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TEMPO DE AGIR A IGREJA NÃO PODE IGNORAR O ABUSO SEXUAL E PRECISA TESTEMUNHAR DO AMOR DE DEUS AOS QUE SOFREM DIVERSOS TIPOS DE VIOLÊNCIA

MARLI PEYERL

Aviolência doméstica cresce de maneira assustadora a cada ano, embora seja difícil ter uma estimativa real dos casos que acontecem, pois muitas ocorrências sequer são registradas. As vítimas não denunciam porque temem por sua integridade física e/ou porque não querem comprometer a própria família.

No entanto, milhares de crianças e adolescentes são vítimas de abuso sexual, o que lamentavelmente tem favorecido o surgimento de doenças físicas e emocionais, tanto na juventude quanto na idade adulta. De acordo com dados do relatório global “Uma Situaçao Habitual: Violência na Vida de Crianças e Adolescentes”, divulgado pelo Unicef em novembro de 2017, 300 milhões de crianças (2 a 4 anos) sofrem disciplina violenta dos seus cuidadores e cerca de 15 milhões de garotas (15 a 19 anos) já foram vítimas de sexo forçado.

Os vários tipos de violência, incluindo a sexual, ocorrem com pessoas de ambos os sexos, em todas as classes socioeconômicas e grupos religiosos. Os casos de abuso sexual podem se configurar um incesto, quando há algum grau próximo de parentesco entre abusador e vítima, e também ocorrer com pessoas de fora do círculo familiar. Porém, seja qual for a situação, o impacto negativo é imenso e pode afetar o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da vítima.

Por isso, crianças e adolescentes precisam ser ensinados a identificar possíveis agressores, porque geralmente

CRIANÇAS E ADOLESCENTES PRECISAM SER ENSINADOS A IDENTIFICAR POSSÍVEIS AGRESSORES, QUE PODEM ESTAR NAS ESCOLAS, IGREJAS E, ACIMA DE TUDO, NO CONVÍVIO FAMILIAR

eles são pessoas do convívio da família da vítima. Até mesmo espaços como instituições de ensino e ambientes religiosos exigem a atenção dos pais.

Embora seja um tema complexo, não podemos ignorá-lo. Ao contrário, precisamos ter uma compreensão correta do problema e criar ações educativas e preventivas que garantam a segurança de crianças e adolescentes. Afinal, é na infância que começamos a interagir com as pessoas e o mundo ao nosso redor, e as experiências vivenciadas nessa fase tendem a moldar nossos relacionamentos para o resto da vida.

Não por acaso, Ellen White escreveu que os pais são professores dos filhos: “Seu tom de voz, seu comportamento, seu espírito são imitados pelos seus pequenos. Os filhos imitam os pais; deve-se, portanto, tomar muito cuidado para lhes dar modelos corretos” (Orientação da Criança, p. 215).

A igreja também pode ajudar nesse processo de maneira prática, atuando internamente por meio dos Ministérios da Família, da Criança e do Adolescente, Desbravadores, Aventureiros e outros; e em espaços externos, como em escolas, universidades e centros comunitários. Em ambas as esferas devemos contar com a ajuda de profissionais qualificados, como psicólogos, psiquiatras, médicos, enfermeiros, assistentes sociais, agentes de saúde, professores e pastores.

Acima de tudo, precisamos da sabedoria e do poder protetor do Espírito Santo. Ele pode sarar as feridas e proporcionar novidade de vida. E pode também usar o corpo de Cristo, que somos nós, Sua igreja, para testemunhar aos sofredores que há cura e esperança. ]

MARLI PEYERL é educadora, coordenadora da campanha Quebrando o Silêncio e líder do Ministério da Mulher na sede sulamericana da Igreja Adventista

Para saber mais

quebrandoosilencio.org

O bê-a-bá da educação dos filhos

EXISTEM VÁRIOS ESTILOS DE PATERNIDADE, MAS AQUELE QUE EQUILIBRA APOIO E CONTROLE TEM SE MOSTRADO MAIS EFICAZ DONNA J. HABENICHT

Embora os pais não tenham nenhuma garantia de que os filhos terão um relacionamento significativo com Deus na fase adulta, o melhor que eles podem fazer enquanto os filhos são pequenos é refletir sobre o estilo de criação que têm adotado. Centenas de estudos, desde a década de 1950, têm analisado a relação entre o comportamento dos pais e a formação dos filhos.

Os resultados mais positivos têm sido associados a um modelo de educação cujos princípios já apareciam na Bíblia e nos escritos de Ellen White. Nas Escrituras, por exemplo, Deus é retratado como um Pai que equilibra justiça e misericórdia (ver Gn 18:19; Sl 103; Pv 3:11 e 12; 13:1 e 24; 15:1 e 5; 19:18; 22:6 e 15; 29:15 e 17; Is 49:13; 54:13; 66:12 e 13; Lc 15:11-32; Ef 6:1-4; Cl 3:20 e 21 e Hb 12:5-11).

Por sua vez, Ellen White descreveu também estilos de criação de filhos, usando nomes diferentes dos de hoje, mas identificando o mesmo comportamento apontado como o mais adequado por estudos contemporâneos (ver O Lar Adventista, p. 439; Orientação da Criança, p. 223- 290; Conselhos aos Pais, Professores e Estudantes, p. 155; Educação, p. 283, 287-297; A Ciência do Bom Viver, p. 384, 391 e 392; O Maior Discurso de Cristo, p. 130-134; O Desejado de Todas as Nações, p. 511- 517; Testemunhos Para a Igreja, v. 1, p. 390-405; v. 3, p. 131-135, 531, 532; v. 4, p. 362-363).

APOIO E CONTROLE

Em linhas gerais, toda essa discussão se refere a dois aspectos principais da relação entre pais e filhos: apoio e controle. O apoio tem que ver com a sensibilidade dos pais em relação às necessidades da criança; e o controle diz respeito a quanto poder exercem sobre ela. A maneira de os pais apoiarem e disciplinarem os filhos afeta a atmosfera do lar, o tom emocional das relações e tudo o mais que acontece dentro de casa.

Os pais apoiadores são receptivos às necessidades da criança. Demonstram muito amor e ternura para com ela. Abraçam, fazem carinho e expressam amor na linguagem que os filhos conseguem entender. Percebem quando o filho teve um dia difícil e necessita de uma dose extra de amor. Esses pais comem, brincam, trabalham e oram com os filhos todos os dias.

Em um lar com apoio, pais e filhos dialogam bastante. Eles sabem como o outro se sente e todos compreendem quais são os valores da família. Os pais respeitam e escutam o ponto de vista do filho e demonstram paciência para com os erros e inconsistências típicos da infância. A independência e a individualidade são incentivadas. Os pais apoiadores são representantes do amor de Deus para seus filhos.

Por outro lado, os pais que não demonstram apoio costumam estar concentrados nos próprios interesses e pouco preocupados com as necessidades da criança. Em lares liderados dessa maneira, os filhos quase não têm permissão para expressar opinião, porque os pais têm medo de perder o controle ou não separam tempo para ouvi-los. Esses pais costumam não demonstrar muita simpatia e podem ser frios e rudes com as crianças. Pouco se envolvem com os filhos e veem na independência e na individualidade das crianças um tabu.

Por sua vez, o controle tem que ver com quem tem as rédeas da família: pais ou filhos? Nesse sentido, o estilo de educação pode variar entre exigente, orientador ou permissivo. Em resumo, o nível de apoio e controle num lar determina o clima emocional da família, que pode ser de aconchego e cuidado ou de frieza e hostilidade; de alegria e felicidade ou de repressão e tristeza. Tudo isso terá papel significativo no fato de os filhos depois aceitarem ou rejeitarem os valores e a religião dos pais.

MODELOS DE PATERNIDADE

MUITO APOIO

Autoritativocomunicativo Responsivo, apoiador, orientador, exigente

MUITO CONTROLE

Autoritário Não apoia, exigente, controlador

POUCO APOIO

Permissivo-indulgente Responsivo, apoiador, tolerante, complacente

POUCO CONTROLE

Indiferente-negligente Desinteressado, não disciplinador

QUEM ESTÁ NO CONTROLE?

Os pais exigentes definem limites para o comportamento dos filhos e os explicam com clareza, respondendo coerentemente a possíveis questionamentos deles. Eles ensinam os filhos a raciocinar e tomar decisões apropriadas para a idade. Por isso, apesar de serem firmes, são razoáveis e não esperam perfeição dos filhos. Esses pais entendem que o domínio próprio é uma espada de dois gumes. Eles reconhecem que também precisam de autocontrole e, caso não tenham condições de lidar com certa situação, deixarão para resolvê-la com calma depois, enquanto oram por sabedoria. O fato é que nessa família quem está no controle são os pais.

Em contrapartida, pais condescendentes e complacentes acham que os filhos não precisam de limites nem de orientação. A frase “as crianças precisam se expressar” é uma das preferidas dos que se portam assim. Esse tipo de lar costuma ter poucas regras, poucos horários e hábitos predefinidos, como quando e onde as crianças devem comer e dormir. Quando tentam estabelecer limites, esses pais o fazem de modo imprevisível e inconsistente, o que acaba não ensinando os filhos a fazer escolhas e planejamento. Nesse tipo de lar, os filhos é que estão no controle.

ESTILOS COMUNICATIVO E AUTORITÁRIO

A intersecção entre as dimensões de apoio e controle identificam quatro quadrantes que definem os quatro estilos de criação de filhos: autoritativo-comunicativo, autoritário, permissivo-indulgente e indiferente-negligente (veja o diagrama “Modelos de paternidade”). Cada estilo é definido pela qualidade e quantidade de apoio e controle na relação entre pais e filhos. Comecemos com o mais adequado.

Os pais autoritativos-comunicativos buscam seguir o modelo divino para educar os filhos: amor e graça incondicionais, orientações claras para valores morais e conduta e ação disciplinar quando necessária. Estudos científicos que apontam nessa direção podem ser encontrados, por exemplo, no capítulo escrito por Holly Catherton Allen e outros pesquisadores no livro Understanding Children’s Spirituality (Wipf and Stock, 2012).

Esses pais costumam ter um relacionamento carinhoso com os filhos. São firmes, pacientes, amáveis e sensatos. Ensinam os filhos a raciocinar e tomar decisões. Nesses lares, tanto os direitos dos filhos quanto os dos pais são res peitados. Pais autoritativos-comunicativos estão envolvidos na vida dos filhos. Sabem por onde e com quem eles andam.

Filhos criados desse modo tendem a ter um vínculo mais forte com os pais. O desenvolvimento moral deles é consistente e a autoestima é saudável. São confiantes, alegres e cooperadores. Apresentam bom rendimento escolar, são responsáveis e independentes, e muitos deles se tornam líderes. Costumam seguir a religião dos pais e o Deus com quem aprenderam a se relacionar. É a mistura perfeita de misericórdia e justiça.

Já os pais autoritários são identificados por seu alto nível de exigência e controle e pela pouca capacidade de diálogo. Tendem a usar a força e a punição física. Raramente explicam o motivo das ordens e regras, e tampouco permitem que os filhos tomem decisões.

Infelizmente, o estilo autoritário é bem comum entre famílias religiosas conservadoras, que justificam sua postura com base numa visão distorcida a respeito de Deus. Os filhos de pais autoritários costumam reagir de duas maneiras: rebelam-se contra os valores dos pais e saem de casa o mais cedo possível ou se transformam em indivíduos indecisos, incapazes de lidar com decisões morais difíceis. Tornam-se “presas” fáceis de influências externas ou podem tentar ser “perfeitos”, na esperança de conquistar o favor de um Deus que imaginam ser apenas justo, mas não misericordioso.

ESTILOS PERMISSIVO E NEGLIGENTE

Os pais permissivos-indulgentes têm um relacionamento afetuoso com os filhos e demonstram muito interesse por suas atividades, mas são mais amigos dos filhos do que pais deles. Por falta de orientação e pelo fato de poderem fazer o que quiserem, essa nova geração tende a se tornar impulsiva e egocêntrica. São fracos no autocontrole, têm dificuldade em enfrentar problemas e a visão que nutrem de Deus é de Alguém que desvia o olhar quando os seres humanos erram. Para eles, o pecado não é o principal problema do Universo.

Por sua vez, os pais indiferentes-negligentes fazem poucas tentativas de orientar os filhos; praticamente os ignoram. Não estão comprometidos com a educação deles. Podem ser fisicamente abusivos e não cuidar das necessidades básicas

O ESTILO DE PATERNIDADE ADOTADO DETERMINA O CLIMA EMOCIONAL DO LAR E, EM GRANDE MEDIDA, SE OS FILHOS VÃO ACEITAR OU REJEITAR A RELIGIÃO DA FAMÍLIA

das crianças. Outros pais que adotam esse estilo até se responsabilizam pela manutenção financeira da família, mas não se envolvem emocionalmente com os filhos.

Famílias ocupadas, nas quais pai e mãe trabalham em tempo integral, podem cair facilmente nesse estilo. Com frequência, os filhos recebem liberdade excessiva e autonomia prematura. Uma pesquisa publicada por G. M. Fosco, E. A. Stormshack, T. J. Dishion e C. E. Winter no Journal of Clinical Child & Adolescent Psychology (2012, p. 202-213) mostra que os pais que permanecem conectados aos filhos durante a adolescência reduzem os índices de uso de drogas, comportamento sexual de risco e delinquência.

Os filhos de pais indiferentesnegligentes têm maior propensão de aceitar os valores negativos da sociedade, porque seu desenvolvimento moral e espiritual é fraco. Eles têm problemas emocionais profundos ligados à negligência que sofreram. O Deus deles é o Soberano do Universo, que não Se importa com o que acontece na Terra.

O MELHOR CAMINHO

Em suma, qual seria o segredo para criar filhos com sucesso? Demonstrar o máximo de amor com o equilíbrio entre independência e controle. A criação de filhos com base no diálogo e na autoridade é o modelo que mais se assemelha ao estilo de paternidade de Deus. O modo de expressar apoio e controle varia conforme cada cultura, mas a combinação equilibrada entre esses dois elementos tem se mostrado o melhor caminho em várias etnias, conforme o capítulo de Larzelere, Morris e Harrist no livro Understanding Children’s Spirituality.

O estilo de educação adotado pelos pais tende a influenciar os filhos ao longo de toda a vida deles. A lembrança dos pais como figuras de autoridade é associada a um ajuste positivo até mesmo nos adultos de meia-idade e mais velhos, segundo argumentam Carol A. Sigelman e Elizabeth A. Rider no livro Life-Span Human Development (Wadsworth Cengage Learning, 2009, p. 491).

Via de regra, os pais educam seus filhos conforme foram criados. A boa notícia é que, com a ajuda de Deus e se necessário, é possível mudar o estilo de criação dos filhos. Muitas famílias bem ajustadas são prova disso. Usar uma abordagem com base no diálogo e na autoridade é um esforço que vale a pena. Afinal, é o futuro de nossos filhos e netos que está em jogo.

Este texto é uma adaptação de um artigo publicado originalmente na revista Ministry de novembro de 2014. ]

DONNA HABENICHTé doutora em educação e professora emérita do departamento de Psicologia Clínica e Educacional na Universidade Andrews (EUA)

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