Luiz da Gama Mór - Ponto Turismo 1

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Luiz da Gama M贸r ADMINISTRADOR TAP-PORTUGAL

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Aviação Comercial

A internet é o grande canal de comunicação que deu o poder ao cliente Num mercado revolucionado pela comunicação na internet que colocou o poder nas mãos do cliente, o administrador da TAP defende que nunca houve tanta evolução no produto. Ponto Turismo - Como é que tem sido o ano para a TAP? Luiz da Gama Mór – O ano tem corrido bem. Temos conseguido compensar as receitas em diferentes mercados de outros que caem, mas mesmo naqueles em que cai, como por exemplo Portugal, não cai muito. Em Portugal o tráfego corporate tem crescido, mas tem caído bastante o de lazer. Continuamos a crescer no Brasil, embora não ao ritmo do ano passado, em África e no Norte da Europa. Na Alemanha estamos a crescer acima dos 20% e em França e Inglaterra também crescemos bem. Temos alguma dificuldade em Itália, Espanha e Portugal porque são os países que sofrem mais com a crise. Genericamente estamos com um resultado em linha com o ano passado. Em relação a 2011 a TAP, SA está ligeiramente abaixo em função do impacto das greves, mas estamos a recuperar. Pretendemos chegar com um resultado equilibrado até ao final do outono. A TAP SGPS está um pouco melhor do que no ano passado. Os custos, com exceção dos de combustível, estão bastante abaixo, fruto das ações que fizemos o ano passado e que estamos a continuar este ano. Conseguimos concluir uma série de projetos importantes na área tecnológica, o próprio projeto com a Amadeus na parte de gestão de inventário e de aeroporto já está em produção, o novo software de gestão de carga também está a libertar muita mão de obra. O nosso limite de redução de custos tem sido a qualidade de serviço, onde, pelo contrário, temos uma série de projetos para melhorar. P. Turismo – Quais são esses projetos para melhorar a qualidade de serviço? LGM – São muitos. Desde o atendimento, que foi um trabalho muito forte nos últimos meses e que tem a ver com a campanha “De Braços Abertos”. Houve uma série de modificações internas de gestão de recursos humanos. Estamos a dar mais valor à atitude em detrimento dos aspectos mais técnicos do comportamento, da formação e do perfil dos candidatos. Também estamos a lançar um novo produto de classe executiva em que serão apresentadas novas ementas, nova palamenta e estamos a segmentar um pouco mais o “long haul médio”, do “long haul longo” introduzindo pequenas alterações como ter um edredão em vez do cobertor, nas rotas mais longas. Fizemo-lo por necessidade de tempo de voo, por exigência de concorrência e de perfil de passageiro - é um cliente

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mais corporate, de mais executiva, que nos destinos mais de lazer. Também estamos a concluir até março, a modificação nos A340. Estamos a introduzir os vídeos touchscreen com vídeo-on-demand em toda a classe económica, a trocar os assentos - aumentamos a distância entre os lugares pelo que o conforto é maior. Está a ficar uma económica realmente fantástica. Na classe executiva estamos a trocar os vídeos e a revitalizar os assentos. Já temos o primeiro avião, o segundo está pronto em outubro, o terceiro em janeiro e o quarto em março. P. Turismo – E novas rotas? LGM – Agora estamos a começar o processo para avaliar e decidir sobre novas rotas. Primeiro temos de avaliar o que é que temos de disponibilidade de avião e todos os anos, quando existem negociações com os aeroportos, conseguimos melhorar os slots e isso permite aumentar a produtividade do avião. Mas a nossa estratégia mantém-se: ligar Portugal ao resto da Europa. Existem muitas oportunidades de crescimento dentro da Europa e muitas oportunidades de crescimento na América e em África. É aí que vamos ficar. O nosso foco é Atlântico Sul. P. Turismo – Há pouco falou das greves. Qual tem sido o impacto e como é que a TAP vê essa situação? LGM – É sempre muito prejudicial. Nós temos sempre dois tipos de prejuízos importantes. O primeiro é que os passageiros somem. Naquele período nós perdemos muito. O segundo é a dificuldade de medir a perda de confiança dos passageiros na empresa. Perdemos a fidelidade, há passageiros que se vão embora e que nunca

Fora as low-cost, a TAP é provavelmente a companhia aérea tradicional mais eficiente da Europa

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O nosso limite na redução de custos é a qualidade de serviço onde, pelo contrário, a TAP está a investir, designadamente ao introduzir alterações na económica e executiva da frota dos A340

mais regressam. Lamentamos mas temos de viver com isso, mas faz parte do negócio. P. Turismo - Como é que a TAP lida com a concorrência das low-costs, principalmente em rotas como por exemplo em Espanha. LGM – A nossa empresa, até por causa das características do país, sempre foi muito forte no lazer, porque o mercado corporate é pequeno em Portugal. É muito diferente de Espanha. A Iberia tem um mercado corporate muito forte, tal como a Alemanha, França ou Inglaterra, são países com uma economia muito maior, e eles voltam-se para o mercado corporate que por sua vez introduz algumas características às companhias. No nosso caso, como fomos sempre uma empresa historicamente vocacionada para o lazer, o nosso custo por assento/quilómetro é muito mais baixo do que o custo médio da AEA. E tem provavelmente um dos, senão o custo mais baixo das empresas europeias. Quando o fenómeno low-cost começou nós começámos a acompanhar desde o início. A diferença entre os custos das low-cost e os custos das grandes empresas europeias era maior do que a diferença entre os custos das low-

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cost e os da TAP, tanto que a TAP não se transforma com a entrada das low-cost. Não começámos a vender serviços como a alimentação a bordo que muitas tiveram que fazer. A concorrência das low-cost atingiu-nos de forma indireta, isto é, o que as empresas tradicionais tiveram que fazer para competir com as low-cost acabou por nos atingir e então todo o mercado se modificou. Mas nós continuámos no nosso processo de melhoria de produtividade, fundamentalmente esse foi o maior salto que demos, menos pessoas fazendo mais, muito mais eficiente. Eu acho que devemos ser a empresa mais eficiente da Europa, fora as low-costs. A segunda questão é que a empresa se transforma quando se segmenta. Tínhamos um único produto, atacávamos o mercado de uma mesma forma. Usávamos o princing e as restrições tarifárias como única ferramenta de diferenciação. Transformámo-nos quando lançámos as cinco maneiras de viajar, lançámos o TAP discount e a partir daí, uma comunicação voltada para o preço com uma presença muito forte no mundo da internet. A low-cost não é um risco para a TAP. É um concorrente que tem um modelo de negócio, que é importante que

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exista, Portugal precisa de todos os modelos até porque é um destino turístico importante. A nossa forma de concorrência tem sido através da melhoria de serviço. Diferenciação via serviço. Mostrar que nós nos preocupamos com os clientes, todo o nosso projeto De Braços Abertos, na Web 2.0 e Facebook é isso. Nós damos importância ao cliente e achamos que tem valor, e vamos continuar, sem descuidar a questão do preço. Mas as low-cost nem foram o nosso problema… P. Turismo – Qual foi então? LGM - A nossa preocupação é com duas questões que ainda não estão completamente resolvidas em Portugal. Uma é a capacidade de crescer no aeroporto de Lisboa. Nós precisamos de crescer no aeroporto de Lisboa e tem havido restrições ao nosso crescimento. A nossa capacidade de competir pressupõe aumento de produtividade, aumento de eficiência e este pressupõe crescimento. O nosso negócio é muito dependente das economias de escala e nós temos de ter espaço para crescer no aeroporto de Lisboa, e a gestão da ANA, em alguns momentos, não nos deu essa possibilidade, reservando espaço para o próprio crescimento das low-cost. Então o nosso problema não é competir com as low-cost, o nosso primeiro problema é espaço para crescer. O segundo problema é que podemos competir com as low-cost, mas temos de ter condições de concorrência iguais. Nós fomos acusados há muitos anos de ser uma empresa que recebia subsídios do Estado e hoje inverteu-se. O Estado e a comunidade de turismo subsidiam as low-cost e nisso nós estamos contra. A Madeira e o Porto subsidiam as low-costs e Lisboa, a ANA, tem dado condições às low-cost que nunca deu à TAP e nós achamos que está errado, é mau para o país. Portugal tem de achar uma forma de conviver com os três modelos, que é empresa tradicional, low-cost e operadores. P. Turismo – Mudar para outro aeroporto é a solução? LGM – Pode ser. É uma questão de saber onde é o outro aeroporto e depende também das condições em que isso vai ocorrer. Nós estamos a viver uma circunstância económica muito particular. O ideal seria que construíssemos um novo aeroporto que num primeiro momento pudesse ser feito em etapas e numa primeira colocar lá as low-costs. Mas não é simples porque as low-cost não vão e ninguém as pode obrigar a ir. A própria easyJet diz que não sai da Portela porque o modelo dela é de concorrer em aeroportos principais. De qualquer forma este aeroporto ainda tem alguma capacidade de crescimento, mas no médio e longo prazo precisamos de mais espaço para crescer. P. Turismo - Então na sua opinião a decisão da ANA de colocar a easyJet no Terminal 2 foi errada? LGM – Não. Nós fomos para lá na época em que foi construído. Em determinado momento a ANA quis transformar o Terminal 2 num terminal mais barato e isso foi errado, não há lugar nenhum no mundo em que se subsidie low-cost no aeroporto central. A ANA acabou por ultrapassar e não diferenciou via preço os dois terminais e assim sendo nós aceitámos e saímos, até porque temos ganhos de produtividade e de qualidade de atendimento aos passageiros tendo toda a operação no Terminal 1.

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A nossa capacidade de competir pressupõe aumento de produtividade e de eficiência e este pressupõe crescimento Na realidade os apoios que a ANA dá à easyJet são mais no sentido da utilização da Portway e uma série de fatores que contém o contrato, como a própria preparação do Terminal 2, algumas concessões como por exemplo embarcar ou desembarcar a pé que foi algo que nós pedimos sempre e nunca concordou e no entanto concordou com a easyJet. É a atitude e um conjunto de subsídios escondidos na ação que nós não concordamos, não é o facto de existir o Terminal 2 e a easyJet estar lá. A easyJet é uma empresa importante para Portugal, está a fazer um bom trabalho. Não temos problemas de concorrer com quem for, pelo contrário, precisamos desse estímulo para continuar a desenvolver e a fazer cada vez melhor. P. Turismo - Qual é a posição da TAP na questão da venda de serviços que antes estavam integrados na tarifa? LGM - A TAP acompanha essa tendência mas não com a mesma radicalidade que uma empresa low-cost. Em alguns aspetos isso introduziu mais transparência e também acaba por ser um serviço porque fica mais claro

“É UM PRIVILÉGIO VIVER EM LISBOA E NÃO QUERO SAIR DAQUI” P. Turismo -Já sabe em que país é que irá viver um dia? LGM - É muito pouco provável que saia de Portugal. Eu não quero sair de Portugal, a minha mulher não quer sair de Portugal. Gosto do Brasil, por um milhão de motivos, adoro Lisboa, a qualidade de vida aqui é muito grande, em comparação com os problemas que temos no Brasil e também por causa da família. Aqui estou perto dos filhos. Não posso dizer que desta água não vou beber, mas eu não quero sair de Lisboa, todo o meu planeamento é como se fosse ficar aqui o resto da minha vida. P. Turismo - O que é que mais aprecia nos portugueses? LGM - Eu gosto de quase tudo daqui de Portugal. Eu gosto muito de Lisboa, da vida, do clima, adapteime tremendamente. Não sou capaz de ficar muito tempo longe da comida portuguesa, gosto do vinho português, sei que há muitos vinhos bons no mundo inteiro mas gosto do português. Gosto muito das pessoas, admiro muito a cultura a visão de mundo dos portugueses aberto aos outros. Tenho dificuldade em dizer o que gosto mais porque acho um privilégio morar aqui.

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no produto que é o poder do consumidor que surge com a internet, com a relação direta. Hoje a internet é um instrumento cada vez mais utilizado pela população geral, até porque é cada vez mais fácil, mais seguro e mais flexível. A internet é o grande canal de comunicação. Não quer dizer que toda a comunicação se processe ali, mas o cliente gosta dessa capacidade de escolha, de experimentar, de ver opiniões, o cliente estuda, está muito bem informado de tudo. Gosta da interação e por isso nós construímos um contact center que envolve a venda pela internet, o call center, o Facebook e outros social media. Estamos a preparar para começar a responder diretamente no TripAdvisor. Queremos estar disponíveis. E o facto de um cliente comprar via agência de viagens não o impede de dialogar conosco e pedir esclarecimentos. É uma tecnologia que mudou completamente o mundo da aviação. Esse é o futuro imediato, cada vez mais integração dos diferentes media, cada vez mais interativo, o que é uma imensa exigência. Hoje é tudo real-time e online. Isso é uma vantagem fantástica, nunca tivemos tanta informação como a que temos hoje, nunca soubemos tão claramente o que o passageiro quer e o que está a acontecer e onde está o problema. Agora temos uma capacidade de intervenção muito maior, nunca o produto evoluiu tanto quanto agora.

No seguimento da estratégia de estar cada vez mais perto do cliente a TAP está a preparar-se para começar a responder diretamente no TripAdvisor. A ideia é estar disponível

para os passageiros. A utilização da internet facilita essa escolha à la carte do passageiro. Para termos uma TAP discount tivemos de tirar atributos de produto como é o caso de cancelamentos de voos, alteração de itinerário, que são muito mais penalizados numa tarifa TAP discount. Cada empresa escolhe o seu modelo e é saudável que isso exista. Acho que há uma lógica de que se existe valor, pode-se pagar por isso, até como garantia, como é o caso da escolha do lugar. Nós temos alguns limites, não chegamos, por exemplo, à cobrança pelos assentos de emergência até porque não permitimos que se faça reserva antecipada para esses lugares. Temos também alguns limites como mínimos que têm que estar incluídos no bilhete, para que uma pessoa possa viajar sem dificuldade. A ideia é dar, por um lado, a possibilidade de escolha e por outro a possibilidade de poder construir a TAP discount para poder ter preço competitivo. P. Turismo - Como é que avalia a evolução dos canais de distribuição? LGM – Eu diria que essa é a principal mudança que houve na comercialização. Houve uma mudança profunda

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P. Turismo - Uma vez que não podemos falar na privatização, que papel é que vê a fazer no futuro da TAP? LGM – Não olho para tão longe. É muito difícil saber. Estou preocupado em fazer o meu trabalho bem feito e ser feliz naquilo que faço e isso é suficiente para mim. Portugal, e a TAP em concreto por ser uma empresa pública, têm um conceito de segurança de emprego que eu não tenho na minha formação. Existe a perceção de que o emprego numa empresa pública é garantido. Não temos nada garantido, a garantia somos nós próprios e a nossa profissão. P. Turismo -Que recomendações deixa ao turismo nacional? LGM - Acho que temos que nos preocupar com as exportações. Temos de achar formas de vender lá fora, e não é só pela crise e característica, mas pela vantagem competitiva. Os portugueses são um dos povos melhor preparados para conviver com o mundo. É um povo aberto a conhecer o outro, é um povo poliglota, um povo culto e não se dá conta disso. Acho que se deve investir melhor na marca Portugal e não é através de campanhas do Turismo de Portugal, apesar disso poder ajudar. É um pouco mais do que isso. Nós temos que ter mais ambição no sentido de nos afirmarmos no mundo. Portugal não se dá o valor que tem. É preciso ultrapassar uma visão antiga da diáspora portuguesa. A força de Portugal e dos portugueses no mundo tem de ser aproveitada para ter uma influência e para vender no mundo. Acho que ainda somos muito fechados e nós temos que falar para o mundo e ao fazer isso nós é que vamos contar ao mundo como nós somos, para os outros não contarem como nós somos. É preciso mudar o tipo de discurso, internacionalizar mais as empresas portuguesas para trazer mais turistas e saber em que é que lhes podemos ser úteis. Portugal é melhor do que nos veem.n

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