mulheres e águas

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Mulheres e águas

Em Rio Formoso, a 89 quilômetros da capital pernambucana, Recife, as mulheres se dedicam à pesca e, ao mesmo tempo, são as responsáveis pela continuidade da tradição pesqueira na comunidade.

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Paulo Maia

Avó e netas na pesca artesanal de siri.

Paulo Maia

É

provável que quando se fale de pesca, ou pescaria, de modo geral venha à mente a figura masculina. Talvez por ser uma atividade que remete a um trabalho rústico, de força e resistência física. No entanto, em Rio Formoso (PE), as mulheres se dedicam à pesca e, ao mesmo tempo, são as responsáveis pela continuidade da tradição pesqueira na comunidade. O pequeno povoado, localizado no litoral sul de Pernambuco, é conhecido por seus manguezais de raízes

vermelhas, que, de forma muito peculiar, lembram um emaranhado de linhas em meio à água e à vegetação verde do mangue. Além disso, lá se encontra a paradisíaca Praia dos Carneiros, que, com sua beleza, brinda os visitantes com a tranquilidade local e o seu barro medicinal, segundo o costume local. Mas a beleza de um lugar está mesmo em sua gente. Ao visitar essa comunidade composta em grande parte por gente simples e trabalhadora, a realidade é de mulheres que diariamente saem para o trabalho no mangue e, assim, complementam a renda familiar com a extração de mariscos, caranguejos e vários outros animais marinhos comestíveis encontrados no manguezal. Os papéis sociais são muito bem divididos. De modo geral, os homens se dedicam à pesca com barco em alto-mar e à pesca de caranguejo na lama do próprio mangue, enquanto as mulheres se dedicam à extração de mariscos, tarefa muito difícil pelo risco de se cortarem, uma vez que estes estão presos às rochas e são verdadeiras lâminas de corte. Elas também usam uma pequena rede chamada gereré para pescar siri, e, junto às crianças com varas de pesca bastante rudimentares, ficam à margem do rio pescando peixes pequenos. Tudo isso para alimento próprio, ou para vender aos restaurantes da região. O trabalho fatigante, que demora o tempo em que a maré permanece baixa, é recompensado, por exemplo, com a venda de um siri por mais ou menos 1 real. A luta diária dessas mulheres coincide com a luta de muitas mulheres pelo Brasil afora, que, além de se dividirem entre o trabalho externo e doméstico, também são as responsáveis pela educação de seus filhos. E em Rio Formoso, além disso, são as mães que asseguram a continuidade da tradição e definição dos papéis sociais, uma vez que são elas que levam desde cedo seus filhos ao mangue para a aprendizagem da pesca artesanal. É nesse momento, vivido pelas crianças, como um lazer que elas vão incorporando à arte de seus pais e vão sendo igualmente incluídas na atividade, que caracteriza a vida daquela comunidade pesqueira. São tantas histórias de vida que se cruzam no mangue. São tantas lutas diárias. Tantos sonhos banhados pelas águas do rio, que o mangue se torna a fonte de energia para essas mulheres que saem de suas casas em barco ou caminhando pelo rio em busca de seu pão de cada dia. São mulheres que, ao educar seus filhos nessa tradição, garantem a sobrevivência não somente de uma prática laboral, mas de todo o conjunto, de uma maneira de ver o mundo, de pensar e de construir sua vida. março de 2012 79


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Muitas vezes, o processo de aprendizagem da pesca é também um momento de lazer para as crianças.

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Junto à mãe, as crianças vão sendo introduzidas na pesca artesanal de siris, com varas rudimentares.


fotos: Paulo Maia

Mãe e filha pescam mariscos.

A pesca de mariscos e ostras, nas pedras, é arriscada pela sua localização em rochas de difícil acesso e também porque as ostras são muito cortantes.

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