Arquivos Brasileiros de Ciencias Medicas

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Arquivos Médicos do ABC / Diretório Acadêmico Nylceo Marques de Castro da Faculdade de Medicina do ABC. – v. 1 fasc. único (1978) – v. 32, n. 2 (jul/dez 2007) Semestral. 1978, v. 1 (fasc. único) 1979, v.2 / 1999, v. 22 (1 e 2) 2000, v. 23 (1 e 2 fasc. único) 2001, v. 24 (1) 2001, v. 25 (2) 2002, v. 26 (3, supl. especial) 2002, v. 27 (2) 2003, v. 28 (1, supl. especial) 2004, v.29 / 2007, v. 32 (1, 2, supl. especial) A partir de 1997, v. 20 (1 e 2) a responsabilidade passa a ser do Núcleo de Estudos, Pesquisa e Assessoria à Saúde da Faculdade de Medicina do ABC. ISSN 0100-3992 Continua como: Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde

Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde / Núcleo de Estudos, Pesquisa e Assessoria à Saúde da Faculdade de Medicina do ABC. – v. 33, n. 1 (jan/abr 2008) – Quadrimestral 2008, v. 33 (1) Continuação de: Arquivos Médicos do ABC, v. 32, n. 2 (jul/dez 2007)

Os Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde são publicados quadrimestralmente pelo NEPAS - Núcleo de Estudos, Pesquisa e Assessoria à Saúde da Faculdade de Medicina do ABC, Av. Lauro Gomes, 2.000, Santo André, SP, CEP 09060-870 – Fone: (11) 4427-6483 – Fax: (11) 4993-5450 – E-mail: abcs@fmabc.br. Tiragem: 2.000 exemplares.

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Sumário Editoriais Os Arquivos Médicos do ABC agora são Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde

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Ricardo Peres do Souto

Os primeiros anos dos Arquivos Médicos do ABC

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Szulim Ber Zyngier

Cartas ao Editor Importância do uso de animais experimentais para a medicina humana

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Nestor Schor, Mirian A. Boim

A necessidade do uso de animais para o ensino e a pesquisa

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Walter Colli

O Brasil deve restringir a experimentação com animais?

11

Luiz Eugênio Araújo de Moraes Mello

Regras e política de portas abertas nos estudos com animais na Universidade Harvard

12

Antônio Carlos Bianco

O uso de animais em pesquisas científicas

15

Lanfranco Ranieri Paolo Troncone

O uso de animais para experimentação ainda é imprescindível

16

Maria Lúcia Zaidan Dagli, Nívea Lopes de Souza, José Luis Bernardino Merusse, Paulo Cesar Maiorka, Ângelo João Stopiglia

Experimentação animal e o avanço do conhecimento

18

Regina Pekelmann Markus

Artigos Originais Análise epidemiológica dos pacientes acometidos por Degeneração Macular Relacionada à Idade, atendidos no Setor de Retina da Faculdade de Medicina do ABC Dérica Serra, Rodrigo Angelucci, Débora Sugano, Paulo Ricardo Sampaio, José Ricardo Rehder

Neoplasia intra-epitelial cervical: diagnóstico, tratamento e seguimento em uma unidade básica de saúde Luís Carlos Machado Junior, Ana Sílvia Whitaker Dalmaso

Eficácia de um programa de exercícios físicos na qualidade de vida de mulheres com osteoporose Marco Antonio Auad, Rodrigo Polaquini Simões, Sama Rouhani, Viviane Castello, Leda Shizuka Yogi

20 24 31

Relatos de Casos Somatostatinoma de duodeno: relato de caso e revisão da literatura Alexandre Cruz Henriques, Ana Maria Amaral Antonio Mader, Giselle Munhoz Ramos, Rafaela Rosalba de Mendonça, Sergio Renato Pais Costa

Queimadura por soda cáustica Sidney Zanasi Jr, Gerson Vilhena Pereira Filho, Alessandra Giammarusti Watase, Rafael Zacarias Batista, Maurício Orel, Edric Rabelo Brianezi, Luis Felipe Conti Teixeira

36 40

Artigos de Revisão Fatores ambientais, comportamentais e neuroendocrinológicos envolvidos na gênese da epidemia da obesidade Ary Serpa Neto, Gabriel Cunha Barbosa Saheb, Bruno Schuind Arantes, Jair Pedralli Júnior, Ricardo Boix Sanchez da Silva, Nara Alves Buriti

Mecanismos neurais da aldosterona no controle cardiovascular e do equilíbrio hidroeletrolítico Silmara Formenti, Guus Hermanus Maria Schoorlemmer, Thiago Santos Moreira, Eduardo Colombari

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ARQUIVOS BRASILEIROS DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

Instruções aos Autores -

Apresentação A revista Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde é um periódico multidisciplinar que tem por finalidade publicar contribuições científicas inéditas, selecionadas em processo de revisão por pares, que sejam de interesse da área de Saúde. •

Submissão de manuscritos •

Normas Gerais: Serão aceitos apenas artigos cuja parte essencial não tenha sido publicada previamente, com exceção a resumos em anais de congressos e simpósios. Os artigos submetidos à publicação nos Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde não deverão ser submetidos concomitante a outra publicação científica. Os autores devem enviar ao Editor o seguinte material: Um original impresso do texto e o arquivo eletrônico correspondente; Uma coleção completa de originais das imagens e/ou arquivos eletrônicos correspondentes em formato jpg ou tif de alta resolução (mínimo 300 dpi); Declaração assinada por todos os autores de que o trabalho é inédito e submetido exclusivamente à publicação nos Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde. Cópia de autorização por Comissão de Ética em Pesquisa no caso de trabalhos experimentais relatando estudos clínicos ou utilizando de animais.

• • •

Referências •

Revista Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde NEPAS – Núcleo de Estudos, Pesquisa e Assessoria à Saúde da Faculdade de Medicina do ABC Av. Lauro Gomes, 2000 – CEP: 09060-870 – Santo André – SP Fone: 55 11 4427-6483 Fax: 55 11 4993-5450 e-mail: abcs@fmabc.br

Tipos de Contribuições

• •

Artigos Originais – Resultados de estudos clínicos, epidemiológicos, experimentais, teóricos, além de revisões sistemáticas da literatura e metanálises. Artigos de Revisão – Documentação e interpretação do desenvolvimento científico de uma determinada área do conhecimento, descrevendo amplamente as contribuições da literatura. Relatos de Caso – Apresentação e discussão de casos clínicos que apresentem interesse especial e contribuem para a literatura específica. Cartas ao Editor – Comentários sobre aspectos relevantes nas Ciências da Saúde, estimulando a discussão de novas tendências e controvérsias

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Todos os textos enviados para publicação devem ser redigidos em espaçamento duplo, fonte Times New Roman ou Arial tamanho 12, margens de 3,0 cm e folha tamanho A4. Todas as páginas devem vir numeradas no canto superior direito. Cada uma das seguintes seções deve iniciar uma nova página: Folha de rosto – título do manuscrito (máximo de 20 palavras); autores (nome completo e instituição à qual mantêm vínculo acadêmico); nome, endereço institucional completo, telefone e endereço eletrônico do autor responsável pela correspondência.

As referências devem ser numeradas em algarismos arábicos de acordo com a ordem em que aparecem no texto, onde devem ser identificadas com o mesmo número no formato sobrescrito. Os autores devem apresentar as referências seguindo as normas dos Requisitos Uniformes para Manuscritos Apresentados a Periódicos Biomédicos (www.icmje.org). Veja abaixo exemplos de formatação das referências: Artigo: Agner C, Misra M, Dujovny M, Kherli P, Alp MS, Ausman JI. Experiência clínica com oximetria cerebral transcraniana. Arq Bras Neurocir 1997;16:77-85. Capítulo de livro: Peerless SJ, Hernesniemi JA, Drake CG. Surgical management of terminal basilar and posterior cerebral artery aneurysms. In: Schmideck HH, Sweet WH, editors. Operative neurosurgical techniques. 3rd ed. Philadelphia: WB Saunders: 1995, vol 1, cap 84, p. 1071-86. Livro: Melzack R. The puzzle of pain. New York: Basic Books Inc Publishers: 1973, p. 50-1. Tese e Dissertação: Pimenta CA. Aspectos culturais, afetivos e terapêuticos relacionados à dor no câncer. Tese (Doutorado). Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo. São Paulo: 1995, p. 109-11. Resumo: Ostertag C. Advances on stereotactic irradiation of brain tumors. In: Anais do 3o Simpósio Internacional de Dor; São Paulo: 1997, p. 77 (abstr). Artigo em formato eletrônico: International Committee of Medical Journal Editors: Uniform requirements for manuscripts submitted to biomedical journals. Disponível em URL: http://www.acponline.org/journals/annals/ 01jan97/ unifreqr.htm. Acessado em 15 de junho de 2003.

Figuras, Tabelas e Quadros •

Formato do Manuscrito •

Figuras, Tabelas e Quadros: devem ser apresentados separadamente ou ao final do texto, juntamente com respectivas legendas e/ou títulos.

Formato das Referências

Endereço do editor

Resumo – Limitado a 250 palavras e acompanhado por até 6 Palavras-chave dos Descritores em Ciências da Saúde (www.decs.bvs.br). Abstract – Versão fiel do Resumo para inglês, limitado a 250 palavras e acompanhado por até 6 Keywords do Medical Subject Headings (www.nlm.nih.gov/mesh). Texto – Deve ser subdivido de acordo com o tipo de contribuição: Artigos Originais: Introdução, Materiais e Métodos (ou Casuística e Métodos), Resultados, Discussão. Relatos de Caso: Introdução, Descrição do Caso, Discussão Artigos de Revisão e Cartas ao Editor podem ser estruturados livremente pelos autores Agradecimentos

Todas as imagens devem ser designadas como “Figuras” e numeradas em algarismos arábicos de acordo com a ordem em que aparecem no texto. No caso do envio de arquivos eletrônicos das imagens, essas devem ser fornecidas em seu formato original (não inserir imagens do tipo jpg ou tif no arquivo de texto). Figuras coloridas serão publicadas somente se autores se responsabilizarem pelos custos adicionais. Tabelas devem ser numeradas em algarismos romanos de acordo com a ordem em que aparecem no texto. Quadros devem ser numerados em algarismos arábicos de acordo com a ordem em que aparecem no texto.

Considerações Éticas •

O número do processo aprovado por Comitê de Ética em Pesquisa deve ser obrigatoriamente citado em Materiais e Métodos ou na Descrição do Caso

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Editorial

Os Arquivos Médicos do ABC agora são Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde Ricardo Peres do Souto1

pesar de não estar presente no início da trajetória dos Arquivos Médicos do ABC há trinta anos, imagino um grupo pioneiro de alunos e

A

professores da Faculdade de Medicina do ABC sonhando com um veículo de informação científica que fosse capaz de instigar e divulgar a pesquisa na Instituição. Desde o início romântico, a revista passou por diferentes fases, colhendo sucessos e enfrentando as dificuldades

comuns aos periódicos de porte similar. Com a ajuda direta de editores, conselheiros, revisores e outros colaboradores e o suporte de toda a comunidade FMABC, a revista estruturou-se e amadureceu ao longo dos anos. Esses primeiros anos da revista são descritos com mais detalhe pelo Prof. Szulim Ber Zyngier, um de seus principais protagonistas, em editorial na página seguinte. Tal evolução da revista resultou no presente momento, onde mais uma etapa da história sonhada em 1978 se concretiza, quando os Arquivos Mé-

dicos do ABC são renomeados Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde. Ao refletir sobre necessidade e a adequação de se modificar o nome tradicional e estimado, percebo que a mudança já havia sido iniciada anteriormente, no próprio conteúdo da revista. Com o novo título, oficializa-se a ampliação dos temas de interesse, contemplando todas as Ciências da Saúde. Essa tendência já era muito clara, sendo possível citar várias contribuições de enfermagem, fisioterapia, ciências básicas, além da própria medicina. Em especial, a partir de agora a revista deseja atrair produções científicas que envolvam a colaboração de diferentes profissionais e interações entre várias disciplinas, uma vez que esses trabalhos são muito ricos e despertam interesse especial. Além disso, a revista tem mostrado nos últimos anos uma maior capacidade de captar artigos externos. Suponho que tal fenômeno deva ser atribuído ao aumento de sua exposição pela distribuição livre online (http://www.fmabc.br/amabc) e ao ajuste de sua política editorial, com a introdução da revisão por pares para todos os manuscritos submetidos. Com o novo título, a revista também planeja consolidar a ampliação de suas fronteiras geográficas e se apresentar como alternativa real para atender às necessidades de grupos de pesquisa em Ciências da Saúde originários de todo o território brasileiro. Concluindo, espero que o nome escolhido transmita adequadamente o comprometimento do Corpo Editorial em produzir um periódico com maior abrangência e maior alcance, e principalmente, que a reafirmação do escopo amplo seja mais uma atitude a contribuir para sua qualificação científica. Neste primeiro fascículo dos Arquivos Brasileiros de Ciências da Saúde foi introduzida uma nova seção de Cartas ao Editor. Dessa maneira a revista pretende abrir espaço para contribuições de interesse no ambiente científico que não se originem obrigatoriamente de atividade de pesquisa. A estréia da seção conta com textos de destacados pesquisadores brasileiros, com inserção na comunidade científica internacional, comentando o tema atual e controverso envolvendo a experimentação em animais. A meu ver, trata-se de assunto de extrema importância, que a revista já abordou anteriormente em editorial de um membro do Conselho Científico (Colombari E. Animais em Experimentação: usar ou não usar, será esta a questão? Arq Méd ABC 2007; 32:52). Agradeço especialmente a colaboração do Dr. José Carlos Souza Pinto, membro do Comitê de Ética em Experimentação Animal da FMABC, que muito se empenhou em reunir esse seleto grupo de lideranças científicas do nosso país. Em seqüência, este fascículo traz nas seções habituais: Serra e colaboradores estudam o perfil epidemiológico de uma das mais importantes causas de perda de visão; Machado Júnior e Dalmaso analisam a resolutividade do sistema público de saúde para os casos de mulheres com exame de Papanicolau positivo; Auad e colaboradores avaliam os benefícios de um programa de exercícios físicos para mulheres com osteoporose; Henriques e colaboradores relatam um caso infreqüente de tumor intestinal produtor de somatostatina; Zanazi Júnior e colaboradores apresentam um caso de queimadura química por álcali e ressaltam as peculiaridades do tratamento em relação às queimaduras térmicas; Serpa Neto e colaboradores discutem os múltiplos fatores que determinam o preocupante avanço da obesidade na sociedade moderna; Formenti e colaboradores revisam a importância da aldosterona no controle cardiovascular considerando os estimulantes achados recentes de novos alvos desse mineralocorticóide, incluindo o próprio sistema nervoso central.

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Editor Responsável

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Editorial

Os primeiros anos dos Arquivos Médicos do ABC Szulim Ber Zyngier1

T

enho em mãos o volume 1, fascículo único de 1978 dos Arquivos Médicos do ABC (AMABC). Ao folheá-lo vão surgindo imagens dos alunos e professores que levaram adiante, enfrentando grandes dificuldades, a idéia de dotar a Faculdade de Medicina do ABC de uma publicação que, como está no Editorial “difundisse a contribuição científica desta Unidade como também oferecer as páginas da Revista a todos os que

trabalham na medicina e ciências afins, através das seções de artigos originais, atualização, revisão e História da Medicina”. A maior dificuldade era arcar com os custos da publicação. A Congregação da Faculdade julgou a idéia da revista prematura naquela ocasião. Os alunos que freqüentavam a Disciplina de Farmacologia como monitores, pesquisadores e agregados, encamparam o desafio e se puseram a procurar entre médicos, professores, laboratórios farmacêuticos e clínicos, patrocínio que permitiria a edição do primeiro volume. Como foram os alunos da Faculdade que providenciaram os meios para o surgimento da Revista resolvemos que esta seria uma publicação do Diretório Acadêmico Nylceo Marques de Castro e o Conselho Editorial ficaria a cargo dos alunos enquanto os professores fariam parte do Conselho Consultivo. É interessante examinar os nomes dos membros do primeiro Conselho Editorial e do Consultivo. É uma sucessão de indivíduos que se destacaram e ainda se destacam nos campos científico e docente. Vários dos então acadêmicos hoje são Professores da Faculdade. Neste primeiro número também foram publicados os Resumos dos trabalhos apresentados no III COMUABC (Congresso Médico Universitário do ABC) e a fotografia do encerramento do evento, no momento em que o Prof. Andrew Victor Schally, Prêmio Nobel de Medicina de 1977 recebe uma homenagem do presidente do Congresso, o então acadêmico Décio Brong Mattar. O passo seguinte era conseguir a indexação do AMABC no Index Latino-Americano. Seguimos nos números publicados todas as exigências do Index e no volume 3 em 1980 já orgulhosamente exibíamos essa qualificação No ano seguinte, a Associação dos Docentes da FMABC uniu-se ao Diretório na publicação. Folheando os números seguintes, até o número 10 de 1987 (Edição Comemorativa de 10 anos), verifica-se que a Revista alcançou plenamente os objetivos a que se propôs no Editorial do seu primeiro número. Em 1988 eu me licenciei da Faculdade e acompanhei esporadicamente a publicação. Ao voltar encontrei os Arquivos (assim como as Faculdades da Fundação e seus Departamentos) vibrantes e em plena expansão.

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Disciplina de Farmacologia – FMABC

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Artigo Original

Análise epidemiológica dos pacientes acometidos por Degeneração Macular Relacionada à Idade, atendidos no Setor de Retina da Faculdade de Medicina do ABC Epidemiological Analysis of patients diagnosed with Age-Related Macular Degeneration in Retina’s Sector of Faculdade de Medicina do ABC Dérica Serra1, Rodrigo Angelucci1, Débora Sugano1, Paulo Ricardo Sampaio1, José Ricardo Rehder1

Resumo Objetivo: O objetivo do presente estudo foi analisar o perfil epidemiológico dos pacientes acometidos por Degeneração Macular Relacionada à Idade (DMRI), atendidos no Setor de Retina e Vítreo do Instituto de Olhos da Faculdade de Medicina do ABC – SP (FMABC). Casuística e Métodos: Realizouse um estudo transversal que avaliou 1179 prontuários de pacientes atendidos no Setor de Retina do Instituto de Olhos da FMABC, no período de janeiro de 2003 a janeiro de 2004. Os pacientes que apresentaram diagnóstico de DMRI foram analisados quanto ao sexo, idade, acuidade visual e forma da DMRI. Resultados: Dos 1179 prontuários avaliados, 92 (7,8%) pacientes apresentaram diagnóstico de DMRI. Em relação à forma clínica da DMRI observou-se 106 (64,63%) olhos com a forma atrófica, e 58 (35,37%) olhos com aspectos exsudativos da doença, sendo 32 (59%) com sinais cicatriciais e 26 (41%) com neovascularização sub-retiniana. Conclusões: A DMRI é mais freqüente em pacientes acima dos 75 anos. Unitermos: Maculopatia relacionada à idade; visão subnormal; epidemiologia; cegueira; qualidade de vida.

Abstract Objective: The objective of this paper was to evaluate the epidemiology of the patients diagnosed with Age-Related Macular Degeneration (AMD) in Retina’s Sector of Faculdade de Medicina do ABC – SP (FMABC). Subjects and Methods: A cross-sectional study was accomplished to evaluate 1179 patients records at FMABC Eye Institute, Retina sector, from January 2003 until January 2004. Patients with AMD were analyzed about sex, age, visual acuity and AMD form. Results: Ninety-two patients (7.8%) presented AMD among 1179 evaluated records. It was noted 106 (64.63%) cases of atrophic form, concerning AMD clinical form and 58 (35.37%) cases with exsudative aspect of the disease. Thirty two of them (59%) presented scarring and 26 (41%) presented signs of sub retinal neovascularization. Conclusion: AMD showed to be more frequent in patients after 75 years old. Keywords: Macular Degeneration; vision, low; epidemiology; blindness; quality of life. Recebido: 28/02/2007 Revisado: 22/09/2007 Aprovado: 18/03/2008

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Trabalho realizado no Instituto de Olhos da Faculdade de Medicina do ABC (FMABC), Santo André (SP), Brasil Disciplina de Oftalmologia da FMABC Endereço para correspondência: Rodrigo Interlandi Angelucci, Alameda Joaquim Eugênio de Lima, 1742, CEP 01425-011 - São Paulo (SP). E-mail: rodrigoangelucci@yahoo.com.br

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Serra D, Angelucci R, Sugano D, Sampaio PR, Rehder JR

dade visual inferior ou igual a 20/60 no melhor olho com a melhor

Introdução

correção obtida com meios usuais, como óculos e lentes de contato

A Degeneração Macular Relacionada à Idade (DMRI) é considerada 1-4

atualmente a maior causa de cegueira legal nos países industrializados . Estudos revelam que a prevalência da DMRI pode ocorrer em

ou com campo visual menor que 10°, mas que utiliza ou é potencialmente capaz de utilizar a visão para o planejamento ou execução de uma tarefa8-9.

1,2% dos pacientes com menos de 65 anos de idade, 7% entre 65 e

Outro conceito que deve ser ressaltado é o de cegueira legal,

74 anos e aproximadamente em 20% dos pacientes com idade superior

no qual o paciente é portador de acuidade visual igual ou menor que

4-5

20/200, ou campo visual menor ou igual a 10° em seu melhor olho, com

aos 75 anos . O Macular Photocoagulation Study Group considera como DMRI a presença de drusas associadas a alterações pigmentares na mácula, em 6

melhor correção10. O objetivo do presente estudo foi analisar o perfil epidemiológico dos pacientes acometidos por DMRI, atendidos no Setor de Retina e

indivíduos com idade acima de 50 anos . A DMRI pode se apresentar nas formas não exsudativa (seca ou 6

Vítreo do Instituto de Olhos da Faculdade de Medicina do ABC – SP (FMABC), no período de janeiro de 2003 a janeiro de 2004.

atrófica) e exsudativa (úmida) . A forma atrófica, a mais freqüentemente encontrada, corresponde a 20% dos casos com perda visual grave, enquanto a forma exsudativa é responsável por 80% deles2-4,7.

Casuística e Métodos

A perda de visão na DMRI seca é causada por uma disfunção

Foi realizado um estudo transversal que avaliou os prontuários

metabólica do epitélio pigmentário da retina (EPR) com conse-

de 1179 pacientes atendidos no Setor de Retina e Vítreo do Instituto de

qüente atrofia das células fotoreceptoras. Na maioria dos casos, a

Olhos da FMABC, no período de janeiro de 2003 a janeiro de 2004.

baixa de visão é lenta e gradual, com acometimento inicial do campo de visão central e posteriormente perda na qualidade da visão. No entanto, geralmente esta perda não é tão importante quanto à provocada pela DMRI úmida, que pode apresentar sintomas de metamorfopsia, precedendo uma baixa de visão rapidamente progressiva em decorrência da formação de membranas neovasculares

Os pacientes que apresentaram diagnóstico de DMRI foram analisados quanto ao sexo, idade, acuidade visual e forma da doença. Foram considerados portadores de DMRI os pacientes com drusas associadas a alterações pigmentares na mácula e idade superior a 40 anos. Foi realizada a análise descritiva de todas as variáveis, as quais foram apresentadas em valores absolutos e relativos.

subretinianas (MNVSR)6. Na DMRI exsudativa, algumas formas de tratamento mostram-se eficazes no controle da evolução da doença, como a terapia fotodinâmica e medicações anti-angiogênicas3,6-7.

Resultados Dos 1179 prontuários avaliados, 92 (7,8%) pacientes apresentaram

Nos casos em que a visão residual apresenta-se insatisfatória, o paciente deve ser acompanhado conjuntamente em um serviço de 1,3

visão subnormal (VSN) . Até o presente momento, os auxílios óp-

diagnóstico de DMRI. Em relação ao gênero 40,3% dos pacientes eram do sexo masculino e 59,7% do sexo feminino.

ticos representam uma das poucas alternativas de tratamento para

Quando avaliada a faixa etária dos pacientes, observou-se uma va-

a melhoria da qualidade de vida da maioria desses pacientes, que

riação entre 46-92 anos com predomínio dos casos entre 71 – 80 (40,22%)

geralmente apresentam a visão periférica preservada1-2,7.

anos de idade (Figura 1). A idade média encontrada foi de 72,5 anos.

Existem várias definições e classificações para VSN ou baixa de visão. Considera-se como portador de VSN o paciente com acui-

Na Tabela 1 podem ser observadas as acuidades visuais encontradas.

Acuidade visual

30

20/30 a 20/60

66

35,86%

20/80

09

4,90%

20/100

16

8,70%

10

20/125

03

1,63%

0

20/160

09

4,90%

20/200

11

5,97%

20/400

06

3,26%

91-100

81-90

71-80

61-70

51-60

20

41-50

Número de casos de DMRI

Tabela 1 - Distribuição numérica e percentual das acuidades visuais 40

Faixa etária (anos)

Figura 1 - Distribuição do diagnóstico de DMRI por faixa etária.

20/400 ou pior Total

Nº de olhos

Porcentagem

64

34,78%

184

100,00%

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Análise epidemiológica dos pacientes acometidos por Degeneração Macular Relacionada à Idade, atendidos no Setor de Retina da Faculdade de Medicina do ABC

de acordo com o avanço da idade4-5,12. Ressalta-se que a idade média de acometimento de DMRI nesta pesquisa foi de 72,5 anos, coincidindo com os estudos de Owen et al. que encontraram uma média de 75 anos de idade12. Vale salientar que neste trabalho foram computados

Atrófica Cicatricial MNVSR

pacientes abaixo de 50 anos de idade porque estes apresentavam sinais associados à degeneração macular. Quanto à apresentação clínica da DMRI, a forma atrófica foi a mais freqüentemente encontrada, com aproximadamente 65% dos olhos analisados; e a forma exsudativa, apesar de menos freqüente, mostrou-se responsável por 75% dos casos de comprometimento visual severo, concordando com os trabalhos estudados2-3,7.

Figura 2 - Proporção das formas clínicas de DMRI.

Em uma análise de 100 pacientes atendidos no setor de VSN da FMABC, Angelucci et al., relataram que 43% desses pacientes foram

Dos 184 olhos avaliados, 164 (89,13%) possuíam algum tipo de

encaminhados pelo Setor de Retina e Vítreo, sendo a DMRI responsá-

DMRI e 20 (10,87%) não apresentaram alterações oftalmoscópicas e

vel pela segunda maior incidência dos casos, seguida da coriorretinite

angiográficas visíveis, sendo considerados normais.

por toxoplasmose13. Tal constatação deve alertar que as doenças retinia-

Em relação à forma clínica da DMRI observaram-se 106 (64,63%)

nas, principalmente a DMRI, são responsáveis por grande parcela de

olhos com a forma atrófica, e 58 (35,37%) olhos com aspectos exsuda-

indivíduos com baixa visão e cegueira e que esses casos necessitam de

tivos da doença, sendo 32 (59%) com sinais cicatriciais e 26 (41%) com

acompanhamento em serviços especializados em baixa visão.

alguma forma de atividade de neovascularização subretiniana (MNVSR) (Figura 2).

O conceito atual em relação à reabilitação visual do paciente idoso com visão subnormal ou baixa visão é que, paralelamente ao tratamen-

Dos 92 pacientes com diagnóstico de DMRI, 57 (62%) eram portadores de VSN. Destes, 21 (36,8%) se enquadravam na definição de cegueira legal, sendo a DMRI exsudativa responsável por 75% desses casos.

to oftalmológico – clínico ou cirúrgico – se realizem as condutas ópticas e reabilitacionais14. Em diversos países do mundo pode-se encontrar serviços de visão subnormal consolidados e bem equipados. No Brasil, nota-se que ainda há carência nesta área15.

Discussão

O Serviço de Visão Subnormal da disciplina de Oftalmologia da

Dos 1179 prontuários analisados no setor de Retina e Vítreo do

FMABC teve sua implantação no segundo semestre de 2001, com o in-

Instituto de Olhos da FMABC pôde-se observar uma prevalência de

tuito de conduzir o grande contingente de pacientes portadores de baixa

7,8% de pacientes com diagnóstico de alguma forma de DMRI, coin-

de visão da região do Grande ABC e ensinar aos médicos oftalmologis-

cidindo com a prevalência encontrada na população geral de países in-

tas integrantes da disciplina como orientar esses pacientes16. Atual-

dustrializados, que varia entre 5,8% a 8,8%4-5. Até o presente momento

mente, o setor funciona com uma equipe multidisciplinar que agrega

não se dispõem de dados referentes à incidência da DMRI.

profissionais especializados em educação especial para Braille, terapia

Em relação ao gênero, o sexo feminino foi mais acometido do

ocupacional para orientação e mobilidade, psicologia, psicopedagogia,

que o masculino. Uma possível explicação seria a maior sobrevida das

fisioterapia, atividades da vida diária e oftalmologistas, promovendo,

mulheres e o fato destas consultarem o oftalmologista com uma maior

desta forma, um atendimento integral aos pacientes. Assim, a análise

freqüência que os homens. Apesar da alta prevalência do sexo feminino

dos resultados demonstra claramente que a DMRI pode tornar-se um

na maioria dos estudos, parece não haver nenhuma relação significante

importante problema de saúde pública no futuro próximo e que existe

5,11

entre a DMRI e o sexo . Quando analisados os grupos etários da presente amostra, a maior incidência de indivíduos acometidos encontrou-se na faixa entre 7180 anos, corroborando os estudos da literatura revisada que demonstram aumento da prevalência de DMRI, independente da forma clínica,

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a necessidade do acompanhamento dos pacientes portadores desta doença por um setor de visão subnormal, com o intuito de proporcionar a eles melhor qualidade de vida. Concluímos que a DMRI é mais freqüente em pacientes acima dos 75 anos.

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