é aventura. Através das histórias épicas de grandes batalhas e criaturas mágicas, ele pode fugir da rotina, “sair do mundo real”. O casamento entre o audiovisual e a literatura ocorre, também, na disciplina de Projeto Experimental em Audiovisual do curso de Comunicação Social da Unisc. No céu dos escritores, uma realização dos alunos Guilherme Pochmann, Gibran Sirena, Amanda Mendonça e Jackson Gerhardt, as obras Iracema, de José de Alencar, e O Alienista, de Machado de Assis, serviram de inspiração para os dois vídeos produzidos. Responsável pelo roteiro, Pochmann teve a ideia para os vídeos ao ler uma obra literária. “Pensamos em como contar um livro usando as ferramentas e linguagens possíveis; depois, foi só planejar e criar”. O roteiro foi escrito após muita pesquisa, consulta de livros do ensino médio e filmes das obras relidas. Pochmann aconselha ler diversos estilos ao mesmo tempo e criar hábitos para que seja possível conhecer o mais importante de cada autor em menos tempo. O acadêmico concorda com o lema da 26ª Feira do Livro, Ler apaixona. “O resultado dessa paixão é o que importa”. Ele acredita que as pessoas amam poder se apaixonar por suas vidas, seus espaços, o que é possível através da leitura. “Nosso desenvolvimento precisa de leitura para acontecer e, hoje, a leitura nos rodeia não somente com palavras, mas também com vídeos”.
ANGELITA BORGES
ARQUIVO PESSOAL / RIBEIRO
Apetite por livros e pratos Bolinhos de barro e saladas de grama: caminhos para a cozinha e a literatura
Roberta Daniela Hanzen da Silva brincava de cozinhar na infância e, hoje, cursa Gastronomia
Michel Ribeiro, o menino que se tornou chef de cozinha
PAULA TURCATTO REPORTAGEM
C
de Gastronomia pela Unisinos. No entanto, abandonou a graduação dois semestres antes de completá-la. Foi trabalhar e estudar com os chefs. Apaixonou-se ainda mais pela atividade. Além de fazer o cardápio, organizava a cozinha, treinava a equipe, fazia lista de compras e verificava o padrão dos alimentos. Também criava e desenvolvia receitas. Hoje, além de trabalhar num restaurante, o chef dá aulas particulares de gastronomia e dedica-se à carreira literária. Escreveu um livro de receitas, recusado por editoras. Com o insucesso, decidiu imprimir o próprio livro e comercializá-lo. O lado afetivo e as memórias da infância acompanham a aprendiz Roberta e o chef Ribeiro. Ambos possuem forte ligação com a casa, o passado, os sabores da infância. Apaixonados pela gastronomia, eles procuram fazer as pessoas felizes ao saborearem seus pratos. São amantes de temperos, criatividade, técnicas, livros e não se esquecem de consultar o bom e velho caderno de receitas da vovó.
GASTRONOMIIA
ertas pessoas são apaixonadas pela literatura, dança, escrita e, outras, pela gastronomia. Há quem aprecie a arte da boa mesa e quem, ainda, faça de seu prazer uma profissão. A fama do meio gastronômico não se restringe aos restaurantes. Também invade editoras, livrarias, bienais e feiras. É a partir do desejo de compartilhar receitas que muitos chefs publicam livros com os quais pretendem ajudar pessoas que não têm habilidade na arte. Para a elaboração de bons pratos, são necessárias pitadas de criatividade e curiosidade. Roberta Daniela Hanzen da Silva tem as duas características desde a infância. Gostava de inventar pratos curiosos – de bolinhos de barro a saladas de grama. A brincadeira virou coisa séria. Aos 19 anos, a estudante está no 3º semestre do curso de Gastronomia da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc). Para ela, alimentação equilibrada e qualidade de vida são fundamentais. A mistura de aromas e sabores nas preparações também a encantam. Desde a infância, as histórias de Roberta são as mais loucas possíveis. Certo dia, a menina decidiu fazer um “super prato”. Tentou imitar os grandes chefs de cozinha, que conseguiam misturar doce e salgado na mes
ma receita. Resolveu inventar a sua. Se eles podiam, ela também conseguiria. A criação foi nada mais, nada menos do que um presunto enrolado com uma mistura de melado, mostarda e margarina. O resultado da “delícia”: uma internação no hospital devido a fortes dores abdominais. Depois de entrar para a faculdade, Roberta, certa vez, trabalhou numa cozinha, na qual preparou refeições para cerca de 500 pessoas. Para o evento, a garota teve a ideia de fazer a receita de um livro: filé mignon à panela e, depois, enrolá-lo em massa folhada e levá-lo ao forno. Como havia trazido a receita, a equipe – mais experiente – imaginou que ela cozinharia. A pequena aprendiz colocou a mão na massa. O resultado: todos adoraram e rolou até repetição. Ela ainda não sabe se o sucesso do prato se deu por seu talento ou pelas rezas diante do pedaço de carne. Na opinião da acadêmica, cozinhar não é algo simples. “Tem que ter vocação, amor e paixão pelo que se está fazendo. Culinária é a arte que se faz com as mãos e o coração”. A inspiração e o jeito com os alimentos vêm das leituras de chefs como Alex Atala, eleito chef do ano em 2006, pelo Guia Quatro Rodas. “Ele faz maravilhas com ingredientes da culinária nacional, transformando-os em pratos magníficos”, conta Roberta. Assim como a estudante, Michel Ribeiro, chef de cozinha há 20 anos, faz menção a Atala, sobretudo, na inspiração para elaborar pratos. Seja no fogão de casa, na universidade ou no restaurante, o que une a estudante de Gastronomia, Roberta, ao chef é o amor pela cozinha. Quando menino, aos nove anos, preparou seu primeiro arroz enquanto os pais trabalhavam fora. Também lia receitas de revistas e cozinhava escondido. Chegou a cursar Direito e Engenharia, mas o dom com as panelas e o fogão falou mais alto. Ribeiro iniciou o curso
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Garimpo de histórias usadas Sebo de Santa Cruz do Sul: duas décadas dedicadas aos livros CAROLINE PIECZARKA REPORTAGEM
Sebo, do latim sebum, é o nome destinado a lojas que trabalham com livros usados. Localizada na galeria Green Center, no centro de Santa Cruz do Sul, a loja Sebum foi criada há 20 anos e ainda é o único sebo da cidade. A proprietária Sueli Nascimento teve a ideia quando, ao ouvir o marido comentar das revistas baratas encontradas em sebos em uma viagem, percebeu que não havia nada parecido no município. O início foi com gibis e livros doados por familiares e de sua biblioteca. Hoje a loja está repleta de livros vendidos ou trocados por clientes do Vale do Rio Pardo. O acervo também recebeu exemplares de sebos visitados por Sueli e bancas de revistas que fecharam em Santa Cruz do Sul. Hoje, o material vem dos clientes e a preferência é por livros que terão mais chances de serem comercializados. No início, houve grande procura e a maior parte dos clientes é adulta. A dona ainda fica surpresa pelo fato de a loja ainda estar aberta. De clássicos da literatura brasileira a revistas de fofoca, os livros mais procurados são de autoajuda e espíritas. Os clientes têm gostos variados e passam tardes na loja, olhando cada exemplar para garimpar boas histórias. Conforme Sueli, os frequentadores de sebos são diferentes de compradores via internet: “Preferem a convivência com a loja física”, acredita. São leitores cujo contato com a leitura é antigo; veem o livro como uma viagem. “Nada substitui um bom livro”, afirma Sueli.
Christofer Dalla Lana, produtor audiovisual, conheceu o sebo há cerca de 8 anos, por indicação de um amigo. Considera sebos mais interessantes do que livrarias por serem lugares nos quais os livros não contêm apenas histórias, mas, também, uma história particular. “Acho fantástico quando tem alguma anotação ou dedicatória na folha de rosto do livro que comprei. É um sinal gráfico de que, de certa forma, aquele volume fez parte da vida de alguém que nunca vou conhecer”. Christofer gosta do garimpo e da surpresa de se deparar com um livro interessante. Já encontrou exemplares que há muito queria adquirir, como uma edição da Divina Comédia, de Dante Alighieri, e A Filosofia da Ciência, de Rubem Alves. Para o produtor audiovisual, ler é uma espécie de vício retroalimentado. “Felizmente, vejo que as pessoas têm lido muito mais e que isso já não é um martírio, como era visto em algumas gerações anteriores. Jovens leem mais de 3 mil páginas de uma série de livros, brincando”, diz, ao citar a série de livros do Harry Potter. A estudante de Ciências Contábeis, Roberta Teixeira Nappar, conheceu o sebo há cerca de quatro anos. Ela destaca o preço e a troca dos livros como vantagens que tornam a leitura mais acessível. Roberta concorda com o tema da 26ª Feira do Livro de Santa Cruz do Sul, “ler é apaixonante e prazeroso”.
ESTANTE
FOTOS: CAROLINE PIECZARKA
Sueli Nascimento é proprietária do único sebo da cidade Leitores reservam tempo para os livros
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Sentimento que move o teatro Profissionais falam sobre sua paixão pelas artes cênicas
VIVIANE FETZER REPORTAGEM
Teatro como parte da aula de Educação Artística. Como projeto extraclasse. E como profissão. Três formas diferentes, mas envolvidas por um único sentimento: a paixão. Paixão que surgiu na infância ou até no curso superior, mas que fez e faz muito por crianças e adolescentes. Nas escolas, os alunos descobrem suas habilidades, perdem a vergonha, entram em um ritmo diferente de trabalho. Num grupo de teatro profissional, a interpretação e as falas são trabalhadas de modo diferente. As duas formas trazem a paixão em seu contexto. E, assim, levam alegria para as crianças. Arlinda Wietzke, 57 anos, professora aposentada de Educação Artística e Música, trabalhava o teatro durante as aulas na disciplina de Educação Artística, em escolas estaduais e particulares. O objetivo, segundo ela, “era enfatizar a importância da expressão artística para o desenvolvimento de habilidades como sensibilidade e comunicação dos alunos”. A paixão pelo teatro veio do curso que frequentou, no qual fez a defesa de um personagem. “Escolhi o palhaço, pesquisei, caracterizei e expressei o personagem com sucesso”. Para ela, foi um desafio, pois era muito inibida e conseguiu fazer sua capacidade expressiva crescer. Assistir a teatros na infância também faz surgir a paixão. Foi o que aconteceu com Jaqueline Kirst, 18 anos, atriz do Teatro Luz e Cena, de
Novo Hamburgo. Além de assistir a peças, fazia parte das apresentações na escola. “Sempre gostei de dançar, cantar, e o teatro veio naturalmente, por paixão”, destaca Jaqueline. Em 2010, começou a participar de oficinas no espaço do Teatro Luz e Cena e, no mesmo ano, contracenou com a companhia no Natal. Em 2011, entrou num grupo alternativo e participou de um festival de esquetes de Novo Hamburgo, quando ganhou o prêmio de atriz revelação. “Fiz oficina de teatro de 2009 a 2011, mas só agora, em 2013, comecei a trabalhar definitivamente com o Teatro Luz e Cena”, salienta. Durante a faculdade de Letras, Maristela Miotto Raminelli despertou para o teatro nas aulas de Literatura. “Depois, na prática pedagógica, me apaixonei”. Professora aposentada de Língua Portuguesa, é monitora do Programa Mais Educação, na Escola Estadual de Ensino Médio Cristo Rei, de Passa Sete. Com turmas variadas, ela explica que os roteiros são pesquisados na internet, em livros e, se for necessário, são feitas adaptações. Nos encontros realizados uma vez por semana, além da peça em si, ela promove brincadeiras com os alunos. A paixão destas três mulheres pelo teatro já movimentou muitas crianças. Jaqueline leva o teatro para muitas cidades, junto com o grupo Teatro Luz e Cena, onde trabalha. Eles se apresentam em escolas, Centros
de Tradições Gaúchas, salões e palcos improvisados. As crianças e adolescentes se divertem e conhecem histórias diferentes. Maristela faz das manhãs e tardes inversas ao turno de estudo dos alunos da Escola mais animadas. Ela conta que os alunos ficam ansiosos pelo próximo ensaio ou peça. Arlinda incentivava os estudantes a pensar que o teatro é arte e tem uma linguagem rica, que diverte instruindo. Em suas peças, os personagens adoravam e viviam intensamente a arte. “Foram momentos inesquecíveis de descontração, atenção, dedicação e de prazer ao ver os resultados”. Nas apresentações ocorrem algumas faltas, mudanças de última hora, improviso. Tudo, no final, rende histórias melhores até que as do roteiro. “De tanto as falas serem alteradas durante a apresentação, o público achava ainda mais engraçado”, conta Arlinda. O improviso faz parte desta arte. Em uma das apresentações, Maristela teve de entrar como atriz para que não ficasse sem um personagem. “Não tinha decorado as falas e entrei com a folha na mão”. VIVIANE FETZER
ARQUIVO ESCOLA CRISTO REI
Grupo de teatro organizado por Arlinda, em especial de Natal ARQUIVO PESSOAL
ARQUIVO PESSOAL
Jaqueline: prêmio de atriz revelação em Novo Hamburgo
Jaqueline em cena na peça A menina da biblioteca
EM CENA
Brincadeiras deixam alunos mais atentos
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Encontro dos amantes da literatura Clube do livro santa-cruzense agrega de seis a oito leitores
JOÃO PEDRO KIST REPORTAGEM
Clubes de livros são formados por grupos de amigos, colegas de aula, de trabalho ou vizinhos que têm a leitura como paixão. Na maioria das vezes, estes se reúnem-se em suas casas, para tomar café, em salas de bibliotecas e, até em bares, para discutir sobre uma obra que os integrantes do grupo tenham combinado. O tamanho do clube pode variar, mas, na maioria das vezes, é formado por até 10 leitores. Os encontros não são oficinas literárias, já que não há um coordenador ou professor. Também não há métodos de aprimoramento de técnicas narrativas com o objetivo de formar escritores. “Subitamente, entre a leitura de um capítulo e outro, surgiu a ideia de fazermos leituras coletivas ou juntarmos mais pessoas”, conta Jorcenita Alves Vieira, uma das fundadoras do clube do livro Sobre Livros e Leituras (SL&L). Natural de Pelotas, Jorcenita é apaixonada por livros desde criança. O grupo se encontra a cada 15 dias. “Para se apaixonar pela leitura, é necessário que
os pais sejam leitores, que se tenha o livro certo, na hora certa e se possa criar o hábito. Quanto mais lemos, mais gostamos de ler”, ressalta. Na noite de uma terça-feira de 2007, as amigas Jorcenita e Inara Moraes dos Santos, de Porto Alegre, estavam empolgadas com a leitura do livro O Caçador de Pipas (2003) e, enquanto avançavam de um capítulo a outro, surgiu a ideia de criar um clube. As amigas, então, criaram o SL&L. “O objetivo era agregar mais, reunir mais pessoas de diferentes áreas do conhecimento. Imaginávamos que, desta forma, as discussões em torno da leitura seriam, além de prazerosas, mais enriquecedoras”, aponta Jorcenita. Mais pessoas foram adicionadas ao grupo. Iuri João Azevedo, amante da leitura e amigo das criadoras do clube, foi procurado por elas para auxiliar na divulgação da ideia e atrair mais público. O SL&L ainda tem um empenho social. Na 20ª Feira do Livro de Santa Cruz do Sul, o clube proporcionou o 1º Encontro Livros, Leituras e Pessoas
Destino dos livros está na rede
LEITURAS
MÔNICA DA CRUZ STEPHANIE SEVERO REPORTAGEM
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O Facebook não se limita ao encontro de amigos. Além da interação entre os usuários, a rede permite que os amantes da leitura negociem com interessados na compra e venda de livros – usados ou não. Diversos grupos de briques de livros foram e são criados, nos quais pessoas de lugares diferentes podem encontrar, por um preço bacana, aquele livro pelo qual tanto procuravam. Os criadores dos grupos, na maioria das vezes, não imaginam a dimensão que os briques podem tomar. É o caso da santa-cruzense Catarina Eick Sieben, 17 anos, que utilizou as vantagens da rede a seu favor. Ela criou o Brique de Livros, em parceria com Carolina Butzge. A ideia nasceu da necessidade de um
local adequado e específico para a negociação de livros na região dos Vales. O grupo conta com mais de 3 mil membros. Já Bruna Heinen, 18 anos, percebeu, na criação do grupo Sebo de Livros – Santa Cruz do Sul, a oportunidade de compartilhar seu mundo. As várias caixas de livros não aproveitados, das quais é dona, agora, podem receber um destino mais digno que a poeira. Bruna deseja ampliar o grupo e alcançar outras cidades, além de Santa Cruz do Sul. Ideia semelhante ocorreu ao terapeuta holístico e astrólogo Augusto Etges Genehr, 26 anos, criador do grupo Trocando Livros > Santa Cruz do Sul. O Facebook foi escolhido por ser amplamente conhecido e utilizado. O destino da página depende da utilização dos usuários. Criada em abril deste ano, o grupo engloba Santa Cruz do Sul e cidades próximas.
com Deficiência. A iniciativa teve o apoio dos organizadores da Feira e de entidades santa-cruzenses vinculadas às pessoas deficientes. No encontro, foram abordados assuntos como a locomoção de cadeirantes no local e em bibliotecas da cidade, as possíveis interações entre literatura infantil e crianças surdas e cegas (hora do conto, teatro, atividades lúdicas e acesso a livros), a publicação de livros em braile e em sign writing (sistema de registro gráfico usado para surdos). Os encontros do SL&L são abertos aos interessados em leitura, especialmente, a prosa. Por iniciativa de professores e acadêmicos da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), hoje, diversas pessoas, não apenas da comunidade universitária, participam do grupo de modo esporádico. Persistem no clube, Jorcenita e mais quatro amigos. Para participar, basta comparecer, sem inscrição ou aviso prévio. Em geral, um tema é definido para o debate, seguindo-se uma conversação livre. Nos últimos anos do clube, o grupo se reúne em cafeterias.
Dicas de Músicas Sucessos tradicionalistas regravados Os Serranos é um dos grupos mais tradicionais do estado. Criado em 1968, em Bom Jesus, na serra do Rio Grande do Sul, é reconhecido pelas interpretações de músicas tradicionalistas. No CD Os Serranos interpretam grandes sucessos vol.3, a banda regravou músicas de outros artistas gauchescos. O trabalho contou com a participação especial de Sérgio Reis, em Nossa Vanera, e de Gaúcho da Fronteira, em Nheco-Vari, Nheco-Fum. Entre as músicas do álbum estão Barranca de Fronteira, Batendo Água, Fandango em Soledade, Bugio Novo, Casamento da Doralice, Vanera Grossa, Mensagem de Saudade e Dançador de Xote.
A história por trás do livro
O caminho percorrido para a ideia do autor virar uma obra literária
EDUARDA PAVANATTO MARTINA SCHERER REPORTAGEM
Espera escrevi a partir do romance A Casa das Sete Mulheres e Invenção de Santa Cruz é a poética dos primeiros momentos desta cidade”. Ele considera fundamental que cada livro tenha um tema específico. Com exceção da primeira obra, uma recolha de poemas, todas as outras são assim. “Os livros de poemas, contos e romances sempre têm um tema gerador. É pela necessidade de narrar um determinado contexto”, esclarece. Depois da inspiração, da escolha do tema e de um tempo de escrita, o livro está pronto para ser publicado. “Escrevi Canções de um certo cotidiano em alguns dias, mas, Uma história não oficial, levei mais de 25 anos”, lembra. Para Klafke, quando a ideia amadurece é hora de concretizá-la em texto até a forma definitiva. O autor, no entanto, observa: “Sempre fica a sensação de que falta algo a acrescentar”. O passo seguinte do processo é a escolha de uma boa editora. Klafke optou pela Singram, de Sinimbu/RS. A Singram foi criada em conjunto com o jornal Tribuna Popular, da mesma cidade, como explica Paulo Dhiel, diretor do jornal e da editora. Nela, foram publicados três livros de Klafke: O Sino & o Galo (1994), Gramado Xavier – Pequena História (1995) e Não é proibido pisar na grama (1998). Segundo o autor, o material chega à editora ainda bastante bruto. “Permito que eles tomem as decisões quanto à diagramação e à capa, bem como a revisão. Muitas vezes, não concordo com o tamanho dos tipos usados, mas não interfiro”, comenta. A Singram, por sua vez, procura não interferir nos textos originais. “Como quase todos os livros foram de poesia, nossa atuação se restringiu à revisão, sem qualquer interferência no conteúdo original. No livro Gramado Xavier – pequena história, além da revisão, houve ape-
nas alguma confirmação de dado pontual”, esclarece Dhiel. Quando sai da gráfica, o livro está pronto: impresso, com capa e encadernado. Agora, faltam definir valores e distribuir. Conforme Dhiel, “o valor para a venda, basicamente, leva em conta o custo de produção e envio”. Klafke acrescenta à soma, o valor do papel e da tiragem, já que o custo aumenta quando esta é limitada. “Mantenho o preço de venda um pouco acima do valor da edição. Não me parece exequível um valor fora do poder aquisitivo de quem compra livros, cuja prática se perdeu”. Quanto à tiragem, o número de exemplares a serem impressos é decidido pelo autor. No caso dos livros publicados por Klafke, dois deles tiveram tiragem de 1000 volumes; um, de 800; dois, de 500; e os demais, de 300. A distribuição também é feita a gosto do autor: “Eu mesmo distribuo os livros entre os patrocinadores”, esclarece. Para Klafke, não se pode arriscar uma tiragem muito grande, pois “a distribuição do livro é o gargalo estrangulador do consumo de literatura”. Após todo o processo, você pode se perguntar se vale a pena escrever e publicar um livro. Klafke acredita que sim. O professor de geografia que se aventura nas letras, prosas e na poesia destaca que narrar é próprio das pessoas. Segundo ele, o ser humano só é ser humano pela capacidade de lidar com a palavra, como instrumento de vida. O escritor também se preocupa com a falta que o hábito da leitura tem feito. “A transmissão de conhecimento, de sentimentos e emoção dependem desta prática e deste exercício. Escrevem-se livros para ser alguém melhor e isto, invariavelmente, acontece”. E você? Já pensou em ter, algum dia, seu nome na estante de outros leitores?
IMPRESSÃO
Escreve um pouco e apaga. Mais um pouco e apaga de novo. Então, já se foram minutos, horas, dias, meses e, até, anos. Junto com esse tempo acabaram-se, também, várias borrachas e o corretivo. O dedo ficou marcado pela caneta ou, no caso de escritores mais modernos, as teclas já ficaram gastas. Essa é a situação pela qual todo autor passa. São anos de dedicação para criar a obra que, hoje, está na mão, estante ou gaveta dos leitores. Entretanto, mesmo depois de finalizadas, as histórias ainda possuem um longo caminho a ser percorrido até que sejam publicadas. Mas, antes de serem finalizadas, precisam ser escritas e, para isso, são necessários um tema e inspiração. Em matéria produzida para o site Saraiva Conteúdo, o jornalista André Bernardo listou uma série de autores e o que estes faziam para se inspirar. Luis Fernando Verisimo, de O Analista de Bagé (1981), A Família Brasil (1993) e As Mentiras que os Homens Contam (2000), gosta de jogar Paciência no computador enquanto não sabe sobre o que escrever. Agatha Christie, a famosa “rainha do crime”, preferia pensar em suas narrativas enquanto estava numa confortável banheira. Para Mauro Klafke, escritor homenageado da 26ª Feira do Livro de Santa Cruz do Sul, a inspiração vem pela necessidade de narrar um determinado contexto. Ele exemplifica: “Acho que vem da vontade de se expressar e narrar, de se comunicar e estabelecer relações. A publicação pode ser consequência ou não desta atitude de invenção, de descoberta e de tenacidade que é a narrativa”. O escritor que, por formação, é professor de geografia, já publicou dez livros – um de histórias, um de contos e oito de poesia. Klafke sentia necessidade de reunir suas obras em livros: Cantares de
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Um novo jornalismo emerge RATÃO DINIZ
Um moderno grupo de jornalistas está emergindo: os que contam histórias através de desenhos. Profissionais confortáveis não só na condução de uma entrevista, mas, também, sentados à mesa, com canetas e lápis à mão, prontos para colocarem no papel e em formato de desenho toda uma história. “Às vezes, tem publicações que dizem que são jornalismo em quadrinhos, mas não são nem jornalismo”. Esse é o pensamento de Augusto Machado Paim, ao falar sobre o gênero. Graduado em jornalismo na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e mestre em Teoria da Literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), trabalha há sete anos Augusto Machado Paim trabalha há sete anos com com jornalismo em quadrinhos. o jornalismo em quadrinhos
QUADRINHOS
MÔNICA DA CRUZ ENTREVISTA
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Unicom: Como tu conheceste o jornalismo em quadrinhos? A. M. P.: Eu participava, durante a faculdade em Santa Maria, de um grupo de pesquisas sobre imagens. Todo o pessoal estudava Teorias da Imagem e cada um aplicava isso em alguma área. Tinha gente que trabalhava com cinema, publicidade, e eu trabalhei com quadrinhos por ser a única pessoa a ter mais intimidade com essa área. Eu iria me formar em jornalismo, mas não conseguia ver um link entre os quadrinhos e o jornalismo. Lembro-me de que, uma vez, fiquei pensando se não seria possível unir as duas coisas, fazer um jornalismo em quadrinhos. Então, fui pesquisar na internet e encontrei o trabalho do Aristides Dutra. Ele é um pesquisador do Rio de Janeiro e fez mestrado sobre a história do jornalismo em quadrinhos. Foi assim que fiquei sabendo da existência do trabalho do Joe Sacco e, a partir daí, comecei a pesquisar para valer sobre o tema. A partir da minha pesquisa surgiu o meu interesse pelo jornalismo em quadrinhos. Unicom: Como tu defines o jornalismo em quadrinhos, hoje? A. M. P.: O jornalismo em quadrinhos é uma reportagem com a mesma profundidade de uma reportagem literária, mas, em vez
Uma das referências de Paim é Joe Sacco, autor da HQ* Palestina – Uma nação ocupada (2010). Sacco realiza um jornalismo humano, aprofundado no contexto de guerras que perduram por gerações, sem abrir mão da reflexão. De acordo com Paim, em entrevista ao blog Jogo da Notícia, “há muitos autores que surgem e alguns se destacam, mas nenhum deles é tão reconhecido como Joe Sacco”. Em 2009, o jornalista traduziu para o português o livro Johnny Cash – uma biografia, premiada obra do quadrinista alemão Reinhard Kleist. Também foi curador e organizador do I Encontro Internacional de Jornalismo em Quadrinhos, em 2010. Paim, em entrevista para o Unicom da Feira do Livro, falou sobre o gênero, a carreira e suas inspirações.
de se usar a linguagem convencional do jornalismo, se usa a dos quadrinhos. Unicom: Há quanto tempo tu estás na área? A. M. P.: A minha monografia sobre o tema foi em 2007 e eu já vinha pesquisando há um ano, então, já fazem sete anos que estou nessa área. Unicom: Qual foi a tua maior dificuldade no começo da carreira e qual é a maior dificuldade agora? A. M. P.: O mais difícil, no início, era convencer um editor que era interessante fazer uma reportagem nesse formato. E, hoje em dia, o mais difícil é convencer a fazer uma boa reportagem nesse formato. Muita gente quer que se faça, mas quer essa coisa simples de ‘ah, faz uma matéria porque a gente tem o desenhista e ele vai desenhar’, quando eu prefiro escolher o desenhista porque essa escolha já tem a ver com o tema da reportagem e com o procedimento. Unicom: Quais são as características necessárias para um profissional que deseja trabalhar na área? A. M. P.: Primeiro, eu acho que tem que ser jornalista. Outra questão é conhecer bem a linguagem dos quadrinhos.
Unicom: Quais dicas tu darias para as pessoas que desejam trabalhar com o jornalismo em quadrinhos? A. M. P.: Primeiro, tem que entrar em contato com o trabalho do Joe Sacco. Em 2011, saiu, pela Editora Conrad, uma edição especial da série dele, chamada Palestina – são dois livros num só volume. Esse volume tem um prefácio do Sacco, no qual ele detalha várias questões ligadas a reportagens em quadrinhos: a edição do roteiro, a maneira como ele faz as entrevistas, as fotografias que usa. A leitura sobre a linguagem dos quadrinhos é fundamental. Unicom: O jornalismo em quadrinhos pode apaixonar da mesma forma que as histórias em quadrinhos? A. M. P.: Só se pode pensar no jornalismo em quadrinhos como algo apaixonante da mesma forma que o jornalismo literário: pela arte de ir para a rua, de entrevistar em profundidade, de prestar atenção nos detalhes significativos. Não é à toa que o jornalismo em quadrinhos é considerado o ‘Novo Novo Jornalismo’. * HQ: Histórias em quadrinhos.
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s a m e o
Ainda há tempo
Ainda há tempo para o último drinque à beira do vulcão ou então para abrir o que estava oculto no sótão ou no porão por isto é o momento de descerrar o indiscernível sim do não. Ainda há tempo de aceitar
a pequenez e explicar a omissão ainda há tempo para a carta não escrita o telefonema tardio o pedido de desculpa na garganta enrustido e um afago de mão. Trechos do poema de Affonso Romano de Sant’Anna, patrono da Feira do Livro
A maré
M orada Ele tinha cabelos escuros, Pele morena, olho esverdeado, Galanteador, meio levado, Aquele tipo de homem mal intencionado Barba falhada, sobretudo e coturno, Deixava-me inquieta, sem saber o que pensar Olhar misterioso, jeito vagabundo, Era como se dissesse: “vem me desvendar” Despertava em mim uma vontade diferente Mão suadas, bochechas rosadas, coração ardente, Sentimentos que eu jamais havia sentido, Um lado meu, até então, desconhecido Notei que havia me apaixonado de verdade, Que, com ele, eu era inteira, não metade. E a cada cena que imaginava de nós dois Eu deixava a realidade pra depois Mas era chegada a hora de encarar A vida batia na porta e eu tinha que continuar E agora o que eu faria? Como continuar a viver? Se meu amor num livro mora E eu acabei de ler? Letícia Lorensini, acadêmica do 8º semestre de Produção em Mídia Audiovisual
Apareceu num doce giro do timão do destino com o vento que atrapalhou tua franja e o fez cair escondendo teus olhos verdes-mar. E das dúvidas que vieram com teus olhos, veio, também, um mar de querer. Zarpei sem medo da maré, não conheço o vento que espalha teu perfume e tampouco o navegar da tua mente. Agora estou em terras distantes, sem querer saber onde irei chegar. Abri as velas para aproveitar melhor o teu perfumado vento. Ganho mais do que força! Me move, é inspiração! Os dias se passam, sinto-me salgado de saudade. E nem uma brava tempestade me distrai. Naufrago, sem querer, em nossas lembranças, mas sou resgatado pela esperança de ainda te ver.
Soneto do poeta Como se fazer um soneto fosse fácil, o poeta fica em busca de um verso grácil, um gracejo, um desejo: a tradução do corpo e alma, do mundo, do coração. E essa busca incessante ainda continua deuses e monstros, a mentira nua e crua, a palavra certa e o verso que se encaixa com a métrica mais que perfeita: exata. Os poetas perderiam noites de sono procurando rimas bonitas e sinceras? Ou seriam eles como as folhas de outono, que, no fim, deitam-se complacentes no chão, deixando o espaço que as flores da primavera, de tão inexperientes, preencherão?
Israel Orlandi, 6º Semestre de Produção Editorial
Angelita Borges, acadêmica do 4º semestre de Jornalismo
POETARES
Amar é... estar confuso, sem saber qual estrela seguir. Amar é... lutar para atracar nos teus braços e desejar deles nunca mais ter de partir. Amar é... ir contra a maré.
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UNISC