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Ronaldo Viana s.
Albert! meu nome é
Uma história sobre bullying
São Paulo, 2017
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Meu nome é Albert!
Copyright © 2017 by Ronaldo Viana da Silva Copyright © 2017 by Editora Ágape Ltda. COORDENAÇÃO EDITORIAL
PREPARAÇÃO
CAPA
REVISÃO
Rebeca Lacerda Dimitry Uziel DIAGRAMAÇÃO
Fernanda Guerriero Antunes Patrícia Murari Marina Ruivo
Rebeca Lacerda COORDENADOR EDITORIAL
EDITORIAL
Vitor Donofrio
Giovanna Petrólio João Paulo Putini Nair Ferraz Rebeca Lacerda
AQUISIÇÕES
Cleber Vasconcelos
Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990), em vigor desde 1o de janeiro de 2009.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (cip) Viana S., Ronaldo Meu nome é Albert! : uma história sobre bullying / Ronaldo Viana S. -- Barueri, SP : Ágape, 2017. 1. Ficção brasileira 2. Preconceito – Ficção 3. Assédio – Ficção I. Título 17-0039
CDD 869-3
Índice para catálogo sistemático: 1. Ficção brasileira 869.3
editora ágape ltda. Alameda Araguaia, 2190 – Bloco A – 11o andar – Conjunto 1112 cep 06455-000 – Alphaville Industrial, Barueri – sp – Brasil Tel.: (11) 3699-7107 | Fax: (11) 3699-7323 www.editoraagape.com.br | atendimento@agape.com.br
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Dedico este livro a Deus.
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Nota do autor Pessoas são diferentes. Pessoas são únicas. Pessoas têm nome e, neste livro, o nome Albert poderia ser substituído por John, Dimitri, Sarah, Giulia, poderia até ser Kurt ou qualquer outro. Poderia ser o seu, poderia ser o meu. Meu nome é Albert! é uma obra de ficção, lugar para onde muitas pessoas gostariam de fugir, principalmente quando elas vivem histórias como esta. Histórias que, infelizmente, são comuns antes mesmo de receberem uma classificação, Bullying. Histórias que estão escondidas na sala de aula, na sala de casa e até nas redes sociais, para quem quiser ver. Lendo este livro, é possível que você ria com Albert, que chore com ele. E é bem possível que você o ame. Talvez você se veja nesse garoto e queira entrar nas páginas desta obra e defendê-lo – ou defender-se – de seus agressores. Meu nome é Albert! é uma obra baseada em fatos reais, nela revivi a minha própria história e a de milhares de pessoas ao redor do mundo, talvez até a sua. Uma história que é vivida por muitos, mas que não deveria pertencer a ninguém.
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1 Albert, um louco solitário? Terça‑feira, 23 de setembro de 1974. Nesse ano, a Alemanha Ocidental foi campeã da Copa do Mundo de futebol. Albert completara 11 anos no dia 17 de agosto, pois tinha nascido em 1963. Morava em Husum, uma pequena e linda cidade portuária no norte da Alemanha capitalista. O seu pai, Peter, era dono de um pequeno mas rentável comércio. Era um bar, o Bar do Porto, localizado na zona portuária. Já a mãe, Bella, não gostava da vida que o marido levava nas noites que pareciam infindáveis. O casal não vivia bem. Todo mundo dizia que Albert era louco. Por isso, como se não bastassem as preocupações com o esposo boêmio e ausente, Bella ainda tinha de se preocupar com o filho. Ela já havia levado o garoto a vários médicos da cidade porque, segundo era dito, Albert vivia conversando sozinho, longe das pessoas, e tinha só um amigo: o Kurt. No entanto, era sempre diagnosticado como um menino normal, embora talvez houvesse sofrido algum trauma. Com amor materno, Bella perguntava‑se: “Qual será a razão do trauma? Será o defeito nas mãos?”. Ela não conseguia obter respostas dos médicos, de Albert e nem de qualquer pessoa. A família de Albert era da Igreja Luterana, à semelhança da maioria dos moradores de Husum. Contudo, apenas Bella se dedicava à vida cristã. Todo dia, Albert conversava com Kurt. Aliás, com exceção de sua mãe, era somente com esse amigo que ele 9
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dialogava durante o dia. Era uma amizade secreta, embora Kurt fizesse bem ao garoto. Albert e o seu amigo se encontravam no jardim todas as manhãs, menos aos domingos, que era o dia de ir à Igreja Luterana da cidade. Juntos, eles brincavam, sorriam, e Kurt não o aborrecia em nada. Afinal, desde os 8 anos ambos eram verdadeiros amigos, e, como tinham a mesma idade, até nisso combinavam. Kurt e Albert não guardavam segredos, se respeitavam mutuamente, não zombavam um do outro e não se agrediam nem verbal nem fisicamente. Na escola, porém, zombavam de Albert todo dia, e volta e meia, inclusive, sofria agressões físicas. Por isso, o filho de Bella tinha pavor das pessoas. O fato marcante de sua vida foi ter nascido com um problema nas mãos. Ele não tinha dedos na mão esquerda, e apenas três na mão direita. Para piorar, os dedos que possuía eram anões. Apesar do defeito nas mãos, Albert conseguia fazer as coisas necessárias que a vida exigia, incluindo o ato de escrever. Ele era muito inteligente, mas detestava ir à escola. Nesta, o tempo custava a passar e isso era um problema. O jardim, porém, era o paraíso de Albert, porque o tempo passava sem que ele nem percebesse. Albert achava que todo mundo na escola, na rua e até na sua família observava o seu defeito físico. Por causa disso, não dava conversa a ninguém e procurava viver isolado de todos, abrigado num mundo só seu. Os vizinhos comentavam sobre o jeito esquisito do garoto de três dedos. Houve até um dia em que Adam, filho de dona Martha, ouviu de sua mãe: – Adam, nunca ande com aquele menino, o Albert. – O Três Dedos? – Sim. – Por que, mãe? – Ele é doido, filho. E dizem que fica no quintal de casa falando sozinho horas e horas. 10
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– Deve ser brincadeira dele. – Que brincadeira estranha essa, né? – Não sei, mãe. Só sei que ele não é meu amigo; aliás, não é amigo de ninguém. Lá na escola, todo mundo zomba dele e ficam gritando: “Aperta a mão aqui, Albert! Aperta a mão aqui, Albert!”. A hipócrita Martha deu um sorrisinho e falou com aparente seriedade: – Isso não se faz, Adam. Martha se virou de costas, pois queria ficar mais à vontade para rir das zombarias das crianças com o garoto. No fundo, ela achava tudo muito engraçado. – Mãe, todo mundo gosta de zoar o garoto – Adam disse. – Até os irmãos dele! – Isso não é correto. – Tentou se fazer de justa perante o filho. – É por isso que ele é esquisito assim. Fique afastado dessas brincadeiras de mau gosto. – Está bem, mãe. Mas eu posso ser amigo do Tom e da Carol? – Claro que sim. Eu só estou te pedindo para evitar o garoto com defeito, só isso. Ele pode dar uma de doido e até jogar pedra em você. – Como assim, mãe?! – indagou Adam com espanto. De imediato, Martha percebeu a besteira que havia saído de seus lábios e tentou consertar as palavras: – Ah, sim, ele só tem três dedos… Daí é difícil mesmo. – E riu. – De qualquer maneira, Adam, evite ficar perto dele. – Vou evitar, mãe. Já eram 10 horas da manhã e, enquanto Albert estava no jardim conversando com o seu amigo secreto, não deu outra: depois que Martha falou com Adam, ela colocou na cabeça que deveria procurar a vizinha para relatar as estranhezas do garoto. Então, confiando nos relatos discriminatórios de Adam, Martha, tida como notória fofoqueira pela vizinhança, foi à casa de Bella a fim de falar sobre o comportamento de Albert na escola e com os vizinhos. Na verdade, segundo o 11
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seu modo de ver, o problema era o comportamento de Albert para com todos à sua volta. A vizinha chegou e logo foi dizendo: – Bella, somos amigas há quanto tempo? Sem entender a razão da pergunta, ela respondeu: – Ah, desde a adolescência. – Então preciso ser sincera com você. – O que aconteceu, Martha? – Eu estou achando o seu filho muito estranho. – Qual deles? – O Albert. Admirada, Bella repetiu sem perceber: – Albert? O Albert? – Sim. – O que o meu filho fez? – Bom, o Tom e a Carol são normais, mas o Albert tem andado muito estranho. Bella achou difícil a Martha ter dito que os outros eram normais, então pensou: Será que essa fuxiqueira quer dizer que o Albert é doido? Sem perder tempo, indagou: – Você quer dizer que o Albert não é normal? – Não, não é isso – Martha gaguejou. – É que ele é diferente dos outros. – Ser diferente é uma coisa; ser anormal é outra – Bella pontuou com seriedade. – Parece que você quer insinuar que o meu filho é doido, não é mesmo? Era exatamente isso o que Martha queria dizer, mas a fuxiqueira tentou fugir do estereótipo que era evidente aos próprios olhos. – Não é isso, Bella. – Então o que é, Martha? – Eu só quero ajudar, só isso. Na verdade, o Adam disse que o seu filho tem andado muito estranho na escola. – O Adam falou isso?
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– Sim, e disse também que o Albert vive falando sozinho e fica enjaulado no jardim a manhã toda. São essas coisas, Bella, você sabe melhor do que eu. – E qual é o problema? – Ora, Bella, você acha que uma criança que vive calada, fala sozinha pelos cantos e foge das pessoas não tem problemas? – Eu quis dizer: qual é o problema para você? Martha ficou sem saber o que responder e Bella continuou: – Ele tem feito mal às pessoas? – Que eu saiba, não. – Tem feito mal a você e ao Adam? – Também não. – Logo, concluímos o seguinte: o meu filho só é diferente dos outros. Estou certa? Quando a vizinha ia falar, Bella fez um sinal de pare com a mão direita e disse: – Não precisa responder nada. Acho que você já entendeu o que eu quis dizer. – Em seguida, para dar basta à conversa, completou: – Agradeço por sua preocupação, vou conversar com Albert sobre o comportamento dele. Agora, porém, me dê licença! Preciso começar a preparar o almoço das crianças. – Está bem, desculpe‑me pelo jeito de falar. – Tudo bem. – Vou lá. Bella disse baixinho, sem que a vizinha a ouvisse: – Demorou… Bella deduziu que Martha diria a todo mundo que o seu filho era louco, pois conhecia a suposta amiga de longa data. Para Bella, a vizinha não passava de uma fofoqueira e de uma fuxiqueira hipócrita. Ainda assim, pensou consigo: Não tenho opção. Vou conversar seriamente com o Albert. Os minutos iam passando e a casa seguia a sua rotina. Quando Albert ia brincar com Kurt no jardim, o garoto fugia do mundo real e criava o seu mundo de faz de conta. Por algumas horas, esquecia‑se das lutas e das dificuldades que vivenciava todos os dias. 13
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No seu mundo imaginário, Albert era sempre feliz. Quando se separava de Kurt todas as manhãs, pois suas aulas se iniciavam às 14 horas, tão logo ele ficava com vontade de voltar a brincar nas terras escuras do jardim. O garoto não queria ir para a escola porque sabia o que iria encontrar lá: desprezo, zombarias e agressões. No entanto, não tinha jeito: ele precisava estudar. Por causa do seu defeito, ou melhor, da discriminação da sociedade de então, o menino não parava para conversar nem para brincar com os garotos e as garotas do bairro. Antes eram eles que viviam se escondendo dele, porém agora era Albert que vivia se escondendo de todos. O filho de dona Bella tinha dois irmãos: Tom, de 13 anos, e Carol, com 15 anos. Tom não era diferente dos zombadores da escola, enquanto Carol, por conta de outros interesses, tentava ao máximo ser indiferente ao irmão caçula. Ela desejava ser benquista pelas amigas e pelos amigos da escola, além de só querer namorar. Ela só pensava em Klaus, o seu namorado de 17 anos. Ele, por sua vez, era um bom jovem de uma família bem‑conceituada da cidade, e, por morar perto da casa de Carol, os seus encontros ficavam mais facilitados. O que a jovenzinha não sabia, porém, é que Klaus estava se preparando para ter uma séria e decisiva conversa com ela. Com certeza, a continuidade do namoro dependeria disso. Klaus não concordava com o jeito com que Carol tratava o irmão: com desprezo e indiferença. O bom jovem não queria continuar namorando uma menina mimada, fria e egoísta. Ao amanhecer, Albert, depois de tomar café, logo ia ao pequeno jardim de sua casa. Era lá onde ele passava a maior parte do tempo e onde ficava até a hora do almoço. Naquele dia, antes das 11 horas da manhã, Bella chamou Tom. Ele estava em seu quarto, no segundo andar da casa, mas desceu e perguntou: – O que foi, mãe? – Estou ocupada com o almoço, Tom. Chame o Albert para mim. 14
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– Ele está lá nos fundos do jardim, mãe. – Eu sei, filho, foi por isso que te chamei. Vai agora até a porta e chame o Albert. – Está bem. O filho saiu resmungando, mas obedeceu. Após poucos segundos, Tom gritou da porta da cozinha: – Albert, a mãe quer conversar com você! – O que ela quer? Enquanto Albert perguntava, Tom entrou no jardim e se aproximou do irmão para poder responder do seu jeito. Responderia, é claro, sem que a mãe o ouvisse. Disse ele: – Olha, eu acho que ela quer saber se é verdade o que falam de você. – O que falam de mim? – Que você é doido, só isso. – Eu não sou doido. – Olha, irmãozinho problemático, para mim quem conversa com ninguém, como você faz neste jardim, é doido. Você fica aqui sozinho, horas e horas, parecendo que está conversando com as árvores. Então, só pode ter um parafuso a menos ou a mais na sua cabeça, não é mesmo? – Já disse: eu não sou doido! E outra: não estou sozinho! Tom olhou para um lado, depois para o outro. Não vendo ninguém, perguntou: – Quem está aqui com você? Albert ficou em silêncio. Ele tinha que guardar segredo sobre a sua amizade, pois com certeza Tom não iria entender. Além do mais, o irmão iria rir muito dele e de Kurt. O garoto, nervoso, gritou: – Já falei que eu não sou doido! Agora vai embora daqui, Tom! – Pode até não ser, mas as pessoas falam. Eu já acho que você é meio maluco das ideias, meu irmão – falou isso fazendo um gesto circular com o dedo indicador na altura da própria cabeça. – Vamos lá dentro conversar com a mãe. 15
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