PRATICAS EDUCATIVAS E REPRESENTAÇÕES LUSO-NIPÓNICAS: O CASO DE TANEGASHIMA NO JAPÃO

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Práticas Educativas e Representações Artístico-Culturais Luso-Nipónicas: O caso de Tanegashima no Japão

Amílcar Martins

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CONTÉM 17 PÁGINAS AMÍLCAR MARTINS, Ph.D. Ciências de Educação, Artes, Montreal Professor no Departamento de Educação e Ensino a Distância Coordenador do Mestrado em Arte e Educação Investigador no CEMRI – Centro de Estudos das Migrações e das Relações Interculturais Universidade Aberta Rua da Escola Politécnica, nº 147 1269-001 Lisboa Portugal Portal da Universidade Aberta: www.univ-ab.pt Email: amilcarmartins1@gmail.com Canal do youtube: www.youtube.com/amilcarmartins1

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ÍNDICE 1. Resumo, p. 2 2. Introdução, p. 2 3. O encontro luso-nipónico no século XVI e os primeiros textos, p. 3 3.1. Fernão Mendes Pinto e a sua “Peregrinação”, p. 4 3.2. Nampu Bunshi e a sua “Teppó Ki” (Crónica do Mosquete), p. 4 4. Uma metodologia empírica apoiada por um diário de bodo digitalizado, p. 6 4.1. 10 Fotos de Tanegashima, p. 7 4.2. 1 mini-vídeo do “Teppó Matsuri” (Youtube), p. 13 5. Conclusões, p. 14 6. Bibliografia, pp. 15–16 7. DVD, p. 17 8. Cassetes, p. 17

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Este artigo corresponde à adaptação do anteriormente publicado com a citação bibliográfica seguinte: MARTINS, Amílcar. (2007). "Práticas Educativas e Representações Artístico-Culturais Luso-Nipónicas: O Caso de Tanegashima no Japão", in Rosa Bizarro (Org.). Eu e o Outro — Estudos Multidisciplinares sobre Identidade(s), Diversidade(s) e Práticas Interculturais, pp. 128-136. Porto: Faculdade de Letras da Universidade do Porto e Areal Editores.

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Agradecemos à Fundação Calouste Gulbenkian a concessão de uma bolsa de curta duração no Japão, em Julho e Agosto de 2005. A nossa gratidão dirige-se igualmente à população de Tanegashima (a ilha da semente), aos autarcas e responsáveis dos sectores da educação e cultura de Nishinoomote e de Minamitane, e ainda à Embaixada do Japão, em Lisboa, e à Embaixada de Portugal, em Tóquio.


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1. RESUMO Este artigo centra-se no impulso para a modernidade suscitado pelo primeiro encontro e diálogo luso-nipónico realizado no século XVI em Tanegashima, Japão, e no modo como os primeiros cronistas deste acontecimento — Fernão Mendes Pinto e Nampo Bunshi —, o expressaram respectivamente nas literaturas portuguesa e japonesa do seu tempo. Evidencia-se a escolha que fizemos de uma metodologia de observação-participante, de inspiração etnográfica, durante vários anos na ilha de Tanegashima, a última delas no verão de 2005. Descrevem-se as características da auscultação e recolha de dados empíricos a partir da fotografia e do vídeo, os quais deram origem à construção de uma narrativa que tem por base um diário de bordo digitalizado. A análise e a interpretação dos dados da pesquisa permite-nos sublinhar o modo como os nipónicos da ilha de Tanegashima evocam a apropriação de traços distintivos da sua identidade, integrando nela a linhagem ritualística da sua historiografia ligada à revitalização das suas práticas educativas e representações artístico-culturais luso-nipónicas, designadamente através dos seus festivais anuais: o Teppó Matsuri, Festival da Espingarda em Nishinoomote, e o Rocket Matsuri, Festival do Foguetão em Minamitane. PALAVRAS-CHAVE CRONISTAS – CONTADORES DE HISTÓRIAS – FERNÃO MENDES PINTO – NAMPO BUNSHI – TANEGASHIMA – JAPÃO – PORTUGAL

2. INTRODUÇÃO O primeiro encontro luso-nipónico do século XVI, constitui um acontecimento marcante na história comum de Portugal e do Japão. Ele aconteceu na ilha de Tanegashima, em 1543, e é ainda hoje celebrado com élan e cumplicidade envolvente e criativa pela população japonesa local. É sobre este acontecimento do presente que revela, também, um impulso futurante e inspirador, que procuramos reflectir sobre o modo como as práticas da educação informal e o diálogo intergeracional se exprimem através de manifestações simbólicas que transbordam o espaço circunscrito à instituição escolar e que são partilhadas pela população em geral, no espaço aberto e público. Assim, esta comunicação foca-se numa pesquisa etnográfica longitudinal que desenvolvemos em Tanegashima desde o ano de 1987 até 2005 (Martins, 1987, 1988a, 1988b 1993, 1998, 2002, 2006; Martins, Folco e Carvalho, 1994; Martins e Carvalho, 1994). A ilha de Tanegashima é conhecida também por ilha da semente, o local onde a semente deitada à terra floresce e frutifica (em japonês tanega significa semente; shima significa ilha). Da leitura interpretativa que construímos, e que repousa sobre os dados empíricos recolhidos na ilha de Tanegashima, especialmente os dados recolhidos em Julho e Agosto de 2005, através da observação em instituições educativas e de múltiplas


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manifestações culturais e artísticas, da análise de documentos, de entrevistas a autoridades locais, a professores, e mesmo a crianças e a jovens, daremos conta do processo local de (re)visitação e de actualização daquelas memórias históricas que invocam e interpelam a visão de alteridade EU-OUTRO, o tema do nosso colóquio. Porém, devemos alertar o leitor para o facto da nossa opção metodológica, na circunstância da elaboração desta comunicação, procurar delimitar a recolha e a análise dos dados empíricos à fotografia e ao vídeo sonorizado, como sublinharemos mais à frente. Em primeiro lugar, começamos por procurar refrescar as nossas memórias colectivas convocando aqui as “vozes” dos primeiros textos conhecidos — em língua portuguesa e em língua japonesa — que exprimem, cada um à sua maneira, o encontro lusonipónico do século XVI. Vamos “escutar” o confronto da forma literária dos seus autores: do cronista português Fernão Mendes Pinto, num excerto da sua “Peregrinação”, e do monge budista nipónico Nampo Bunshi, num excerto da “Teppó Ki” (Crónica do Mosquete). Iremos constatar, sobretudo no texto japonês, o contexto e o ambiente descritivo das personagens que protagonizaram o diálogo inicial desse encontro. Em segundo lugar, proponho-vos um salto imagético até Tanegashima observando alguns dos locais, da cenografia e dos actores do encontro luso-nipónico, através da projecção de imagens fotográficas e de um mini-vídeo com excertos daquela fascinante paisagem sono-plástica do verão de 2005. Em terceiro lugar, discutiremos a reapropriação educativa, cultural e artística daquela herança, bem como dos vários símbolos e valores gerados pelo encontro luso-nipónico na modulação do ciclo festivo anual da ilha da semente, designadamente através dos sinais evocativos na cenografia do espaço público e no Teppó Matsuri (Festival da Espingarda), em Nishinoomote, e no Rocket Matsuri (Festival do Foguetão), em Minamitane.

3. O ENCONTRO LUSO-NIPÓNICO NO SÉCULO XVI E OS PRIMEIROS TEXTOS Após terem chegado à Índia em 1498, os portugueses chegaram posteriormente a Malaca e descobriram que se poderiam constituir como elo de ligação entre a China e o Japão. Como diz o ditado português levando a uns o que faltava a outros — o comércio significaria um dos pontos inspiradores mais importantes da expansão marítima portuguesa. É face a esse objectivo, essencialmente de carácter económico e territorial, em profunda aliança com a perspectiva de evangelização, que nasceria a cidade de Macau como ponto privilegiado das viagens então estabelecidas na rota do Japão. Rota entre a Índia, Malaca, Macau e o Japão (cf. Bethencourt e Chaudhuri, 1998). Japão que, segundo Fernão Mendes Pinto, com a sua “Peregrinação”, se chegaria através de um temporal de vento esgarrão.


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3.1. FERNÃO MENDES PINTO E A SUA “PEREGRINAÇÃO” O primeiro português que escreve sobre a nossa chegada ao Japão, mais concretamente à praia de Kadokura em Tanegashima, foi o célebre cronista Fernão Mendes Pinto que fez parte dessa viagem e que a conta no seu livro “Peregrinação” de uma forma bastante colorida: (…) E continuando nossa viagem assim destroçados como íamos, mais três dias, nos deu um temporal de vento esgarrão por cima da terra tão impetuoso que naquela mesma noite a perdemos de vista, e como então já não a podíamos tornar a tomar, nos foi forçado arribarmos em popa à ilha dos Léquios, onde este cossairo era muito conhecido, assim do rei como da outra gente da terra; e navegando nós com esta determinação por este arquipélago de ilhas adiante, como neste tempo não levávamos piloto, por nos ser morto na briga passada e os ventos nordestes nos eram ponteiros, e as águas corriam muito contra nós, bordejámos às voltas, de um rumo no outro, vinte e três dias com assaz de trabalho, no fim dos quais, prouve a Nosso Senhor, que vimos terra. E chegando-nos bem a ela, para vermos se dava de si alguma mostra de angra ou porto com bom surgidouro, lhe enxergámos da parte do sul, quase no horizonte do mar, um grande fogo, por onde imaginámos que deveria ser povoada de alguma gente, que por nosso dinheiro, nos provesse de água de que vínhamos faltos. E surgindo nós no rosto da ilha em setenta braças, nos saíram da terra duas almadias pequenas em que vinham seis homens, os quais chegando a bordo, depois de nos fazerem suas salvas e cortesias a seu modo, nos perguntaram de onde vinha o junco, a que se respondeu que da China, com mercadorias para fazer veniaga com eles se para isso nos dessem licença. Um dos seis nos respondeu que a licença, o nautoquim, senhor daquela ilha Tanixumá, a daria de boa vontade, se lhe pagássemos os direitos que se costumavam pagar em Japão, que era aquela grande terra que de fronte de nós aparecia. Com isto nos deu relação de tudo o mais que nos convinha, e nos mostrou o porto onde havíamos de surgir. Nós, com este alvoroço, levámos logo as amarras e nos fomos pelo batel pela proa meter em uma calheta que a terra fazia da banda do sul, onde estava uma grande população que se dizia Miagyma, da qual logo nos vieram a bordo muitos paraus com refresco que lhe comprámos (...) (Fernão Mendes Pinto, 1988). Bem saborosa, sem dúvida, esta forma de descrever o primeiro encontro luso-nipónico por Fernão Mendes Pinto.

3.2. NAMPO BUNSHI E A SUA “TEPPÓ KI” (CRÓNICA DO MOSQUETE) Será interessante comparar-se o texto anterior com a descrição japonesa, e constatar-se como se desenvolveu o primeiro diálogo luso-japonês conhecido que, segundo a


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lenda, teria sido mediado por um chinês que escrevia na areia da praia os símbolos da tradução. Os protagonistas desse diálogo foram o senhor da ilha, Tokitaka e um português, referido pelos japoneses da época como um dos nambans, ou os bárbaros do sul. O excerto que a seguir se indica, da autoria do japonês Nampo Bunshi, intitula-se «Teppó Ki», que significa Crónica do Mosquete. Centrado embora no objecto «mosquete», o texto confronta as diferenças filosóficas e culturais entre os dois interlocutores. Um dia Tokitaka, através da dupla tradução, disse para os dois bárbaros: — “Não posso dizer que conheça bem esse objecto, por isso gostaria de aprender mais sobre ele”. Igualmente através dos dois tradutores responderam os bárbaros: — “Se o teu Senhor deseja aprender, faremos o melhor para lhe ensinar”. Tokitaka perguntou: — “Pensam que dominarei o segredo?” — “Apenas se conseguir a mente pura e clara, bem como um dos olhos apurados”, responderam os bárbaros. “Ter o pensamento claro é o ensinamento dos antigos sábios, e para isso fui ensinado”, disse Tokitaka. “Se não se seguir o princípio de reflectir acima do céu, as acções e palavras serão contra as próprias opiniões. Para manter o pensamento correcto, aquele que o teu Senhor fala, não pode ser outro senão este princípio. Mas para ver longe e largo não é suficiente ter apenas um dos olhos apurados. Porque apuram um dos olhos?” Os bárbaros replicaram: — “É necessário ver com nitidez. Para ver com nitidez não é suficiente ver amplamente. Para ver as coisas nítidas o olhar deve ser aguçado. O olhar é aguçado apenas para ver nítido e mais longe. Por favor, tente compreender isto”. Tokitaka ficou satisfeito e disse: — “Lao-Tzé diz que observar um pouco é ver melhor, será esse o princípio de que estão a falar?” (Nampo Bunshi, 1988). A forma de olhar e de sentir o outro implica, naturalmente, um jogo de experimentação, de ensaio, de confrontação e de negociação do sentido do que se diz e do modo como se exprime. Os japoneses chamariam aos portugueses, como já referimos, os nambans (os bárbaros do sul), os tais que segundo eles,


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(...) apesar de compreenderem grosseiramente como senhor e vassalo se devem comportar um com o outro, o seu comportamento deixa muito a desejar. Assim, quando bebem, bebem muito, mas não usam chávenas. Quando comem, comem com os dedos, sem usar pauzinhos. Apenas seguem as suas emoções e desconhecem a sabedoria do comedimento (…) (Nampo Bunshi, 1988).

4. UMA METODOLOGIA EMPÍRICA APOIADA POR UM DIÁRIO DE BORDO DIGITALIZADO A observação de Lao Tzé invocada por Tokitaka no primeiro diálogo luso-nipónico, observar um pouco é ver melhor, tem pleno cabimento na captura moderna de alvos observados pelo homo digitalis3, e mediados pela tecnologia digital que permite a reprodução instantânea de imagens e de sons. A imagem fotográfica e/ou videográfica, articulada, ou não, como o som ambiente, constitui de per se um reportório evocador de traços constituintes de uma situação observada que revela(m) o(s) momento(s) aqui e agora. Este(s) momento(s) capturado(s) é/são filtrado(s) pelo nosso olhar selectivo, enquanto apreendedor do real e fotógrafo etnográfico, no caso da viagem a Tanegashima de Julho e Agosto de 2005, através de uma mini-câmara que integra a dupla função de fotografar e/ou filmar com som incorporado. A captação do acontecer digitalis, observado e ouvido, pictográfico e sonográfico, enquadrado(s) ambos na fotografia e/ou no vídeo sonorizado, permitem, imediatamente após o gesto do disparo pressionador no botão on, fazer-se a verificação e a retroacção do que se fixou no espaço rectangular da imagem — com ou sem som —, e que nos é reenviada pela própria mini-câmara. Estabelece-se, nesta experiência, um jogo de reenvios progressivos, quiçá similar a um jogo de espelhos entre o que existe no real, o que se observa selectivamente através da câmara, o que se capta e fixa no disparo on, e o que se (re)observa na imagem final — sonorizada ou não. Os momentos imediatamente seguintes, a que podemos chamar de pós-produção, corresponderão à montagem de imagens e de sons que constróem uma hipótese de uma narrativa sequencial de fragmentos do real para se mostrar a “Outro(s)”. Assim, a imagem fixada através da fotografia e do vídeo permitem, posteriormente à acção de captura, à acção de selecção e à acção de montagem, (re)ordenar e construir um discurso sequencial suportado por uma retroacção analítica e crítica sobre o(s) momento(s) imagéticos da narrativa. O processo de retroacção sobre a narrativa reenvia-nos à completude de um diário de bordo digitalizado que proporciona um retorno actualizado de vinculação ao real observado. Eis-nos, assim, perante uma narrativa de imagens de Tanegashima, todas elas do verão de 2005, que contam o pulsar de uma observação dialógica e de 3

Com o advento da cultura digital e da cultura na ponta dos dedos (...) o homo sapiens está a converter-se em homo digitalis com a introdução, na vida diária, dos computadores, da Internet, dos telemóveis, das mini-câmaras de fotografar e de filmar (cf Joviana Benedito (2003, p. 191).


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complementaridade entre o ver e o recrear, entre o objectivo e o subjectivo, entre o real e a ficção. A narrativa que a seguir se apresenta corresponde, apenas, a uma reapropriação selectiva de um excerto de 10 imagens fotográficas (de um reportório de cerca de 1 500), às quais se adiciona, a cada uma delas, uma breve legenda explicativa do seu conteúdo. A sequência da narrativa é, assim, a resultante das etapas sublinhadas no nosso percurso e posicionamento etnográfico, bem como na opção metodológica apoiada pela construção de um diário de bordo digitalizado. Complementamos ainda esta descrição com o mini-vídeo “Teppó Matsuri em Tanegashima, Japão” (1’ 29’’) que se encontra disponível no meu canal do Youtube http://br.youtube.com/watch?v=2u5McjiJIjU&feature=channel_page

4.1. 10 FOTOS

Foto 1: O Museu da Espingarda, em Nishinoomote, Tanegashima, replica, na sua forma arquitectónica, o junco que foi empurrado para esta ilha através de um temporal de vento esgarrão… O acervo do museu conta, através de um teatro mecânico interactivo com o visitante, a história luso-nipónica do século XVI.


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Foto 2: Fernão Mendes Pinto, à direita, com o apoio de um tradutor, no primeiro diálogo luso-nipónico conhecido.

Foto 3: Murais com os nambans (os bárbaros do sul) e as teppó (espingardas) no espaço público do cais marítimo de Nishinoomote, Tanegashima.


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Foto 4: Estátua do Infante D. Henrique oferecida a Tanegashima pelo Governo de Portugal após a Exposição Mundial de Osaka, em 1970.

Foto 5: Cartaz do Teppó Matsuri (Festival da Espingarda), em Nishinoomote, Tanegashima, 2005.


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Foto 6: As teppó (espingardas), que impulsionaram grandes transformações tecnológicas e militares no Japão dos séculos XVI e XVII, apresentamse no Teppó Matsuri (Festival da Espingarda), em 2005.

Foto 7: Homens que transportam um mikoshi num ritual do taikoyama, purificamse nas águas de Tanegashima, em 2005.


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Foto 8: A recreação do navio português Sagres (com bandeira portuguesa içada no mastro) é transportado como um mikoshi, por crianças e jovens no Teppó Matsuri (Festival da Espingarda), em 2005.

Foto 9: Idem. No verso da bandeira portuguesa içada no mastro encontra-se a bandeira japonesa.


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Foto 10: Crianças de Tanegashima — o símbolo da paz!

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4.2. 1 MINI-VÍDEO DO “TEPPÓ MATSURI” (Youtube) Youtube: Canal de Amílcar Martins sobre Arte e Educação. http://br.youtube.com/user/amilcarmartins1 Acedido em 4 de Janeiro de 2009. Ver em http://br.youtube.com/watch?v=2u5McjiJIjU&feature=channel_page

RESUMO DO MINI-VÍDEO “Teppó Matsuri em Tanegashima, Japão” (1’ 29’’) Esta narrativa videográfica (1' 29'') revela um exemplo de como o fluxo da tradição cultural nipónica se exprime no diálogo intergeracional de crianças e de adultos do sexo feminino, traduzido no "Teppó Matsuri" (Festival da Espingarda), manifestação artística que tem lugar todos os anos no verão em Tanegashima, Japão. A conjugação da captura, selecção e ordenação sequencial do discurso visual, através da fotografia etnográfica (Amílcar Martins), articulada com a ressonância da sonoridade ancestral do grito e dos tambores nipónicos (Kitaro), fixa os elementos desta narrativa digital.


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5. CONCLUSÕES O cruzamento dos dados empíricos da nossa pesquisa, através da observação in loco, em Tanegashima, durante largos períodos desde 1986 até 2005, da participação directa em inúmeras actividades locais, de entrevistas a professores, a crianças e a jovens japoneses, bem como a várias outras personalidades e a membros da comunidade local, e ainda das imagens fotográficas que são estruturantes deste artigo, permite-nos avançar com a seguinte interpretação: i) a população japonesa, em geral, atribui significado e relevância histórica e cultural ao primeiro encontro luso-nipónico do século XVI; ii) muitos especialistas consideram que o impacto do encontro luso-nipónico do século XVI se repercutiu na sociedade japonesa a vários níveis: tecnológico, linguístico, artístico, cultural, educacional, religioso, militar e político; iii) a população de Tanegashima assume-se como herdeira directa da memória colectiva luso-nipónica e intervém com grande dinamismo no desempenho do papel de guardiã activa do que consideram ser sua pertença histórica; iv) os sectores mais representativos da educação formal e informal, nomeadamente as autoridades do departamento de educação e cultura, o Museu da Espingarda, a NASDA, as instituições escolares e os seus agentes de ensino, as associações culturais, os clubes e a população em geral, colaboram regularmente em actividades escolares, ou extra-escolares, de contacto com a sua história, estudando-a, expandindo-a, actualizando-a ou participando na descoberta de novos sentidos e significados; v) a vivacidade e a animação presentes — hoje — vinculadas na genealogia dos fluxos da tradição cultural japonesa, sublinham a consciência colectiva das práticas da comunicação intergeracional que se abrem à contemporaneidade e à inovação, designadamente através dos rituais e das festas como factores de coesão social e de afirmação da identidade local, sustentadas na historicidade do primeiro encontro luso-nipónico. Sabemos que os modos como se vivenciam colectivamente os processos de ritualização — festivos ou de outra natureza — têm implicação na forma como se aprende e, também, na forma como se estrutura e organiza o pensamento, designadamente ao nível das aprendizagens sociais (cf. Courtney, 1995). Alguns rituais e festas representam, para os indivíduos e as comunidades que a eles aderem e participam, a manifestação visível dos seus traços distintivos profundos de identidade. Eles constituem, porventura, o elemento mais marcante da coesão sóciocultural de um grupo, de uma comunidade, de um país e, por vezes mesmo, de uma civilização. Cremos que em tempo de pressão globalizante que conduz a mudanças uniformizadoras nas diversas culturas, importa que o fluxo da permanência e da durabilidade dê lugar a gestos e a acções que preservem, aprofundem e iluminem algumas marcas de tradições. Importa que as comunidades educativas, e


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particularmente os seus agentes educativos, participem activamente no esforço conjunto de eleger e acarinhar heranças fecundas do tempo, e manifestem sensibilidade para ajudar a construir sínteses saudáveis de progresso em estreita ligação com os elementos mais inovadores e criativos das culturas onde se inserem. A população de Tanegashima, ao continuar hoje a celebrar, festivamente, o primeiro encontro e diálogo luso-nipónico do século XVI, revê-se também no valor da experiência e das trocas, da interculturalidade e da paz que esse encontro produziu. Julgamos, por isso, ser oportuno lançar aqui uma ponte para um outro viajante, Fernando Pessoa. O Poeta conjugador, em vários tempos e modos, do verbo ir à aventura, da teatralidade múltipla e da experimentação da diversidade do EU, criador de tanto(s) OUTRO(s), revela-nos, através de um dos seus heterónimos, Álvaro de Campos, a sua sensibilidade criadora e interpelante a esta dinâmica do ser EUOUTRO: (...) Quanto mais eu sinta, quanto mais eu sinta como várias pessoas, Quanto mais personalidades eu tiver, Quanto mais intensamente, estridentemente as tiver, Quanto mais simultaneamente sentir com todas elas, Quanto mais unificadamente diverso, dispersadamente atento, Estiver, sentir, viver, for, Mais possuirei a existência total do universo (…)

6. BIBLIOGRAFIA BENEDITO, Joviana. (2003). Dicionário da Internet e do Telemóvel. Lisboa: Centro Atlântico. BETHENCOURT, Francisco e CHAUDHURI, Kirti. (Dir.). (1998). História da Expansão Portuguesa. Volume I – A Formação do Império (1415-1570). Lisboa: Círculo dos Leitores. BRUNER, Jerome. (2000). Cultura da Educação. Tradução de Abílio Queirós de ‘The Culture of Education’. Lisboa: Edições 70. BUNSHI, Nampo. (1988). “Crónica do Mosquete”, in MARTINS, Amílcar (Coord.). Catálogo Tanegashima - Teatro de História Luso-Nipónica. Macau: Complexo Escolar de Macau. COURTNEY, Richard. (1995). Drama and Feeling: An Aesthetic Theory. Montreal & Kingston; London; Buffalo: McGill-Queen's University Press. CRAIG, Peter Erik. (1978). La méthode heuristique: une approche passionnée de la recherche en sciences humaines. Tradução do inglês para francês por Ali Haramein, 1988. Boston: University Graduate School of Education. JANEIRA, Armando Martins. (1988). O Impacto Português sobre a Civilização Japonesa. Lisboa: Publicações Dom Quixote. LEGENDRE, Renald. (2005). Dictionaire actuel de l’éducation. 3ième édition. Montréal: Guérin. LOUREIRO, Rui. (s/d). Os Portugueses e o Japão no Século XVI: Primeiras informações. Lisboa: Grupo de Trabalho do Ministério da Educação para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses. MAISONEUVE, Jean. (1988). Les rituels. Paris: Presses Universitaires de France.


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7. DVD Câmara Municipal de Nishinoomote. (2000). Tanegashima. Nishinoomote, Tanegashima, Japão. (Versão japonesa, 15’).

8. VÍDEO-CASSETES RODRIGUES, Avelino et al. (1986a). Tanegashima - A Ilha da Espingarda. Macau: TDM Teledifusão de Macau. RODRIGUES, Avelino et al. (1986b). Os Cristãos Ocultos de Nagasaki. Macau: TDM - Teledifusão de Macau.


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