Canto da tarde

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Solo Oenda auê, a a! Ucumbi oenda, auê, a... Oenda auê, a a! Ucumbi oenda, auê, no calunga. Coro l º Ucumbi oenda, ondoró onjó Ucumbi oenda ondoró onjó (bis) Coro 2º lô vou oendá pu curima auê ló vou oendá pu curima auê (bis) (Fundamento fornecido por Aires: "- O sol está entrando, vamo-nos embora para o rancho.'/- 'O sol entrou, vamos para o rancho.' - 'Eu vou entrar é para minha fuisqueirà." O pesq1úsador comenta como é "admirável a permanência da idéia de mar. Perguntados, todos os informantes traduziram por mar a palavra calunga. ")

Canto da tarde Cai a tarde, auê a luz vai se apagando, auê, a. Cai a tarde, auê o sol se recolhe no mar. Coro 1 Apaga-se o sol, vamos nos recolher à cafua, onjó. Apaga-se o sol, vamos nos recolher à cafua, onjó. Coro 2 Eu vou me recolher é no lume da mina, auê. Eu vou me recolher é no lume da mina, auê. Adriana Melo se valeu da classificação adotada por Aires na apresenta­ ção da partitura do vissungo 33 para dar título à sua transcriação: "Canto da tarde". No texto, manteve cena sonoridade banto, na vocalidade do lamento auêlauê, a e nos vocábulos cafaa e onjó, o primeiro, um africanismo incorporado ao ponuguês do Brasil, o segundo, um estrangeirismo que garante mais radicalmente a memória do outro na tradução. Na transcriação do canto 53, o poeta paulo de andrade buscou manter a vocalidade em ô/ê do texto africano. E enfrentou a dificuldade da tradução do verso Curima aiô mdambi, optando por explorar a literalidade do funda­ mento fornecido por Aires em "fazer 'serviço' com mulher", revertendo a frase ao campo metafórico: "o trabalho do amor". Iô mbô Combaro, auê Ucumbi quendê, Curima, aiô 'mdambi, Iô mbô combaro, auê. Ucumbi quendê, Curima aiô mdambi. (Fundamento fornecido por Aires: "Quando o sol entrar vou ao comércio procurar mulher- fazer 'serviço' com mulher.'')

Canjerê sol me vou feira afora, ê mulher ah, cadê o trabalho do amor sol me vou feira afora, ê mulher ah, cadê o trabalho do amor Nesses movimentos de escuta e tra­ dução, os cantos atravessam os tempos, as culturas, as línguas, as semioses. Do campo à página, da voz à letra impressa no papel. Do livro à cena, ao palco, à tela, a palavra embala em rede a mone e a vida - o trabalho do amor.

Sônia Queiroz é poeta, professora e pesquisadora da Faculdade de Letras da UFMG.


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