Experimentar o movimento contínuo de acolhida da palavra e do sujeito num mundo cujos valores e ritmos velozes tornam invisíveis seus senti dos, seus significados. Ousar a dura busca da consciência de nossas igno râncias, reveladora da incompletude de todo conhecimento, todo saber, todo sujeito, toda palavra. Aceitar o desafio da arte, presente em todas as instâncias da vida: a recondução do sensível como fundamento da exis tência. Essas e muitas outras reflexões pautam o tom destas notas - breves, melodiosas, poéticas, políticas, lite rárias, filosóficas, sociológicas - que procuram discutir e transcriar os ca minhos da pesquisa na universidade moderna contemporânea. No inter valo entre uma e outra nota, debatida e rascunhada em salas de aula nos cursos de metodologia, as reflexões se desdobram, compondo, então, o texto
Entrenotas: compreensões de pesquisa.
Um apelo à liberdade do pensamento que não se admite refém de modelos e receituários de escrita e de com portamento, nem se omite diante dos movimentos de mercantilização da universidade e da vida, que nos roubam a criatividade, o bem-estar e a saúde. Um convite ao movimento por uma ciência comprometida com o bem viver e a com a qualidade da vida em todas as suas formas e instâncias. Assim como o educador Paulo Freire, o escritor e professor Cássio E. Viana Hissa, autor destas notas e suas vi brações poéticas, aposta na formação/ transformação crítica e criativa dos sujeitos, necessariamente insubmis sos à formação disciplinar, passiva e esvaziada de mundo que especial mente na contemporaneidade tem
se imposto como dominante. Romper com o imobilismo político e criativo que tem dominãdo a ciência, a arte, a vid� sobretudo. das últimas décadas do sécuío 20 aos nossos dias, exige de nós a nossa própria transgressão, nos diz o escritor, a ruptura com modelos de pensamento herdados do início da modernidade e que ressoam ainda nos chamados textos de ciência deste início de século 21. Para o autor, pes quisar é, sobretudo, buscar o que não se conhece, compartilhar desconhe ceres, fazer com o outro a caminhada. Esse percurso, que não separa da arte a vida, a ciência, a pesquisa e a escrita, requer "a paciência do artesão, no tempo do cultivar, no tempo lento do bordar compreensões, no tempo lento de quem espera e, simultaneamente, na rotina de quem fabrica a utopia da presença do mundo em nós e de nós em cada um". Requer a cuidadosa incursão no laborioso e prazeroso mundo do poeta a transformar a pedra em palavra, ponte, passagem: fronteira móvel que nos mobiliza. ADRIANA MELO
(ASSIO E. VIANA H1SSA é professor do Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFMG e pesquisador do Centro de Estudos Sociais América Latina. � doutor em Geografia pela Universidade Estadual Paulista, com pós-doutorado em Sociologia e Epis temologia pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Autor de A mobilidade das fronteiras (2002); organizador e autor de Saberes ambientais (2008) e Conversações: de artes e deciêndos (2011), todos publi cados pela Editora UFM6.