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QUÍMICA INORGÂNICA BÁSICA
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Antonio Andrade de Oliveira (Autor)
Antonio Carlos Massabni (Organizador)
QUÍMICA INORGÂNICA BÁSICA
Química Inorgânica Básica
© 2024 Luiz Antonio Andrade de Oliveira
Antonio Carlos Massabni (organizador)
Editora Edgard Blücher Ltda.
Publisher Edgard Blücher
Editores Eduardo Blücher
Pré-produção Aline Fernandes
Coordenador editorial Rafael Fulanetti
Coordenação de produção Andressa Lira
Produção editorial Lidiane Pedroso Gonçalves
Preparação de texto Ana Lúcia dos Santos
Diagramação Roberta Pereira de Paula
Revisão de texto Maurício Katayama
Capa Laércio Flenic
Imagem da capa João Gião Borges
Rua Pedroso Alvarenga, 1245, 4o andar 04531-934 – São Paulo – SP – Brasil
Tel.: 55 11 3078-5366 contato@blucher.com.br www.blucher.com.br
Segundo o Novo Acordo Ortográfico, conforme 6. ed. do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, Academia Brasileira de Letras, julho de 2021.
É proibida a reprodução total ou parcial por quaisquer meios sem autorização escrita da editora.
Todos os direitos reservados pela Editora Edgard Blücher Ltda.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Angélica Ilacqua CRB-8/7057
Oliveira, Luiz Antonio Andrade de Química Inorgânica Básica / Luiz Antonio Andrade de Oliveira. – São Paulo : Blucher, 2024. 672 p.
Bibliografia
ISBN 978-85-212-2066-4
1. Química Inorgânica Básica I. Título II. Série
23-6355
CDD 546.014
Índices para catálogo sistemático:
1. Química Inorgânica Básica
CONTEÚDO
1.1 Histórico da evolução do modelo atômico atual 15
1.2 Espectro de raias do átomo de hidrogênio 17
1.3 Radiação de corpo negro e a necessidade do conceito de quantização 19
1.4 Efeito fotoelétrico e sua explicação por Einstein – extensão do conceito de quantização à radiação eletromagnética 24
1.5 O modelo de Bohr para o átomo de hidrogênio e seu espectro atômico 27
1.6 A extensão do modelo de Bohr por Sommerfeld 32
1.7 O caminho para o desenvolvimento da mecânica ondulatória 36
1.8 A equação de Schrödinger e a mecânica ondulatória 43
1.9 A equação de onda aplicada ao átomo de hidrogênio 51
1.10 O átomo de hidrogênio e o quarto número quântico 79
1.11 O momento angular total J – o acoplamento spin-órbita 84
1.12 Átomos polieletrônicos segundo a abordagem ondulatória 93
1.13 Periodicidade química e tabela periódica 136
2. LIGAÇÃO QUÍMICA
2.1 Estrutura de Lewis dos átomos 170
2.2 A ligação covalente e a regra do octeto 170
2.3 Os pares de elétrons e a previsão da geometria molecular 183
2.4 Teorias da ligação covalente – TLV e TOM 192
3. ESTRUTURAS E LIGAÇÕES QUÍMICAS
NO
3.1 Classificação dos compostos sólidos 258
3.2 Ligação metálica 261
3.3 Raios metálicos 269
3.4 Interstícios existentes nas estruturas metálicas de empacotamento denso 271
3.5 Ligas metálicas 272
3.6 Teorias da ligação metálica 275
3.7 Condutores, isolantes e semicondutores intrínsecos 281
3.8 Ligação iônica 291
3.9 Raios iônicos 304
3.10 A energia envolvida em uma ligação iônica –energia reticular 315
3.11 Cálculo teórico da energia reticular 317
3.12 Ligações covalentes estendidas 327
3.13 Forças intermoleculares de Van der Waals (ou de dispersão de London) 331
3.14 Ligações de Van der Waals, estruturas de sólidos e raios de Van der Waals 338
3.15 Interações repulsivas e ligação de Van der Waals 342
3.16 Ligações químicas intermediárias 344
4.
3.17 Classificação de sólidos em termos da estrutura 365
3.18 Sólidos reais e defeitos 378
SIMETRIA E QUÍMICA
385
4.1 Introdução 385
4.2 Elementos e operações de simetria em entidades moleculares isoladas 389
4.3 As operações de simetria de uma molécula como um grupo matemático 393
4.4 Grupos pontuais e classificação de moléculas nesses grupos 405
4.5 Aplicação dos conceitos de simetria em propriedades de moléculas 439
4.6 Teoria de grupo, simetria molecular e aplicações em Química 445
5. DESCRIÇÃO DE MOLÉCULAS E SUAS PROPRIEDADES
PELA TEORIA DE GRUPO – REPRESENTAÇÕES REDUTÍVEIS E IRREDUTÍVEIS 483
5.1 Obtenção das representações redutíveis envolvidas na descrição das vibrações da molécula de H2O 484
5.2 Desdobramento de uma representação redutível em suas componentes irredutíveis 486
5.3 Modos vibracionais da molécula de NH3 491
5.4 Decomposição dos modos de vibrações fundamentais das moléculas de H2O e NH3 – operador de projeção e combinações lineares adaptadas por simetria (CLAS) 493
5.5 Aplicação da teoria de grupo a orbitais moleculares 504
5.6 Orbitais moleculares e espectros eletrônicos de moléculas lineares 572
5.7 Regras de seleção de transições eletrônicas em moléculas lineares 595
5.8 O caso do espectro eletrônico de absorção do oxigênio molecular 597
APÊNDICE 1 – DATAS APROXIMADAS DE ALGUNS
EXPERIMENTOS E TEORIAS IMPORTANTES PARA O DESENVOLVIMENTO DOS MODELOS DO ÁTOMO
DIVISÍVEL, DA ESTRUTURA ATÔMICA E DA LIGAÇÃO QUÍMICA ATUAIS A PARTIR DO SÉCULO XIX
APÊNDICE 2 – MODELOS DE SÓLIDOS PLATÔNICOS
COMO INSTRUMENTO DE TREINAMENTO NA IDENTIFICAÇÃO DE ELEMENTOS E OPERAÇÕES DE SIMETRIA PRESENTES NUMA ESTRUTURA
APÊNDICE 3 – CONCEITOS MATEMÁTICOS BÁSICOS
609
615
PARA O DESENVOLVIMENTO DA TEORIA DE GRUPO 619
APÊNDICE 4 – TABELAS DE CARACTERES DOS GRUPOS DE SIMETRIA IMPORTANTES NA ÁREA DE QUÍMICA INORGÂNICA
APÊNDICE 5 – PRODUTOS DIRETOS DE REPRESENTAÇÕES IRREDUTÍVEIS
APÊNDICE 6 – SIMETRIA DE COMBINAÇÕES LINEARES
ADAPTADAS POR SIMETRIA (CLAS) E DE ORBITAIS ATÔMICOS NOS GRUPOS DE SIMETRIA MAIS COMUNS EM QUÍMICA INORGÂNICA
REFERÊNCIAS
637
651
653
669
CAPÍTULO 1
O átomo isolado e sua estrutura
1.1 HISTÓRICO DA EVOLUÇÃO DO MODELO ATÔMICO ATUAL
Ao final do século XIX, a Química encontrava-se numa posição peculiar, pois era capaz de correlacionar um corpo muito grande de dados por meio das leis dos gases, as relações empíricas de massa e as ideias de valência e periodicidade dos elementos, sem ter qualquer conhecimento sobre a estrutura interna dos átomos envolvidos. A visão predominante sobre o átomo era a do átomo indivisível decorrente do modelo atômico de Dalton. Embora já houvesse evidências sobre a natureza elétrica da matéria e a divisibilidade do átomo, especialmente devido às descobertas do elétron e do próton como constituintes fundamentais da matéria, somente em 1911, com a proposição do modelo nuclear do átomo por Rutherford, passou-se a ter o primeiro modelo de átomo divisível. Nesse modelo, praticamente a totalidade da massa do átomo é descrita como concentrada em um núcleo pequeno, em comparação com o tamanho do átomo, composto por cargas positivas, com os elétrons dispostos ao redor desse núcleo a uma grande distância.
O caminho desde esse modelo inicial do átomo divisível até o aceito atualmente envolveu uma mudança radical nos paradigmas da Física vigentes na época. Até a segunda metade do século XIX, a Física Clássica, baseada na Mecânica Newtoniana, era capaz de explicar com sucesso desde o movimento de moléculas no interior dos gases e trajetórias de projéteis até as órbitas de cometas e planetas. No entanto, nas duas últimas décadas do século XIX, começaram a surgir observações envolvendo o comportamento de átomos e a interação da radiação com a matéria, que não podiam ser explicadas pelos conceitos da Física Clássica, como a radiação do corpo negro, o
efeito fotoelétrico e os espectros atômicos de emissão. O primeiro problema surgido seria explicar a própria estabilidade do átomo divisível, formado por partículas de cargas opostas, cuja tendência natural é se atraírem. Segundo os paradigmas da Física Clássica, isso levaria irremediavelmente à destruição do átomo, que sabemos ser estável.
A solução dessas incompatibilidades levou à reformulação de um conceito arraigado na Física Clássica: o da variação contínua da energia. Para explicar os fenômenos relacionados com os sistemas atômicos, foi necessário abandonar esse conceito, com a introdução do conceito de quantização, segundo o qual a energia do sistema só pode assumir valores discretos, que são múltiplos de um valor unitário de energia, o quantum. A introdução desse conceito teve profundas implicações sobre o desenvolvimento do modelo de átomo, levando ao modelo ondulatório probabilístico, aceito até os dias de hoje, em que as partículas do átomo divisível são mais bem descritas em termos de probabilidades.
Ao resolverem problemas da Física, cientistas como Max Planck, Albert Einstein, Niels Bohr, Louis de Broglie, Werner Heisenberg, Erwin Schrödinger, entre outros, tiveram papel importante no entendimento da estrutura do átomo e da ligação química. A introdução dos conceitos quânticos na Química influenciou fortemente o seu desenvolvimento durante todo o século XX por meio da Química Quântica. Para se avaliar a importância e o impacto desta, basta citar que, embora os seus conceitos básicos já estivessem estabelecidos por volta de 1930, em 1998, John A. Pople e Walter Kohn receberam o Prêmio Nobel de Química, pelo desenvolvimento de métodos quânticos de cálculos de propriedades de moléculas.
No Apêndice 1, é apresentada uma relação das teorias e dos experimentos mais importantes no desenvolvimento do modelo do átomo divisível, com pequeno resumo biográfico de cada cientista envolvido no processo. A relação representa escolhas pessoais do autor da obra e não pretende ser completa. Aos interessados nos detalhes históricos dessa evolução, recomenda-se consulta às obras listadas a seguir.
Textos clássicos
JA FFE, B. (1994). Cr ucibles: The History of Chemistry from Ancient Alchemy to Nuclear Fission Dover Publications.
LEICESTER, H. M. (1971). The Historical Background of Chemistry. Dover Publications.
PARTINGTON, J. R. (1989). A Short History of Chemistry. Dover Publications.
Textos mais recentes
GOLDFARB, A. M. A. (1987). Da alquimia à química. 1ª ed. Nova Estela Editorial.
GREENBERG, A. (2000). A Chemical History Tour : Picturing Chemistry from Alchemy to Modern Molecular Science. 1ª ed. John Wiley & Sons.
GREENBERG, A. (2009). Uma breve história da química. Blucher.
MAAR, J. H. (1999). Pequena história da química, vol. 1. Papalivros.
MAAR, J. H. (2019). Pequena história da química, vol. 2. Papalivros.
Textos de divulgação
CHASSOT, A. (1994). A Ciência através dos tempos. 1ª ed. Editora Moderna Ltda.
VANIN, J. A. (1994). Alquimistas e químicos: o passado, o presente e o futuro. 6ª ed. Editora Moderna Ltda.
1.2 ESPECTRO DE RAIAS DO ÁTOMO DE HIDROGÊNIO
Os estudos de descargas elétricas em gases a pressões variáveis foram iniciados em torno de 1860. A decomposição da radiação emitida por diferentes elementos gasosos por um prisma, ou rede de difração, de um espectrógrafo já havia mostrado que a radiação emitida não era contínua como um arco-íris, mas formada por raias descontínuas, com frequências características para cada elemento. Por meio da luz emitida, pode-se identificar o elemento emissor. O exemplo mais notável foi o da descoberta do elemento hélio no Sol, antes de ser descoberto na Terra, mediante a observação da luz solar, por J. N. Lockyer e E. Frankland, durante eclipse ocorrido em 18 de agosto de 1868. A comprovação da existência do hélio na atmosfera terrestre só foi feita mais tarde, em 1895, pelo cientista inglês William Ramsay. Pelos trabalhos com gases nobres, Ramsay foi agraciado com o Prêmio Nobel de Química, em 1904.
O espectro de emissão do hidrogênio atômico na região do visível, mostrado na Figura 1.1, já era bem conhecido nessa época.
λ = 6562,8Å
4861,3 4340,5 4101,7 3645,6 Ultravioleta Violeta Azul Vermelho
Em 1884, o professor suíço de escola secundária Johann Jakob Balmer encontrou uma fórmula empírica que permitia calcular com grande precisão os comprimentos de onda das raias observadas na região do visível. em Angstron n n comn 3645 6 4 345 2 2 ,
Por sua contribuição ao estudo do espectro do hidrogênio atômico, essa série espectral é hoje conhecida como série de Balmer.
Em 1890, o sucesso de Balmer levou o cientista sueco Johannes Robert Rydberg a procurar uma relação empírica para comprimentos de ondas para séries mais complexas de raias espectrais de elementos mais pesados. Sua equação, uma generalização da equação proposta por Balmer, foi modificada em 1908, pelo cientista suíço Walter Ritz, adquirindo a forma que conhecemos atualmente.
11 1 22 l R mn
(1.2) R constantedeRydberg cm mn 1 09678 10 12 345 51 , ,, ,,
Posteriormente, foram descobertas novas séries de raias na região do ultravioleta e do infravermelho, que receberam os nomes de seus descobridores. As séries conhecidas para o átomo de hidrogênio, com suas respectivas raias, podem ser calculadas, com excelente concordância com os valores experimentais, a partir da aplicação da equação de Rydberg (1.2), variando-se os valores de m e n, conforme mostrado na Tabela 1.1.
Tabela 1.1 – Séries espectrais do hidrogênio atômico calculadas a partir da equação de Rydberg, com os números inteiros m e n que deram origem às séries
1.3 RADIAÇÃO DE CORPO NEGRO E A NECESSIDADE DO CONCEITO DE QUANTIZAÇÃO
É mais ou menos intuitiva a noção de que corpos suficientemente aquecidos emitem radiação eletromagnética. Uma resistência elétrica aquecida em torno de 600 oC tem cor avermelhada. Se a resistência tiver sua temperatura gradativamente elevada, a cor emitida muda continuamente para alaranjada, amarela, azulada e, finalmente,
branca intensa. Há uma relação íntima entre a temperatura do corpo e a radiação emitida; ao ficar branca, a resistência está a uma temperatura superior à que apresenta quando está apenas avermelhada.
A radiação emitida por um corpo ideal em função apenas de sua temperatura, independentemente da natureza do corpo emissor, é conhecida como radiação de corpo negro. Esse corpo idealizado é um emissor perfeito, emitindo toda a faixa de radiação eletromagnética. Esse emissor perfeito é também um absorvedor perfeito, absorvendo indistintamente todos os comprimentos de onda eventualmente incidentes sobre sua superfície.
O corpo real que mais se aproxima de um corpo negro ideal é um forno oco, com paredes de grafite ou de metal polido, isoladas termicamente do ambiente, dotado de um dispositivo que permita o controle de sua temperatura interna e cujo único contato com o exterior seja feito por meio de um orifício. Toda a troca de radiação emitida ou absorvida pelo forno seria feita por esse orifício. Essa situação é representada na Figura 1.2, para o corpo negro atuando como emissor.
Figura 1.2 – Representação esquemática de corte de um corpo negro idealizado.
Fonte: Wehr e Richard (1965). Adaptada.
A radiação emitida por um corpo negro em uma dada temperatura fixa pode ser estudada, fazendo-se incidir a radiação emergente do orifício em um sistema de dispersão da radiação, um prisma ou uma rede de difração. Registrando-se essa radiação por um meio adequado e medindo-se a intensidade de radiação emitida em cada faixa
CAPÍTULO 2
Ligação química
Poucos elementos existem na natureza como átomos isolados. Com exceção da maioria dos gases nobres, os átomos dos elementos reagem entre si ou com átomos de outros elementos. Isto é, a maioria dos elementos encontra uma configuração mais estável formando ligações químicas com outros átomos. Assim, para ser bem-sucedido, qualquer conceito sobre a natureza do átomo deve ser capaz de explicar a formação da ligação química.
Antes mesmo do surgimento do conceito de átomo nuclear, o químico inglês William Ramsay (1852-1916) considerava a combinação química como resultado da interação de elétrons. Obviamente, a primeira abordagem consistente da ligação química teve de esperar o surgimento do primeiro modelo de átomo, proposto por Bohr em 1913. O trabalho de Bohr, complementado pelo de Sommerfeld, permitiu a colocação dos elétrons externos em algum tipo de distribuição orbital ao redor do núcleo. Em alguns anos, no período compreendido entre 1916 e 1920, Gilbert N. Lewis, Walther Kossel e Irving Langmuir chegaram independentemente a um esquema semelhante para abordar a formação de ligação química a partir da estrutura eletrônica dos átomos. Embora esse modelo de ligação tenha sido desenvolvido simultaneamente pelos pesquisadores mencionados, hoje é conhecido como o modelo de Lewis.
2.1 ESTRUTURA DE LEWIS DOS ÁTOMOS
É pouco conveniente escrever a estrutura eletrônica completa de um átomo quando se considera a ligação química, especialmente porque são somente os elétrons da última camada, os elétrons de valência, que estão envolvidos na ligação. Lewis propôs que os elétrons de um elemento fossem divididos em elétrons do “caroço” do átomo, correspondendo aos elétrons do gás nobre anterior, e os elétrons de valência, os elétrons que estão fora do “caroço” de gás nobre. Para o cloro, por exemplo, basta escrever [Ne]3s2 3p5, ou 3s2 3p5, em vez da estrutura eletrônica completa 1s2 2s2 2p6 3s2 3p5. Nesse caso, o “caroço”, correspondente à configuração 1s2 2s2 2p6 é representado por [Ne], neônio, o gás nobre anterior.
Lewis desenvolveu uma simbologia para representar a estrutura eletrônica dos átomos na qual o símbolo do elemento representa o caroço do átomo, e os elétrons externos são representados por pontos colocados ao redor do símbolo do elemento. Para o caso específico do cloro, a representação seria
na qual os sete pontos representam os elétrons de valência do cloro. As estruturas de Lewis para os primeiros dezoito elementos, apresentadas na Figura 2.1, tornam evidente porque suas propriedades apresentam periodicidade.
Figura 2.1 – Estrutura de Lewis dos dezoito primeiros elementos da tabela periódica.
2.2 A LIGAÇÃO COVALENTE E A REGRA DO OCTETO
Em 1916, Lewis sugeriu que uma ligação covalente é formada por um par de elétrons, localizado entre dois átomos. Os dois elétrons são compartilhados simultaneamente pelos dois átomos. Na maioria das moléculas, cada um dos dois átomos fornece um elétron para a formação da ligação.
Baseado na estabilidade dos gases nobres, com oito elétrons na camada de valência, e na observação de que os elementos do segundo período formam, na sua maioria, compostos nos quais estão rodeados por oito elétrons compartilhados, Lewis formulou a regra do octeto. Segundo essa regra, quando dois ou mais elementos se unem para formar uma molécula, eles distribuem seus elétrons externos de modo que, compartilhando um ou mais pares de elétrons, todos os elementos que formam a molécula têm os seus octetos satisfeitos, adquirindo a configuração eletrônica do gás nobre
mais próximo. Esse número “mágico”, na época, hoje é facilmente compreendido, lembrando que oito é exatamente o número de elétrons necessários para se preencher totalmente os orbitais da segunda camada eletrônica.
A explicação dos compostos formados pelo hidrogênio, com seu único elétron na camada de valência, exigiu tratamento especial. Para isso, o hidrogênio foi tratado como um átomo que tem sua camada de valência completa por apenas dois elétrons, em vez do octeto. Por essa razão, o átomo de hidrogênio compartilha outro elétron com outro átomo de hidrogênio, formando a molécula estável H2. Na molécula H2, cada átomo de hidrogênio adquire a estrutura eletrônica do gás nobre mais próximo, o hélio. Hoje, isso é facilmente entendido, considerando-se que os elementos da primeira camada só têm um orbital atômico disponível, podendo acomodar somente dois elétrons.
2.2.1 A REGRA DO OCTETO E MOLÉCULAS DIATÔMICAS HOMONUCLEARES
Consideremos o átomo de cloro com seus sete elétrons na camada de valência. Para se completar seu octeto e fazer com que atinja a configuração eletrônica do gás nobre neônio, ele precisa compartilhar apenas um elétron. Esse elétron pode ser suprido pela interação com outro átomo de cloro, como mostrado a seguir.
C C
Com o compartilhamento do par de elétrons pelos dois átomos de cloro, os octetos dos dois átomos são satisfeitos, dando origem a uma molécula diatômica Cl2 , mais estável que os dois átomos de cloro isolados. O par de elétrons compartilhado dá origem a uma ligação simples entre os dois átomos de cloro, também representada por
C C
onde o traço entre os dois átomos de cloro representa a ligação química formada entre eles. Observando-se os pares de Lewis ao redor dos átomos de cloro que compõem a molécula Cl 2 , nota-se que cada átomo de cloro tem ao seu redor três pares de elétrons não compartilhados com o outro átomo. Esses pares são denominados pares isolados. Consideremos, agora, o oxigênio, com seus seis elétrons na camada de valência. Para completar seu octeto, o oxigênio precisa de dois elétrons, a fim de atingir, assim, a configuração eletrônica do gás nobre neônio. Ele pode fazer isso compartilhando dois elétrons com um átomo de oxigênio vizinho, formando a molécula O2 , com a fórmula de Lewis:
O
Observando-se a fórmula de Lewis da molécula, nota-se que há dois pares de elétrons compartilhados entre os dois átomos de oxigênio, dando origem a uma ligação dupla. A molécula de O2 pode também ser representada como
OO
com as duas barras representando a ligação dupla. Nessa fórmula, pode-se notar também que cada átomo de oxigênio tem dois pares de elétrons isolados.
O nitrogênio tem cinco elétrons na camada de valência, exigindo o compartilhamento de três elétrons com um átomo de nitrogênio vizinho, formando uma ligação tripla. As fórmulas de Lewis para a molécula N2 podem ser representadas por
Nota-se que cada átomo de nitrogênio da molécula N2 tem apenas um par isolado de elétrons.
2.2.2 A REGRA DO OCTETO E MOLÉCULAS DIATÔMICAS
HETERONUCLEARES
Com base na regra do octeto (ou do dupleto para o hidrogênio), podemos prever também o número de interações entre elétrons de dois átomos diferentes, para cada átomo ter seu octeto satisfeito. Consideremos a interação entre carbono, com quatro elétrons na camada de valência, e oxigênio, com seis elétrons, num total de 10 elétrons para a molécula. Os octetos dos dois átomos componentes da molécula de CO podem ser satisfeitos pela estrutura de Lewis
na qual existem três pares compartilhados, formando uma ligação tripla entre os átomos componentes da molécula, e tendo cada átomo um par isolado de elétrons.
Do mesmo modo que para moléculas neutras, estruturas de Lewis podem também ser obtidas para íons moleculares, como CN– ou NO+. A única diferença no último caso é que elétrons devem ser adicionados aos elétrons das camadas de valência dos átomos no caso de ânions e retirados quando se tratar de cátions. Isso pode ser visto no caso de CN– e NO+
Comparando-se as estruturas eletrônicas de CO, CN– e NO+, verifica-se que todas as espécies têm o mesmo número total de elétrons em suas camadas de valência e a mesma configuração eletrônica, pelo que é dito serem isoeletrônicas.
2.2.3 MOLÉCULAS DIATÔMICAS HETERONUCLEARES
E LIGAÇÕES POLARES E IÔNICAS
No caso de uma molécula diatômica homonuclear, em que os dois átomos são iguais, a distribuição do par eletrônico entre os dois átomos é simétrica. Tem-se, então, o exemplo típico de uma ligação covalente pura.
Quando se tem uma molécula diatômica heteronuclear, é de se esperar que a distribuição dos pares eletrônicos compartilhados não seja simétrica, devendo ocorrer um desequilíbrio da distribuição da densidade eletrônica entre os átomos que formam a molécula. Esse deslocamento de carga em direção a um dos átomos da molécula dá origem a uma ligação covalente polar. O deslocamento do par eletrônico compartilhado em direção a um dos átomos da molécula é governado por suas eletronegatividades. O átomo mais eletronegativo tenderá a deslocar a densidade eletrônica em sua direção, adquirindo uma fração de carga negativa d-. Em consequência, o outro átomo adquirirá uma fração de carga positiva d+, decorrente do afastamento de densidade eletrônica de suas proximidades. Essa situação é mostrada para a molécula de HF, onde F é o elemento mais eletronegativo da molécula, nas duas formas usuais de representar a polaridade da ligação
Na primeira forma de representação, os símbolos d+ e d– são usados para representar as extremidades positiva e negativa da molécula, respectivamente. Na segunda forma de representação, usa-se uma seta para representar a polaridade da molécula. Por convenção da IUPAC, a seta é direcionada da extremidade negativa para a extremidade positiva da molécula. Na maioria dos textos antigos, pode ser encontrada também a convenção oposta para a direção do vetor momento de dipolo elétrico recomendada pela IUPAC.
Quando a diferença entre as eletronegatividades dos dois átomos aumenta, o deslocamento de carga pode ser tão grande que, eventualmente, um elétron é transferido de um átomo para o outro. Nesse caso, a ligação resultante é denominada eletrovalente ou iônica. Esse é o caso que ocorre no NaCl. Para o sódio, com um elétron na camada de valência, é mais fácil atingir a configuração do gás nobre anterior, o neônio, pela perda de seu elétron da camada de valência. Com isso, será formado o íon Na+, estando envolvida a energia de ionização do sódio no processo, +496 kJ/mol. Para o cloro, com sete elétrons na camada de valência, o octeto pode ser completo pela aceitação do
elétron perdido pelo sódio, formando o ânion Cl– com configuração eletrônica do gás nobre argônio. No processo, está envolvida a afinidade eletrônica do cloro, –348 kJ/mol. Pela abordagem de Lewis, na interação entre Na e Cl,
Na Cl + [ Cl ][ Na]+
ambos os octetos estão satisfeitos, e é previsto que a espécie Na+ Cl– exista como unidade independente.
No entanto, do ponto de vista energético, o simples fato de os octetos serem satisfeitos não é suficiente para justificar a ocorrência do processo. A soma das energias envolvidas, +496 kJ/mol e –348 kJ/mol, fornece um total de +148 kJ/mol para a formação dos dois íons, sendo o processo termodinamicamente desfavorecido. O que justifica, então, a formação da espécie? No estado gasoso, a interação eletrostática dos íons Na+ e Cl– para formar o par iônico Na+Cl–(g) é um processo exotérmico, desprendendo 450 kJ/mol. Essa interação é suficiente para tornar o processo global de formação do par iônico, a partir de Na(g) e Cl(g), termodinamicamente favorecido, com uma energia global envolvida de –302 kJ/mol.
No entanto, a forma estável do cloreto de sódio não é o de par iônico gasoso, mas o de sólido cristalino de retículo infinito, no qual a fórmula NaCl apenas fornece a relação estequiométrica existente entre os íons Na+ e Cl– para manter a eletroneutralidade. O ciclo termodinâmico de Born-Haber para a obtenção de NaCl(s) a partir de sódio metálico e Cl 2 gasoso, as formas estáveis de sódio e cloro nas condições padrão, é mostrado na Figura 2.2. Esse ciclo permite compreender por que a forma estável de NaCl é a de um sólido cristalino de retículo infinito, e não a de um par iônico gasoso.
A energia U0, envolvida no processo exotérmico de formação de 1 mol de NaCl sólido a partir de 1 mol de íons Na+ e Cl– no estado gasoso, é denominada energia reticular. A energia reticular U0 fornece uma estabilização adicional de 336,8 kJ/mol em relação a um mol de pares iônicos no estado gasoso, fazendo com que a forma estável do NaCl seja de sólido cristalino de retículo infinito. Esse assunto será retomado mais adiante.
A formação de ligação iônica é favorecida quando um dos elementos tem energia de ionização baixa, e o outro elemento, afinidade eletrônica elevada. Essas condições são normalmente encontradas nos elementos dos grupos 1 e 2 da tabela periódica (antigos grupos IA e IIA, os metais alcalinos e alcalinoterrosos) e dos grupos 16 e 17 (antigos grupos VIA e VIIA, os calcogênios e halogênios). Esses elementos formam, invariavelmente, compostos iônicos.
CAPÍTULO 3
Estruturas e ligações químicas no estado sólido
As espécies químicas abordadas até o momento foram estudadas em fase gasosa, sendo espécies isoladas estáveis. Como consequência, tudo o que foi dito até aqui sobre ligação química refere-se a espécies químicas isoladas. Até o momento, nada foi dito sobre compostos em fases condensadas, quer sejam no estado líquido ou sólido, e as forças químicas responsáveis por suas propriedades. Nos estudos das espécies isoladas efetuados até o momento era necessária apenas a visualização da geometria ao redor do átomo central da espécie química para se descrever suas estrutura. No estado sólido, que é a forma mais organizada da matéria, torna-se necessário visualizar estruturas tridimensionais mais complexas. As estruturas dos sólidos e as ligações químicas responsáveis pela formação e pela manutenção dessas estruturas é o próximo tema a ser abordado.
No conceito popular, sólido é uma porção de matéria que tem volume e forma definidos e que não podem ser alterados com facilidade. Para a Química, um sólido é uma porção da matéria que, além de ter volume e forma fixa que não se alteram com facilidade, apresenta regularidade em sua estrutura tridimensional interna. A existência dessa regularidade submicroscópica interna faz com que um sólido apresente propriedades características, desde a observação macroscópica da constância do ponto de fusão de um sólido quimicamente puro até a obtenção de diagramas de difração de raios-x por sólidos cristalinos. Essas estruturas tridimensionais regulares podem ser descritas em termos de uma unidade mínima representativa de toda a estrutura, a célula unitária, cuja repetição em três dimensões gera o retículo cristalino do sólido. Para a visualização dessas estruturas tridimensionais, é necessário o desenvolvimento
Estruturas e ligações químicas no estado sólido da visão espacial tridimensional. Algumas pessoas têm relativa facilidade em desenvolver essa capacidade, enquanto outras enfrentam consideráveis dificuldades para atingir o mesmo objetivo. Felizmente, essa habilidade pode ser desenvolvida pelo treino com modelos tridimensionais. Desse modo, é fortemente recomendada a utilização de modelos estruturais montados com kits próprios, ou improvisados com bolas de isopor e varetas, na abordagem dos tópicos a seguir. No Apêndice 2 são apresentados sugestões para a montagem de modelos de sólidos platônicos, que auxiliam muito no desenvolvimento da visão espacial de estruturas.
3.1 CLASSIFICAÇÃO DOS COMPOSTOS SÓLIDOS
A classificação dos compostos sólidos é um assunto controverso, e vários critérios podem ser adotados para essa finalidade. Entre eles, pode-se destacar a classificação em termos de: i) tipo de ligação responsável pela formação do sólido; ii) condutividade elétrica do composto no estado sólido, no estado fundido ou em solução; e iii) características estruturais do sólido. (Structural Inorganic Chemistry, de A F. Wells [1975]).
Embora pareça que a classificação dos sólidos, em termos dos tipos de ligações existentes entre os átomos, seja o melhor critério do ponto de vista químico, este é um assunto bastante polêmico, sobre o qual reina muita confusão. Muitos textos descrevem quatro tipos de ligação química – covalente, iônica, de Van der Waals e metálica – e tentam classificar os sólidos em uma dessas categorias. O problema fundamental dessa classificação é que compostos em que ocorre exclusivamente um único tipo de ligação são raros, e na maioria dos compostos sólidos as interações entre os átomos envolvem mais de um tipo de ligação.
A tentativa de representar esquematicamente os tipos extremos de ligação e os casos intermediários, associando a cada caso compostos típicos da categoria, complica ainda mais a situação. Uma dessas abordagens é o triângulo de Ketelaar, representado na Figura 3.1. Na representação, cada vértice do triângulo é associado a um tipo extremo de ligação, sendo nele colocado um composto considerado representativo de cada tipo de ligação. Nas arestas, estão localizados os compostos com ligações intermediárias entre os extremos representados pelos dois vértices, e, no interior do triângulo, estão os compostos que apresentam características dos três tipos de ligação. Além de omitir as interações de Van der Waals do esquema geral e sofrer de dificuldade inerente na escolha dos compostos representativos de cada um dos tipos extremos de ligação, não há qualquer base quantitativa para classificação dos sólidos que apresentam ligações intermediárias.
Mais recentemente, foi sugerida por Laing (M.A. Laing, Tetrahedron of bonding, Educ. Chem., v. 30, p. 160-163, 1993) a adoção do tetraedro de ligações, mostrado na Figura 3.2. Embora o tetraedro represente melhor a situação geral com a inclusão clara dos compostos ligados por interações de Van der Waals, o modelo sofre dos mesmos problemas apresentados pelo triângulo de Ketelaar no que se refere à escolha dos padrões representativos de cada tipo extremo de ligação e da ausência de base quantitativa para a classificação dos compostos.
Covalente Metálica Iônica
Figura 3.1 – Triângulo de Ketelaar ilustrando as transições entre ligações covalente, metálica e iônica.
Fonte: J.A.A. Ketelaar, Chemical Constitution, 2ª ed., Elsevier: Amsterdam, 1958, p. 21. Adaptada.
Van der Waals
Iônica
Metálica
Covalente
Figura 3.2 – Tetraedro de ligações de Lang.
Fonte: M. A. Laing, Tetrahedron of Bonding, Educ. Chem., v. 30, 9. 160-163, 1993. Adaptada.
Estruturas e ligações químicas no estado sólido
A situação se complica a inda mais quando se procura associar tipos de ligações com propriedades molares das substâncias, como pontos de fusão, pontos de ebulição, condutividades elétricas e solubilidades. É comum encontrarmos afirmações que indicam que altos pontos de fusão estão associados à ligação iônica, e baixos pontos de fusão à ligação covalente. A origem dessa confusão relaciona-se com o fato de que, ao fazermos essas comparações, estamos discutindo fenômenos em dois níveis diferentes. Quando classificamos uma substância em termos dos tipos de interação entre suas unidades formadoras, estamos descrevendo a substância no nível elétrico (microscópico). Quando comparamos pontos de fusão, estamos comparando propriedades em nível molar (macroscópico), que obviamente dependem do tipo de ligações existentes entre as unidades, mas talvez, mais fortemente, do tipo de estrutura molecular responsável pela formação do sólido. O fato observado de que óxido de magnésio, diamante e tungstênio metálico têm altos pontos de fusão (2802 oC, 3547 oC e 3407 oC, respectivamente) tem mais a ver com as três substâncias terem em comum uma estrutura tridimensional estendida do que com o fato do MgO ser formado por ligações iônicas, o diamante por ligações covalentes e o tungstênio por ligações metálicas. Do mesmo modo, o fato de SF6 e fósforo branco, P4 , apresentarem baixos pontos de fusão (– 50,7 e 44,3 oC, respectivamente) está mais relacionado com apresentarem estruturas tridimensionais baseadas em unidades isoladas SF6 e P4 do que com o fato de SF6 envolver interações relativamente iônicas e P4 interações covalentes. Esses aspectos foram muito bem discutidos por Jensen (W.B. Jensen, J. Chem. Ed., 1998, 75, 817-828).
Com base no que foi dito anteriormente e reconhecendo as limitações de qualquer classificação de compostos sólidos exclusivamente em termos de tipos extremos de ligação, empregaremos esse critério como ponto de partida para nossos estudos de sólidos, tomando como base o tetraedro de ligações proposto por Laing em M. A. Laing, Tetrahedron of Bonding, Educ. Chem., v. 30, 9. 160-163, 1993. (Figura 3.2).
Assim, pode-se visualizar quatro tipos de ligações extremas existentes entre os átomos, úteis como modelos para a abordagem da ligação em sólidos:
1) Covalente estendida – descrita como formada por pares eletrônicos compartilhados por átomos vizinhos do retículo tridimensional infinito. Exemplo típico deste tipo de composto sólido é o diamante, em que cada átomo de carbono tetraédrico se liga por pares eletrônicos compartilhados a quatro átomos de carbono vizinhos.
2) Iônica – esta é a ligação formada pela atração eletrostática entre átomos carregados, ou íons de cargas opostas, que se alternam formando a estrutura tridimensional do sólido. No caso idealizado de formação de ligação puramente iônica, cada íon seria esfericamente simétrico, sem densidade eletrônica compartilhada entre íons vizinhos.
3) Metálica – este tipo de ligação ocorre em redes regulares de átomos ou grupo de átomos, deficientes em elétrons, como ocorre nos metais e ligas. A característica principal da ligação metálica é que os elétrons da ligação estão deslocalizados por todo o cristal.
4) Van der Waals – este tipo de ligação, algumas vezes denominado de forças de dispersão de London, corresponde às interações fracas que ocorrem entre átomos e moléculas decorrentes da atração entre dipolos instantâneos e dipolos induzidos. Mesmo em espécies que não têm momento de dipolo permanente, para as quais os centros de carga positiva e negativa coincidem, a flutuação momentânea da densidade eletrônica pode dar origem a uma assimetria na distribuição de cargas, originando momentos de dipolo instantâneos. Esses dipolos instantâneos induzem dipolos nas espécies adjacentes, pela polarização dos elétrons da camada externa dessas últimas. Em consequência da separação de cargas originada, as espécies vizinhas tendem a se orientar de modo a maximizar a atração elétron-núcleo e minimizar as repulsões elétron-elétron. A intensidade das forças de Van der Waals cresce rapidamente com o aumento do volume molecular e com o número de elétrons polarizáveis disponíveis na espécie. Esse tipo de força é a principal responsável pela manutenção da estrutura de argônio sólido, assim como a principal força intermolecular que atua em I2 e compostos orgânicos apolares no estado sólido.
Uma vez apresentados inicialmente os modelos extremos em termos de ligação, passaremos a abordar os casos em que as interações existentes entre as unidades são intermediárias, levando-se em conta também o arranjo tridimensional responsável pela formação dos sólidos.
3.2 LIGAÇÃO METÁLICA
3.2.1 PROPRIEDADES GERAIS DOS METAIS
A maior parte dos elementos da tabela periódica é constituída por metais. Os metais têm propriedades físicas muito características, que incluem: 1) alta refletividade, geralmente denominada brilho metálico; 2) alta condutividade elétrica e térmica; 3) maleabilidade e ductilidade; 4) estruturas cristalinas, que quase sempre se encaixam em cúbica de face centrada, hexagonal densa ou cúbica de corpo centrado; e 5) facilidade de formação de ligas. A explicação dessas propriedades, e para suas variações de um metal para outro, deve ser consequência da natureza estrutural e eletrônica do metal, devendo estar incorporada no modelo adotado para descrever a estrutura e a ligação em sólidos metálicos.
Muitas das propriedades dos metais se correlacionam bem com a força que mantém seus átomos ligados. Essa força de ligação pode ser medida pela energia necessária para retirar átomos gasosos da superfície do metal, a entalpia de atomização. Esses dados, juntamente com os pontos de fusão e ebulição, assim como as durezas dos metais mais comuns, são apresentados na Tabela 3.1. Como seria de esperar, metais com baixas entalpias de atomização devem ser moles e de baixos pontos de fusão, e metais com altas entalpias de atomização devem ser duros e de altos pontos de fusão. Apenas no caso dos metais de transição observa-se uma descontinuidade na sequência
Estruturas e ligações químicas no estado sólido
geral esperada. Essa descontinuidade está ligada ao fato de os metais de transição apresentarem elétrons em orbitais d, cuja ocupação abrange fatores não envolvidos no caso de elementos abordados até agora, que apresentam apenas orbitais s e p em suas camadas de valência. Esse e outros aspectos relacionados com os elementos cujas camadas de valência envolvem orbitais d serão abordados oportunamente.
A alta condutividade elétrica dos metais, independentemente do estado físico do metal, implica que o mecanismo de condução seja devido à existência de condutores de carga deslocalizados por toda a estrutura. Como veremos nos itens que se seguem, sabe-se hoje que a condução elétrica dos metais se deve ao movimento de elétrons deslocalizados.
CAPÍTULO 4
Simetria e Química
4.1 INTRODUÇÃO
Quando se inicia o estudo do capítulo sobre simetria usualmente encontrado em textos didáticos, geralmente em livros de Química Inorgânica ou Físico-Química, logo surgem duas perguntas: i) o que é simetria?; ii) qual a relação existente entre simetria e Química, ou mais amplamente, entre simetria e ciências exatas e biológicas?
Vamos iniciar a resposta às questões consultando o verbete “simetria” em um dicionário de amplo uso na língua portuguesa, o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (2004). Dentre os muitos significados encontrados para o verbete, listamos a seguir apenas os que se relacionam com os aspectos gerais do tópico:
1. conformidade, em medida, forma e posição relativa, entre as partes dispostas em cada lado de uma linha divisória, um plano médio, um centro ou eixo;
2. semelhança entre duas metades;
3. semelhança entre duas ou mais situações ou fenômenos; concordância, correspondência;
4. conjunto de proporções equilibradas;
5. harmonia e beleza resultante de proporções equilibradas;
6. transformação geométrica que não altera a forma, as dimensões ou qualquer outra propriedade de uma figura.
Como se pode inferir pela leitura dessas definições, vê-se que “simetria” evoca inicialmente noções de harmonia, equilíbrio, beleza e semelhança de formas. Nesse sentido, conceitos de simetria são encontrados em elementos da natureza, nas artes, na engenharia e na arquitetura, como se pode ver nas Figura 4.1, 4.2 e 4.3.
Na Figura 4.1a, é possível notar a existência de simetria em torno de um plano imaginário que divide verticalmente a flor de orquídea ao meio, cuja metade esquerda é semelhante à sua metade direita. Por razões que veremos adiante, diz-se que a flor apresenta o que é conhecido como simetria pontual. Já na Figura 4.1b, nota-se que a repetição de flores semelhantes alternadas ao longo da haste central do ramo gera um outro tipo de simetria ao longo do espaço tridimensional. Por isso, diz-se que o ramo de orquídeas apresenta simetria espacial.
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4.1 – (a) Flor de orquídea isolada, apresentando simetria pontual; (b) ramo da mesma orquídea, apresentando simetria espacial.
A simetria é também encontrada e utilizada em objetos do cotidiano, como mostrado nas Figuras 4.2a e 4.2b, com o objetivo de prover praticidade em suas utilizações, ou meramente de decoração.
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4.2 – Simetria em objetos do cotidiano.
Nas Figura 4.3a e 4.3b, na pintura mundialmente famosa da Monalisa e na foto de um lago canadense, respectivamente, pode-se ver como o conhecimento e a utilização dos conceitos de simetria levam à produção de belas imagens, esteticamente agradáveis à maioria das pessoas.
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Figura 4.3 – (a) Monalisa, obra do artista italiano Leonardo da Vinci (1452-1519), em exibição no Museu do Louvre, Paris, França; (b) fotografia de lago, com reflexos.
Nas Figuras 4.4a e 4.4b, pode-se ver, respectivamente, exemplos da utilização dos conceitos de simetria na arquitetura na fachada do Panteão, localizado na cidade de Roma, e na Torre Eiffel, localizada na cidade de Paris. Já na Figura 4. 4c, o arquiteto usa a falta de simetria para dar a ideia de movimento à obra.
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Figura 4.4 – (a) Panteão, templo localizado na cidade de Roma, Itália, construído inicialmente pelo imperador Augusto (63 a.C.-14) entre 29 e 19 a.C., e reconstruído pelo imperador Adriano (76-138), por volta de 126; (b) Torre Eiffel, localizado na cidade de Paris, França. Construída entre 1887 e 1889 pelo engenheiro Gustave Eiffel (1832-1923). A obra é mostrada em ângulo para evidenciar a simetria existente; (c) prédio do Museu Guggenheim de Bilbao, Espanha, inaugurado em 1997, obra do arquiteto américo-canadense Frank Gehry (1929).
No tocante à Química, muito provavelmente os primeiros contatos do estudante com os conceitos de simetria (ou sua ausência!) ocorrem durante o ensino médio. Esses contatos geralmente estão associados aos conhecimentos de geometria molecular em geral e polaridades elétricas, assim como aos conceitos de isomeria óptica e geométrica que ocorrem em alguns compostos orgânicos. Na Física, os conceitos de simetria aparecem geralmente associados às partículas subatômicas e suas respectivas antipartículas, que apresentam as mesmas massas, mas cargas elétricas opostas.
Como veremos posteriormente, os conceitos de simetria aplicados às moléculas podem ser estendidos também às propriedades a elas associadas, como orbitais moleculares, diagramas de níveis de energia e transições entre esses níveis, e as técnicas espectroscópicas envolvidas nessas transições. No entanto, para ampliarmos essas ideias intuitivas iniciais sobre simetria, precisaremos analisar com mais detalhes os elementos e operações de simetria existentes em uma molécula, assim como a representação matemática das transformações ocasionadas pela atuação de uma operação de simetria efetuada sobre uma molécula. Esses assuntos e outros correlatos serão objeto de nossos tópicos seguintes.
4.2 ELEMENTOS E OPERAÇÕES DE SIMETRIA EM
ENTIDADES MOLECULARES ISOLADAS
Os elementos de simetria básicos que podem estar presentes em entidades moléculares isoladas ou objetos são os centros de inversão, os eixos de rotação e os planos de reflexão, associados com entes geométricos presentes na molécula (ou objeto): ponto, linha e planos, respectivamente. Em torno desses elementos de simetria, são realizadas as chamadas operações de simetria. Uma operação de simetria é uma ação efetuada sobre uma molécula (ou um objeto) isolada em torno de um elemento de simetria, após a qual a molécula (ou objeto) encontra-se em uma posição semelhante, mas não idêntica, à que tinha antes da referida operação. Exemplos de cada uma dessas operações de simetria são mostrados nas Figuras 4.5 a 4.7, utilizando a molécula plana 1,2-dicloroeteno, CHCl=CHCl, representada no plano do papel ou em perspectiva, conforme a conveniências em cada caso. Para facilitar a visualização das ilustrações, os átomos de H e Cl são identificados pelas letras a e b, apenas para marcar suas posições inicial e final, antes e após a aplicação da operação de simetria. Fora esse rótulo, todos os átomos de H são idênticos entre si, o mesmo acontecendo com os átomos de Cl
Na Figura 4.5, é apresentado o efeito da operação de simetria de inversão por meio do centro de inversão existente na molécula trans-1,2-dicloroeteno, representado pela letra i. Para a visualização dessa operação, é mais conveniente representar a molécula no plano dessa página.
C
CC
b Hb i
C
inversão pelo centro de inversão i
C
a
C
a
b
Figura 4.5 – Operação de inversão pelo centro de simetria (ou inversão) i. As linhas tracejadas destacam as posições dos átomos da molécula envolvidos na operação de simetria. A molécula está representada no plano da folha de papel.
Nota-se que a aplicação da operação de inversão pelo centro de simetria i existente na molécula efetua a troca dos átomos localizados em posições diametralmente opostas em relação a esse centro. A configuração final da molécula é semelhante, mas não idêntica, à sua configuração inicial.
Na Figura 4.6, é apresentado o efeito da aplicação de um plano de reflexão, representado pela letra grega σ, sobre a molécula cis-1,2-dicloroeteno. A operação de simetria realizada em torno desse plano consiste na reflexão especular das partes da molécula que se encontram em posições opostas em relação ao plano σ.
b
a
operação de reflexão no plano de reflexão σ
a
a
a
b
Figura 4.6 – Operação de reflexão especular em relação ao plano de reflexão σ. O plano σ, que corta perpendicularmente o ponto médio da ligação C=C.
Na Figura 4.7, é apresentado o efeito da operação de rotação própria em torno de um eixo de simetria Cn, no caso específico um eixo C2 , sobre a molécula trans-1,2-dicloroeteno. Em torno de um eixo C n qualquer, em que n=1, 2, 3, 4..., é efetuada uma rotação por um ângulo 360º/n. No caso particular do eixo C2 representado nessa figura, n = 2, e a rotação efetuada é de 360º/2 = 180º.
Embora não haja uma convenção oficial, usualmente é adotado o sentido horário para uma operação de rotação em torno de um eixo (da esquerda para a direita, em relação ao observador). Essa orientação arbitrária será utilizada em todas as nossas abordagens das operações de rotação.
b H b
rotação própria de 180º em relação ao eixo C2
a
a
b
Figura 4.7 – Operação de rotação própria de 180º efetuada em torno de um eixo C2 da molécula transHCℓC=CCℓH. A molécula é representada em perspectiva num plano perpendicular ao plano da página, estando os átomos de carbono situados na intersecção entre os dois planos. O eixo C2, é representado por uma seta perpendicular ao eixo da ligação C=C e ao plano que contém a molécula. Em suas posições iniciais os átomos H a e Cℓ a são representados saindo do plano dessa página, e Hb e Cℓb representados como estando atrás desse plano.
No caso da molécula trans-1,2-dicloroeteno, pode-se verificar que os resultados da aplicação da operação de inversão (Figura 4.5) e da rotação própria em relação ao eixo C2 (Figura 4.7) são equivalentes, embora pela aplicação de dois elementos de simetria distintos.
Descrição de moléculas e suas
propriedades
pela teoria de grupo –representações redutíveis e irredutíveis
Para o tratamento das moléculas e suas propriedades pelas ferramentas da teoria de grupo, é possível a utilização de vários conjuntos completos de vetores como bases de representação. Esses conjuntos de vetores são integrantes do espaço vetorial V formado pela molécula e suas propriedades. A escolha da base de uma representação particular utilizada num dado estudo é feita de acordo com a conveniência para cada caso abordado. Por exemplo, na descrição da formação dos orbitais da molécula a partir da combinação dos orbitais dos átomos que a formam, a escolha da base mais conveniente recai, obviamente, sobre os orbitais atômicos envolvidos. Já no estudo das vibrações de uma molécula não linear, a base mais adequada é formada pelas distâncias das ligações entre os átomos e os ângulos formados entre essas ligações. Em ambos os exemplos, as representações obtidas para as transformações produzidas pelas operações de simetria do grupo sobre os vetores base são redutíveis. Como as representações que interessam são as irredutíveis, relacionadas com a base de vetores ortonormais, as representações redutíveis precisam ser desdobradas nas componentes irredutíveis que a formam. Então, esse tipo de estudo envolve 3 etapas: i) a escolha de uma base de representação mais conveniente para descrever o sistema sendo abordado; ii) a obtenção das representações redutíveis correspondentes às operações de simetria do grupo; e iii) o desdobramento das representações redutíveis obtidas como combinações lineares das representações irredutíveis do grupo pontual, por meio da aplicação da ferramenta matemática adequada.
Para abordarmos essas etapas do processo, vamos utilizar como exemplo o caso das vibrações moleculares de H2O, grupo pontual C2V.
5.1 OBTENÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES REDUTÍVEIS
ENVOLVIDAS NA DESCRIÇÃO DAS VIBRAÇÕES
DA MOLÉCULA DE H 2 O
Para o estudo das vibrações da molécula de H2O, é conveniente a utilização do sistema de coordenadas, já visto na Figura 4.35 e reproduzido novamente a seguir, junto com a matriz transformação 9 x 9, que descreve a aplicação da operação identidade E sobre a base de representação adotada para descrever o sistema.
Esse procedimento pode ser repetido para os outros elementos de simetria do grupo C2V, como já foi feito para o caso da operação C2 e os planos de reflexão verticais. No entanto, o inconveniente de se manipularem matrizes transformação com essas dimensões, ou maiores, pode ser evitado utilizandose o procedimento descrito a seguir.
Anteriormente (Seção 4.6.1) foi obtida a matriz transformação genérica para uma rotação própria em torno de um eixo por um ângulo θ, reproduzida a seguir, junto com seu caráter.
cosseno
Para uma molécula, a contribuição total da rotação própria, χ rp t , será obtida multiplicandose essa contribuição pelo número de átomos da molécula que permaneceram inalterados, representado por np, após a aplicação da operação de simetria:
Aplicando a fórmula para o caso da operação identidade E, que pode ser tratada como uma rotação em que θ = 360o, cos 360o = 1 e n p = 3, temos:
E t 31 2 360 31 29 cos o () ,
que, como esperado, é idêntico ao valor obtido por meio do procedimento mais trabalhoso envolvendo uma matriz 9 x 9. Para o caso de C2 , θ = 180o, cos θ = –1 e n p = 1 (apenas o átomo de O fica com a posição inalterada após a aplicação de C2), temos:
C t 2 11 21 12 1
Para o caso de uma rotação imprópria em torno de um eixo Sn por um ângulo genérico θ, na mesma Seção 4.6.1 mencionada anteriormente, foi obtida a matriz transformação correspondente, reproduzida a seguir, junto com seu caráter.
cosseno seno seno cosseno 0 0
Descrição de moléculas e suas propriedades pela teoria de grupo
Do mesmo modo que no caso anterior, a contribuição total para o caráter da rotação imprópria, χ ip t , será obtida multiplicandose esse valor pelo número de átomos que permanecem inalterados, representado por ni, após a aplicação do eixo impróprio:
t ip t i ncosseno 12 .
rotaçãoimprópria
No caso presente, as duas reflexões no plano, σ xz e σ yz , podem ser tratadas como rotações impróprias, com um ângulo θ = 0o, cos θ = 1, com as diferenças entre elas sendo apenas os valores de ni . No caso do plano σ xz , ni = 1 (átomo de O permanece inalterado), e xz
t 11 20 11 21 cos o .
Para o caso do plano σ yz, ni = 3 (os átomos de O, H2 e H3 permanecem inalterados) e yz
t 31 20 31 23 cos o
Reunindo esses dados para a molécula H2O, temse os caracteres χtotal, reunidos a seguir.
Aplicandose o Teorema 3 ( i R 2 h R ) aos caracteres obtidos para χtotal, verificase que [92 + (1)2 + 12 + 32] = (81 +1 +1 + 9 ) = 92 > h = 4 para o grupo C2V e, portanto, χtotal é uma representação redutível.
Uma vez obtida a representação redutível que descreve as vibrações da molécula H2O, a próxima etapa envolve o desdobramento dessa representação como resultado de combinações lineares da base irredutível de vetores ortonormais do grupo C2V. Isso é feito na Seção 5.2.
5.2 DESDOBRAMENTO DE UMA REPRESENTAÇÃO REDUTÍVEL EM SUAS COMPONENTES IRREDUTÍVEIS
Uma das características de qualquer conjunto de vetores pertencentes a um espaço vetorial V , conjunto este tomado como base de representação desse espaço V , é que esse conjunto deve ser capaz de gerar qualquer outro vetor pertencente a esse espaço, por meio de combinação linear dos vetores da base de representação adotada. No nosso caso particular, nosso espaço vetorial V tem dimensão h, onde h é o número de
operações de simetria que podem ser realizadas sobre a molécula em torno de seus elementos de simetria. Estamos, então, interessados em representar as transformações provocadas pela aplicação dessas operações de simetria sobre a molécula, em termos de uma base de representação formada por vetores ortonormais, que são as representações irredutíveis do grupo pontual da molécula, representadas genericamente por Γi(R), ou pelos símbolos de Mulliken correspondentes. Então, qualquer vetor redutível, representado genericamente por Γredutível, que pertença ao mesmo espaço vetorial V que os vetores base ortonormais, pode ser gerado pela combinação linear genérica:
em que a i representa o número de vezes que a representação irredutível Γi aparece na composição da representação Γredutível = Γ.
Para se realizar essa tarefa – o desdobramento de uma representação redutível em suas componentes irredutíveis –, além da tabela de caracteres do grupo da molécula em estudo, disponível no Apêndice 4 , é necessária uma equação matemática que relacione os caracteres das representações redutíveis e irredutíveis. Essa equação é apresentada a seguir [Equação (5.5)]. Embora essa equação seja demonstrável a partir dos Teoremas 1 a 5, essa demonstração não será aqui apresentada. Aos interessados no assunto, recomendase a consulta aos textos indicados sobre teoria de grupo.
a h iCgR 1 [ RR i R , (5.5)
em que:
a i = número de vezes que a reapresentação irredutível Γi aparece na representação redutível, χredutível = Γ(R);
h = ordem do grupo pontual da molécula, igual ao número total de operações de simetria presentes no grupo;
R = uma operação de simetria do grupo, presente na classe de simetria C;
Γ(R) = é um caráter da operação R na representação redutível Γ;
Γi(R) = é um caráter da operação R na representação irredutível Γi;
gC(R) = é o número de operações R presentes na classe de simetria C.
Para exemplificarmos o tratamento aos dados da molécula H2O, vamos incluir os dados sobre a representação redutível Γ na tabela de caracteres do grupo C2V.
Aplicandose a fórmula anterior a cada uma das representações irredutíveis, temse:
Na tabela que se segue, são colocadas as representações irredutíveis encontradas no desdobramento da representação redutível Γ, em espécie e número, mostrando que Γ é, realmente, o resultado da combinação linear dessas representações irredutíveis.
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Química Inorgânica Básica: é um livro que reúne a experiência do autor no ensino de Química Geral e Química Inorgânica em cursos de graduação e pós-graduação.
Essa experiência revelou dois pontos importantes: o primeiro refere-se à compreensão dos conceitos quânticos envolvidos em estruturas eletrônicas e do tripé estrutura/ligação química/reatividade dos compostos químicos; o segundo ponto aborda a dificuldade enfrentada pelos alunos na compreensão desses tópicos. Esses temas são abordados no livro utilizando os conceitos de simetria e teoria de grupo, por meio de exemplos relacionados com aspectos energéticos, estruturais e espectroscópicos de átomos e moléculas. Espera-se que a obra seja útil para alunos de graduação e pós-graduação em Química e áreas correlatas.
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