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ENTREVISTA DE CAPA OTÁVIO DAMASO Diretor de Regulação do BC

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ACREFI SOCIAL

ACREFI SOCIAL

Otávio Damaso

Diretor de Regulação do Banco Central

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Visão muito além do ESG

Não é de hoje que o Banco Central do Brasil encara com muita seriedade os princípios do ESG (ambiental, social e governança, em português). Desde 2014, a instituição máxima do Sistema Financeiro Nacional está atenta e dedicada à evolução das questões relacionadas a sustentabilidade social, ambiental e climática no universo dos negócios e tudo o que envolve os stakeholders. Para mergulharmos mais fundo nesse tema, que já impacta na formação e na sobrevivência das próximas gerações, a Financeiro entrevista Otávio Damaso, diretor de Regulação do Banco Central, sobre ações de sustentabilidade e governança entre as instituições financeiras, o impacto dos riscos sociais e climáticos nos investimentos, monitoramento e relatórios oficiais de prestações de contas sob a ótica do gerenciamento de riscos, das estratégias e da governança. “O adequado gerenciamento do risco social, do risco ambiental e do risco climático reduz a possibilidade de as instituições incorrerem em perdas e contribui para a manutenção de sua solvência”, garante Damaso. A seguir, leia a entrevista completa com o diretor de Regulação do BC.

Já tem um tempo que o BC abraçou os princípios ESG; de que maneira pretende estimular ainda mais as ações de sustentabilidade e governança entre as instituições que fazem parte do Sistema Financeiro Nacional?

O Banco Central do Brasil foi pioneiro no tratamento de questões relacionadas aos princípios ESG, com a edição da Resolução CMN nº 4.327, de 2014, que determina às instituições financeiras o gerenciamento do risco socioambiental e o estabelecimento da Política de Responsabilidade socioambiental (PRSA). Os debates sobre o assunto vêm ganhando posição de destaque em fóruns internacionais, com foco sobretudo nos desdobramentos dos compromissos assumidos no Acordo de Paris, de 2015, e nos possíveis impactos das mudanças climáticas para o setor financeiro. O assunto é especialmente relevante quando considerada a ocorrência de eventos meteorológicos cada vez mais frequentes e extremos e o processo de

transição para uma economia de baixo carbono, em que a emissão de gases do efeito estufa é reduzida ou compensada e os mecanismos naturais de captura desses gases são preservados.

Diante desse cenário, o BCB realizou consulta pública de proposta de aprimoramento normativo, com vistas a aperfeiçoar o tratamento do tema ESG, agora incorporando a dimensão relativa à mudança climática, no arcabouço regulatório brasileiro. Além do reforço na conceituação do risco social, do risco ambiental e do risco climático, passam a ser aplicados aos três riscos os mesmos requisitos estabelecidos na Resolução CMN 4.557, de 2017, para os riscos tradicionais (como o risco de crédito, o risco de mercado, o risco operacional e o risco de liquidez). Os três riscos (social, ambiental e climático) devem ser incluídos nos testes de estresse, na Declaração de Apetite por Risco (RAS) e no plano de continuidade de negócios, entre outros aspectos. Além disso, são estabelecidos requisitos específicos para cada um desses riscos. Fica explicitado que a governança do gerenciamento desses três riscos é a mesma aplicável aos riscos tradicionais, com as mesmas responsabilidades atribuídas ao conselho de administração, ao comitê de riscos, ao diretor de riscos e à diretoria da instituição. Quanto à política de responsabilidade, passa a ser exigida das instituições financeiras a Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática (PRSAC), contendo princípios e diretrizes voltados à contribuição da instituição para a sustentabilidade nas dimensões social, ambiental e climática, por meio de seus negócios e da sua relação com stakeholders. A PRSAC deve ser divulgada juntamente com as ações voltadas a garantir sua efetividade e com os critérios de avaliação dessas ações. Por fim, o BCB propõe que as instituições financeiras divulguem informações sobre os três riscos, cobrindo aspectos, como o gerenciamento, a governança e as estratégias. Mais à frente, serão acrescentadas informações sobre métricas e metas. Essa iniciativa é inspirada nas recomendações da Task Force on Climate-related Financial Disclosures (TCFD), força-tarefa dedicada ao tema climático. O Brasil mostra-se pioneiro mais uma vez, ao incluir nas divulgações não apenas aspectos climáticos, mas também os relativos aos temas social e ambiental.

“O assunto é especialmente relevante quando considerada a ocorrência de eventos meteorológicos cada vez mais frequentes e extremos e o processo de transição para uma economia de baixo carbono”

Na avaliação do BC, como os riscos sociais e climáticos afetam diretamente os interesses dos investidores e dos poupadores brasileiros?

O interesse primordial de investidores é o retorno de seu investimento, assim como o interesse primordial de poupadores é a preservação do valor poupado. Nesse sentido, o adequado gerenciamento do risco social, do risco ambiental e do risco climático reduz a possibilidade de as instituições incorrerem em perdas e contribui para a manutenção de sua solvência. As regras de transparência permitem o conhecimento, por investidores e poupadores, sobre o gerenciamento de riscos efetuado pela instituição da qual são clientes, bem como a possibilidade de comparação com o gerenciamento conduzido pelas demais instituições, o que contribui para a disciplina de mercado, em benefício da redução de riscos e, portanto, de perdas.

“O adequado gerenciamento do risco social, do risco ambiental e do risco climático reduz a possibilidade de as instituições incorrerem em perdas e contribui para a manutenção de sua solvência”

Em alguns países da União Europeia, os relatórios de sustentabilidade das instituições já têm a mesma importância, exigências e responsabilidades dos relatórios financeiros. Isso também deve começar a fazer parte no futuro das obrigações das instituições que participam do SFN?

Sim. Conforme a proposta normativa da consulta pública 85, as instituições do Sistema Financeiro Nacional deverão publicar a sua Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática (PRSAC), juntamente com as ações destinadas a assegurar a efetividade dessa política e os critérios utilizados em sua avaliação. Já a proposta da Consulta Pública 86 é de que essas instituições publiquem, segundo uma abordagem de proporcionalidade, o relatório de Riscos e Oportunidades Sociais, Ambientais e Climáticas (Relatório GRSAC), abordando o tratamento dado às questões sociais, ambientais e climáticas sob a ótica do gerenciamento de riscos, das estratégias e da governança. A versão final dos normativos referentes à PRSAC e ao relatório GRSAC deve ser editada em setembro de 2021.

A “competição” entre as instituições financeiras pela adoção e execução de ações amparadas nos princípios ESG é avaliada com simpatia pelo BC?

Sim. A disciplina de mercado obtida por meio da transparência é o objetivo do requerimento de que sejam divulgadas tanto a Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática (PRSAC), juntamente com as ações para assegurar sua efetividade, quanto do relatório de Riscos e Oportunidades Sociais, Ambientais e Climáticas (GRSAC), objeto das consultas públicas 85 e 86.

Existe alguma atenção especial por parte do BC em examinar ou monitorar as ações de ESG implantadas pelas instituições financeiras?

A supervisão do Banco Central vem concentrando seus esforços na verificação da existência das políticas de responsabilidade socioambiental das instituições financeiras e da adequação de seus sistemas de gerenciamento de risco em relação a questões socioambientais, nos termos da Resolução 4.327/2014. Inclusive, os aspectos avaliados pela supervisão nos bancos estão disponíveis na página do Banco Central na internet, nos seguintes links: https://bit.ly/3rJGR82 e https://bit.ly/3xoYaN3

“O apetite crescente dos investidores por ativos relacionados a projetos com rótulo ESG tem permitido a emissão de títulos de dívida ou contratação de empréstimos com características mais favoráveis, movimento que tem sido chamado de ‘greenium’ ”

Em que medida o desenvolvimento de iniciativas voltadas à sustentabilidade das finanças deve impactar na oferta aos brasileiros de recursos com menor custo?

Os investidores têm sido ávidos por investimentos com o rótulo ESG. Isso é mais evidente em relação aos investidores estrangeiros, mas cada vez mais o mercado doméstico tem se interessado por esses ativos. O mercado brasileiro oferece oportunidades diferenciadas para o desenvolvimento de produtos desse tipo. O apetite crescente dos investidores por ativos relacionados a projetos com esse rótulo, especialmente os voltados para o aspecto ambiental, tem permitido a emissão de títulos de dívida ou contratação de empréstimos com características mais favoráveis, movimento que tem sido chamado de “greenium”.

Entre as iniciativas propostas pelo BC está a criação do bureau de crédito rural verde; como funcionará esse importante instrumento nos investimentos direcionados ao segmento produtivo?

O Bureau de Crédito Rural Sustentável é um projeto que envolve o aprimoramento do atual Sistema das Operações de Crédito Rural e do Proagro (Sicor). Atualmente, todas as operações de crédito rural concedidas no Sistema Financeiro Nacional devem ser registradas no Sicor. Com o projeto do bureau, o Sicor será integrado a diversas bases de dados governamentais, que serão consultadas de maneira on-line e em tempo real, no momento do registro da operação no sistema. Esse cruzamento permitirá identificar, por exemplo, se financiamentos rurais estão sendo concedidos em áreas embargadas pelo Ibama ou em terras indígenas. Nos casos em que a regulamentação não permite expressamente a exploração, haverá a recusa da contratação da operação. Além disso, o bureau operará sob a lógica do open finance. Assim, mediante autorização do mutuário, instituições financeiras, certificadoras, investidores e fundos poderão acessar as informações detalhadas das operações de crédito rural. Essa funcionalidade, aliada à inclusão de novos campos que captam informações relativas a características sustentáveis dos empreendimentos financiados, permitirá que os agentes de mercado identifiquem produtores com práticas sustentáveis e possam ofertar operações de crédito com mais vantagens e menores custos ao mutuário. f

Jul/2021 - Jul/2022

Diversidade e inclusão: avanços urgentes e necessários

Acrefi abre espaço para a relevância das organizações, no sentido de criarem equipes profissionais e ambientes de trabalho mais seguros e inclusivos, com equidade de gênero e de salário

Acrefi abre espaço para a relevância das organizações, no sentido de criarem equipes profissionais e ambientes de trabalho mais seguros e inclusivos, com equidade de gênero e de salário.

As questões relativas a diversidade e inclusão ganham cada vez mais espaço na agenda dos executivos em sintonia com os avanços necessários e exigidos pela sociedade. Eles buscam formar e organizar equipes com olhar plural, abertas às novas diretrizes e ambientes de trabalho mais seguros e inclusivos, com equidade de gênero e salário. Foi pensando nessa nova mentalidade corporativa que a Acrefi promoveu, dia 28 de julho, a live “Diversidade & Inclusão: Sinônimo de Negócios Sustentáveis”. O encontro contou com a participação de Ana Paula Antunes Tarcia, diretora de Pessoas e Cultura do Banco BV; José Vicente, fundador e reitor da Universidade Zumbi dos Palmares; e Carolina Cavenaghi, cofundadora e CEO da Fin4she (plataforma de conexão do ecossistema financeiro para mulheres e marcas). A mediação foi conduzida pela advogada Cintia Falcão, consultora Jurídica da Acrefi.

Antes do início das explanações, Luis Eduardo da Costa Carvalho, presidente da Acrefi, destacou a importância da participação da associação no movimento pela diversidade e inclusão. “Isso faz parte do meu DNA, do DNA da Lecca, que é a empresa que eu fundei e presido há mais de 46 anos. Essa temática ganha uma importância maior, tanto no Brasil como no exterior, mas sempre estiveram presentes no nosso dia a dia”, comentou.

Mediadora do evento, Cintia Falcão, preliminarmente, ressaltou que a diversidade e inclusão estão totalmente aderentes à agenda ESG. “Estimativas do IBGE de 2020 indicam que a população brasileira, hoje com um pouco mais de 200 milhões de habitantes, é composta por uma equivalência entre homens e mulheres. 56% são negros, 17% se identificam como LGBTQIA+, 25% dessas pessoas estão acima de 50 anos, entre muitas outras diferenças ou semelhanças. A diversidade vai muito além das campanhas publicitárias que a gente tem visto por aí ou por meio de manifestos inspiradores. É preciso agir”, afirmou.

Na avaliação de José Vicente, reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, a realidade e os desafios de inclusão de negros no mercado de trabalho, ao longo dos últimos 20 anos, apresentaram progressos e realizações muito importantes, como o estabelecimento de cotas em universidades e no poder público. Nesse

LUIS EDUARDO DA COSTA CARVALHO

Presidente da Acrefi

ANA PAULA TARCIA

Diretora de Pessoas e Cultura do Banco BV

JOSÉ VICENTE

Fundador e reitor da Universidade Zumbi dos Palmares

CAROLINA CAVENAGHI

Cofundadora e CEO da Fin4she

CINTIA FALCÃO

Consultora Jurídica da Acrefi

período, a participação do negro em instituições públicas de ensino superior passou de 2% para 16%. “Saímos do zero, caminhamos 20 anos, do ponto de vista da estrutura estatal, cumprimos todas as etapas, foram criadas ações importantes, com resultados bastante significativos”, ponderou José Vicente.

Negros nos ambientes corporativos

Do ponto de vista empresarial, o acadêmico da Universidade Zumbi dos Palmares considera que a discussão saiu da negação do racismo no ambiente corporativo, seguido de medidas paliativas, como estágios para negros, para a presença de negros nos cargos de direção. “Esse é o panorama que encontramos atualmente e que vem reforçado por conta do ESG que, no Brasil, precisa ter o recorte racial para se cumprirem os fundamentos.

PATROCÍNIO Trabalhar a pluralidade

Para Ana Paula Antunes Tarcia, diretora de Pessoas e Cultura do Banco BV – reconhecido pela Great Place to Work como uma das melhores empresas para se trabalhar – o tema da diversidade e inclusão é estratégico e relevante para todos os desafios que temos aqui no banco. Trabalhar a pluralidade é ter a representatividade da nossa sociedade dentro do BV, uma premissa dentro do nosso princípio de cultura, que é ser correto e ser íntegro. E isso faz toda a diferença tanto na atratividade, quanto na retenção e nos negócios”, contou.

Juntos, somos melhores

Carolina Cavenaghi, cofundadora e CEO da Fin4she, compartilhou com a audiência da live da Acrefi a maneira como seu trabalho, dentro da plataforma digital, promove a equidade de gênero no ecossistema financeiro. “Temos que tirar esse viés que trata uma causa como uma questão econômica. Quando falamos em mulheres nas empresas, não estamos falando que elas são melhores que os homens, ou que eles que sejam melhores. O que defendemos é a capacidade de produzirmos melhor pela diversidade, é a capacidade de inovação. Juntos, somos melhores”, resumiu. “Quando pensamos em números, no ambiente de negócios, estudos mostram que é de 93% a probabilidade de as empresas que têm diversidade de gênero superarem a performance financeira dos seus concorrentes”, concluiu.

Acesse o link e assista a live: https://bit.ly/3zVAh1g f

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