Enfoque (137)

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vila brás | são leopoldo | novembro/2012 | edição 137

Brás

enfoque

Mesmo sem um espaço adequado para a prática do skate, mais de 50 jovens se reúnem todos os sábados para aproveitar o asfalto em frente à Escola João Goulart

O artesão que transforma garrafas em taças

Página central

Em uma oficina caseira, Alcides Assis da Motta, 61 anos, dá novo uso a material rejeitado

Página 7

Troco algo que eu gosto por algo que você tem Moradores da Vila Brás passam adiante objetos e memórias para seus vizinhos

Páginas 10 e 11

(Crônicas)

Páginas 3, 5, 13, 21 e 22

RODRIGO BLUM

Estudantes do curso de Jornalismo da Unisinos interpretam a vida cotidiana na vila

MARCELO GRISA

O pico da


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Idas e vindas

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Carta ao leitor Aproxima-se o final do ano. Fazemos novas reflexões, temos novas vontades. A poesia aparece nos pensamentos e nas falas. E nos convida a acreditar que podemos ser melhores e fazer o melhor, que podemos aprender com a vida e ousar. As pessoas somam vontade e empenho, e constróem oportunidades. É como diz a canção: “Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. É com essa garra que uma mulher trabalha com a venda de produtos de limpeza, de porta em porta, e percorre as ruas da Vila Brás com os filhos pequenos. Fazem suas histórias. Gente que continua firme na caminhada, como a jovem Bianca de Lima, campeã de paracanoagem, que se prepara para ir à busca de novas conquistas. O calor de novembro e dezembro convida a sair mais às ruas, propicia reencontros. Andar por aí, tomar um sorvete, conversar, pode inspirar. É assim que nascem as ideias. Ideias de como organizar o espaço pessoal e o coletivo. O progresso da comunidade reflete as atitudes e os propósitos individuais. Ideias de como difundir a cooperação, uma vez que as melhorias e os avanços em qualidade de vida vêm pelo esforço e pela união. Quem sabe seja essa a hora de darmos um passeio. Uma voltinha pelas ruas de parcerias, dobrando uma e outra esquina de flexibilidade, atravessando a avenida e entrando em entendimento. Caminhar pelas próximas páginas poderá oxigenar os pulmões e ser um bom exercício. Fabiana Eleonora Editora-chefe

O Enfoque é um jornal direcionado aos moradores da Vila Brás, em São Leopoldo/RS. A produção é dos alunos das disciplinas de Redação Experimental em Jornal e Fotojornalismo do Curso de Jornalismo da Unisinos. Fale conosco! (51) 3590 8463 / 3590 8466

enfoque

enfoquevilabras@gmail.com

“É bonito aparecer no jornal”

Maria Generosa, moradora da vila há quatro anos, pede (e sai) no Enfoque BIBIANA KRANZ (Texto) Caroline Weigel (Foto)

“E

i! Vocês podem tirar uma foto minha?” foram as palavras de Maria Generosa Souza dos Santos, 60 anos. “Eu acho bonito aparecer no jornal. Quase todos da vila já foram fotografados, e eu pensei que um dia eu poderia falar com vocês, e pedir para tirarem fotos minhas e do meu enteado, Valdemir”. Dona de uma casa na Avenida Leopoldo Wasun, a pensionista atende o Enfoque com um sorriso no rosto. “Se sair, vou mandar o jornal para a Diva e para a Vilma, minhas amigas de Novo Hamburgo”, diz ela, encabulada. Em pouco tempo, Maria se abre, contando sua história. “Moro há quatro anos na vila, e foi o único lugar ao qual me adaptei. Os vizinhos são mais gentis, não é tão barulhento e aqui me sinto feliz”, relata. “Antes de vir para a vila, morei muitos anos em Novo Hamburgo, porém, não tinha muitos amigos, eu andava sempre sozinha”, explica Maria. “Minha família toda mora em Canela.

Eu era de lá. Morei 30 anos naquela cidade.” Maria afirma que sente muita falta de sua família, e que às vezes a visita: “Tenho vontade de me mudar para lá, mas o custo de vida é muito alto e é difícil arranjar emprego naquela região”. A pensionista compartilhou mais do que alguns trechos breves de sua vida, revelando acontecimentos comoventes ocorridos em um período curto de tempo. “Há quatro meses perdi meu marido. Seu nome era Dorival dos Santos, tinha 81 anos, e durante um ano sofreu as consequências do câncer de pulmão”, relata ela. Maria e Dorival estavam casados há 24 anos. “A batalha contra a doença foi muito sofrida, pois não havia remédio que ajudasse. Foram idas e vindas do Hospital Centenário. Os sintomas demoraram a aparecer, e inicialmente achávamos que eram apenas pontadas”, conta a pensionista. Anteriormente, outra tragédia acometeu a vida de Maria e de seu falecido marido. “Também perdi um filho, César Souza dos Santos, há dois anos, em

um acidente de moto. Ele tinha apenas 20 anos, e era um rapaz correto. Havia se formado na escola, não tinha vício nenhum. Às vezes é difícil de acreditar que realmente aconteceu”, conta Maria, com lágrimas aos olhos. “Eu era mamãe coruja. Buscava-o no colégio até os 18 anos, e sempre que ele saia à noite, eu o esperava acordada.” Outro morador da casa explica como ocorreu o acidente. “César foi desviar de um carro que estava saindo de ré da garagem, e deu de encontro a outra moto”, diz Manuel Blademir Acauan, inquilino de Maria. “Meu filho foi atendido pelo Hospital Geral, ficou 24 horas internado antes de falecer”, comenta Maria. “Acho que a perda do César foi o que auxiliou no adoecimento do Dorival.” Apesar de tudo o que ocorreu na vida de Maria Generosa Souza dos Santos, ela não perdeu as esperanças, nem o sorriso do rosto, e confessa seu maior desejo. “Eu tenho outro filho, Luciano Galle, mas de outro casamento. Ele mora em Novo Hamburgo, e está solteiro no momento. Meu sonho é que ele me dê um neto.”

Av. Unisinos, 950 - Agexcom/Área 3 - São Leopoldo/RS

Confira quando circulam as próximas edições! 135

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15 de setembro

6 de outubro

Novembro

[REDAÇÃO] Orientação: professor Eduardo Veras. Textos: alunos André Herzer, André Pereira, Bibiana Kranz, Catiele Abreu, Dieverson Colombo, Édson Schaeffer, Estefania Souza, Fabiana Eleonora (editora-chefe), Fernanda Mandicajú, Isabel Bonorino, Jonas Pilz, Juliana Litivin, Juliana Spitaliere, Larissa Azevedo, Letícia Dias, Lucas Barros, Lucas Steinmetz, Lucas Velho, Luciana Marques, Luciana Martinez Trapolini, Luísa Schenato, Luiz Fernando Vieira, Marcus Von Groll, Melissa Lewis, Natália Gaion, Natália Mussi, Paula Silveira, Rafael Kehl, Rodrigo Karam, Rodrigo Blum, Simone Ludwig e Taize Odelli. [FOTOGRAFIA] Orientação: professor Flávio Dutra. Fotos: alunos Adriano Garcia, Alessandra Fedeski, Angélica Dias, Bruna Pires, Bruna Scotti Abreu, Camila Capelão, Caroline Santos, Caroline Weigel, Daniel Grudzinski, Danielle Souza, Fernanda Reus, Fernanda Schmidt, Gabriela Barbon, Gilvana Dias, Guilherme Maciel, Henrique Standt, Jéssica Sobreira, Jorge Leite, Laís Oliveira, Leonardo Vieceli, Marcelo Grisa, Mariana da Rosa, Mariana Aveline, Mayra Andrade, Mel Anaí Quincozes, Paula Cardoso, Pedro de Brito, Priscila Gomes, Rossana Pires, Sabrina Strack, Shelby Nelson, Thaciane de Moura e Vitor Pereira. [ARTE] Projeto gráfico e diagramação realizadas pela equipe de jornalismo da Agência Experimental de Comunicação (Agexcom). Supervisão: professores Eduardo Veras e Thaís Furtado. Projeto gráfico: jornalista Marcelo Garcia. Diagramação: estagiária Amanda Heredia. Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS Av. Unisinos, 950, Bairro Cristo Rei - São Leopoldo/RS Telefone: (51) 3591 1122. E-mail: unisinos@unisinos.br Reitor: Marcelo Fernandes de Aquino. Vice-reitor: José Ivo Follmann. Pró-reitor Acadêmico: Pedro Gilberto Gomes. Pró-reitor de Administração: João Zani. Diretor da Unidade de Graduação: Gustavo Borba. Gerente de Bacharelados: Gustavo Fischer. Coordenador do Curso de Jornalismo: Edelberto Behs.

Maria Generosa saiu de Canela, na Serra, para viver na Brás, onde comemora a gentileza dos vizinhos


Esporte

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

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Medalha, medalha, medalha Bicampeã brasileira e sul-americana de paracanoagem, Bianca da Silva de Lima busca patrocínio para realizar seus sonhos Catiele Abreu (Texto) Paula Cardoso (Foto)

representante do Estado na paracanoagem e mesmo assim os patrocínios não aparecem. “Já fui em lojas buscar patrocinadores e ninguém quer ajudar. Falam que, se fosse para futebol, ajudariam, mas, como é outro esporte, não têm interesse”, desabafa. O auxílio vem de familiares e amigos que ajudam na venda das rifas e com outras ações. Mesmo com as dificuldades, Bianca não desiste e serve de exemplo para seus colegas. “Ainda não caiu a ficha, mas minha professora diz que os outros alunos falam que querem ser como eu”, diverte-se. Depois que ela começou a participar das competições e conquistar medalhas, aumentou o interesse de outros jovens pela canoagem. Ela ainda é uma jovem atleta, mas sonha alto. Seu objetivo é competir nas Olimpíadas. Bianca diz que para isso é preciso força de vontade e treino, qualidades que não faltam para essa medalhista.

P

ersistência e esperança são sentimentos que movem os sonhadores. Não é diferente para a atleta de paracanoagem e moradora da Vila Brás Bianca da Silva de Lima, 15 anos. Ela é atleta da Associação Leopoldense de Ecologia e Canoagem e pratica o esporte desde 2010, através do projeto municipal Canoagem na Escola. A adolescente tem má formação congênita na mão direita, o que não a impede de praticar o esporte. Há cerca de um ano, Bianca já marcou presença nas páginas da edição 128 do Enfoque, quando estava prestes a participar de uma competição internacional. Desde então ela já esteve presente em diversos campeonatos e faturou medalhas para sua coleção, que só aumenta.Ainda tem muito potencial, pois está só no início da vida de atleta. Entre os principais eventos esportivos que Bianca participou, estão o campeonato Mundial, realizado na Polônia, onde ela obteve a oitava colocação; o Pan-Americano, em que conquistou a medalha de prata; e o Brasileiro, onde se sagrou bicampeã. O próximo desafio da jovem é o Campeonato Brasileiro de 2012, que acontece em novembro. Ela diz que essa é uma das competições mais importantes, pois é quando ela tem a oportunidade de obter índice para os demais campeonatos. “Agora começa tudo de novo. Tenho que me classificar para poder participar do Pan e do Mundial”, conta. A expectativa de Bianca para o próximo Brasileiro é grande, pois ela já venceu duas vezes. Porém, enfrenta dificuldades de patrocínio. As despesas com passagens, hospedagem e alimentação são por conta do atleta, e sua família não tem condições de custear tudo. Para que ela não fique de fora, sua mãe, Claudia da Silva, incentiva a filha a não desistir. “Fazemos rifa, meio galeto e vendemos para arrecadar o dinheiro”, diz. Claudia também conta que a filha é a única

Bianca, que já foi capa do Enfoque, exibe suas novas conquistas

(Crônica ) Que saudades da minha infância Simone Ludwig (Texto) RODRIGO BLUM (Ilustração) O sábado estava quente. Não. Horrivelmente quente. Daqueles dias em que o sol dá férias para as nuvens, de modo que ele tenha que trabalhar a todo vapor. Andando com passos rápidos, é impossível relaxar, já que há muitas coisas para serem feitas, o tempo é curto e a vida não espera. Continua acontecendo. Foi em meio a esses passos que avistei um grupo de meninos. Eles estavam tão contentes, tão alegres. Suas faces estavam mais radiantes do que o sol de 30 graus. Adivinhem o que eles estavam fazendo? Soltando pipas. Durante alguns

minutos de distração, veio à tona lembranças de um tempo em que a minha única preocupação era brincar. Que saudades da minha infância. A vida era tão maravilhosa, sem a preocupação. Não precisávamos de remédios para tensão e stress. Todos os dias de alguma forma eram especiais. Não suportando a ideia de apenas observar, resolvi ir conversar com os meninos. No fundo, eu tinha uma vontade incontrolável de ser contagiada por toda aquela alegria inocente e sincera de criança. Eles falavam pelos cotovelos. Quanta simpátia! No meio disso tudo, o mais novo me conta uma pérola: “A gente caça rãs e eu tenho uma guardada dentro de uma

caixa lá em casa”. À medida que a boca de David se movia com cada palavra pronunciada, as pipas voaram dos meus pensamentos e as rãs começaram a saltar como ideias enlouquecidas.

Mas isso não foi nada perto do que o pequeno, esbelto e de cabelos encaracolados acrescentou. “A gente come elas também”. Nossa! Quando poderia imaginar que cinco meninos caçam, limpam e comem rãs? Hoje é tudo tão diferente, tão artificial. Quando vi a casinha improvisada dos garotos, ali, logo abaixo de uma árvore grande de folhas secas, deu uma saudade de um tempo, em que brincava de casinha e podia ter um amigo imaginário sem parecer ter um parafuso a menos. Por isso e por tantas outras coisas, fico me perguntando por que quando somos crianças queremos ser logo adultos e quando adultos queremos voltar a ser crianças? Alguém sabe me responder?


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Cultura popular

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Todo mundo sabe alguma coisa Rodrigo Blum (Texto) Angélica Dias (Fotos)

Ao transmitir uma pequena parcela de sua sabedoria, as pessoas mostram um pouco de sua vida. Contam um pouco de suas histórias e transmitem um recado genérico, que pode se aplicar de maneira muito forte e causar identificação dos leitores. São recados de vida, que se lidos com atenção, podem significar mais do que está explícito. No grande número de moradores da Vila, alguns dão dicas de assuntos variados que pudessem ajudar os leitores de diversas maneiras. A ideia era dar uma dica útil em apenas uma frase. Surpreendentemente, algumas delas carregam muito mais do que sugestões de moda, culinária ou pintura.

“As pessoas têm que parar de beber tanto, pois isso incomoda a família e os amigos. Principalmente a minha própria família.” Apelo de Lucia Santos da Cruz, uma cozinheira que hoje se dedica a cuidar de sua mãe, filhos e sobrinhos, e ainda enfrenta problemas com o alcoolismo de alguns familiares. “Eu poderia dar boas dicas de cozinha, mas essa significa muito mais para mim”, fala.

Ao pintar a grade de uma casa nova que pretende alugar ou vender, Bruno Schneider explica: “É importante sempre diluir a tinta óleo com solvente certo e a tinta acrílica com água”. Ele já aproveita para divulgar seu investimento: Quem se interessar pela casa número 41 da Rua B, basta entrar em contato com ele pelo telefone 3572-0676.

Ester de Paula de Oliveira, 40, “empreguete”, como ela mesma denomina sua profissão, dá uma dica de um belo look feminino: “um vestido tomara-quecaia , uma sandália com strass, brincos grandes, muitas pulseiras e tornozeleiras estão super na moda.”

“É importante cuidar de seus filhos com muita atenção”, salienta Marlei Lopes, 32, prestadora de serviços gerais. A mãe de Philip Gustavo do Nascimento, de apenas quatro meses de idade, ensina algo que se aplica a todos os tipos de mãe, com filhos de todas as idades.

“Para fazer qualquer coisa bem feita, é preciso fazer com amor”, ensina Marilei Regina Vetter, proprietária da Padaria Cravo e Canela. Para ela, a felicidade e a satisfação estão diretamente relacionadas ao gosto pelo que se faz.

“Para os cabelos ficarem mais bonitos e tratados é bom utilizar um bom xampu de limpeza profunda”, sugere a cabelereira Maria Lenir Brummelhaus , dona do salão Lena Cabeleireira.

O açougueiro Raul Danilo Berlitz, 44, sugere o corte ideal para um bom churrasco: “Uma costela dianteira com o corte nos ossos, com uma largura de sete centímetros preserva o sabor da carne.”

“Na hora de comprar um carro usado, é bom sempre fazer uma revisão no motor e na caixa de câmbio”, diz Valci Almeida , 41, proprietário da revenda Alemão Car.


Cultura popular

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

No mundo da mecânica Donos de oficinas ensinam truques para solucionar problemas corriqueiros no dia a dia dos veículos Rodrigo Karam (Texto) Fernanda Reus (Foto)

A

mecânica de autopeças é um serviço disponível em grande parte das comunidades. O conhecimento, com isso, é transmitido através de gerações. A troca de experiências permite que uma simples rotina de trabalho possa ser interrompida constantemente para o ensinamento a pessoas que desconhecem a magia que envolve as oficinas. A Vila Brás conta com quatro oficinas mecânicas. A demanda de serviço varia conforme o número de funcionários de cada uma. A entrada da Oficina Santos, por exemplo, simboliza a grande procura de motoristas da comunidade. Localizada na Rua 13, a calçada e o portão são ocupados por veículos com defeitos que vão desde o encurtamento do carburador até o entupimento do esguicho. Os termos acima podem soar estranhos a motoristas novatos e pedestres convictos.

Para esclarecer as dúvidas, o proprietário José Mauri dos Santos, 50 anos, descreve os problemas de forma sucinta. O primeiro carro analisado foi um Chevette 86. “Ele chegou aqui por causa do motor engasgado. Era o carburador sujo, que acabava cortando a distribuição de combustível”, descreve José. O mesmo problema foi encontrado em um Escort, mas dessa vez em razão de sujeira no esguicho, mecanismo responsável pela distribuição de combustível. A rotina da oficina conta com o auxílio de uma pessoa conhecida: o filho Alair Gomes dos Santos, 15 anos. No horário inverso de aula, o jovem recebe ensinamentos do pai sobre o conserto de automóveis. “Mas ele não deixa de estudar”, adverte José, que resume o gosto da família pela profissão. “Eu sempre gostei de trabalhar com mecânico, mas tem que ter o dom de fazer”, considera. O trabalho em família da família Santos contrasta com a rotina solitária de Odair Medina, 32 anos. Proprietário da Mecânica She-

ffer, localizada na Rua Lyons Padre Reus, ele atende uma demanda inferior em comparação a oficina concorrente. O motivo é “a preocupação em fazer um serviço de qualidade”. O número de carros que procuram a mecânica, no entanto, é constante, com defeitos variados. Odair descreve os principais problemas encontrados ao mesmo tempo em que apresenta dicas para que motoristas identifiquem os problemas (ver box). Odair conquistou uma lista de clientes fiéis, o que não impede alguns contratempos. A falta de pagamento por parte de alguns clientes, mesmo com a emissão de recibo, é um exemplo, mas que não impede o dandamento do trabalho. “Não vale a pena se estressar. O que vale mesmo é trabalhar”, resume. Os mecânicos da Brás são especialistas em solucionar defeitos de automóveis. O motivo é a transmissão do conhecimento mecânico através de gerações e a conquista de clientes fieis.

Odair utiliza a própria residência para receber e consertar carros de vizinhos da Brás

Dicas do Odair Defeito 1

Defeito 2

Defeito 3

Defeito 4

Dente estragado da correia dentada

Interrupção da bomba de gasolina

Desgaste da embreagem

Amortecedor estourado

O que fazer: não acelerar o veículo no instante do arranque, pois pode haver entupimento das válvulas termostáticas. A peça é responsável pela transmissão de água, e o mau uso pode resultar na fundição do motor.

O que fazer: o desgaste da bomba pode impedir a passagem de gasolina. O problema pode ser evitado se o motorista sempre colocar gasolina quando o tanque chegar ao trecho de reserva. A solução é substituir a bomba de gasolina.

O que fazer: pode ser identificado quando o motorista não consegue aumentar a velocidade do carro mesmo colocando o pé no fundo do acelerador. A solução é não acelerar o carro para aumentar a velocidade.

O que fazer: substituir a peça, pois o defeito resulta em vazamento de óleo.

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(Crônica )

Que cheirinho Édson Luís Schaeffer (Texto) RODRIGO BLUM (Ilustração) Mas que cheirinho é esse que me persegue? Vou andando pela Leopoldo Wasum. O cheirinho me persegue. Mas que cheirinho é esse? Sigo caminhando, o cheirinho me acompanhando. Chego à Rua dos Beijos. O cheirinho chega junto. Fico pensando: “Que cheirinho é esse?”. O cheirinho não me parece estranho... Não, não pode ser isso. Sigo em frente. Chego à Associação dos Moradores – o cheirinho chega junto, de novo. Só ouço murmúrios: “Que cheiro é esse?”. Olho para os lados. Que cheirinho é esse? Tento adivinhar. Meus neurônios não devem ser. Está certo que estava desesperado atrás de uma notícia. Mas não seria o suficiente para queimar os neurônios. Seria? Acredito que não. Que cheirinho é esse? Sigo caminhando – já ganhando dor de cabeça, por duplamente pensar em pauta e no cheirinho. Chego à Rua dos Cravos. O cheiro chega também. “Mas que cheiro insistente. Não larga do meu pé”, penso. Pé? Será chulé? Não, pouco provável. Meia nova, tênis novo. Começo a pirar nesse cheirinho. Será que está impregnado no meu nariz? Volto à Associação. Passo uma água no rosto e no nariz, obviamente. Saio. O cheirinho volta de novo. “Mas que cheirinho infernal. Que cheirinho é esse? Larga do meu pé...”. Pé? Decido olhar para os meus pés. Suspeitava desde o princípio. Descobri que cheirinho é esse, que tanto me perseguia, me fazia perder a concentração. Só pode ter acontecido quando desembarguei do ônibus, chegando à Vila Brás. Eu havia pisado, como suspeitava desde o princípio, nas fezes de um cachorro – ou seria cadela? – na minha chegada à Brás. De certo de um dos vários cachorros (ou cadelas) abandonados ou soltos nas ruas da Vila. Cheirinho nada agradável, né?


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Capricho

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Como o pátio de casa pode ser um lugar para plantar

O jardim mágico da esquina Larissa Azevedo (Texto) Priscila Gomes (Fotos)

A

realidade do asfalto e dos carros que passam ao lado da casa parece não fazer parte do bairro em que vive Luiza Irma da Silva, 55. A aposentada, que mora em uma das esquinas da Avenida Leopoldo Wasun, na Vila Brás, tem um dos maiores jardins da região e transformou-o em um ambiente à parte. Fez dele um espaço reservado para o cultivo de plantas. “Cresci fazendo isso. Para mim, é algo tão natural que não encontro dificuldade”, conta ela, que nasceu em Espumoso e passou quase toda a vida trabalhando na lavoura do pai. Em seu jardim, tem planta de tudo que é gosto. Couve-flor, salsa, espinafre para o almoço e de sobremesa, bergamotas ou laranjas. Se der vontade depois, chás variados. “O que eu mais gosto é o de cidreira”, confessa. O costume que lhe foi imposto desde o berço se transformou em hobbie e hoje é uma das formas como Luiza ocupa o tempo livre. “Geralmente eu fico duas horas por dia envolvida nisso, mas sempre de manhã cedo, para escapar do calor”, justifica. Quem trabalha ali não é só ela. O filho mais novo, o único que ainda mora em casa, Moisés Alexandre da Silva, 27, ajuda a mãe nesse trabalho. “Nas limpezas mais pesadas , ele me auxilia também, coloco ele no pesado”, ri a mãe.

O passo a passo de Luiza

Para quem não tem o mesmo espaço privilegiado de Luiza, vão as dicas da aposentada para fazer uma horta no espaço que houver:

l É preciso regar todos os dias;

l Pode ser feita em vasos

l Cuidar

normais, a forma de cuidar e o resultado são quase os mesmos do que plantar diretamente;

se fizer muito calor, mais vezes. A terra nunca pode estar seca e nem empapada.

sempre com o tipo de planta que vai cultivar, pois existem épocas certas para cada uma;

l Limpar

sempre os inços, pois, se eles tomarem conta, a planta desejada não nasce; l Para quem não tem como

fazer adubo natural, com restos de comida, recomenda-se colocar folhas de outras árvores para nutrir a terra.


Invenção

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

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Garrafas que viram taças Trabalho artesanal de morador da Brás transforma produtos recicláveis em mercadorias de uso diário Simone Ludwig (Texto) MEL QUINCOZES (Foto)

S

e você acha que garrafa de vidro vazia é lixo, é porque não conhece o trabalho de um morador na Vila Brás. Alcides Assis da Motta, 61 anos, trabalha há 20 com a fabricação de taças, provenientes de frascos jogados fora por outras pessoas. O artesão, que produz tudo em sua própria casa, comercializa três tipos de itens: taças grandes, pequenas e copos. “Agora, por exemplo, já tenho pré- prontas em minha residência cinco mil garrafas cortadas, lixadas e lavadas”, conta. Como diz o ditado, “ninguém faz sucesso sozinho”. O mesmo acontece com Alcides, que conta com a família para atender todos os pedidos. “Trabalhamos entre quatro pessoas na produção das taças. Meu filho, minha esposa, uma funcionária que contratamos e eu”, conta. Valdir Assis da Motta, 34 anos, auxilia no negócio desde a adolescência. “Ajudo desde os meus 15 anos”, contabiliza. O artesão leva aproximadamente seis minutos para finalizar cada peça e descreve todas as etapas que acontecem até a finalização do produto. “Primeiro eu compro as garrafas da reciclagem. Elas precisam ser brancas, por isso trabalho com os frascos de Smirloff, Orloff,

Skol e Summer (garrafas pequenas). Depois disso trago elas para casa, corto, lixo, lavo, coloco para secar. Depois de seco, colo o adesivo do Grêmio ou do Inter . A cola precisa ser de preferência a Araldite, pois além de ter uma secagem rápida, aproximadamente 10 minuto, ela tem uma fixação resistente e de longa duração. Por último, eu embrulho com muito cuidado, taça por taça”, descreve. Com um grande número de pedidos, Motta confecciona cerca de mil taças por semana. “As grandes são compradas principalmente pelos capeteiros, e as pequenas, juntamente com os copos, são compradas pelas lojas em geral”, conta. O verão só traz alegrias e lucros para o artesão, pois é a estação mais lucrativa do ano. “Quando é tempo de praia, a venda de taças grandes aumenta. Os capeteiros chegam a pedir duas mil peças”, afirmar. Alcides, juntamente com o filho Valir, realiza as próprias entregas. “Tenho carro e reboque. Então coloco tudo dentro e vou”, sublinha. As entregas são feitas inclusive fora do Estado, obedecendo apenas algumas regras. “O limite de entrega é até Santa Catarina e o pedido mínimo é 1.500 unidades”, lembra. As taças grandes são vendidas por dois reais enquanto as pequenas e os copos por um.

Vende-se

uma casa rosa Apesar dos negócios estarem de vento em poupa, o artesão, que mora há 11 anos na Brás, está à procura de um comprador para sua casa. O motivo? Está cansado de cidade grande, quer ir morar no interior e próximo de Criciumal, sua cidade Natal. Para interessados, seguem os dados:

Alcides mostra com orgulho o copo e a taça que produziu em casa

Casa rosa de alvenaria, na Rua S, 110, na Brás, com dois dormitórios, sala, cozinha, banheiro e lavanderia. Construída há três anos, têm 70 metros quadrados,. Conta com pátio, galpão e canil. Preço: R$ 80 mil. Aceita-se carro como parte da troca. Observação: casa de esquina com as duas ruas asfaltadas, em lugar tranquilo. Mais informações: Alcides Dias da Motta, pelos telefones: (51) 9721 1303 e 3572 0225.

A fantástica fábrica de sorvetes Natália Gaion (Texto) Bruna Abreu (Foto) Sob um sol de quase 31°C, em plena primavera, o objetivo era descobrir como a população da Vila Brás se refresca com o calor de verão. A resposta estava na Rua 14 Bis, 521, na sorveteria do João Carlos. A sorveteria Petrópolis começou a funcionar há 12 anos quando seu João Carlos da Rosa resolveu investir em vendas de picolés e sorvetes no pátio em frente a sua casa. Por anos, ele e a esposa, Dalva da Rosa, mantiveram um mercadinho, mas as vendas fiadas quase os levaram à falência. Resolveram fechar, e João Carlos foi trabalhar como vigilante. Como sobrou um refrigerador na venda do mercado, Dalva começou a vender picolés e sorvete. O negócio rendeu bons lucros e João Carlos, visionário, comprou uma máquina indus-

trial e começou a fabricar dentro de casa os próprios sorvetes. Ao longo dos 10 anos seguintes, a fábrica foi ganhando clientes e ficando mais forte. Na sorveteria trabalham ele, a esposa, o filho e a nora do casal. O lucro da fábrica sustenta a família. De acordo com João Carlos, os meses que mais tem venda de sorvetes são entre outubro e dezembro. “É a época que começa a subir as temperaturas e o pessoal ainda está pela cidade. Em janeiro e fevereiro, o pessoal vai pra praia, tira férias e cai um pouco as vendas”, nos conta. A produção dos sorvetes começa já em setembro e outubro. Em 20 minutos são produzidos 10 litros. Por dia são 120 litros. “Nesta época do ano a gente levanta às 5h da manhã para conseguir vencer as vendas. Sai muitos litros por dia”, acrescenta Dalva. Os sorvetes da família não estão só na Vila

Brás, ele é revendido em diversos mercados de São Leopoldo e até Novo Hamburgo. “Nas minhas contas são em torno de uns 30 mercadinhos que compram nossos sorvetes e revendem”, orgulha-se João Carlos. “Depois que começamos a produzir os picolés e sorvetes, nossa renda melhorou bastante. Quando começa a aumentar a temperatura, quando começa primavera e verão, nós ficamos felizes, pois sabemos que teremos clientes. E aqui sempre fica cheio de gente no verão. É muito bom”, alegra-se Dalva. São bem variados os sabores: chocolate, brigadeiro, flocos, morango, creme, menta e os de frutas. Os valores são nem em conta: o pote de 1 litro custa R$5, o de 2 litros R$10 e o pequeno, de 250ml, sai por R$2. Vale a pena conhecer a fantástica fábrica de sorvetes da família.

Dalva e João Carlos mantém há 12 anos a sorveteria Petrópolis


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Economia

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Vida de ambulante

Vendedora percorre ruas da Brás oferecendo produtos de limpeza fabricados por ela Fernanda Mandicajú (Texto) Pedro Brito (Foto)

“O

h visinha quer aproveitar para comprar produtos de limpeza? Está na promoção!”. A frase é de Gislaine Conte, 30 anos, que sob um sol escaldante de aproximadamente 30°, acompanhada da família, caminha pela Avenida Leopoldo Wasun e ruas da Vila Brás vendendo seus produtos num carrinho. Em companhia dos filhos Katiele, quatro anos, David, oito, Ketlyn, 11, e da irmã Janaina da Silva de 17, com Tiago, seu filho de seis meses, Gislaine vai nas casas e nos clientes já conquistados oferecendo os materiais. No carrinho que empurra, tem pinho, desengordurante, detergente e alvejante. Alguns Gislaine compra outros ela mesmo fabrica. Gislaine que há 15 anos trabalha no ramo de vendas, se estabeleceu há sete meses na Brás, tempo suficiente para ter muitos clientes. “Estou gostando de morar aqui, tem bastante movimento, tenho muitos fregueses, bem mais de onde eu morava antes estou gostando, onde vou me dou bem”, declara Gislaine. Antes de residir nesse local, ela

morava no Morro do Paulo, em São Leopoldo, porém era complicado, pois o lugar possui muitas lombas. Na vila é melhor para sair pelas ruas e becos. “Aqui, para vender meus produtos é mais plano, onde eu morava antes tinha que descer e subir muita lomba”, compara. Gislaine vende galão de cinco litros e garrafas de dois litros. Se o cliente comprar três galões ganha um brinde. “Dando o brinde, eu ganho a freguesia, as pessoas ajudam porque veem que a gente está na luta. Hoje saímos às 8h e vamos voltar lá pelas 11h30min. De tarde, vamos ver se vai estar muito quente para irmos a vender de novo. De tardezinha, é melhor de sair, não está muito quente”. Uma de suas clientes, Solange Blauth proprietária da loja Sol Modas, compra há algum tempo os produtos de limpeza de Gislaine. Considera: “É um trabalho honesto, os produtos são bons, compro principalmente o de tirar gordura”. Além de produtos de limpeza, Gislaine também vende frutas em uma carroça. “Eu tinha uma carroça, mas vendi e agora já adquiri outra, que vou receber hoje, o cavalo eu já tenho. Na carrocinha, vendo frutas

e produtos de limpeza. De um lado as frutas. Do outro, os materiais. No verão, vou vender principalmente melancia. Também sou conhecida como vendedora de frutas. Em todo lugar que vou, as pessoas me conhecem. Oh lá vem a mulher da fruta. Outro dia estava passando numa casa, e um menino gritou para a mãe: mãe, a fruteira está aqui. Quando está com a carroça, Gislaine anuncia: “Olha o carroção da economia! Para olhar não paga nada e para levar paga bem pouquinho”! Dorida Da Rosa Flores, moradora da Vila Brás que já comprou frutas, considera o trabalho de Gislaine bom. “Sempre que ela passa aqui eu compro”, comenta Dorida. Os clientes de Gislaine não estão somente na Vila Brás. “Tenho mais de 200 fregueses em Campo Bom, onde morava antes de residir no Morro do Paulo, também tenho clientes perto de Sapiranga” comemora. As entregas mais distantes, Gislaine faz de moto, na qual ela é a condutora. Durante a semana, Gislaine sai, e sua irmã, Janaína, fica cuidando das crianças. No final de semana, todos saem para vender. Sempre com otimismo Gislaine está pronta

Gislaine Conte atende clientes fiéis como Solange Blauth para sair no verão e no inverno. “Ganho bastante ajuda, tem pessoas de bom coração que nos ajudam. Não podemos desistir, saímos hoje, e não tínhamos vendido nada, minha irmã queria desistir, paramos uma casa e vendemos, e eu falei para ela: não podemos desistir é só pedir para Deus que tudo dá certo”.

Com essa convicção Gislaine continua sua caminhada, oferecendo os produtos de limpeza. David, o filho da vendedora de oito anos, já não mais acompanha a mãe, teve que ir para casa receber a nova carroça que irá ajudar a vendedora nas suas caminhadas pelas ruas e avenidas da Vila Brás.

Viva a concorrência!

Alfenor Ferreira: “O sol nasce para todos” Luiz Fernando Vieira (Texto) Adriano Garcia (Fotos) Andando pela principal rua da Vila Brás, a Leopoldo Wasun, é inevitável não repararar na quantidade de lojinhas, bazares e minimercados ao longo de sua extensão. Contudo, o fato realmente curioso é que muitos desses estabelecimentos localizam-se quase lado a lado, grudados um no outro. Imagine você, saindo de casa de manhã cedo para comprar aquele pãozinho para o café, e num espaço de mais ou menos 200 metros encontrar cinco opções de locais para realizar a

Zildo Pompeo, dono do Bazar Estrela

compra. Incrível, não? Pois é, em determinado ponto da Leopoldo Wasun é assim mesmo, um paraíso de concorrência aos olhos dos clientes. Mas como será que os donos desses estabelecimentos lidam com essa proximidade? Será que, literalmente, há espaço para todos? A equipe do Enfoque visitou alguns desses locais e conversou com os proprietários para saber o que pensam a respeito. Cláudio Rocha, 45 anos, é dono do Mercado Rocha há 25 anos. Ele viu como poucos a concorrência crescer a sua volta e, apesar de não ver nisso um pro-

Giovani herdou o mercado do pai

blema, ressalta que nem todos possuem alvará da prefeitura. O comerciante diz ainda que já viu estabelecimentos fecharem as portas menos de um mês após inauguração e atribui a isso as despesas de energia nos armazéns. Segundo ele, se o local for regularizado, há ainda outros custos como o de extintores e sua frequente inspeção. Se por um lado a concorrência não atrapalha, ela também não traz benefícios. Diante dessa ideia, Cláudio conta que em breve estará abrindo uma lan house, buscando na diversidade o crescimento de seus negócios. A poucos metros dali, estão

Carlos, com o Mercado Rocha há 25 anos

mais dois minimercados. Os proprietários Giovani Bertissolo, 29 anos, e Alfenor Ferreira, 63, afirmam que a concorrência não é problema, inclusive não costumam pesquisar preços dos vizinhos para nortear seus negócios. Giovani diz que todos se dão bem. Alfenor endossa: “O sol nasce para todos”. Zildo Pompeo, 36 anos, dono do Bazar Estrela, diz que realmente há bastante concorrência, mas não se sente prejudicado por isso. Afirma haver espaço para todos e argumenta que a população na região é grande, o que faz com que os negócios fluam naturalmente.

Alguns metros adiante, 20 ou talvez nem isso, está o Bazar de Maria Nascimento, 42 anos. Proprietária há três anos, ela também faz coro aos demais colegas comerciantes. Não vê problemas com a proximidade e tampouco com a concorrência. Maria afirma com segurança: “Todos se respeitam, inclusive eu indico algum lugar quando é necessário”. Na Brás, é visível o bom espírito de competitividade dos comerciantes, todos em busca de seu sustento, mas sempre mantendo o respeito. Com isso, ganham todos: Comerciantes e, principalmente, os clientes.


Ensino

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

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Letras + números = motivação Parceria entre escola e Unisinos incentiva o aprendizado da Matemática através da leitura Taize Odelli (Texto) GABRIELA BARBON (Fotos)

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ortuguês e Matemática são duas áreas de conhecimento que geralmente caminham separadas. Quando as letras entram dentro das fórmulas matemáticas, os cálculos se tornam mais complicados, mas um projeto realizado na Escola João Goulart por graduandos de licenciatura da Unisinos agrupa números e letras de outra forma. O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) propõe um novo modelo de ensinar matemática para as turmas do projeto Seguindo em Frente e turmas regulares da escola da Vila Brás. Desde maio de 2012, a leitura de jornais faz parte da rotina das aulas da professora de Matemática Juliana Garbin. Juntamente com a professora de Português, Renata Garcia Marquez, Juliana comanda o Seguindo em Frente, que são turmas especiais com alunos que saíram e agora voltaram às aulas ou possuem dificuldade de aprendizado. Juliana explica que, no início do ano letivo, os jovens entre 15 e 17 anos escolheram temas para trabalhar em aula. Gravidez, profissões, drogas e futuro foram assuntos selecionados pelos 50 alunos. Com isso, Juliana recolhe matérias de jornais e as leva para a turma para serem debatidas e exploradas em atividades matemáticas. Háridi James Pereira, 17 anos, aluno da tur-

ma de Juliana, conta que, com esses trabalhos ele e seus colegas, perceberam o avanço do aprendizado que vêm recebendo. “Apresentamos trabalhos fora da escola, para outras turmas e grupos, e isso motiva a gente a querer aprender mais”, revela. Diferenciar o ensino é o que Juliana considera ser importante para recuperar o interesse dos alunos. “É claro que temos que seguir um padrão de ensino, mas podemos fazer isso de forma mais atrativa, diferente”, explica. A participação dos bolsistas da Unisinos já vem dando resultado. Juliana diz que eles perceberam nos alunos a vontade de querer aprender e as notas começaram a aumentar. Não só consequência da parceria entre professores e alunos de licenciatura, mas também de melhorias feitas em toda da escola, Juliana avalia que o rendimento dos alunos da João Goulart como um todo apresentou grandes avanços. “Em 2009, o Ideb (nível que mede a qualidade do ensino no Brasil) da nossa escola era de 2,9. Este ano aumentou para 4,2, um dos maiores resultados de São Leopoldo”, comemora. Carolina Rodrigues é uma das bolsistas do PIBID que trabalha junto com a professora Juliana. Para ela, o projeto possibilitou maior contato com a rotina de sala de aula. “Vi o programa como uma forma de adquirir postura ética, responsabilidade, experiência e conhecimento”, conta.

Háridi é um dos alunos mais motivados a aprender através do PIBID

Juliana transforma notícias de jornais em exercícios de matemática


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Corrente do bem

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Câmbio solidariedade Moradores da Vila Brás participam de escambo de objetos Juliana Spitaliere (Texto) Danielle Souza (Fotos)

O casal Margarete e Leonel, moradores da Rua 7, oferecem um porta-retratos para começar o escambo

É

comum termos em casa algum objeto que, mesmo significativo, não é mais utilizado ou sequer entrou em uso. E é mais corriqueiro do que imaginamos o interesse ou necessidade, de pessoas próximas a nós, por essa mesma peça. Sabendo dessa realidade, o Enfoque Vila Brás propôs uma espécie de escambo entre alguns moradores. A proposta começou para o casal Margarete Teresinha Gonçalves e Leonel Mário da Silva, casados há 13 anos e pais de oito filhos. Ele, colorado fanático, buscou, entre as dezenas de objetos decorativos alusivos ao Internacional, um porta-retratos que ganhou de presente da filha. A família cultiva o hábito de exibir as fotografias dos filhos e netos em um móvel bem na entrada da casa. “Já tenho tantos enfeites, isso pode fazer a alegria de alguém que não tenha condições de comprar”, afirma Leonel. O porta-retratos foi recebido com alegria por Antônio Carmo da Cruz, outro fanático pelo time. O instalador hidráulico de 53 anos trocou o presente por uma bomba de ar, para encher pneus de bicicletas. O objeto, que foi um presente da família, acabou entrando em desuso, por já possuírem outro do mesmo tipo. “O pessoal aqui na vila anda muito de bicicleta, certamente terá alguma serventia para alguém”, diz. E teve. O pequeno Everton Costa, de 11 anos, adorou o presente. Há pouco tempo, o pneu de sua bicicleta murchou, e ele teve de se deslocar para longe para poder enchê-lo: “Ando muito com essa bicicleta, então é bom que eu tenha um desses em casa”. Quando questionado sobre o

A artesã Adelina de Oliveira, moradora da Rua Alegria de Jardim, doa garrafa térmica em troca dos utensílios de sobremesa

Antônio da Cruz, morador da Rua 14 Bis, doa uma bomba de ar em troca do porta-retratos de seu time O garoto Everton da Costa, morador da Rua dos Beijos, troca a bomba de ar por um conjunto de utensílios de sobremesa


Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

objeto que para a troca, Everton corre para buscar um conjunto de utensílios para sobremesa. O presente foi dado aos pais do menino, que se casaram há alguns meses. “Ganhamos três conjuntos desses. Não custa nada darmos um de presente”, afirma Everton. Adelina de Oliveira estava justamente precisando de um desses. Compra muitos objetos para a casa e utensílios domésticos. Não hesitou na hora em que viu o conteúdo da caixa. “Nossa, estava querendo muito. Já estava até pensando em comprar. É bom para receber visitas”, contou. Artesã, ela passa os dias fazendo suas artes com a companhia do bom e velho chimarrão. Gosta tanto que resolveu doar uma garrafa térmica novinha, que nunca usou. “Eu tenho mais três em casa. Com tanta gente apaixonada por chimarrão por aí, não será difícil encontrar quem queira”, imagina. Andreia Regina Pereira é daquelas que toma chimarrão até no calor. São várias cuias por dia. Mas a térmica já não estava mais ajudando. “Tenho duas outras, mas essa aqui é mais novinha, vai manter mais aquecida a água.” A revendedora de produtos de beleza resolveu ganhar a garrafa em troca de uma caixa com sabonetes. Com muitos produtos para venda em casa, não se importou em doar: “As mulheres adoram estar bem cheirosas, vão adorar”. Justamente os olhos de Lena Maria Moreira brilharam quando viram o presente. “Eu adoro isso, mas faz tempo que não compro.” Dona de casa, Lena é bastante supersticiosa, e gosta manter a casa protegida contra energias negativas. Em uma gaveta de seu quarto, guarda diversas caixas com incenso, cada um com um poder diferente. Pegou o mais forte, segundo ela: o de arruda, contra mau olhado. “Tem muita gente que não gosta de incenso, mas esse é poderoso, pode confiar”. É o que pensa Edi Pinheiro Antunes. Adoradora das fumacinhas milagrosas, adorou o presente. “Acredito muito no poder dos incensos. O bom é que eles ainda perfumam a casa”, conta. A empregada doméstica de 52 anos faz questão de cuidar bem do seu jardim. Diferentes plantas embelezam a entrada de sua casa. Uma delas é seu presente. “Amo plantar e cuidar da terra. Meu presente será uma mudinha de beijinho, uma planta linda”. Há tempos tentando pegar uma muda dessa mesma planta, Margarete Teresinha Gonçalves, aquela que havia começado a corrente, oferecendo um porta-retratos, abre um belo sorriso quando a recebe. A família se une na sala de estar para vê-la posando com o marido para a foto. “Bela iniciativa de vocês. Fez a gente muito feliz, de maneira simples”.

Corrente do bem

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Ao final, Margarete e Leonel recebem um presente em troca do porta-retratos que doaram: uma muda beijinho

Andreia Pereira, moradora da Rua J, decide ganhar a garrafa térmica e doar uma caixa de sabonetes

Edi Pinheiro, moradora da Rua 3, doa uma das plantas que cultiva em seu jardim em troca dos poderosos incensos Lena Moreira, moradora da Rua Girassol, indica seus incensos contra mau-olhado em troca da caixa de sabonetes


Sk8 Street

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Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

(Crônica )

Surfistas do

asfalto

É ela que passa por ruas e avenidas

A lateral da Escola João Goulart é a praia onde os skatistas realizam suas manobras sobre quatro rodinhas e uma prancha. Sem saída e com bom asfalto, a rua toma forma nos sábados à tarde

ANDRÉ PEREIRA (Texto) MARCELO GRISA (Fotos)

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s buracos nas ruas, os desníveis das calçadas e a falta de um local específico para a prática do esporte não impedem os cerca de 50 jovens skatistas de surfarem sobre quatro rodas de uma ponta a outra da Vila Brás. Os locais preferidos são a calçada da Unidade Básica de Saúde na Avenida Leopoldo Wasun – quando está fechada, claro – e, nas tardes de sábado, a frente da Escola João Goulart, na Rua das Papoulas, onde, além dos praticantes com seus caixotes e trilhos, muitos simpatizantes vão assistir. “Aqui no posto nós andamos, mas é ruim, pois muita gente passa na calçada. E ainda tem o perigo de quando o skate desliza para o meio da rua”, conta Vitor Gustavo da Silva, 15 anos, que já teve prejuízo quando um carro passou por cima e quebrou

seu shape (prancha). “Preferimos andar na frente do colégio. Nos sábados à tarde se junta uma galera ali”, afirma Paulo Gabriel Campos, 10 anos. A rua da Escola João Goulart, onde Paulo e Vitor estudam, é a preferida pelos praticantes em razão de não ter saída e contar com asfalto em boas condições, devido ao baixo fluxo de veículos. Skatepark Kelvin Rodrigues, 20 anos, diz que o presidente da Associação de Moradores já foi contatado, em busca de um local próprio para a prática do esporte. “Nós fizemos até uma maquete com tudo que precisaria ser construído. O mais próximo é o mini-hamp no ginásio do Centro”, destaca Kelvin. O estudante Denver Tiago Severo, 17, assinala que o deslocamento para locais apropriados é o mais complicado. “Temos que ir de ônibus ou trem no Skate-

park de Sapucaia, que está todo depredado, ou a Porto Alegre, que é mais longe ainda”, diz ele, que pratica o esporte há mais de dois anos. A falta de um local específico impossibilita inclusive que alguns jovens busquem uma carreira profissional. “Os patrocinadores, que normalmente são donos de lojas de skate, não vão vir até aqui para ver a gente andar”, afirma Leandro Vieira de Assunção, um dos mais velhos do grupo, com 25 anos. “Eu estava parado há uns seis anos e faz uns oito meses que voltei a andar.” Destaca-se entre os mais novos, Taylor Lemos, 13 anos, que pratica o esporte desde os dez. “Deve ter mais de 100 skatistas aqui na Brás. Na frente do colégio se reúnem uns 40 quase todos os sábados”, contabiliza ele. O Brasil tem hoje mais de 3,8 milhões de skatistas e a profissionalização do esporte é complicada devido a falta de locais apropriados.

Fernanda Mandicajú (Texto) RODRIGO BLUM (Ilustração)

Os locais preferidos pelos jovens skatistas da Brás são a calçada da Unidade Básica de Saúde, na Avenida Leopoldo Wasun, e, nas tardes de sábado, a frente da Escola João Goulart, na Rua das Papoulas

— Oh vizinha! Quer aproveitar a promoção? Com essa fala, ela demonstra que está se aproximando. Para chamar a atenção, bate palmas ou grita. Pelas ruas e avenidas, vai ofertando seus produtos para moradores e comerciantes. Visita também os clientes já conquistados, além de cuidar dos filhos que lhe acompanham nessa jornada. Não há chuva nem sol que impeça essa mulher guerreira de sair todos os dias independentemente da temperatura. Com um calor de 30°, ela percorre não sabe ao certo quantos quilômetros percorre por dia, mas sabe que é bastante. Mas o que chama a atenção é que, além de se fazer acompanhar pela família, ela empurra um carrinho com vários produtos. O que ganha dá para viver a vida. A alta temperatura fica estampada no seu rosto, que está vermelho. Ela descansa um pouco, só para conversar conosco em uma sombra, embaixo de um portão, mas em nenhum momento seus olhos se afastam dos filhos. Mas a vida tem que continuar e, por várias ruas, estamos na companhia dessa vendedora ambulante, que tem vários fregueses não somente na Vila Brás, mas também em Campo Bom. Por onde passa, conquista novos clientes e quem sabe até novas amizades. – Oh vizinha, quer aproveitar a promoção! Assim ela continua, empurrando seu carrinho.


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Palpite

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Se essa rua fosse minha... Inspirados em velha cantiga popular, moradores relatam o que gostariam de mudar nos lugares onde vivem Édson Luís Schaeffer (Texto) Shelby Nelson (Fotos)

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uem mora na Vila Brás, ou em qualquer outro bairro, tem anseios, espera melhorias para o seu bem-estar e o dos vizinhos. Se tivessem o poder nas mãos, mudariam realidades físicas e imateriais, mínimas que fossem. Inspirados na cantiga popular infantil Se essa rua fosse minha, os moradores da Vila, de várias faixas etárias, relatam à reportagem do Enfoque o que mudariam em seus logradouros se pudessem ter em mãos o poder. Respostas revelam sonhos de uma Brás cada vez melhor. Pedidos vão desde melhorias físicas, como pavimentação e calçamento, até desejos imateriais, como mais paz e solidariedade. Não se pode deixar de mencionar escolhas conscientes, como um local com brinquedos feitos com materiais recicláveis. A cantiga serve de inspiração para refletir sobre aquilo que se quer mudar, seja na rua, na residência e, porque não, no bairro. Mudanças simples que, com o empenho de todos, podem se tornar realidade.

“Eu mandava limpar as bocas dos bueiros, que quase sempre estão sujas, além de arrumar as calçadas que estão bem desparelhas. Eu também iria plantar mais árvores e fazer canteiros de flores. Assim minha rua já ficaria bem mais agradável.” Janete Lorscheiter, 33 anos, Rua I

“Eu iria conservar mais ela. Ela já está bonita. Mas mandaria plantar mais árvores, pois há pouca sombra, sendo que no verão fica complicado caminhar pela rua naquele calor. Também mandaria construir um posto de polícia, para nos sentirmos mais seguros.” Gastão Rodrigues da Silva, 71 anos, Avenida Leopoldo Wasum

“Eu tiraria todos os lixos da rua, porque há muita na minha rua. E ao invés de paralelepípedo, mandaria colocar asfalto. Eu também queria que tivesse um espaço seguro para as crianças brincarem e os pais ficarem tranquilos.” Fernanda Oliveira, 18 anos, Rua das Gardênias

“Eu iria cuidar mais. Iria arrumar todos os valões que tem aqui. Eu também iria cuidar dos animais, pois gosto muito de cachorros. Também iria criar um lugar e montar brinquedos com latinhas de refrigerante.” Morgana da Rosa Oestreich, 11 anos, Rua 10

“Eu mandava asfaltar e conscientizaria as pessoas para não jogarem o lixo na rua. Também procuraria alternativas para acabar com o grande número de cachorros abandonados. Isso faria com que a rua fosse mais higiênica e ficasse mais segura, pois há cachorros que atacam as pessoas.” Sabrina Reis, 32 anos, Rua 10

“Eu promoveria a paz e lutaria por mais segurança, pois minha rua é um pouco violenta. Também gostaria que tivesse mais solidariedade e harmonia entre os vizinhos, pois nunca se sabe quando se vai precisar deles. Com certeza eu sairia mais tranquila e descansada para trabalhar.” Terezinha Nunes Antunes, 64 anos, Rua 8

Música que inspira Confira e relembre a música que serviu de inspiração para os moradores refletirem sobre o que mudariam na sua rua: “Se essa rua Se essa rua fosse minha Eu mandava Eu mandava ladrilhar Com pedrinhas Com pedrinhas de brilhante Só pra ver Só pra ver meu bem passar Nessa rua Nessa rua tem um bosque Que se chama Que se chama solidão Dentro dele Dentro dele mora um anjo Que roubou Que roubou meu coração Se eu roubei Se eu roubei teu coração Tu roubaste Tu roubaste o meu também Se eu roubei Se eu roubei teu coração Foi porque Só porque te quero bem.”

“Eu colocaria uma sinaleira no início da avenida e mais quebra-molas, porque os veículos trafegam em alta velocidade, principalmente nos finais de semana. Eu também iria arrumar a praça que tem aqui, para trazer mais segurança para as crianças.” Tais Rodrigues, 21 anos, Avenida Leopoldo Wasum


Palpite 15

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Uma palavra, um sentimento Moradores usam a criatividade para definir a Vila em apenas um termo. As respostas expressam o carinho pela comunidade Juliana Litivin (Texto) Camila Capelão (Fotos)

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omo tu definirias a Vila Brás em apenas uma palavra? Esse foi o desafio proposto pela equipe de reportagem do jornal Enfoque aos moradores da região. Alguns ficaram empolgados com a proposta. Outros, porém, demonstraram timidez. Apesar das diferentes reações, a maioria dos entrevistados entrou na brincadeira e escolheu sua própria definição. Ao longo da reportagem, respostas surpreendentes e engraçadas surgiram,. assim como relatos emocionados de pessoas que se orgulham do local onde vivem. Sem um tema específico ou qualquer delimitação, os moradores ficaram livres para soltar a imaginação e, principalmente, a criatividade. Jovens, crianças e adultos provaram que é possível demonstrar em poucas expressões seus sentimentos e sensações. A Brás revelada por eles é um local de amizade, diversão, movimento, alegria.

Segurança

Diversão

Amizade

Morgana Fortes, 23 anos

Gabriela Ortiz, 13 anos

Brenda Mitiele, 11 anos

“Hoje a Vila está mais segura. Moro aqui há 15 anos e noto a mudança. Observo nas ruas as crianças brincando sem medo da violência. Na minha época, as coisas não eram assim. Fico feliz ao ver essas transformações.”

“Me divirto muito com os meus amigos aqui. Como a Vila é pequena, fica mais fácil fazer amizades. Juntos jogamos vôlei e passeamos pela Avenida Leopoldo Wasum. É bem legal morar na Brás.”

“Gosto de ficar na calçada conversando com os meus amigos e familiares. Aqui, é fácil encontrar rodas de conversa. Na escola também tenho a oportunidade de conhecer pessoas novas. A amizade é presente entre todos aqui.”

Educação

Movimento

A Brás,

em uma

palavra, é... Orgulho

Victor Machado, 14 anos “Sinto orgulho de morar na Vila Brás, sinto orgulho das pessoas daqui. Não me mudaria da região por nada.”

Rafael Corrêa, 13 anos “Sou aluno da Escola João Goulart. Gosto muito de lá, acho o ensino muito bom. Tenho certeza que terei um futuro melhor. Quero ser advogado quando crescer.”

Família

Sara Nogueira, 10 anos

Fernanda Oliveira, 18 anos

“A Brás está sempre em movimento. Muitas pessoas circulam pelas ruas. O comércio aqui é também muito variado. Tem lojas para todos os gostos e estilos. A Vila está sempre mudando e se renovando, ela não para um segundo.”

“Toda a minha família mora aqui. A Brás é o meu lar. Vou com os meus pais nas praças e nos eventos que acontecem na comunidade. Estou sempre junto da minha família e dos meus amigos. Me sinto bem aqui. Já me mudei da Brás, mas voltei para cá rapidinho.”


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Palpite

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

As faces do sentimento Enquete revela o que faz falta aos moradores da Brás após anos residindo na Vila Lucas Steinmetz (Texto) Luísa Schenato (Texto) Guilherme Maciel (Fotos)

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omo esta é a última edição do ano do Enfoque Vila Brás, a pauta estava clara: falar sobre saudade. Para isso, o Enfoque procurou moradores antigos da Vila e lançou a pergunta: do que você tem saudade? As respostas são recortes subjetivos que mostram uma preocupação em ressaltar pontos positivos da Brás, tentando

afastar de vez a ideia de lugar violento e marginalizado. Tem até mesmo aqueles que afirmam não ter saudade de nada. Um pouco confusos, mas não poderiam ser diferentes, sentimentos são assim mesmo, feitos para se sentir de forma muito particular e não para serem explicados. Defini-los nunca é uma tarefa fácil. Ainda mais quando se trata desses que são difíceis até de entender. E saudade, com certeza é assim. Para começar, a palavra já é complica-

da. Ela só existe na língua portuguesa e serve para descrever uma mistura de perda, distância e amor. Significa muito mais que sentir falta. É isso, somado à mágoa que se sente pela ausência ou desaparecimento de pessoas, animais, lugares, situações, hábitos. Não é à toa que foi considerada por pesquisadores a sétima palavra de mais difícil tradução. No fundo, estamos sempre sentindo saudades. Seja da amizade que acabou, da mãe que faleceu, de um filho que mora longe, dos brinquedos da infância ou de

nós mesmos, do que éramos. É como se essa palavra já nascesse com a gente. Às vezes parece até que sentimos saudade daquilo que nem vivemos. Saudade dói mesmo, mas há quem diga que é uma dor gostosa de sentir, que pode até nos motivar a continuar, a buscar o melhor. Quem sabe, não é essa a lição mais valiosa deixada pelos moradores da Brás? Pessoas que, mesmo em meio às dificuldades, demonstram sempre lutar por uma vida mais digna. E você, do que tem saudade?

Tenho saudade de... Jesus de Oliveira Cavalheiro 74 anos Mora na vila há 18 anos

Líria da Silva Pens 70 anos Mora na vila há 22 anos

“Por enquanto, não tenho nada de saudade, tudo está bem. Estou bem de saúde, tenho bastante amigos. Antigamente eu não tinha nada, hoje eu tenho bastante. Duas casas, dois terrenos, carro, tudo aqui na Brás. Melhorou muita coisa. Melhorou a rua, a cidade aumentou bastante, melhorou tudo. Eu morava em Palmeira das Missões, até tenho saudade de lá. Mas o lugar era ruim para conseguir serviço.”

“Na verdade, eu não gostava de nada antigamente aqui na vila, era um terror. Hoje está melhor. Eu não gostava da bandidagem que tinha. Eu vi esfaquearem um cara de noite dentro da olaria. Foi um terror para mim. Nós queríamos vender tudo e ir embora, mas não tinha para quem vender. Hoje é muito mais seguro.”

Lauro Osvaldo Vieira 56 anos Mora na vila há 25 anos

Senilda da Silva Ferreira 73 anos Mora na vila há 28 anos

“Não tenho saudade, para mim aqui está tudo bom. Terminou a poeira, ficou bom. Depois que asfaltaram, melhorou bastante. Agora nós temos um monte de mercados por aí, o colégio é perto, tem ônibus toda hora. Está tudo melhor.”

“Eu tenho saudade de voltar para a colônia, porque eu me criei na colônia. No interior era melhor. Aqui na Vila, acho que tudo melhorou: a rua, a iluminação.”

Trinidade Martins 60 anos Mora na vila há 24 anos

Eroni Ferreira da Silveira 62 anos Mora na vila há 20 anos

“Tenho saudade de voltar embora para minha terra, voltar para Chapecó, em Santa Catarina. Tenho saudade também de fazer um curso, de trabalhar, porque eu já sou aposentada. Eu não gosto de ficar parada. Eu trabalho hoje com a Pastoral da Criança. Melhorou muita coisa aqui na Vila, a única coisa que a gente ainda reclama é da falta de creche e do atendimento do postinho.”

“Eu tenho saudade de onde eu morava, que era um bairro em Novo Hamburgo. Tenho saudade das coisas que tinha lá, um lugar mais calmo. Aqui é meio violento, tem que ter cuidado, né? Tenho saudade de um lugar mais calmo. Desde que vim morar aqui, a segurança melhorou um pouco. Mas ainda tem que melhorar mais.”


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Tributo 17

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Vem gente de todo lugar De todas as querências para se aquerenciar Seja para morar com a mãe Ou residência fixar

LUCAS REIS (Texto) NATÁLIA MUSSI (Texto) Caroline Santos (Foto) Fernanda Schmidt (Foto)

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religiões, raças, crenças, talentos, resolvemos construir um texto contando com a colaboração de moradores da Brás. Questionamos quais as coisas boas e ruins existentes na Vila e por que é bom morar naquele lugar. São opiniões de pessoas que têm a Brás como seu lar, doce lar, e que esperam melhorias para o lugar que escolheram para construir a sua vida. Abaixo a lista dos nossos colaboradores que, assim como todos os que habitam a Vila Brás, são figuras essenciais para o seu desenvolvimento. CAROLINE SANTOS

ara seus moradores, e também para quem trabalha na Brás, a vila tem seu significado e importância. As amizades presentes em cada residência e comércio e as brincadeiras de crianças em cada esquina transmitem a ideia de um lugar onde é difícil encontrar quem não goste de viver. Apesar dos problemas, comuns nas grandes cidades, quem lá mora não pensa em deixar seu canto. A falta de postos de saúde e policiamento efetivo não tira o sorriso do rosto dos trabalhadores e moradores, que afirmam: as amizades que ali conquistaram não trocam por nada no mundo. Faltam locais de lazer, mas sobram afeto e companheirismo. Cada esquina da Brás respira vida nova. As crianças são incontáveis e se acumulam em brincadeiras pelas calçadas da principal avenida da Vila e não pensam duas vezes antes de dizer que ali são felizes. Os adultos reclamam da única praça, um dos poucos locais de lazer do bairro, mas as crianças adoram. Escorregar, correr e brincar. Quem reclamaria de uma infância onde se tem tão pouco e ao mesmo tempo se tem de tudo o que se precisa para ser feliz? Com aproximadamente 15 mil habitantes, é possível afirmar que a Vila Brás é uma pequena cidade dentro de uma cidade grande, onde tudo se encontra: Comércio, lojas que vendem os mais variados produtos, supermercado, padaria. Não precisa andar muito pela Avenida Leopoldo Wasun para conseguir o que se deseja. Apesar dos preços mais altos, não precisar fazer uma viagem a estabelecimentos de bairros vizinhos é algo que tem o seu valor. Costureiras, mecânicos, bares, lancherias, restaurantes e churrascarias. Igrejas de diferentes religiões que só a fé pode mensurar, no percorrer de aproximadamente 15 quadras. Tudo e toda gente que se possa imaginar, encontra-se na Brás. Quem poderia prever que aquele capoeirão, no meio do mato, onde as primeiras casinhas simples foram surgindo em meio

à poeira e ao suor de quem não tinha para onde ir, deu início à grande comunidade que está em contínua evolução. Cada conquista, cada terreno legalizado, cada tijolo colocado, torna-se uma vitória em conjunto de uma gente orgulhosa de onde vive. Cada criança que nasce, cada novo morador traz para a vila um ar de renovação e de esperança para pessoas que não têm tudo na vida, mas o que tem, fazem questão de dividir, principalmente, a felicidade. A fim de unir as diferentes opiniões dessa Vila que concentra tantas idades,

Aqui, de tudo tem, Cabeleireira, Barbeiro, Bar Supermercado, Padaria, Armazém Brechó, Ferragem, Lar

FERNANDA SCHMIDT

A vila como ela é

A partir de declarações dos moradores, o Enfoque construiu um poema sobre a Brás

Um lugar que nada tinha Agora, longe não precisa ir Para o ônibus pegar A criança estudar O arroz e feijão comprar

A criançada das ruas toma

conta

Anda de skate, pula corda, vive a infância

Brinca, corre se diverte

Dá até vontade de

voltar a ser criança Tem gente que é boa, Gente que é ruim Porém, as amizades verdadeiras Na Brás, não tem fim A saúde precária

A falta de segurança persiste Vagas na creche não têm

Mas o sorriso e a luta De uma gente que não desiste

Do sorriso e da labuta Que vitória sempre traz Para quem vive um dia de cada vez

E não deixam passar A felicidade da Vila Brás

Nossos

colaboradores :

Kézia dos Anjos, 19 anos Márcia Schutze, 34 anos Betina Pons, 32 anos Jackson Rezende, 18 anos Maria Francisca (Xica), 44 anos Danielle de Oliveira, 7 anos Sara de Oliveira, 10 anos Brena de Oliveira, 11 anos A alegria das crianças que vivem na Brás é notável


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Cidadania

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Abençoe a Brás, vereador

Há 20 anos à frente de projetos sociais, o pastor Perci conquistou 980 votos somente no colégio eleitoral da vila Marcus Von Groll (Texto e foto)

P

or duas vezes, deu na trave, mas em 2012 o pastor da Igreja Ministério da Glória de Deus, Perci Pereira, 50 anos, conseguiu marcar um golaço com a ajuda da comunidade da Brás ao ser eleito vereador de São Leopoldo. Pastor Perci, como é conhecido, mora na vila há 30 anos, e desde lá desenvolve diversos trabalhos sociais com o intuito de ajudar os mais carentes da comunidade. “Quando vim para cá, residiam apenas 54 famílias, e desde os meus 17 anos, venho ajudando as pessoas tanto com o trabalho espiritual quanto com o social.” Dentre os diversos projetos sociais que realizou, o mais conhecido deles foi o Sopão da Vila Brás. “Na época, muitas famílias viviam à beira da miséria e eu queria ajudar de alguma forma a amenizar isso na comunidade. Como a única forma era com recursos próprios, a ideia de fazer um sopão foi a que encontramos para realizar

isso”, conta Perci. O Sopão era servido de segunda a sexta-feira, todas as noites, e assim foi por 12 anos. Maria Pereira, esposa de Perci, conta com entusiasmo o tra-

balho que seu marido realizou. “Ele sempre trabalhou com o intuito de ajudar o povo desde o começo. Hoje pessoas que estão casadas e que na época eram crianças, contam a história do

sopão, no qual se alimentavam”. Trabalhar com a política não era a sua ambição, mas, ao longo dos anos, Perci percebeu que ali poderia ser uma boa alternativa de conseguir recursos para aju-

Agora vereador, pastor Perci pretende buscar parcerias para construir um ginásio de esportes

dar a comunidade mais carente. “Nunca me imaginei sendo um político, mas por conhecer muita gente e ver diversas necessidades aqui no bairro, como a falta de água, luz e calçamento, percebi na política a saída para poder ajudar o povo”. Foi então que, no ano de 2000, lançou-se candidato. “A primeira vez concorri, consegui 1.186 votos, e entrei como suplente. De 2002 a 2004 assumi como vereador titular. Na segunda vez, em 2008, não consegui a eleição e agora, em 2012, fiz 1.901 votos, sendo 980 deles aqui na Vila.” Em 1º de janeiro de 2013, quando assumir a Câmara Municipal de São Leopoldo como vereador, o principal objetivo de Perci é investir na área do esporte e cursos profissionalizantes. “Aqui na Vila Brás eu quero buscar parcerias para poder construir um ginásio de esportes profissionalizante, ou seja, as crianças vão poder praticar uma modalidade esportiva num turno e no outro fazer um curso profissionalizante, tudo de forma gratuita”, conclui o futuro vereador.

Informática é realidade na escola Isabel Bonorino (Texto) LISIANE MACHADO (Foto) Meio da semana, hora de recreio, mas o dia era de torneio de futebol para a maioria das turmas da Escola Municipal João Goulart, e somente os alunos menores estavam por lá. No laboratório de informática, alguns alunos foram convidados para um bate-papo sobre como a utilização dos computadores ajuda na educação. Tímidas, cinco crianças começaram a usar os joguinhos educativos, antes de começar a entrevista. Uma das responsáveis pelo Espaço Virtual Ambiente Multimídia da Escola (Evam), Ísis Cardoso Farias, 32 anos, conta que o local disponibiliza 25 computadores, que são utilizados diariamente pelos cerca de 1.450 estudantes. Conforme a professora, o espaço funciona há cerca de dois anos, e as aulas estão previstas no currículo de todas as turmas, desde as iniciais até as noturnas da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Porém, a internet ainda não é uma realidade na vida desses estudantes. “Todo ano, prometem que a internet vai chegar até a escola”, afirma Ísis. Segundo a educadora, a João Goulart

é uma das poucas escolas do município que não tem internet devido a problemas com o sinal que, segundo informam, é fraco. Para a educadora, o uso da internet auxiliaria os estudantes a pesquisar para os trabalhos escolares, já que muitos só têm acesso a eles na escola. Amanda Mello, Rian Frutuoso e Ana Cristina Pereira, todos com nove anos, alunos da 3ª série, concordam com a professora. Eles contam que já acessaram a internet na casa de parentes, e que isso facilitaria na hora de fazer os trabalhos. Mesmo quem tem acesso à internet em casa, como Amanda, acaba utilizando muito pouco. “Só quando o irmão mais velho deixa”, conta a menina. Já Ana, acredita que a internet seria útil para as pesquisas, mas também para que pudessem utilizar “os joguinhos da internet”. No Evam, é possível utilizar os jogos educativos e editores de texto. Perguntados se sabiam utilizar essas ferramentas, os três foram desafiados a mostrar o que já tinham aprendido. Amanda e Rian entrevistaram um ao outro, mas para isso usaram o computador para escrever as perguntas que fariam. Já Ana, que demonstrou ser mais desinibida, coube a tarefa de fazer um pedido a quem pudesse resolver o pro-

blema do laboratório. Ana escreveu um recado ao prefeito de São Leopoldo pedindo internet na escola, mas aproveitou a oportunidade e lembrou de pedir cortinas para as salas de aula. Não satisfeita, a menina ajudou na entrevista que os colegas faziam.

Rian (centro) e Amanda (direita) mostram conhecimentos em informática. Ana (esquerda), além de internet, quer cortinas na escola


Espiritualidade 19

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Fé na vila

Diferentes religiões promovem o diálogo

Estefânia Camargo (Texto) Daniel Grudzinski (Fotos)

I

grejas evangélicas, pentecostais, católicas, adventistas, assembleias e ministérios fazem parte de um emaranhado de fé e devoção para todos os moradores da Brás. As inúmeras igrejas funcionam em diversos horários com uma variedade de temáticas trabalhadas nos cultos. Temas como família, dinheiro, inveja, amor e ódio são alguns dos assuntos debatidos nas igrejas evangélicas, que também trazem como meta mostrar a cultura da religião desde a infância, com escolas bíblicas para crianças de todas as idades. A Igreja Adventista do Sétimo Dia está presente há 15 anos na Brás, com três cultos semanais e cerca de 30 frequentadores em cada um dos cultos. O coordenador da congregação, Gilberto Souza, conta que o objetivo da igreja é “pregar a Bíblia, levando a palavra de Deus a todos.” O casal Simão e Giovana Moraes conta que suas histórias se cruzaram em um

Maria é fundadora da Cristo Operário

culto de sua igreja – a Assembleia de Deus – há 23 anos e que, agora, casados, há 11 anos não perdem um dia de culto. Do fruto desse amor, nasceram Gezer e Eliezer, que sempre acompanham os pais em sua devoção e fé. Para os católicos, a Vila Brás possui quatro igrejas, sendo que uma delas foi a primeira igreja construída na vila segundo Maria, a Cristo Operário, que já existe há 30 anos na comunidade. Com missas todos os sábados, recebe cerca de 50 devotos toda semana. Em suma, as diversas religiões que se enraizaram na vila contam com cerca de 15 igrejas para atender a todos os que nelas creem e têm fé. Homenagem Os fiéis da igreja Assembleia de Deus, Simão e Giovana fazem uma homenagem ao seu filho Gezer que completa oito anos. Desejam a ele toda a felicidade e que Deus abençoe, ilumine e proteja seus caminhos e seu coração.

Simão, Giovana e os filhos são da Assembleia

Erono dos Anjos, um homem do bem Lucas Barros (Texto) Mariana da Rosa (Foto) Fé. “Para seguir Jesus, é preciso pagar um preço alto. Quem larga a cruz, no sentido bíblico, não tem promessa boa. Garantir a salvação, só perseverando no caminho de Deus. Hoje temos duas opções: céu e inferno”, prega Erono F. dos Anjos, 67 anos. Aposentado, ele mora com a esposa Romilda, na Rua dos Girassóis, antiga Rua M. “Participo da Igreja faz 22 anos. Comecei como membro, depois porteiro e auxiliar. Por último, diácono e hoje sou, por uma graça de Deus, presbítero”, comemora.

Para Erono, participar das atividades sociais é uma alegria. “Se alguém precisar de mim, é só chamar. Como presbítero, posso ungir os fiéis. Além disso, faço também um trabalho social com alimentos”. Uma vez por mês a Igreja Assembleia de Deus realiza a Santa Ceia, e os fiéis levam doações de alimentos não perecíveis que são destinados para as famílias mais necessitadas da Vila Brás. Durante o ano, são realizadas 12 Santas Ceias, sempre na segunda terça-feira de cada mês. Erono e Romilda são naturais de Sobradinho. Eram católicos e antes de serem acolhidos na igreja da qual participam hoje, frequenta-

ram também a igreja luterana, mas, para eles, o que importa são aqueles que estão caminhando junto. “Não gosto de forçar ninguém a acreditar no que eu acredito. Procuro ser ético em todos os meus atos. Minha grande esperança é que temos outra vida, a eternidade. Um lugar que vamos depois de morrer e lá ficamos para sempre. Claro que, antes, é preciso viver segundo as escrituras, cumprindo os mandamentos, sem dar mau testemunho da verdade de Jesus”. Demonstrando ter muita fé, Erono garante que todos que já foram e que perseveraram no caminho da salvação, lhe esperam em local de descanso eterno.

Fé e ética balizam a postura de Erono quando o assunto é religião


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Eleição

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Ser mesário é ser cidadão Apesar da pouca visibilidade, eles possuem importante papel em dia de eleição e realizam um belo trabalho André Rafael Herzer (Texto) Vitor Pereira (Fotos)

M

uitas vezes eles passam em branco nas eleições. Eleitores não sabem seus nomes, e também não se interessam por eles. Não falo de candidatos com propostas absurdas, mas sim dos mesários. O que se esquece é de que, sem o importante trabalho deles, não haveria votação. Alguns ignoram a função do mesário nas eleições, é o caso do jovem Jackson Roberto Rezende Furtado, 18 anos. Ele destaca que, apesar de não ter feito

o título de eleitor, é importante votar. “Ter um senso para ver quem se vai botar no governo é fundamental”, analisa. Quem concorda com ele é a jovem Luana Martins, 20 anos. Ela acredita que conhecer bem o candidato no qual se vai votar e cobrar dele por resultados é decisivo e faz o voto ter valor. Assim como Jackson, que já ouviu falar de mesários, mas não sabe o que eles fazem, Luana tem uma vaga ideia da função deles. “Acho que eles controlam quem entra e sai para votar”, especula. Quem também não conhece direito o trabalho do mesário,

mas sabe da importância do voto é Rodrigo dos Santos Penteado, 19 anos. Ele é morador da Brás, mas vota em Porto Alegre. “Para ter uma cidade melhor, é preciso votar”, avalia. O jovem planejava não fazer corpo mole e ir até a capital para votar pela primeira vez. Sônia Frare, 33 anos, nunca foi mesária. Ela acredita que a principal função dele é identificar e auxiliar as pessoas na hora do voto. Se fosse convocada para ser mesária, Sônia iria sem problemas desenvolver seu papel de cidadã, assim como faz seu irmão. O irmão de Sônia, Paulo Roberto Frare, 29 anos, participou

de uma eleição como mesário pela quarta vez. “Este ano fui o presidente da seção”, destaca. Ele conta que foi mesário pela primeira vez por convocação da Justiça Eleitoral. Após isso, ele mesmo se voluntariou para desenvolver a função nas eleições seguintes. “É um trabalho interessante, gosto de realiza-lo”, afirma. Durante os anos em que atuou como mesário, Paulo Roberto não teve nenhum problema grave em sua seção. “O máximo que aconteceu foi uma urna que não estava funcionando, mas o problema foi resolvido prontamente”, lembra. Quem também trabalhou anos em

eleições e não teve nenhum problema durante o dia de votação foi Juarez Figueiredo, 48 anos. Convocado para ser mesário três vezes, Juarez, afirma ter gostado da experiência. “No começo não achei legal, mas passar um dia com pessoas desconhecidas te traz experiências diferentes. É algo que te satisfaz”, resume. Porém, depois de atuar como mesário por três vezes, ele decidiu que não queria mais trabalhar no dia da eleição. Juarez lembra que teve que ir pessoalmente à Justiça Eleitoral e escrever uma carta ao juiz pedindo para não ser mais convocado.

Saiba mais É o mesário quem representa o povo nas eleições, ele é o cidadão participando da construção da democracia. Os mesários são divididos em: Presidente: é a maior autoridade da seção. Ele deve manter a ordem no recinto, dispondo da força pública necessária. São suas funções: iniciar e encerrar a votação, digitar o número do título do eleitor no microterminal, habilitando-o a votar. Resolver as dificuldades e esclarecer as dúvidas que ocorrerem.

Rodrigo mora na Vila Brás, mas vota em Porto Alegre, e reconhce a importância de seu voto

Mesário: substitui o presidente na sua ausência. Também é sua função localizar o nome do eleitor no caderno de votação e colher sua assinatura, ditar o número do título de eleitor ao presidente da seção, entregar o comprovante de votação e devolver o documento ao eleitor e auxiliar no processamento das justificativas eleitorais. Secretário: sua principal função é preencher a ata da mesa receptora de votos, relacionando, no campo “Anotações”, as ocorrências registradas no dia. Ele também orienta os eleitores na fila e verifica se pertencem mesmo àquela seção, controla a entrada e a movimentação das pessoas na seção e verifica se o eleitor, ao sair, recebeu o título ou documento de identificação e o comprovante de votação. Quem trabalha como mesário no dia das eleições também recebe uma série de benefícios, tais como: dispensa do serviço pelo dobro dos dias prestados à Justiça Eleitoral, auxílio-alimentação para o dia da eleição, vantagem em desempate em concurso público, se houver previsão em edital.

Essa será a quarta vez que Paulo Roberto será mesário, a primeira como presidente da seção


Cotidiano 21

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

( Crônica )

A solitária bibiana kranz (Texto) RODRIGO BLUM (Ilustração) Entre idas e vindas pelas ruas empoeiradas da vila Brás, passei em frente a uma casa, e tive a atenção capturada por alguns instantes. Foi tempo o suficiente para notar um a menina sentada na frente da porta de sua casa, cutucando a terra com um pedacinho de pau – sozinha. Pensei cá com meus botões se ela realmente é sozinha, ou apenas solitária. E não é tudo a mesma coisa? Não! O que a maioria das pessoas não sabe é que as duas palavras tem significados diferentes. Solitude é isolamento, sem angústia, ou sofrimento. É exclusão voluntária. Pode-se estar sem ninguém a sua volta, mas sentir-se bem consigo mesmo. O solitário é aquele que não depende de outros para encontrar-se feliz, pleno, em paz. Ele cria seu próprio mundo de reflexões, sonhos, aventuras. Já no caso da solidão, existe apenas um vazio. Pode-se estar rodeado de milhões de pessoas, e não se encaixar. Pode sentir a falta da companhia de alguém especifico, ou simplesmente não se identificar com ninguém. A solidão pode acarretar outros sentimentos negativos como a depressão. A solidão tem um efeito borboleta. Quando ela bate, desencadeia milhões de sensações ruins que podem perdurar a vida toda. O ser humano, durante milhares de anos, fugiu da solidão, buscando sempre um parceiro, capaz de corresponder sentimentos, tais como o amor. Eu sinceramente espero que essa doce garotinha, sentada em frente a porta de sua casa, seja uma solitária, trancada pelo lado de dentro em um mundo cheio de fadas, leões falantes, chapeleiros malucos e Pégasos. E se um dia ela decidir abrir mão desse cantinho, que ela encontre seu príncipe encantado de verdade. Que eles se casem, e tenham uma linda filha capaz de herdar o dom de sua mãe de ser solitária, mas jamais sozinha.

Há quatro anos na profissão, Luis Schneider vem testemunhando uma série de histórias peculiares

Segredos de um chaveiro Dieverson Colombo (Texto) Letícia Fagundes (Texto) Paula Silveira (Texto) Jorge Leite (Fotos)

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aminhando pela Brás, é possível observar diferentes tipos de placas e cavaletes em frente a bares, salões de beleza, minimercados. Em uma esquina qualquer, encontra-se escrito, em um cavalete pintado de amarelo, que parece ainda mais vivo sob a luz do sol, o seguinte: “Cópias de chaves em geral”. Logo abaixo, o número 15 e uma flecha, em vermelho, indicando a localização da residência onde funciona o serviço. No endereço está um senhor de olhar vivo e muito receptivo. Luis Schneider é chaveiro há quatros anos e faz desta atividade sua segunda profissão, já que é agente de saúde há 14. Em 2008, Luis sofreu um infarto. No tempo em que ficou sem trabalhar, começou a exercer o ofício. “Aprendi a trabalhar com

chaves sozinho. Tenho todo o maquinário em casa”, diz. Ao longo da conversa, histórias que hoje são divertidas, mas que na ocasião lhe pareceram até estranhas, surgem naturalmente. Sempre simpático, Schneider conta que um dia uma mulher ligou para ele dizendo que estava trancada dentro de casa. Ela acionou seu serviço, mas ressaltou que não tinha dinheiro para pagar. Com receio de que fosse uma armadilha, ele a deixou trancada e não foi socorrê-la. Outro caso um tanto engraçado foi de um rapaz que chegou em sua casa apenas com o desenho de uma chave e insistiu pela cópia. Schneider disse que não era possível fazer sem a original e o questionou para saber o que aquela chave abria. O homem respondeu que era de um cadeado, mas que não seria possível trazê-lo, pois o cadeado estava na praia. No fim, o homem teve que se contentar e sair sem sua cópia.

Além de chaveiro, Schneider também é agente de saúde


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Cotidiano

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

Sábado é dia de quê? Moradores da Brás contam como aproveitam o dia Fabiana Eleonora (Texto) Sabrina Strack (Fotos)

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Em frente à casa, Elias saboreia um chimarrão com a filha e o neto

Passeando ao sol, Terezinha aprecia ouvir música e ver as pessoas de uma palavra... e está tudo aqui”. No trailer de lanches, Elaine Mench da Silva responde alegre: “Para mim é o dia mais turbulento, mas é bom. É o dia em que eu pago as contas”. O negócio é próprio, e ela gosta do movimento. “Sábado eu trabalho o dia inteiro: de manhã abro a lancheria, à tarde vou fazer algum serviço em casa, olho os fi-

O que eu quero ler Jonas Pilz (Texto) Jardel Nozari (Foto) O Enfoque Vila Brás apurou o que os leitores querem ler nas próximas edições do jornal. Das oito pessoas entrevistadas, seis afirmaram que gostam de estar informados sobre o comércio local. “Eu gosto das notícias sobre as lojas aqui da Vila, porque a gente precisa ver o que está acontecendo”, afirma Andressa Fagundes, 18 anos. Também relacionadas ao comércio, as promoções apareceram em segundo lugar. “É bom para saber se tem alguma coisa boa para comprar”, relata Marlene Rocha, 54 anos.

As reportagens sobre os moradores e as denúncias dos problemas da Vila também foram lembradas. ”O melhor é ler sobre o que está errado aqui e as histórias dos nossos vizinhos”, conta Carla da Rosa, 30 anos. “Às vezes a gente até vê umas mentiras que eles falam”, diverte-se. Os leitores também deram algumas dicas e sugestões. “Gostaria que tivesse uma página policial”, pede Raul Danilo Berlitz, 44 anos. “Muita gente ntrabalha fora. Assim, não fica sabendo o que está acontecendo”. Para Carlos Rocha, 54 anos, todas as notícias são interessantes. “Tudo que é de dentro da Brás interessa para mim”.

lhos. No Xis, vou até a madrugada”. Adilson dos Santos Silva, esposo de Elaine, afirma: “O sábado é um dos dias que eu mais gosto. O outro é segunda, quando posso ficar com a família, em casa”. Adilson é operador de empilhadeira, e à noite ajuda a atender no trailer. “Ah, sábado é o dia em que jogo futebol com o meu time, o Brazão.

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“O que eu mais gosto de ler são as reportagens que falam dos moradores. A gente fica sabendo as histórias dos nossos vizinhos.” Inês dos Santos, 34 anos “Gosto de ler sobre tudo, porque é notícia do lugar em que a gente mora, sobre a nossa Vila.” Taciana Silveira, 20 anos “Para mim o melhor é ler sobre os nossos conhecidos, nossos vizinhos. Às vezes a gente lê umas mentiras que eles falam. É muito engraçado.” Carla da Rosa, 30 anos

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ia de descansar, de conviver com a família, de dedicar-se aos afazeres domésticos. Para alguns, o sábado é dia mesmo de trabalhar. Seja para o que for, todas as pessoas dedicam o seu dia de sábado a algo importante. E esse dia tem o seu valor. Sentado sob uma árvore, cadeira na calçada, Elias dos Santos sorri satisfeito. Uma lata de graxa, pano e dois pares de tênis no chão, em meio à filha e o neto, e ele não quer mais nada. “Bah, Deus o livre, o sábado para mim é tudo!” Elias não abre mão do seu dia preferido na semana. “Aparecem os bicos. Queriam uma pintura para o próximo sábado agora. Eu disse que na sexta, feriado, eu faço. Mas no sábado não.” De segunda a sexta ele trabalha em uma empresa, em Porto Alegre. “O sábado é de estar com a família, lavar o carro, descansar, e domingo não é a mesma coisa, a gente sabe que o dia seguinte já é segunda-feira”, dá risada. “Sábado é o dia em que eu entro em contato com o Espírito Santo”. Anderson Silveira Santos conta que, aos sábados, acorda às oito horas, toma café e inicia a leitura da Bíblia. “Há um ano e meio sigo Jesus e estou fora das drogas”, ele lembra, sentado em frente à casa em que mora com os pais e três irmãos. “Toda a leitura que fazemos nos abre a mente. A Bíblia, então! Às vezes a gente está precisando

Trabalho a semana inteira pensando no sábado”, completa. Tranquilo, em frente a casa, Edir Grasel conta: “Sábado gosto mais é de ficar curtindo o meu filho”. Edir é fundidor, e trabalha fora durante a semana. “Fico com ele, saio com ele, cuido de casa”, conclui. Para Fátima Belo, é o dia de limpar a casa. “Cuido do bebê, faço uma comida diferente: uma maionese, um bife com queijo no forno, que a minha filha gosta.” Durante a semana, Fátima trabalha em Novo Hamburgo. Há 20 anos é merendeira em uma escola. “No sábado, a gente pode reunir todo o mundo. A vida é feita de momentos”, sorri. Com a mão na massa, ou melhor, no pano e na água, Emílio Lima declara: “Gosto bastante, primeiro porque é sábado! E depois, é final de semana, tem as coisas para fazer em casa, cortar a grama, lavar o carro.” Emílio e a esposa fazem evangelização na escolinha bíblica, ao lado de casa. Nas tardes de sábado, eles assumem um grupo de crianças de três até 12 anos. Nicole Schutz Rodrigues, sete anos, nem pensa duas vezes: “Sábado é legal! Eu pulo corda com meu irmão e meus amigos. De tarde, tiro um cochilo.” Como a mãe está em casa nesse dia, Nicole lhe dá uma mão com a louça e ajuda a arrumar a casa. “Estou aprendendo a ler e a escrever!” se empolga. De sombrinha aberta para aliviar o calor intenso do sol de quase meio-dia, caminha Terezinha Fernandes de Matos, de 68 anos. “Dá bem para se entreter”, ri. “Vê agora, tem mais gente, tem música! É bom para passear.” E ela pode estar o dia com seus filhos, já que alguns não trabalham aos sábados.

“Tem que mostrar o desenvolvimento da Vila e as muitas coisas que é preciso arrumar.” Neri Souza de Oliveira, 35 anos

(Crônica )

A cobra Marcus Von Groll (Texto) RODRIGO BLUM (Ilustração) Certo dia fiquei sabendo que na Vila Brás alguns moradores dizem que existe uma cobra na beira do rio, e que ela come gente. Dizem ainda que muitos dos que sumiram por lá foi porque a cobra comeu. Pelas ruas, quando perguntamos aos moradores, poucos sabem dessa história. Uns até dizem que ouviram falar, mas encontrar um que tenha visto a tal de cobra, nada. Pelo menos eu não encontrei. Tanto é que estive por duas vezes na Vila procurando por ela. Fui até a beira do rio, entrei mato a dentro, mas nada, nada mesmo. Uns dizem que é uma jiboia, outros falam que é uma sucuri imensa. Sei não. Na beira do rio, encontrei uns caçadores de preá com seus cachorros alucinados atrás dos bichinhos no meio do banhado. Perguntei a um deles sobre a tal de cobra, e nada. Isso que os “caras” estão todos os finais de semana caçando por lá. Passando por cima da “pontezinha” do Arroio Gauchinho, um morador com sua bicicleta. De longe perguntei sobre a cobra, e ele disse que nunca viu, mas que já ouviu falar. Um pouco mais adiante, numa casa da Rua 26, a moradora diz que ali naquela rua mora um senhor que vive acampando na beira do rio, cujo nome não se lembra, mas que já viu a tal de cobra, assim como a filha. Se for verdade ou não a existência desse animal, só sei que eu perdi uns bons três quilos e adquiri algumas câimbras caminhando quilômetros em busca de... Uma tal de cobra da Vila Brás.


Glamour 23

Enfoque - Vila Brás, São Leopoldo - Novembro de 2012

A bela da Brás Victória Schütze tem hoje um grande sonho: cursar Medicina Rafael Kehl (Texto) Gilvana Dias (Foto)

Q

uero deixar bem claro que a matéria a seguir foi realizada por livre e espontânea pressão do repórter, nas palavras essas da própria entrevistada. Encontrei Victória Schütze, 17 anos, atrás do balcão, ajudando a tia na floricultura. Quando a abordei, a menina, tímida, não quis tocar no assunto, nem mesmo quando sua tia a incentivou a falar. Depois de insistir, sem sucesso, virei as costas e fui embora. Porém, achei interessante saber o motivo pelo qual aquela menina, tão bela, foi tão firme ao afirmar que não queria tocar no assunto. Por isso, voltei a floricultura. De tanto persuadir, consegui aos poucos arrancar algumas palavras. Incentivada, e mais, inscrita por uma amiga e pelo pai, Victoria participou de alguns concursos e seleções para modelos, mesmo que, digamos, a contragosto. “Eu torcia pelas outras. Meu pai acha que só porque sou magra e alta, posso ser modelo”, afirma Victoria. O pai, Claudimir

Schutze, presidente da Associação dos Moradores da Vila Brás, diz que sempre foi um sonho ver sua filha como modelo. “Todos que têm um filho, sonham que ele se torne jogador de futebol. Como eu tive uma menina, meu sonho era que ela se tornasse modelo”. A seletiva para o concurso Garotão Verão foi um dos testes. No concurso seguinte, proporcionado pela agência de modelos Dilson Stein, a menina ultrapassou uma das seletivas e foi convidada a participar de uma convenção em Gramado - Dilson Stein é parceiro das melhores agências de modelos do Brasil e do exterior. Entretanto o alto custo, algo em torno de R$ 2.000, com books, viagens e a própria participação na convenção, fez Victória pedir ao pai que desistissem desse sonho. Para o pai, o problema não era apenas financeiro. “Infelizmente os bastidores da moda são muitos perigosos. Eu não iria deixar minha filha ir a São Paulo com apenas 16 anos. Na época demos a maior assistência possível para ela seguir o sonho. Hoje ela entende”, afirma. Ao me distanciar do assunto

relacionado a fotos e desfiles, é fácil notar nos olhos e no sorriso de Victória um brilho diferente. Ao perguntar porque ela desistiu do mundo das passarelas e estúdios, a resposta foi imediata: “ Quero cursar Medicina” Tornar-se médica é realmente o maior desejo da jovem. “Desde criança, sonho com essa profissão. Tenho tias enfermeiras, mas não chegaram a influenciar na minha decisão”, afirma. A um passo de terminar o Ensino Médio, a menina já faz planos de cursar medicina na Universidade Federal do Rio Grande Do Sul. “Para a gente, que vem do interior, será um orgulho ter um filha formada em Medicina. É algo gratificante”, ressalta Claudimir. Porém, Victória não quer perder tempo e já planeja começar logo o curso técnico de enfermagem do Hospital Moinhos de Vento. “Quero trabalhar com cirurgia, pediatria ou legista”, afirma. Pelos poucos momentos que estive com essa menina, posso afirmar que ela tem um grande futuro pela frente. Basta ela escolher. O caminho das passarelas ou a mesa de cirurgia.

Viciadas em esmalte

Luciana Marques (Texto) Jéssica Sobreira (Fotos)

A maioria das mulheres gosta de pintar as suas próprias unhas

Raissa coleciona esmaltes e tem preferência por cores vibrantes

A indústria dos esmaltes tem crescido consideravelmente. Isso porque o público feminino está consumindo esse produto cada vez mais cedo, e em maior quantidade. Esmaltes em cores inusitadas, com glitter, craquelê e strass, estão dividindo espaço nas prateleiras com os tradicionais Rebú (Risqué), Renda (Risqué), Café (Colorama) e Filó (Impala). Essa nova tendência também vem sendo vivenciada pelas moradoras da Vila Brás. Uma pesquisa divulgada pelo site Moda Spot.Com (http://modaspot.abril.com.br), encomendada pela Mundial Impala e realizada com 600 entrevistados, aponta que 86% das brasileiras aplicam esmaltes nas unhas uma vez por semana e 14% chegam a fazer isso duas vezes neste mesmo período. Essa mania fez com que as empresas passassem a acompanhar as novidades surgidas no mercado e ampliassem seus lançamentos, aumentando, por consequência, a produção nas fábricas.

A menina Victoria não descarta brilhar no mundo das passarelas

O farmacêutico e proprietário da farmácia Sul Brasileira, a única da Vila Brás, Nelson Oro, relata que a procura pelos queridos vidrinhos em seu estabelecimento, é grande. “Procuro estar atento para oferecer o que os clientes pedem. Percebo que as cores mais vendidas são as de tons rosados. Mas o famoso renda continua sendo o mais solicitado”, revela. Na farmácia Sul Brasileira, os esmaltes estão custando, em média R$ 3,00. Mania Com apenas 11 anos, a estudante Raíssa Gheler denomina-se uma colecionadora de esmaltes. Ela conta que possui 30 esmaltes, todos em cores vibrantes e coloridas. “Eu pinto as minhas próprias unhas, pois é um hábito que eu tenho prazer. Não ligo muito para o que está na moda, vou no faro mesmo”, relata. Cliente assídua dos salões de beleza da Brás, a dona de casa Eleonora Machado, 29 anos, gosta de unhas bem feitas, e de preferência decoradas. “Faço minhas unhas

semanalmente. Gosto de variar as cores e modelos, mas não arrisco fazer em casa. Prefiro procurar um profissional experiente”, comenta. Quem também gosta de estar com as unhas pintadas é a dona de casa Floraci Brizola, 34 anos. Ela afirma que já chegou a trocar a cor das unhas três vezes em uma mesma semana. “Se o esmalte começa a descascar, ou tem outra cor que eu quero testar, já trato de mudar. Eu mesma faço minhas unhas, e encaro isso como uma terapia, pois sou muito vaidosa”, frisa. FAMA Lançado em 2009, o esmalte Jade, da marca Chanel, transformou o comércio da beleza e impulsionou o consumo de esmaltes em todo o mundo. Conforme o Moda Spot.Com, o esmalte, que possui um tom verde médio, virou febre entre as pessoas ligadas à moda e se transformou em um objeto de desejo das brasileiras, que até então estavam acostumadas aos tons clarinhos ou aos vermelhos clássicos.


Enfoquinho

VIla Brás - São Leopoldo/RS Novembro de 2012 enfoque

Alegria em dose dupla

Maicol e Mateus aproveitam o sol da primavera para brincar com seus amigos

Os gêmeos Maicol e Mateus, sete anos, contam piadas e histórias divertidas na Praça da Paz

MELISSA LEWIS (Texto) LUCIANA Martinez (Texto) BRUNA PIRES (Foto)

U

ma bola roda e atrás dela pequenos corpos com rostos sorridentes são observados desde longe. Simpáticos, todos eles chegam perto cada vez que uma pessoa de fora se aproxima, e é bem-vinda e recebe o convite para participar na partida. Asim, passam os fins de semana, dias em que não há aula, algums dos meninos que moram em Vila Brás. As brincaderas e a diverçao ten lugar no sitio mais bonito do bairro para a maioria dos moradores: a Praça da Paz. Os irmãos Maicol e Mateus Simas Martínez são os que mais chamam a atenção entre os ami-

gos. Além da grande semelhança fisica, por terem compartilhado o ventre da mãe por nove meses, se destacam por uma causa particular: som grandes contadores de histórias que tornamse uma diverção para outras criaças e adultos. Os meninos, de sete anos, vieram de Novo Hamburgo para a Brás faz apenas um mês e têm o privilégio de morar na frente do ponto de encontro. Depois de algumas palavras de apresentação, deixaram a bola de lado. Maicol é o primero a se animar a demoustrar sua habilidade. “Eu conheço uma piada muito boa”, diz para quebrar o gelo. “Qual é o final da picada?”, pergunta para os presentes. Ninguém sabia a resposta, e todos ficaram esperando ansiosos. “Quando o mosquito

vai embora”, prossegiu ele, e todos soltaram uma gargalhada. Entre risos e olhares cúmplices, os pequenos Martinez alternavam as histórias e os bons contos. O laço especial que os une fazia que um deles desse o pé para que o outro fizesse uma piada ainda melhor que a anterior. “Por que a galinha atravessou a rua?”, perguntou novamente para as pessoas que ouviam, que, com o correr do tempo, foram aumentando. “Porque estava com pressa”, finalizou e todos riram novamente. “Foi muito fácil, Maicol”, diz Mateus, mostrando sua simpatia e sua vontade de apresentarse também como bom piadista. “Tenho uma melhor. O que é que foi feito para andar, mas não anda?”, e o silencio invadiu

o ambiente mais uma vez. “A rua”, acrecentou o menino, e as pessoas adoraram. Oscar de Lima, de 44 anos, era um dos que estavam na praça ouvindo os meninos com atenção. Ele mora numa casa perto dali há mais de 20 anos e disse que a praça é o ponto de encontro de jovens, famílias e amigos. “É o único lugar lindo que temos aqui. Apesar de que carece de muitas coisas, porque os bancos para sentar estão quebrados e, quando chove, a água empoça, é bem iluminada e os próprios vizinhos estão plantando árvores para que as pessoas também possam vir durante o dia”, disse Lima. “Tentamos ver as coisas com a melhor cara e desfrutar do que temos. Nos domingos se enche de pes-

soas que vêm para tomar chimarrão, aproveitar o sol e praticar esportes”. Entre histórias engraçadas e piadas, meninos e adultos passam as horas e se divertem, vendo com olhos positivos o que é deles e que têm que cuidar. Faz algumas semanas que a prefeitura de São Leopoldo pintou e cortou a grama. “Conto a última”, disse Maicol antes de finalizar a sua apresentação. “Quem tem cinco dedos e não tem unhas?” E a resposta surprendeu a todos uma vez mais: “As luvas”. Curiosidade da praça: Algumas vezes os homens jogam futebol usando roupas de mulheres para passar um momento de diversão na frente de suas esposas.


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