Suplemento do Jornal Unesp Julho 2018
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O PL 6.299 não deveria ser aprovado
Denis Moledo de Souza Abessa
Entrevista com Pedro Luis da Costa Aguiar Alves
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Projeto de lei sobre agrotóxicos na contramão das gerações futuras Antonio Fernando Monteiro Camargo
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A importância da modernização da lei dos agrotóxicos
Caio Antonio Carbonari e Edivaldo Domingues Velini
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FÓRUM
PROJETO DE LEI POLÊMICO No dia 25 de junho, uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados aprovou o relatório do deputado Luiz Nishimori (PR-PR), que defendeu a aprovação em plenário do Projeto de Lei 6.299 (PL 6.299), que estabelece novas regras para o setor de agrotóxicos. De autoria do atual ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimen-
to, Blairo Maggi, o PL divide opiniões. De um lado, os críticos argumentam que o projeto atende aos interesses do segmento ruralista, tornará a legislação mais propícia à liberação do uso dessas substâncias e estimulará sua comercialização no Brasil, que, segundo eles, já é o maior consumidor desses produtos no mundo. De
outro, os defensores da proposta assinalam que ela representa a necessária atualização da legislação do país para esse mercado e garantirá uma avaliação rigorosa dos novos agrotóxicos. Por meio da opinião de pesquisadores da Unesp, este caderno publica os argumentos dos representantes dessas duas tendências.
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Fórum
Julho 2018
PROPOSTA APRIMORA ANÁLISE E CONTROLE DE AGROTÓXICOS
O PL 6.299 NÃO DEVERIA SER APROVADO 123RF
Denis Moledo de Souza Abessa
PEDRO LUIS DA COSTA AGUIAR ALVES Por André Louzas
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iretor da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV), do Câmpus da Unesp de Jaboticabal, Pedro Luis da Costa Aguiar Alves desenvolve seus estudos na área de fisiologia vegetal, em especial de matologia, ou seja, de plantas daninhas, tratando de questões como competição, herbicidas, alelopatia (capacidade de certos vegetais de, por meio da liberação de dadas substâncias, influir sobre outros vegetais), amendoim, feijão e eucalipto. Nesta entrevista, o professor Alves analisa o PL 6.299, que modifica o processo de liberação de pesticidas no país.
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despeito do protagonismo exercido pelo Brasil na questão ambiental a partir da redemocratização do país (nos anos 1990), os últimos anos têm trazido inúmeros e perigosos retrocessos, os quais possivelmente produzirão consequências negativas sobre os ecossistemas naturais e os aspectos socioeconômicos [...]. [...] Nesse cenário de terra arrasada, aparece o Projeto de Lei de número 6.299 (PL 6.299), apresentado em 2002 pelo atual ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA (Blairo Maggi) [...]. Esse projeto, conhecido como “PL do Veneno”, foi aprovado em Comissão Especial da Câmara dos Deputados, e seguirá sua tramitação. De modo geral, o PL deverá levar a um grande afrouxamento das normas de controle dos pesticidas no Brasil, aumentando ainda mais o uso dessas substâncias e consequentemente a contaminação de alimentos, atmosfera, solos e águas (superficiais e subterrâneas), juntamente com a contaminação de trabalhadores rurais, consumidores e ecossistemas. É um problema muito preocupante, já que o Brasil é um dos países que mais utilizam agrotóxicos no mundo, sendo que os limites legais para concentrações de pesticidas em alimentos e águas são maiores do que aqueles propostos por outros países. [...] Além disso, o PL transfere a responsabilidade de avaliação e regulamentação de pesticidas para uma Comissão Técnica Nacional de Fitossanitários (CTNFito), que será criada e mais vinculada ao MAPA. Hoje em dia esse controle é realizado de forma tripartite, pelo MAPA, Ibama e Anvisa. [...] Recentemente, duas publicações foram produzidas pela profa. dra. Larissa Bombardi, da USP – os livros Geografia sobre o uso de agrotóxicos no Brasil e Pequeno ensaio cartográfico sobre o uso de agrotóxicos no Brasil – a partir de dados do Sistema Único de Saúde (SUS). Nesse material, estão demonstrados, de forma inequívoca, os problemas decorrentes do uso de agrotóxicos e suas relações nocivas sobre a saúde pública, com estimativas de até 1,25 milhão de pessoas afetadas entre 2007 e 2014 no Brasil. Além disso, existe farta documentação na literatura científica, indicando que os pesticidas se espalham na natureza, atingindo ecossistemas naturais e causando danos sobre os organismos. [...] Por isso, não é por acaso que inúmeros órgãos técnicos estejam se posicionando frontalmente contra a aprovação do PL 6.299, como é o caso do Instituto Nacional do Câncer, Conselho Nacional de
Política agrícola não pode estar acima do direito à saúde e ao ambiente equilibrado Saúde, Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho, Anvisa, Ibama, Departamento de Vigilância em Saúde Ambiental e Saúde do Trabalhador, Conselho Nacional dos Direitos Humanos, Fiocruz, Defensoria Pública da União, entre outros. [...] [...] As leis brasileiras, incluindo a Constituição Federal, baseiam-se em alguns princípios do Direito, entre eles o princípio do Direito Humano Fundamental (no caso, o direito a um ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida), o princípio da Cautela (aquele que determina que não se produzam intervenções no meio ambiente antes de haver a certeza de que estas não serão adversas para o meio ambiente), e o princípio da Prevenção (determina que poder público e coletividade devem agir quando possuem ciência de que algum elemento do meio ambiente possa ser afetado por um ato ou uma atividade, ou não atividade, humana). O PL 6.299 viola esses princípios, ao, de certa forma, criar mecanismos que induzam a um aumento do uso de substâncias tóxicas e diminuam seu controle. Esse argumento está alinhado com o MPF, que contesta o PL 6.299 pelo fato de que a política agrícola não pode estar acima do direito à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. [...] Por fim, afrouxar as regulamentações é seguir no caminho contrário daquele trilhado pela maioria dos países desenvolvidos, os quais têm adotado restrições crescentes; estabelecido limites mais restritivos; banido substâncias com alta toxicidade e carcinogenicidade; e investido em pesquisa para aumentar a produtividade agrícola usando menos (ou nenhum) agrotóxico. Em resumo, não é sensato nem correto aprovar um projeto de lei que flexibilize as normas relativas aos pesticidas, beneficiando somente o setor do agronegócio, em detrimento da saúde pública e ambiental. Denis Moledo de Souza Abessa é professor do Instituto de Biociências, Câmpus do Litoral Paulista. A íntegra deste artigo está disponível no “Debate Acadêmico” do Portal Unesp, no endereço: <https://bit.ly/2Msmh6B>.
Caderno Fórum: Como o senhor avalia a aprovação do PL 6.299/2002, comparando as propostas desse texto e a legislação em vigor? Pedro Luis da Costa Aguiar Alves: O Brasil possui uma das legislações mais rigorosas no mundo no que tange a produção, registro, comercialização e uso de agrotóxicos, mas data de 1989, ou seja, carece de adequação à nova realidade agrícola brasileira. A proposta em si mantém a essência da atual legislação e eu não acredito que vá flexibilizar as etapas envolvidas no processo de registro e utilização desses produtos, mas apenas proporcionar celeridade a algumas delas. Por exemplo: atualmente, o registro de um produto junto ao MAPA tramita em mais de um ministério, causando o dispêndio principalmente de tempo. Dada essa morosidade, há o risco de um produto ser lançado no mercado já caduco, ineficaz para aquilo para o qual foi desenvolvido. O processo de desenvolvimento e registro de um produto passa por uma série de filtros e esses serão mantidos, com a vantagem de o processo ser analisado por uma única comissão (Comissão Técnica Nacional de Fitossanitários - CTNFito), que possuirá os representantes técnicos desses ministérios, além de outros profissionais de notório saber na área, o que provavelmente levará a celeridade da tramitação, uma vez que limitará conclusão dos pleitos de registro em até 12 meses. CF: O projeto aprovado sofre críticas como a possibilidade de aprovação de produtos a partir de conceitos como “risco aceitável” e “risco inaceitável”, que poderiam dar margem a avaliações subjetivas. Alves: Pessoalmente não acredito nessa possibilidade, pois, como já mencionei, existem os filtros e uma série de profissionais e instituições envolvidos em todo o processo, incluindo os especialistas de cinco ministérios (MAPA, MS, MCT, MMA e MDIC), lembrando que a aprovação passará pelo crivo da comissão formada por 23 especialistas. CF: Pelo PL, as empresas podem pedir o registro provisório de um produto, antes da aprovação oficial, desde que ele já tenha sido liberado em três países da OCDE. Os críticos dessa medida dizem que muitos países da OCDE não são bons exemplos em relação à liberação de agrotóxicos...
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PROJETO DE LEI SOBRE AGROTÓXICOS NA CONTRAMÃO DAS GERAÇÕES FUTURAS
Legislação atual é rigorosa e a nova proposta não deverá flexibilizar processo de registro e uso desses produtos Alves: Atualmente nós temos o Registro Especial Temporário para fins de pesquisa e experimentação de produtos (técnicos, técnicos similares, etc.) visando ao registro definitivo. O que o PL propõe é que o registro temporário seja liberado quando esses produtos já estiverem registrados para culturas similares em pelo menos três países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que adotem, nos respectivos âmbitos, o Código Internacional de Conduta sobre a Distribuição e Uso de Pesticidas da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Essa solicitação deverá passar pela avaliação da CTNFito, que deverá ter o discernimento ao julgar a qualificação dos países referenciados. CF: Há também quem argumente que o PL não prevê a reavaliação cíclica dos produtos disponíveis no mercado. O que o sr. acha? Alves: Essa reavaliação já é naturalmente feita pelos usuários, pelo mercado consumidor e pelas instituições de pesquisa, o que leva à restrição de uso quando um produto é colocado sob suspeição. Além disso, como inovação, o PL estabelece a tipificação penal, estabelece o alcance da responsabilidade (civil e administrativa) por eventuais danos causados à saúde das pessoas e ao meio ambiente, quando da produção, comercialização, utilização, transporte e destinação de embalagens vazias de defensivos fitossanitários, de controle ambiental e afins, ao profissional, usuário ou prestador de serviços, ao comerciante, ao registrante e ao formulador. Essa medida deverá coibir eventuais desvios no processo de utilização de agrotóxicos.
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Antonio Fernando Monteiro Camargo
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inha neta Isabel me perguntou hoje à tarde se eu poderia levá-la ao “círculo”. Nestes dias há um circo aqui em Piracicaba e o “círculo” da Isabel é o circo. Quando criança, o circo tinha vários animais, como elefantes, macacos, cachorros amestrados. Quando eu era um jovem pai, levei meus filhos ao circo em que um mágico fazia desaparecer um tigre da jaula e surpreendentemente aparecer no alto da lona, mágica... truque. [...] Hoje não se pode ter mais animais no circo, pois os animais são amestrados, sofrem e são maltratados. Automóveis sem equipamentos de segurança eram corriqueiros há algumas décadas. Na atualidade, os carros são obrigados por lei a ter cintos de segurança, air bags, freios abs e outras coisas que são importantes para a segurança do motorista e dos passageiros, além de equipamentos que reduzem a poluição do ar, como catalisadores no escapamento. [...] Esses exemplos mostram que nos dias de hoje há um cuidado muito maior com a saúde e com o meio ambiente. A partir da década de 1950, devido ao crescimento populacional e à necessidade de aumento da produção de alimentos, as práticas agrícolas foram modificadas e o uso de substâncias químicas para controle de pragas passou a ser utilizado. [...] Em 1962, foi publicado o livro Primavera silenciosa, de Rachel Carson, bióloga marinha, ecologista e escritora, no qual ela denunciava os prejuízos causados pelo pesticida DDT ao ambiente e especialmente aos ovos de pássaros. Em 1972, o DDT teve sua utilização proibida. A partir daí as leis passaram a ser mais rigorosas em relação aos estudos de risco ao ambiente e à saúde humana na utilização de agrotóxicos. O modelo de produção agrícola com grandes monoculturas favorece a ocorrência de organismos que utilizam esses vegetais como fonte de alimento e que para o produtor são uma “praga”, pois competem com ele pela produção vegetal e causam prejuízos econômicos. No entanto, não somente os organismos “praga” são afetados, pois os agrotóxicos, além de prejudiciais à saúde humana, também são prejudiciais ao meio ambiente e à biodiversidade. Nos países da União Europeia (UE), já há vários anos existe um movimento para a restrição do uso de pesticidas (denominação UE). Por exemplo, a Diretiva 2009/128/CE estabelecida há quase 10 anos tem como objetivo a utilização sustentável dos pesticidas para redução dos
Na União Europeia, há um movimento para a restrição do uso de pesticidas riscos para a saúde humana e para o meio ambiente. Alguns pontos que considero importantes destacar são: 1. a proibição de pulverização aérea; 2. proteger as águas, sobretudo a água destinada ao consumo humano, dos efeitos dos pesticidas; 3. assegurar que a utilização de pesticidas seja minimizada ou proibida em certas zonas, como os parques públicos, parques infantis, campos desportivos ou perto de instalações de prestação de cuidados de saúde. Recentemente, em 27 de abril deste ano, a União Europeia proibiu a utilização de três pesticidas (imidacloprid, clotianidina e tiametoxam) que são prejudiciais às abelhas. [...] No Brasil estamos caminhando na contramão dos países desenvolvidos, pois no final de junho o projeto de lei (PL) que modifica o registro de agrotóxicos foi aprovado em uma comissão da Câmara de Deputados. Nesse projeto de lei a liberação de um novo produto fica centralizada no Ministério da Agricultura, tirando poder decisório da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). O projeto também diminui para dois anos o tempo máximo de registro de um novo agrotóxico. O PL proposto passa a desconsiderar o risco à saúde humana e ao ambiente, o que é um retrocesso enorme. O ideal é restringirmos ao máximo o uso de venenos para controle de organismos vivos para conservarmos a biodiversidade, o ambiente e a saúde humana. Minha esperança é que minha neta Isabel viva em um mundo mais saudável quanto à saúde das pessoas e do ambiente. Não vamos deixar que o Congresso Nacional aprove um projeto de lei que é um retrocesso enorme!
Antonio Fernando Monteiro Camargo é professor do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências, Câmpus da Unesp de Rio Claro. A íntegra deste artigo está disponível no “Debate Acadêmico” do Portal Unesp, no endereço: <https://bit.ly/2Msmh6B>.
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A IMPORTÂNCIA DA MODERNIZAÇÃO DA LEI DOS AGROTÓXICOS 123RF
Caio Antonio Carbonari e Edivaldo Domingues Velini
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agricultura brasileira vem incorporando continuamente inovações ligadas a produtos, processos e organização, mas ainda tem dificuldades em produzir e difundir bases de informações que contribuam para o seu desenvolvimento e sustentabilidade. [...] De forma recorrente é dado destaque ao fato de o Brasil ser o maior consumidor mundial de agrotóxicos, apenas levando-se em consideração o valor comercializado. No entanto, a análise das informações sobre uso de agrotóxicos demanda a normalização dos dados por área cultivada ou por quantidade de produção. Após a normalização das informações dos valores referentes ao uso de agrotóxicos por unidade de área, observa-se que o Brasil ocupa a sétima posição entre 20 países analisados, tendo à sua frente Japão, Coreia do Sul, Alemanha, França, Itália e Reino Unido. Quando a normalização é feita por quantidade produzida, o Brasil passa a ocupar a décima terceira posição, sendo superado também por Canadá, Espanha, Austrália, Argentina, Estados Unidos e Polônia. Mais importante do que discutirmos o volume ou valor do consumo de agrotóxicos por área ou produção é avançarmos na análise do risco dos defensivos que estamos consumindo. A análise de risco é mais adequada para garantirmos o uso seguro das tecnologias utilizadas na proteção de plantas. [...] Uma das ferramentas já consolidadas e com grande aceitação por agências reguladoras e instituições de pesquisa no mundo é o EIQ (environmental impact quotient of pesticides – quociente de impacto ambiental), desenvolvido em 1992 por pesquisadores do New York State Integrated Pest Management (Kovach et al., 1992). O EIQ permite quantificar e estabelecer comparações quanto ao risco do consumo de defensivos agrícolas, levando em consideração uma série de fatores, como a dose de ingrediente ativo aplicada, características físico-químicas e toxicológicas e dinâmica ambiental de cada composto. Essa ferramenta permite ainda avaliar o risco associado a diferentes componentes, sendo
A lei vigente está totalmente superada do ponto de vista técnico-científico eles o consumidor dos produtos agrícolas, o trabalhador envolvido na manipulação e aplicação e o ambiente. Quando fazemos o levantamento do EIQ para o uso de todas as classes de agrotóxicos no Brasil, em algumas das culturas mais importantes quanto a área plantada e consumo de agrotóxicos (milho, soja, cana-de-açúcar e algodão), no período de 2002 a 2015, os resultados evidenciam o uso racional de defensivos agrícolas no Brasil e demonstram que os EIQs associados a essas culturas são iguais ou em muitos casos inferiores aos EIQs de outros importantes países produtores destas culturas. Mais do que isso, quando analisamos o EIQ médio para cada aplicação de defensivos para o conjunto de informações dessas quatro culturas, observamos uma tendência muito significativa de queda nos riscos. No período de 2002 a 2015 tivemos uma redução de 51%, 37%, 34% e 38% nos valores de EIQs, respectivamente para o trabalhador, consumidor, ambiente e campo (correspondendo à média dos três componentes). Tão importante quanto proibir ou postergar o uso de agrotóxicos que podem causar danos ou riscos é permitir o acesso rápido àqueles que, à luz da ciência, sejam considerados úteis e seguros. Vários dos agrotóxicos que aguardam registro no Brasil já são utilizados em muitos países e apresentam valores de EIQ significativamente inferiores aos que se encontram em uso no nosso país. Um outro ponto é que a partir da convergência científica internacional têm sido construídos procedimentos e conceitos que embasam a convergência regulatória,
fundamental para a livre circulação de alimentos e outros produtos agrícolas. Sendo um dos maiores produtores e grande exportador de alimentos, fibras e bioenergia, o Brasil precisa incorporar às suas normas os princípios que norteiam essa convergência regulatória. Um exemplo é a substituição das análises de periculosidade por análises de risco quando da avaliação e decisão sobre a segurança de novas tecnologias. A avaliação de risco considera a variável exposição e deve ser sempre conduzida em condições práticas de uso. A lei de agrotóxicos vigente no Brasil (lei n° 7.802, de julho de 1989) ainda é fundamentada na análise de perigo e não contempla os conceitos de análise de risco, o que já é amplamente adotado nos principais países desenvolvidos há mais de duas décadas. Além dessa falha, a lei vigente antecede e, portanto, não incorpora conceitos relacionados à nanotecnologia, biotecnologia e agricultura digital, estando completamente superada do ponto de vista técnico-científico. A convergência regulatória internacional também tem como princípio a análise caso a caso. Não se pode tomar a parte pelo todo nem o todo pela parte. As avaliações devem ser construídas a partir do conhecimento técnico e científico disponível. Não se pode dar credibilidade a avaliações e julgamentos de cunho ideológico e genéricos. Quem quiser opinar sobre o assunto deve fazê-lo de modo objetivo e à luz da ciência e do conhecimento.
*Kovach, J., C. Petzoldt. J. Degni, and J. Tette. 1992. A method to measure the environmental impact of pesticides. N.Y. Food Life Sci. Bull. 139. Caio Antonio Carbonari e Edivaldo Domingues Velini são professores da Faculdade de Ciências Agronômicas, Câmpus da Unesp de Botucatu. A íntegra deste artigo está disponível no “Debate Acadêmico” do Portal Unesp, no endereço: <https://bit.ly/2Msmh6B>.