FINANÇAS PÚBLICAS GAÚCHAS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O MONITORAMENTO

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1 FINANÇAS PÚBLICAS GAÚCHAS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O MONITORAMENTO

PUCRS – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Programa de Pós-Graduação em Economia da PUCRS (PPGE/PUCRS) Av. Ipiranga, 6681 - Prédio 50 – Sala 1105 CEP 90.619-900 – Porto Alegre – RS Nome: Alfredo Meneghetti Neto. Qualificação: pesquisador em economia da FEE e professor da PUCRS. Endereço: rua Pedro Ivo, 385, apto. 501, bairro Mont’ Serrat, Porto Alegre. E-mail: a.meneghetti@terra.com.br Área temática: Macroeconomia Regional, Setor Externo, Finanças Públicas Setor Público e Finanças Públicas Palavras chaves: contas públicas, finanças públicas, incentivos fiscais. RESUMO O objetivo deste trabalho foi construir conhecimento sobre o monitoramento das finanças públicas gaúchas, privilegiando as principais variáveis da receita, da despesa e do resultado e execução orçamentária. Foram trazidos vários aspectos em termos de medições do ICMS, gastos com pessoal, dívida e renúncias fiscais que podem ajudar a acompanhar as enormes dificuldades das contas públicas do RS. ABSTRACT The aim of this work was to build knowledge about the monitoring of public finances in Rio Grande do Sul, focusing on the main variables of revenue, expenditure and results and budget execution. Several aspects have been brought in terms of ICMS measurements, personnel expenses, debt and tax benefits that can help to understand the enormous difficulties of the RS public accounts.

FINANÇAS PÚBLICAS GAÚCHAS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O MONITORAMENTO


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Alfredo Meneghetti Neto1 Esse texto é uma atualização de um estudo anterior (Meneghetti Neto, 2018a) com o objetivo de propor algumas variáveis das finanças públicas gaúchas para o seu monitoramento. Para isso foram privilegiadas as variáveis relacionadas com as receitas, despesas e o resultado e execução orçamentária, que têm a virtude de espelhar o desempenho das contas públicas. Em primeiro lugar no item 1 analisa-se o desempenho do Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, que é sem dúvida, o principal tributo do Estado.

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No item 2 detalham-se as duas rubricas mais importantes

das despesas: os gastos com o pessoal e com a dívida e, no item 3, apresentam-se o resultado e execução orçamentária de 2017. Logo a seguir, detalham-se as considerações finais. 1- MEDIÇÕES DA PERFORMANCE DO ICMS

Sabe-se que a arrecadação do ICMS é fundamental para as finanças públicas estaduais, já que se trata de um imposto que tem representado cerca de 80% da receita tributária gaúcha. Para monitorar o ICMS gaúcho nesses últimos anos tem-se adotado metodologias, já desenvolvidas em estudos anteriores, contrapondo as taxas de crescimento do PIB com as do ICMS. Na realidade tanto a arrecadação do ICMS, como o Produto Interno Bruto (PIB), são duas variáveis que têm a virtude de espelhar, por um lado, o quanto à economia conseguiu produzir em bens e serviços e, por outro, o quanto o Tesouro arrecadou. Apesar de existirem algumas peculiaridades em termos de composição das duas variáveis, elas tendem a variar de uma forma semelhante, pois o ICMS incide sobre produtos (como alimentação, vestuário, eletrodomésticos), e também sobre serviços (tais como luz e telefone).3 Observando-se uma série de 1986 a 2017, em algumas vezes, essa semelhança no desempenho das duas variáveis não aconteceu, das 32 observações realizadas, em 19 Economista, pesquisador em economia da FEE e professor da PUCRS. O texto foi enriquecido pelo fornecimento de dados tanto de Alvaro Almeida Berrutti da Contadoria e Auditoria Geral do Estado da Secretaria da Fazenda (CAGE-SEFAZ), como de Adi Collaziol da Secretaria de Planejamento (DOFSPGG). Os erros que eventualmente tenham permanecido são de inteira responsabilidade do autor. 2 A estatística da arrecadação do ICMS nesse texto é distinta do ICMS arrecadado a qualquer título, pois não estão sendo considerados: a dívida ativa, os juros de mora e as multas por pagamento de atrasos. Ao adotar esse procedimento busca-se uma precisão maior no monitoramento do ICMS. Além disso utilizouse como deflator o IGP-DI atualizado para 1º de janeiro de 2018, disponível no link “serviços/ atualização de valores” do site da FEE (www.fee.tche.br). 3 É importante salientar que ao se comparar essas duas variáveis está sendo utilizada uma metodologia alternativa, pois elas possuem uma estrutura bem diversificada nas suas composições. O melhor seria considerar a evolução de todos os setores do PIB que são tributados pelo ICMS ou, o PIB pelo seu componente interno, uma vez que as exportações estão desoneradas do imposto. O mercado interno ou “absorção interna” (a parte da riqueza produzida no País e consumida internamente) abrange o consumo das famílias, o consumo do governo e os investimentos das empresas (formação bruta de capital fixo). Entretanto, como essa estatística é difícil de ser obtida, tem-se adotado a comparação pura e simples do PIB e ICMS. 1


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delas as variações percentuais foram com o mesmo sinal (positivo ou negativo). Entretanto, ocorreram diferenças bem substanciais nas 13 restantes, chegando inclusive a 30 pontos percentuais como no ano de 1989, quando o PIB-RS apresentou um crescimento de 3,4% e o ICMS gaúcho aumentou mais de 33%. 4 O Gráfico 1 da arrecadação do ICMS e do PIB gaúcho dos últimos vinte anos mostra bem nitidamente que nos anos de 1993, 2003 e 2007 essas divergências no crescimento foram encontradas. Existem explicações, tais como: modificações na política macroeconômica do governo federal; reestruturação da administração tributária da Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul; isenções, inadimplências, não-incidência de ICMS em setores como o financeiro, guerra fiscal, sonegação, dentre outros. 5 Gráfico 1 Evolução do ICMS e do PIB gaúcho -1995-2017

Fonte dos dados brutos: FEE e Secretaria da Fazenda Isso permite argumentar que a hipótese do PIB-RS e do ICMS ter o mesmo comportamento anual deve ser vista com restrições. Através do Gráfico 2, pode-se visualizar o comportamento dessas duas variáveis medidas pelas suas taxas de crescimento nos últimos quase quarenta anos. Gráfico 2

Como ainda não foi publicado o PIB gaúcho de 2017 pela FEE, está sendo adotado uma taxa de crescimento de 1%, semelhante a taxa de crescimento do PIB brasileiro. 5 Existem vários estudos onde se buscou detalhar com mais profundidade a relação entre o PIB e o ICMS gaúcho, como em Meneghetti Neto (1990, 1995, 2018a). 4


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Evolução do ICMS e do PIB-1970-2017

Fonte dos dados brutos: FEE e Secretaria da Fazenda O crescimento do ICMS e do PIB-RS foi semelhante até 1975, quando começou a apresentar um primeiro distanciamento no ano seguinte: enquanto o PIB gaúcho crescia 74% o ICMS alcançava somente 60%. O maior distanciamento, entretanto, ocorreu em três episódios: 1984, 1988 e depois do Plano Real, quando a economia cresceu (em relação a 1970) e a arrecadação não conseguiu reagir. Observando-se a série como um todo é possível argumentar que enquanto o PIB-RS cresceu 323% em relação a 1970, o ICMS acompanhou somente com 311%. Isso significa que o Estado vem tendo cada vez menos capacidade de se impor para transformar a expansão da base econômica em termos de arrecadação. Em outras palavras, a economia gaúcha até cresceu ao longo do período, mas o ICMS não.

A Tabela 1 apresenta o cálculo da elasticidade-renda do ICMS.6 Tabela 1 Elasticidade-renda do ICMS gaúcho nos anos 70, 80, 90, 00 e 10. ANOS

Período

Elasticidade -renda

70

1970-79

0,90

Para o cálculo da elasticidade-renda dos últimos 40 anos foi utilizada a planilha Excel da Microsoft. Em primeiro lugar, dividiu-se a série em cinco períodos e depois foi considerado como variável independente o PIB-RS e como variável dependente o ICMS. A ideia que está por trás disso é que as variações da economia gaúcha (em termos de crescimento) teriam condições de explicar as variações da arrecadação do ICMS. 6


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80

1980-89

1,41

90

1990-99

-0,48

00

2000-09

0,88

10 2010-17 Fonte: elaborado pelo autor

0,91

Pode-se notar pela Tabela 1, que nos anos 70, a elasticidade-renda do ICMS gaúcho ficou em 0,90, o que significa dizer que, para cada variação de 1% do PIB, o ICMS respondeu (positivamente) com 0,90%. Nos anos 80, a elasticidade-renda do ICMS gaúcho aumentou para 1,41, mostrando assim, uma capacidade maior do Estado em acompanhar a economia gaúcha. Nos anos 90 a relação do ICMS e do PIB foi inversa, ou seja, o PIB variou em média 1% de crescimento, enquanto que o ICMS caia 0,48%, significando que o Estado passou a ter cada vez menos recursos em relação aos encargos que o crescimento da economia lhe impõe. A partir de 2000 o ICMS está mostrando sinais de melhoria: 0,88 e 0,91. Isso permite argumentar que a atual performance do ICMS está semelhante aos anos 70. Outra forma de medir a arrecadação do ICMS é verificar até que ponto os planos econômicos ou as alterações da política tributária influenciaram sua performance. Parece razoável supor que a arrecadação do ICMS deve ter recebido todos os impactos relativos ao desempenho da economia brasileira, como os planos de estabilização econômica, que conseguiram melhorar o desempenho do ICMS em virtude da queda brusca da inflação, como pode ser visualizado no Gráfico 3 nos Planos: Cruzado (1986), Verão (1989), Collor I (1990), Collor II (1991) e no Real (1994).

Gráfico 3 Evolução do ICMS gaúcho e os Planos Econômicos-1986-2017


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Fonte dos dados brutos: Secretaria da Fazenda Nota: Os valores do ICMS foram deflacionados pelo IGP-DI a preços de janeiro de 2018.

Nota-se que o patamar chegou a R$ 2 bilhões no Plano Cruzado e logo depois, no ano de 1988, ocorreu o nível mais baixo de arrecadação do ICMS na gestão do ministro Maílson da Nóbrega, anterior ao Plano Verão, pois a inflação era de 20% ao mês e o prazo de recolhimento do ICMS chegava há 50 dias. Na época, teve inclusive meses que a arrecadação do ICMS ficou abaixo de R$ 1,2 bilhão. Já o pico de arrecadação no Rio Grande do Sul ocorreu nos Planos: Verão e Real. Especificamente esses picos de arrecadação coincidem com três fatores: prazo reduzido de recolhimento, queda brusca da inflação e nível máximo de produção da indústria gaúcha. Já mais recentemente mesmo com os efeitos negativos da crise econômica mundial e brasileira o crescimento do ICMS foi constante, atingindo nos meses de janeiro de 2015 e 2017 o recorde histórico de R$ 2,7 bilhões, que teve nesse último ano inclusive o aumento da alíquota de ICMS do Governo estadual. 2-MEDIÇÕES DOS GASTOS COM PESSOAL, DA DÍVIDA E DAS DESONERAÇÕES

Dois itens têm dificultado a execução orçamentária do RS: o gasto com o pessoal e o pagamento da dívida. O comprometimento com o pagamento de pessoal (ativos, inativos e pensionistas e as transferências às autarquias e fundações), incluído nas despesas correntes, chegou a um patamar de R$ 23 bilhões no ano de 2017. Esse montante de despesa apresenta sérias dificuldades para ser executado, não só pelo seu alto patamar de gasto exigido, como também pela sua rigidez aliado ao fato de os gastos com inativos e pensionistas já representarem mais da metade do pagamento do pessoal total.


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O número de matrículas desse contingente da Administração Direta e Indireta vem gradativamente aumentando nos últimos anos, como pode ser visto no Gráfico 5, que detalha o período de 1991 a 2017. Gráfico 4 Número de matrículas dos servidores ativos, inativos e pensionistas do RS – 1991- 2017

FONTE: Rio Grande do Sul. Secretaria da Fazenda.

Nele observa-se que enquanto os servidores ativos diminuíram de 228 mil (1991) para 187 mil (2017), os inativos aumentaram de 79 mil para 171 mil; e os pensionistas praticamente se estabilizaram em torno de 47 mil respectivamente no mesmo período. (Rio Grande do Sul, 03.03.2018). Essa situação deverá trazer muitas dificuldades para o RS no futuro, pois é um dos estados com a situação mais crítica nesse aspecto de todo o país. As implicações dessa rubrica são sérias, pois de acordo com o Ministério da Previdência e Assistência Social o Rio Grande do Sul apresentou um déficit previdenciário público no ano de 2015 de R$ 7,1 bilhões só superados por São Paulo (R$ 13,3 bilhões) e Rio de Janeiro (R$ 8,6 bilhões). (BRASIL, 20.03.2017). Mas essa situação também é bem complicada em 20 dos 27 estados, nos quais a despesa supera a receita previdenciária. Em relação às despesas com a dívida pública total do RS, a amortização e o pagamento dos seus encargos absorveram R$ 1,6 bilhão em 2016. Esse montante representa quase uma arrecadação mensal de ICMS. Além disso, a dívida pública total (interna e externa) do RS é bem expressiva, pois chegou em 2016 a R$ 66 bilhões, o que equivale a mais do que um orçamento anual do Estado.


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Tabela 2: Estoque da Dívida Pública consolidada Interna e Externa — R$ milhões Estoque Dívida Final de Governos em 31/12/2017 Governo Peracchi 1971 2.242 Triches 1974 6.383 Guazelli 1978 8.685 Amaral 1982 15.551 Jair 1986 21.594 Simon 1990 21.622 Collares 1994 26.693 Britto 1998 59.338 Olívio 2002 59.182 Rigotto 2006 60.271 Yeda Crusius 2010 59.673 Tarso Genro 2014 64.714 Ivo Sartori 2016 65.973 FONTE: Rio Grande do Sul (21.02.2018)

Índice de Referência 1,0 2,8 3,9 6,9 9,6 9,6 11,9 26,5 26,4 26,9 26,6 28,9 29,4

Na realidade a dívida pública gaúcha tem crescido muito nos últimos anos como mostra a Tabela 2, pois em 1971 chegava a R$ 2,2 bilhões e teve até agora, um crescimento de 29 vezes em valores reais pelo IGP-DI, representando um extraordinário salto da dívida ocorrido no Governo Britto, causado pela renegociação da dívida com a União. Especificamente a fórmula de cálculo utilizada pela União para a correção da dívida gaúcha em abril de 1998, pelo IGP-DI provocou esse aumento no seu montante. Entretanto com a aprovação do PL 238/2013, a partir de 01/01/2013, o estoque passou a ser corrigido pelo IPCA mais 4% ao ano, ou a Taxa SELIC, o que for menor, em substituição ao IGP-DI mais 6% ao ano. Importante salientar que essa matéria tenha sido regulamentada através do Decreto nº 8.616, quase três anos depois, em 29/12/15. Dessa forma, a nova metodologia de atualização do estoque poderá beneficiar tanto no curto como no médio prazo, podendo abrir espaço para novas operações de crédito; no longo prazo, em tese poderá reduzir o estoque da dívida no final do contrato. Pode-se argumentar que, quanto menor for a inflação pelo IPCA ou quanto menor for a Taxa SELIC, menor será o aumento do estoque da dívida.7 (Rio Grande do Sul, 03.03.2018) Finalmente, outro elemento importante que torna o orçamento gaúcho deficitário são as desonerações do ICMS, como mostra a Tabela 3. Nota-se um volume Recentemente foi aprovado no Congresso Nacional, o Projeto de Lei que alongou a dívida dos Estados com a União por mais 20 anos. Certamente essa medida trará um alívio financeiro para todos os estados, autorizando a suspensão do pagamento das parcelas entre julho e dezembro de 2016. Dessa forma, a contar de janeiro de 2017 até junho de 2018 (18 meses), voltarão a ser pagas na proporção acumulada simples de 5,55% ao mês. A partir de julho de 2018, as parcelas serão quitadas na sua integralidade, ou seja, voltará a ser de 13,0% da Receita Líquida Real. 7


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expressivo de desonerações fiscais em todos esses anos, que tem diminuído a arrecadação potencial em 23%. Nota-se que as desonerações foram crescendo à medida que as arrecadações ganhavam novos patamares: passaram de R$ 1,7 bilhão (em 2003) para R$ 8 bilhões (em 2015). É sabido que quando o Governo concede uma desoneração fiscal para um segmento da economia, espera haver efeitos multiplicadores, gerando, assim, mais empregos e mais investimentos. Com isso, todos deveriam sair ganhando, o empresário, ao recolher menos imposto, reduz o seu custo e eleva a sua competitividade, podendo aumentar a comercialização de bens e serviços. O cidadão ganha na oferta de bens e produtos de preço menor e, eventualmente, poderá ter mais oportunidades de empregos nos segmentos beneficiados, e o próprio Governo poderá aumentar a sua arrecadação. Entretanto para um estado com as finanças públicas tão prejudicadas, tanto pela fragilidade do ICMS, como também pelo volume expressivo dos gastos com pessoal e da dívida, o volume expressivo das desonerações agrava ainda mais a sua situação orçamentária.8

Tabela 3 Evolução das Estimativas das Desonerações - Em R$ milhões (valores nominais) - 2003 a 2015 Ano

Arrecadação

2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

8.989 9.638 11.383 11.813 12.258 14.825 15.087 17.893

Desonerações 1.775 2.243 2.275 2.634 3.036 3.789 3.637 4.724

ICMS Potencial 10.764 11.881 13.658 14.447 15.294 18.614 18.724 22.618

% Desoneração/ ICMS Potencial 16,49% 18,88% 16,65% 18,23% 19,85% 20,36% 19,42% 20,89%

A situação gaúcha das desonerações fiscais do ICMS também é muito semelhante à de outros estados, como bem chama atenção um estudo publicado pelo Banco Interamericano Para o Desenvolvimento (Afonso et alii, 2014). Foi demonstrado que as desonerações fiscais dos estados chegaram a montantes elevados (entre R$ 41 bilhões e R$ 52 bilhões no triênio 2012-14), enquanto a renúncia tributária federal ficou entre R$ 146 bilhões e R$ 192 bilhões para o mesmo período. Não há dúvidas que é fundamental, estudar mais a fundo as desonerações fiscais, as quais são consideradas um gasto público invisível, pois são protegidas por sigilo fiscal e não são avaliadas de forma adequada. 8


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2011 22,56% 19.503 5.683 25.186 2012 21,89% 21.378 5.992 27.370 2013 21,93% 24.061 6.759 30.820 2014 23,98% 25.854 8.155 34.010 2015 22,92% 27.126 8.065 35.190 FONTE: RELATÓRIO E PARECER PRÉVIO SOBRE AS CONTAS DO GOVERNO DO ESTADO: exercício 2015. Porto Alegre: Tribunal de Contas, 2016. Disponível em: http://www2.tce.rs.gov.br/portal/page/portal/tcers/consultas/contas_estaduais/contas_governador. Acesso 09 abril 2018.

Essas três rubricas (pessoal, dívida e desonerações) por serem cada vez maiores, diminuem as possibilidades do Governo Estadual em realizar investimentos, que ainda estão em um nível muito baixo (de R$ 1,3 bilhão), representando somente 0,5% do PIB no ano de 2017. Na realidade o que se tem observado é uma redução gradativa dos investimentos, em média, nos últimos quatro governos: Britto (1,5% do PIB), Olívio (0,7% do PIB), Rigotto (0,5% do PIB), Yeda (0,5% do PIB) e Tarso (0,5% do PIB). Rio Grande do Sul. (03.03.2018) Além disso as três rubricas pressionam muito o resultado e a execução orçamentária do RS, como se verá no item 3. 3-MEDIÇÕES DO RESULTADO E DA EXECUÇÃO ORÇAMENTÁRIA Os resultados orçamentários da Administração Consolidada (de todo o setor público gaúcho, com exceção das estatais) na maioria dos últimos anos foram deficitários, como mostra o Gráfico 5. Os únicos superávits foram nos anos 2007, 2008 e 2009, que, com exceção do ano de 2007, foram conseguidos através de uma combinação de medidas de modernização da administração tributária, de controle de gastos e de aumento da arrecadação.9 Depois disso ocorreram somente resultados deficitários, sendo que alguns deles até maiores do que R$ 1 bilhão: como R$ 1,7 bilhão (2013), R$ 1,4 bilhão (2014), R$ 4,9 bilhões (2015) e R$ 1,7 bilhão (2017). A única exceção foi o ano de 2016, quando o déficit ficou em somente R$ 738 milhões devido às novas receitas e aos acertos realizados pelo executivo. Em síntese naquele ano houve: aumento das alíquotas do ICMS; renegociação da dívida; venda da folha para o Banrisul, acordo judicial com a Ford, o Programa de Repatriação e os recursos do Fundo de Apoio às Exportações. Juntando todas essas ações o executivo conseguiu R$ 7,2 bilhões, como foi descrito em No ano de 2007, o superávit fiscal de R$ 844 milhões foi conseguido através de uma forma inédita pelas receitas extraordinárias - no sentido de ter havido receitas vindas tanto das alienações de ações preferenciais do BANRISUL; pelo pagamento dos convênios realizados pela União e também pelo esforço de cortes de despesas. Já em 2008 e 2009 foram conseguidos através de um programa de governo, chamado de déficit zero. 9


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Meneghetti Neto (2018b, p.126). Isso mostra as dificuldades crescentes da execução orçamentária gaúcha, pois as despesas cresceram mais rápido do que as receitas. Gráfico 5 Evolução do resultado orçamentário da Administração Consolidada do RS – 2002 a 2017

FONTE: RIO GRANDE DO SUL. Secretaria da Fazenda. NOTA: O resultado orçamentário apresentado no Gráfico 1 se refere à Administração Consolidada (Administração Direta + Transferências a Autarquias e Fundações), diferentemente daquele exposto na Tabela 4, que é somente dos recursos do Tesouro (Administração Direta).

A tendência é a situação se agravar ainda mais, pois a estimativa de déficit em 2018 chega a quase R$ 7 bilhões, de acordo com o Orçamento do Estado do RS (Rio Grande do Sul, 03.03.2018). A seguir detalham-se o comportamento da execução orçamentária. Através da Tabela 4, pode-se acompanhar a execução orçamentária do Tesouro do ano de 2017. 10 Tabela 4 Execução orçamentária da Administração Direta do RS - 2017 TÍTULOS A - RECEITAS CORRENTES B- RECEITAS CORRENTES INTRA-ORÇAMENTÁRIAS C- DEDUÇÕES PARA FUNDEF D - DESPESAS CORRENTES E - RESULTADO DO ORÇAMENTO CORRENTE (A+B-C) -D F - RECEITAS DE CAPITAL G - DESPESAS DE CAPITAL H- RESULTADO DO ORÇAMENTO DE CAPITAL (F-G) I - RESULTADO (E-H)

EM R$ MIL 48.838.813 15.405 -5.580.076 43.711.987 -437.845 790.106 1.994.647 -1.204.541 -1.642.386

No que diz respeito à execução orçamentária estadual se tem optado em considerar a despesa empenhada como sendo a interpretação mais próxima da real situação das contas públicas. Já a receita considerada na análise é a arrecadada. 10


12 Fonte: Estado do Rio Grande do Sul. Secretaria da Fazenda. Contadoria e Auditoria Geral do Estado. Execução Orçamentária da Administração Direta NOTA: O resultado orçamentário apresentado nesse no item se refere somente aos recursos do Tesouro (Administração Direta), diferentemente daquele exposto no Gráfico 1, que é de toda a Administração Consolidada.

As Receitas Correntes (item A) que englobam as receitas tributárias, patrimoniais, industriais e as provenientes de transferências correntes alcançaram R$ 48,8 bilhões e as Receitas Correntes Intra-orçamentárias (item B) ficaram em R$ 15,4 milhões. Dessas duas receitas são excluídas as Despesas do FUNDEB (item C) e as Despesas Correntes (item D). A primeira corresponde à provisão de R$ 5,6 bilhões que todos os Estados e Municípios devem destinar ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Básico e de Valorização do Magistério (FUNDEB). Já as Despesas Correntes atingiram quase R$ 44 bilhões e engloba os gastos com pessoal e de material de consumo dentre outros. O Resultado Orçamentário Corrente (item E) foi deficitário em R$ 438 milhões.11 O Resultado do Orçamento de Capital (item H) também foi deficitário em R$ 1,2 bilhão, porque as receitas atingiram somente R$ 790 milhões, frente as despesas de capital de R$ 2 bilhões (pressionadas pelas amortizações da dívida de quase R$ 1 bilhão). Totalizando-se essas rubricas, nota-se que o Executivo não conseguiu equilíbrio orçamentário, tendo chegado ao final de 2017 a uma situação deficitária de R$ 1,6 bilhão (item I). Essa situação de déficit crescente desde 2010, preocupa muito, pois a única exceção ocorreu em 2016 quando o Governo Sartori conseguiu receitas extras (aumento das alíquotas do ICMS da renegociação da dívida; venda da folha para o Banrisul, acordo judicial com a Ford, Programa de Repatriação e Fundo de Apoio às Exportações) que totalizaram R$ 7,2 bilhões, e conseguiram reduzir o déficit em 2016. Daqui para frente todas essas fontes de arrecadação extra já não existem mais. Isso permite concluir que o equilíbrio do orçamento estadual se torna cada vez mais difícil, que somente foi obtido na gestão do Governo Yeda, que tinha como meta a busca pelo déficit zero, como está claro nos anos 2007, 2008 e 2009 do Gráfico 5. Finalmente, cabe salientar ainda que ao observar uma série histórica da execução orçamentária dos recursos do Tesouro notou-se que o aumento do déficit repercute cada vez mais nas dificuldades de caixa, tornando o cenário futuro do RS bastante sombrio, pois não há nenhuma mudança estrutural no orçamento gaúcho. 11

Interessante constatar que esse resultado é importante para as finanças públicas, porque revela a poupança que o setor público forma ao longo de um ano para honrar o serviço da dívida. O que se nota é que ele vem se tornando cada vez pior, pois em 2016 teve um déficit de R$ 252 milhões e ele quase dobrou (R$ 438 milhões) em 2017. Isso mostra uma tendência de fragilidade das contas públicas.


13 4- CONSIDERAÇÕES FINAIS

A questão principal investigada por este estudo foi construir conhecimento para monitorar as finanças públicas gaúchas. Todo o conjunto de variáveis apresentadas nos três itens oferecem amplo material que respondem a essa questão. Através das métricas das principais variáveis foi possível aprofundar a situação das receitas, despesas e dos resultados e execução orçamentária. Elas demonstram claramente as dificuldades das finanças públicas gaúchas nesses últimos anos. Todos os indicadores, gráficos e tabelas selecionados, impõe que sempre o Executivo tenha que buscar inúmeras formas alternativas para o pagamento de seus compromissos. Três considerações sobre as finanças públicas podem ser encaminhadas. Em primeiro lugar, a arrecadação do ICMS está muito fragilizada em função do volume excessivo das renúncias fiscais, o que faz com que essa variável tenha ficado aquém do crescimento da economia gaúcha. É necessário um debate maior sobre as renúncias fiscais procurando construir conhecimento para verificar a repercussão deles na economia em termos de empregos e impactos nos segmentos econômicos. Em segundo lugar, é sabido que mesmo com todo esforço na eficiência do gasto, ajudado pela implementação do Programa de Qualidade do Gasto, ainda as despesas com pessoal e com a dívida estão muito altas, comprometendo demasiadamente o equilíbrio orçamentário. A solução para isso é que o Governo deve continuar negociando um acordo da dívida com o governo federal, ajustando as despesas com pessoal, cortando os desperdícios e procurando manter o mínimo possível de cargos de confiança e funções gratificadas. Em terceiro lugar, uma frente de trabalho pode ser constituída para monitorar mais de perto a execução do orçamento do estado, onde se notou que o Executivo vem tendo a cada ano uma situação deficitária crescente. Isso tem chamado atenção do Tribunal de Contas do Estado, pois os dois últimos anos superavitários foram de 2008 e 2009. Não há dúvidas que as dificuldades são crescentes, mas o governo gaúcho deve apresentar um patamar mínimo de poupança para honrar o serviço da dívida. Concluindo pode-se argumentar com base nessas variáveis selecionadas que é possível monitorar de forma adequada as finanças públicas e que a situação do Rio Grande do Sul é insustentável. Existem déficits crescentes, causados por receitas fragilizadas e despesas cada vez maiores. Isso impõe um esforço político enorme, para que o Executivo busque alternativas para resolver os seus problemas. Sem esse esforço político e sem o equilíbrio orçamentário as finanças públicas, a confiança dos empresários e dos contribuintes gaúchos não será retomada.


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