Amanda quick o rio sabe o seu nome

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Amanda Quick

O Rio Sabe O Seu Nome

Tradução/Pesquisa:GRH Revisão Inicial: Sueli Leitura Final e Formatação:Ana Paula G.


Comentário da Revisora Sueli:

“Seu nome era Joanna Barclay, e ela precisava morrer para continuar viva.” Nessa novela, Amanda Quick continua a nos apresentar cenas do cotidiano londrino. O destino das viúvas deixadas na ruína por seus maridos aristocratas, que por um motivo ou outro não souberam administrar seus bens e ainda deixaram dívidas a serem pagas, era o pior possível! Poucas opções havia para elas, e muitas acabavam na prostituição, ou mais frequentemente no fundo do Tamisa. Nossa heroína é uma das mulheres expulsa do convívio com seus pares, e que para fugir da forca simula sua própria morte, e reaparece um ano depois como correspondente de um tabloide, especializado em escândalos, crimes e fofocas. Não podemos esquecer que foi durante o reinado da Rainha Vitória que tomamos conhecimento de um dos primeiros assassinos seriais da história universal. Londres, definitivamente, não era um lugar seguro, nem tão pouco amistoso para as mulheres sem fortuna ou beleza, que se dedicassem a ter uma forma honesta para ganhar a vida, sem que para isso tivessem a necessidade de estar a serviço de alguém. É nesse cenário que nossa protagonista encontra Anthony, um jovem aristocrático, culto, charmoso, muito rico 2


e que ela confunde com um arrombador de cofres fortes. Nascido em uma família muito pouco convencional, ele está à procura de uma explicação para a morte de sua prometida. Anthony e Louisa resolvem reunir esforços para se faça justiça, mesmo que para isso tenham que colocar suas vidas em risco nos momentos em que não estejam em intenso interlúdio romântico! Um suspense divertido e sensual, bem do jeitinho dessa escritora simpática e bem humorada. Foi uma grata surpresa encontrar cenas muito sensuais, mais descritivas e hilárias. Leia e aprecie! Um romance 4 estrelas! Leitura Final Ana Paula G.: Eu,particularmente, gosto muito do estilo da Amanda Quick.Suas histórias são sempre bem elaboradas,sensuais e com um toque de humor.Este livro não é diferente.Muito bom!

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R es u m o O primeiro beijo aconteceu no corredor escassamente iluminado da mansão de Edwin Hastings. Louisa não o viu chegar....Claro que era impossível que Anthony abrigasse intenções românticas. O beijo deve ter sido uma medida desesperada para evitar que os capangas os descobrissem, onde não deveriam estar. Porque, afinal de contas, nenhum homem poderia considerar que Louisa Bryce, com seu vestido sem graça e seus óculos, fosse uma mulher atraente. A única coisa que os intrusos tinham em comum era o interesse pelos assuntos particulares do Sr. Hastings, um homem poderoso de quem suspeitavam que abrigasse terríveis segredos. Agora, a Anthony e Louisa é apresentada a oportunidade de somar esforços para descobrir a verdade....., e esta associação será mais apaixonada do que ambos imaginaram. O Rio Sabe Seu Nome é outra grande novela de Amanda Quick, repleta de suspense, criatividade e sensualidade.

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Prólogo Ao final do reinado da Rainha Vitória

Não ousou acender todas as luzes com medo que um transeunte reparasse na luminosidade e, mais tarde, quando a polícia começasse a fazer perguntas, se lembrasse das luzes. Lá fora, no beco, a neblina era densa, mas o luar que se derramava pela janela era suficiente para iluminar o quarto minúsculo. Não que precisasse da fria luz prateada. Conhecia como a palma da mão os quartos confortáveis, situados em cima da loja. Aquele pequeno espaço fora seu lar por quase dois anos. Agachou-se na frente do pesado baú que estava em um canto e tentou colocar a chave na fechadura, uma tarefa que acabou sendo muito difícil por causa da tremedeira que agitava suas mãos. Obrigou-se a respirar profundamente numa tentativa de diminuir a frequência dos batimentos cardíacos, até que, após três tentativas fracassadas, o baú finalmente se abriu. No silêncio, o ranger das dobradiças parecia um lamento. Remexeu por dentro e pegou dois volumes cobertos com pele que havia guardado ali. Levantou-se, atravessou a sala e os depositou em uma pequena bolsa de viagem. Embaixo, na loja, empilhavam-se dezenas de livros, alguns dos quais, muito valiosos, mas o valor desses dois exemplares ultrapassava, de longe, o restante. Só poderia levar um número limitado. Livros pesavam muito, e mesmo que pudesse levar mais alguns, não seria aconselhável. O desaparecimento de um número desproporcional de volumes das prateleiras levantaria suspeitas.

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Por razões semelhantes, só havia levado uma quantidade mínima de roupas. Não seria conveniente que uma suposta suicida havia se afogado, levando consigo todo o seu vestuário. Ela fechou a bolsa volumosa. Ainda bem que não havia vendido os dois volumes. Às vezes nos últimos dois anos, o dinheiro teria vindo em boa hora, mas tinha sido incapaz de se livrar dos livros preferidos do seu pai. Eles eram tudo o que tinham, não só ele, mas também sua mãe, que havia morrido quatro anos antes. A verdade é que seu pai nunca conseguiu se recuperar da perda de sua amada esposa. Ninguém ficou surpreso com o tiro que deu na cabeça depois de ter experimentado uma desaceleração econômica devastadora. Os credores ficaram com a casa confortável e todos os seus pertences. Felizmente, a eles, pareceu que a vasta e diferenciada biblioteca não valia o suficiente. Quando precisou escolher entre as carreiras para as mulheres de sua posição, como dama de companhia ou preceptora, usou os livros para fazer o impensável e, na opinião da alta sociedade, o imperdoável: dedicou-se ao comércio. Aos olhos dessa mesma alta sociedade, era como se ela tivesse deixado de existir por obra de um feitiço. Não que ela nunca tivesse conhecido alguém daquele mundo. Os Barclay se moviam nesses círculos. Seu conhecimento das coleções e dos colecionadores de livros, herdados de seu pai, tornou possível começar a ganhar um pequeno lucro, apenas alguns meses depois de abrir o negócio. Nos dois anos em que a loja esteve aberta, tinha conseguido estabelecer-se como uma pequena, porém, respeitada comerciante de livros raros. Sua nova vida, em um local considerável, livros de contabilidade e uma volumosa correspondência comercial, estava longe de ser o agradável 6


e distinto mundo em que ela foi educada, mas percebeu que ser proprietária de um negócio e dirigi-lo era muito gratificante. Havia muito a dizer sobre as vantagens de ter controle sobre o dinheiro. Além disso, como comerciante estava finalmente livre das muitas regras e restrições impostas pela sociedade aos jovens distintos e solteiros. Era inegável que agora ocupava uma posição social inferior, mas a experiência lhe permitiu ganhar o controle de seu destino de uma maneira que antes teria sido impossível. Entretanto, uma hora antes, o sonho de um futuro brilhante, novo e independente, que tinha começado a tomar forma, foi desfeito. Agora estava mergulhada em um pesadelo. Ela não tinha outra escolha a não ser fugir à meia-noite, levando um punhado de itens pessoais, o dinheiro de um dia de vendas e dois livros valiosos. Deveria desaparecer, não tinha dúvidas, mas teria que ter certeza que ninguém se sentisse compelido a procurá-la. A febril inspiração veio de uma reportagem que leu alguns dias antes: ... Pela segunda vez, em menos de uma semana, a sociedade lamenta a trágica perda de outro de seus membros principais. Infelizmente, o rio fez mais uma vítima do sexo feminino. Sra. Victoria Hastings, que diziam estar sofrendo de ataques frequentes de depressão, terminou sua vida ao pular de uma ponte nas frias, profundas e turvas águas do rio Tamisa. O corpo não foi recuperado. Autoridades especulam a possibilidade que ele tenha sido arrastado para o mar ou que esteja preso nos destroços de um navio naufragado. Diz-se que seu devotado marido, Elwin Hastings, está mergulhado na mais profunda dor. Os leitores recordarão que a menos de uma semana, Fiona Risby, noiva do Sr. Anthony Stalbridge, também pulou no rio. O corpo, no entanto, foi recuperado... 7


Duas senhoras da alta sociedade se jogaram no rio, e na mesma semana. Além disso, todos os anos, mulheres de condições muito menos elevadas, desesperadas e deprimidas, escolhiam a mesma rota de fuga. Ninguém se surpreenderia quando descobrissem que a proprietária de uma pequena livraria havia cometido suicídio da mesma forma. Escreveu o bilhete de suicídio com as mãos trêmulas, concentrandose em encontrar as palavras certas, palavras que fossem convincentes: ... Eu perdi a esperança. Eu não posso viver com a recordação do que fiz esta noite, nem posso contemplar um futuro que só me oferece a humilhação de um julgamento público e a forca. É muito melhor me perder no esquecimento do rio... Assinou o bilhete, e o colocou sobre a pequena mesa, onde tinha o hábito de fazer refeições solitárias, e prendeu o papel com um pequeno busto de Shakespeare. Não lhe convinha que o bilhete caísse no chão e, talvez, passasse despercebido pela polícia. Jogou o casaco sobre os ombros e deu uma última olhada para o quarto. Ela tinha sido feliz ali. Era verdade que, às vezes, a solidão era difícil de suportar, especialmente à noite, mas você acaba se acostumando. Ela até pensou em ter um cão para lhe fazer companhia. Virou-se e levantou a bolsa pesada. Hesitou. Dois chapéus estavam pendurados em ganchos na parede do caminho: um de verão, e de abas largas, enfeitado com uma pena, que usava para uma caminhada. Ela pensou que poderia ser uma coisa interessante, um detalhe muito convincente, se o chapéu com pluma aparecesse flutuando perto da ponte, preso, talvez, a uma rocha ou madeira a deriva. Pegou o chapéu e o vestiu. Dirigiu o olhar para a cortina que escondia o quarto. Outro arrepio percorreu seu corpo pensando no que havia por trás.

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Segurando a bolsa com força, desceu correndo as escadas e foi para a sala dos fundos. Abriu a porta e olhou para o beco escuro. Não havia nenhuma razão para se preocupar com a chave. A fechadura havia sido forçada a menos de uma hora, quando o intruso havia invadido por meio da força. Caminhou devagar pelo beco, confiando em sua memória sobre a passagem estreita que corria por trás da fileira de lojas. Com sorte, alguns dias transcorreriam antes que alguém se perguntasse por que a Livraria Barclay estava fechada por tanto tempo. Porém, cedo ou tarde, alguém, provavelmente o senhorio, ficaria alarmado. Sr. Jenkins bateria na porta, dando golpes contundentes durante algum tempo, o que só aumentaria a sua raiva. Finalmente, pegaria uma das chaves que sempre carregava em seu chaveiro, abriria a porta da loja, e exigiria o pagamento de aluguel. Seria então, quando o corpo seria descoberto, deitado no quarto de cima. Em seguida, a polícia começaria a procura da mulher que havia assassinado Lord Gavin, um dos cavalheiros mais ilustres e ricos em alta sociedade. Fugiu na noite.

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Capítulo 01 Um ano e dois meses depois ...

A viúva misteriosa tinha desaparecido novamente. Anthony Stalbridge rondava o sombrio corredor a procura de uma fresta reveladora de luz, embaixo de uma porta. Todos os quartos pareciam vazios, porém sabia que ela não poderia estar muito longe. Tinha conseguido vê-la antes que desaparecesse na escura escada de serviço. Ele havia lhe dado certa vantagem, antes de segui-la pelas escadas estreitas. No entanto, ao chegar ao andar onde estavam os quartos, a Sra. Bryce tinha desaparecido sem deixar vestígios. Do salão subia os acordes apagados de uma valsa e o murmúrio monótono das conversas estimulado pelo champanhe. O andar térreo da mansão de Hastings estava brilhantemente iluminado e cheio de convidados elegantemente vestidos, porém no andar de cima, apenas se via um ou outro brilho dos apliques na parede além de um silêncio ameaçador. Era uma casa enorme, mas ocupada apenas por Elwin Hastings, sua novíssima, riquíssima e jovem esposa, e os criados. Estes dormiam no porão, o que significava que a maioria dos quartos, desse andar, estava vazia. Às vezes, os quartos desocupados eram tentadores para os convidados que procuravam um local adequado para seus encontros ilícitos durante as longas noitadas. Será que a Sra. Bryce subiu até aqui para se encontrar com um homem? Por alguma razão desconhecida não queria pensar seriamente sobre essa possibilidade. Não que ele tivesse direito de esperar alguma coisa. Ela lhe havia concedido algumas danças e mantido algumas conversas formais, nada comprometedoras, nos diversos eventos 10


sociais realizados na semana anterior. Somente até aí chegava o conhecimento que tinham um do outro. Mas sua intuição, para não mencionar todos os seus instintos masculinos, tinham-no advertido que, de fato, os dois, haviam se envolvido em um duelo arriscado. Um duelo que não tinha intenção de perder. Desde o primeiro encontro, Louisa Bryce tinha feito todo possível para não despertar sua atenção, pelo menos verbalmente. O que era esperado, claro, desde o antigo escândalo ligado ao seu nome. O que o intrigou foi que ela parecia determinada a desencorajar todos os homens que estivessem presentes nas festas que comparecia. Ele era um homem do mundo, estava ciente que havia algumas mulheres que não se sentiam sexualmente atraídas por homens, mas nas raras ocasiões em que havia persuadido Louisa a dançar com ele, e a teve em seus braços, estava convencido que ela sentia por ele, a mesma atração que sentia por ela. A valsa foi um excelente teste para este tipo de situação. Mas, talvez, poderia ter se enganado pela mais antiga razão do mundo: ele a desejava. Ela não poderia saber que os seus óculos de aros dourados que lhe davam um ar intelectual, vestidos e conversas antiquadas e chatas só contribuiriam para fasciná-lo. O deliberado e maçante verniz era claramente falso. No entanto, ele teve que admitir que parecesse funcionar muito bem com o resto da sociedade. Seu nome não era associado a nenhum cavaleiro. Ele já havia se encarregado de confirmar esse fato, discretamente, é claro. Que ele soubesse Louisa não mantinha relações íntimas com nenhum homem. A senhora era certamente misteriosa, e um dos maiores mistérios sobre ela era a sua curiosidade insaciável sobre o anfitrião da noite, Elwin

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Hastings, e os demais senhores que representavam o novo consórcio de investimento de Hastings. Uma porta se abriu no corredor. Anthony escondeu na sombra de um pequeno nicho e esperou pelos acontecimentos. Louisa saiu do quarto. Ele não podia ver o seu rosto claramente no escuro, mas reconheceu o insípido vestido marrom opaco e da pelerine um pouco antiquada. Também notou a inclinação orgulhosa de seu queixo e o contorno delicado de seus ombros. Apesar da situação constrangedora, ou talvez até mesmo por causa dela, sentiu uma onda de desejo na metade inferior de seu corpo. Ele a viu andar na direção dele, envolta em sombras, e lembrou que ele a tinha sentido em seus braços, quando haviam dançado há pouco tempo. Havia feito todo o possível, como de costume, para parecer pudica e chata, porém, quando estimulada a uma conversa, não conseguia esconder a inteligência cautelosa e o desafio intrigante de seus olhos ambarinos. Nem tampouco, mesmo com suas palavras entediantes, tinha conseguido distraí-lo do toque delicado de sua mão em suas costas. Anthony se perguntou se ela estava ciente de que por mais que tentasse desencorajá-lo, mais aumentava o desejo de descobrir seus segredos. Ela andou pelo corredor, alheia à sua presença, refazendo seus passos em direção às escadas de serviço. A luz de um candelabro de parede refletiu brevemente sobre as lentes de seus óculos. Anthony hesitou entre sair das sombras e interceptar o seu passo ou manter-se onde estava, quando uma voz rouca ecoou do patamar da escada. ― Quem está aí? - Um homem gritou rudemente. Era uma ordem e não uma pergunta, formulada sem o tom amável e respeitoso dos criados. Quinby. Um dos dois capangas que, recentemente, acompanhavam Hastings a toda a parte. Anthony estendeu a mão, agarrou 12


Louisa quando passava diante dele e a forçou parar. Ela se virou para ele, a boca aberta num grito de surpresa não emitido, os olhos arregalados. Anthony cobriu a boca com a mão livre. ― Silêncio! - Ele disse ao seu ouvido. ― Confie em mim. Apertando-a contra o seu corpo, a beijou para que se calasse. Ela resistiu durante alguns segundos. Deliberadamente, Anthony a beijou de novo, exigindo uma resposta. De repente, ela se entregou. Este momento de íntima, intensa e eletrizante paixão, era como um relâmpago a fulminá-los. Sabia que ela tinha tido a mesma experiência, pois havia sentido a sua reação de surpresa e emoção. Não tinha nada a ver com a chegada do sentinela. Os passos pesados de Quinby ecoaram no corredor. Anthony amaldiçoou silenciosamente. Não queria outra coisa a não ser continuar beijando Louisa. Sonhava em arrastá-la para o quarto mais próximo, colocá-la na cama, arrancar seus óculos e seu vestido simples... - O que estão fazendo aqui? - Quinby ladrou. Anthony olhou para cima. Ele não precisou fingir que estava relutante e com raiva. Louisa recuou, franzindo a testa como se ela também estivesse aborrecida pela interrupção. Anthony não deixou de perceber que o olhar dela, por trás das lentes, parecia um pouco fora de foco, e que sua respiração estava acelerada. ― Parece que temos companhia, minha querida. – disse, sem se alterar. Quinby quase tropeçou neles. Robusto e de ombros largos, vestia um sobretudo escuro. Um objeto pesado se avolumava em um dos bolsos do casaco. Um anel de ouro e ônix, caro e chamativo, brilhava em um de seus dedos.

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Louisa virou-se para o vigilante. Anthony percebeu que ela estava nervosa, mas ela escondeu sua reação admiravelmente, abrindo seu leque com gesto irritado. ― Acho que não fomos apresentados. - disse em um tom de voz que poderia esfriar um forno. E, apesar de sua altura ser significativamente menor que a de Quinby, de alguma forma, conseguiu olhar por cima do ombro. ― Quem é você para nos incomodar? ― Sem querer ofender, minha senhora... - Quinby disse, ainda olhando para Anthony. ― Mas, os convidados não tem permissão para vaguear por este andar. Vou acompanhá-los até embaixo. ― Nós não precisamos de escolta, - disse Anthony friamente. ― Nós conhecemos o caminho. ― Certamente. - disse Louisa. ― Nós conhecemos muito bem. Ela recolheu suas saias e tentou passar a frente de Quinby. O homem a impediu e segurou o seu cotovelo. Ela suspirou, como se a surpresa a tivesse paralisado. ― Como você se atreve! ― Perdão, minha senhora, mas antes de sair, eu tenho que perguntar o que vocês faziam aqui. Ela olhou para ele através de seus óculos. -Retire a mão imediatamente, ou eu vou providenciar para que o Sr. Hastings seja informado do que aconteceu. ― Ele será informado de qualquer maneira. - Era óbvio que Quinby não se sentia ameaçado. ― É meu dever informá-lo quando ocorrem essas coisas. ― Que tipo de coisas, se posso perguntar? - Louisa respondeu. ― O que está insinuando? Anthony olhou para Quinby. 14


― Retire a mão do braço da senhora. – Os olhos de Quinby se estreitaram. "Ele não gosta de receber ordens", pensou Anthony. ― Imediatamente. - acrescentou suavemente. Quinby liberou Louisa. ― Eu necessidade que respondam à minha pergunta. - murmurou, ainda com a atenção fixa em Anthony. ― Por que subiram aqui? Anthony compreendeu que a pergunta foi claramente dirigida a ele. Quinby já não estava mais interessado em Louisa. Anthony agarrou o braço de Louisa como se ela fosse sua propriedade, como faria com sua amante. ― Eu pensei que a resposta fosse óbvia. A senhora e eu estávamos à procura de um pouco de privacidade. Ele percebeu que Louisa não estava muito entusiasmada com as implicações de sua explicação, porém, ela sabia muito bem que ele não tinha outro remédio e cabia a ela endossar a iniciativa de Anthony. Com toda honestidade, estava de acordo com a ocasião. ― É claro que agora teremos que encontrar outro lugar, senhor. disse ela. ― É o que parece. - confirmou Anthony. Ele a agarrou fortemente pelo braço deu meia volta e começou a caminhar em direção à escadaria principal. -Um momento! - Quinby disse atrás dele. ― Eu não sabia o que vocês estavam fazendo, mas ... ― Exatamente. - disse Anthony falando sobre o ombro. ― Não tem ideia do que minha boa amiga e eu estávamos fazendo aqui, e vai continuar assim. ― Fui contratado para monitorar tudo o que acontece na mansão. disse Quinby, seguindo-os pelo corredor. 15


― Eu entendo. - disse Anthony. ― No entanto, a senhora e eu não sabíamos que o restante da casa nos estava proibido. Sem contar que não vimos nenhum aviso nesse sentido. ― É claro que não existe aviso. - Quinby rosnou. ― Pessoas como o Sr. Hastings não ficaraim pendurado avisos em mansões luxuosas como esta. ― Então, você não pode culpar-nos por ficar rondando a casa quando decidimos que queríamos fugir da multidão que está no térreo. Anthony disse suavemente. ― Espere um minuto. - disse Quinby. Anthony ignorou. ― Eu creio que meu coche vai nos dar o isolamento que necessitamos. - disse para Louisa, falando alto o suficiente para que fosse ouvido por Quinby. Ela olhou para ele hesitante, porém, graças a Deus, manteve sua boca fechada. Eles começaram a descer as escadas e Quinby parou no patamar. Anthony podia sentir os olhos do vigia perfurando suas costas. ― Devemos partir ― sugeriu discretamente a Louisa. ― Se ficarmos, vai parecer ainda mais suspeito. ― Eu vim aqui com a senhora Ashton, ― respondeu Louisa, nervosa, bem baixinho. ― Eu não posso simplesmente desaparecer. Ela ficaria preocupada. ― Tenho certeza que os lacaios não veriam nenhum inconveniente em informá-la que você partiu comigo. Ela ficou tensa. ― Eu não posso fazer isso, senhor.

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― Por que não? A noite é uma criança, e temos muito sobre o que falar, não é verdade? ― Não sei o que quer dizer. Agradeço-lhe a oportuna intervenção no corredor, ainda que inteiramente desnecessária. Eu poderia manejar, sem problema nenhum, esse homem. E, agora, realmente devo insistir..... ― Eu temo que seja eu quem deva insistir. Você suscitou a minha curiosidade, entende? Não poderei dormir esta noite, até que obtenha algumas respostas. Ela deu-lhe outra olhada de soslaio, rápida e carregada de suspeitas. Ele sorriu, mostrando também a sua determinação. Louisa estava tensa, mas não recuou. “Está muito ocupada planejando a fuga ― ele pensou ―sem dúvida, fazendo planos para quando chegar ao salão, já que a presença da multidão seria desaconselhável para uma cena.” Ele acrescentou: ― Terá que esquecer qualquer ideia que lhe ocorra de me abandonar, senhora Bryce. De uma maneira ou de outra, me permitirá que a acompanhe a sua casa esta noite. ― Não pode me obrigar a subir em seu coche. ― Jamais me ocorreria utilizar a força. Não, quando é muito mais provável que a serena razão funcione igualmente. ― Qual é a natureza desta serena razão? ― perguntou Louisa. ― Por que não começamos com a observação do nosso mútuo e fragrante interesse nos assuntos privados do nosso anfitrião? Anthony observou que ela tragava o ar, rápida e assustada. ― Não tenho a menor ideia do que está falando. ― Você acabou de sair do dormitório de Hastings ― disse Anthony. ― Como pode saber? ― perguntou ela ― Você está supondo?

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― Raramente me guio por suposições, senhora Bryce. Não quando tenho os fatos diante de mim. Eu sei que aquele era o quarto de Hastings porque ontem, eu consegui a planta da casa. ― Deus meu, senhor! ― exclamou Louisa. A repentina compreensão e algo muito próximo ao alívio iluminaram o seu rosto ― Você é um ladrão profissional? Uma dama de verdade e de boa criação, teria ficado horrorizada, ele meditou. Porém, Louisa não mostrava a menor preocupação por ser acompanhada por um membro da classe criminal. Muito pelo contrário, parecia muito intrigada; “encantada”.....não seria uma palavra exagerada. Ele estava certo, era uma mulher incomum. ―Não espere que eu confirme as suas suspeitas ― respondeu ele ― Não tenho a menor dúvida que chamaria a polícia e faria com que me arrastassem. Para seu grande assombro, ela começou a rir e sua gargalhada o cativou. ― Em absoluto, senhor ― assegurou-lhe com um abanar displicente― Não é meu assunto se ganha a vida roubando pessoas como Elwin Hastings, de qualquer maneira, devo dizer que essa notícia explica algumas coisas. Ele percebeu que a conversa estava tomando um rumo bem curioso. ― O que quer dizer? ― perguntou. ― Devo admitir que desde que o conheci nos baile dos Hammond, senti muita curiosidade por você, senhor. ― Devo me sentir lisonjeado ou alarmado? Ela não respondeu à pergunta. Em seu lugar, sorriu, com uma expressão petulante e satisfeita de uma gatinha enroscada, diante de uma lareira acesa. 18


― Desde o primeiro momento pensei que havia alguma coisa misteriosa em você ― disse ela. ― O que a fez pensar isso? ― O fato de pedir que nos apresentassem e logo a seguir me tirar para dançar, por acaso não é suficiente? ― respondeu abrindo e fechando o leque, com pequenos gestos que davam a entender que estava com a razão. ― E, o que tem isso de estranho? ― Os cavaleiros não sentem interesse em conhecer-me e muito menos em convidar-me para bailar. Quando voltou a dançar comigo na festa dos Wellsworth compreendi imediatamente que planejava algo duvidoso. ― Entendo ― admitiu Anthony. ― Por conseguinte, supus que me utilizava como desculpa para ocultar seu interesse em outra mulher ― pausou com sutileza ― Uma mulher casada, talvez. ― É óbvio que tem dedicado muito tempo e energia para pensar em mim nestes últimos dias. Tanto tempo como ele havia passado contemplando-a, pensou, e isso lhe causou grande satisfação. ― Era um enigma ― respondeu com simplicidade ― Naturalmente senti a necessidade de encontrar uma resposta. Nunca me passou pela cabeça que fosse um ladrão. Devo dizer que essa reviravolta nos acontecimentos é muito fortuita. Chegaram à entrada do salão antes que Anthony encontrasse uma resposta ao seu comentário. Um criado de libré, vestido com uniforme azul e prata, fora de moda, e uma peruca polvilhada, saiu ao seu encontro.

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― A capa da Sra. Bryce, por favor ― disse ― Avise ao meu cocheiro que venha e logo após informe à lady Ashton que a dama foi embora comigo. ― Sim, senhor ― respondeu o lacaio, apressando-se. Looisa não protestou mais, Anthony ficou com a impressão de que estava tão ansiosa para ir embora quanto ele. Pelo que parecia, a ideia de perder-se na noite com um ladrão profissional, não a preocupava nem um pouco. Não tinha noção sobre o que pensar sobre ela. O lacaio voltou trazendo uma capa granada, sem graça, para combinar com o insosso vestido da mesma cor. Anthony segurou a capa oferecida e a posou sobre os ombros de Louisa. O pequeno e galante gesto continha uma mensagem que não passou despercebida. Se Hastings interrogasse o Lácio depois, este diria que a Senhora Bryce e o Senhor Stalbridge pareciam se conhecer intimamente. Quando o coche parou diante da escadaria, Louisa se deixou guiar para o interior. Anthony a seguiu antes que ela mudasse de ideia. Ocupou o assento em frente e fechou a porta. Envoltos na obscuridade opressiva do veículo, compartilhando um espaço íntimo, Anthony se viu completamente consciente do cheiro de Louisa, uma mistura de aroma de mulher e de colônia de flores. Percebeu que se encontrava muito excitado, e teria que se concentrar muito no assunto que tinha em suas mãos. ― Muito bem, Sra. Bryce ― comentou ― Onde estávamos? ― Creio que ia me contar algo sobre a natureza tão incomum de uma profissão como a sua ― respondeu, puxando de sua manga um lápis e uma caderneta – Se importaria de acender as lamparinas? Quero tomar nota.

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Capítulo 02

O silêncio que se seguiu foi profundo. Louisa levantou os olhos e viu que Anthony a observava fixamente, com expressão atônita. Ela lhe dedicou um sorriso que deveria ser consolador. ― Não se preocupe ― acrescentou, abrindo a pequena caderneta, forrada de pele que levava à todas as partes ― não tenho nenhuma intenção de roubar os segredos do seu ofício. ― Tanto faz, porque não tenho nenhuma intenção de revelá-los – replicou secamente ― Guarde a sua caderneta Senhora Bryce. Os nervos de Louisa foram sacudidos por um ligeiro estremecimento. O mesmo estremecimento de alarme que havia experimentado quando, no princípio da semana, Lady Ashton os havia apresentado na festa dos Hammond. Ao ouvir seu nome, as campainhas de alarme haviam soado muito altas, porém se convenceu que era mera coincidência e não a mão terrível do destino, que a levara a bailar com o homem cuja noiva era uma das mulheres que haviam se afogado no rio, há pouco mais de um ano. A alta sociedade era, no fim das contas, um círculo relativamente reduzido. Apesar disso, esta noite, ao vê-lo no corredor da mansão dos Hastings, quase se deixou arrastar pelo medo. Não conseguia compreender, mas o certo era que encontrar-se com ele, lhe havia causado um sobressalto maior do que o que havia experimentado ao serem surpreendidos pelo vigia. Tinha certeza que poderia manobrar Quinby. Depois de todos aqueles meses frequentando a alta sociedade, a imagem que ela e Lady Ashton haviam se esforçado, tão cuidadosamente para estabelecer, havia 21


sido aceita. Ela era Louisa Bryce, a insignificante, antiquada e excessivamente aborrecida, parente provinciana de Lady Ashton, a quem esta havia tomado bondosamente como dama de companhia. Não havia razão nenhuma para que Quinby suspeitasse dela. Sem dúvida, a inesperada aparição de Anthony no corredor lhe havia causado imenso nervosismo. Nesta ocasião, certamente, que se tratava de algo mais que apenas coincidência. Desde o primeiro encontro com Anthony, intuitivamente sabia que o ar de tédio e o excessivo desinteresse que projetava eram falsos, motivo pelo qual se havia mostrado muito prudente com ele. Talvez, essa fosse a principal razão por ele tê-la fascinado desde o princípio. A descoberta de que se tratava de um ladrão de joias, não somente a tranquilizava, mas também lhe havia dado uma ideia brilhante. Pelo menos, era o que havia parecido até este momento. Mas, começava a duvidar. Talvez, a inspiração de alguns minutos antes, fosse um erro; pensando bem, poderia ter sido um ato imprudente de desespero. Se deu conta de que ele a observava com uma mistura jovial de irritação e de determinação. ― Se insiste ― disse ela, mantendo um tom amável, tentando ocultar a sua desilusão ― Nada de anotações. Com uma careta, ela voltou a guardar o lápis e a caderneta, no pequeno bolso, no interior da sua manga. Anthony não havia fez o menor esforço para acender as candeias no interior do veículo, conforme ela havia lhe pedido, portanto sua fisionomia permanecia oculta nas sombras. Porém, ela havia dançado com ele várias vezes na última semana, Seus olhos misteriosos e os ângulos fortes de seu rosto estavam impressos em todos os seus sentidos. Quando as pontas de seus dedos enluvados haviam descansado sobre seus ombros, apenas 22


durante as valsas, experimentou intensamente a força dos elegantes músculos escondidos pelo traje caríssimo, cortado sob medida. Dançar com Anthony era como dançar com um lobo bem vestido e de boas maneiras: uma experiência perigosa e excitante. Beijá-lo, havia sido mil vezes mais apaixonante e, sem dúvida, mil vezes mais arriscado. Nunca esqueceria esse abraço, surpreendente e excitante, no corredor da mansão dos Hastings, pensou. Anthony possuía uma aura de frio domínio de si mesmo, de homem cruel, que simultaneamente a atraía e lhe provocava um cauteloso respeito. Falava-se que Anthony havia vivido em terras estrangeiras durante muito tempo, até voltar para a Inglaterra, há quatro anos. A impressão que lhe dava era de que as experiências no estrangeiro haviam ensinado a Anthony a enxergar além das aparências.....o que o resto da sociedade não percebia. Era de conhecimento público que os Stalbridge eram uma família de excêntricos, que em sua grande maioria ignorava a sociedade. Não obstante, a fortuna dos Stalbrdge cresceu consideravelmente nos últimos anos, e pertenciam a uma família ilustre. Segundo as explicações de Lady Ashton, esses eram os fatores cruciais pelos quais a alta sociedade era impedida de ignorar os Stalbridge. Anthony e os outros membros de sua família eram incluídos em todas as listas de convidados, de forma frequente, mesmo que raramente comparecessem. Qualquer anfitrião que lograsse atrair um Stalbridge a um acontecimento social diria que havia dado um golpe de mestre. Sem dúvida, a nova Senhora Hastings sentia-se muito orgulhosa por ter atraído Anthony ao seu primeiro baile, depois de casada. Satisfeito, agora, que o lápis e a caderneta haviam desaparecido, Anthony se recostou no assento e contemplou Louisa com os olhos ligeiramente entreabertos. 23


― O que fazia no quarto de Hastings? A conversa não caminhava para onde ela desejava. Havia planejado tomar a iniciativa desde o princípio, porém ele havia ganho o controle e agora a interrogava. Não poderia fazer nada, salvo negar, descaradamente, as evidências. ― Eu abri a porta por engano ― contestou. ― Acredito que não irá se ofender, quando eu disser que não acredito em uma palavra dessa explicação inconsistente, e duvido muito que o homem que nos encontrou também acreditasse. ― Eu tinha preparado uma história perfeitamente coerente para contar para aquela criatura odiosa ― disse louisa, sem parar para refletir sobre suas palavras ― Se você não houvesse interferido, eu diria que estava procurando um quarto onde pudesse costurar o meu vestido. ― Eu creio que ele acharia essa história tão inverossímil quanto eu. ― Anthony esticou as pernas e cruzou os braços ― A propósito, o nome dessa criatura odiosa, como você o chama, é Quinby. É um capanga contratado. Hastings contatou dois, recentemente, e ambos andam armados. Ela parou de respirar. ― Deus meu! Você está dizendo que o Senhor Quinby estava armado? ― Estava com uma pistola no bolso do seu casaco. Imagino que levava uma navalha, também. Segundo a minha experiência, os homens que crescem nas ruas, costumam sentir-se seguros com elas. ― Compreendo. ― Ela respirou profundamente, absorvendo a explicação ― Você adquiriu essa experiência, nas suas viagens ao exterior? ― Acredito que você já fez muitas perguntas sobre mim. Fico honrado em saber que chamei a sua atenção até esse ponto. Ela sorriu e explicou: 24


― Sim, bem, como já disse, foi seu estranho interesse em mim que despertou a minha curiosidade. ― Vejo o porquê do meu interesse em você ser considerado estranho. Acredite em mim, quando lhe digo que você é realmente fascinante, Senhora Bryce. E, em resposta a sua pergunta, sim, eu passe muito tempo em lugares onde os homens andavam normalmente armados, e aprendi muitas coisas. ― Fez uma pausa para dar mais ênfase ― Além de ter conhecido homens como Quinby, portanto, sei como caminham. Louisa não sabia o que pensar sobre o comentário realmente fascinante, então decidiu por ignorá-lo. ― Bom, isso explica algumas coisas sobre o Sr. Quinby ― disse ela com ar eficiente – Perguntava-me por que ele se sentia no direito de nos falar de forma tão desagradável. Percebi que não era apenas um criado da casa. ― Não ― Anthony lhe deu razão ― Primeira lição, Sra. Bryce: a próxima vez que vir um homem vestido com um casaco e com um volume suspeito no bolso, fique atenta. ― É o que farei imediatamente ― afirmou Louisa ― Graças ao seu conselho, senhor. ― Mas, que droga! Estou perdendo o meu tempo, tentando assustála, não é verdade? ― Eu lhe asseguro que sou bem capaz de sentir medo, Sr. Stalbridge, embora, na minha opinião, não há nada como experimentar as coisas na própria carne. Sem dúvida, quanto mais coisas se aprende sobre crimes, melhor preparado se está para proteger-se. Tanto é que você me parece ser um perito, e eu lhe agradeceria muito por qualquer informação que puder me dar. ― Terei que pensar em meus honorários como seu tutor. 25


― Mas, que ideia excelente, senhor ― respondeu com renovado entusiasmo ― Estou disposta a pagar-lhe para que me instrua nesses assuntos. Me seria muito útil. Anthony desviou o olhar para o exterior e examinou a noite como se buscasse respostas em alguma fonte metafísica. ― Bem feito para mim. Acabei de cair em uma armadilha que não sei como sair. ― Como disse? ― Não tem importância, Sra. Bryce, eu falava comigo mesmo. Você me levou a isso. Ela bateu com o indicador na almofada. Uma vez refeita do susto de ter sido abordada por um homem armado, sua curiosidade e excitação se avivaram. Por que Elwin Hastings teria necessidade de contratar um par de capangas? Era uma pergunta sumamente intrigante. Outra pergunta seguiu rapidamente os passos da anterior. Olhou para Anthony. ―Como você sabe que Hastings havia contratado capangas e que estes andam armados? Anthony desviou sua atenção da cena urbana. ― Digamos que presto atenção aos assuntos de Hastings. ― A mim, não cabe a menor dúvida. Enfim, o que passou, passou. Devemos seguir adiante. Ele parecia estar se divertindo. ― Esse é todo o agradecimento que vou receber, depois de tê-la salvado? Ela lhe sorriu friamente.

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― Tentemos ser um pouco mais sinceros, senhor. Era muito conveniente para você, não dar-se a conhecer naquele momento preciso, não estou correta? ― O que quer dizer? ― Enquanto eu tinha uma desculpa excelente, nós dois sabemos que seria consideravelmente difícil para você explicar a sua presença no corredor. De fato, me parece que é você quem deveria me agradecer por resgatá-lo do que se seria uma situação extremamente incômoda. Ela se reclinou no assento, satisfeita por inverter os papéis, aplicando um pouco de lógica. ― Lembre-me depois, para mostrar-lhe a minha gratidão ― respondeu ― Mas, voltando ao assunto que nos interessa só me ocorrem duas razões para que alguém suba se esgueirando, durante um baile. A primeira e mais óbvia é para comparecer a um compromisso. Diga-me, você subiu para se encontrar com Hastings? Surpresa, Louisa só conseguiu encará-lo fixamente, durante alguns segundos. Em seguida, encolheu os ombros. ― Não. Não seria capaz de manter relações com um homem de natureza tão desprezível, como a dele. A resposta tranquilizou Anthony. ― O que você sabe sobre ele? ― Entre outras coisas, que é um homem recém casado que insulta a sua esposa, frequentando um bordel pela suas costas. ― Como conseguiu averiguar algo assim? ― perguntou Anthony, sinceramente intrigado. Por pouco, ela não começou a rir.

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― Nunca paro de me espantar com homens que se surpreendem ao descobrirem que nós, as mulheres, não somos tão ingênuas como eles imaginam. Temos nossas fontes de fofocas, senhor, assim como vocês. ― Disso, eu não duvido nem um instante. Diga-me, se não aprova a moral de Hastings, por que aceitou o convite para o baile desta noite? Louisa hesitou. Não se sentia preparada para confiar nele. O interrogatório agressivo dele conseguiu fazê-la ter sérias dúvidas sobre a conveniência de buscar a sua ajuda. ― Lady Ashton queria vir ― respondeu suavemente ― e me pediu que a acompanhasse. Anthony refletiu por um instante, e logo sacudiu a cabeça. ― Eu temo que essa versão dos fatos, não soe muito convincente. A fria acusação provocou a ira da jovem. ― É uma lástima, porque é a única versão que existe. ― Senão subiu ao piso superior com a intenção de se encontrar com Hastings, então devo pensar que entrou em seu quarto com o propósito de pegar alguma coisa. Ela continuou imóvel. ― Não vejo porque tenho que responder às suas perguntas, quando você não respondeu às minhas. ―Peço desculpas. Uma vez que me proponho a satisfazer a minha curiosidade, tendo a ficar um pouco obsessivo. ― Que coincidência! Eu também ― ela respondeu. ― O quê você procurava no dormitório de Hastings? ― insistiu ele em um tom de voz muito suave. Louisa sentiu a boca seca. Abandonar o baile com ele havia sido uma péssima ideia, agora compreendia perfeitamente.

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― Não tenho a menor ideia do que o senhor está falando ― respondeu. ― Nos poupará, a ambos, um precioso tempo e um monte de energia se você responder à pergunta. Ela levantou o queixo desafiadoramente. ― Com certeza, nãovai querer que eu lhe preste contas dos meus assuntos pessoais. Nós apenas somos conhecidos, senhor. ― A partir de amanhã, a sociedade pensará de outro jeito – disse ele. Suas palavras lhe causaram um calafrio que percorreu todo o seu corpo. Ele estava certo. Os comentários voavam muito rápido na boa sociedade. Enquanto, se poderia dizer que ela havia sido bastante imprudente, com Anthony era um caso seria muito diferente. Os cavalheiros solteiros, ricos e de excelente família sempre despertavam um grande interesse nos círculos mais elevados. Além do mais, não poderia esquecer a notoriedade que ainda o rodeava, devido ao suicídio de sua noiva. O dia seguinte, pensou, os rumores explodiriam. ― As fofocas não duram muito tempo. Cedo ou tarde, você dançara com outra dama e todo mundo vai se esquecer de mim. ― Parece muito ansiosa para se livrar de mim. Sinto-me muito consternado. ― Não sou mais uma menininha boba e inocente que acaba de sair do colégio. Nós dois sabemos que não sente nenhum interesse especial por mim. Esta semana me usou com algum propósito que somente você sabe. ― É isso que você pensa? ― Anthony perguntou. ― Sim, certamente ― disse ela, apagando sem piedade a pequena chama de esperança que havia saltado em algum cantinho do seu coração ― Peço que seja gentil e reconheça que tem sentido, senhor. Não existe outra razão que justifique sua atenção para comigo. Reconheço que me 29


perguntei o que estava acontecendo, mas acho que você respondeu essa questão esta noite. ― Verdade? E posso saber qual a resposta? ― Em virtude de suas atividades como cavalheiro-ladrão, obviamente tem motivos para querer comparecer a certos acontecimentos sociais. É igualmente óbvio que acaba sendo útil distrair as pessoas ao levantar suspeitas, enquanto se dedica a outros assuntos. Durante essa semana, a parenta humilde e provinciana de Lady Ashton foi muito conveniente aos seus propósitos, não é verdade? ― Você acha que eu a utilizei para os meus passatempos criminais? ― ele perguntou fascinado, apesar da sua frustração. Ela estendeu suas mãos enluvadas. ― Acredito que os mágicos chamam de “jogo de ilusão”. Se, as pessoas pensarem que o entediado Sr. Stalbridge está se distraindo seduzindo um viúva provinciana, não se perguntaram o que mais ele está fazendo. ― Ora! ― disse ele, com crescente admiração ― Certamente acredita que tenho o hábito de apropriar-me dos pertences de outras pessoas. ― Em virtude dos acontecimentos, é a única explicação que faz sentido ― ela pigarreou ― Devo entender que a sua carreira noturna explica como a fortuna dos Stalbridge revitalizou nos últimos anos? Lady Ashton comentou que há quatro anos, antes da sua volta à Inglaterra, se dizia que a família estava à beira da falência. ― Acredita que recuperei a economia de minha família me convertendo em um ladrão de joias? ― Deve admitir que é uma hipótese viável.

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― Baseada no fato de que esta semana eu dancei com você em várias ocasiões? Não, Sra. Bryce, não considerarei isso como uma suposição razoável. Suas provas são demasiado débeis ― disse Anthony. ― Oh, mas há muito mais coisas, além da questão dos bailes ― disse ela friamente. Ele não se moveu. ― Mais coisas? ― Em outra noite, o vi sair do salão de baile de Lady Hammond. Acreditei que devia ser um encontro secreto no jardim, no entanto, subiu para o andar de cima. ― Meu Deus! Você me seguiu? ― Só até o pé da escada ―assegurou ― Me pareceu que dadas as circunstâncias, eu tinha o direito de saber o que maquinava. ― As circunstâncias? Maldita seja, mulher! A única coisa que fiz foi dançar com você algumas vezes. ― Sim, e eu sabia que deveria haver alguma razão para isso ― repôs ― E, quanto a você, como você mesmo disse, existe um número limitado de explicações para justificar o porquê de uma pessoa subir, esgueirandose, pela escada de serviço, durante um evento social. Até esta noite, eu tinha certeza de que tinha o costume de reunir-se com sua amante dessa maneira, porém, me dei conta que o mais provável é que seja um ladrão. ― Você me deixa sem palavras, Sra. Bryce. Anthony esperava que fosse um cumprimento. Tentou fazer com que dissesse a verdade, porém não tinha nenhuma intenção de se confessar um ladrão. Não estava dando certo. Ela, tampouco, iria lhe confiar o seu segredo, mesmo que ele provocasse um efeito alarmante em sua pulsação.

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― Devido à sua profissão, Sr. Stalbridge, você não se encontra em posição de interrogar-me sobre as minhas atividades e muito menos criticálas. ― Senhora Bryce, esta conversa é de longe, a mais fscinante que tive em anos. Sem dúvida, serei franco. Não sei que intenção tinha esta noite, porém devo dizer-lhe que correu um grande risco, aventurando-se a ir ao dormitório de Elwin Hastings. É óbvio que não tinha ideia da magnitude do risco que correu. A sombria certeza de suas palavras deixou Louisa pensativa. ― Certamente, não corria mais perigo do que passar alguns momentos de vergonha ― disse. ― Se é isso o que pensa, então, devo dizer que conhece Hastings menos do que acredita. ― Claro que admito que você deva conhecê-lo melhor que eu ― fez uma pausa, depois da qual, dedicou-lhe um sorriso ― Quem sabe pudesse ser bastante amável e ser o meu informante. O rosto masculino endureceu. ― Preste atenção, Sra. Bryce. Se Hastings tiver algum motivo para suspeitar que você possa ser uma ameaça para ele, estará correndo um grave perigo. Ela deixou de sorrir. ― Você não pode estar insinuando que ele poderia ir tão longe, ao ponto de me assassinar, só porque soube que abri a porta do seu quarto, por engano. ― Sim, Sra. Bryce, é exatamente o que estou insinuando. Ela respirou profundamente. ― Mas, isso é ridículo, senhor. Sem dúvida nenhuma, não é um homem de princípios, porém é um cavalheiro. Com certeza, não cairia tão 32


baixo ao ponto de assassinar uma dama que não causou nenhum dana grave. Anthony deu um pulo inesperado para frente, provocando-lhe um grito abafado de surpresa. Segurou seus punhos com as duas mãos e se inclinou em direção a ela. ― Acredite em mim, Sra. Bryce. Se minhas conclusões sobre Elwin Hastings forem acertadas, ele já matou duas vezes. ― Meu Deus! Tem certeza, senhor? ― Ainda não tenho provas, mas, sim, tenho certeza. ― Suponho que tenho que confiar em suas palavras ― disse com desenvoltura― Não tenho nenhuma dúvida que você tem melhores conexões que eu, no mundo criminal, e, portanto, está mais bem informado que eu nesses assuntos. ― Será que estou sentindo uma pontinha de inveja? ― Bom, devo admitir que, de vez enquanto, me seria muito útil ter um conhecimento mais detalhado do submundo. ― A que se dedica exatamente, Sra. Bryce? ― perguntou com amabilidade. Outro calafrio percorreu suas costas. Sentia-se absolutamente consciente da força de seus dedos. Não lhe causava nenhum dano, porém a mantinham presa firmemente. Teve que fazer um grande esforço para manter a voz uniforme e tranquila. ― Não se preocupe, senhor, não irei competir com você ― assegurou ― Não tenho nenhum interesse nas joias dos Hastings. ― Então, que diabo esperava encontrar em seu quarto? Hesitou um momento antes de tomar uma decisão. Ele sabia que tinha estado no quarto e, no entanto, não havia delatado seu ato ao capanga. Estava claro que não era amigo de Elwin Hastings e, embora fosse um 33


cavalheiro, tinha confessado que era um ladrão profissional, uma espécie conhecida por sua falta de escrúpulos, e não tinha muita opção de escolha. Anthony era um cavalheiro raro, que não se parecia nem um pouco com outros homens. Era possível que quisesse ajudá-la, mesmo que fosse porque encontrara um desafio intrigante. ― Eu tinha certeza que encontraria provas que Hastings tem interesse financeiro em certo bordel ― replicou ― Um local chamado Phoenix House. Louisa prendeu o fôlego. Anthony continuou olhando para ela, sem falar por um longo momento. Soltou os seus pulsos, mas continuou inclinado para frente, com os antebraços repousando sobre as coxas. Dedos entrelaçadas entre os joelhos ligeiramente afastados, e olhou para ela como você olha para um espécime estranho no zoológico. ― Você procura por provas de que Hastings investiu dinheiro em um bordel? ― perguntou como se quisesse ter certeza que tinha escutado direito. ― Sim. ― respondeu, segurando com força seu puho. ― Se importa de me dizer o motivo? ― Sim, me importo. Não é assunto seu, senhor. Anthony concordou. ― Antes eu tinha conseguido esgueirar-me para a biblioteca e inspecionar as gavetas de sua mesa. Elas não haviam sido sequer trancadas. Eu não encontrei nada útil. O quarto foi o único outro lugar que pensei em procurar. ― Procurou em sua mesa de documentos relacionados com as suas contas? ― agora, Anthony estava mais admirado, ainda. Ele balançou a cabeça ― É mais estúpida, irresponsável e tola ... 34


― Eu não pedi a sua opinião ― contestou, tensa ― Em qualquer caso, não foi insensato. Ninguém estava por perto. Os criados estavam muito ocupados esta noite. ― É um milagre que os guardas não a tenham surpreendido. ― Sim, bem, até então eu não sabia da sua presença ― admitiu com arrependimento. ― Um grave descuido ― respondeu. ― Certo ― admitiu, esticando os ombros ― como estava dizendo, o dormitório era o único lugar que me ocorreu. ― Deduzo que não encontrou as provas que procurava. ― Desafortunadamente, não ― disse com um suspiro ― Procurei em todos os cantos dos armários, e debaixo da cama. Perto da janela, existe uma pequena escrivaninha. A gaveta não estava trancada, mas estava vazia. Eu não consigo pensar em qualquer outro lugar para olhar, e nem havia o menor sinal de um cofre. ― Porque está escondido embaixo do piso. ― Tem certeza? ― Sim. É um modelo da marca Apolo, com certeza. É o cofre mais seguro que existe no mercado. ― Estou muito impressionada, senhor, realmente você deve ser muito bom no seu trabalho. É claro que pesquisa minuciosamente seus ...., ah, objetivos. Nem me ocorreu procurar por um cofre no chão. ― Bem melhor que tenha sido assim. Se tivesse permanecido por mais tempo no dormitório, com certeza o capanga a teria descoberto lá dentro ― comentou. ― Mesmo que eu tivesse descoberto o cofre, não teria me servido de nada. Lamento dizer que embora eu seja capaz de abrir uma fechadura facilmente com um grampo, eu não tenho experiência em abrir cofres. 35


― Me surpreendo em ouvir que seus recursos sejam limitados, Sra. Bryce. Ela entrelaçou as mãos com força. ― Senhor, não é o momento para sacarmos. ― Se isso faz você se sentir melhor, que eu saiba ninguém conseguiu forçar um cofre Apollo. Em raras ocasiões, os ladrões usaram explosivos para abri-los, porque até agora, esse tem sido o único método que funcionou. ―-Então, como planejava abrir o cofre de Hastings, senhor? Porque é evidente que esta era sua intenção de hoje à noite. ― Desculpe, mas eu deveria ter dito que quase ninguém conseguiu arrombar a fechadura. Há apenas uma exceção. Isso foi um incentivo. ― Você. ― Sim. ― Nesse caso, e desde que nós chegamos tão longe, eu tenho uma proposta a fazer, senhor. ― Não prossiga, Sra. Bryce. ― Ele ergueu a palma da mão, em direção a ela ― Não diga mais nenhuma palavra. ― Só me perguntava se eu poderia contratar serviços profissionais ― disse ela rapidamente. Anthony não se mexeu. ― Quer me contratar para invadir o cofre de Hastings? ― Exatamente. Hoje à noite eu falhei na minha missão, mas, obviamente, você é um especialista nestes assuntos ― apontou para o elegante e bem feito traje de festa, além do distinto e confortável veículo em que viajavam ― Não há dúvida de que a fortuna lhe sorriu nos últimos anos. Eu sei que não precisa de clientes. No entanto, uma vez que planeja 36


abrir o cofre de Hastings, eu lhe agradeceria muitíssimo se pudesse dar uma olhadinha em algo, enquanto estivesse trabalhando. Estou interessada em quaisquer documentos relativos a um bordel. O recompensarei por fazê-lo. ― Sra. Bryce, eu não aceito trabalho neste tipo de assunto. ― Eu entendo

―, disse, dedicando-lhe o mais brilhante e

encantador dos sorrisos ― Mas, certamente, um homem de negócios tão inteligente como você não iria recusar a oferta de uma recompensa de uma pessoa grata. ― Anthony ficou em silêncio por um longo período de tempo. ― Bem, senhor? ― Você é uma mulher notável, Sra. Bryce. ― Eu poderia dizer o mesmo de você, senhor. Não consigo imaginar que haja um grande número de ladrões que se movem em círculos elevados. Esse comentário pareceu diverti-lo. ― Ficaria surpresa, madame. Estatisticamente falando, tenho certeza que podemos afirmar que as pessoas que se movem em círculos altos não são mais honestas do que aqueles que se movem em outras esferas. ― Nisso estamos de acordo, senhor ― concordou ―, embora a diferença entre os dois grupos seja que no grupo dos bem sucedidos existe maior probabilidade de seus membros se libertarem sem pagarem por seus crimes, do que aqueles das classes mais baixas. Ele arqueou a sobrancelha. ― Soa muito cínica, Sra. Bryce. ― Eu não tenho ilusões sobre os ricos e poderosos, senhor. Eu sei muito bem o dano que podem causar e como é fácil para eles escaparem da justiça. Mas não penso que este seja o momento para debater essas questões, certo? ― Não ―, disse ele ― Parece que temos problemas mais urgentes. 37


― Sem dúvida, você tem intenções de voltar para a mansão Hastings mais tarde para concluir seu trabalho. Tudo o que peço é que quando você abrir o cofre procure por documentos relacionados com a Phoenix House. Ficarei encantada em compensá-lo pela inconveniência. ― Supondo que eu não morra na tentativa. ― Sim, bem, mas eu tenho certeza que é um ladrão muito competente, senhor. Afinal de contas, sobreviveu até agora. ― Eu agradeço a sua fé em minhas habilidades profissionais. Louisa foi invadida pela esperança. ― Bem? Você aceita o trabalho? ― Por que não? ― respondeu, resignado ―. Eu não tenho nada mais interessante para fazer hoje à noite. ― Excelente. ― Ela dedicou-lhe outro sorriso brilhante ―. Eu vou esperar no carro. ― Não, não vai, minha senhora. Primeiro vou levá-la para casa. Amanhã vamos discutir o resultado dos meus esforços. ― Eu acho que deixou escapar um detalhe da nossa relação, senhor. Eu estou lhe pagando pelo trabalho desta noite. E, como sua cliente, devo insistir em estar por perto até que você tenha terminado o seu trabalho. ― Em outras palavras, não confia completamente em mim. ― Minhas desculpas, senhor, eu não quero ofendê-lo, porém nunca tive a chance de contratar um ladrão profissional, então preferiria lidar com esse plano como sendo um assunto de negócios ― hesitou ao lembrar-se de outra coisa ― A propósito, quanto vai cobrar por esse tipo de trabalho? Os olhos de Anthony se estreitaram perigosamente. -Tenha certeza de que vou estudar esta questão com muito cuidado.

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Capítulo 03

Uma questão de negócios. Como diabos eles chegaram nesse ponto? Ele estava prestes a arrombar o cofre de Elwin Hastings enquanto seu novo cúmplice, para ser exato, sua cliente, estava esperando por ele em um coche fechado, num beco próximo. Naquela noite, a sua vida já bem complicada por si só, deu algumas voltas, decididamente complicadas. Esta noite, pela segunda vez, Anthony estudou o corredor escuro que conduzia ao quarto de Hastings. O capanga estava desaparecido. Não parecia que houvesse alguém rondando por aí. Ele olhou para o nicho onde ele tinha estado oculto algumas horas antes. Estava vazio. Voltar a entrar na mansão havia sido muito simples. Usava um casaco longo e chapéu puxado sobre os olhos, que havia trazido para esse propósito. Louisa tinha observado de perto, claramente intrigada com a elegante transformação. ― Caso alguém me veja, de longe, é improvável que me reconheça, disse ele. ― Parece muito ameaçador com esse casaco e esse chapéu, senhor. É incrível como eles mudam sua aparência. Asseguro-lhe que poderia passar por um membro do submundo. ― A ideia é procurar assemelhar-me a um negociante respeitável. ― Oh, sinto muito. Ele escalou o muro do jardim, sem problemas, mas havia sido forçado a agachar-se atrás da sebe, quando o segundo guarda, Royce, fazia a patrulha de rotina do terreno. Guiando-se pela planta que tinha estudado naquela tarde, e que viu com os próprios olhos, algumas horas antes, encontrou sem nenhuma dificuldade a entrada de serviço. A escadaria que 39


leva ao andar de cima continuava desimpedida. Os criados aflitos estavam ocupados no térreo, atendendo nos bastidores as necessidades de uma casa cheia de convidados. Contente por ter o corredor apenas para ele abriu a porta do quarto de Hastings. Uma vez lá dentro, parou por um momento para ter uma ideia do ambiente à luz do luar. Levou mais de um ano estudando Hastings. Sabia muito sobre a sua presa. Levantou a ponta do tapete e encontrou o cofre exatamente onde eu deveria estar. Não precisava acender a luz para ver o que estava fazendo. Quando você arrombava um cofre Apollo, só era preciso recorrer ao toque, não à visão. Ele abriu o cofre rapidamente. Havia instruído um dos melhores artesãos em Birmingham o pequeno conjunto de ferramentas que tinha trazido com ele para fazer o serviço. As peças eram mais delicadas e sensíveis do que o bisturi de um cirurgião. O interior do Apollo era tão sombrio como uma caverna. Deslizou para dentro, e esvaziou seu conteúdo, espalhando tudo sobre o tapete iluminado por um raio de luar. Havia quatro sacos de veludo, que são utilizados para armazenar joias, alguns poucos documentos de negócios, cinco diários forrados de couro e uma pasta com três cartas. Folheou os diários, dos quais quatro não foram escritos por Hastings, nem por sua esposa, mas por outras pessoas. O quinto continha o registro dos pagamentos efetuados por indivíduos identificados exclusivamente pelas iniciais de seu nome. Os envelopes continham cartas assinadas por uma jovem mulher. Guardou os diários, as cartas e os documentos nos bolsos internos do seu casaco. Virando-se para os sacos de joias, abriu um por um. Os três primeiros continham uma variedade de pulseiras, anéis e colares de diamantes, pérolas e pedras preciosas coloridas. Todas as peças eram muito 40


modernas e, sem dúvida, haviam pertencido à primeira senhora Hastings. Ela havia sido muito admirada por sua propensão a estar sempre na moda. Pegou o quarto saco e o esvaziou na palma da sua mão. O luar iluminou um colar de esmeraldas e diamantes incrustados em ouro. O desenho era antigo e lhe parecia muito familiar. Uma sensação de selvagem alegria se apoderou dele. Tinha a esperança de encontrar algumas respostas nesta noite, mas não havia se permitido sonhar que a sorte lhe sorriria. Ele colocou o colar na bolsa, puxou as cordas que o fechavam, e o guardou em um bolso. Ele jogou os outros sacos no cofre, fechou a porta e trancou-a. Em seguida, voltou a colocar o tapete no lugar. Hastings não sabia quanto tempo para voltar para verificar o conteúdo de seu Apollo seguro, mas quando o fez, iria experimentar um choque certamente merecido. Nenhum ladrão comum teria deixado a maioria das joias na caixa. Quando Hastings estava observando os itens foram embora, ele saberia que alguém queria caçar. Espero começar a suar. Anthony foi até a porta e escutou atentamente. Uma das tábuas do piso do corredor rangeu. O primeiro rangido foi seguido por outro, desta vez mais perto. Alguém estava vindo pelo corredor até ao quarto. Provavelmente, um dos guardas. Será que abriria a porta do quarto do seu patrão ou este era um território proibido? Não havia nenhuma maneira de saber o quão escrupulosos seriam Quinby e Royce, mas, como Anthony conhecia o temperamento de Hastings, parecia improvável que autorizasse a qualquer pessoa rondar o seu retiro sagrado. Ouviu vozes no corredor. Um homem sussurrava alguma coisa em tom urgente, porém suave. Uma mulher respondia em voz baixa e igualmente ansiosa. 41


Era evidente que Hastings se dirigia ao seu dormitório, acompanhado de uma de suas convidadas, enquanto sua jovem esposa devotadamente atendia aos presentes, no piso inferior. Essa atitude confirmava o baixo conceito que Louisa tinha de seus caráter. Sem dúvida, a sensibilidade da nova Sra. Hastings não era o que mais preocupava o seu marido nesse instante. Precisava sair do dormitório. Havia duas alternativas, a janela e a porta que se comunicava com o dormitório da Sra. Hastings. Escolheu a segunda. Se pulasse sobre o parapeito, era muito possível que não encontrasse nenhuma janela aberta, para voltar a entrar na residência. Estava com a mão na maçaneta da porta do dormitório vizinho, quando ouviu que a principal se abria. Anthony se manteve imóvel, escutando a entrada do casal. ― Isso é muito arriscado, Lilly. ― Hoje à noite, Hastings e seus convidados beberam muito champanhe. Ninguém vai perceber que nós estivemos fora por algum tempo. De qualquer maneira, este não é mais arriscado do que qualquer um de nossos encontros, antes de ser forçada a este casamento horroroso. ― Mas, se descobrirem... ― Querido, eu o desejo demais... as últimas semanas têm sido um pesadelo. Me abrace. O farfalhar de pesadas saias e anáguas foi acrescido pelo som apaixonado dos gemidos. ― Oh, Deus! Lilly! Você não sabe o que isso tem sido para mim. Passei noites sem dormir pensando em você na cama de Hastings. Esse pensamento está me matando lentamente. ― Não se atormente, meu amor. Ele foi incapaz de consumar o nosso casamento na noite de núpcias e não veio ver-me desde então. 42


― Hastings é impotente? ― Ele diz que a culpa é minha. Que eu não entendo suas necessidades especiais. Eu acho que ele vai para outro lugar satisfazê-las, do qual sou muito grato por isso, acredite em mim. ― Eu também ― disse o homem. Anthony soltou o trinco, voltou sobre seus passos para a porta por onde tinha entrado. Deslizou pelo corredor envolto em sombras e desceu pelas escadas de serviço.

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Capítulo 04

Louisa não tinha consciência do seu estado de tensão enquanto esperava por Anthony, até a porta do coche se abrir abruptamente. Surpresa, quase gritou quando ele saltou para dentro do veículo às escuras. ― Não era a minha intenção assustá-la, Sra. Bryce ― levantou a escotilha ― Dirija-se para Arden Square, Ned. ― Sim, senhor. O veículo começou a se movimentar com uma ruído surdo. Anthony se recostou no assento em frente a ela. Louisa adivinhou de imediato que algo havia acontecido. Irradiava uma energia apaixonada e violenta. Sentia que compartilhava o carro com uma pantera, que acabava de sentir o odor de sua presa. ― O que aconteceu? ― perguntou em um tom mais ácido do que gostaria ― Eu estava preocupada. Você demorou. ― Vinte minutos, no máximo. A maior parte do tempo eu passei no jardim, esperando por uma oportunidade de entrar na casa. ― O tempo não passa tão depressa quando alguém espera em um carro fechado e escuro. ― Ela olhou para ele com olhos curiosos, tentando ler em seu rosto. ― Você está bem? Qual foi o problema? ― Obrigado por seu interesse. Estou bem, obrigado. O único problema, no final, não se mostrou grande coisa. ― Parece de muito bom humor para um homem que acaba de arriscar seu pescoço. Você gosta de seu trabalho, senhor? Anthony levou alguns minutos pensando e a seguir encolheu os ombros.

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― Parece que o exercício melhorou o meu estado de espírito. E você, minha senhora? Você acha emocionante invadir tranquilamente os quartos de outras pessoas? ― Não, em absoluto ― respondeu tensa, levantou o queixo e disse: ― E, não há necessidade de falar comigo como se eu tivesse o hábito de fazer esse tipo de coisa. ― Compreendo. Só visita os quartos de outras pessoas quando bem entende. Quando foi a primeira vez que invadiu um quarto privado? ― Ele perguntou. Um arrepio de aviso percorreu a sua espinha. "Você já disse o suficiente ― pensou ― Embora a tenha ajudado esta noite, o fato é que você não conhece esse homem. Não pode correr o risco de revelar seus segredos. " ― Não importa ― disse ― Diga-me o que você encontrou. Você já conseguiu abrir o cofre? ― Claro! ― acendeu uma das candeias, introduziu a mão por baixo do casaco volumoso e tirou um punhado de papéis ― É tudo o que estava dentro do cofre. Louisa olhava para ele atônita. ― Você trouxe todos os seus papéis? ― Sim. Não havia tempo para examinar todos e encontrar os papéis específicos que você queria, então eu trouxe todos. ― Jesus! ― O que esperava? Afinal de contas era um ladrão. ― Eu ... só queria saber se havia no cofre algum documento relativo ao bordel. Não era realmente a minha intenção ― parou no meio da frase ― Não importa. ― Tome ― disse, entregando os papéis ― Veja se você encontra alguma coisa nesta pilha. 45


Ela pegou os papéis cuidadosamente e os elevou até a luz. ― Eles se parecem com documentos de negócios, ― disse, enquanto os examinava ― A maioria relacionada a um novo plano de investimento. Não vejo nada relacionado a ... ― fez uma pausa ao reconhecer um endereço. A excitação acelerou seus batimentos cardíacos ― Ah! Aqui estão eles. Este menciona a propriedade ... a propriedade, situada no número 22 de Winslow Lane ― leu o documento rapidamente e, em seguida, olhou para cima ― Encontrou exatamente o documento que eu queria, senhor. De acordo com isto, Hastings recentemente investiu uma grande soma de dinheiro na Phoenix House. ― Eu sempre digo, não há nada como um cliente satisfeito ― Anthony pegou alguns livros pequenos e forrados de pele, de diferentes bolsos ― Posso contar com futuros pedidos? Ela ignorou a zombaria e olhou para os pequenos livros. ― O que você tem aí? ― Eu ainda não sei. Eu só peguei porque achei que a maioria deles não pertence nem a Hastings e nem a sua esposa. Ele entregou-lhe um exemplar, e abriu outro para examinar. ―É um diário pessoal ― disse Louisa. Parou ao reconhecer o nome escrito em uma das páginas. ― Meu Deus! Você tem razão, não foi escrito por Hastings. De acordo com o que leio, é o diário de Miss Sarah Brindle. Ela está para casar com o Senhor Mallenby, no final do mês. Como é possível que isso tenha ido parar no cofre de Hastings? ― Uma excelente pergunta. Anthony levantou o exemplar que estava examinando. ― Este diário pertence a uma jovem mulher chamada Julia Montrose.

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― Me apresentaram a ela. Recentemente ficou noiva de Richard Plumstead. Espera-se que seja um casamento espetacular. Plumstead herdará o título de seu pai. Louisa franziu a testa. ― Tudo isso é muito estranho. Por que Hastings estaria de posse desses diários? ― De imediato, só posso pensar em uma razão muito boa. Ela respirou fundo. ― Você acha que ele chantageava essa meninas? ― ela perguntou. ― Eu duvido que Julia e Sara disponham de dinheiro suficiente para pagar um chantagista. É provável que só recebam uma quarta parte do seu dote. Se Hastings pensa em extorquir alguém, escolheria outro membro da família. No caso de Julia, teria que ser a sua avó, Lady Penfield, que controla a fortuna da família ― Anthony fez uma pausa ― Está muito idosa e não goza de boa saúde. ― Lady Ashton disse que o controle da herança de Sara Brinkle estaria nas mãos de uma tia idosa. Anthony abriu o último dos pequenos diários. ― Suspeito que este é o caixa dos pagamentos das extorsões. ― Devemos devolver esses diários imediatamente às suas legítimas proprietárias – propôs Louisa. ― Estou de acordo, Porém, devemos trabalhar discretamente. ― Certamente que sim! Não podemos revelar nossas identidades ― parou ― Que faremos com os documentos? ― Ficarei com eles ― respondeu Anthony friamente. ― Mas, eles pertencem a Hastings. Uma coisa é pegarmos os objetos de uma chantagem, porém acredito que deveríamos voltar a depositar os documentos no cofre. 47


Anthony olhou para ela. Seus olhos tinham um brilho implacável na penumbra. ― Aquele desgraçado não só é um chantagista, mas um assassino de sangue frio. Eu não me sinto na obrigação de devolver nada. Um arrepio percorreu o corpo de Louisa. ― É a segunda vez que menciona sua crença de que ele é um assassino. Você tem provas? ― Eu não tinha nenhuma, até esta noite. Anthony puxou um saco de veludo verde de um bolso, abriu e o colocou de cabeça para baixo. Uma cascata de ouro e pedras preciosas foi derramada por entre os seus dedos. ― Meu Deus! ― murmurou ela ― Deve valer uma fortuna. ― Assim é. Como também é a prova de que Hastings é culpado de assassinato. ― Não compreendo. Você recolheu isto do cofre, esta noite? ― Sim. Ela ficou olhando fixamente para o punhado de pedras brilhantes, chocada apesar de tudo. ― Você é realmente um ladrão de joias. ― Este colar pertencia a uma mulher chamada Fiona Risby. Ela afastou bruscamente os olhos do colar e se deparou com o seu rosto sombrio. ― A sua noiva? A mulher que pulou no rio? ― Nunca acreditei que Fiona havia cometido suicídio. Encontrar esse colar no cofre de Hastings prova que eu estava certo. Hastings a matou. ― Tem certeza de que este é o seu colar? Ele voltou a depositar o colar na bolsa. 48


― Sim, é inconfundível, uma relíquia de família. Fiona usava na noite em que morreu. ― O que você pensa em fazer? Agora que pegou o colar do cofre de Hastings, não é mais prova contra ele porque o colar não está mais em seu poder ― fez uma pausa delicada ― Não sei se eu deveria mencionar isto, senhor, mas se a polícia descobrir que você tem o colar, poderia se tornar um suspeito. ― Eu não poderia deixá-lo no cofre. Há nunca o teriam encontrado. Hastings jamais autorizaria a polícia a revistar a sua casa. ― Eu entendo o que você diz, mas o que você vai fazer com ele? ― Eu não tenho certeza, porém ― admitiu ― quando eu for visitá-la amanhã, espero ter um plano. ― Você vai me visitar amanhã, em minha casa, na Praça Arden? ― perguntou, subitamente desconfiada. ― Claro. ― o sorriso de Anthony era perigosamente enigmático ― Ainda não cobrei os meus honorários pelo trabalho desta noite.

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Capítulo 05

Anthony abriu a porta e entrou na casa escura. Não havia ninguém esperando para recebê-lo. O pequeno número de empregados a seu serviço sabia que não teriam que esperá-lo acordados. Entrou na biblioteca e deixou cair o pesado casaco sobre as costas da cadeira, despiu a casaca, desatou o nó da gravata negra e afrouxou o colarinho da camisa. Colocou os objetos que havia apanhado do cofre em uma mesinha próxima à uma poltrona para leitura e se serviu de um pouco de conhaque. Depois, de dar um longo gole, se afundiu na poltrona, pegou alguns documentos e começou a ler. Vinte minutos depois, não tinha dúvidas do que estava olhando. Os documentos conformavam os rumores que havia escutado em seus clubes. Elwin Hastings estava planejando e organizando outro consórcio de investimento. Não havia nada de surpreendente nisso. Nos últimos anos, Hastings esteve envolvido numa série de aventuras financeiras. O que era notadamente incomum neste projeto foi a identidade de um participante. Ele bebeu o que restava do conhaque, levantou-se, e serviu-se de outra dose. Era tarde, mas ele não estava com pressa de ir para a cama. Sabia que, quando finalmente conciliasse o sono, sonharia com Fiona Risby. Não seria a mulher jovem, bonita e vibrante que tinha sido em vida, em vez disso, iria vê-la da maneira como estava quando foi retirada do rio, olhos mortos e acusadores. Ele puxou colar do saco de veludo e o estudou. No que lhe dizia respeito, uma das duas perguntas que havia feito durante o último ano e

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dois meses tinha sido respondida de forma sonora e enfática. Fiona não tinha tirado a sua vida. Havia sido assassinada por Hastings. Mas a segunda pergunta permanecia sem resposta. Necessitava saber por que Fiona havia sido assassinada. Além de tudo, tinha que descobrir se foi ele quem havia conduzido Fiona para uma situação perigosa que lhe custou a vida. Tomou mais um trago. Um plano começava a tomar forma em sua mente. Depois de um tempo, subiu as escadas e se deitou. Para sua surpresa não foi a imagem do corpo de Fiona que perturbou o seu sono; foi o rosto de Louisa Bryce que viu. Olhava-o através do véu invisível de seus óculos, alerta e misteriosa. Em seus sonhos, a perseguia por um labirinto interminável de corredores, sabendo que não poderia parar até que houvesse descoberto todos os seus segredos.

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Capítulo 06

O pesadelo começou como começava sempre.... Um ruído surdo que parecia vir de baixo dela. O ruído era proveniente da parte de trás da loja. Alguém havia forçado a fechadura nova, que foi instalada na semana passada. De repente, começa a sentir frio da cabeça aos pés, paralisada de medo. Seu coração bate acelerado. O pânico contrai o seu estômago, enquanto um suor frio encharca a sua camisola. Ela segura o cobertor como este fosse um escudo. As dobradiças rangem. A porta se abre. O monstro está dentro da loja. Está vindo por ela. Nos últimos meses tem vivido com um temor crescente. Esta noite os seus piores pesadelos se converteram em realidade. Precisa mover-se. Não pode ficar na cama como uma garotinha assustada, esperando que o diabo a encontre. O degrau mais baixo geme sob o peso de um pé com uma bota pesada. Não há nenhuma tentativa de dissimulação. Quer que saiba que está vindo por ela. Deve levantar-se da cama nesse momento, antes que seja tarde demais. Gritos não irão ajudar em nada. Não há vizinhos que possam ouvila. Tampouco tem certeza de que poderiam ajudá-la. Uma paralisia aterrorizante afetou sua voz, assim como o resto de seu corpo. Se esforçou em concentrar-se no plano desesperado que havia concebido dias antes. O ato de fixar a mente em algo que não seja o puro medo lhe dá forças.

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Recorrendo ao máximo de sua força de vontade, afasta os lençóis e pula fora da cama. O chão está muito frio. De alguma forma isso ajuda a acalmar os nervos. Escuta outro rangido. Agora, ele está no meio da escada. Não se apresse. Leve o tempo que for preciso. -Eu avisei, Joanna ― sua voz revela uma luxúria alarmante ― Você realmente pensou que poderia me desafiar? Você é apenas uma comerciante ingênua e medíocre. Alguém tão insignificante precisa saber o seu lugar no mundo ― a seguir, a voz se aviva, a raiva vem a superfície ― Você deveria estar agradecida por um cavalheiro, na minha posição, estar disposto a olhar para você duas vezes. Agradecida! Está me escutando, cadela estúpida? Você deveria me suplicar para que eu a violasse. O quarto não tem porta. Apenas uma cortina para bloquear o acesso do intruso. A cortina está aberta. Percebe que, através da janela, um raio de luz oblíqua, lançado pela lua banhada em névoa, se filtra. A figura maligna se recorta contra ele. Fecha as cortinas apressadamente, sumindo na densa obscuridade da habitação. Ela conhece bem esse espaço apertado, porém, o monstro não o conhecia. Com sorte, ele andará às cegas quando entrar na escuridão, dando-lhe a oportunidade de escapar pelas suas costas. Agora, está no salão, e se dirige ao dormitório, separado apenas por uma cortina. Pode ouvir o ruído surdo e suave de suas botas sobre o tapete fino. ― As mulheres como você necessitam aprender qual é o seu lugar. Eu vou ensiná-la o que acontece com as mulheres que não demonstram o devido respeito diante de seus superiores.

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Ela agarra o atiçador que havia deixado no chão, ao lado da cama. É um ferro longo e pesado. Segura com ambas as mãos e reza. Escuta, do outro lado da cortina um ruído leve. Pelos dois lados da pesada cortina filtra-se uma luz vacilante. O monstro havia acendido uma lâmpada. Disse adeus ao plano de cegá-lo momentaneamente com a escuridão da habitação. Seus nervos estavam a ponto de falharem. De repente, o punho do atiçador parece escorregar de seus dedos, e bate contra a parede ao lado da cortina. ― Chegou a sua hora, Joanna. Você já me fez esperar muito tempo. Agora, irá pagar pela sua insolência. A cortina se abre de um só golpe. A lâmpada ilumina o rosto da besta. Os belos traços da sua fisionomia estão distorcidos pela máscara do desejo demoníaco. A chama dançou perversamente na lâmina que empunhava em sua mão. Entrou no quarto e se dirigiu para a cama ... Louisa acordou de repente, sem fôlego e com medo. Sua camisola estava encharcada de suor. Será que gritou desta vez? Espero que não. Não desejava alarmar Emma novamente. Nos últimos meses, a frequência dos pesadelos foi significativamente diminuída. Tinha começado a pensar que os havia deixado para trás, para sempre. Como estava errada! Afastou os lençóis e começou a caminhar pela sala de um lado para outro, tentando consumir a energia antinatural que havia acelerado os seus batimentos cardíacos e que dificultava a sua respiração.

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Depois de um tempo conseguiu acalmar-se. Se aproximou da janela e olhou para fora, procurando a sombra da prostituta vestida de preto. Naquela noite não estava no parque. Possivelmente, tenha estado ali mais cedo. O mais provável era que a pobre criatura tinha cansado de tentar atrair clientes e teria voltado para onde dormia. Arden Square era um bairro calmo, extremamente respeitável. Não era um dos lugares aonde os homens viriam à procura de prostitutas. Há algumas noites atrás, havia prestado atenção na mulher de negro. A desconhecida, que se cobria com uma capa escura e um chapéu, com um véu do mesmo tom e que ocultava seus traços, era certamente uma viúva que havia sido obrigada a ganhar dinheiro nas ruas, após a morte do seu marido. Esse tipo de história era muito comum. Teria passado algum tempo em pé no abrigo das sombras profundas de uma árvore, evidentemente esperando a chegada de um carro com um senhor que procurasse os serviços de uma prostituta. É possível que tenha abandonado esta vizinhança e tenha ido para outra rua. Ou, talvez, a viúva tinha perdido a esperança e se jogado no rio como fizeram muitas outras mulheres desesperadas. O mundo era tão cruel para com as mulheres que estavam na prostituição, pensou Louisa. As senhoras que foram empurradas para a pobreza extrema por causa da morte de seus maridos tinham poucas alternativas. Por um lado, a sociedade as condenava, mas ao mesmo tempo, fazia com que fosse quase impossível acharem um trabalho respeitável. "Eu tive muita sorte ― pensou Louisa ― Se não fosse pela graça de Deus ... " Embargada pela tristeza e um profundo sentimento de indignação, se afastou da janela, foi até a escrivaninha e acendeu a lâmpada. Sabia que

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agora eu não conseguiria dormir. Poderia muito bem aproveitar a oportunidade para dar uma olhada nas notas que ele tinha tomado antes. Abriu o pequeno diário e começou a ler, mas depois de um tempo voltou a fechá-lo novamente. Não conseguia se concentrar. Por alguma razão, tudo em que conseguia pensar era como havia se sentido quando Anthony a tomou em seus braços, como lhe havia pressionado contra seu peito enquanto a beijava. Quando finalmente voltou para a cama, levou consigo essa lembrança e se agarrou a ela como um talismã contra o pesadelo.

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Capítulo 07

O dia seguinte amanheceu como uma fria manhã de sol. Louisa colocou uma camisa fina, calças e apenas uma anágua. Muitas pessoas teriam ficado horrorizadas, com a sua quantidade mínima de roupas, para não mencionar a falta de corselet (espartilho). As mulheres que seguiam a moda íntima utilizam roupas que poderiam pesar até seis quilos, sob os vestidos que pesavam inclusive, mais. Porém, Emma e ela eram firmes defensoras do movimento a favor de se vestirem de forma sensata, promovendo que a roupa íntima das mulheres não ultrapassassem três quilos. Quanto ao espartilho, o movimento havia os havia declarado, com conhecimento de causa, prejudiciais à saúde da mulher. O vestido azul marinho, que escolheu, também foi desenhado de acordo com os princípios do movimento, inspirados pelo senso comum. O corpete, ajustado de acordo com os ditames da moda, não usava cartilagens de baleias e era apenas um pouco ajustado. A armação era pequena e acolchoada apenas para dar a forma. As saias eram feitas com muito menos tecido do que o normalmente utilizado nos elegantes e elaborados vestidos com drapeados. A redução do tecido nas saias foi um fator determinante. Ao reduzir o peso do vestido, andar era muito mais fácil. As pregas volumosas de muitos vestidos elegantes, combinadas com as múltiplas anáguas que os sustentavam, tornava quase impossível às mulheres darem um revigorante passeio no parque. Só podiam dar pequenos e afetados passos. Se tentassem caminhar rapidamente, as pernas se enrolavam completamente no emaranhado das saias.

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Louisa pegou o pequeno diário que estava na mesa de cabeceira, saiu para o corredor e dirigiu-se para as escadas. Notou que a porta de Emma continuava fechada. Na cozinha, encontrou a governanta, a Sra. Galt, com o seu marido, Hugo, e sua sobrinha, Bess. Hugo, um homem musculoso de cerca de quarenta e tantos anos, cuidava do jardim e da estufa que Emma tanto adorava. Bess cuidava do resto. Os três bebiam chá quando Louisa entrou na sala. Rapidamente, todos se levantaram. ― Bom dia ― cumprimentou Louisa ― Só passei para tomar uma xícara de chá. ― Bom dia, senhora ― disse a Sra. Galt sorrindo ― Levantou-se cedo. Que tal uma torrada para acompanhar o chá? ― Seria perfeito. ― Vou levar, em um momento, para a biblioteca ― a Sra. Galt foi até o fogão e colocou a panela para ferver a água ― Vou acender o fogo na lareira, minha senhora. Bess fez uma reverência rápida e saiu correndo da cozinha. ― Obrigado ― disse Louisa. Despedindo-se com um sorriso do Sr. e da Sra. Galt, caminhou em direção à biblioteca. Não tinha ido muito longe quando ouviu atrás de si, que a Sra. Galt murmurava baixinho alguma coisa. ― Ora essa! Estou surpresa que já tenha levantado e esteja pronta a essa hora. Ontem à noite, chegou muito tarde. Com certeza, não deve ter dormido muito. ― Eu sempre digo que o sono não é importante ― a voz do Sr. Galt era um sussurro suave ― Mas, voltar para casa no carro de um cavalheiro,

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é algo surpreendente. É a primeira vez que acontece algo assim, desde que trabalhamos aqui. ― Cale a boca! ― interrompeu a Sra. Galt rapidamente ― Desde o início sabemos que esta é uma casa fora do comum. Não é nenhum segredo que Lady Ashton é uma excêntrica, mas o salário é excelente. Nunca diga ou faça qualquer coisa que nos faça perder nosso emprego. Louisa suspirou e seguiu caminhando pelo corredor. Não era fácil manter segredos quando se tinha criados. Teria que lembrar-se, a todo o momento, que havia outras pessoas na casa além de Emma e ela. Não que o Sr. Galt tinha dito qualquer coisa que não fosse verdade. Ontem à noite havia chegado em casa muito tarde e não podia negar que voltar ali, no número doze, em um coche diferente do que o veículo em que havia saído, era, sem dúvida nenhuma, a primeira vez que isso acontecia. Como também havia sido que um cavalheiro a acompanhasse até a porta. Na biblioteca encontrou um bom fogo crepitando na lareira. ― Pronto, minha senhora ― disse Bess, ao se levantar do chão ― Daqui a pouco estará quentinho e acolhedor. ― Obrigado ― disse Louisa. ― Aqui está seu chá, senhora ― disse a Sra. Galt da porta, antes de colocar a bandeja sobre a mesa ― Deixe descansar um pouco. ― Farei isso ― prometeu Louisa. Esta manhã precisava que o chá estivesse muito forte. Tinha muitas coisas em que pensar. Esperou ficar sozinha, antes de sentar-se em sua escrivaninha. Cruzando as mãos sobre o couro que protegia a mesa, olhou para a sala. As prateleiras estavam cheias de livros, incluindo uma grande variedade de romances de sucesso. Havia se encantado por eles no último ano, porque

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descreviam histórias de amores não correspondidos. Sabia que, dado ao seu passado secreto, um caso ilícito era a única coisa que poderia esperar. Cada novo romance aumentava a sua sensação de segurança. Era como se cada volume que adicionava à sua pequena biblioteca, fosse um tijolo na fortaleza construía ao seu redor. Infelizmente, a verdade é que nunca estaria completamente a salvo. Emma tinha feito todo o possível para sentir-se confortável, porém a pequena chama de esperança que brilhava dentro dela, negando-se a desaparecer completamente, estava ameaçada por um frio terror. Quase todas as manhãs quando acordava, sentia o mesmo pessimismo e, geralmente, era essa mesma sensação que experimentava todas as noites, antes de adormecer. Às vezes, essa emoção tinha um efeito depressivo em seu humor. Inclusive nos dias mais felizes, saber que um dia poderia ser descoberta e presa, acusada de ter cometido um assassinato, era algo que estava sempre presente, pairando sobre a sua cabeça como uma nuvem de mau agouro. Conhecer Emma tinha sido um golpe de sorte dos mais extraordinários. Porém, sabia muito bem que a nova vida que havia criado poderia ser destruída em um instante se, algum dia, descobrissem o seu segredo sombrio. Impôs para si mesma: "Não pense sobre o passado ou sobre o futuro e, acima de tudo, não pense em Anthony Stalbridge. Concentre-se em seu trabalho." Seu novo trabalho como correspondente secreta da gazeta Flying Intelligencer (El Confident) foi a pérola da sua vida. A distração para a melancolia e o medo, deu-lhe um profundo senso de motivação e propósito. Estava determinada a dedicar sua vida ao jornalismo.

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Abriu o livro de capa de couro que havia trazido do seu quarto. Em sua curta carreira como jornalista tinha aprendido o valor de tomar boas notas. Para andar mais rápido e pela preocupação que um dos criados ou algum curioso lesse, usava um código privado. No entanto, sempre tendo o cuidado de escrever bem os nomes próprios, caso contrário serviriam para nada. Pegou uma pena e começou a trabalhar, revisando e reescrevendo as notas breves e enigmáticas havia feito. Não parecia haver dúvida de que Hastings era um chantagista, uma atividade criminosa que fez dele um ser ainda mais vil do que imaginava. Infelizmente, não viu nenhuma forma de delatá-lo sem revelar as identidades de suas vítimas, o que não seria justo. Claro, tinha outras evidências ligando-o a Phoenix House, lembrou. Os papéis que Anthony havia encontrado no cofre de Hastings confirmava a participação como sócio do bordel. Apenas essa notícia seria sensacional o bastante para satisfazer o Sr. Spraggett, o editor do Flying Intelligencer. Spraggett se orgulhava por oferecer as notícias mais escabrosas e emocionantes para os seus leitores. O anúncio que um distinto cavalheiro da alta sociedade, estava envolvido em um negócio de prostituição iria vender muitas cópias. Porém, e se Anthony estivesse certo e Hastings fosse um assassino? Essa era uma notícia que abalaria os alicerces da alta sociedade, para não mencionar o resto do país. Seu pulso acelerou em pensar na possibilidade de entregar um criminoso à justiça.

Uma hora depois, a alguns passos familiares, rápidos e enérgicos ecoou na sala, seguido por uma breve, porém forte batida na porta da biblioteca. 61


― Entre, Emma ― disse Louisa, alto o suficiente. A porta se abriu e Emma, Lady Ashton, entrou com o passo enérgico na biblioteca. Ao invés de andar ou passear, Emma sempre dava passadas. Grande e imponente, vestida como uma estátua grega, era uma mulher que possuía uma visão única do mundo. Neste dia, havia escolhido um vestido marrom avermelhado. O cabelo prateado estava recolhido em coque firme. Aos sessenta e três anos, era, todavia, uma mulher formosa. E, formidável em mais de um sentido. Depois de perder seu marido quando ainda estava jovem, Emma desafiou todas as convenções e se dedicou a percorrer o mundo. Quando finalmente voltou à Inglaterra, sua riqueza unida à sua linhagem e seus contatos socais, lhe haviam permitido recuperar sua posição natural na sociedade. Fazia pouco mais de um ano que havia requisitado os serviços de uma agência que proporcionava damas de companhia e instrutoras. Emma planejava escrever suas memórias. Desejava contratar uma dama de bom caráter, bem educada e com uma “visão moderna” para ajudá-la em seu projeto. Havia entrevistado meia dúzia de mulheres de bom caráter e bem educadas que asseguravam ter uma visão moderna, antes que a agência, em um ato de absoluto desespero, lhe enviara a sua candidata mais nova. Louisa e Emma simpatizaram uma com a outra desde o primeiro encontro. ― Diremos que você é uma parente distante ― decidiu Emma, enquanto tomavam chá ― Dessa maneira, a tratarão com muito mais respeito, do que se souberem que a contratei para ser minha dama de companhia e secretária. Quando Emma descobriu que Louisa só cumpria dois dos três requisitos que havia estipulado à agência, estava mais que disposta a passar por cima da condição que faltava. 62


Louisa nunca esqueceria veredicto de Emma. Tivesse ocorrido ao acordar de um pesadelo particularmente terrível, que a tinha deixado instável e vulnerável. Quando Emma se ofereceu para confortá-la, Louisa não aguentou mais e começou a chorar e contou o que aconteceu na noite em que desferiu um golpe fatal na cabeça do senhor Gavin com o atiçador. A necessidade de confessar o seu terrível segredo para sua amiga tinha sido esmagadora. Até então, já conhecia Emma bem o suficiente para imaginar que sua benfeitora não chamaria a polícia. Foi confirmado que Emma defendia pontos de vista extremamente modernos. Acreditou na versão dos acontecimentos que Louisa tinha lhe dado. Não obstante, quem gostaria de viver sob o mesmo teto com uma assassina? Depois de confessar o seu segredo e pedir desculpas por tê-la enganado, Louisa estava preparada para perder seu emprego. Em vez de demiti-la, Emma deu um tapinha em seu ombro e disse: "Não se preocupe, querida. Em minha opinião, a importância de um bom caráter é excessivamente supervalorizada. " ― Bom dia, Louisa ― exclamou Emma, dirigindo-se à lareira para aquecer-se ― Você madrugou, tendo em conta o fato de ter chegado tarde em casa, esta noite. Nem se quer a ouvi chegar. Louisa deixou a pena. ― Eu não quis acordá-la. Emma se aproximou da mesa do escritório, seus olhos azuis brilhantes de curiosidade. ― Ok! Ok! Anthony Stalbridge! Quando o lacaio me comunicou a sua mensagem, quase caí de susto. ― Eu duvido muito. Não há nada que possa ter esse efeito sobre você, Emma.

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― De todos os cavalheiros com os quais poderia ter ido embora, esta noite, Stalbridge me parece, o mais enigmático de todos. Louisa ruborizou. ― Não é o que você pensa, Emma. O Sr. Stalbridge e eu coincidimos em circunstâncias fora do habitual. ― Sempre digo que são as melhores. ― Eu o encontrei me esperando no corredor de comunicação do dormitório de Hastings. Emma arregalou os olhos de assombro. ― Deus meu! ― Veio em meu auxílio, quando um dos vigias contratado por Hastings se dispunha a me interrogar. ― Hastings contratou vigias? ― Emma perguntou. ― Sim. ― Que estranho! ― Tem boas razões. Segundo o que parece, não apenas investiu em um bordel, como também vem chantageando famílias muito distintas. Emma a olhava atordoada. ― Não é possível! ― E, isso, não é o pior. O Sr. Stalbridge pensa que Hastings assassinou a sua noiva, Fiona Risby. Acredita que Hastings também acabou com a vida de sua esposa. Emma se sentou bruscamente e apertou com força os braços da poltrona. ― Conte-me tudo, querida ― disse ― Desde o princípio ― Louisa lhe fez um rápido resume dos fatos. Emma escutou a tudo atentamente e em seguida recostou-se na poltrona ― É assombroso, absolutamente assombroso. E, eu que pensei que você estava em um encontro. Me alegrei 64


por você....Admito que fiquei um pouco preocupada que o homem escolhido fosse Anthony Stalbridge. Mesmo assim, me pareceu um bom sinal de que você começava a sair de sua concha. ― Já lhe disse inúmeras vezes que não tenho nenhuma intenção de abandonar a minha concha, ao menos, no sentido a que você se refere. ― Bobagens, simplesmente você ainda não encontrou o homem adequado ― Emma franziu a testa ― Mas, deixemos isso por hora. O que você acha da suspeita de que Hastings seja um assassino? Louisa tamborilou seus dedos na mesa. ― Para ser sincera, eu não sei o que pensar. Não há dúvida de que Hastings tem interesses financeiros na Phoenix House e parece claro que é um chantagista, porém não tenho certeza de que possamos chegar à conclusão de que tenha assassinado Fiona Risby. ― Concordo com você. Tudo aponta que tenha sido um suicídio ― Emma pensou durante uns segundos ― Porém, temos o colar que Stalbrigde encontrou no cofre de Hastings. Você disse esmeraldas e diamantes, incrustadas em ouro? ― Sim. Me pareceu muito valioso. Não obstante, até esse momento, só tenho a palavras do Sr. Stalbridge de que pertencia a Fiona. Inclusive, se for verdade, já deixou de ser uma prova da culpabilidade de Hastings, agora que desapareceu do cofre. Emma deu um grunhido próprio de uma dama. ― Stalbridge tem razão em uma coisa. Deixá-lo no cofre não serviria de nada. Se Hastings é realmente culpado de assassinato, não é provável que autorize a polícia a revistar a sua casa. ― E, mesmo que o tivessem encontrado em sua casa, tenho certeza que Hastings teria uma explicação plausível. Poderia sempre dizer que o

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colar pertenceu a sua primeira esposa, que havia admirado o colar de Risby e encomendou uma cópia exata a um joalheiro. ― Mesmo que Victoria Hastings jamais tivesse copiado joias de outra mulher ― disse Emma disse secamente ― Ela era uma das que ditava a moda, não das que a seguiam. ― Eu me lembro de ter ouvido dizer que era admirada por seu estilo. ― Sim. Ela era uma mulher muito bonita. Louisa rapidamente abriu as páginas sob o título VH. Quando começou a investigar os negócios de Hastings, havia pedido à Emma um relatório sobre este e sua primeira esposa. Também entrevistou a empregada que trabalhou para a Victoria Hastings. Não havia muitas anotações sobre Victoria. Naquele momento, a primeira senhora Hastings não lhe pareceu importante, mas, evocando o passado, um par de frases ganhou um novo significado. Passou o dedo na página cheia de enigmáticos sinais e parou. ― Você me disse que ela era uma das poucas mulheres que conheceu que sabia nadar. ― Foi a única mulher além de mim, que sabia nadar ― disse Emma ― E, com uma habilidade que poucas mulheres conseguem aprender. ― Isso parece dar mais credibilidade à teoria do Sr. Stalbridge de que poderia ter sido assassinada. Por que uma mulher que sabe nadar, escolheria pular de uma ponte como uma forma de suicídio? ― Qualquer mulher, boa nadadora ou não, que se jogue, completamente vestida, dentro do rio é muito provável que se afogue ― disse Emma ― Uma senhora que siga os ditames da moda, arrasta mais de seis quilos de peso em seu vestuário. O peso total de suas saias e espartilho a empurrariam para o fundo, mesmo que estivesse acorrentada a uma rocha. Louisa estremeceu. 66


― Certo ― Voltou a consultar suas anotações ― Você falou que não a conhecia muito. ―Não...Talvez,

porque

não

houvesse

muita

intimidade.

Encontramos-nos em vários acontecimentos sociais, porém nossa amizade não passou disso. ― A empregada de Victoria me disse que Hastings tinha o costume de comentar os seus negócios com ela. É muito estranho que um marido faça algo assim. Devia respeitar a sua inteligência. Emma concordou. ― Sempre me pareceu uma mulher muito astuta. Posso perfeitamente imaginar que tivesse uma cabeça ótima para os negócios. Louisa fechou seu diário e se recostou em sua cadeira. ― Tem alguma coisa no Sr. Stalbridge que me preocupa. Emma arqueou as sobrancelhas. ― Fico feliz em ver que a sua intuição está funcionando muito bem. Diga-me, o que tanta a preocupa? Fora o fato de que ele saiba arrombar um cofre, por exemplo, ― fez uma pausa ― Suponho que tenha consciência que se trata de um talento muito peculiar para um cavalheiro. ― Admito que a sua habilidade desperta algumas perguntas, mas o que mais me preocupa é que parece estar obcecado com a ideia que Fiona Risby não tenha cometido suicídio. Ontem à noite tive a impressão que ele estaria disposto a ir até o inferno para provar que ela foi assassinada. Emma encolheu os ombros ligeiramente. ― Será que é porque ele quer limpar seu nome de suspeitas. Louisa parou de tamborilar com os dedos. ― O que ... você está falando? ― Você ainda não frequentava os círculos sociais no ano passado, quando Fiona morreu, portanto, não ouviu os rumores. 67


― Que tipo de rumores? ― Naquela época, havia rumores de que o Sr. Stalbridge estava prestes a terminar seu noivado com senhorita Risby. Algumas pessoas disseram que a ideia de enfrentar a humilhação de ser rechaçada foi o que levou a Sra. Risby se matar. Louisa estremeceu. ― Qualquer mulher que seja rejeitada por seu noivo, encontra-se, sem dúvida nenhuma, em uma situação horrível, no que diz respeito à boa sociedade. Mas, recorrer ao suicídio? ― Não seria a primeira vez ― disse Emma ― Uma mulher abandonada se torna em uma espécie de pária na alta sociedade. Algumas pessoas teriam esperado que se afastasse da vida social, como uma viúva no primeiro ano de luto. ― Pertencia a uma família rica? ― perguntou Louisa. Disse a si mesma que era a jornalista que havia nela que estava interessada na resposta. Não sentia curiosidade pessoal pela mulher que Anthony havia escolhido como sua noiva. ― Sim, claro ― disse Emma ― A fortuna dos Risby é bastante elevada. Claro, que o fato de Fiona ser uma herdeira teria feito a sua situação mais suportável. Teria outros pretendentes. Além disso, era linda, uma jovem realmente adorável. Tenho certeza de que seu pai teria encontrado outro cavalheiro que fosse um bom partido. No entanto, a experiência de ser rejeitada por Stalbridge teria causado grande sofrimento para ela e sua família. ― Eu entendo. Claro que Fiona Risby tinha sido rica, bonita e charmosa. Que outra coisa poderia ser? Distraída, Louisa pegou a pena e fez uma pequena marca em sua mesa. 68


― Foi considerado o casamento perfeito ― Emma continuou ― As duas famílias estavam felicíssimas. Os Risby e os Stalbridge eram amigos há anos. São proprietários de terras adjacentes no norte. ― Eu entendo ― repetiu Louisa. Percebeu que estava pressionando a pena com tanta força que a ponta estava deixando pequenas marcas no couro. Forçou-se a soltar o instrumento de escrita. ― Eu devo mencionar que outros rumores correram no ano passado ― prosseguiu Emma gravemente ― rumores mais graves que o rompimento do noivado. Surpresa, Louisa se endireitou sem tirar os olhos do rosto de Emma. ― Suponho que ninguém insinuou que o Sr. Stalbridge matou Fiona Risby. ― Lamento dizer que houve especulação nesse sentido ― disse Emma. ― O quê? Por que alguém faria isso? Que motivo poderia ter tido? Emma a olhou diretamente nos olhos e disse: ― Dizia-se que o Sr. Stalbridge havia pego Fiona nos braços de outro homem. Louisa sentiu um leve calafrio. ― Certamente você não vai acreditar que foi ele quem a matou. ― Minha querida, se eu aprendi alguma coisa durante minhas viagens, é que qualquer ser humano, independentemente de origem social ou grau de civilidade, pode cometer um assassinato em determinadas circunstâncias ― os olhos de Emma se encontraram com os de Louisa ― A única questão é: que circunstâncias motivaram cada indivíduo em particular. Louisa engoliu em seco. 69


― Não posso rebater essa conclusão. O rosto de Emma suavizou-se. ― As minhas desculpas. Eu não queria ... ― Não há nada a desculpar. Você está certa, Emma. No entanto, eu acho que é seguro dizer que o Sr. Stalbridge não matou Fiona Risby. ― O que a faz ter tanta certeza? ― perguntou Emma com curiosidade genuína. ― Sem dúvida nenhuma, se ele a tivesse assassinado, não estaria procurando o culpado. ―Faz mais de um ano que ele perdeu sua noiva ― Emma disse suavemente ― O Sr. Stalbridge está ... naturalmente no mercado em busca de uma noiva, mas a os velhos rumores certamente complicam a questão. Em circunstâncias normais, poderia procurar sua nova prometida entre as famílias mais ilustres da sociedade. Como eu expliquei, os Stalbridge vêm de uma linhagem ilustre, e agora que eles recuperaram a sua fortuna ocupam uma posição privilegiada na sociedade. No entanto ... Emma fez uma pausa, dando de ombros ligeiramente. Louisa experimentou um vazio no estômago. ― Eu entendo o que você quer dizer. Muitas das melhores famílias certamente hesitarão em se casar uma filha com um cavalheiro cujos rumores dizem que pode ter assassinado uma jovem mulher. ― Mesmo que não acreditem nesse boato, serão receosos em permitir que a sua filha se comprometa com um cavalheiro que rechaçou a sua primeira noiva. E se fizer isso de novo? Pais cautelosos não correriam o risco de expor sua filha a esse tipo de humilhação social. ― Em outras palavras, se ele é culpado de deixar Fiona, ou de matála ou não, tem bons motivos para querer parecer que ele matou alguém ― concluiu Louisa. 70


― Será preciso provas concludentes, mas se for bem sucedido, a sociedade vai aceitar a sua inocência. Será, então, livre para casar com qualquer uma das ricas herdeiras que os pais mais zelosos e entusiastas poriam na frente dele.

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Capítulo 08

Do outro lado da mesa, Elwin Hastings olhou para aquela que era sua esposa há dois meses. Ele sabia que era invejado por muitos homens. Vestida com um traje verde da última moda, e com o cabelo dourado em um elaborado penteado, que todas as manhãs exigia as atenções de uma cabeleireira, Lilly estava muito bonita. Fez tudo que podia para não pegar o pesado jarro de cristal que descansava sobre a mesa e jogá-lo em sua pequena cabeça estúpida. ― Da próxima vez, deverá me mostrar a lista de convidados, antes de ordenar a Crompton que envie os convites. Fui claro? ― Sim, claro ― Lilly apertou com força as mãos descansavam em seu colo. O ressentimento inflamando em seus olhos ― Mas, você me disse que Crompton sabia a quem teríamos que convidar para o baile. Você insistiu que seu secretário estava ciente de como deve-se fazer as coisas nas questões sociais e que eu devia deixar tudo em suas mãos. ― Vou falar com Crompton imediatamente e informá-lo que Anthony Stalbridge deverá ser excluído de todas as listas de futuros convidados ― disse Elwin. ― Eu não entendo por que tanto aborrecimento por causa da presença do Sr. Stalbridge, afinal ele vem de uma família ilustre, é sobrinho do Conde de Oakbrook. Além disso, há especulações de que poderia herdar o título dado ao velho conde que não voltou a casar-se e não tem outro herdeiro. ― Assim como todos os membros dessa família, Oakbrook é um verdadeiro excêntrico ― Elwin fez um esforço para controlar sua raiva ― Todo mundo sabe que, agora, tudo que importa para o velho conde é a sua 72


investigação arqueológica. Estou ciente da linhagem de Stalbridge, Lilly. Mais uma vez, repito, a partir de agora em diante, ele não é bem-vindo nesta casa. Lilly começou a chorar. ― Eu pensei que tudo tinha corrido muito bem ontem à noite ... As lágrimas eram mais do que ele poderia tolerar. Hastings ficou de pé. ― Isso é tudo Lilly. Ela se levantou do assento rapidamente com o rosto vermelho de raiva. ― Eu não entendo por que você está com o humor tão ruim, hoje. Será que o Sr. Stalbridge fez alguma coisa que incomodou você na noite passada? Ouvi dizer que ele havia saído mais cedo com a parenta provinciana de Lady Ashton. Esqueci seu nome. Ele rangeu os dentes. A noite a havia sido um fiasco, mas não tinha intenção de informar esse fato desagradável à essa garota estúpida. Então, disse: ―Minhas razões para não querer o Stalbridge nesta casa, não é assunto seu. ― Isso é o que você sempre responde a cada vez que pergunto o que está acontecendo. Está constantemente de mau humor desde o dia em que nos casamos. É como se você tivesse se tornado uma pessoa diferente. Quando pediu a minha mão ao meu avô, era um homem gentil e encantador. Agora, tudo que eu digo ou faço, você acha errado. Juro que não sei como lhe agradar. ― Deixe-me, Lilly. Eu tenho negócios a resolver. Lilly se virou e correu para a porta, sem ocultar a vontade de escapar.

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"O sentimento é mútuo", Elwin pensou, olhando a porta fechar-se atrás dela. Ela reunia tudo o que achava desejar em sua segunda esposa, jovem, bonita, e o mais importante, era uma herdeira. Tudo bem que seu avô tinha feito sua fortuna com o comércio, mas duas gerações mais tarde, eles podiam ignorar esse tipo de linhagem familiar, desde que houvesse dinheiro suficiente envolvido. Entretanto, a conversa banal de Lilly e sua obsessão pelas fofocas e as roupas estavam o deixando louco. E o que era pior, era uma inútil na cama. Ao contrário de Victoria, era incapaz de perceber as suas necessidades especiais. Sem dúvida, houve momentos em que Victoria se entregava menos, refletiu. Felizmente conhecia um estabelecimento em Winslow Lane onde entendiam e satisfaziam as suas necessidades particulares de maneira muito agradável. Ele teria gostado de se livrar de sua nova esposa, mas não podia se dar ao luxo de dispensá-la, ainda. No dia do casamento descobriu, para seu horror, que não havia obtido o controle de toda a herança de Lilly. Seu avô, a raposa astuta, tinha disposto o restante da fortuna da jovem de tal maneira que receberia apenas um valor anual. Para fins práticos, Elwin pensou com amargura, se via forçado a viver com um salário. Além do mais, se algo acontecesse com Lilly, os pagamentos anuais deixariam de serem pagos imediatamente. Era degradante. Uma humilhação. Um insulto absoluto. Isto era o que acontecia quando se permitia, por razões econômicas, o acesso à boa sociedade de homens como o avô de Lilly. Droga! Se não fosse pelo condenado dinheiro, nunca cogitaria em ter como futura esposa uma mulher com a origem da Lilly. Foi a segunda vez que ele se viu forçado a

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se casar com alguém muito abaixo de sua classe social. Primeiro Victoria e agora Lilly. E tudo por culpa do dinheiro. Era injusto que um homem de sua linhagem se visse forçado a descer tão baixo. Ele sentiu um ataque de ira se apoderava de seu ser. Imediatamente, se conscientizou que segurava um peso de papel de prata pesado. Ele o jogou contra a parede. O objeto colidiu contra as cortinas de veludo azul com um baque surdo e rolou no tapete. No ano anterior esteve em uma situação precária. As coisas tinham começado a ir mal, quase que imediatamente, depois da morte de Victoria. E, foi uma sorte para ele que a sociedade não exigisse dos homens os três anos de luto, que exigiam para as mulheres. Se esperava que os viúvos voltassem a casar o quanto antes. Embora não tivesse nenhum desejo de outra esposa, não pode deixar de compreender que um casamento economicamente sólido era sua única esperança de continuar tendo crédito. Nos meses seguintes ao desaparecimento de Victoria no rio, havia sofrido diversos reveses financeiros. A morte de Phillip Grantley, ocorrida duas semanas antes, havia sido um golpe tremendo. Entre outras razões, dependia de Grantley para cobrar o dinheiro das chantagens de maneira anônima e impossível de ser rastreada. As chantagens eram as únicas coisas de seus negócios que seguiam funcionando bem, depois do falecimento de Victoria. E, mais importante ainda, foi Grantley quem havia esquematizado um novo plano de investimentos que era a sua única esperança de libertarse de Lilly e de seu avô tacanho. O suicídio de Grantley o havia alarmado por diversas razões. O medo que uma das vítimas de chantagem houvesse descoberto a identidade do agente que recolhia as somas e desse início às ações legais havia crispado seriamente seus nervos. Victoria insistia que selecionassem vítimas ricas, 75


velhas e frágeis. Era difícil imaginar-se uma delas perseguindo Grantley, muito menos o matando, porém não se podia ignorar a possibilidade que tivesse sido dessa forma. E, se a mesma pessoa descobriu que ele, Hastings, era o cérebro do plano? Era esse o motivo que o empurrou a contratar os guarda costas. Felizmente, não havia mais indícios que estivesse em perigo. E mais, nos últimos dias começava a pensar que tinha reagido exageradamente. Talvez, suas suspeitas e medos fossem infundados. Talvez, Grantley realmente tivesse se suicidado. Não era o fim do mundo, porque o plano de investimentos estava completamente concluído e pronto para ser implementado. Havia, inclusive, pensado em despedir Quinby e Royce, porém o desastre da noite anterior havia modificado tudo. O medo voltava a se apoderar dele. Por mais que o desagradasse ter os guarda costas constantemente rondando, no mínimo, eram necessários para proporcionarlhe tranquilidade. Consolava-se com a ideia de que quando começasse a chegar os benefícios de sua nova aventura mercantil, ao menos seria capaz de desfazer-se de sua irritante consorte. Perguntava-se se o suicídio de sua segunda esposa despertaria muito assombro na alta sociedade. Desta vez, talvez um acidente fosse mais oportuno. Mas, por enquanto, teria que se ocupar da presente catástrofe. Segurou um dos tirantes de veludo que pendiam da parede atrás de sua mesa e puxou, com força, duas vezes. Quinby e Royce apareceram imediatamente. Primeiro, olhou para Quinby. Era evidente, desde o princípio, que era o mais inteligente dos vigias. Também era o mais perigoso e o mais impertinente. 76


―Repita outra vez o que aconteceu, ontem à noite, no corredor, diante do meu dormitório, Quinby. ―Já lhe dei um informe completo, Sr. Hastings ― disse Quinby, encolhendo um ombro, despreocupado ― Não tenho mais nada a acrescentar. Elwin aplacou outra onda de raiva. A atitude de Quinby o deixou exasperado.

Raramente

se

mostrava

abertamente

insolente

ou

desrespeitoso; embora, a falta de cortesia diante de seus superiores sempre fosse franca, a flor da pele. Obviamente, pertencia às classes baixas. Esforçava-se para ocultar a pronúncia das ruas, porém estava aí, em sua fala. O anel de ouro e ônix que usava no dedo, sem dúvida, era caro, o anel de um cavalheiro, porém o espertinho trabalhava para um chefão do crime. Como se atrevia a considerar-se um verdadeiro cavalheiro? Royce, por outro lado, era grandalhão e estúpido, mas ao menos mostrava o respeito adequado frente àqueles que haviam nascido nas classes mais altas. Se tivesse escolha, teria despedido Quinby nesse mesmo instante, pensou Elwin. Mas, esse era o verdadeiro problema: não tinha escolha. Precisava de proteção, e de acordo com Clement Corvus, Quinby era o melhor em seu trabalho, e Elwin acreditava nisso. Um olhar atento aos olhos de Quinby bastava para saber que era frio como aço. ―Repita a história outra vez – ordenou sem alterar-se. ―Eu fazia a minha ronda, como de costume – falou Quinby com voz de aborrecimento – inspecionando o interior da casa, enquanto Royce vigiava o jardim. Depois de examinar o último andar, desci pela escada de serviço, ao andar onde se encontram as acomodações do amo. No corredor havia um cavalheiro e uma dama, beijando-se. ―A Sra. Bryce e o Sr. Stalbridge – disse Elwin. 77


―Exato, embora eu não soubesse seus nomes até que falei com um dos lacaios. A mulher era sem dúvida Louisa Bryce, Elwin havia se assegurado. Asua identidade foi confirmada pelos criados que a viram sair com Stalbridge. A parenta provinciana e antiquada de Lady Ashton era inconfundível. Com seus óculos, os vestidos sem estilo e uma conversa aborrecida, era a típica jovem que passava despercebida em todos os acontecimentos sociais que comparecia. O verdadeiro mistério era o porquê de Salbridge ter mostrado interesse por ela. Elwin recostou-se em sua cadeira, pretendendo pensar. Essa era uma das ocasiões em que sentia muita falta das ideias perspicazes de Victoria. Sempre havia sido extremamente sagaz quando se tratava de compreender as motivações dos homens. ―Tem alguma ideia de quanto tempo Stalbridge possa ter estado no corredor, próximo das minhas acomodações? – perguntou. ―Não mais que alguns minutos – respondeu Quinby – Quando perguntei aos criados, dois mencionaram que o haviam visto no baile um pouco antes que eu o tivesse encontrado no corredor. ―Quanto tempo se leva para arrombar um cofre? Quinby fez um gesto com a mão e explicou: ―Depende da pericia do ladrão. A maioria dos ladrões é rápida. Muito rápida. ―Peço-lhe que me desculpe, senhor, mas seu cofre é um Apolo, que tem patente registrada. ―E...? – perguntou Elwin, obrigando-se a mostrar-se paciente. ―É impossível forçá-lo sem ajuda de explosivos – respondeu Royce – E, durante a noite, não aconteceu nada. Explosivos, eu quero dizer.

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―Maldito seja! Stalbridge não é um ladrão profissional de cofres – Elwin se levantou de sua cadeira e começou a andar pela sala – É um cavalheiro – Quinby sorriu debochadamente, mas se resguardou de fazer comentários. Elwin se irritou – O que é tão divertido para você, Quinby? ―É que me ocorreu que, embora pareça haver uma regra, não escrita, que diz que um homem de classe baixa, não pode aspirar ser um cavalheiro, não existe nenhuma lei que impeça que um cavalheiro não possa se converter e um membro da classe criminal. “Bastardo insolente”, pensou Elwin, porém negou-se a entrar em discussão sobre as sutilezas importância social com um homem proveniente das profundezas londrinas. ―Eu lhe digo – esclareceu em voz firme, Elwin – que Stalbridge não tem motivos para recorrer ao roubo de cofres ou de qualquer outro tipo. Sua família conseguiu reunir uma imensa fortuna nos últimos anos. E, onde, diabos, ia um cavalheiro aprender a arrombar cofres? ―Muito bem dito! – confirmou Quinby – Com certeza não é o que se ensina em Oxford ou Cambridge.

Elwin apertou os dentes. Não podia deixar que Quinby o distraísse. Precisava manter a atenção fixa no problema que tinha entre as mãos. Royce voltou a pigarrear. ―Perdoe-me que o interrompa, senhor. Elwin supirou. ―O que é, agora? ―O nome Stalbridge, senhor – disse Royce, inseguro – Tem alguma coisa a ver com o Sr. Marcus Stalbridge, o cavalheiro que desenhou e patenteou os cofres Apolo?

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Elwin foi sacudido como se um raio houvesse caído sobre ele. Deu a volta em sua escrivaninha, com o queixo caído. ―Como? – perguntou controlando-se – Marcus Stalbridge desenhou o meu cofre? Quinby franziu o entre olhos. ―De que droga você está falando Royce? Royce se moveu inquieto. ―Tenho um sobrinho que sabe um pouco sobre esse assunto de cofres. ―Você se refere ao Bert? – perguntou Quinby – E, a razão pela qual entende do assunto é que é um ladrão profissional de cofres. ―Mas, está aposentado – completou rapidamente Royce. ―Continue! – exigiu Elwin bruscamente. ―Sim, senhor – Royce oscilou, nervoso, sobre seus grandes pés – É que ouvi Bert falar sobre o assunto. Mais de uma vez me disse que, geralmente, os profissionais evitam os cofres Apolo porque a única maneira de se entrar neles é abrindo um orifício. Elwin agarrou com força as costas de uma cadeira de leitura. ―Aonde você quer chegar, Royce? ―Os explosivos fazem muito barulho e chamam atenção, que não é o que um ladrão de cofres está procurando, normalmente – explicou Royce, adotando um ar professoral – Sobretudo se o cofre se encontra em uma casa particular como esta, ocupada normalmente, por certo número de pessoas. ―Não me interessa saber como se abre um cofre – disseElwin, espçando as palavras com muito cuidado, como se falasse com um idiota – Fale-me mais coisas de Marcus Stalbridge. Royce inclinou a cabeça várias vezes, em sinal de deferência.

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―Sim, senhor. Veja, o caso é, senhor, que meu sobrinho e alguns de seus....companheiros admiram muito Marcus Stalbridge por ter a patente dos cofres Apolo. ―Maldito seja! – Elwin queria jogar alguma coisa contra a parede – Anthony Stalbridge cresceu na casa do homem que inventou o cofre forte mais seguro do mundo, que por casualidade é o cofre forte que eu tenho. Se existe alguém que saiba o segredo para se abrir um Apolo, com certeza é ele. ―Ou seu pai – assinalou Royce amavelmente. ―Ora essa! Marcus Stalbridge não esteve aqui, ontem à noite, quem esteve foi seu filho. ―E, a mulher, a Sra. Bryce? – perguntou Quinby. ―Não tem nenhuma importância – Elwin descartou com dando uma abanada com a mão – Alguém sem nenhuma importância, que Stalbridge deve ter utilizado para algum propósito. Com certeza, como disfarce para ocultar a verdadeira razão pela qual se encontrava nessa parte da casa, no caso de que o descobrissem saindo do dormitório. ―Não acho que seja oportuno tirar conclusões precipitadas – comentou Quinby. ―Por um acaso, não está sugerindo que a Sra. Bryce arrombou o cofre forte? – interrompeu bruscamente Elwin. Com outro de seus gestos enfadados, Quinby encolheu os ombros. ―É um erro subestimar as mulheres. ―Carece de qualquer credibilidade pensar que essa mulher insignificante é uma especialista em arrombar cofres fortes – disse Elwin – porém, alguém forçou meu cofre forte ontem à noite e, quem quer que tenha feito isso, sabia muito bem o que fazia. Não havia nada que indicasse que alguém tivesse entrado em meu dormitório. Se por um acaso, esta 81


manhã, eu não tivesse aberto o cofre, não saberia que certos objetos muito valiosos haviam desaparecido. Quinby se apoiou contra a quina da escrivaninha com a tranquilidade de um homem que sente como se estivesse em sua própria casa. ―Fique tranquilo Sr. Hastings. Solucionaremos este assunto. Elwin experimentou outro acesso de raiva. ―Como você se atreve falar-me com esse tom condescendentes, ladrãozinho de merda! Afaste-se agora mesmo da minha mesa. Estou farto da sua insolência. Quem você pensa que é? ―A barba de Quinby se arrepiou. Seu olhar se tornou muito, muito frio. Levantou-se lentamente da quina da mesa, desenroscando-se como uma cobra. Um ligeiro calafrio de terror sacudiu Elwin. Lembrou que Quinby e Royce recebiam ordens de Clement Corvus e que Corvus havia ordenado aos dois que o protegesse. Não obstante, o fato era que os dois ocupavam seus postos atuais na organização de Corvus precisamente, porque eram capazes de cometer atos de violência brutal. O rosto flácido de Royce adotou uma expressão, que sem dúvida, manifestava uma discreta curiosidade. ―Perdoe-me, senhor – disse – como bem disse, que é de conhecimento geral, o senhor Stalbridge é um cavalheiro muito rico. Por que, então, ele iria querer abrir o seu cofre forte? Afinal, não precisa dos seus valores. Essa era, precisamente, a questão, pensou Elwin. Deixou de segurar febrilmente, às costas da cadeira e se obrigou a se concentrar. Só havia uma coisa que o vinculava a Stalbridge: a morte de Fiona Risby. E esse maldito colar era a única joia que havia desaparecido. Uma coincidência? Que droga estaria acontecendo? 82


Após o aparecimento do seu cadáver no rio, murmurou-se, durante algum tempo, que Stalbridge não estava convencido de que houvesse sido um suicídio. Mas, embora suspeitasse que Fiona houvesse sido assassinada, que importância poderia ter isso para ele? Afinal de contas, se dizia que estava a ponto de cancelar seu compromisso. Inclusive, havia rumores que havia encontrada sua noiva na cama com outro homem. Que interesse teria em vingá-la? Por que teria esperado tanto tempo para agir? E, se Stalbridge fosse o ladrão, por que levaria também os diários, que eram objetos de chantagem e os documentos de negócios? Droga! Tudo era tão desconcertante....Se sentia terrivelmente confuso e muito, muito desconfortável. Algo tinha saído muito errado. Angustiado, se aproximou da janela e apreciou o jardim. Desejava discutir o problema com alguém em quem pudesse confiar e, a princípio, não tinha intenção de desabafar com Quinby e Royce. Naquele momento, percebia que se encontrava em uma situação muito arriscada com o seu chefe. A última coisa que desejava era cometer um erro do qual Clement Corvus pudesse se aproveitar. Algum tempo atrás, teria procurado o conselho de Victoria. Ela tinha uma mente extremamente arguta, quando se tratava de juntar as peças desse tipo de quebra-cabeça, mas Victoria não estava ali, nem tampouco Grantley, a outra pessoa que poderia consultar. Não havia mais ninguém em quem pudesse confiar. Ele hesitou. Sempre recaía em Thurlow, pensou. Victoria o tinha escolhido como um sedutor por excelência para envolver certo número de moças e depois chantageá-las. Thurlow tinha muitos talentos. Segundo Victoria, era um dos mais belos homens de Londres. Sem dúvida nenhuma, as jovens inocentes que ele tinha seduzido pensavam da mesma forma.

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Thurlow, no entanto, era um ávido jogador. Isso, é claro, era o que o tornava tão útil. Regularmente precisava de dinheiro para pagar suas dívidas. Mas, Victoria nunca havia confiado inteiramente nele: "Um jogador só se mantém leal até a próxima partida de cartas", dizia ela. Foi assaltado por outro terrível pensamento. Thurlow sabia da existência de Grantley. Maldito seja! Quem sabe não tenha sido Thurlow que havia assassinado Grantley? Essa horrível possibilidade desencadeou outro sobressalto de medo. Será que Thurlow decidiu apropriar-se do negócio das chantagens? Talvez ele tivesse começado a se livrar do intermediário, Grantley, e, em seguida, havia se apoderado dos itens que estavam no cofre, artigos que o próprio Thurlow havia roubado das jovens. Parecia altamente improvável que Thurlow soubesse como abrir um cofre, mas talvez ... não fosse totalmente impossível. De qualquer forma, isso não explicava o papel de Stalbridge no assunto. Elwin começou a se sentir como se estivesse afundando em areia movediça. Tudo era tão complicado e problemático ... Virou-se para abordar Quinby e Royce. ―Este é o plano. Primeiro, os encarregarei de que Stalbridge não volte a aproximar-se de mim ou desta casa. Fui bem claro? ―Sim, senhor ― repondeu Royce rapidamente. Quinby encolheu os ombros. Elwin vacilou. Ele queria desesperadamente pedir aos guardas que matassem Thurlow e Stalbridge também, para sentir-se seguro, mas não era possível; eles eram homens de Corvus. Era pouco provável que o patriarca do crime aceitasse que se empregassem dois membros de sua organização para matar dois cavalheiros. Não que Corvus tivesse quaisquer escrúpulos, porém assassinar dois homens respeitáveis, um deles membro da alta sociedade, seria um negócio 84


perigoso para um homem da sua posição. Esse tipo de violência atrairia a atenção da Scotland Yard. Corvus não tinha motivos para correr semelhante risco. ―Segundo: - Elwin disse ― Eu quero contratar alguém para vigiar um homem chamado Thurlow, que vive em Halsey Street. Presumo que qualquer um de vocês conhece o tipo de pessoa que se pode contratar para este trabalho. Quinby encolheu os ombros novamente. Royce tossiu. ―Há um homem que chamado de Ligeirinho, que estaria interessado nesse trabalho.

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Capítulo 09

Pouco depois das duas da tarde, a campainha da porta soou com precisão e autoridade absolutas. Alguém chamava na porta, esperando e exigindo ser admitido. Louisa sentiu que seu coração acelerava. Em vão, tentou conter seu nervosismo e o calafrio de excitação que percorriam seu corpo. “Concentre-se no assunto que tem em suas mãos. Não permita que nada a distraia.” Sra. Galt passou apressadamente em frente à porta aberta da biblioteca, enxugando as mãos no avental. Emma apareceu na porta. Ele usava um velho vestido que usava para trabalhar na estufa. A expectativa iluminava os seus olhos. ―Eu suponho que deve ser o seu Senhor Stalbridge. ―Não é o meu Senhor Stalbridge. - Louisa deixou a caneta com muita parcimonia, tentando parecer fria e serena. ― Mas sim, eu acho que deve ser ele. Ele disse que viria esta tarde para receber os seus honorários. Emma mostrou sua satisfação com uma respiração feminina e delicada. ―Como se Stalbridge precisasse do seu dinheiro. Eu duvido muito que ele tenha vindo por esse motivo. A porta da rua foi aberta, e uma voz profunda e masculina ecoou no vestíbulo. Louisa sentiu um ligeiro calafrio na nuca que a deixou arrepiada. "Acalme-se. Esta é uma visita de negócios, não um caso amoroso. " Um momento depois, apareceu a Sra. Galt, com o ar de surpresa adequado e sem a mínima curiosidade.

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―Está aqui, o Sr. Stalbridge, Sra. Bryce ― anunciou ― Ele diz que tem um compromisso com você. Sra. Galt tinha motivos de sobra para estar curiosa, pensou Louisa. Até então, o único cavalheiro que visitava regularmente o número doze da praça Arden era o Sr. Rossmarten, um admirador de Emma, que tinha sessenta e cinco anos, o qual havia conhecido na Sociedade Botânica. Ambos partilhavam a paixão pelas orquídeas. Ciente passado cheio de aventuras de Emma, Louisa tinha certeza de que o casal compartilhava também um outro tipo de paixão. Discretamente, é claro. ―Por favor, faça-o entrar, Sra. Galt ― disse Louisa, fazendo um esforço para manter a compostura ― E, em seguida, traga-nos uma bandeja de chá, por favor. ―Sim, senhora. Sra. Galt reapareceu na porta da biblioteca. ―Entre... ― O Sr. Stalbridge. Algo dentro de Louisa modificou-se ao ver Anthony. Até então, só o havia visto iluminado pelas luzes brilhantes dos salões de baile ou envolto nas sombras do interior de seu coche. Parte dela se perguntava se os sentimentos perturbadores que tinha experimentado em sua presença iriam desaparecer na luz do dia. Mas, Anthony estava tão elegante e tão excitantemente perigoso em seu bem cortado e caro casaco de lã cinza escuro, combinando com a calça, assim como em seu traje formal branco e preto. Ele usava uma elegante gravata com o laço frouxo, e uma camisa com colarinho engomado de acordo com a última moda. O cabelo escuro estava penteado para trás, deixando sua testa maior. Gostou do fato de que ele estivesse bem barbeado. Os bigodes estavam na moda entre os cavaleiros, porém ele não gostava de usá-lo. 87


Anthony inclinou a cabeça com graça viril. ―Senhoras ― disse gentilmente. Sra. Galt desapareceu em direção à cozinha. Houve um breve silêncio. Anthony aguardou, com ar divertido. Louisa finalmente percebeu que Emma lhe fez um leve e necessário sinal, com a mão. E, ela se deu conta que permanecia sentada olhando para Anthony. Constrangida, recuperou a compostura e fez as apresentações. ―Bom dia, Sr. Stalbridge ― disse rapidamente ― Por favor, entre. Eu acho que você já conhece Lady Ashton. ―Claro que sim ― Anthony se adiantou e tomando a mão de Emma fez uma mesura ― É um prazer vê-lo novamente, milady. ―Obrigada. Anthony percorreu a curta distância que o separava da cadeira que estava livre, e sentou-se nela. Olhou Louisa, sobrancelhas ligeiramente arqueadas como em um sinal mudo de interrogação. ―Não se preocupe, senhor ― disse ela ― Já expliquei as circunstâncias incomuns de nosso acordo para Emma. Você pode falar livremente na frente dela. Anthony olhou para Emma com profundo interesse. ―Você está participando da trama para mostrar que Hastings tem um interesse financeiro em um bordel? Emma sorriu e disse: ―Não. O plano é de Louisa, mas tenho o prazer de ajudá-la em tudo que eu puder. ―Aceitando convites para as casas de pessoas que interessam a ele revistá-las? Emma ficou impressionada.

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―Você é muito perspicaz, senhor. Essa é, na verdade, uma das maneiras em que tento ajudá-la. Louisa tossiu delicadamente. ―A que conclusões você chegou depois de analisar as evidências de chantagem, Sr. Stalbridge? ―Eu li os diários e as cartas. Parece que são cinco pessoas sendo extorquidas, e como eu suspeitava na noite passada, não as jovens damas que pagam o dinheiro da chantagem. Em todos os casos são os idosos, parentes ricos da vítima, e que não parecem gozar de boa saúde. ―Por que pagar a chantagem? ―Para proteger um membro da sua família, uma jovem mulher, cuja reputação foi comprometida. ―Que terrível! ― Louisa fez uma pausa, franzindo a testa ― E, foi Hastings quem comprometeu as jovens damas? Suponho, objetivamente falando, que não é um homem atraente, além do mais, eu penso que é um pouco velho para atrair as mulheres mais jovens. ―Este é um dos aspectos interessantes da situação ― disse Anthony ― Todas as mulheres foram colocadas em uma posição comprometedora por causa de um homem que elas descrevem, em cartas e diários, como "um deus grego de cabelos de ouro", "o homem mais bonito que existe na face da terra" e "um cavaleiro de armadura deslumbrante." E todas concordam em dizer que tem vinte anos. ―Hastings tem o cabelo escuro e grisalho, e deve estar em torno dos quarenta ― disse Emma. ―Portanto, há outro homem envolvido na chantagem ― completou Louisa chocada. ―Sim ― confirmou Anthony ― Vamos organizar tudo para que esses itens sejam devolvidos imediatamente aos seus proprietários de forma 89


anônima e para garantir às vítimas que a chantagem chegou ao fim. No entanto, esta via de investigação foi encerrada para nós. ―Claro ― disse Louisa ― Não podemos arriscar-nos a revelar a identidade das vítimas. ―Não ― Anthony a olhou em seus olhos ― Nem é provável que eles queiram nos ajudar de maneira nenhuma. Sra. Bryce, eu acho que é hora de discutirmos o pagamento pelos serviços prestados na noite passada. Louisa ficou em pé. ―Sim, claro. Quanto você acha que vale os seus serviços? ―Eu não quero seu dinheiro. O que eu quero é a informação. Ela ficou tensa. ―O quê? ―Eu vim aqui hoje para colocar as cartas na mesa ― disse Anthony ― No caso de ontem à noite, espero que você esteja preparada para fazer o mesmo por mim. ―O que você quer dizer? ―Eu expliquei que, graças ao colar que encontrei no cofre, conclui, sem qualquer sombra de dúvida, que Elwin Hastings havia assassinado Fiona Risby. ―Sim, isso foi o que me disse ―ela confirmou gentilmente. Ele sorriu friamente. ―Vejo que você não tem certeza. ―Desculpe-me a interrupção ― Emma disse sem se alterar ― mas, me ocorreu sugerir a Louisa que, talvez você tivesse alguma razão para culpar Elwin Hastings. E, isso, não é mesmo que provar que ele matou Fiona. Anthony concordou, compreendendo instantaneamente.

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―Sim, é claro. Deve estar se perguntando se eu me preocupo que os antigos boatos irão impedir-me de encontrar uma esposa em certos círculos. Chegou à conclusão de que, talvez, eu esteja tentando envolver outra pessoa no crime para limpar meu nome. Louisa estremeceu ao ouvir a frase "encontrar uma esposa." Emma ergueu as sobrancelhas. ―Deve admitir que é uma possibilidade que não pode ser completamente descartada. Anthony olhou para ela diretamente nos olhos. ―Neste momento só posso oferecer a minha palavra de que este não é o caso. Na noite passada eu encontrei a prova que eu precisava para me convencer do que eu acredito há algum tempo. ―O Colar ― disse Louisa. ―Sim ― confirmou, voltando-se para ela ― No que a mim diz respeito é a prova que eu precisava para me convencer de que Fiona foi morta por Elwin Hastings, mas que me leva a outra pergunta que tenho intenção de responder. ―E, qual é? ― Louisa quis saber. ―Tenho certeza de que ele a matou, mas não tenho ideia do motivo. Não havia nenhuma relação entre Fiona Risby e Elwin Hastings, exceto que os dois estiveram presentes ao mesmo baile na noite em que ela desapareceu. ―Deve ter sido um baile muito concorrido – ressaltou ― Por que reduziu todos os suspeitos a Hastings? ―Houve vários detalhes do evento que provocaram a minha curiosidade a respeito dele. O primeiro foi a morte de sua esposa, alguns dias depois. Para dizer o mínimo, penso que o suicídio de duas mulheres da

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alta

classe

foi

extremamente

casual,

ocorreu

em circunstâncias

semelhantes, no curto prazo de apenas uma semana. Louisa tamborilou com a pena no couro. ―É possível que uma tenha inspirado a outra. Uma mulher esmagada pela melancolia, que leia, por casualidade, sobre a morte de outra, pode optar por segui-la. Emma fez uma careta. ―Eu admito que não a conhecia muito bem, mas devo dizer que fiquei muito surpresa quando soube da morte de Victoria no ano passado. Naquela época, eu me lembro de ter pensado que não parecia ser o tipo de pessoa que tiraria sua vida. ―Essa era a mesma impressão que eu tinha dela ― disse Anthony ― Estou, inclusive, ainda mais convencido de que Fiona nunca teria feito uma coisa assim. A porta se abriu novamente. Sra. Galt depositou a bandeja de chá sobre a mesa situada na frente de Emma. ―Eu vou servir, Sra. Galt ― disse Emma ― Obrigado. ―Sim, senhora. Ninguém falou até que a Sra. Galt saiu e a porta se fechou novamente. Louisa olhou para Anthony. ―Disse que a coincidência dos dois suicídios chamou sua atenção. Ele afundou no assento, e a observou por cima dos seus dedos cruzados. ―Na verdade, houve três suicídios no mesmo mês. O terceiro foi o de Joanna Barclay, a mulher que assassinou Lord Gavin. É possível que se lembre do seu nome. O assassinato causou um alvoroço na imprensa.

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O sangue de Louisa gelou em suas veias. Uma intensa chicotada de medo a sacudiu por dentro. Teve o cuidado de não olhar para Emma. ―Sim ― conseguiu dizer ― Acho que ouvi alguma coisa sobre esse suicídio. Era tudo que poderia fazer para seguir respirando normalmente. O velho medo voltou a sair das sombras profundas, nas quais sempre esteve à espreita. Ele não poderia saber quem ela era. No que se referia ao mundo, Joanna Barclay tinha morrido. A sociedade há muito havia esquecido a comoção causada pela morte de Lord Gavin. Porém, Lord Gavin tinha parentes. Ele tinha sido casado, e deixou uma viúva. Claro, Lady Gavin não frequentava os círculos sociais, porque ele ainda estava de luto. No entanto, ela estava em algum lugar. Talvez Anthony conhecesse. Poderia ter concluído que havia alguma conexão entre as mortes de Fiona e Victoria. Talvez, ele considerasse necessário investigar o suicídio de Joanna Barclay ... ―Sra. Bryce? Surpreendeu-se ao ouvir a voz de Anthony. Ele a olhova com uma expressão enigmática e perturbadora. ―Sinto muito – desculpou-se rapidamente ― Eu estava pensando sobre o que acabou de dizer, senhor. Emma olhou para ela com preocupação. ―Está aborrecida, querida? ―Nem um pouco ― Louisa esforçou-se para manter os seus receios caóticos na sombra. "Controle-se, você está deixando voar a sua imaginação, você não deve pensar nos problemas até que se apresentem" ―Por favor, pode prosseguir com a sua explicação, senhor ― disse friamente ― O que você sabe o terceiro suicídio?

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Ele continuou olhando-a por um momento. Ela não gostou da expressão calculista do seu olhar. Finalmente, inclinou a cabeça ligeiramente, como aceitando as suas explicações. ―Fiz algumas averiguações sobre o suicídio da Senhorita Barclay ― disse ― mas, fui forçado a admitir que não havia nenhuma ligação com as mortes de Fiona e Victoria Hastings. A Senhorita Barclay era livreira, não tinha nada a ver com a alta sociedade e não havia nada que indicasse que Hastings poderia conhecê-la. Sua especialidade eram os livros raros, e sua clientela era composta principalmente de colecionadores. A Hastings não interessava os livros. "Ele foi muito longe para fazer indagações." Um suor frio umedeceu a combinação de Louisa. Em um esforço para acalmar os nervos, tirou os óculos e começou a polir as lentes com um lenço. ―Hummm! – disse, tentando parecer, de novo, pensativa. ―Pelo que me lembro ― comentou Emma, serena como sempre em momentos de crise ―,a imprensa sensacionalista deixou claro que não havia nenhum mistério na morte da Senhorita Barclay. Tinha motivos para acabar com a vida. Sabia que a prenderiam pelo assassinato de Lord Gavin. Obviamente, não pode suportar a ideia da terrível experiência que lhe aguardava. ―Certo. ― Anthony voltou a juntar as pontas dos dedos ― Estava decidido a abandonar essa investigação. Embora, os suicídios de Fiona e da Sra. Hastings seguiam me importunando. Fiz algumas investigações, desta vez, sobre os negócios de Hastings. Louisa abandonou de repente a limpeza de suas lentes. A curiosidade levou a melhor sobre o seu medo. Colocando os óculos, olhou fixamente para Anthony. ―Você encontrou alguma coisa que aguçou as suas suspeitas? 94


―Infelizmente, não. Hastings estava envolvido em um dos consórcios de investimento, mas não consegui encontrar nenhuma relação entre Fiona e seus negócios. Louisa pigarreou. ―Perdoe-me que eu mencione isto, senhor, porém devo fazê-lo. Existe alguma possibilidade de que Fiona e o Sr. Hastings mantivesse relações íntimas? ―Absolutamente, nenhuma – afirmou Anthony. Era uma negativa imperativa e inequívoca. Sem lugar para discussões. ―Compreendo ― respondeu Louisa ― Muito bem, pois.... ―Falei com várias pessoas que haviam visto Fiona e o Sr. Hastings no baile aquela noite. Evidentemente, o Sr. e a Sra. Hastings haviam saído para o jardim afim de tomarem um ar fresco. Fiona foi vista abandonando o baile e dirigindo-se, também, sozinha, aos jardins. Emma lhe ofereceu uma xícara de chá. ―Esta noite os jardins deveriam estar muito concorridos. ―Certo ― Anthony levou a xícara de chá e colocou na mesa ao lado de sua cadeira ― Em qualquer caso, os Hastings voltaram ao baile depois de um tempo, pediram o seu coche e saíram imediatamente. ―E, a senhorita Risby? ― perguntou Louisa. Anthony tencionou a mandíbula. ―Ninguém mais voltou a vê-la com vida. ―Eu não estou entendendo. Você está dizendo que ninguém a viu retornar ao baile? ―Sim, Sra. Bryce, é isso o que eu estou lhe dizendo. Ela foi para o jardim sozinha e nunca mais voltou. Quando foi retirada do rio, ao

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amanhecer, ainda usava o vestido que estava no baile. O colar havia desaparecido. Presumiu-se que havia caído para no fundo do rio. Emma mexia o chá distraidamente e disse: ―Eu não tinha ouvido falar desses detalhes. ―Por razões óbvias, os Risby estavam ansiosos para manter o maior grau possível de discrição ― disse Anthony. ―Prossiga ― pediu Louisa, agora fascinada ― Havia outros indícios a serem relacionados às mortes das duas mulheres? ―Durante a autópsia foi descoberto que Fiona tinha recebido algum tipo de golpe em sua cabeça. As autoridades concluíram que ela tinha batido contra uma pedra ou outro obstáculo submerso, mas há outras possibilidades. Louisa conteve um pequeno arrepio. Havia, certamente, outras maneiras de sofrer uma pancada na cabeça. Um atiçador, por exemplo, pode causar uma ferida profunda, uma ferida mortal. Ela lambeu os lábios secos de repente. ―Essa foi a única pista que você encontrou? ―Sim ― admitiu ― No final, fui obrigado a abandonar as minhas investigações. ―Eu não entendo ― disse Louisa ― Se assim for, o que levou você a correr o risco de arrombar o cofre de Hastings na noite passada? ―O suposto suicídio, duas semanas atrás, de um homem chamado Phillip Grantley ― disse Anthony. Louisa olhou para Emma esperando por algum esclarecimento. Emma acenou com a cabeça, indicando que estava tão confusa quanto ela. Isso significava que Grantley não pertencia a alta sociedade. Louisa voltou sua atenção para Anthony. ―Quem era Phillip Grantley? 96


―De acordo com meu informante, Grantley conhecia muito bem Elwin Hastings. Aparentemente, Grantley fazia parte dos negócios de Hastings. Coincidentemente, Hastings está organizando um consórcio de investimento, como fez ano passado, quando Fiona e Sra. Hastings morreram. Acho que é um fato muito incomum para ser ignorado. Louisa viu tudo sob uma nova ótica. Reclinou-se em sua cadeira, vencida pela excitação. ―Por essa razão participou dos mesmos bailes que eu na semana passada. Nós dois estávamos à procura de informações sobre outros membros do consórcio investidor de Hastings. ―Sim ― Anthony sorriu levemente ― Eu prestei atenção em você, quando quase tropeçamos um no outro na biblioteca do Lord Hammond. Louisa que havia levado sua xícara de chá aos láios. Surpresa, o depositou sobre o pires com um sonoro ruído de louça quebrando. ―Do que você está falando, senhor? ―Na noite em que Hammond organizou o baile, você entrou na biblioteca de uma forma que só pode ser descrito como furtivo, cerca de trinta segundos depois de mim. Ela olhou para ele horrorizada. ―Escondi-me atrás das cortinas – disse ele ― Foi desconfortável. Não me lembro da última vez que me vi obrigado a esconder-me dessa maneira. ―Meu Deus! ― desanimada, Louisa desabou na cadeira ― Você estava na biblioteca, enquanto eu a revistava? Eu tinha certeza de que ninguém havia me visto..... ―Como pode imaginar, despertou a minha curiosidade – disse Anthony, com o olhar fixo nela.

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―Mais tarde, nessa mesma noite, pediu fosse apresentado a nós ― observou Emma. Essa foi a primeira noite que havia bailado com ela, pensou Louisa com nostalgia. A noite que havia se permitido sonhar um pouquinho. ―Ao perceber, alguns dias depois, que fez o mesmo na biblioteca de Wellsworth ― continuou, sem afastar o olhar dela ― ficou claro que poderíamos compartilhar meu interesse comum por Hastings. Ontem à noite, confirmou-se a minha teoria. Creio que chegado a hora de unir os nossos recursos. ―Hum ...! ― murmurou Louisa. ―Antes de prosseguir ― Anthony completou deliberadamente ― eu tenho uma pergunta para lhe fazer. Dado o muito que confiei em você, eu gostaria de receber uma resposta. Na verdade, eu creio que é justo dizer que eu mereço. Ela se recostou na cadeira. ―Quer saber por que investigo os negócios financeiros de Hastings ... ―Me parece uma pergunta razoável, dadas às circunstâncias. Razoável ou não, ela decidiu que não tinha porque não responder. Caso negasse, provavelmente não iria querer se aliar a ela. E, nesse momento ficou claro que esta era a única maneira de levar a investigação até o fim. A atração de publicar a notícia de dois assassinatos na alta sociedade era irresistível. ―Muito bem. Assim farei, senhor, com uma condição.

Emma franziu a boca. ―Louisa, eu não estou muito convencida de que seja uma boa ideia.

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―Desculpe-me ― respondeu Louisa, suavemente ― porém, sinto que não tenho alternativa ― olhou para Anthony ― Aceita? ―Depende do que seja – respondeu sem alterar-se. ―Se desejar a minha ajuda neste assunto, devemos nos associar. Anthony olhou para ela com desconfiança. ―Quer se envolver em um caso de assassinato, Sra. Bryce? ―Desejo ajudá-lo a investigar Hastings – corrigiu com precisão ― Não estou convencida de que você tem razão quando afirma que ele tenha cometido dois assassinatos. Não obstante, despertou a minha curiosidade a ponto de querer saber mais sobre o assunto. ―Por que diabos, você quer ajudar a perseguir um assassino? É um trabalho perigoso. ―Sim – dsse Emma rapidamente ― Um trabalho muito perigoso. Louisa, não creio que deva seguir adiante com esse plano. Você já correu muitos riscos. Produziu-se um breve silêncio. Anthony desviou sua atenção para Emma. “Sentiu o faro de uma pista – pensou Louisa ― Nada o distrairá agora.” ―Muito bem, senhor ― disse, e cruzou as mãos sobre o tampo de couro ― Vou explicar, porém lhe advirto, que realmente não tem alternativa se não cooperar. Se não for assim, é muito provável que sigamos pisando nos calos um do outro no futuro. Anthony a estudou atentamente. ―Senhora Bryce, a vida social está tão enfadonha que saia a procura de graves riscos, apenas para distrair-se? ―Dir-lhe-ei algo que muito poucas pessoas sabem. Emma é uma delas, a outra é o diretor e editor do Flying Intelligencer. 99


―Aquele jornaleco? ― assombrou-se Anthony ― Pode-se saber o que tem a ver

com um periódico de tão duvidosa reputação, que se

alimenta das notícias mais escabrosas? Havia esperado essa reação, recordou a si mesma. Não obstante, se sentiu abatida e enojada, pelo comentário tão desdenhoso. ―Por um acaso ― respondeu friamente ― eu sou correspondente desse jornaleco de duvidosa reputação. Anthony ficou imóvel. Era, pensou ela, a primeira vez que o via mudo de surpresa. Teve a intenção de desfrutar da reviravolta dos acontecimentos. Com certeza, a opinião que tinha dela havia despencado, mas, pelo menos, tinha conseguido surpreendê-lo. Tinha a impressão de que isso não era muito frequente. ―Você é correspondente? ― repetiu com a voz neutra. ―Correspondente secreta ― esclareceu ― Escrevo sob o pseudônimo de I. M. Phantom (E. L. Fantasma) ―Caramba! Com certeza eu tenho o que mereço ― disse movendo a cabeça e em seguida torcendo, um pouco, a boca. Ela irritou-se. ―Por um acaso, acha o meu trabalho engraçado, senhor? ―Assombroso, seria a palavra mais acertada – fez uma pausa ― Minha irmã ficaria encantada em conhecê-la. Louisa ficou animada. ―Lê o que eu escrevo? ―Claro, ainda que não seja essa a única razão pela qual gostaria de conhecê-la. Casualmente, ambas têm muitas coisas em comum. ―Não o compreendo. Sua irmã também é correspondente? ―Não, porém tem uma profissão parecida, uma que, assim como a sua, a obriga a esconder a sua identidade. 100


―Mas, a quê ela se dedica? ― perguntou Louisa impaciente, pois nunca havia conhecido outra mulher que também assumisse uma identidade falsa. ―Escreve obras de teatro, sob o pseudônimo de E. G. Harris. ―Conheço o seu trabalho ― Louisa mal podia conter a sua excitação ― Suas obras são apresentadas no Teatro Olimpia. A que está no momento em cartaz chama-se Noche en Sutton Lane. Fui assistir semana passada. Tem vários momentos emocionantes, entre eles, a incrível cena do naufrágio de um barco no mar. ―Eu sei ― ele admitiu. ―Espera-se que a heroína acabe se afogando, porque tem mantido relações ilícitas, e todos sabem que o amor proibido sempre acabam mal nos dramas. No entanto, no último minuto, de repente aparece um cavaleiro que a salva ― Louisa suspirou ― Infelizmente não é Nigel, o homem que ela amava. ―Pelo que me lembro, Nigel já era casado. ―Sim, bem, mas ele não sabia. Pensava que sua esposa havia morrido quando, na verdade, seu intrigante irmão havia trancado sua esposa em um hospício. ―Eu vos garanto que assisti a peça, Sra. Bryce. Não há necessidade de me explicar. Ela corou, envergonhada. ―Sim, claro. Emma sorriu. ―Louisa é uma grande admiradora das obras de sua irmã, senhor. ―Eu vejo que sim ― Anthony levantou as sobrancelhas ― Coincidentemente, eu também leio alguns dos seus artigos, a Sra. Bryce.

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―Estou surpresa de ouvi-lo admitir que tenha lido alguma coisa publicada no The Flying Intelligencer. No entanto, ela sentiu um pequeno arrepio de prazer: ele havia lido os seus artigos. -O The Flying Intelligencer tem duas categorias de leitores ― ele respondeu secamente ―: aqueles que admitem que o leem e os que não admitem. Isto é especialmente verdade desde que apareceram os primeiros artigos de I. M. Phantom. Felicito-vos sinceramente, Sra. Bryce. Conseguiu deixar a sociedade atordoada com suas revelações de escândalos nas altas esferas. Louisa sentiu necessidade de se defender. ―Eu não me interesso pelos escândalos pelo impacto que possam ter. É o desejo de que se faça justiça que me motiva, senhor. Sardônico, ele elevou uma sobrancelha. ―Justiça? ―Muitas vezes, as pessoas que circulam nas altas esferas abusam de suas posições de privilégio e poder. Eles se aproveitam de quem sabe que são mais fracos do que eles, com o pleno conhecimento de que seja muito improvável que paguem por seus crimes. ―Eu

entendo.

Você

sente

necessidade

de

fazer

justiça,

desmascarando essa pessoas? ―Pouco mais pode ser feito ― Louisa estendeu as mãos ― Todo mundo sabe que é praticamente impossível para a Scotland Yard conduzir uma investigação na alta sociedade. Todas as portas se fecham e não há maneira de abri-las. Você mesmo disse isso, não há possibilidade de que a polícia possa revistar a casa de Hastings. ―Correto. No entanto ...

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―Graças a Emma, eu estou em uma posição única ― ela o interrompeu ― Eu posso me movimentar em determinados círculos sociais sem chamar a atenção. Anthony olhou para Emma. Emma se serviu de outra xícara de chá. ―Devo dizer que tem sido interessante. ―Quero deixar claro que estou orgulhosa de fazer o meu trabalho com rigor ― Louisa acrescentou com firmeza ― Sempre investigo exaustivamente, antes de escrever meus artigos. A última coisa que desejo fazer é causar danos ou humilhar uma pessoa inocente. ―Basta ― Anthony acenou com a mão para interrompê-la ― Não tenho dúvidas do seu cuidado ou de suas intenções, a Sra. Bryce. Ela se permitiu relaxar um pouco. ―Obrigado. ―Fiquei me perguntando como consegue informações ― continuou ele ―Eu posso presumir que como um membro da imprensa, deve contar com informantes? ―Sim ― ela disse, novamente, com cautela. ―Eu gostaria de saber o nome da pessoa que a colocou na pista Hastings ― disse Anthony. Louisa refletiu por um momento. Miranda Fawcett gostava de seu papel como fonte de segredos, nos bastidores, de uma correspondente do jornal. Certamente poderia convencê-la a ajudar Anthony em sua investigação, desde que estivesse convencida de que poderia confiar nele. ―É possível que a minha fonte de informação possa ajudá-lo ― ela disse ― mas, não posso garantir nada. Olhos de Anthony brilharam de velada excitação. ―Eu entendo. 103


Louisa apertou as mãos em cima da mesa. ―Deixe-me explicar, claramente, senhor ― disse friamente ― Essa conversa vai acabar aqui e agora, se você não concordar que sejamos parceiros neste assunto. Anthony semicerrou os olhos. ―Eu não acho prudente, Sra. Bryce. ―E, eu não acredito que tenha outra escolha, Sr. Stalbridge.

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Capítulo 10

Dez minutos depois, desceu os degraus do número doze, atravessou a rua e dirigiu-se ao pequeno parque localizado no meio da praça. Não estava no seu melhor humor. Louisa era correspondente do Flying Intelligencer. Foi uma informação totalmente inesperada que o tinha apanhado desprevenido. Nunca tinha ouvido falar de jornalistas do sexo feminino, muito menos um que fizesse o seu trabalho em círculos seletos. Assombrosa como era a sua carreira, explicava parte da curiosidade que despertou nele durante os últimos dias, incluindo suas incursões secretas nas bibliotecas de Wellsworth e Hammond e seu interesse em Hastings. Também explicava as roupas ridículas, óculos, e a conversa chata em qualquer evento social que participava. Louisa tinha feito grandes esforços para garantir que as pessoas não iriam notá-la. Mas, gostando ou não, perderia um pouco do seu valioso anonimato, agora que seu nome foi ligado ao dele. Perguntava-se como ela reagiria . Atravessou uma alameda e encontrou uma pequena clareira no parque. Passou pela frente de dois bancos de ferro forjado pintados de verde e da estátua de uma ninfa. Ao chegar à outra extremidade da área arborizada, cruzou outra rua, virou uma esquina e entrou em um beco estreito. Saindo em uma rua muito movimentada, pensou em pegar um coche de aluguel, mas logo descartou a ideia. Precisava fazer um pouco de exercício para se livrar da frustração causada pela oferta de Louisa. Não a queria envolvida neste assunto, mas parecia não haver alternativa. Havia deixado bem claro que iria continuar a investigar

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Hastings, com ou sem a sua ajuda. Agora, tudo que poderia fazer era protegê-la. Coisa que, provavelmente não seria fácil, pensou.

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Capítulo 11 ―Sei que é altamente improvável que possa dissuadi-la desta aventura – disse Emma ― Não obstante, sinto que devo tentar. Você está correndo muitos riscos. Louisa levantou-se de sua cadeira e se aproximou da janela com vista para o jardim. ―Não seria a primeira vez. ―Mas, não era como este. Você nunca investigou um assassinato. ―Mais uma razão pela qual não posso deixar passar essa oportunidade. Uma história sobre os surpreendentes assassinatos de duas mulheres da alta sociedade, que poderia estar ligada a Elwin Hastings, é demasiadamente importante para ser ignorado. Homens como Hastings raramente pagam pelos seus crimes. É uma oportunidade para levar um deles perante a justiça. ―Lembre-se que não tem certeza que Hastings tenha assassinado ninguém. Até esse momento só tem a opinião do Sr. Stalbridge sobre os fatos. Já lhe disse que ele poderia ter seus motivos para querer colocar a culpa em outra pessoa. Louisa continuava a contemplar o jardim da janela. ―Não creio que ele esteja investigando apenas para limpar o seu nome, Emma. Sinceramente, creio que ele não se importa nem um pouco com a opinião da sociedade. Minha intuição me diz que ele está realmente convencido que Hastings assassinou Fiona. Ele está decidido que se faça justiça.

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―Talvez você queira atribuir-lhe esse nobre motivo, porque gostaria de acreditar que têm algo em comum – repôs Emma amavelmente ― Que vocês dois procuram que se faça justiça, etc, etc, etc. ―Suponho que você tenha razão ― disse Louisa de costas para a janela ― Mas, de qualquer maneira, estou disposta a chegar até o fim dessa história. ―Não me interprete erradamente, querida, admiro sinceramente o seu trabalho de correspondente, porém me preocupo que você cometa imprudências em sua busca por justiça na alta sociedade. ―Eu agradeço a sua preocupação e prometo-lhe que terei todo cuidado. Emma suspirou. ―É a antiga raiva e o medo de Lord Gavin que mobiliza você. Mesmo estando morto, este homem ainda a persegue. ―Não posso discordar nesse ponto. O acontecimento do ano passado é um pesadelo que me acompanhará o resto dos meus dias. É bem possível que ao empreender esse trabalho, eu tenha me deixado levar pelos acontecimentos. Ao mesmo tempo, não posso evitar sentir que estou fazendo o que precisa ser feito, meu trabalho como I. M. Phantom satisfaz algo em mim, que não se compara com nada. ―Decidiu seguir adiante com o acordo feito com Anthony Stalbridge, não é verdade? ―Não tenho outra opção ― Louisa agarrou o parapeito da janela e ficou em silêncio por instantes ―Deve tê-la amado muito, Emma.

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Capítulo 12

Anthony subiu os degraus da mansão da Rua Brackton. Temendo o que o esperava, golpeou a aldrava. Passos ecoaram no corredor. A porta se abriu e apareceu um homem alto, de aparência cadavérica e cabelo grisalho, vestido com o uniforme de um mordomo. ―Senhor Stalbridge. Por favor, entre. ―Boa tarde, Shuttle ― Anthony entrou no vestíbulo e jogou o chapéu sobre uma mesa com a superfície de mármore ― Tudo bem, espero. ―Gozo de excelente saúde, obrigado senhor ― Shuttle fechou a porta ― Sua mãe e sua irmã o esperam na biblioteca. Seu pai, é claro, está em sua oficina. ─Obrigado. Anthony caminhou pelo corredor e parou diante da porta aberta da biblioteca, preparando-se para o assalto. Havia uma grande mesa e um cavalete no quarto, ambos localizados na melhor posição para se beneficiar da luz que se filtrava através das grandes janelas com vista para os amplos jardins. Sua mãe, Georgiana, em pé diante do cavalete, pincel na mão. O sol iluminava alguns cabelos brancos que cobriam seu cabelo escuro. Tinha cinquenta e poucos anos, era alta e bem proporcionada. Um avental manchado protegia seu vestido. Clarice estava sentada à mesa, absorta na leitura de uma pilha de papéis escritos por sua própria mão. Certamente, seu último trabalho para o Olympia. Uma massa de cachos vermelhos emoldurava seu rosto delicado e seus olhos azuis.

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―Boa tarde, senhoras ― disse da porta ― Vocês duas me parece muito ocupadas. Não quero incomodá-las ― deu um passo para trás ―Só passei rapidamente para conversar com meu pai. ―Tony ― Clarice, de repente, olhou por cima de seus escritos ― Volte aqui. Nem pense em sair sem nos dar uma explicação. ―Desculpe ― disse Anthony com um pé no corredor ― No momento estou muito apressado. Talvez, mais tarde. ―Não, mais tarde, não ― disse Georgiana, deixando o pincel na paleta ― Sua avó esteve aqui há menos de uma hora e contou-nos tudo. Anthony abafou um xingamento. Sua avó, Lady Payne, era uma mulher indomável que sempre fez jus ao seu nome, Dolores. Sua principal ocupação, que ele soubesse, era se intrometer nos assuntos familiares. Em um momento ou outro, todos os membros da sua família haviam padecido com sua interferência, mas ultimamente tinha concentrado a maior parte de sua atenção sobre ele. Para ser justo, não era a única. Atualmente, parecia que todos os membros do grande clã concentrava todo o seu interesse, sem dúvida bemintencionado, nele. Felizmente, os únicos membros da grande família Stalbridge que estavam na cidade nesse momento eram sua avó, os pais e a irmã. De qualquer maneira, dada a agudíssima inteligência e força de vontade que caracteriza cada folha da árvore genealógica dos Stalbridge, não era de admirar que estes dias fazia todo o possível para evitar até mesmo os quatro parentes que estavam em Londres nesse momento. ―É verdade? ― Clarice perguntou com tom enérgico ― É verdade que você ontem à noite praticamente arrastou, do baile organizado pelos Hastings, uma viúva misteriosa, uma tal senhora Bryce, que a colocou em seu carro e que sumiram na noite? 110


Ele adorava sua irmã. Era alguns anos mais jovem que ele, tinha uma grande inteligência, tinha um bom coração e era geralmente muito divertida, mas era evidente que tinha uma fraqueza para o dramático, uma consequência de seu talento para escrever, sem dúvida. ―A Sra. Bryce e eu deixamos o baile juntos ― disse Anthony, escolhendo cuidadosamente as palavras ― No entanto, descemos as escadas e subimos no coche de forma totalmente normal. Pelo que me lembro, ninguém foi arrastado. Agora, se vocês me dão licença, eu quero falar com nosso pai. ―Espere, você tem a nos dizer mais sobre ela ― insistiu Georgiana ― Quem é? O que você sabe sobre a sua família? O que aconteceu com o Sr. Bryce? Sua avó não tinha muita informação. Tudo que sabia sobre a Sra. Bryce é que é uma parenta distante de Lady Emma Ashton, e não tem, absolutamente nenhum sentido de moda. Anthony sorriu. ―A falta de detalhes deve ser extremamente frustrante para ela. ―É verdade que o usa de óculos quando vai ao baile? ― Clarice perguntou. ―Sim ― disse Anthony. ―E, então? ― disse Georgiana ― O que você sabe sobre seu marido? ―Eu não sei o que aconteceu com o Sr. Bryce ― admitiu ― O importante é que não está aqui. ―A vovó disse que a Sra. Bryce está de luto, por isso deve ter morrido há três ou quatro anos ― disse Clarice. ―Tem lógica pensar que seja assim ― concordou Anthony.

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―Sua avó disse que parece ter o seu próprio dinheiro ― observou Georgiana ― Claramente, Lady Ashton a protege como em um ato de generosidade. ―Parece que é isso ― disse Anthony ― Agora, se vocês me dão licença ... ―Como ela é? ― Clarice perguntou. Anthony levou alguns segundos para refletir sobre a resposta. ―Pouco convencional ― disse finalmente. ―Em que sentido? ― Clarice insistiu ― Queremos os detalhes, Tony. Esta é a primeira mulher que você mostra interesse, depois que Fiona morreu. O mínimo que pode fazer é nos contar sobre isso. -Entre outras coisas, admira suas obras ― disse ele. ―Você disse que eu escrevo para o Olympia? ― Clarice olhou para ele com surpresa. ―Eu acho que ela ficou muito satisfeita porque a heroína que havia mantido relações ilícitas, em Noche em Sutton Lane, não tenha se afogado, ainda que quem a tivesse resgatado não tenha sido o homem que a seduziu. ―Nigel não poderia salvá-la ― se justificou Clarice ― Ele já era casado. ―Eu tentei explicar ― disse Anthony, e aproveitou a oportunidade para escapar. Ele subiu as escadas e caminhou pelo longo corredor que conduzia a uma grande sala situada na parte de trás da casa, um espaço projetado pelo arquiteto para ser usado como uma sala de jantar e sala de estar, mas tinha sido a oficina de seu pai desde que Anthony podia se lembrar. Um som surdo de metal batendo ecoou pelo corredor do primeiro andar. Era um som familiar, que também lembrava a sua infância. Havia passado incontáveis horas na oficina, quer ajudando seu pai, ativamente em 112


um projeto ou dedicando uma considerável quantidade de tempo para se distrair brincando com o relógio e brinquedos mecânicos, únicos e extraordinários, que seu pai tinha feito para ele. A boa coisa sobre ter um pai inventor, pensou, enquanto abria a porta, era que a vida nunca havia sido chata. ―É você, Clarice? ― Marcus Stalbridge estava de costas para a porta, e não se virou ― Eu não terminei o trabalho do seu projeto da casa em chamas. Temo que haja um pequeno problema com os produtos químicos que criam a fumaça. Produzem fumaça em demasia. O público pode não ver o que acontece no palco. Anthony fechou a porta, cruzou os braços e apoiou um ombro contra a parede. ―Clarice está planejando queimar uma casa? ―Tony, já era hora de você chegar ― Marcus deixou cair a chave inglesa e se virou ― Mandei uma mensagem, faz horas. Onde diabos você estava? Vestido com um avental pesado de couro, camisa e calças manchadas de graxa, um par de botas robustas e resistentes, era fácil confundir seu pai, com um carpinteiro ou um estivador, pensou Anthony. Claro que não representava a imagem típica de um cavalheiro inglês, descende de uma família nobre. Marcus tinha estudado engenharia. Segundo todos os que o conheceram em sua juventude, tinha inventado coisas desde quando saiu do berço. Agora, com 60 e poucos anos, era um homem grande, com mãos grandes e capazes, e apresenta feições agressivamente moldadas. Seus olhos, cor de azeitona, poderiam ser desconcertantemente penetrantes e diretos quando lhe consumia a criação de uma de suas muitas invenções. Em outros momentos, seus olhos se tornavam vagos e distraídos. Todo 113


mundo conhecia bem essa expressão. Queria dizer que Marcus estava idealizando um novo artefato. ―As minhas desculpas, senhor ― se desculpou Anthony ― Eu estive ocupado e ao chegar aqui, eu tive algumas dificuldades para contornar as curiosas do térreo. Marcus limpou as mãos com um pano. ―Imagino que a sua mãe e sua irmã queriam lhe fazer algumas perguntas. Sua avó fez-nos uma visita hoje. ―Foi o que ouvi dizer. Conte-me sobre a casa em chamas de Clarice. ―Este é outro de seus efeitos especiais. Ela diz que a concorrência está se tornando feroz e todos os teatros da cidade estão tentando derrubar os outros, criando cenas de grande dramatismo no palco: fantasmas, tempestades, descarrilamentos de trens, torres giratórias, etc, tornaram-se eventos regulares. Mas garante que o público tem uma fraqueza por incêndios. ―Vai ser difícil superar o naufrágio do navio, em sua próxima produção. Foi tão realista que os críticos se queixaram de se molhar. ―Bah! ― exclamou Marcus ― Os críticos sempre encontram algo para reclamar. O público se admirou com o espetáculo. ―Agora você quer incendiar uma casa no palco? ―Sim. O herói tem que salvar uma garota presa pelas chamas. ―Certamente, será emocionante ― disse Anthony. Marcus franziu os lábios. ―Temo que não tanto quanto Clarice esperava. Parece que os proprietários do Olímpia ficaram um pouco nervosos quando lhes disse que planejava usar chamas reais no palco. No entanto, eu encontrei uma

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alternativa, que eu espero que funcione. É constituída por uma tela de luzes e cores, além de fumaça. ―Estou impaciente para assistir. ―Falando dereviravoltas. Sua avó disse-nos que uma viúva, que é conhecida como Sra. Bryce, e você tinham agitado a noite passada. O que aconteceu? Eu pensei que você estava completamente comprometido com a investigação de Hastings. Você mudou de ideia. ―Não precisa me olhar com lástima. Desculpe, mas a Sra. Bryce está relacionada à minha investigação. ―Droga! ― Marcus fez uma careta ― Eu devia ter imaginado. Quando sua mãe, Clarice, e eu ouvimos dizer que você tinha acompanhado uma mulher à sua casa, supomos que talvez ... ―Que eu tivesse me permitido um momento de distração? Desculpe desapontá-lo. Marcus encostou-se à mesa de trabalho. ―Você não pode nos culpar por preocupar-nos com você, Tony. Você está obcecado por mostrar que Hastings assassinou Fiona. É um negócio perigoso que você está fazendo. Se você tivesse sido pego rondando a casa de Hastings ... ―Na noite passada, eu encontrei o colar de Fiona ― disse Anthony calmamente. Marcus olhou para ele. ―Droga! Onde? ―No cofre de Hastings. Marcus respirou profundamente antes de apertar os olhos. ―Tem certeza que é o colar de Risby? ―Sim. Ele deve ter tirado, antes de assassiná-la. Marcus esfregou parte de trás do pescoço. 115


―Você estava certo, afinal. ―Tudo indica que sim ― admitiu Anthony. Marcus cruzou os braços, pensativo. ―Mas não faz sentido. Por que faria uma coisa assim? ― franziu os olhos ― Seria possível que a tivesse seduzido? Uma briga entre amantes, talvez? ―Não ― disse Anthony. ―Você parece muito seguro. Eu sei que amava Fiona, Tony, todos nós a amávamos, mas não deixe que o carinho que sentia por ela impeça você de contemplar algumas outras possibilidades. ―Fiona não mantinha relações com Hastings. Marcus não parecia completamente satisfeito, mas acenou com a cabeça, abandonando a discussão. ―Muito bem. Então, qual foi o motivo? Qual o possível motivo que poderia ter tido para matar uma menina inocente? ―Eu não sei, senhor. Essa é uma das coisas que tenho que descobrir. ―Pare com isso, Tony. Já faz muito tempo, agora você não poderá provar nada. Anthony aproximou-se de uma das mesas, e olhou para a coleção de ferramentas sobre a superfície da madeira. ―Hastings está há mais de dois anos chantageando vários anciões ricos. ―Não pode ser! Hastings é um chantagista? ― disse Marcus. ―Além do colar, encontrei evidências no cofre. Infelizmente, assim como com o colar, são inúteis. Vou providenciar para que as vítimas de extorsão recebam as provas anonimamente, mas, por razões óbvias, não se pode esperar que nenhuma delas testemunhe contra ele. Além disso, eu duvido que mesmo eles saibam a identidade do chantagista. 116


―Meu Deus! ― Marcus fez uma careta de desgosto ― Esse homem é um patife, sem dúvida, mas se você não pode provar nada, o que você pensa em fazer? ―Cada coisa ao seu tempo ― Anthony afastou o olhar das ferramentas ― Agora meu objetivo principal é descobrir por que matou Fiona. Essa pergunta me persegue desde que eu comecei isto. - Como você pensa em fazer isto? ―Tenho certeza de que não mantinham relações íntimas, o que abre a possibilidade de que Fiona tivesse de alguma forma tomado conhecimento dos assuntos que tinha nas mãos. É possível que tenha descoberto que ele era um chantagista. Marcus parou para pensar. ―Você acha que ele a matou para esconder os seus segredos? ―Seria uma boa razão ― disse Anthony. ―Pode ser que sim. Mas, novamente, como você poderá provar, depois de tanto tempo? ―Eu não sei ― Anthony foi para perto do cofre, no canto da sala, colocou a mão sobre a superfície verde brilhante e passou o dedo pelos enfeites dourados ― O cofre de Hastings era um Apolo, como você disse. Havia sido instalado no chão do quarto, como disse Carruthers. Obrigado por me dar essa informação. Will Carruthers, da Companhia de Fechaduras e Cofres Carruthers, era um velho amigo da família, e a fornecedora exclusiva de cofres Apolo, em Londres. Carruthers tinha vendido o cofre para Hastings. Também foi responsável pela instalação, Marcus ergueu as sobrancelhas. ―Devo entender que você não perdeu sua capacidade para arrombar cofres? 117


―Perdi um pouco de prática, mas eu consegui abrir em menos de trinta segundos. ―Nos bons tempos você não teria levado mais de quinze anos ― Marcus sorriu melancolicamente ― Nunca esquecerei a quantidade de horas felizes que você gastava abrindo fechaduras, testando novos dispositivos para meu uso ― mais uma vez, arqueou as sobrancelhas ― O que me lembra de que é hora de me dar netos. Preciso de ajudantes. Você, eu apenas vejo de passagem, e Clarice está sempre muito ocupada escrevendo peças teatrais. ―Um dia ― Anthony prometeu ― Quando este assunto estiver terminado. ―Promessas, promessas. A expressão de Marcus se avivou. ―O que diz a Sra. Bryce? Como ela se encaixa nesse assunto? ―É complicado ― Anthony admitiu ― Na noite passada, eu a encontrei assim que saía do quarto de Hastings. Marcus abriu a boca, fechou-a e abriu-a novamente. ―No seu quarto? Que diabos ele estava fazendo lá? ―O mesmo que eu estava tentando fazer. Ela entrou em seu quarto para revistá-lo. ―Por quê? ―Estava procurando por evidências de que Hastings tem investido recursos em um bordel. ― disse Anthony, sem hesitar. ―Ela forçou o cofre? ―Não, mas depois, quando nos encontramos no corredor me contratou para fazer o trabalho. ―Contratou você, Tony? Agora Marcus apenas balbuciava. 118


―Me confundiu com um ladrão de joias. Como eu disse, é um pouco complicado. ―Meu Deus! ― Marcus ficou com uma cara de poços amigos ― Quem é essa senhora Bryce? ―Eu ainda estou tentando responder a essa pergunta. No entanto, descobri entre outras coisas, que trabalha como correspondente da revista The Flying Intelligencer. ―Não posso acreditar. Escreve para um tabloide sensacionalista? -Sim. ―Mas, você detesta esse tipo de imprensa pela forma como eles trataram com a morte trágica de Fiona. Mal posso acreditar que você está associado a uma jornalista. ―A mim também surpreende, senhor. Mas, descobri que a Sra. Bryce tem um dom especial para confundir as pessoas ― disse Anthony ― Enquanto durar a nossa parceria devo pedir-lhe para manter a ocupação da Sra. Bryce como um grande segredo familiar. Ela faz todo o possível para esconder sua identidade. As sobrancelhas de Marcus arcaram ao máximo. ―Por que é ... uma mulher? ―Em parte, sem dúvida. Mas a razão principal para escrever sob um pseudônimo é porque ela exerce as suas investigações na alta sociedade. Se souberem a sua identidade, seria o fim de sua carreira. ―Sem dúvida ― admitiu Marcus ― Se soubessem, o seu nome desapareceria de todas as listas de convidados da cidade. Nunca mais voltariam a convidá-la. ―Exatamente. Marcus coçou o queixo, pensativo. ―Isso é incrível, meu filho. Absolutamente incrível. 119


―Você se lembra do escândalo Bromley? ―Por alto. Falando de reviravoltas, quem teria pensado que este pedante hipócrita e fariseu do Lord Bromley estivesse ficando rico com antros de ópio. Quando o The Flying Intelligencer publicou a notícia, foi forçado a deixar o país em uma longa turnê pela América do Norte. Não se atreve a voltar. ― A Sra. Bryce foi uma das primeiras que publicou a história e ofereceu provas para o público ― explicou Anthony ― Ela escreve sob o pseudônimo de I. M. Phantom. ―Quer dizer que ela é “o fantasma ". E, agora ela está atrás do Hastings. Ora, ora, ora... ― disse Marcus. ―Eu tentei convencê-la a abandonar a investigação, mas ela não quer nem ouvir falar disso. Eu me sinto na responsabilidade de assegurarme que não sofra nenhum dano, por isso aceitei trabalhar com ela nesta aventura. No futuro imediato o mundo vai acreditar que eu mantenho um caso de amor com a Sra. Bryce. ―Eu entendo ― Marcus parecia receoso ― E, você? ―Asseguro-lhe, senhor, que a nossa associação é puramente acidental. ―Segundo a sua avó, todo mundo diz que vocês têm uma romance. ―É disso que se trata, senhor. Com sorte, os rumores irão mascarar a realidade. Se as pessoas, inclusive Hastings, acreditarem que a Sra. Bryce e eu temos uma aventura, é muito improvável que adivinhem o que estamos fazendo realmente. ―Uma teoria muito interessante ― Marcus disse sem rodeios. ―Lamentavelmente, não tenho outra. Bom dia, senhor. Anthony saiu e caminhou rapidamente para a escada. Temia que Clarice perambulasse pelo vestíbulo, porém a sorte o acompanhou. 120


Não havia ninguém no corredor do andar de baixo. No entanto, não respirou com tranquilidade até que estivesse em segurança, fora da casa. Marcus esperou até ouvir a porta da frente abrir e fechar. Quando teve certeza que Anthony havia saído, tirou o avental de couro, desceu as escadas e entrou na biblioteca. Georgiana e Clarice estavam tomando chá. Ambos olharam para ele com expectativa. ― Tony contou alguma coisa sobre o seu relacionamento com a Sra. Bryce,papai? ― Clarice perguntou. ―Um pouco ― Marcus aceitou a xícara de chá oferecida por Georgiana ― É bastante surpreendente. Estranho, de fato. ―Você acha que se trata de algo sério, querido? ― perguntou Georgiana ― Ou é apenas um capricho? ―Essa mulher não é um capricho passageiro ― disse Marcus com absoluta certeza de sua conclusão ― Embora, não acreditando que Tony tenha percebido isso ainda. Ele continua empenhado em encontrar o assassino de Fiona. ―O que você acha da Sra. Bryce? ― perguntou Georgiana. ―É difícil dizer, eu não conheço essa mulher ― Marcus tomou um gole de chá e depositou a xícara no pires ― Mas, pelo que eu ouvi até agora, eu diria que ela se encaixa muito bem nesta família.

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Capítulo 13

Miranda Fawcett aceitou reunir-se com eles no dia seguinte. Recebeu Louisa e Anthony em uma grande sala que se assemelhava ao saguão de um teatro de luxo. Cortinas de veludo vermelho de borda dourada emolduravam as janelas. O tapete era vermelho, decorado com motivos florais intrincados. O sofá e as poltronas eram dourados, combinando com a tapeçaria. Um lustre de cristal pesado pendia no teto. A própria Miranda tinha igualmente um aspecto chamativo com seu vestido de noite azul turquesa e uma grande quantidade de pérolas. Estava com uma enormidade de cabelo recolhido em um impressionante e elaborado penteado que deve ter levado várias horas de preparação. Louisa tinha certeza de que sua anfitriã usava uma peruca. Muito poucas mulheres na idade de Miranda, ou em qualquer outra idade, de fato, tinha semelhante cabeleira. A cor marrom intensa era igualmente suspeita. ―É um prazer conhecê-lo, Sr. Stalbridge. Miranda se encheu de alegria quando Anthony pegou sua mão e fez uma reverência. ―O prazer é todo meu, a Sra. Fawcett ― Anthony se levantou, sorrindo ― Você é uma lenda, senhora. Mas, bem, você já sabe. Nenhuma atriz foi capaz de substituí-la no palco. Tive a sorte de assistir a sua última apresentação como Lady Macbeth. Louisa não podia acreditar em seus ouvidos. Quer dizer então, que Anthony poderia ser galante sem nenhum esforço. Meia hora antes, quando ele tinha ido para a Praça Arden pegá-la, não parecia nada satisfeito com a ideia de conhecer a atriz aposentada. Além disso, ele estava bastante surpreso com a identidade de sua fonte de informação. 122


―Como, em nome de Deus, conheceu Miranda Fawcett? ― resmungou, seguindo Louisa para o coche. ―Pouco depois de iniciar minha carreira como jornalista, eu lhe fiz um pequeno favor ― disse Louisa ― Ficou agradecida. ―Essa mulher deve ser em torno de sessenta anos. ―Sim, eu diria que sim ― concordou Louisa. Anthony recostou-se e ponderou. ―Comenta-se que em sua época, era amante de alguns dos homens mais poderosos do país. ―Emma me contou sobre isso. ―Dizia-se que ela teve um longo caso amoroso com um homem chamado Corvus Clemente ― disse ele. ― Creio que Miranda mencionou seu nome em alguma ocasião. ―Louisa, esse homem tem a reputação de ser um chefão do crime. ―Acho que não, senhor ― Louisa sorriu calmamente ― Se o Sr. Corvus fosse um criminoso, já o teriam prendido. ―Pelo que eu ouvi, é inteligente demais para se deixar prender. Sempre teve o cuidado de manter uma distância segura das atividades criminosas das se beneficia ― explicou Anthony ― Dizem que ele vive como um cavalheiro, rico e de boa posição, enquanto dirige o império do submundo. É conhecido nas ruas como “O Corvo.” Em sua voz havia um tom de autoridade sobre o assunto, que despertou o interesse de Louisa. ―Você parece saber muito sobre o Sr. Corvus ― disse. Anthony hesitou. ―Recentemente, ele tem estado muito presente em meus pensamentos. Vou ser franco. O fato que tenha contato com seu ex-amante faz com que eu me sinta extremamente desconfortável. 123


―Eu não acho que seu relacionamento chegou ao fim, no passado ― disse Louisa, divertida ― Tenho a impressão que eles ainda são muito próximos. A Sra. Fawcett é uma excelente fonte de informação. Não me surpreenderia que a maioria das informações que me deu venha diretamente de “O Corvo”. ―Por que ajudaria a uma correspondente de um jornal? Ela encolheu os ombros ligeiramente. ―É possível que ele se divirta. Eu sei que a Sra. Fawcett gosta muito de ser a minha informante. ―Que tipo de favor lhe fez? ― Anthony perguntou com interesse. ―É uma longa história. Observando como Miranda se iluminava com satisfação, Louisa sentiu uma mistura de diversão e admiração. No auge de sua carreira, Miranda tinha sido uma das atrizes mais famosas da Inglaterra. Também havia sido aclamada em sua turnê norte-americana. Apesar de ter deixado o palco, era evidente que não tinha perdido nenhuma de suas habilidades para seduzir o público. As covinhas de Miranda apareceram, quando sorriu para Anthony. ―Você é muito gentil, senhor. Devo admitir que, às vezes, eu custo acreditar que estou afastada há tanto tempo do teatro. Me faz muito falta. A vida real pode ser tão terrivelmente aborrecida...― lançou um sorriso de cumplicidade à Louisa ― Pelo menos era até que eu conheci a Sra. Bryce. Juro que ela deu um novo sabor à minha existência monótona. Anthony se sentou em uma das cadeiras dourada. ―A Sra. Bryce sabe como injetar um pouco de emoção nas coisas. Louisa deu-lhe um olhar de desaprovação, ao que ele respondeu com um sorriso educado.

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―Certamente ― disse Miranda. Olhou para Anthony com curiosidade ― Louisa me disse que você tem ajudado em uma de suas pequena e emocionante investigações, Sr. Stalbridge. ―Eu pensei que seria divertido ― disse Anthony ― Eu também estava achando a vida um pouco chata, ultimamente. Louisa olhou para o teto. Miranda abafou um risinho. ―A Sra. Bryce vai se encarregar de solucionar esse problema. ―Já notei um profunda troca na monótona rotina dos meus assuntos cotidianos ― assegurou ele. “Sei, sei, sei” pensou Louisa. Nada em sua vida era rotineiro, e muito menos aborrecido. ―Eu posso imaginar ― murmurou Miranda ― Dizem que desde que regressou de suas longas viagens pelo exterior, há anos, se dedicou a ocupar-se dos negócios familiares. Assombrada, Louisa olhou para Anthony em busca de confirmação. ―É um trabalho aborrecido ― ele admitiu ― Infelizmente, tornouse dolorosamente claro que eu era a única pessoa na família com cabeça para os negócios. Miranda riu entre os dentes. -Ao que parece, é excepcionalmente hábil nesse assunto. Dizem que salvou todo o clã Stalbridge da ruína. -Historicamente, a nossa fortuna é flutuante. Miranda deu uma piscadela. ―Não, desde que você assumiu o comando, Sr. Stalbridge. Espero que sua família agradeça devidamente o seu talento para os negócios. Ele sorriu e disse: ―Poucos membros da minha família prestam atenção aos assuntos monetários. Só reparam se de repente haja uma escassez de fundos. 125


Louisa sentiu-se ruborizar, pensando que se havia imaginado que tinha restaurado a fortuna da família convertendo-se em um ladrão de joias. Pigarreou. ―Obrigado por nos receber, Miranda. É muita gentileza da sua parte. ―Bobagem, eu estava mesmo querendo ― Miranda sorriu ― Eu gosto de nossos pequenos bate papos ― Anthony olhou-a e ela continuou ― Posso perguntar o que fez você e a Sra. Bryce formarem essa peculiar associação? ―Não lhe disse? Miranda levantou as sobrancelhas. ―Na verdade, senhor, eu tenho uma grande dívida para com ela. Faz alguns meses, veio ver-me porque havia descoberto que eu estava prestes a investir uma soma considerável de dinheiro em um projeto planejado por dois senhores, membros proeminentes da sociedade. Anthony olhou para Louisa. ―O esquema da mina disse que a Califórnia ― Louisa esclareceu. ―Ah, sim ― Anthony recostou-se na sua cadeira ― Lembro-me bem. Sr Grayson e Lord Bartlett foram os dois homens que organizaram fraude. Após o surgimento da notícia na imprensa, foram forçados a sair de circulação. ―O projeto era uma farsa completa, é claro ― disse Miranda friamente ― Projetado para tirar vantagem de pessoas como eu que têm dinheiro, mas não se movimentam em seu círculo social. ―Sim ― disse Anthony, em voz baixa ― Eu sei. Miranda deixou escapar um murmúrio de desgosto.

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―Grayson e Bartlett jamais sonhariam em arruinar aos seus ilustres conhecidos da alta sociedade, porém não duvidaram em destroçar a vida daqueles que consideravam inferiores a eles. Eu não era a sua única vítima. Louisa segurou firmemente sua manga. ―Isso os divertia ― opinou. Anthony olhou para ela com uma expressão enigmática. ―Como você descobriu a tempo de avisar a Sra. Fawcett? ―Foi por questão de pura sorte ― disse Louisa ― Uma tarde, Emma e eu fomos a uma exposição. Estava muito quente, eu saí para respirar um pouco de ar fresco e, sem querer, ouvi parte da conversa entre o Sr. Grayson e Lord Bartlett. Não consegui captar todos os detalhes, mas o suficiente para descobrir que planejavam uma maldade contra a Sra. Fawcett. ―Ela veio para contar-me a história ― disse Miranda ― Assim que ouvi os nomes de dois homens, supus imediatamente que eles deveriam estar discutindo o meu investimento. Eu não conseguia entender o que eles estavam tramando, eu não tenho cabeça para essas coisas, sabe? Por esta razão, eu mencionei a um bom amigo meu, que tem uma cabeça excelente para os negócios. Então, ele percebeu o impacto e fez algumas investigações. ―Miranda entrou em contato comigo para agradecer e me explicou o que seu amigo havia descoberto – disse Louisa ― Me propus a informar ao mundo da fraude, porque havia outras vítimas. Entrei em contato com o editor e o diretor do The Flying Intelligencer, e da noite para o dia eu me tornei I. M. Phantom. ―E, eu, em uma das informantes secretas de I. M. Phantom ― Miranda dobrou as pregas de sua saia, de maneira, inclusive, mais elegante

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e perfeita, e observou Anthony com expressão ansiosa ― Bem, Louisa disse em sua mensagem que você gostaria de fazer-me algumas perguntas. ―Relacionadas com a nossa investigação sobre Hastings ― disse Anthony. Ele falou calmamente ― Encontramos evidências mostrando que ele é autor de várias chantagem. Miranda fez um som suave de indignação. ―Eu sempre considerei a chantagem como um dos crimes mais baixos. ―A maior parte dos objetos que encontramos eram os diários pessoais de jovens senhoras que incluíam referências apaixonadas a um amante de grande beleza ― disse Louisa ― Eu não entendo é como eles chegaram às mãos de Hastings. Miranda assentiu pensativa. ―Eu suponho que você não possa me dar os nomes de nenhuma das vítimas? ―Não, eu temo que não ― disse Louisa ― Sentimos a obrigação de protegê-las. ―Eu entendo ― disse Miranda ― Eu gostaria de ajudar, mas estou inteiramente segura do que querem de mim. Anthony olhou para ela. ―Você parece saber muito sobre Hastings. Poderia dar à Louisa os nomes de alguns de seus parceiros de negócios, e também, mencionou que poderia ter interesses econômicos em um bordel. ―Sim ― disse Miranda. Deu uma piscadela para Louisa ― Eu também tenho um informante. ―Nós não acreditamos que Hastings organize sozinho as chantagens ― prosseguiu Louisa ― Sabemos que teve, pelo menos, outro funcionário,

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um empresário chamado Phillip Grantley, porém Grantley deu um tiro na cabeça, há duas semanas. ―O que gostáramos de saber ― disse Anthony ― é se Hastings tem outras pessoas que trabalham para ele. Em particular, um jovem loiro e bonito, nos seus vinte anos. Acreditamos que essa pessoa existe e que foi ele quem comprometeu a reputação de jovens, cujos parentes foram chantageados mais tarde. ―Oh sim, agora eu entendo ― disse Miranda ― Não sei a resposta agora, mas eu ficarei feliz em fazer as averiguações. Podem me dar um dia ou dois? ―Claro que sim ― disse Louisa. Muito obrigado. O Sr. Stalbridge e eu estamos muito agradecidos. ―Bobagem ― Miranda apertou a mão dela com um gesto gracioso ― Você sabe o quanto eu gosto de nossas pequenas aventuras. ―Há mais uma coisa ― disse Anthony. Miranda olhou para ele curiosa. ―Sim, Sr. Stalbridge? ―Perdoe-me se eu interfiro na sua vida privada, mas Louisa disseme que é muito próxima de Corvus Clement. A risada de Miranda foi profunda e sensual. ―Sim, senhor. Por mais de vinte anos. Anthony pegou um envelope de dentro do bolso do casaco. ―Nesse caso, você se importaria de dar-lhe isso, com meus cumprimentos, a próxima vez que você o vir?

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Capítulo 14

Anthony ajudou Louisa a subir no veículo. Naquela tarde, ele havia alugado uma calesa em vez de utilizar um dos seus. Não havia necessidade de proclamar aos quatro ventos que ele e Louisa estavam visitando uma atriz aposentada. Ao sentar-se em frente à jovem percebeu que seus olhos brilhavam de curiosidade reprimida. Ocorreu-lhe que, em todos os seus humores, ela o fascinava. Sempre que estava próximo dela, tinha consciência de uma energia profundamente sensual e misteriosamente feminina que atraía tudo de mais viril que havia nele. Sentia-se preso a ela por laços invisíveis. Nunca tinha sido assim com outras mulheres. ―O que havia no envelope? ― perguntou com urgência. Ele foi forçado a prestar atenção à pergunta. ―Alguns papéis relacionados com o consórcio de investimento que Hastings recentemente montou com Wellsworth e Hammond ― respondeu. ―Não estou entendendo. Por que você acha que interessam ao Sr. Corvus? ―Porque, de acordo com esses papéis, ele é o quarto investidor no consórcio. Ela revirou os olhos de espanto. ―Oh, droga! ―Porém, sem dúvida, a parte mais interessante é que tudo aponta para Hastings e outros planejam enganar Corvus, privando-o de uma parte equitativa dos benefícios a que teria direito. Aparentemente, eles decidiram que, se esconderem certos fatos da aventura, ele nunca irá perceber que o pedaço do bolo que um dia receberá, será muito menor do que a dos outros. 130


―Presumem que uma vez que Clement Corvus não seja do seu mundo e não pode se misturar com eles, nunca vai descobrir a verdade. Eles estão felizes em receber o seu dinheiro, e depois dar-lhes as costas e enganá-lo ― Ela fechou a mão dela e puxou o pequeno punho ― É tão típico das pessoas de sua classe ... ―Corvus é um chefão do crime, Louisa, não um santo. Não precisa sentir pena dele. Nestes anos tem feito uma boa quantidade de fraudes e crimes, certamente, muito piores. ―Suponho que é verdade ― disse ela. Focada nas cenas de rua que via pela janela do coche ― É a arrogância de Hastings e outros que não suporto. Esse tipo de homem não se importa nem um pouco em esmagar o outro, desde que pertença a uma classe inferior. ―Você sempre sentiu essa preocupação pelos canalhas que se movem na alta sociedade?― Anthony perguntou em voz baixa. Ela sentiu um leve tremor, como se tivesse esquecido que ele estava lá até que ele falou. Quando ela se virou para ele, seus olhos estavam cheios de desconfiança. Anthony sentiu que ela lamentou ter exteriorizado seus sentimentos. ―Desculpe-me ― disse, sem alterar a sua voz ― Estou ciente de que há momentos em que eu levo meu trabalho muito a sério. Ele sorriu. ―As suas paixões não me incomodam. Ela piscou. ―Não? ―Não, e mais, na maioria dàs vezes, eu acho muito excitante. Ela olhou fixamente para ele, desconcertada. ―Eu não entendo o que quer dizer, senhor. ―Isto é o que eu quero dizer, Sra. Bryce. 131


Anthony inclinou para frente, rodeou seu pescoço com a mão, afagou o rosto feminino muito próximo do seu, e a beijou nos lábios. Ela pareceu surpresa por alguns segundos, mas não tentou se afastar. Anthony sentiu o tremor que a sacudiu a e intensificou seu abraço. Ela colocou uma mão enluvada suavemente em seu ombro e entreabriu os lábios. A emoção rapidamente se apoderou dele. Fez o impossível para não arrastá-la até ele, levantar suas saias e afundar-se nela. Esse pensamento lembrou-lhe que as cortinas das janelas estavam abertas. Ainda segurando Louisa, ele usou a mão livre para fechá-las. Envoltos nas sombras do coche fechado, tomou a cabeça de Louisa com as duas mãos, agarrou-a e beijou-a deliberadamente com mais paixão. Sua boca era suave e infinitamente tentadora. Ele bebeu do doce manancial que ela lhe oferecia como se estivesse privado de água durante meses, talvez anos. Ele ouviu o mais leve dos gemidos femininos. O som o cativou. Sentiu seu pênis bem ereto, duro e tenso sob as calças. Sua mão desceu até um dos seios de Louisa, descobrindo sua forma através do tecido do vestido. Houve um outro pequeno ruído, um suspiro leve de surpresa desta vez, e, em seguida, os dedos femininos se cravaram convulsivamente sobre seus ombros. ―Senhor Stalbridge ― disse ela com voz trêmula. ―Eu sei ― rosnou, erguendo a cabeça com relutância ― Este não é precisamente o lugar, nem o momento. As minhas desculpas, minha senhora. Sou consciente que esta não é a maneira como com se sucede esse tipo de coisa. Tudo o que posso dizer é que quando se trata de você, nada parece acontecer como é o costume. 132


Ela o olhou através das lentes embaçadas, os lábios entreabertos, o rosto corado. Divertido, ele tirou os óculos dela. Ela piscou e a seguir franziu ligeiramente a testa, quando ele puxou um lenço do bolso e começou a limpar as lentes. Devolveu-lhe os óculos. ―Obrigado ― ela disse sem fôlego. Ela os colocou e, de repente, se concentrou em ajustar o seu chapéu e esticar a saia do seu vestido. Anthony observou-a por um momento, apreciando o fato de vê-la sentada ali, diante dele, saboreando a certeza de que ela havia retornado o seu beijo. Depois de um momento, puxou a cortina. Quando Louisa não encontrou nada mais para fazer, tossiu, se recostou na cadeira e segurou as mãos, apertando-as bem. ―E ... então ― disse, e depois parou. ―Você não respondeu à minha pergunta ― ele lembrou-a suavemente. Ela franziu a testa. ―Que pergunta? ―Desde quando você tem essa grande paixão em levar à justiça os criminosos que circulam na alta sociedade? ―Oh. Foi depois que eu me instalei na casa de Emma ― Louisa olhou pela janela ― Antes eu pensava que não se podia fazer nada contra essas pessoas. ―Aconteceu alguma coisa a uma pessoa amada? ― perguntou, tentando arrancar alguma informação com cuidado ― Algo que inspirou o desejo de ver a justiça ser feita?

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―Não foi nada pessoal ― ela disse suavemente ― Apenas observações do mundo. Ele percebeu que Louisa estava mentindo. Muito interessante. Ele sorriu um pouco. ―Um dia desses eu tenho que lhe apresentar um amigo meu. Ele é um homem que entende o que é sentir-se movido pela paixão pela justiça. Acho que terão muito sobre o que falar. Ela olhou para ele com desconfiança. ―Quem é? ―Seu nome Fowler – disse Anthony ― Um detetive da Scotland Yard. Uma expressão de horror iluminou por um momento seu rosto. Ela desapareceu quase imediatamente, mas não antes de deixar uma impressão profunda nele. ―Você é amigo íntimo de um policial? ― perguntou tensa. Aqui havia um gato escondido. Cruzou os braços e recostou-se em um canto do veículo, com grande curiosidade. ―Fowler foi a pessoa responsável pela investigação da morte de Fiona ― explicou ― Investigamos também o suicídio de Victoria Hastings. Assim como eu, ele também estava convencido de que havia uma conexão com Elwin Hastings, mas não conseguiu provar. Segurava a sua sombrinha com força que ficou surpresa que o cabo não tenha se quebrado. ―Esse detetive investigou também o terceiro suicídio que você mencionou? O que aconteceu nesse mesmo mês? ―O de Joanna Barclay? Sim. Ele não tinha escolha, pois investigava também o assassinato de Lord Gavin ― disse Anthony. ―Eu entendo. 134


Anthony pensou que Louisa estava respirando com dificuldade. ―Você está doente? ― perguntou subitamente preocupado. ―Não, eu estou bem, obrigada ― hesitou ― Eu não sabia que tinha contatos com a Scotland Yard. ―Não é de domínio público por razões óbvias. Fowler tem o mesmo cuidado que eu para manter a nossa amizade em segredo. ―Eu entendo. Você tem que admitir que é incomum que um cavalheiro de sua posição mantenha uma boa amizade com um policial. Anthony deu de ombros. ―Fowler e eu compartilhamos um interesse mútuo. ―Provar que Hastings assassinou Fiona? ―Sim. ―Presumo que o Sr. Fowler é a sua fonte de informações sobre questões relativas Elwin Hastings? Anthony assentiu. ―Também me informa sobre as atividades de Clement Corvus. A ajuda de Fowler tem sido muito útil. Ela lhe deu um sorriso frágil. ―Me alegro por você!

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Capítulo 15

Pouco depois, Anthony a acompanhou à porta do número doze e se despediu dela. ―Avise-me quando tiver notícias de Miranda Fawcett – disse ele quando a Sra. Galt abriu a porta. ―Farei isso – prometeu, desejosa de desfazer-se dele. Anthony a olhou friamente e especulativo, e a seguir deu um passo atrás. Despedindo-se com um gesto amávle da Sra. Galt, desceu os degraus em direção à carruagem que o esperava. Louisa entrou apressadamente no vestíbulo, sentindo como se fosse perseguida por uma legião de demônios. Praticamente jogou sua mantilha e chapéu para a Sra. Galt. ―Lady Ashton está em casa? – perguntou. ―Ainda não chegou, senhora. Porém, não deve tardar a voltar de sua reunião da Sociedade Botânica. ―Estarei na biblioteca. Louisa se esforçou para caminhar, e não correr pelo corredor. Entrou na biblioteca e fechou a porta atrás de si. Segurando a maçaneta com as duas mãos, se apoiou contra a porta de madeira. Não parecia capaz de recuperar o fôlego. Era como se estivesse em um espartilho de aço. Estava com o pulso acelerado. Queria fugir, se esconder, mas não sabia para onde ir. Necessitava de algo para acalmar os nervos. Afastando-se da porta, caminhou até a mesa com bebidas, abriu a licoreira num impulso, e serviuse de uma boa dose de conhaque em um copo. Engoliu muito líquido da primeira vez, cuspindo boa parte e engasgando um pouco. Respirando profundamente, começou a andar de um lado ao outro da sala. 136


―Calma ― disse em voz alta ― Não pode saber quem você é. Não há nenhuma maneira de descobrir a verdade, nunca. Maravilhoso. Agora, falava sozinha. Tomou outro gole de conhaque, um pequeno gole dessa vez e foi até a janela. Seus olhos passearam pelo jardim. Dentro dela tudo estava de cabeça para baixo. Era perfeitamente compreensível, assegurou-se. Tinha sido um choque atrás do outro. Primeiro foi aquele beijo devastador. Logo a seguir, a notícia igualmente devastadora de que o homem que havia sacudido os seus sentidos mantinha amizade com o detetive que havia investigado o assassinato de Lord Gavin. Tomou outro gole de conhaque. Levou algum tempo antes de sua respiração voltar ao normal, e o pânico desaparecer gradualmente. Tudo sairia bem, pensou, deixando o copo vazio sobre a mesinha. Teria que ter cuidado claro, porém não corria nenhum risco imediato de ser descoberta. Era óbvio que Anthony estava consumido pelo desejo de vingar Fiona. Enquanto estivesse com a atenção completamente fixa em fazer justiça à mulher que havia amado e perdido, não teria razão para mostrar excessiva curiosidade pela mulher que o ajudava no projeto, não é? Tentou pensar com lógica. Infelizmente, o conhaque a tinha deixado confusa. Não obstante, uma coisa era óbvia, os beijos teriam que terminar. Seria muito estúpido manter uma aventura amorosa com Anthony Stalbridge. Nada de bom poderia sair dali. Os amores proibidos sempre acabavam mal. O pessimismo encobriu o medo nervoso. Segurando o parapeito da janela, apoio a testa no vidro e fechou os olhos. Como seria ser amada da forma como Anthony amou a sua querida Fiona? Sabia que nunca teria a resposta à essa pergunta.

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Capítulo 16

Daisy Spalding acordou completamente dolorida. O efeito da mistura de ópio que havia tomado na noite anterior tinha desaparecido, deixando-a com a angústia de um corpo maltratado e espancado. Sentou-se cuidadosamente sobre a cama estreita e fez um balanço. Havia sobrevido a outro cliente, mas por pouco. Se um cliente não tivesse ouvido os gritos através das paredes e não tivesse saído para investigar, teria amanhecido morta. O cliente da noite passada foi o mais violento que já tivera. Ela tinha visto a loucura em seus olhos quando ele amordaçou-a e amarrou suas mãos atrás das costas. Estava apavorada, mas aí já era tarde demais. Só fazia algumas semanas que tinha começado a trabalhar no bordel, mas duvidava que sobrevivesse o mês. Depois da morte de Andrew, o homem a quem devia dinheiro tinha dito que poderia pagar a dívida, vindo trabalhar na Phoenix House por um par de meses. Então, pela primeira vez, tinha planejado jogar-se no rio, mas o credor tinha a convencido. ―Phoenix House não é como outros bordéis ― disse ele ― Todas as mulheres que lá trabalham vêm de famílias respeitáveis como você. Ganham muito dinheiro, porque desfrutam de uma posição muito superior do que a prostituta de rua. São “courtisanes” não prostitutas de rua. Os cavalheiros estão dispostos a pagar bem pela companhia de senhoras refinadas. "Mas uma prostituta é uma prostituta", pensou Daisy. Havia sido uma estúpida ao pensar que o negócio seria diferente porque ela, antes, era uma senhora. Aterrorizada em terminar seus dias em um asilo de pobres, aceitou a oferta. Não descobriu, até muito tempo depois de começar a 138


trabalhar na Phoenix House, que o credor de seu marido havia recebido uma boa quantidade da proprietária, Madame Phoenix. Madame Phoenix havia lhe explicado que não era bonita o bastante para clientes regulares. Só restava uma vaga para uma mulher disposta a exercer o trabalho duro. Alguns homens gostavam de ficar um pouco violento, explicou-lhe. Isso os excitava, porém não corria perigo algum. Daisy levantou-se, rastejando, e se olhou no espelho quebrado que havia sobre o lavatório. Seus olhos estavam machucados e o seu queixo inchado. Teve medo de examinar o resto de seu corpo. Desta vez, os danos eram graves. Da próxima vez poderiam ser fatais. Se estava destinada a morrer aos vinte e dois anos, preferia ser ela a tirar sua vida. Maldita seja! Não daria esse privilégio a um homem que certamente chegaria a um orgasmo, se ela morresse por causa de sua brutalidade. Apesar de sua determinação em recorrer à últimas das opções, não obstante, prevalecia seu desejo de viver. Tinha ouvido boatos de um estabelecimento, em Swanton Lane, onde as prostitutas podiam ir para comer um prato quente. Dizia-se que as mulheres que o dirigiam, por vezes, ajudavam as meninas encontrar um emprego respeitável sob outro nome. O que tinha a perder? Pensou Daisy. Mas teria que agir com muito cuidado. Madame Phoenix era uma mulher fria e sem escrúpulos. Falava-se que tinha sido responsável pelo desaparecimento misterioso de sua antecessora. E o homem com o rosto duro que recebia em seus aposentos parecia, inclusive, ainda mais perigoso. Daisy tremeu. Quando Madame Phoenix descobrisse que uma de suas prostitutas tinha fugido para o estabelecimento de Swanton Lane, ninguém poderia imaginar o quão longe poderia ir com o seu castigo. 139


Consideraria um péssimo exemplo para o resto das mulheres da Phoenix House.

Capítulo 17

O bilhete de Miranda Fawcett chegou na manhã seguinte. Anthony ainda estava em casa quando recebeu aviso de Louisa. Chamou uma carruagem e foi para a Plaza Arden imediatamente. Uma mistura perturbadora de entusiasmo e desejo lhe atingiu quando o veículo parou diante das escadarias do número doze. Percebeu que a excitação que experimentava não tinha nada a ver com o próximo encontro com Miranda Fawcett. Excitava-lhe a ideia de ver Louisa, de sentar-se perto dela no coche. Droga! O que estava acontecendo com ele? Ele não conseguia se lembrar da última vez que havia se sentido assim, simplesmente porque iria fazer uma curta viagem de coche com uma senhora. Louisa estava esperando vestida de preto, com luvas combinando e um véu cobrindo o rosto. Ele se perguntou se era um dos vestidos que foram usados após a morte de seu marido. A ideia de que Louisa tinha amado outro homem o deixado irritado por algum motivo. Afastou esse pensamento. Teve que admitir que o vestido e o véu formasse um excelente disfarce. Até agora, não tinha percebido o anonimato perfeito das viúvas que andavam pelas ruas vestidas de luto. 140


―Com que frequência você precisa se disfarçar no trabalho? ― perguntou ele a ajudava a entrar no carro. ―Descobri que o luto das viúvas pode ser muito útil em diversas ocasiões ― disse ela, enquanto se sentava. Anthony sentou-se em frente. Louisa olhou para ele através do véu, mais convidativamente misterioso do que nunca. Ele se esforçou para se concentrar no assunto em questão. ―O que disse a Sra. Fawcett? ―Apenas escreveu um nome e um endereço na Rua Halsey ― disse Louisa. Ele deu um rápido olhar no bilhete que ela lhe deu. ―Benjamin Thurlow. Ela levantou o véu negro que lhe cobria o e olhou para ele com um rosto radiante, os olhos brilhando de emoção por trás dos óculos. Anthony perguntou-se se ela teria esse aspecto quando era dominada pela paixão ou se era apenas o seu trabalho como jornalista que inspirava tanto entusiasmo. ―Conhece o Sr. Thurlow? ― ela perguntou. Refletiu um momento e então balançou a cabeça. ―Não ― Anthony se levantou, ergueu a escotilha do veículo e falou com o motorista ― Para a Rua Halsey, por favor. ―Sim, senhor. O veículo entrou na neblina fazendo um ruído surdo. ―Sem dúvida, o próximo passo é interrogá-lo ― disse Louisa ― Mas, devemos ser sutis. Não queremos mostrar as nossas cartas. ―Eu entendo, Sra. Bryce ― disse Anthony suavemente ― Vou me esforçar para ser discreto. Tenho certeza que vou conseguir seguir o seu excelente exemplo. Eu não sei como expressar a minha gratidão pelos 141


ensinamentos sobre o trabalho de investigação que recebo de você. Certamente eu tive muita sorte em conhecê-la. Quem sabe os graves erros que eu poderia ter cometido se não tivesse você para me dar lições na delicada arte de investigar com sutileza. Ela torceu o nariz. ―Desculpe-me. Jamais me atreveria a dar sermões. Temo que eu não esteja acostumada a trabalhar em equipe. ―Parece que nós dois teremos que nos adaptar. ―Acho que sim. Anthony esticou as pernas e cruzou os braços. ―Você leva sua profissão muito a sério, não é? Não é uma diversão ou um jogo para você. ―Você pensava que era? ― perguntou Louisa. ―É difícil imaginar que uma mulher em uma posição obviamente confortável como a sua, empreenda uma carreira como jornalista. ―Acho que é muito satisfatória. ―Sim, eu posso ver. Você tem outros informantes, além de Miranda Fawcett? ―Oh sim ― disse ela ― Claro, Miranda é muito útil, e como você tem podido ver, conto também com a vantagem dos contatos sociais de Emma e seu conhecimento da alta sociedade ― fez uma pausa ― Mas, ocasionalmente, eu também confio em outra fonte. ―De quem se trata? ―Roberta Woods. Uma mulher que dedicou sua vida a ajudar as mulheres que, por qualquer motivo, têm sido forçadas a ganhar a vida nas ruas. Ela dirige um pequeno estabelecimento na Swanton Lane, que serve refeições para mulheres carentes. Também envia ajuda às solicitações de um lugar chamado "A Agência". 142


―A que se dedica? ―A ensinar as mulheres a usar uma nova invenção: a máquina de escrever. Você já ouviu falar dessas máquinas, Sr. Stalbridge? Anthony sorriu. ―Meu pai inventou uma. Ainda está trabalhando para aperfeiçoá-la. Ele está convencido de que irá revolucionar muitos aspectos da indústria e comércio. ―Tem razão ― De repente, Louisa brilhou de entusiasmo ― É um dispositivo maravilhoso. “A Agência” costuma dizer, que em breve não haverá nenhum estabelecimento no país que não tenha um. Claro, isso significa que há uma crescente demanda por pessoas qualificadas para usálos. ―Eu entendo. A Agência fornece datilógrafas aos empresários – concluiu Anthony. ―Sim. Já que se trata de uma habilidade rara, muitas empresas estão felizes em contratar mulheres para preencher o cargo. Na “A Agência” me asseguraram que as máquinas de escrever estão abrindo um novo campo de trabalho respeitável para mulheres. É muito emocionante. ―Eu sei que o campo profissional das mulheres é muito limitado ― admitiu. ―Poucas são as que se acham completamente a salvo de acabarem na rua. Mesmo senhoras das classes superiores da sociedade procuram a Swanton Lane. Geralmente são viúvas cujos maridos não deixaram um tostão sequer, as deixaram com dívidas, aí elas são obrigadas a venderem seus corpos para comprar comida ou pagar um quarto. ―Eu vejo que se interessa bastante pela instituição de Roberta Woods. Como você ficou sabendo sobre sua existência?

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―Quando eu vim morar com Emma, me ocupei de atender às suas obras de caridade. Faz anos que ela ajuda a financiar o estabelecimento de Miss Woods. A Senhorita Woods e eu somos muito amigas. Ambas compartilhamos um interesse comum quando se trata de denunciar cavalheiros da alta sociedade que abusam de outras pessoas. Ele a observou e perguntou: ―Que tipo de informações obtem a partir deste lugar? Ela sorriu tristemente. ―Você ficaria surpreso como as mulheres da noite conhecem bem os cavalheiros bem nascidos. ―Eu nunca tinha pensado nisso, mas

posso imaginar que as

prostitutas são uma excelente fonte de informação. Ela olhou para ele. ―Na Swanton Lane foi onde eu me inteirei que Hastings era um visitante assíduo da Phoenix House há vários meses. Agora, ele tem um encontro semanal. E, me garantiram que, por hipótese nenhuma o cancela. ―Interessante. Ela franziu a testa. ―Não lhe parece estranho que um cavalheiro visite toda semana um bordel? ―Receio que não seja tão incomum, Louisa. ―Oh. Ele sorriu. -Se isso a preocupa, lhe asseguro que eu não tenho esse costume. Ela corou. ―Eu não quis insinuar nada, senhor. Ele a tinha deixado bastante envergonhada, pensou Anthony.

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―Conte-me mais sobre o golpe da mina da Califórnia. Lembro-me de ficar impressionado com os detalhes que I. M. Phantom deu à imprensa. Como você conseguiu tanta informação? ―Como Miranda lhe disse ― Louisa começou a explicar ― fui vêla um dia depois de ouvir aquela conversa. Eu não esperava que me recebesse, e muito menos que confiasse em minha palavra. Mas para minha surpresa, não só me convidou para sua casa, mas ouviu o que eu tinha a dizer. Concebemos um plano. ―Explique. ―Miranda é, sem dúvida, uma atriz excelente. Quando os homens entraram em contato com ela para assinar os papéis definitivos, ela interpretou uma mulher que ingênua e felicíssima de ter a oportunidade de participar de um investimento com dois cavalheiros distintos. Me escondi atrás de uma porta de serviço, ouvindo cada palavra e tomando notas. ―Qual foi o próximo passo? ― Anthony pediu, fascinado. ―Enviei um telegrama para o diretor do novo jornal na cidade da Califórnia, onde se supunha que houvesse uma mina de ouro. Ele teve a gentileza de me responder imediatamente, dizendo que não havia mina nenhuma nos arredores. Ele suspeitou que fosse uma fraude e pediu-me para ter cuidado. Ele acrescentou que gostaria de publicar detalhes em seu jornal. ―Foi assim que ocorreu a você a ideia de converter-se em uma correspondente? ―Sim ― disse Louisa ― Imediatamente pedi uma entrevista com o diretor e editor do The Flying Intelligencer. Reunimo-nos e discutimos a minha oferta para escrever uma série de reportagens sobre notícias esporádicas obtidos nos círculos da alta sociedade, para chamar de alguma

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forma, começando com a notícia de um golpe organizado por dois cavalheiros proeminentes. ―Suponho que não perdeu a oportunidade? ―O Sr. Spraggett não hesitou nem por um momento ― ela respondeu com uma nota de orgulho. ―Isso não me surpreende ― Anthony olhou para ela por um longo momento ― Se não for uma questão muito pessoal, posso perguntar o que aconteceu com o Sr. Bryce? ―Infelizmente, ele teve uma febre logo depois de nos casarmos. Disse com muita suavidade, notou ele, e com um certo toque de tristeza. ―Minhas sinceras condolências, senhora. ―Obrigada. Isso aconteceu há alguns anos atrás. A dor da perda já desapareceu ― ajeitou os óculos e assumiu uma expressão de determinação ― Nós devemos pensar no que vamos dizer ao Sr. Thurlow. ―Seria melhor esperar no carro enquanto eu falo com ele. ―Absolutamente não. Ele balançou a cabeça, aceitando o inevitável. ―Eu senti que eu ia dizer isso.

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Capítulo 18

A Rua Calle acabou sendo um pequeno e estreito beco, em uma zona modesta da cidade. Envolto em uma névoa espessa, parecia existir em um mundo separado e solitário. Louisa estudou a cena através da janelinha do coche. O bairro parecia deserto e sem trânsito. Anthony deu ao condutor a ordem para parar, abriu a porta, saltou do veículo e desceu o estribo. Louisa ajustou o véu e se deixou ajudar para descer do veículo. ―Seria muito amável se nos aguardasse – disse Anthony ao cocheiro. ―Sim, senhor – o homem se recostou no enconsto do seu assento e sacou uma cigarreira do bolso ― Estarei aqui quando voltarem. Louisa caminhou junto a Anthony através da bruma até a porta da residência de Thurlow. Anthony bateu na porta com grosseria. Não houve resposta. ―Que estranho – disse Louisa ― Posso imaginar que o Sr. Thurlow tenha saído, porém esperava que houvesse uma governanta. Anthony olhou pensativo para as janelas fechadas por pesadas cortinas. ―Se existir uma governanta deve ter saído para as compras. Algo em seu tom de voz chamou a atenção de Louisa. ―Está pensando em quê, senhor? ―Que, obviamente, teremos que voltar em outra hora. Segurando-a pelo cotovelo, dirigiram-se para a carruagem que os esperava.

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―Ora! – ela parou, obrigando-o a deter-se também ― Não pense que pode me enganar tão facilmente, senhor. Está planejando livrar-se de mim para voltar aqui sozinho, forçar a porta da casa do Sr. Thurlow e dar uma olhada por dentro, não estou certa? ―Fere-me com a sua falta de confiança, senhora. ―Farei muito mais que isso se continuar tentando deixar-me de fora ― protestou Louisa. ―Você está sonhando se acredita que vou permitir que entre furtivamente na casa de Thurlow comigo. Não serei responsável por sua prisão, acusada de invasão e roubo. Ela olhou para o beco vazio. ―Não vejo nenhum sinal de agentes policiais, nas imediações. Se tivermos cuidado, é muito improvável que nos prendam. Ninguém prestará atenção em nós, se entrarmos pela porta principal. Se formos visto por alguém, pensará que o ocupante da casa nos deixou entrar. ―É muito provável que a porta principal esteja fechada com a chave, Sra. Bryce. ―Tenho certeza de que uma pessoa capaz de arrombar um cofre forte Appolo não terá grande dificuldade para abrir a fechadura de uma simples porta. Ficarei atrás de você enquanto realiza o seu trabalho. Minhas saias dissimularam suas...ações. ―E, se por um acaso, alguém questionar a nossa presença na casa?― perguntou ele. ―Diremos que somos amigos do Sr. Thurlow e que tínhamos motivos para estar preocupado por sua saúde. ―Hum! ― olhou para ela pó alguns segundos ― Não está mal. Não está nada mal.

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―Tivemos que entrar para nos assegurar de que não estivesse enfermo – prosseguiu Louisa alegremente ― Quem nos contradirá? ―Talvez o próprio Thurlow, se, por casualidade, aparecer enquanto estamos revistando a sua casa? ―É pouco provável que chame a polícia, uma vez que lhe informaremos que estamos a par de sua participação em uma rede de chantagem – disse ela. Os dentes de Anthony brilharam em um sorriso sagaz. ―Sra. Bryce, você e eu temos a tendência de pensarmos igualmente quando se trata de certos assuntos. ―É verdade, senhor ― sorriu, ciente de seu entusiasmo diante do que viria ― E agora, será que colocaria suas mãos à obra, por gentileza? ―Não vou demorar muito ― pôs a mão na maçaneta da porta e tentou girá-la. A porta se abriu com facilidade ― Na verdade, não fiz absolutamente nada. Louisa franziu a testa. ―O Sr. Thurlow deve ter esquecido de trancar a porta, ao sair ― ela disse. Anthony empurrou a porta, e esta se abriu mostrando um vestíbulo vazio. Louisa não gostou do silêncio pesado que reinava na casa de Thurlow. Sentiu seu cabelo da nuca eriçar-se. Stalbridge entrou na obscura entrada. Havia algo quase animal em sua atitude alerta que a fez tremer de novo. Ele também pressentia uma catástrofe. Ela o seguiu, levantou o véu e olhou em torno. A casa de Thurlow era a morada apropriada de poucos recursos. Notou que a sala era muito pequena e parcamente mobiliada. O corredor que levava até a cozinha e uma porta traseira que provavelmente dava em 149


um beco. Uma escada estreita, envolta na obscuridade, se comunicava com o andar superior. Anthony fechou a porta. ―Há alguém em casa? ― gritou alto o suficiente para ouvi-lo no andar de cima. O silêncio ecoou de maneira quase sufocante. Louisa correu um dedo pela superfície do console do corredor. Sua luva ficou ligeiramente manchada. ―Tem uma mulher que limpa a casa, mas, aparentemente, eu diria que não vêm todos os dias. -O que explicaria o motivo por não estar aqui hoje ― concluiu Anthony. Entrou na sala e abriu as gavetas da escrivaninha. Puxou um maço de papéis de uma delas e olhou rapidamente. ―Alguma coisa interessante? – perguntou ela. ─Faturas de seu alfaiate de contas e outros fornecedores a quem deve dinheiro. Anthony voltou-se para deixar o maço de papéis na gaveta e tirou um pequeno caderno. Folheou-a ─ A Sra. Fawcett estava certa. Thurlow é um jogador compulsivo. ─O que encontrou?- perguntou Louisa, tentando olhar por cima do ombro. ─Uma lista das pessoas a quem deve dinheiro ─ Anthony folheou mais algumas páginas ─ É evidente que se endivida constantemente, e então, de alguma forma, consegue pagar seus credores. ─Nesse caso, deve ganhar de vez em quando. ─As dívidas mais antigas são de quase três anos. Algumas são muito elevadas. Vários milhares de libras em alguns casos ─ Anthony tornou a colocar o livro na gaveta. 150


Ela o seguiu enquanto inspecionavam o resto dos cômodos no piso térreo. Tudo parecia em ordem. Era como se Thurlow tivesse saído poucos minutos antes que eles chegassem. Quando eles voltaram para o saguão, Anthony subiu as escadas. Louisa se apressou a segui-lo. A sensação de que algo ia mal só aumentava. Uma vez que estava no andar de cima, Anthony parou para examinar o pequeno corredor que terminava na frente de uma porta trancada. Louisa também parou, inexplicavelmente gelada. ─O que está acontecendo? ─ perguntou. ─Espere aqui ─ disse calmamente ─ Pode ser que esteja dormindo. Os jogadores tendem a dormir durante o dia. Louisa ignorou a ordem, mas fez questão de manter uma distância prudente dele. A última coisa que queria fazer era entrar em um cômodo onde um homem estava dormindo. Anthony não parecia notar a sua presença. Toda a sua atenção concentrou-se na porta fechada no final do corredor. Ele bateu uma vez. Não recebendo resposta, girou a maçaneta. A porta se abriu com um longo e lúgubre rangido de dobradiças. Ele ficou na porta, observando o dormitório semi escuro e com cortinas fechadas. Não se moveu. O medo contraía os nervos de Louisa. Não queria aproximar-se, mas forçou-se a vir até a porta. Um odor inconfundível de sangue e morte emanava do cômodo. ─É melhor você ficar longe - Anthony disse-lhe com voz fria e séria. Ele tirou um lenço da manga e tapou o nariz com ele. A seguir olhou para o quarto. Um homem jazia deitado de costas na cama, os lençóis e o edredom, mexidos, o cobriam apenas da cintura para cima. Tinha uma ferida terrível na cabeça. O travesseiro de linho branco estava encharcado de sangue. 151


Uma visão infernal parecia se materializar no ar antes dela. "Lord Gavin tinha o mesmo aspecto quando caiu morto no chão de seu quarto." - Louisa? ─ a voz de Anthony soou forte e brutal ─ Você vai desmaiar? ─Não ─ se recompôs com esforço ─ Eu não vou desmaiar. Ele notou que o morto tinha o braço dobrado e uma das mãos não muito longe da cabeça. Os dedos sem vida rodeavam a coronha da pistola. ─Meu Deus ─ ela sussurrou ─ Ele se matou. Anthony entrou no quarto e se aproximou do corpo para observá-lo de perto. ─Ora, ora, isso é interessante ─ disse ele. Louisa ficou impressionada com a incrível falta de emoção na voz de Anthony. Parecia que estava fazendo uma observação sobre o tempo. No entanto, viu que seu rosto tinha endurecido e seus olhos estavam frios. ─O que você quer dizer? ─ conseguiu perguntar. ─Gostaria de saber quais são as chances de dois funcionários de Hastings decidirem suicidar-se com pouco mais de duas semanas de intervalo ─ ele contestou.

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Capítulo 19

Ele viu que Louisa afastava os olhos da cena sangrenta. ─Tem certeza de que não vai desmaiar? ─Eu já disse que estou bem. ─Volte para baixo – disse baixinho ─ Não há necessidade de ficar neste quarto. Ela não respondeu à sugestão. ─Certamente se encaixa na descrição que as jovens deram em seus diários. Foi, sem dúvida, um jovem excepcionalmente bonito. E, parece ter de cerca de vinte anos. Anthony voltou-se para analisar a cena com cuidado. A bala tinha causado danos consideráveis à cabeça de Thurlow, o sangue havia manchado o seu cabelo loiro, mas seu rosto praticamente não mudou. Realmente tinha o tipo de características que atraía os olhares das mulheres. Ele se virou para Louisa. A jovem tinha sua atenção fixa em uma folha de papel descansava sobre uma cômoda não muito alta. ─O Sr. Grantley deixou um bilhete? ─ perguntou delicadamente. ─De acordo com Fowler, sim. Ele cruzou o quarto, pegou o bilhete de suicídio e leu em voz alta: "Eu não posso suportar a vergonha que me espera. Minhas desculpas a minha família. " ─Que vergonha? ─ perguntou Louisa, olhando para ele ─ Você acha que ele estava se referindo a suas dívidas de jogo? ─Não parece que se preocupou muito no passado. Por que sentiria a necessidade de tirar a vida agora? 153


Ela assentiu com a cabeça. ─É uma boa pergunta. ─Não é um suicídio – concluiu Anthony olhando para o quarto. ─Eu estou inclinada a pensar o mesmo ─ disse Louisa. ─Eu me pergunto se Hastings se livrou de seus dois funcionários pelas mesmas razões ─ disse Anthony. ─Talvez ele achasse que tinha razão para temê-los ─ deduziu Louisa ─ É possível que acreditasse que conspiravam contra ele, coisa que explicaria por que contratou os dois guardas. ─Sim. Ela olhou para ele com olhos tristes e sombrios. ─O que faremos agora? ─Eu vou imediatamente avisar Fowler. Com certeza, vai querer investigar este novo acontecimento o mais cedo possível. Ela firmemente as mãos. ─Sim, claro. ─Mas, primeiro ─ disse Anthony ─ vou enviá-la para casa na carruagem. Não é preciso esperar aqui até a chegada de Fowler. Posso dizer-lhe tudo o que precisa saber. Um sinal de alívio iluminou seu rosto antes que recuperasse a compostura. ─Você tem certeza? ─Sim. Ela olhou para ele com os olhos semicerrados. ─Você pretende mencionar o meu nome? ─Eu não vejo necessidade. ─Eu só preocupo em proteger a minha identidade como I. M. Phantom ─ ela disse suavemente. 154


─Eu entendo. Ele deixou o bilhete sobre a cômoda e voltou ao seu lado para pegála pelo braço. ─Venha, tenho que tirá-la daqui. Ele acompanhou-a até o primeiro piso. No salão, parou diante da mesa para escrever uma nota curta. ─Tem certeza que é seguro aqui? ─ Louisa perguntou ─ E, se o assassino voltar? A ansiedade que havia em sua pergunta o pegou desprevenido. Percebeu que ela estava realmente preocupada, talvez, inclusive, assustada por ele. ─O assassino poderia ser Hastings, ou talvez não ─ Anthony dobrou o bilhete ─ Em todo caso, eu não creio que se arrisque a voltar à cena do crime, pelo menos não até depois de terem encontrado o corpo e a notícia se espalhado. ─Como você pode ter certeza disso? ─Quem quer que seja assumiu um grande risco quando veio até aqui para cometer um assassinato. Não correrá outro se puder evitar. Agora, só deve estar pensando em sua própria segurança. ─Terá cuidado não é, Sr. Stalbridge? ─ disse, de repente, muito ansiosa. ─Sim ─ ele prometeu, estranhamente comovido ─ A carruagem vai levá-la diretamente para casa ─ Passarei para buscá-la, esta noite, às oito. Ela enrijeceu. ─Por quê? ─Nós dois fomos convidados para a recepção de Lorrington, lembra? Ela estremeceu.

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─Eu tinha esquecido. Desculpe-me, senhor, mas não estou com vontade de participar de qualquer evento social esta noite. ─Desculpe-me, Louisa, mas creio que seria melhor se fossemos vistos em público, esta noite. É vital nós agirmos como se nada fora do comum tivesse acontecido. Ela hesitou, depois assentiu com relutância. ─Suponho que tenha razão. Meu Deus! Você acha que Hastings vai estar lá? ─Eu não sei, mas haverá muitas pessoas. Se estiver, tenho certeza que podemos evitá-lo. ─Quando eu chegar em casa, redigirei a notícia da morte para enviála ao Sr. Spraggett. Ainda há tempo para fazer com que apareça na edição de manhã do The Flying Intelligencer. Anthony ponderou brevemente. ─Uma grande ideia. Pelo menos o assassino vai ficar nervoso ao ler que a polícia considera a possibilidade de que se trata de um crime. ─A menos que não seja bem assim ─ disse ela secamente ─ A polícia nem sabe ainda que o Sr. Thurlow está morto. ─Desde quando pequenos detalhes como esse impedem uma intrépida jornalista de relatar os fatos? Ela sorriu ironicamente. ─É verdade. Eu vou me assegurar de incluir algumas obscuras insinuações de um possível assassinato ─ hesitou ─ Você realmente acredita que Hastings matou o Sr. Thurlow, não é? ─Eu acho que é possível ─ ele corrigiu calmamente ─ Precisamos de mais informações. ─Esse parece ser o problema principal desta investigação: a falta terrível de informações. 156


Ele baixou o véu para cobrir seu rosto. ─Eu não vou discutir com você, por essa razão ─ disse amavelmente. Ele acompanhou-a até a rua e ajudou a entrar no carro. Quando ela se sentou, fechou a porta e deu ao motorista a nota que ele havia escrito. ─Depois que você tiver deixado a senhora em casa, faça o favor de ir até a Scotland Yard e entregue essa mensagem ao detetive Fowler. ─Sim, senhor. O cocheiro guardou a nota. ─Deve entregá-la apenas a Fowler – reafirmou Anthony, entregando o dinheiro para o cocheiro ─ Fui claro? Se você tiver que esperar, faça-o. O cocheiro contou as moedas e balançou a cabeça vigorosamente. ─Não se preocupe com nada, senhor. Vou me assegurar de que a nota chegue ao tal Fowler. ─Obrigado. O cocheiro bateu com o chicote nas ancas do cavalo. O coche começou a andar com grande ruído

e quase que imediatamente

desapareceu no nevoeiro. Anthony voltou para casa de Thurlow e se dirigiu às escadas que conduziam ao primeiro andar. Quanto mais degraus subia, mais esforço era necessário fazer para seguir em frente. A atmosfera de morte que respirava era tão grossa como o nevoeiro da rua. Uma vez no quarto, a primeira coisa que fez foi se dirigir para o armário. As jaquetas e calças eram cortadas de acordo com os ditames da moda. As camisas feitas sob medida estavam recém-lavadas e passadas com cuidado. Encontrou na cômoda um porta joias de couro. Dentro havia vários pares de abotoaduras valiosas, um relógio de bolso de ouro, finamente gravado, e um alfinete de gravata adornado com uma pérola. Perto, havia 157


uma escova com cabo de prata, um pente e um recipiente de gel de cabelo. Thurlow prestava muita atenção à sua aparência. Anthony foi para a cama e passou a estudar o corpo. Obrigando-se a ignorar o sangue, se fixou nos detalhes. As áreas do cabelo e do bigode, que não estavam manchados de sangue, pareciam cortadas de acordo com os últimos ditames da moda. A camisola de dormir era bordada. Ele pensou no que disse Louisa, realmente era um homem excepcionalmente bonito. Iniciou uma busca completa e metódica da habitação, olhando em lugares onde um homem poderia esconder os seus segredos. No armário, encontrou um cofre, escondido sob um fundo falso em madeira. O segredo era excelente, concebido por um dos melhores fabricantes de Willenhall, mas não era um cofre forte Apollo. Levou menos de quinze segundos para arrombá-lo. A única coisa que havia dentro era uma caderneta que, à primeira vista, continha o registro de grandes somas de dinheiro pertencentes ao jogo. No entanto, tinha apenas cinco entradas. As datas eram de quase três anos atrás. Ao lado dos números havia iniciais, e essas iniciais correspondiam com as das jovens que ele havia comprometido. Se deu conta de que estava olhando para uma lista dos pagamentos que Thurlow havia recebido em troca de comprometer nas garras de Hastings as vítimas de chantagem. Ele colocou a caderneta no bolso e ficou ali, imóvel, observando o quarto pela última vez. Algo lhe escapou. Contemplou os artigos da cômoda durante um longo momento, tentando entender o que não estava no lugar. Manchas vagas sobre a fina camada de pó nos móveis e alguns poucos lenços, descuidadamente dobrados em uma gaveta, era tudo o que 158


se destacava. Quando ele não conseguiu encontrar a solução, voltou para o térreo. Seguindo um palpite, decidiu voltar a revistar a mesa, desta vez com muito mais cuidado. Ao abrir a pasta com contas a pagar, de repente soube o que estava errado. As facturas não estavam em ordem. O resto das coisas que havia na casa de Thurlow estavam cuidadosamente ordenadas, mas as contas foram armazenadas em uma pasta sem qualquer ordem. Era como se alguém tivesse revistado de forma apressada e, em seguida, jogadas na gaveta. Com essa observação em mente, continuou a busca. Quando terminou, tinha certeza de sua conclusão. Logo depois, uma carruagem parou ruidosamente na rua, em frente à porta. Ele se aproximou da janela e levantou a cortina a tempo de ver como a figura sombria de Harold Fowler descia do coche. Abriu-a antes que Fowler batesse na porta Fowler. ─Eu recebi a sua mensagem, Sr. Stalbridge. ─ Fowler entrou no vestíbulo, tirou o chapéu e olhou em volta com curiosidade imperturbável de um homem que está acostumado a ser chamado por razões desagradáveis. ─ Do que se trata? ─O ocupante desta casa, Benjamin Thurlow, jaz morto no andar de cima. Aparentemente, desesperado por incapacidade de pagar suas dívidas de jogo, deu um tiro na cabeça. Há uma nota de suicídio. As palavras foram cuidadosamente escritas em letras maiúsculas. ─Em letras maiúsculas, diz você? ─ Fowler franziu o farto bigode. Seus olhos tristes se avivaram ─ Como na nota de Grantley ... ─Sim. ─ entregou o papel para Fowler ─ Letras maiúsculas tornam impossível comparar as escritas, mas eu suspeito que Thurlow não escreveu a nota. 159


Fowler levantou a nota com sua grande mão e examinou atentamente por alguns segundos. Ao levantar os olhos, seu olhar era triste. ─Concordo com você, senhor, mas nunca poderemos provar que o assassino escreveu a nota. ─Outra coisa ─ acrescentou Anthony ─ Também não há como provar, mas eu poderia jurar que alguém revistou a casa antes de minha chegada. ─Entendo. Fowler estreitou um pouco os olhos. ─Que tipo de informação o trouxe aqui hoje? ─Me disseram que Thurlow, assim como Grantley, trabalhava para Hastings. Parece que, no passado, Hastings pagou-lhe grandes somas de dinheiro em várias ocasiões. Queria falar com ele. ─Você está pensando que Hastings o matou, não é? ─Eu acho que seja muito provável, sim. Mas, isso não me ajuda a encontrar um motivo para o assassinato de Fiona Risby. E agora, outra pessoa que poderia ter uma resposta à minha pergunta, está morta. O rosto sombrio de Fowler suavizou-se. ─Eu o avisei, Sr. Stalbridge, que as chances de descobrir alguma coisa nova após todo esse tempo são realmente muito poucas. Meu conselho é deixar que a pobre menina morta descanse em paz. ─Você não entende - disse Anthony ─ Sou eu quem não pode descansar, detetive. Devo descobrir por que ela foi assassinada. ─Na minha experiência, só há um pequeno número razões para se cometer um crime. A ganância, a vingança, a necessidade de esconder um segredo, e loucura.

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Capítulo 20 ─Você está bem? ─ Anthony perguntou suavemente. Louisa estava olhando os jardins iluminados pela lua. Era quase meia noite. Algumas lanternas dispersas balançavam. À sua direita, elevavam-se as elegantes formas da estrutura de ferro e vidro que cobria o grande jardim de inverno. Atrás deles, o concorrido salão brilhava animado. Uma torrente de risos e música se filtrava através das portas de vidro abertas de par em par. ─Sim, claro – respondeu ela, reprimindo um calafrio. Porém, o esforço de fingir que se divertia durante as duas últimas horas, começava a cobrar o seu preço. Seu sorriso era forçado. Queria voltar a Praça Arden e beber um grande cálice de conhaque ─ Já podemos ir? ─Em um minuto – prometeu Anthony ─ Vamos dar um passeio. ─Bom, ao menos, agora, sabemos que tipo de serviço o Sr. Thurlow fazia para Elwin Hastings – disse ela ao fim de um momento ─ Comprometia as vítimas e logo após roubava-lhes o diário e as cartas, para entregar à Hastings. ─Era um jogador compulsivo. O que significa que sempre tinha necessidade de grandes somas de dinheiro para saldar às suas dívidas. Hastings se mostraria disposto a pagar bem por artigos que pudessem ser objeto de chantagem. Grantley, sem dúvida, devia se ocupar de cobrar o dinheiro. Não imagino Hastings fazendo esse tipo de trabalho. Desceram os degraus do terraço e seguiram por um caminho de grama que serpenteava pelo jardim cuidadosamente desenhado. Não era o único casal que havia saído para respirar um pouco de ar, fora do calor e da agitação que havia no salão de baile, percebeu Louisa. Ouviu as vozes que 161


sussurravam nas sombras, o riso suave de um homem, as saias brancas do vestido de uma mulher, brilhando fugazmente à luz da lua antes de sumir atrás de obstáculo. A última coisa que desejava aquela noite era comparecer a um baile, porém concordava com o motivo apresentado por Anthony. Deviam agir como se nada fora do normal houvesse acontecido esta tarde. Para Anthony não parecia haver lhe custado nada, mas ela levou toda tarde e toda a noite combatendo uma desagradável ansiedade. A verdade era que a descoberta do cadáver de Thurlow algumas horas antes, havia alterado seus nervos muito mais do que havia imaginado na hora. O cenário do assassinato havia reavivado o terror e o medo que avia experimentado, há pouco mais de um ano. Era incapaz de afastar a imagem de Gavin de sua cabeça. Sabia que por mais tarde que se deitasse na cama essa noite, por mais conhaque que bebesse, quando chegasse a casa, era improvável que adormecesse o que não seria de todo ruim, pensou. Se conseguisse manter-se acordada, certamente não teria pesadelos. Anthony a fez parar próximo da entrada da grande estufa. A estrutura de cristal brilhava opaca à luz prateada da lua. ─Aqui poderemos conversar sem problemas ─ disse Anthony calmamente. Ela sentou-se no banco de mármore. As saias de seu vestido derramaram-se em torno de seus tornozelos. Ficou pensativa e voltou a se arrepiar. ─Você está com frio? ─ perguntou Anthony. ─Um pouco ─ não poderia dizer-lhe o quanto a cena do crime havia mexido com ela. Pensaria que ela não tinha sangue frio para continuar com a investigação ─ O que fazemos? Com Victoria Hastings, Thurlow e Grantley, todos convenientemente mortos, não temos mais pistas para 162


seguir. Não parece haver ninguém que conheça os segredos de Elwin Hastings. Anthony colocou um pé no banco ao lado dela, e descansou o antebraço sobre a coxa. ─A única coisa que podemos fazer é seguir fazendo perguntas. Louisa tentou se concentrar no problema. ─Me ocorreu que há um lugar onde talvez conheçam os segredos de Hastings ─ disse ela. ─Onde? ─O bordel onde tem seus encontros semanais. ─Phoenix House? ─ guardou silêncio por um tempo, e em seguida concordou lentamente – Uma ideia interessante. Ela enrugou o nariz. ─Espero que não me vá dizer que marcará uma hora para você mesmo, em uma penitência, investigar essa teoria. Ele sorriu ligeiramente. ─Duvido que sirva de alguma coisa. Não é provável que eu consiga convencer alguma mulher que trabalhe ali a confiar em mim, em tão pouco tempo. Porém, parece que você ganhou a confiança de alguém que conhece algumas delas. ─Refere-se à Roberta Woods, de Swanton Lane. ─Sim ─ ele disse. ─Vou pedir-lhe que faça algumas averiguações discretas. ─Excelente. Por enquanto, só espero que Clement Corvus dê sinais de vida. Sem dúvida, deve saber muito sobre os negócios de Hastings. ─Não posso imaginar um chefão do crime que queira revelar-nos suas atividades ilegais – comentou ela. ─Veremos. 163


Louisa arqueou as sobrancelhas. ─Você acredita realmente que entrará em contato conosco? ─É possível. ─Mas, por que faria uma coisa dessas? – perguntou ela. Anthony deu um sorriso débil. ─Apesar de seus negócios, ou até mesmo por causa deles, se diz que se rege por um solene código de honra. Entre outras coisas, me disseram que sempre paga suas dívidas. ─Quem lhe contou tantas coisas sobre Corvus? ─O detetive Fowler. Corvus e a Scotland Yard têm uma longa relação. Outra vez Fowler. Ela reprimiu outro arrepio. ─Está pensando que o Sr. Corvus sentir-se-á em dívida com você, por aqueles papéis, fossem o que fossem, que pediu à Miranda que os entregasse? ─Ou isso, ou se quiser obter mais alguma informação de mim. Nada é seguro nesse caso. Ela se abraçou. ─Se nossas suposições forem corretas, Elwin Hastings não cometeu um, mas talvez quatro assassinatos: o de Fiona Risby, a primeira senhora Hastings, Grantley e Thurlow. É difícil imaginar tamanha maldade. ─Assassinar se torna, sem dúvida nenhuma, mais fácil depois da primeira vez ─ disse Anthony. Louisa teve que lutar para não ficar de pé e gritar que ele estava errado, por mais justificado que fosse, assassinar alguém era uma experiência terrível, que perseguia a pessoa pelo resto da vida. Sem aviso nenhum, Anthony inclinou-se para frente, segurou-a pelos cotovelos e a colocou em pé. 164


─Silêncio! – ordenou quase beijando-a. Ela abriu a boca para perguntar o que estava fazendo, mas antes que pudesse pronunciar uma palavra, ele apertou-a contra seu peito e selou sua boca com um beijo exigente e apaixonado. Louisa não reagiu. Havia tomado uma decisão, pensou. Era melhor não voltassem a se beijarem. No entanto, enquanto repetia a si mesma a lógica de seu raciocínio, sabia que essa noite não seria capaz de resistir à tentação. Seus nervos estavam muito alterados. Desejava deixar-se consumir pelo fogo da paixão, para esquecer as cenas de morte que vagavam por sua mente como fantasmas. Rodeou seu pescoço com os braços e se apertou ainda mais contra ele. Então, ouviu o leve murmúrio de vozes no silêncio da noite. Um casal se aproximava pelo caminho que conduzia à estufa. Mais uma vez, Anthony a beijou para dar a impressão de que mantinham um relacionamento furtivo. Ela se sentiu invadida pela frustração. Queria ter certeza, de que a beijava porque a desejava. O homem começou a rir. ─Parece que teremos que procurar outro cenário, querida. Este, já está ocupado. Ela murmurou alguma coisa indistinguível em resposta. Louisa percebeu que as vozes foram se tornando mais fracas conforme o casal se mudava para outra área dos jardins, mas ela parou de prestar atenção. Agora, só conseguia pensar no que sentia nos braços de Anthony. O desejo tomou conta dela. Não importa que o beijo não tenha sido um ato de sedução. O impacto era semelhante a um relâmpago que incendiava seus nervos já sensíveis. Toda ela ardia por dentro. ─Anthony ─ sussurrou sem fôlego contra seus lábios.

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Ele emitiu um sussurro suave e rouco. Abraçou-a ainda mais fortemente, sua boca, de repente, agressiva e exigente. Agora o beijo era real, como ela o beijava. Havia tanta eletricidade entre eles, crepitando e soltando faíscas, que ficou surpresa por seus pelos não se eriçarem. Suas mãos percorriam suas costas, pressionando violentamente o corpete, solto e confortável, do seu vestido. Sentia-se inexplicavelmente desesperada, tremendo de necessidade. Presa em um turbilhão de força que só compreendia medianamente, agarrou os ombros de Anthony, como se sua vida dependesse dele, e devolveu o beijo. Ele retirou seus lábios e rodeou seu rosto com as mãos. ─Repita o meu nome. À luz imprecisa e sombria da lâmpada mais próxima, sua expressão não era a de um amante doce e gentil. O que ela viu em seu rosto era um desejo cru e urgente que combinava com o seu. ─Anthony ─ Ela tremia, mas desta vez não de nervoso. Todo o seu ser vibrava de emoção ─ Anthony. Ele afastou as mãos do seu rosto e rodeou sua cintura. Abaixou a cabeça e beijou sua garganta. A boca masculina, molhada e faminta sobre sua pele. Por um momento, sentiu os dentes. Uma estranha sensação a fez respirar profundamente. Era isto o que eu precisava. Esta paixão desesperada e intensa apagaria as imagens das cabeças ensanguentadas de Thurlow e Gavin, pelo menos por um tempo. Anthony a segurou em seus braços e levou-a até a porta do jardim de inverno. ─Abra – murmurou.

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Com a mão encontrou a maçaneta e girou-a. A porta se abriu de par em par. Uma rajada de calor úmido a envolveu e inalou a fragrância das flores, plantas e terra recém revirada, o perfume da vida, não da morte. Anthony cruzou o limiar com ela em seus braços e ficou próximo de uma mesa de trabalho. Retrocedendo seus passos, fechou a porta e trancoua com a chave. Em seguida, voltou junto a ela e abraçou-a, suas mãos estavam ocupadas em desabotoar o corpete de seu vestido. Ficou surpresa ao ver os dedos, tão habilidosos e sensíveis com os cofres e fechaduras, agora estavam trêmulos. Podia, inclusive, ouvir sua respiração, acelerada, urgente. Quando o tocou, descobriu que tinha os músculos do ombro rígidos, sob a casaca. Ela sentiu crescer uma espiral de esperança. Anthony tinha amado a sua querida Fiona, mas era possível que houvesse lugar em seu coração para outra mulher. Desabotoou o corpete. Ela estava imensamente agradecida pelas sombras profundas ao redor deles. O tecido leve de sua camisa era a única coisa cobrindo seus seios. Ele abaixou a cabeça e beijou sua garganta. Seu polegar roçou-lhe o mamilo, causando pequenos tremores. Ela agarrou seus ombros, que desejando explorar a força e o poder que encontrou ali, mas ele não lhe deu a oportunidade. ─Louisa, você não imagina o que fez comigo. Eu quero você. Eu preciso de você. Sem aviso, levantou-a no ar e a colocou na beirada da mesa. Tudo acontecia tão rápido que ela não conseguia pensar. Por outro lado, pensar era a última coisa que queria fazer. A seguir sentiu em seu seio que a boca havia substituído a mão. Sua língua umedeceu o tecido de sua camisa. 167


Experimentou uma necessidade premente. Entrelaçou os dedos no cabelo de Anthony, arquejando quando ele beliscou seus mamilos. Imediatamente, ele levantou a cabeça para silenciá-la com outro beijo apaixonado. Anthony recolheu as saias do vestido e levantou-as acima dos joelhos. Agarrou suas coxas por cima das meias e as separou. A pulsação de Louisa disparou. Ainda estava se adaptando à sensação extremamente agradável de intimidade com ele, quando ele introduziu os dedos através da abertura de sua calcinha rendada. A sensação de prazer que experimentou quando sentiu a mão na parte mais íntima do seu corpo foi chocante e deliciosamente excitante. ─Diga que me quer ─ sussurrou com voz rouca ─ Diga. Diga que você me quer tanto quanto eu quero você. ─Sim ─ Ela agarrou seus cabelos com mais força ─ Oh, sim. Sua cabeça estava girando. O mundo fora do jardim de inverno deixou de existir. Isso era o que significava ser consumida pela paixão. Ficou maravilhada com a excitante sensação. Os romancistas e dramaturgos tinham razão. Foi por isso que as pessoas mantinham relações proibidas. ─Você é tão suave ... ─ disse ele, acariciando-a intimamente ─ Você me deixa louco. Percebeu que Anthony estava abrindo a frente das calças. Olhando para baixo, viu que segurava, com uma mão o pênis ereto. Ele tirou um lenço de linho branco do bolso e colocou na mesa ao lado dela. Fascinada, moveu-se para tocá-lo, mas ele já estava afundando-se na cavidade úmida de seu corpo. A pressão aumentou seu ardor. Queria mais. Desesperada, pediu mais.

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Agarrando-a pelas nádegas, ele entrou em um único golpe violento, afundando todo o seu membro dentro dela. Um chicote de dor sacudiu os seus já alterados nervos. Perturbada pela transição abrupta de um desejo insuportável à uma realidade não tão agradável, lançou um grito abafado e ficou completamente imóvel. ─Maldita seja! ─ Anthony também congelou ─ Você é virgem. -Sim, bem, mas não vejo que isso seja nenhum problema. ─Por que diabos você não disse que era virgem? Ele parecia nervoso. Que direito tinha de estar zangado com ela? Era ela que estava com dor. ─Não pensei que fosse assunto seu ─ disse, mostrando o seu temperamento. ─Como você pode dizer que não é o meu assunto? ─ disse Anthony. A raiva tomou se apoderou dela, apagando um pouco do seu desconforto físico. ─Por Deus, senhor! Como poderia esperar que eu discutisse semelhantes detalhes íntimos da minha vida, com um cavalheiro que mal conheço. Ele olhou para ela com surpresa. ─Será que posso lembrá-la que você está fazendo amor com um cavalheiro que mal conhece? ─Nós não estamos fazendo amor ─ disse ela abruptamente, não querendo admitir o quanto essa verdade machucava-lhe ─ Estamos mantendo um caso ilícito. ─Eu entendo. E, você é uma autoridade no assunto, Louisa? ─As aventuras ilícitas são diferentes. Não existe nenhuma obrigação de confiar ao amante os seus assuntos pessoais.

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─Eu não posso acreditar que é você quem está me dando uma palestra sobre a natureza das aventuras ilícitas ─ disse, surpreso. Ela fez um gesto de dor. ─Eu acho que é melhor, humm, saia de mim, senhor. Como você pode ver não formamos uma boa dupla. ─Como você sabe? ─ perguntou, sem fazer o menor sinal de que ia deixá-la. ─Eu diria que é evidente. Você é muito grande para mim. ─Eu acho que somos um casal perfeito ─ disse ele. E, começou a se retirar. Ela prendeu a respiração. Porém, antes de se retirar totalmente, parou e empurrou gentilmente, possuindo-a por completo mais uma vez. Ela deu um grito surdo. ─Eu não acho que é uma boa ideia. ─Permita-me que lhe informe, Sra. Bryce, que você não é nenhuma especialista. Beijou-a profundamente, silenciando uma discussão. Repetiu o movimento, retirando-se quase completamente e logo a seguir voltando a preenchê-la completamente. Desta vez, a sensação não foi dolorosa, porém, não agradável. Estava tão tensa que mal podia respirar, mas não era uma sensação desagradável. Como era certamente previsível, despertou sua tremenda curiosidade, suprimindo a decepção. ─Muito bem, se você insiste ─ disse ela, escorregando um pouco mais, em um esforço para ficar mais confortável ─ mas, por favor, mais rápido. Anthony voltou a ficar parado, enterrado dentro dela.

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Ela abriu os olhos e viu que a olhava com uma expressão indecifrável. Penalizada, tomou seu rosto em suas mãos. ─Oh, não! Não era minha intenção magoar seus sentimentos ─ disse ansiosamente ─ Sinta-se livre para continuar. Não vou dizer uma palavra. ─Tenho a sua promessa? ─Totalmente, senhor. Como já fomos longe demais, é melhor acabar com este assunto. ─Tenha piedade, querida. Assim eu derreto, com essa conversa tão romântica ─ disse Anthony. Sentia-se envergonhadíssima. E, também furiosa. O resultado foi mistura altamente inflamável. Agarrou-lhe pelos ombros, empurrou-o em sua direção. ─Droga, Anthony! Acabe com isso de uma vez. Sem fôlego, ele disse algo, que ela não conseguiu entender, mas finalmente começou a se mover, empurrando novamente e novamente. Parecia que agora seu corpo havia se adaptado melhor. Embora as sensações que experimentava não fossem tão emocionante como tinha imaginado, não eram de todo desagradáveis. Se Anthony encontrava prazer, ela poderia tolerar o exercício. ─Droga! ─ parecia como se ele tivesse dificuldade em respirar ─ A culpa é toda sua esta noite você me fez perder o controle de mim mesmo. ─Como assim, é minha culpa? Do que você tenta me culpar? Como você se atreve, Anthony? ─Você prometeu não falar ─ disse ele com os dentes cerrados ─ Droga! Preocupada com o grito grave e selvagem, que acompanhou a maldição, ela abriu os olhos. ─Você está bem? 171


Ele não respondeu. Em vez disso, retirou-se bruscamente dela, pegou o lenço e enrolou a ponta do seu membro ereto com ele. Na escuridão, ele viu que tinha os seus olhos apertados, e seus lábios se abriram num gesto de silencioso gemido. Seus dentes ameaçadores brilharam no escuro. E, então acabou. Apoiou-se sobre a mesa, respirando pesadamente. Sem abrir os olhos. - Droga! ─ gritou novamente, desta vez muito suavemente.

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Capítulo 21

Esperou, indecisa sobre o que se devia fazer em uma situação como aquela. Os escritores de novelas românticas não mencionavam esse tipo de coisas no livros que ela havia lido. Preocupada, tocou suavemente em seu braço. ─Anthony? ─ ele abriu um pouquinho os olhos. Tremeu, inquieta, ao ver como a olhava ─ Você está doente? – perguntou. ─Uma pergunta interessante. Ele endireitou-se, e se afastou dela para ajustar as calças. Ela aproveitou para descer da mesa, num salto, o que foi um erro. Seus joelhos falharam e teve que se agarrar na bancada para recobrar o equilíbrio. Alisou as saias com movimentos torpes, consciente da desagradável sensação entre as pernas. ─Minhas desculpas, senhor – disse rispidamente. Ele virou-se, alarmantemente indiferente e dono de si mesmo, dizendo: ─Por deixar-me acreditar que fosse uma mulher do mundo? ─Não, por apressá-lo há uns minutos. Embora, em minha defesa, devo dizer que esperava um resultado muito diferente. ─O que é que esperava exatamente, Louisa? Ela fez um gesto com a mão, agradecida pelas sombras que dissimulavam o seu rubor. ─Tenho certeza de que entende. Ouve-se falar tanto sobre os arrebatamentos das aventuras proibidas ... ou não? ─Eu não poderia dizer-lhe ─ falou. ─Certamente você não deve ler muitos romances. 173


─Não. ─Mas, tem visto as obras maravilhosas de sua irmã ─ deduziu Louisa. ─Em seus trabalhos, relacionamentos ilícitos sempre terminam mal. ─Não é isso ─ parou para encontrar as palavras ─ A questão é que, com base no que eu li e o que vi no palco, antecipava uma experiência, como dizer, transcendente. -Transcendente ... ─ repetiu em tom neutro. ─É desta forma que se representa o amor proibido, compreende? ─ suspirou ─ Eu deveria ter percebido que deveria ter uma razão pela qual todas as mulheres na Inglaterra não andam por aí se permitindo aventuras ilícitas. ─Foi a primeira vez, Louisa. As primeiras vezes são sempre estranhas ─ animou-se a esclarecer Anthony. Ela ficou pensativa. - Hum! Anthony ergueu o queixo para poder olhar os seus olhos. Ele perguntou: ─O que é que isso quer dizer? ─Nada ─ disse ela apressadamente. ─Por tudo que eu acabei de passar, eu acho que mereço uma resposta. ─Muito bem. Se insiste. Ocorre-me que o problema pode ter sido você, e não eu. ─Você está me acusando por não ter conseguido atingir a transcendência? ─Não, não, claro que não. Bem, não totalmente ─ Louisa pigarreou ─ Definitivamente não é sua culpa pela natureza dotar em excesso algumas 174


partes de sua anatomia ─ fez uma pausa, considerando o assunto mais detidamente ─ Talvez, um homem menor ... ─Nem pense nisso ─ disse ele, parecendo assustadoramente sério. Ela se afastou rapidamente, mas foi parada pela mesa. -Calma, senhor. Está um pouco agitado, no momento. Nós dois estamos. Foi um dia muito difícil. Ele bloqueou sua fuga, plantando suas mãos sobre a mesa, enganchando-a entre seus braços. ─Permita-me deixar bem claro ─ acrescentou no mesmo tom grave e perigoso ─ Isto tudo foi culpa sua, não minha. Me enganou com seu disfarce de viúva. Interpretou o seu papel demasiado bem. Deveria ter me contado a verdade. ─Bobagens. Se eu houvesse feito isto, em primeiro lugar, nunca me beijaria e muito menos me tomaria à força. ─Queria ser tomada à força? ─ perguntou Anthony. ─Sim, queria – por dentro continuava a sentir raiva e frustração ─ Esta noite, me apetecia ser tomada pela força. Ele a olhava sem pestanejar. ─Foi uma espécie de capricho, uma decisão que tomou, esta noite, sem pensar? ─Em absoluto ─ levantou o queixo ─ Por casualidade, tenho pensado muito sobre isso, ultimamente. ─Que coincidência – disse ele ─ Eu também. Ela ignorou o comentário. ─Até esta noite, tenho mantido um controle absoluto de minhas emoções, claro. ─Claro.

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─Não obstante, lamento dizer que o que aconteceu na casa de Thurlow me fez sentir muito intranquila. ─Em que sentido? ─ ele perguntou. ─Não posso explicar-lhe. Estive agitada e nervosa durante toda a tarde. Meu coração batia mais rápido que o normal, e não conseguia acalmar meus nervos. Anthony examinou seu rosto nas sombras. ─Creio que entendo. ─Quando me beijou, há uns momentos, era como se houvesse estado uma tormenta. De repente, me senti engolida por um torvelinho de intensas sensações. ─Arrastada pelos ventos fortes da paixão – conduziu amavelmente. ─Sim, exatamente. ─Sacudida por um desejo enlouquecedor? Ele a compreendia. Sentiu-se mais animada. ─Esse, é exatamente o sentimento que estou tentando explicar – Louisa fez uma pausa expectante ─ Você sentiu a mesma coisa? ─Desde o começo ─ inclinou-se um pouco mais sobre ela ─ Até que a temperatura desceu repentinamente. ─Sim, bom, obviamente, foi um enorme erro. Eu gostaria muito de ir embora, se não se importa. Sinto uma necessidade enorme de tomar uma generosa dose de conhaque. ─Eu também. ─Você está irritado. Eu não o culpo.... ─ Um pensamento terrível veio-lhe à cabeça ─ Não vai deixar que esse incidente desafortunado altere o nosso acordo no que se refere à investigação, não é? Para a sua desilusão, ele não contestou imediatamente.

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─Não. – disse, finalmente ─ Nosso acordo se mantém, se é isso o que quiser. ─É isso o que eu quero – assegurou. ─Não obstante, há uma coisa que deveria considerar antes de insistir em que continuemos com nossa associação. ─Que coisa? ─ perguntou Louisa, agora cautelosa. ─Se continuarmos trabalhando juntos, certamente haverá mais tormentas ferozes, como a que acabar de produzir. Apesar de tudo que havia acontecido, notou que sua pulsação voltou a acelerar. Um pequeno calafrio percorreu sua espinha dorsal. O suprimiu com esforço, recuperou a compostura e jogou os ombros para trás. ─Ambos, temos força de vontade, senhor. ─ Disse com firmeza ─ Tenho certeza de que saberemos nos controlar. ─Não me inclua, Louisa! Ele acompanhou-a para fora do jardim de inverno e atravessaram os jardins. Louisa olhou para as luzes que iluminavam o salão de baile. O pânico se apoderou dela. ─Temos que entrar novamente? – perguntou ansiosa. Anthony parecia estar se divertindo muito. ─Um dos truques para manter uma aventura ilícita, minha vida, é a habilidade de enfrentar-se o mundo e agir como se nada estivesse fora do lugar. Ele tinha razão. Levantou o queixo e esticou os ombros, que já eram corretos por si só. ─Assim está bom? ─Excelente – murmurou ao seu ouvido.

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Felizmente, ninguém pareceu se interessar por eles. Atravessaram o concorrido salão, saudando algumas pessoas com uma ligeira inclinação de cabeça e sendo objeto de alguns olhares especulativos. Ao chegar ao vestíbulo, Anthony pediu seu coche. Juntos, desceram a escadaria e um lacaio abriu-lhes a porta do veículo. A fuga estava próxima, pensou Louisa. Permitiu-se um cauteloso suspiro de alívio. Nesse momento chegou outro veículo que parou logo atrás do de Anthony. A porta se abriu e um homem vestido com um elegante, branco e preto, desceu do veículo. Ele cambaleou um pouco, e precisou se agarrar à porta para recuperar o equilíbrio. Ao avistar Anthony, instantaneamente seu belo rosto se contraiu de raiva. ─Ora, se não é Stalbridge! ─ disse, arrastando-se até ele ─ Suponho que essa deva ser a viuvinha da Praça Arden, da qual eu tenho ouvido muito falar, ultimamente. Você não vai me apresentar a senhora? ─Não ─ disse Anthony, colocando-se entre ela e o desconhecido. Louisa ficou tão chocada com a fria rejeição. Que tropeçou no último degrau. Teria caído se não ele não a tivesse segurado. Anthony lhe ajudou a sentar-se no carro. ─Me chamo Julian Easton, Sra. Bryce ─ disse Easton, enquanto tirava rapidamente o chapéu como uma paródia dos bons costumes ─ É um prazer conhecê-la. Tinha ouvido rumores de que Stalbridge se distraía em seu tempo livre com uma mulher incomum, mas esta é a primeira vez que eu tive a oportunidade de ver a sua ratinha do campo. Anthony voltou-se para ele. ─Basta, Easton. Você está bêbado. Está chamando a atenção. Easton o ignorou, olhando para Louisa através da janela do coche. 178


─Você consegue perceber que ele a está usando, Sra. Bryce? Não é o seu tipo,entende? O boato nos clubes é que atraca com a mulher de outro homem e oculta o caso se escondendo atrás de suas saias. Anthony se aproximou dele. No último momento, Easton pareceu perceber que estava em perigo, mas já era tarde demais. Anthony se moveu a uma velocidade que pegou todo mundo de surpresa. Agarrou Easton pela manga da sua casaca, ao mesmo tempo em que o levantava em uma espécie de cambalhota. A cena durou um instante. Easton caiu no chão, aterrissando de costas, e ficou sentado na calçada, atordoado. ─Siga para a Praça Arden ─ disse Anthony ao cocheiro enquanto pulava para dentro do veículo. O coche começou a andar imediatamente. Louisa olhou pela janela para ver as escadas da mansão Lorrington. Julian Easton continuava sentado no chão. A fúria havia substituído a confusão e a surpresa em seu rosto. Ele se virou para olhar diretamente para Anthony. ─Quem é o Sr. Easton? ─Nós somos membros do mesmo clube. A voz de Anthony soava inquietantemente neutra. ─Obviamente, não são amigos. ─Não ─ disse Anthony ─ Nós não somos amigos. Foi quase possível ouvir a porta se fechar para esse tipo de interrogatório. Decidiu tentar outro. ─O que você fez para desequilibrá-lo assim tão de repente? ─ perguntou. ─É um truque que eu aprendi em minhas viagens ao exterior. Acho que é útil às vezes.

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Anthony olhou para o lado e ficou apreciando a paisagem noturna pela janela. Ele não disse uma palavra até que a deixou na porta de sua casa. ─Eu sinto muito que você tenha sido forçada presenciar aquela cena com Easton ─ disse. Parecia angustiado, e inexplicavelmente esgotado. Percebeu que aflorava a simpatia que sentia por ele. Ela acariciou seu rosto com os dedos enluvados. ─Não precisa se desculpar ─ disse suavemente ─ Foi culpa de Easton. Você sofreu muito nos meses que se passaram desde a morte de Fiona. Espero que possa encontrar as respostas que procura, Anthony. Virou-se e entrou em casa.

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Capítulo 22

Despertou

sobressaltada,

odiando

as

batidas

familiares

e

demasiadamente rápidas do seu coração e a sensação de tristeza que sempre acompanhavam o sonho. Afastou os lençóis e sentou-se na cama, com uma necessidade de andar, mover-se, ou qualquer outra coisa que a fizesse queimar a desagradável energia que experimentava após as imagens de seus pesadelos. Levantou-se, estremecendo um pouco ao sentir a delicadeza entre as pernas. As recordações da aventura no jardim de inverno a invadiram, graças a Deus, desalojando os piores fragmentos do pesadelo, porém trazendo uma nova classe de medos. Deu um salto, deslizou os pés nos chinelos e começou a andar. O que eu fiz ontem à noite? Como havia se envolvido em um caso de amor com um homem que poderia destruí-la? Um homem que era amigo de um detetive da Scotland Yard que investigou o assassinato do Sr. Gavin? Que diabos eu estava pensando? Parou plenamente consciente da resposta a essa pergunta. Havia se apaixonado por Anthony, naquele momento, no baile dos Hammond, em que ele havia lhe olhado como se ele conhecesse todos os seus segredos mais íntimos. Seria a sua perdição. Tinha tanta certeza disso como tinha de seu próprio nome. Talvez já fosse tarde demais. "Não pense no futuro. Seu amor está condenado. Você nunca poderá contar-lhe a verdade sobre você, e você nunca vai será capaz de casar com um homem a menos que você lhe revele o seu segredo. Não seria correto. " Nenhum cavalheiro da classe social de Anthony se casaria com uma assassina. Primeiramente teria que pensar no bom nome de sua família. 181


Tampouco era provável que chegasse a apaixonar-se por ela, nunca. Ele tinha dado o seu coração para Fiona Risby. Um dia, sem dúvida, se casaria em sua esfera social, era o que se esperava, mas quando chegasse esse momento, iria escolher alguém muito melhor do que uma mulher sem nome ou fortuna. "Aproveite o aqui e agora.É a única coisa que você pode esperar com Anthony" Parou no meio do quarto, pensando em tomar outro copo de conhaque. Ele havia bebido após Anthony acompanhado casa da residência do Lorrington provou surpreendentemente eficaz. Ele não esperava dormir naquela noite, mas, obviamente, os eventos dramáticos durante o dia e de noite havia esgotado mais do que ele imaginava. Outra bebida pode ajudála a dormir algumas horas. Aproximou-se da janela e olhou através do vidro. As luzes da rua e da lua pálida mal iluminavam a rua. Na calçada, bem em frente à porta do número doze, viu um vulto coberto com um manto, o rosto oculto por um véu negro. Parecia um fantasma a andar sem rumo por entre as árvores envoltas em névoa. A pobre e desesperada viúva que tinha sido forçada a entrar na prostituição estava de volta. Louisa ficou surpresa por voltar a vê-la novamente. Era óbvio que ainda não tinha aprendido que os clientes que procuram comprar o que ela oferecia não eram comuns nesta parte da cidade. Ou, talvez estivesse com muito medo de ir para os bairros mais perigosos. Sem dúvida, fazer a rua era uma profissão nova para ela. Impulsivamente, Louisa se virou e entrou no hall. Silenciosamente, entrou na biblioteca. Acendeu uma lâmpada, abriu uma gaveta trancada e pegou uma pequena soma de dinheiro, que Emma e ela guardavam para pagar pequenas despesas da casa. Colocou algumas moedas e notas em um 182


envelope e com a pluma, escreveu rapidamente um endereço no verso do envelope. No hall de entrada, envolveu-se em um xale, abriu a porta principal e olhou detidamente a rua. A mulher envolta no manto e véus negros, ainda estava ali, parada na sombra de uma árvore. Ficou muito quieta ao ver que Louisa saía da casa e parava na luz do poste. ─Boa noite ─ disse Louisa em voz baixa. Ela reagiu como se tivesse visto um fantasma. Sobressaltou-se, retrocedeu um passo, deu meia volta e começou a andar muito rápido ─ Espere, por favor ─ disse Louisa, correndo atrás dela ─ Eu não vou chamar a polícia. Eu só quero lhe dar um dinheiro e um endereço. Convencida, evidentemente, que não seria deixada em paz, ela parou e se virou, uma criatura em perigo, encurralada. ─Eu ... Louisa parou a poucos metros dela e ofereceu-lhe o envelope. ─Há dinheiro suficiente para passar o mês, se bem controlado. No lado verso há um endereço. Se você for até lá e pedir ajuda, ninguém lhe fará perguntas. O estabelecimento é gerido por uma mulher cujo único objetivo é ajudar outras mulheres como você. ─Outras mulheres como eu? ─ A mulher ficou tensa. ─Mulheres que se viram obrigadas a fazer a vida na rua. ─Como você ousa insinuar que eu sou uma mulher na rua? Quem você pensa que é? Falou baixinho e com uma voz cheia de indignação. Era a voz de uma mulher educada, que cresceu em círculos respeitáveis. ─Desculpe-me ─ disse Louisa penalizada ─ Não quis ofendê-la.

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Sem dizer uma palavra, a mulher desapareceu rapidamente na escuridão, as dobras da capa de veludo que rodeando seus tornozelos. Louisa observou até que desaparecesse. Quando a viúva se foi, voltou para casa e fechou a porta com a chave. Jogou o envelope no console do hall de entrada e subiu as escadas, as palavras da mulher ressoando em seus ouvidos. "Quem você pensa que é?" A questão não era que a viúva tivesse usado as mesmas palavras que o Sr. Gavin lhe dissera naquela noite fatídica, um ano antes. No final das contas, a frase era muito comum. "Quem está pensando que é?" As pessoas a repetiam o tempo todo. O que lhe provocou um estremecimento foi a raiva que vibrava na voz da mulher. "Era como se me odiasse. Mas, como isso é possível? Tenho certeza de não tê-la visto jamais em minha vida. "

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Capítulo 23

Louisa Bryce havia lhe confundido com uma prostituta da rua. Sentia que a raiva a queimava por dentro. Tinha um enorme desejo de retornar a Praça Arden e matar aquela mulher estúpida, mas, pouco a pouco o bom senso prevaleceu. Começou a respirar mais profundamente. Raiva foi sendo diluída. Ocupar-se-ia de Louisa Bryce quando chegasse a hora. Caminhou rapidamente, dirigindo-se para uma rua onde poderia encontrar um coche que a levasse para casa. A noite sempre lhe trazia lembranças: Os efeitos do clorofórmio começavam a desaparecer, deixando-a ligeiramente desorientada e enjoada. Só percebia o movimento. No começo não entendeu nada. Então, ocorreu-lhe que um homem a carregava em seus braços. Não tinha forças para lutar. Talvez fosse o melhor. Um obscuro instinto lhe disse que era mais seguro permanecer inerte e sem vida. No entanto, não resistiu a abrir os olhos parcialmente, mas isso não lhe ajudou. Não viu nada. Tinha o rosto coberto com um pano pesado. Uma lona, pensou. De repente, estava ciente de que o envoltório de lona apertada estava ao redor de todo o seu corpo. Embora quisesse, não poderia ter sido movido. No entanto, apesar da lona que lhe cobria o rosto, cheirava a umidade da neblina e do rio. O pânico tomou conta dela. O homem que a carregava bufava devido ao esforço. Ela queria gritar, mas sua voz falhou. Depois de um tempo eu estava caindo, despencando no vazio. Chocar-se contra a água foi como chocar-se contra uma parede de pedra, apesar da proteção da lona. 185


Experimentou uma sensação de frio, que gelava até os seus ossos, enquanto afundava sob a superfície. O sudário em que estava envolvida, obviamente, não foi bem amarrado. Ela sentiu-se escorregar por baixo da lona.

Não demorou muito para compreender porque Elwin não tinha amarrado suas mãos e os seus pés, antes de jogá-la da ponte. Ele queria que todos acreditassem que ela havia cometido suicídio. Essa farsa não teria funcionado se ela estivesse com as mãos e os pulsos amarrados quando fosse retirada do rio. Esta noite, a sorte tinha estado ao seu lado. Sem saber, Elwin, que fugiu do local logo que havia se livrado da vítima, deixando uma testemunha ocular. Um louco que havia construído um barraco à beira do rio, viu cair um volume pesado no rio, e preso pela curiosidade, tinha remado seu barco para ver se poderia salvar alguma coisa valiosa. Ela conseguiu subir para a superfície, agradecida por ter aprendido a nadar em sua juventude. Era uma habilidade rara entre as mulheres. No entanto, sabia que provavelmente teria se afogado se não estivesse vestindo apenas uma camisola. Ela estava dormindo quando ele lhe aplicou o clorofórmio. Se vestisse um de seus vestidos da moda, quando foi jogada no rio, o peso das saias e do espartilho a teriam afundado nas águas. A primeira coisa que viu ao sair à superfície foi o contorno de um pequeno barco. Alguém lhe deu um remo para que se agarrasse com ambas as mãos. Outro golpe de sorte foi o fato de que o seu salvador era um louco que dizia ouvir vozes em sua cabeça. As pessoas o evitavam, e ele, por sua vez, raramente falava com alguém. O resultado foi que ninguém sabia que ele havia lhe resgatado do rio, naquela noite. 186


O louco, convencido de que era uma criatura mágica a quem devia cuidar, tratava-lhe com deferência, guardando em segredo até que ela se recuperasse da terrível experiência. Ela ficou com ele algumas semanas, permitindo que ele desse-lhe comida e abrigo, enquanto ela ponderava sobre o seu futuro e fazia planos. Para não correr riscos, antes de deixar o abrigo, teve de envenenar o velho idiota com arsênico. Afinal de contas, não poderia correr o risco de ter uma testemunha. Havia muito em jogo. Não iria deixaria nada ficar entre ela e a grande vingança que tinha planejado ... Afastou os pensamentos do passado. Na rua havia um coche livre. Foi até ele e deu ao motorista um endereço. As senhoras que queriam manter a salvo a sua reputação procuravam não serem vistas nas carruagens. As carruagens eram rápidas e dizia-se que as mulheres que estavam nelas, também eram. No entanto, a viúva disfarçada mantinha-se no anonimato. Nenhuma das pessoas que a quem tinha conhecido quando era esposa de Elwin Hastings a teria reconhecido. Recostou-se no assento, com as mãos enluvadas, firmemente apertadas. “Como Louisa Bryce atrevia-se a confundi-la com uma prostituta barata de rua?”

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Capítulo 24

O coche estava parado, envolto nas sombras, no final da rua escura. Dentro, Anthony estava sentado, há quase uma hora, vigiando a porta do clube de cavalheiros, esperando pela saída de Hastings. Eram três horas da madrugada, e os primeiros rumores acerca da morte de Thurlow já haviam começado a circular. Os boatos começavam primeiramente nos clubes. Queria saber como reagiria Hastings a essa notícia. Enquanto esperava para não perder de vista a sua presa, seus pensamentos se concentravam em Louisa. Havia esperado uma experiência “transcendental”. Ele havia metido os pés pelas mãos e não tinha outra pessoa a quem culpar a não ser a si mesmo. Por outro lado, ela o havia enganado com sua farsa sobre ser uma viúva misteriosa. Não obstante, se houvesse mantido um mínimo de controle, haveria percebido que estava beijando uma mulher sem nenhuma experiência. Porém, o controle sobre si mesmo não havia estado presente em seus pensamentos nessa noite, ao menos, depois que iniciara aquele beijo nos jardins dos Lorrington. Naquele momento, disse a si mesmo que o abraço serviria como meio de fazer com que Louisa ficasse calada e fomentar a impressão que os dois mantinham um idílio amoroso. Mas, a verdade era que havia desejado Louisa desde o primeiro momento em que foram apresentados. A resposta apaixonada de Louisa havia diminuído o controle que tinha sobre si ao limite, nublando todo o seu pensamento racional. A descoberta que ela o desejava, havia produzido uma repentina e indescritível sensação de euforia. Naqueles primeiros e tumultuados

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minutos, a única coisa em que se havia concentrado era em encontrar um lugar onde pudessem ficar juntos. Pensando bem, teria que admitir que a mesa de trabalho de um jardineiro, não era certamente o lugar mais romântico, e, sem dúvida nenhuma, ele havia se precipitado. Até mesmo uma dama com mais experiência da vida teria motivos para queixar-se diante das circunstâncias. Agora, uma dama sem experiência, cujo único conhecimento da paixão procedia das novelas românticas e das peças teatrais tinha todo direito de sentir-se decepcionada. A porta do clube abriu-se, tal como ocorrera várias vezes nos últimos quarenta e cinco minutos. Desta vez, Hastings apareceu. Uma figura de aspecto familiar, com um longo casaco e um chapéu enfiado até os olhos, endireitou-se desencostando do parapeito contra o qual ele estava inclinado, jogou o cigarro no chão e foi em sua direção. ─Está pronto para sair? ─ Quinby perguntou. ─Chame um carro ─ disse Hastings asperamente ─ Acabei de receber uma mensagem. Temos que sair imediatamente. Anthony golpeou com suavidade a parte traseira da carruagem em que ele estava esperando. ─Você pode me ouvir? Está acordado? ─Sim, senhor ─ sussurrou o condutor através da abertura ─ Só descansava um pouco os olhos, senhor, isso é tudo. Quinby assobiou para um veículo. A carruagem andou e parou na frente dos degraus que conduziam ao clube. Os dois homens entraram no veículo às pressas. ─Quero que siga aquele carro a uma distância segura ─ ordenou Anthony para o cocheiro ─ Não quero que os ocupantes percebam que os seguimos. Receberá uma boa gorjeta se não os perderem de vista. 189


─Isso não será um problema, senhor. Não vão reparar em nós, com este tráfego. O motorista bateu na garupa do cavalo levemente com as rédeas. Uma carruagem puxada por cavalos, com quatro rodas teria dificuldade para seguir outro veículo nas ruas movimentadas, mas um coche de duas rodas, rápido e fácil de manobrar, abria seu caminho através do tráfego com facilidade. Depois de zanzar por várias ruas e dar várias voltas, a carruagem em que Hastings estava entrou nas cercanias de um bairro pobre, de ruas estreitas e mal iluminadas, onde muitas das janelas dos edifícios estavam às escuras. O único espaço iluminado era uma pequena taberna em que se vislumbrava uma sinistra luz amarela. Por que um homem como Hastings se arriscaria a visitar um dos mais perigosos lugares da cidade? A carruagem de Hastings parou diante da taverna. O condutor do veículo de Anthony se deteve a certa distância. Hastings e Quinby saltaram, sem repararem no veículo de Antônio. Quinby introduziu a mão no bolso de seu casaco e a deixou lá. "Ele vai armado a toda parte", pensou Anthony. ─A mensagem dizia que eu seria esperado no final deste beco ─ Hastings parou diante da entrada de um beco, escuro e estreito, que separava o edifício adjacente, da taberna ─ Acenda a lanterna. Vá na frente. Quinby não disse nada, mas acendeu a lanterna tla e qual lhe haviam ordenado. A chama iluminou o rosto de feições duras. Anthony viu como ele observava ao seu redor, estudando o cenário com olhos frios e astutos. Ele percebeu o segundo veículo. Anthony sabia que era impossível para Quinby poder vê-lo através da escuridão que envolvia o seu carro, mas mesmo assim, o exame fez com que seus nervos reagissem. 190


Concluindo, sem dúvida, que o segundo carro não apresentava qualquer ameaça, Quinby sacou sua pistola e guiou Hastings ao beco sem iluminação. Anthony tirou algumas moedas do bolso e deu o condutor através da portinhola, localizada na parte traseira do veículo. ─Aqui tem as moedas que eu prometi ─ disse ele ─ Vai receber outra se eu o encontrar aqui quando voltar. O motorista guardou as moedas com um gesto suave de alguém que tem muita de prática. ─Eu estarei aqui. Anthony saiu do carro e caminhou até a entrada do beco por onde Hastings e seu companheiro tinham desaparecido. Ao chegar, ele viu ao longe o brilho apagado e amarelento da lanterna do guarda costas. Havia três figuras iluminadas, Quinby, Hastings, e um terceiro homem. Ele ouvia o ruído de vozes, mas era impossível saber o que eles falavam. Um momento depois, lanterna do capanga se apagou. Passos ecoaram na pedra. Hastings e Quinby voltavam, andando rapidamente. Anthony escondeu-se nas sombras densas que rodeavam a entrada de um edifício. Hastings saiu do beco quase correndo, seguido por Quinby, que, ao contrário de seu chefe, não parecia preocupado. Hastings entrou no carro em que chegaram, seguido por Quinby. O cocheiro esporeou o cavalo, que trotou rapidamente e com energia. Anthony aguardou mais alguns instantes. Em seguida, tirou a pistola que tinha trazido e entrou, cuidadosamente, no beco. No outro extremo acendeu uma lanterna, iluminando a silhueta de um homem encostado na parede. A figura moveu-se rapidamente para o lado oposto do beco. Anthony a seguiu, tentando não fazer nenhum barulho no pavimento de pedra, mas o homem deve ter ouvido alguma coisa ou 191


estava simplesmente nervoso. Virando as costas abruptamente, tirou o cigarro da boca de uma só vez. ─Quem vem aí? ─ perguntou, segurando a tocha no alto, enquanto examinava as sombras ─ É você mais uma vez, Sr. Hastings? O que quer agora? Eu já lhe disse tudo o que eu sei, eu juro. ─Nesse caso, diga a mim ─ disse Anthony, aproximando-se da luz para que o homem pudesse ver a arma ─ Eu prometo pagar-lhe tão bem ou melhor, do que Hastings. O rosto do homem contraiu-se com o medo. - Ei, espere! Você não tem nenhuma razão para atirar em mim. ─E, nem tenho nenhuma intenção de fazê-lo. A arma é apenas por precaução. Eu tenho a impressão de que este não é o melhor dos bairros. Qual é o seu nome? Houve uma breve pausa. ─Você está falando sério em pagar tanto quanto Hastings? ─ perguntou o homem, com cautela. ─Sim ─ Anthony enfiou a mão no bolso, tirou algumas moedas e jogou-as no chão. Ao chocarem-se no chão, as moedas saltaram, dando voltas e brilhando à luz da lanterna ─ Há mais de onde elas vêm, se você responder às minhas perguntas. O homem olhou para as moedas com expressão interessada. ─O que você quer saber? ─Em primeiro lugar, o seu nome. ─Me chamam Ligeirinho. ─Como você ganhou esse nome? Ligeirinho sorriu, revelando uma boca com a ausência de vários dentes. ─Por que sou bom em entrar e sair sem que me vejam. 192


─Era para isso que o Hastings contratou você? ─Sim, senhor. Eu sou um profissional, mesmo que seja algo ruim, e meu trabalho é reconhecido em certos ambientes. Hastings espalhou que queria contratar alguém com minhas habilidades. Como o preço estava bom, nós chegamos a um acordo. ─Que tipo de entradas e saídas Hastings lhe pediu? ─ Anthony perguntou. ─Nada muito complicado ─ disse Ligeirinho ─ Teria que vigiar um cavalheiro, ver onde ele estava indo, apontar as visitas, esse tipo de coisas. ─E, onde é que vive esse senhor? ─Na Rua Halsey. Mas, se pode economizar a visita. O corpo foi levado esta manhã. Parece que deu um tiro na cabeça. Dizem que ele não poderia pagar suas dívidas de jogo. ─Hastings parecia chateado com o rumo dos acontecimentos? ─ Anthony perguntou. ─Já sabia da morte do Sr. Thurlow antes de vir aqui, esta noite. Ele disse que tinha ouvido rumores no clube. Ele parecia muito chateado, sim. Ou, talvez esteja mal dos nervos. ─ Você enviou uma mensagem para Hastings, quando ele estava no clube. ─Sim, disse-lhe que queria entregar o meu relatório final sobre os assuntos do Sr. Thurlow e pegar meu dinheiro. ─Que informações você deu para Hastings? ─ Anthony perguntou. ─Não há muito a dizer. Ontem à noite, o Sr. Thurlow visitou os infernos, como era seu costume. Regressou à sua casa ao amanhecer, completamente bêbado. Eu o vi entrar e fui dormir. Não voltei à Rua Halsey até duas da tarde. Eu imaginei que o Sr. Thurlow não sairia da cama até mais tarde, então eu tinha tempo de sobra. 193


Ligeirinho havia chegado depois que ele e Louisa tinham deixado a casa, refletiu Anthony. Era uma boa notícia. Isso significava que Ligeirinho não tinha visto Louisa. ─O que aconteceu com a governanta? ─ Anthony perguntou. Você a viu sair de casa enquanto vigiava a porta de Thurlow? ─Não. Ela não estava. Hoje é seu dia de folga. ─O que você fez quando chegou à Rua Halsey, esta tarde? ─ Anthony perguntou. ─Eu vi um oficial parado na porta e muitas pessoas na rua. Eles disseram que havia também um homem da Scotland Yard na casa, então eu fui embora, imediatamente. Eu levo muito a sério o fato de manter distância da polícia. Nunca traz nada de bom. ─Você acha que Thurlow tirou sua vida, porque ele não poderia pagar dívidas de jogo? ─Eu duvido ─ disse Ligeirinho ─ Ontem à noite ganhou várias partidas e estava de muito bom humor quando voltou para casa. Foi por outra razão. ─Quanto tempo você o vigiava em nome de Hastings? ─Não mais do que um ou dois dias. ─Recebeu visitantes durante esse tempo? ─Se houve alguma visita ─ disse Ligeirinho ─ não entrou pela porta da frente. ─O que quer dizer? ─Lógica simples, senhor ─ prosseguiu Ligeirinho ─ Eu vigiava a casa de Thurlow na parte da frente. Eu não podia ver a porta dos fundos de lá, certo? O assassino entrou pela porta dos fundos, pensou Anthony. Talvez tivesse seguido Thurlow até sua casa na noite anterior, ou talvez fosse 194


ciente da rotina de Thurlow e sabia que sua presa voltaria para casa em estado de embriaguez. Thurlow tinha deitado morto para o mundo por causa do álcool que tinha consumido. Era provável que não houvesse despertado e não soubera quem era o assassino que estava em seu quarto. Seu carrasco tinha colocado uma arma em sua cabeça e apertado o gatilho. Então, preparou a cena do suicídio e realizado uma busca cuidadosa na casa antes de deixar o bilhete e sair pela porta de trás. Mas, se Hastings havia contratado Ligeirinho para vigiar Thurlow, pensou Anthony, agora, sua teoria de que Hastings havia assassinado o jogador perdia todo o seu peso.

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Capítulo 25 ─Obviamente, sentiu-se terrivelmente humilhada quando você ofereceu sua ajuda ─ disse Emma ─ A julgar pela sua descrição, deve ter sido uma mulher respeitável, e de boa família. Sem dúvida, foram os restos de seu orgulho ferido que a levou a rejeitar a sua amável generosidade. ─Acho que você está certo ─ disse Louisa, pensando no encontro com a prostituta, na noite passada ─ Ela parecia profundamente ofendida. Ambas estavam sentadas na biblioteca, bebendo chá. O dia tinha amanhecido claro, mas o nevoeiro chegou à tarde, invadindo as ruas que conduziam à Praça Arden e concentrando-se no pequeno parque. ─É uma história triste e absolutamente normal ─ Emma pegou o bule de chá ─ É comum ler sobre casos semelhantes nos tabloides. Há inúmeras maneiras nas quais uma mulher respeitável pode ser forçada à prostituição. A morte ou a doença de um marido, a ruína, a dívida, o divórcio, a falta de família. Qualquer uma delas pode deixar uma mulher sem dinheiro do dia para noite. ─Eu sei ─ disse Louisa baixinho. ─É claro que você sabe, querida ─ Emma levantou as sobrancelhas ─ Mas não se esqueça que, mesmo estando em uma situação desesperadora, duas vezes, você conseguiu sair brilhantemente, sem recorrer à prostituição. ─Pura sorte. ─Não! ─ Emma disse categoricamente ─ Não teve nada a ver com a sorte. Você é uma mulher com muitos recursos, querida. Após a morte do seu pai, e que os credores tiraram tudo o que tinha menos a sua biblioteca, você se livrou, montando um negócio de compra e venda de livros. Em 196


seguida, o episódio terrível de Lord Gavin, voltou a ir em frente, mudando de nome, criando um personagem fictício no qual se amparou e indo para uma agência. Foi a sua própria criatividade e determinação que a manteve fora das ruas, Louisa, não a sorte. Nuca se esqueça disso. Louisa sorriu debilmente. ─ Você sempre sabe como me alegrar, Emma. Emma olhou para ela com curiosidade. ─O que é que lhe incomoda na mulher que viu a noite passada no parque? ─Para ser honesta, eu não tenho certeza. Não acho que esteja muito tempo nessa situação desesperadora. A capa parecia de muito boa qualidade e na moda, assim como o véu e as luvas. Se soubesse que a pobreza a esperava, após a morte de seu marido, por que gastar tanto dinheiro na compra de elegantes roupas de luto? ─É possível que não tenha sabido a extensão de seu desastre até pouco depois do funeral. É o que acontece à muitas mulheres. Os maridos não discutem nunca os seus assuntos financeiros com elas e as viúvas não descobrem a sua verdadeira situação até que seja tarde demais. ─Sim. Em suma, não se pode fazer nada sobre isso ─ Louisa largou a xícara de chá e abriu seu caderninho de notas ─ Se você não se importa, eu gostaria de fazer-lhe mais algumas perguntas sobre Victoria Hastings. ─Nem um pouco ─ Emma inclinou um pouco a cabeça em sinal de curiosidade ─ Por que você se interessa? ─O Sr. Stalbridge suspeita que Hastings a matou, assim como Fiona Risby. Ocorre-me que uma vez que teremos pouca sorte em encontrar uma razão para a morte de Fiona, talvez fizesse sentido entender por que Hastings assassinou sua esposa. Parece-me que deve haver alguma ligação entre os dois assassinatos. 197


Capítulo 26

Naquela tarde, tomou a rota habitual através do grande parque para ir à livraria Digby. O nevoeiro tinha engrossado formando uma espécie de muro impenetrável, mas ela estava bem ciente do caminho. Teria o parque só para ela. Não era o tipo de dia que atraísse crianças brincando com pipas e babás com as criaturas sob seus cuidados. Ao atravessar o parque e sair para a rua, percebeu que o tráfego era apenas moderadamente denso. Os coches e ônibus deslizavam lentamente através do nevoeiro como uma frota ruidosa de navios fantasmas. Apenas se viam os transeuntes. Acelerou o passo e entrou na livraria, preparada para a pontada de saudade e o pequeno calafrio que sempre lhe assaltavam ao entrar na Digby. A imagem das prateleiras abarrotadas de livros e o cheiro das capas de couro nunca deixavam de despertar memórias antigas e medos mais recentes. Albert Digby, um homem pequeno, encurvado e com uma calvície insipiente, deixou de lado o exemplar do “The Flying Intelligencer”, que estava olhando, e olhou fixamente Louisa por cima dos óculos que lhe davam um certo ar pedante. Como de costume, ele estava visivelmente chateado com a intrusão de um cliente. ─Oh, é você, Sra. Bryce. Havia passado o negócio para Digby por duas razões. O primeiro é que era um vendedor de livros extremamente qualificado e com um grande número de contatos entre os colecionadores. A segunda razão pela qual tinha escolhido Digby era porque ele não a conhecia pessoalmente, durante

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os dois anos em que ela tinha sido proprietária da livraria Barclay, por isso não era possível que a reconhecesse. ─Boa tarde, Sr. Digby ─ disse, aproximando-se do balcão ─ Recebi sua mensagem. Estou encantada por saber que finalmente conseguiu o “Aristóteles”, de Woodson. ─Não foi fácil encontrar o determinado exemplar que me pediu. Mas eu consegui obtê-lo por um bom preço, se me permite dizer. ─Agradeço seu talento de negociador, Mr. Digby. ─Bah! O herdeiro de Glenning não entende nada sobre livros, e nem quer aprender. Está encantado por vender todos os volumes que herdou de seu pai. Só se preocupa com o dinheiro que recebeu depois da morte do velho. Digby desapareceu atrás do balcão. Quando voltou, trazia com ele um pacote. O depositou na superfície da mesa de madeira gasta, e desembrulhou sem pressa. O livro que apareceu diante de seus olhos estava encadernado em couro vermelho. Louisa foi invadida por um raio de esperança. À primeira vista parecia o livro que procurava. Pegou o livro e o abriu lentamente, e começou a folhear as páginas, reprimindo todas as suas esperanças. Foi convencida ao ver as pequenas anotações escritas a mão. Era apenas uma cópia de “Aristóteles”, de Woodson; era o mesmo exemplar que tinha sido forçada a vender no ano anterior, o exemplar de seu pai. Um dos dois livros que havia guardado rapidamente na maleta, naquela noite terrível. Fechou o livro, tentando esconder sua excitação. ─Estou muito feliz. Como você conseguiu encontrá-lo? O livreiro olhou para ela com uma expressão ardilosa.

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─Aqueles que se dedicam ao negócio de livros, têm meios, Sra. Bryce. ─Eu entendo. Quanto ao exemplar de Milton ... , acrescentou ela. ─Será melhor que você esqueça-se dele. Já lhe disse que o novo proprietário deixou bem claro que só venderia por um preço justo. E, cá entre nós, Sra. Bryce, este livro não está ao seu alcance. ─Sim, bem, as circunstâncias das pessoas mudam, como aconteceu quando Glenning morreu e deixou o “Aristóteles” ao filho que não queria e não sabia o seu valor. Eu ficaria muito grata se, de tempos a tempos, lembrasse ao proprietário do livro de Milton, que tem um cliente que está interessado em sua cópia. ─Farei o que você me pede, Sra. Bryce, mas é um desperdício de tempo. Ela forçou um sorriso. ─Obrigado. Ela notou o jornal apoiado no balcão. ─Vejo que está lendo “The Flying Intelligencer”. Ele seguiu seu olhar e fez uma careta. ─Um tabloide sensacionalista e de gosto duvidoso, como os outros. Exceto o Times, é claro. Mas, eu o compro sempre que haja um artigo do I. M. Phantom. ─Compreendo. ─Um caso fascinante é o da morte, ontem mesmo, de um jovem cavalheiro. As aparências sugerem que ele se matou. Parece que a vítima tinha um monte de dívidas de jogo. No entanto, I. M. Phantom assegura que circulam rumores de que ele poderia ter sido morto. Isso faz você pensar em quantos assassinatos passaram sem solução, porque parecia que a vítima havia cometido suicídio. 200


-Sim, é verdade. Pagou o livro e saiu para a rua. A névoa estava tão espessa que era difícil distinguir as árvores na amplidão do parque. Perguntou-s, inquieta, se correri o risco de se perder no meio de uma bruma tão densa. Para que se preocupar? Tudo que tinha a fazer era seguir o caminho, e nada iria lhe acontecer. Cruzou a rua e entrou no mar de vapor. Calculou que havia percorrido um terço do parque, quando ouviu atrás de si, passos suaves sobre o cascalho. De repente, sentiu as mãos muito frias, apesar das luvas. Um levíssimo arrepio na base de seu pescoço eriçou seu cabelo. Parou e deu meia volta rapidamente, examinando a névoa cinzenta. Não havia nada para ver na bruma, exceto contornos imprecisos de algumas das árvores mais próximas. Escutou atentamente por alguns segundos, mas não ouviu mais os passos. Recomeçou a andar, desta vez, muito mais rapidamente. Estava à beira do pânico, o que era ridículo. O que estava acontecendo? Havia uma pessoa que andava atrás dela no parque. E, então? Era um parque público. Pensou se a tensão era um sinal de que seus nervos estavam prestes a falhar. Precisava recuperar o controle de si mesma. Atrás dela, os passos voltaram a soar. Apesar da pequena tentativa de acalmar-se, a sua ansiedade redobrou. Todos os seus instintos lhe diziam que começasse a correr, porém se fosse um homem que a seguisse e decidisse ir atrás dela, correr seria inútil. Usando um vestido, mesmo seguindo os princípios mais vanguardistas de moda das roupas femininas, não poderia correr mais rápido do que um homem usando calças. Ocorreu-lhe que quem quer que fosse a pessoa que estava atrás dela, estaria tão às cegas como ela. Esse pensamento pôs um freio na crescente 201


onda de pânico. O melhor que poderia fazer seria desviar-se do caminho, esconder-se atrás das árvores e deixá-lo passar. Se fosse outro pedestre inocente, não haveria nenhum problema. Se a pessoa que estava atrás quisesse causar algum dano, pensaria que ela estava à sua frente, e continuaria caminhando. Em qualquer caso, estaria a salvo. Louisa abandonou o caminho e se dirigiu para as sombras escuras projetadas por um grupo de árvores, seus passos foram abafados pela grama molhada. Quando chegou ao abrigo das árvores, virou-se para olhar a estrada. O perfil de uma figura fantasmagórica envolta em um manto escuro, com o rosto coberto pelo capuz, surgiu através da névoa. A mulher, oculta sob o manto, parou para ouvir e, depois do que pareceu uma eternidade, se virou abruptamente e voltou rapidamente por onde tinha vindo. O oceano de névoa a engoliu quase que imediatamente. Louisa ficou parada por muito tempo. Não era possível que ela fosse a mulher que tinha visto na noite anterior na Praça Arden. Um manto negro não era seria distinguível de outro manto negro. No entanto, não conseguia afastar o pensamento de que a viúva prostituta a tinha seguido até ali. Quando o seu coração recuperou uma velocidade relativamente normal, deixou o abrigo das árvores, voltou sobre seus passos até chegar a estrada e se dirigiu para a Praça Arden. Só tinha avançado alguns poucos passos, quando viu aparecer outra figura no nevoeiro, desta vez, o de um homem, vestindo um casaco cinza. ─Lady Ashton me disse que era provável que tivesse tomado o caminho que atravessa o parque para voltar para casa ─ disse Anthony, caminhando em sua direção ─ Pensei em vir ao seu encontro. Foi invadida por uma onda de alívio, seguida de uma crepitante sensação de euforia. Parecia tão, tranquilizadoramente forte, sólido e

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poderoso, o seu elegante lobo. Sentiu um enorme desejo de lançar-se em seus braços. ─Por Deus, senhor, você me assustou ─ disse ela, ao recuperar o controle de suas fortes emoções. Ele parou em frente a ela com as sobrancelhas levantadas. ─Minhas desculpas. Você parece um pouco nervosa. Aconteceu algo errado? -Não. Louisa olhou por cima do ombro. Não havia nenhum sinal da figura encapuzada. ─Há uns momentos, vi uma mulher, mas ela já se foi. Esqueça. Não importa. ─Deixe-me ajudá-la ─ Anthony pegou o pacote que ela carregava debaixo do braço ─ Lady Ashton me disse que você tinha ido fazer compras. Vejo que você comprou um livro. ─Sim. ─Um romance de sucesso, cheio de aventuras ilícitas e outros casos? ─No ─ Irritado por causa da zombaria, corou ─ Por que você está aqui? Ele a pegou pelo braço. ─O homem que não visitar a senhora no dia seguinte, não pode ser considerado um cavalheiro. ─O dia depois de quê? ─ perguntou Louisa, com seu pensamento ainda preso na mulher encapuzada. Anthony torceu a boca em um gesto de arrependimento. ─Estou desolado, Louisa. É possível que você tenha esquecido tão cedo nosso interlúdio no jardim de inverno? Ela não podia respirar. Sentiu o calor em suas bochechas. 203


─Oh, refere-se a isso ... ─ disse com a voz entrecortada. ─Vá em frente, minha querida, e eu engolirei a terra sob o peso da minha humilhação. ─Valha-me Deus, senhor! ─Ontem à noite, você me chamou de Anthony. Eu gosto mais. ─Acho que devemos mudar de assunto ─ disse Louisa. ─Eu lhe asseguro, que se o seu objetivo é fazer-me sentir todo o peso do meu fracasso na noite passada, não precisa dizer mais nenhuma palavra. Agora estou bem ciente do meu grande erro. Em parte, hoje, venho pedirlhe que me perdoe. ─Não deve se culpar, senhor ─ disse ela apressadamente ─ Pensei muito sobre o assunto e, agora, eu percebo que a grande parte da culpa é minha. ─Por não ter me avisado que não tinha nenhuma experiência no assunto? Louisa corou. ─Não, por esperar demasiadamente do assunto, em si. Tenho medo de ter dado muito crédito às elogiosas descrições dos romancistas e dramaturgos de sucesso. Todas essas deliciosas loucuras sobre o delicado e requintado arrebatamento da paixão transcendental. Eu deveria imaginar que a realidade sempre ficaria aquém. ─Na minha opinião, você faria muito bem em não tirar conclusões sobre o assunto até que tenha feito mais algumas experiências. ─Hum! Ele agarrou seu braço com mais força. ─E eu devo insistir que você faça essas experiências comigo. Por alguma razão, o tom ameaçador da sua voz, levantou o seu ânimo. Estaria ele um pouco ciumento? 204


─Por quê? ─ Ela perguntou suavemente ─ Certamente, seria mais científico experimentar com uma variedade de homens. Anthony parou, forçando Louisa parar também. ─Você está brincando comigo? ─ ele disse calmamente. ─Sim, é claro ─ ela admitiu. ─Não faça isso. Não com este assunto. ─Muito bem ─ sorriu. ─Corrija-me se eu estiver errado, mas, na noite passada, eu tive a impressão de que meus beijos não a desagradam. Ela corou. ─Não. Nesse aspecto do assunto foi bastante gratificante. ─Fico aliviado em ouvir isso. Anthony deslizou sua mão, quente e forte, ao redor da nuca de Louisa, a puxou para si deliberadamente e a beijou. Sua boca agia como uma droga lenta e sedutora sobre seus sentidos. O desejo e a excitação se apoderaram dela. Rodeou o pescoço de Anthony com o braço livre e se abandonou as sensações tentadoras que inflamavam os seus sentidos. Ela poderia facilmente sentir-se viciada pelos beijos de Anthony. Quando ele a soltou, um momento depois, voltou a ficar sem ar, mas, desta vez, não de medo. ─Devo dizer que os romancistas podem ter errado quando se trata do resultado do assunto, ─ anunciou, muito feliz ─ mas, estão absolutamente certos quando descrevem as delícias dos beijos roubados Anthony deu a ela um de seus sorrisos misteriosos. ─Tomarei isso como um sinal de progresso ─ Ele a pegou pelo braço e a empurrou para continuar caminhando depressa ─ No entanto, os futuros experimentos terão de esperar. Nós temos um problema mais grave. ─Nossa investigação? ─ perguntou ela. 205


─Isso também. A propósito, tenho boas razões para acreditar que Hastings não assassinou Thurlow. ─Como assim? ─Ele contratou um homem para vigiar Thurlow. Eu não acredito que teria feito isso, se tivesse tido a intenção de matá-lo. ─Meu Deus! Isso significa que Thurlow realmente se matou ou ... ─Ou, foi assassinado por outra pessoa. Por agora, eu escolho a segunda opção, mas primeiro temos que atender a um convite. Louisa soltou um pequeno som de impaciência. ─Outro aborrecido evento social? ─Não. Não há garantias de que você vá apreciar este, em particular, mas eu prometo que você não vai se entediar. ─Do que você está falando? ─Minha mãe convidou você para um chá esta tarde. Louisa parou, totalmente aterrorizada. ─Sua mãe. Não é possível que queira me conhecer. ─Era inevitável. Ela ouviu sobre os boatos que circulam sobre nós. ─Mas, mantemos uma aventura ilícita. As mães não querem receber mulheres com quem os seus filhos mantenham relações ilícitas. ─Você não conhece a minha mãe.

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Capítulo 27

Anthony esperou até que o único cliente que estava na livraria Digby saísse, fora ele, antes de deixar o romance que ele fingiu estar examinando e dirigir-se para o balcão. Digby estava sentado em sua mesa, e não levantou os olhos do catálogo de livros raros. ─O que você quer? ─ rosnou. ─Desejo comprar um livro para uma boa amiga que é uma cliente sua ─ disse Anthony ─ Trata-se de uma surpresa para uma ocasião especial. Minha amiga é muito esperta no que se refere a livros raros, mas me falta experiência nesse campo. Eu pensei que talvez você pudesse me ajudar a escolher algo que ela realmente apreciasse. Digby bufou e virou uma página. ─Como se chama a sua amiga? ─Sra. Bryce. Digby relutantemente fechou o catálogo e suspirou, exasperado. ─Sem querer ofender, senhor, mas essa senhora é irritante. ─Em que sentido? ─ Anthony perguntou. Digby fez um gesto com o braço, apontando para as prateleiras com a palma aberta da mão. ─Nada do que eu tenho na minha loja é bom o suficiente para ela. Só lê romances de sucesso. Eu não trabalho com esse tipo de literatura. Eu trabalho com livros raros. ─Eu pensei que viesse aqui, especificamente, para comprar livros raros.

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─Somente dois dos livros são importantes para ela. Ambos extremamente difíceis de obter ─ Digby disse severamente ─ É muito caprichosa. Muito exigente. Não quer qualquer primeira edição, precisam ser primeiras edições específicas. E, eu não tenho nenhuma delas em minha loja. ─Talvez, eu tenha entendido que teve sorte. Mostrou-me uma cópia de um livro que você conseguiu. Os bigodes de Digby se contraíram em um gesto que indicava irritação. ─A única razão pela qual consegui convencer o novo proprietário a me vender foi pelo fato dele não estar interessado em livros raros. Não sabia o valor do que tinha. Porém, já não tive muita sorte com o proprietário do livro de Milton. Mesmo se eu pudesse convencê-lo a vender, deixou muito claro que o preço seria muito acima das possibilidades da Sra. Bryce. ─Talvez, se eu falar com o colecionador, poderia convencê-lo a vender para mim ─ sugeriu Anthony ─ Poderia me dar o seu nome? Digby franziu a testa com amargura. ─Veja bem, a Sra. Bryce me contratou para encontrar esse livro. Eu seria louco de passar o negócio para você. ─Claro que eu lhe pagaria uma comissão, como um gesto de agradecimento por sua valiosa ajuda. Digby não parecia animado. ─Mesmo que eu desse o nome do colecionador não é provável que o convencesse a vender. ─Vou pagar sua comissão conseguindo ou não comprar esse livro – acrescentou Anthony. Digby moveu suas sobrancelhas até formar uma linha reta. 208


─Para saber o nome, antes terá que pagar a comissão. ─É claro ─ disse Anthony.

Uma hora e meia depois, Anthony caminhava por uma biblioteca tão cheia de livros e volumes que não conseguiu localizar o seu anfitrião imediatamente. A governanta desapareceu antes que ele pudesse perguntar. ─Lord Pepper? ─ perguntou em voz alta para uma sala aparentemente deserta. ─Aqui, senhor ─ disse uma voz rouca, do outro lado de uma estante mais alta do que o resto ─ Perto da janela. Anthony fez o seu caminho através de um labirinto de livros empilhados no tapete e deixou para trás várias fileiras de estantes. Um homem alto e de compleição robusta, que estava sentado em frente a uma grande mesa de mogno, se pôs em pé torpemente. Usava um terno de boa qualidade, embora, infelizmente desatualizado. Era evidente que fazia tempo que não cortava o cabelo grisalho ou aparava o bigode. Cumprimentou-o com um sorriso, mostrando um dente de ouro. ─Sr. Stalbridge, é um prazer em conhecê-lo. Ele fez sinal para ele sentasse em uma cadeira ocupada por volumes forrados em couro. ─Sente-se, sente-se. Com sorte, a governanta vai nos trazer uma xícara de chá. ─Obrigado por me receber tão rapidamente, senhor ─ Anthony pegou a pilha de livros que estava na cadeira e olhou para seu anfitrião ─ Onde eu os coloco? ─Deixe-os no chão, ou onde você quiser.

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Mais fácil falar do que fazer, Anthony pensou. Finalmente, ele localizou um pedaço de tapete que não estava repleto de livros, depositou seu fardo, voltou para o sofá e sentou-se. Lord Pepper sentou-se novamente. ─Como está o seu pai, jovem? ─Muito bem, senhor. Ele envia suas saudações, e me pediu para conferir se você continua satisfeito com seu cofre forte Apollo. Pepper sorriu carinhosamente para o enorme cofre forte que ficava ao lado de sua mesa. ─Absolutamente satisfeito. Eu tenho a maior confiança no modelo Apollo. Além disso, é possível que eu tenha que comprar outro em breve. Este já está lotado. ─Meu pai vai ficar muito feliz em ouvir isso. O cofre forte Apollo foi o motivo que as portas da casa de Pepper haviam sido abertas. Ao mencionar o nome do proprietário do livro de Milton a seu pai, Marcus o havia reconhecido imediatamente. "Faz anos que conheço Pepper. Um grande amante dos livros. " Pepper apoiou os braços sobre a mesa e apertou suas mãos. ─E, então? Quer dizer que se interessa pelo meu exemplar de Milton? Devo concluir que se tornou um colecionador, senhor? ─Não ─ disse Anthony ─ Desejo presentear uma boa amiga. ─Eu entendo – Pepper assumiu uma expressão maliciosa ─ Não sei se posso ajudá-lo. Esse livro é um dos meus bens mais valiosos. De fato, eu o guardo no meu Apolo. Era a resposta que Anthony havia esperado. Acomodou-se na cadeira e se preparou para sondar a informação que realmente queria. ─Eu compreendo, senhor ─ disse ele ─ Obviamente, terei que encontrar um presente para minha amiga em outro lugar. 210


─Você não irá encontrar outra cópia da primeira edição, deste livro de Milton, em tão bom estado ─ disse Pepper orgulhoso, e indicando o cofre com um aceno de cabeça, ele acrescentou ─ Eu passei anos tentando obtê-lo. ─Por curiosidade, você poderia me dizer como chegou a suas mãos? Um brilho de satisfação iluminou os olhos de Pepper. ─Ocasionalmente, circulavam rumores de que ele estava na coleção privada de um senhor chamado George Barclay. Eu lhe fiz uma ou duas ofertas em vida, mas se recusou a vender. ─O que aconteceu? ─ Anthony perguntou. ─Temo que seja uma história triste. Barclay tirou sua vida, deixando uma enorme dívida para sua filha pagar, seu único parente vivo. Ela foi forçada a vender a casa e a maioria de seus pertences, mas conseguiu manter os livros de Barclay. Muito poucas pessoas sabem disso, mas a jovem dama os utilizou para abrir uma pequena livraria. Anthony sentiu um calafrio que o fez ficar muito quieto. Começava a entender. ─Foi proprietária de uma loja? Não seria a Livraria Barclay’s? ─Ah, eu vejo que você está familiarizado com essa parte da história. Tornou-se muito famosa, claro, depois de Gavin foi assassinado lá. -Pepper recostou-se na cadeira, balançando a cabeça com tristeza ─ Terrível, de fato. ─O assassinato? ─Isso, também, é claro. Mas, eu me referia ao declínio e a queda da Senhorita Barclay. Os Barclay descendiam de uma antiga e distinta família. Estou convencido de que George Barclay revirou-se em seu túmulo, quando soube que sua filha tinha se rebaixado o suficiente ao envolver no comércio. 211


─Não me parece que tivesse muito mais escolhas ─ afirmou Anthony sem se alterar ─ Depois de pagar as dívidas não sobraram muitas alternativas. ─Sim, bem, eu acho que isso é verdade ─ reconheceu Pepper ─ No entanto, é uma grande pena. Unicamente, se pensa que uma jovem teria mais respeito por si mesmo. O que mais poderia ter feito, se perguntou Anthony. Envolver-se na prostituição? Ir para um asilo? Condenar-se a viver de maneira digna, porém modesta como preceptora, ou dama de companhia? Obrigou-se a reprimir a raiva. Estava lá para obter informações, recordou-se, não para se envolver em uma discussão com Lord Pepper. ─Continue a história, senhor. Estou achando fascinante. ─Vamos ver, onde eu estava? Ah, sim, na Livraria Barclay’s. Estava localizada em uma área muito pobre da cidade, mas a Senhorita Barclay entendia muito de livros raros porque seu pai era um ávido colecionador. Começou a atrair uma boa clientela, e acho que deve ter lhe dado bons benefícios, no final. Porém logo depois, é claro, assassinou seu amante, Lord Gavin, e cometeu suicídio ─ Pepper fez um muxoxo ─ Trágico. ─Conhecia a Senhorita Barclay, Sr. Pepper? ─Não. Os Barclay não conviviam com a alta sociedade. Eu nunca tive a oportunidade de conhecê-la. ─E, o Lord Gavin? Conhecia? ─Não muito. Ele pertencia a um dos meus clubes, mas raramente nos encontramos. Ele gostava dos livros do século XVII, se bem me lembro. Não era muito exigente.

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Capítulo 28

Anthony desceu do coche, pagou o condutor e subiu os degraus do Museu dos Crimes Mais Violentos, de propriedade de J. T. Tuttington. Na entrada ainda era visível um letreiro velho e descolorido: “Livraria Barclay’s”. Ao abrir a porta de vidro, a campainha soou. O interior estava mal iluminado. Ainda havia alguns livros sobre as prateleiras e teias de aranha cobriam a parte mais alta das estantes. A única ocupante era uma jovem sentada atrás do balcão, com um vestido simples e uma touca branca simples. Examinou as vestimentas luxuosas de Anthony, e escondeu rapidamente a revista sensacionalista que estava lendo. ─J. T. Tuttington? ─ perguntou gentilmente. Ela começou a rir. ─Ele é meu pai, senhor. Meu nome é Hannah Tuttington. Cuido do museu, quando ele não está. Ele acenou com a cabeça. ─É um prazer conhecê-la, Senhorita Tuttington. Hannah corou com a saudação amigável. ─Posso ajudá-lo, senhor? ─Soube que aqui foi o cenário de um assassinato chocante ─ Anthony disse. Os olhos de Hannah se arregalaram. ─É verdade, senhor. Foi um acontecimento dos mais terríveis e sangrentos. Uma mulher matou o seu amante a sangue frio neste lugar. Quer fazer uma visita completa, senhor? ─Sim, por favor. 213


Anthony tirou uma moeda do bolso do casaco e colocou-a sobre o balcão. Hannah rapidamente pegou. ─Por aqui, senhor. Começamos na porta dos fundos. O belo Lord Gavin usava esta porta, quando vinha visitá-la nas últimas horas da noite. Saiu rapidamente de trás do balcão e o levou para a parte de trás da antiga biblioteca. Antes de segui-la, Anthony deu uma olhada na revista que ela estava lendo. A capa continha um escabroso desenho de uma mulher deitada no chão, ao pé de um lance de degraus de pedra. A figura ameaçadora de um homem estava no patamar, com uma faca ensanguentada na mão. A capa dizia: "A história completa do terrível assassinato de Frances Hayes, uma prostituta." Ele caminhou para a parte de trás da loja, tomando seu tempo e absorvendo a atmosfera do local. ─Vejo que conservam alguns dos livros, do proprietário anterior ─ disse, olhando caixas de papelão cheias de livros velhos, amontoados em um pequeno canto. ─Só nos restam poucos ─ disse Hannah ─ Papai vendeu-os quando ele assumiu a loja. Os primeiros dias, após o assassinato, vieram todos os tipos de pessoas estranhas querendo comprá-los. Ele olhou para ela. ─Estranhas de que maneira? Hannah fez uma careta. ─Disseram que meu pai que era colecionador. Surpreender-se-ia com os preços que eles estavam dispostos a pagar por alguns livros empoeirados. Quem poderia imaginar que havia um mercado para esse tipo

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de coisa? Papai pensou que ficaria rico em um mês, mas depois de alguns dias deixaram de vir. ─E, sobraram esses volumes? Anthony aproximou-se para examinar as caixas. Hannah olhou para eles entristecida. ─Às vezes, alguém leva algum como lembrança da visita, mas nossos clientes não estão dispostos a pagar tanto quanto os colecionadores. Agora, a maioria dos livros é vendida por centavos. ─Muitas pessoas vêm para visitar o museu? ─Não tanto quanto nos primeiros meses após o assassinato ─ Hannah suspirou ─ Lamento dizer que o negócio não está indo muito bem ultimamente. Papai faz tudo o que pode para promover o museu, mas há muita concorrência hoje em dia. Dificilmente se passa uma semana sem que a impressa fale de outro assassinato chocante ou de um suicídio. Papai está pensando em trocar de negócio. ─Uma decisão sábia, sem dúvida. Fale-me sobre o assassinato. Hannah limpou a garganta e assumiu um tom melodramático. ─O nome da assassina era Joanna Barclay, uma senhorita muito bonita, de longos cabelos loiros e adoráveis olhos azuis. Seu amante era Lord Gavin, um cavalheiro bonito e sempre muito elegante. ─De onde você tirou as descrições? ─ perguntou Anthony baixinho. Hannah piscou por causa da interrupção. ─Dos jornais e das revistas sensacionalistas, é claro. Eu asseguro-lhe que todos os detalhes estão baseados em fatos reais, senhor. ─Claro. Por favor, continue. ─Na noite do terrível evento, Joanna Barclay ouviu o belo Lord Gavin a chamando três vezes na porta de trás.

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Hannah aproximou o punho da porta e chamou de uma maneira que pressagiava nada de bom. ─Como é que você sabe que ele chamou três vezes? ─ perguntou. ─Era seu código secreto. ─Se fosse um código secreto, como você saberia? Hannah franziu a testa, confusa com a pergunta novamente. ─Meu pai leu sobre o código em um tabloide. Anthony balançou a cabeça e disse: ─Uma fonte de informação sempre confiável. Hannah retomou a história com tom sepulcral. ─A Srta. Barclay recusou-se a receber o seu belo amante, vestida em uma camisola, roupão e chinelos. ─Como você sabe o que ela vestia? Também tirou das notícias publicadas nos tabloides? ─Meu pai diz que os clientes gostam de conhecer os detalhes ─ confessou Hannah ─ Portanto, alguns que eu invento, para tornar a história mais interessante. ─O que demonstra muita iniciativa da sua parte, senhorita. ─Obrigado, senhor ─ Hannah estava satisfeita ─ Como eu estava dizendo, a bela Joanna Barclay desceu vestida para uma noite de paixões proibidas. Abriu a porta para deixar entrar seu distinto amante. Anthony estudou a porta. Era um modelo relativamente novo que não estava muito tempo no mercado. O que o interessou foram os sinais na madeira adjacentes. Havia marcas e perfurações, e imaginou o contorno de uma fechadura anterior, muito maior. ─Esta é mesma fechadura que havia na porta quando aconteceu o assassinato? ─ Perguntou ele.

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─Não, senhor ─ Hannah franziu a testa, obviamente intrigada com a pergunta ─ Papai fez com que instalassem uma nova quando alugou o local. A que estava antes, estava quebrada. ─Tem alguma ideia de como se quebrou? Confusa, Hannah sacudiu a cabeça. ─Como vou saber, senhor? ─Não importa. Hannah tossiu um pouco e retomou a sua história: ─Depois de deixar o seu lindo amante, naquela noite fatídica, Joanna Barclay beijou apaixonadamente Lord Gavin, e tomando-o pela mão o levou para o andar de cima. Mal sabia ele que estava indo para a sua própria morte. ─Sem dúvida, ele não imaginava o que o destino traria ─ Anthony respondeu, estudando as escadas. ─Me acompanhe, senhor. Vou mostrar-lhe o ninho dos amantes. Hannah subiu as escadas até os quartos, localizados acima da loja. Ele a seguiu, escutando o ranger dos antigos degraus. "Ela não desceu para abrir a porta. Ouviu como forçou a porta, e em seguida, ouviu seus passos na escada. " Ao chegar ao piso superior, Hannah, mostrou com a mão a sala de estar, pequena e aconchegante. Não havia muita mobília, Anthony pensou. Uma cadeira de leitura, uma mesa, uma lâmpada e um pesado baú. Parecia um lugar solitário. ─Mobilhado tal e qual como na noite do assassinato, senhor ─ disse Hannah ─ Como eu estava dizendo, Joanna Barclay trouxe o amante condenado até esta sala, o convidou para sentar-se e ofereceu-lhe um copo de vinho. Anthony olhou para a mesa. 217


─Eu não vejo nenhum copo. Como sabe que lhe ofereceu alguma coisa para beber? ─Os amantes quando se encontram costumam beber vinho ─ disse Hannah. Anthony balançou a cabeça e disse: ─Não sei como nunca pensei nisso. Hannah baixou a voz até que se tornou um sussurro teatral. ─Desencadeou-se uma violenta disputa. ─Também inventou isso? ─Parece lógico que eles tenham discutido, senhor ─ disse Hannah pacientemente ─ Por que outra razão o mataria? ─Uma excelente pergunta. Alguém ouviu gritos? -Anthony suspirou. Naquele momento, não havia vizinhos ─ Sobre o que eles discutiram? ─Segundo a imprensa, a briga começou, porque Lord Gavin disse à senhorita Barclay que iria substituí-la por outra mulher. ─Por quê? ─Por quê? ─ exclamou Hannah perplexa ─ Porque ele havia se cansado dela, eu acho. Afinal de contas, era sua amante. Todo mundo sabe que os homens, frequentemente, se cansam de suas amantes. ─Por favor, continue. ─Muito bem ─ Hannah parou, e com um gesto dramático, recolheu a cortina que separava a sala do quarto ao lado. ─ Joanna Barclay convidou o elegante Lord Gavin ao seu quarto pela última vez. Ele a acompanhou, sem saber que nunca sairia vivo dali. Anthony se aproximou da entrada e puxou o reposteiro. Havia uma pequena penteadeira e um armário. Os lençóis e colchas da cama estreita estavam amontoados, presumivelmente para indicar um apaixonado

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encontro amoroso. No tapete eram visíveis manchas marrons, velhas e putrefatas. ─É o lugar...? ─Depois de seu último abraço apaixonado, Lord Gavin adormeceu ─ disse Hannah ─ Joanna Barclay se levantou da cama, pegou o atiçador, que você vê ao lado de sua camisola e, com toda a sua força, golpeou o seu indefeso amante na cabeça. Uma recatada camisola branca, enfeitada com um delicado bordado, na parte inferior, estava estendida nos pés da cama. ─Será que eles trocaram os lençóis? ─ perguntou. ─Não senhor. Garanto que tudo o que há nesta habitação se encontra tal e qual como papai encontrou quando o museu abriu. Ventilamos os lençóis e a camisola ocasionalmente e tiramos o pó dos móveis, mas nada mais. Anthony aproximou-se da cama para examiná-la. ─Não há manchas de sangue sobre os lençóis. Foram lavados? ─Não, senhor ─ Hannah franziu a testa ─ Não me lembro de sangue na roupa de cama. ─Provavelmente porque está no tapete ─ disse Anthony suavemente. Hannah lutou um momento com a discrepância e depois se animou. ─Suponho que Lord Gavin acordou antes dela golpeá-lo, e se levantou da cama em uma tentativa inútil de evitar o golpe. ─Esta é certamente uma teoria plausível. Ele abriu o armário. Dentro estavam dois vestidos desbotados e um par de sapatos. Ele voltou para a sala e se agachou na frente do baú. A fechadura era sólida, mas estava aberta. Levantou a tampa e olhou para dentro. Estava vazia. 219


─O que eles encontraram no baú? ─ perguntou a Hannah. O rosto da menina enrugou-se em sinal de profunda concentração. ─Se havia algo dentro, desapareceu antes de papai alugar as instalações. Por que você pergunta? ─Não importa. Não é importante. Pura curiosidade. ─Bem, a seguir ─ continuou Hannah ─ uma vez que Joanna Barclay assassinou Lord Gavin de maneira brutal, foi traída pelos nervos e chorou amargamente. Joanna Barclay tinha comprado uma fechadura cara para o baú. Fosse o que fosse que guardasse ali dentro, deve ter sido de valor considerável para ela. A fechadura estava quebrada. O baú aberto por alguém que tinha uma chave ou que sabia como forçar uma fechadura. ─Dizem que ela cometeu suicídio ─ Anthony observou, levantandose. ─Ia chegar a essa parte ─ Hannah exagerou em um arrepio ─ Como eu lhe dizia, depois de assassinar seu lindo amante, Joanna Barclay entregou-se ao mais profundo desespero. Correu para o rio, jogou-se da ponte e se afogou. Eles encontraram um chapéu enfeitado por uma pena, preso a um pedaço de madeira flutuante. ─Porém, não encontraram o seu corpo ─ lembrou Anthony. ─Não, senhor. Isso é verdade. ─Obrigado, Srta. Tuttington. A visita guiada foi muito instrutiva. ─Fico feliz que você tenha gostado, senhor. Pouco tempo depois, abandonou o museu Tuttington se perguntando o que havia no baú, e por que motivo uma mulher que planejava se matar se deu ao trabalho de levar o seu conteúdo. Ocorreu-lhe que há pouco mais de um ano, ele tinha estado obcecado com perguntas sobre a morte de Fiona. Perguntas para as quais ainda não tinha encontrado respostas. No 220


entanto, por alguma razão desconhecida, era o mistério da outra mulher que o atraía agora.

Capítulo 29

As contas mensais estavam indo bem, mostrando lucros esplêndidos novamente. Madame Phoenix deixou a pena e fechou o diário. As melhorias que foram introduzidas com os fundos fornecidos pelo novo círculo de investidores tinham sido muito lucrativas, como ela havia imaginado. Era meia-noite. Sonoras gargalhadas masculinas chegavam do grande salão que ficava no térreo. Os cavaleiros estavam ocupados bebendo taças de champanhe e conhaque de excelentes qualidades, canapés de lagosta, pato assado, e um sem fim de aperitivos e bebidas alcoólicas que contribuíam para fazer da Phoenix House o bordel mais elegante de Londres. Não era apenas a comida que tinha chamado a atenção dos homens ricos e entediados, que vinham todas as noites. Madame Phoenix sabia que a principal atração era a qualidade das mulheres disponíveis por uma ou duas horas de prazer. As mulheres que trabalhavam na Phoenix House não eram prostitutas de rua. Todas elas procediam de boas famílias, tinham sido educadas e se vestiam na última moda. A maioria provinha de classes respeitáveis, mulheres solteiras ou viúvas que se viram sozinhas no mundo ou tentavam 221


pagar as dívidas de seus pais e maridos. Todas tinham uma coisa em comum: tinham sido empurradas na mais abjeta pobreza, por um motivo o outro. Haviam escolhido a Phoenix House no lugar da rua ou do rio. Ouviu três batidas rápidas na porta. ─Entre ─ disse Madame Phoenix, virando-se. A porta se abriu. Uma mulher, jovem e bonita, usando um vestido com corselet, que expunha seus seios aos olhares, a saudou com uma reverência. ─O cliente chegou, e o estão conduzindo ao aposento, madame. ─Obrigado, Betsy. Você pode para os nossos convidados. ─Sim, madame. Curvou-se novamente e saiu. Madame Phoenix esperou até que a porta se fechasse atrás da jovem, antes de atravessar a sala e parar em frente a uma estante. Puxou uma alavanca escondida. A estante se abriu, revelando um estreito e mal iluminado corredor parcamente iluminado por um aplique. Entrou e fechou o painel às suas costas. O primeiro proprietário havia ordenado a construção das passagens, porque ele não gostava de cruzar com os criados na escada ou corredores. As passagens ocultas permitiam que os serviçais se movimentassem discretamente pela casa, sem serem vistos pelo proprietário ou seus convidados. A proprietária anterior do bordel tinha encontrado outro uso para as passagens secretas. Depois de desfazer-se de sua predecessora, Madame Phoenix manteve a tradição. Em vários pontos, ao longo dos corredores, as paredes tinham pequenos orifícios, através dos quais se podiam ver o interior dos aposentos. Os buracos estavam discretamente escondidos com

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quadros pendurados nas paredes. Os ocupantes dos quartos não sabiam que, às vezes, serviam diversão para aqueles que pagavam para olhar. Apenas os clientes mais seletos eram informados da oportunidade de observar os outros, executando uma variedade de atos sexuais. A tarifa era, naturalmente, exorbitante, mas até então, ninguém a quem tinha sido oferecido a oportunidade de desfrutar do serviço, havia se recusado a pagar. Caminhou um trecho pelo corredor e desceu por alguns degraus estreitos. Percorreu uma curta distância por outro corredor e parou na frente de um pequeno buraco na parede. Uma lâmpada de gás, com uma pequena chama, iluminava o aposento do outro lado. As paredes e o teto eram cobertos com veludo preto. Uma cama, coberta com lençóis de seda combinando, imperava no centro da sala. Algemas de veludo preto estavam penduradas em quatro pilares que ladeavam a cabeceira e o pé da cama. Uma das paredes era ocupada por uma vitrine. Dentro, estavam expostos diferentes tipos de objetos, incluindo vários modelos de chicote e alguns instrumentos incomuns. Enquanto observava, a porta do aposento foi aberta. Uma das moças, provocativamente vestida, deu passagem para o cliente. ─A Srta. Justine me deu ordens para que se dispa, dobre suas roupas e espere deitado na cama ─ disse a empregada. O cliente assentiu vigorosamente. ─Compreendo. A jovem saiu. Ao fechar a porta se ouviu um som de metal por trás dela. O cliente tirou a roupa com óbvio entusiasmo. Dobrou a roupa cuidadosamente e a colocou sobre a cômoda. Com o membro completamente ereto, deitou-se de bruços na cama. 223


A chave voltou a girar na fechadura. A porta se abriu e apareceu uma mulher alta e vestida com um espartilho negro, austero. Parecia uma dominatrix. ─Ponha-se de pé, ao lado da cama ─ disse a mulher, com voz fria e aborrecida. ─Sim, senhorita Justine. O cliente obedeceu sem questionar. ─Vá para a vitrine onde se encontram as ferramentas de punição e escolha um chicote. Desta vez, acredito que um dos grandes. Vejo que não dobrou as roupas tão cuidadosamente quanto deveria. Você precisa ser castigado. ─Sim, senhorita Justine. O cliente abriu o armário e pegou o chicote. ─Beije o chicote antes de me entregar e, em seguida, ponha a venda. ─Sim, senhorita Justine. Submisso, o cliente, beijou respeitosamente a empunhadura do chicote, antes de entregá-lo. Em seguida, ele se aproximou da mesa, pegou um lenço de seda preto e vendou os seus olhos. ─Deite-se na cama. Virado para baixo. ─Sim, senhorita Justine. Tateando, o cliente voltou para a cama e deitou-se. Quando ele estava na posição, a Srta. Justine andou ao redor da cama sem pressa, parando em cada coluna para amarrar-lhe os pulsos e tornozelos. Então, pegou o chicote. Madame Phoenix afastou-se do seu observatório e iniciou a caminhada de volta para as escadas que conduziam ao seu escritório. Não tinha nenhum prazer em ver como Elwin Hastings sofria a sua punição.

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Afinal de contas, o bastardo se divertia muito com ele. Ele pagava muito bem para recebê-lo. Retornou aos seus aposentos através das passagens ocultas. As coisas estavam indo muito bem na Phoenix House, havia apenas um problema. Estava claro que teria que lidar com Louisa Bryce. Ela estava fazendo perguntas demais. Abriu a porta de sua área privada. Ela a estava esperando, tal como tinha imaginado. ─Querida. Ela sorriu e correu para os seus braços. Ele a beijou apaixonadamente, com fome, enquanto seus dedos encontravam os botões de seu vestido. Poucos minutos depois, a arrastava para a cama.

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Capítulo 30

O restaurante era o mesmo que haviam escolhido há pouco mais de um ano antes, para reunir-se em particular. Como era seu costume, ocuparam um reservado na parte de trás do local. O pequeno estabelecimento, de propriedade de um chef francês, servia um coq au vin, realmente, delicioso. Também se vangloriava de oferecer uma excelente carta de vinhos. Sua principal atração, no entanto, era que estava situado em um pequeno e anônimo beco, bem distante da Scotland Yard. Fowler não teria que se preocupar com que seus colegas o vissem. ─No ano passado eu lhe disse que o assassinato de Gavin e suicídio da Srta. Barclay não tinham nenhuma conexão com as mortes da Srta. Risby e da Sra. Hastings ─ disse Fowler, espetando um pedaço de frango com um garfo. ─Eu não tenho dúvida de que esteja certo ─ Anthony pensou que ele tinha de ter cuidado com as perguntas que fazia. Ainda que Fowler e ele compartilhassem um interesse mútuo em descobrir a verdade sobre o assassinato de Fiona Risby, Fowler não deixava de ser um detetive ─ No entanto, eu acho interessante que tantas mulheres decidiram pular no rio em menos de um mês. O que você sabe de Lord Gavin? Fowler bufou. ─No que se refere à polícia, o mundo está muito melhor sem ele. Eu acredito que a viúva está tão satisfeita, como nós, por haver se livrado de um bastardo. O tom veemente de Fowler deu o que pensar a Anthony. Lentamente, colocou seu garfo no prato. 226


─Não expressou esses sentimentos tão fortes, no ano passado, quando falamos sobre Gavin, Fowler. ─Sem querer ofender, senhor, mas, não conhecia você naquela época ─ Fowler pegou o copo de vinho e tomou um gole ─ Se você se lembrar, tinham acabado de nos apresentar. Eu lhe disse o que considerei apropriado que soubesse, para ficar tranquilo de que não havia ligação entre o assassinato de Gavin e a morte de Fiona Risby. ─Eu entendo. Agora, é claro, despertou a minha curiosidade. Por que está satisfeito de que Gavin não se encontre entre os vivos? Fowler levantou as sobrancelhas. ─Você o conhecia, senhor? ─Superficialmente. Eu o conheci, ocasionalmente, em alguns clubes, mas nunca fomos amigos. Fowler olhou para os reservados adjacentes, para se certificar que eles estivessem vazios, e baixou a voz. ─Lord Gavin era, como diríamos, alguém importante entre os membros da polícia que se dedicam a investigações criminais. Anthony ficou frio. ─Nunca ouvi esses rumores. ─Claro que não, senhor. Meus superiores tiveram todo cuidado de manter a maior parte em extremo sigilo. Ele teria desencadeado um inferno grande se nós o implicássemos em uma investigação. Gavin ficaria realmente furioso. Todos os envolvidos teriam perdido o emprego. ─Eu entendo ─ disse Anthony. ─Não repita em seus clubes o que eu vou lhe dizer, senhor. ─Eu juro. Fowler assentiu uma vez, satisfeito.

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─Muito bem. Alguns meses antes da morte de Gavin, estupraram e bateram a proprietária de uma loja de luvas. A jovem mulher, uma viúva que tinha assumido o negócio de seu marido, esteve a ponto de morrer. Foi encontrada por sua funcionária, totalmente emocionada, que chamou a polícia. ─Continue. ─A vítima acusou Lord Gavin do ataque. Anthony congelou. ─Eu não li nada na imprensa. ─Claro que não ─ Fowler rosnou ─ O assunto foi imediatamente silenciado, entre outras razões, porque a proprietária da loja não era uma testemunha das mais confiáveis. Naquela época, a viúva mantinha um caso com um homem casado e haviam escutado quando discutiu com seu amante. Anthony deixou o garfo e disse: ─ Ou seja, presumiu-se que foi ele que a violentou, em um ataque de ciúmes, e que ela havia denunciado Lord Gavin como seu agressor, no lugar de revelar o nome de seu amante. ─Exatamente, senhor. No final, a vítima sofreu um intenso colapso nervoso e confessou que havia mentido ao acusar Gavin de havê-la agredido. ─Porém, não me irá dizer que tirou o nome de Gavin do nada, para dá-lo a polícia – comentou Anthony. ─Não. Era um de seus clientes. Gavin havia comprado dois pares de luvas, poucas semanas antes do ataque. ─Você falou com Gavin?

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─Recusou-se a conceder-me uma entrevista ─ disse o policial ─ Sem provas e com apenas uma testemunha, que mudou de ideia sobre os fatos, não havia nada que eu pudesse fazer. ─Eu sinto que a história não termina aí. ─Não ─ disse Fowler, com o rosto sombrio ─ Não termina aí. Um mês depois, outra mulher solteira que vivia sozinha, foi encontrada morta, em seus aposentos localizados acima de sua loja. Ela foi estuprada, espancada e esfaqueada. Anthony empurrou o prato, sem apetite. ─Esse assassinato apareceu na imprensa. Que eu saiba, ninguém foi preso – lembrou Anthony. ─Porque não havia provas ─ O policial tentou ser irônico: ─ A vítima foi incapaz de nos dizer porque ela foi morta. No entanto, houve algumas semelhanças com o processo anterior que preocuparam. Finalmente encontrei uma testemunha que viu um homem cuja descrição ajustava-se a Gavin, que entrou na loja um par de vezes, nos dias que antecederam o crime, porém isso não era suficiente para agir. ─O que você fez? Fowler fez um gesto impotente com a mão. -Eu quis designar um policial para seguir Gavin por um tempo, mas meus superiores tiveram medo de serem descobertos. ─O que aconteceu depois? ─Depois de um mês, houve uma morte semelhante ─ disse Fowler. Anthony levantou uma sobrancelha. ─Outra mulher proprietária de uma loja? -Sim. Neste caso, uma vizinha da vítima testemunhou que nas semanas anteriores à sua morte, ela confidenciou que um de seus clientes, um cavalheiro, a estava deixando nervosa. Disse que ele lhe fez propostas 229


indecentes e pareceu irritado quando ela se recusou. Em seguida, outros incidentes ocorreram. ─Que tipo de incidente? ─Entre outras coisas, a proprietária da loja encontrou uma imagem obscena alguém havia introduzido por baixo de sua porta. Era a imagem de uma mulher nua, com as pernas abertas. ─Maldito bastardo! ─ Anthony sussurrou. ─Outra vez ─ Fowler continuou ─ a mulher encontrou um rato morto em sua cama. Cortaram-lhe a cabeça e os lençóis estavam empapados de sangue. ─Suponho que não houve nenhuma maneira de vincular estes incidentes com Gavin. Fowler balançou a cabeça. ─Não. ─Descreva-me a cena de assassinato de Gavin – pediu Anthony. ─Quando me informaram que haviam encontrado o corpo de Gavin, nos aposentos acima da Livraria Barclay, imediatamente me dirigi ao local. Eu encontrei a nota de suicídio da Srta. Barclay. ─Mais alguma coisa? ─Um atiçador de lareira com manchas de sangue e restos de cabelo ─ Fowler descreveu o objeto com as mãos. ─Isso é tudo? ─Só mais uma coisa ─ acrescentou Fowler lentamente, antes de deixar seu garfo no prato, com grande precisão ─ Esse assassinato não apareceu na imprensa porque não mencionamos nada aos jornalistas. Encontrei uma faca no chão, ao lado da cama. Supostamente, algumas pessoas diriam que a Srta. Barclay tinha a intenção de apunhalar Gavin,

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depois de golpeá-lo na cabeça com o atiçador, para ter certeza que estava morto. ─Porém, você não acredita que tenha ocorrido dessa forma – concluiu Anthony. ─Não, não acredito. Tenho a impressão que Gavin deixou cair a faca quando a Srta. Barclay o acertou com o atiçador. A imagem de Joanna Barclay lutando contra um homem armado com uma faca lhe gelou o sangue. Anthony olhou para baixo e percebeu que seu punho estava fechado. Deliberadamente relaxou os dedos. ─ Foi ali para estuprá-la e matá-la ─ disse lentamente. ─Estou absolutamente convencido de que foi isso mesmo. Dei uma olhada no livro de contas e nos recibos da Srta. Barclay. Gavin havia comprado três livros em três ocasiões diferentes. Isso era parte de seu plano. Escolhia mulheres solteiras, que estavam sozinhas no mundo. Proprietárias de empresas, cuja ausência ninguém notaria, pelo menos por algum tempo. Mulheres de origens humildes, cuja posição social era muito abaixo da sua. ─Um facínora. ─Um facínora, mentalmente perturbado, acredito ─ Fowler continuou ─ Eu conheci outros como ele. Acho que começou batendo em suas vítimas, mas depois de um tempo, isso não era suficiente para satisfazer a sua lascívia doentia. ─Então, começou a assassiná-las. ─E, continuaria a fazê-lo se a Srta. Barclay não tivesse impedido ─ disse Fowler ─ Em minha opinião ela nos fez um grande favor despachando Lord Gavin para outro mundo. Uma pena que essa jovem não esteja conosco. Eu acho que ela tirou sua vida porque temia ser acusada de assassinato. 231


─Esse medo não era apenas um produto da sua imaginação, dada a sua posição no mundo, em relação à de Gavin ─ Anthony ficou olhando para Fowler através da mesa ─ Nós dois sabemos que se a família de Gavin insistisse em ver a Srta. Barclay enforcada pelo assassinato, é muito provável que impusessem a sua vontade. Fowler ergueu as sobrancelhas espessas. ─Infelizmente, a Srta. Barclay não tinha nenhuma maneira de saber que a esposa de Gavin não amava o seu marido e, que sua família está secretamente aliviada de que esteja morto. Suspeito que eles tinham motivos para temer sua ira. ─Como você averiguou isso? ─Falando com os criados, é claro. Até a morte de Lord Gavin, no ano passado, as trocas de empregados eram frequentes em sua mansão.

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Capítulo 31

Anthony deixou o clube pouco depois da meia-noite. Ele parou por um momento considerando sobre a prudência em chamar um coche, mas logo abandonou a ideia. Por causa da neblina, os veículos andavam a passos de tartaruga. Inclusive aqueles que eram mais ágeis e rápidos se viam obrigados a se movimentarem cautelosamente através da névoa quase impenetrável. Seria mais rápido caminhar. Além disso, pensava melhor ao caminhar, e naquela noite precisava pensar. Levantou a gola de seu casaco e começou a descer as escadas. Um carro parou na rua, bem na sua frente. Uma figura familiar desceu com passos vacilantes do veículo. Julian Easton estava bêbado, como de costume. Uma infeliz coincidência, Anthony pensou. Gostaria de ter saído cinco minutos antes. ─Stalbridge ─ Easton agarrou o corrimão para não cair ─ Vai sair tão cedo? Não se aprece por minha causa. ─Não o faço. Anthony desceu as escadas. Easton colocou-se na frente dele, bloqueando o seu caminho. ─Você está indo visitar a sua viuvinha, na Praça? ─ O rosto de Easton contraiu-se em um sorriso de escárnio ─ Não se esqueça de dar-lhe os meus cumprimentos. Anthony parou. ─Está no meu caminho, Easton. Gostaria muito que se afastasse. ─Vejo que está com pressa para vê-la ─ Easton oscilou um pouco ─ Eu me pergunto quanto tempo vai levar para perceber que se aproveita de sua ingenuidade. 233


─Por que não entra e toma outra garrafa de clarete? ─ disse Anthony com desprezo. ─É injusto de sua parte usá-la para encobrir seu caso com a esposa de outro homem, você não acha? ─O que eu acho é que seria melhor guardar suas especulações para si mesmo ─ disse Anthony lentamente. ─E, por que iria fazê-lo quando existe tantas pessoas ansiosas para resolver o mistério? ─ Easton adotou um ar astuto ─ Na verdade, há apostas em todos os clubes de St. James. É surpreendente como muitos cavalheiros estão curiosos para saber com a esposa de quem você está dormindo, enquanto se esconde sob as saias foras de moda da Sra. Bryce. ─Saia do meu caminho, Easton. O rosto de Easton contraiu-se em uma expressão de raiva. ─É melhor não tentar me jogar no chão novamente. Agora eu carrego uma arma para proteger-me de você. ─Tenha cuidado ─ advertiu-lhe Anthony ─ Em seu estado atual poderia atirar em seu próprio pé. Agora devo insistir que se afaste. ─Ao diabo, se sairei daqui! Anthony pegou o braço de Easton e o torceu. Easton bateu contra a grade de ferro e teve que agarrar-se freneticamente para não cair. Quando ele recuperou o equilíbrio, Anthony já estava na calçada. Outro coche chegou e dele desceram três cavalheiros bem vestidos. Eles observaram a cena com expressão de divertida curiosidade. ─A esposa de quem? ─ gritou Easton, com voz cheia de raiva. Em qual dos cavalheiros do clube está colocando chifres, Stalbridge? Anthony não se virou para olhar. Seguiu em frente, mergulhando no nevoeiro.

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As ruas estavam bem iluminadas naquela parte da cidade. As bolas brilhantes de luz que pendiam diante das portas estavam enfileiradas, formando um estranho colar de pedras preciosas brilhando no escuro. No entanto, noites de nevoeiro como esta, a luz não chegava muito longe. Nos paralelepípedos rodavam carruagens e coches, que apareciam e desapareciam na névoa. O ruído surdo e lento dos cascos dos cavalos e do chocalho de veículos soava estranhamente naquela noite. Era como se a bruma engolisse tanto o som, assim como a luz. Devia avisar Louisa das apostas que foram feitas à custa deles nos clubes, pensou. Parou em uma esquina pensando na hora. Provavelmente ela estaria na cama, mas queria que a despertassem para conhecer esta informação de última hora. Afinal de contas, ela continuamente o recordava que eram parceiros. Ele tentou imaginar que aspecto teria a essa hora, em roupão e chinelos, e cabelo recolhido em um chapéu ou, talvez, solto sobre os ombros. Sorrindo, ele virou uma esquina e se dirigiu para a Praça Arden. Não tinha certeza do momento em que percebeu o eco de passos atrás dele. Ele tinha cruzado com certo número de pedestres na rua, e nas imediações do clube. No entanto, desde entrou na vizinhança mais tranquila, de mansões e pracinhas, não havia visto mais ninguém. Não era apenas o som dos passos que o incomodava. Era o ritmo. Muito parecido com o seu, ele pensou. Quem quer que fosse que caminhava atrás dele, tentava manter a distância. Ele parou para verificar sua teoria. Ouviu os passos por um momento e, então, de repente parou. Retomou seu ritmo. Voltou a ouvi-los. Virou em outra esquina e caminhou em direção à Praça Arden. A luz fraca das lâmpadas de rua iluminava as entradas dos edifícios, mas o pequeno parque, no centro da praça, era uma sombra, escura e sem forma. 235


Ele fez uma pausa. A pessoa que o seguia fez o mesmo. Ele atravessou a rua indo em direção ao parque invisível, aproveitando a mudança de direção para olhar à direita. A silhueta de uma figura vestida com uma capa e um chapéu alto estava parada na calçada. Anthony entrou no pequeno parque, seguindo o caminho de cascalho. A luz da lua, refletida no nevoeiro, brilhando o suficiente para revelar o contorno escuro dos troncos das árvores e as formas compactas dos arbustos. Ele ouviu o som de passos apressados. Um momento depois, o cascalho rangia atrás dele. Ele tirou o casaco e chapéu. Ao chegar próximo da estátua da ninfa, erguida no centro do parque, envolveu os ombros de pedra com o seu casaco. O chapéu, ligeiramente inclinado, colocou-o sobre a cabeça da ninfa. Afastou-se da figura, entrando nas sombras para examinar seu trabalho. De dia, não enganaria ninguém, mas depois, à luz da lua e no meio do nevoeiro, o sobretudo e chapéu ofereciam uma semelhança razoável com um homem que tinha parado para esvaziar a bexiga. Esperou. Os passos se aproximavam mais rapidamente, agora. Tinham uma pressa nervosa, como se o perseguidor temesse perder sua presa. Uma figura surgiu da sombra projetada por uma árvore imponente. O homem parou a poucos passos da estátua coberta. Levantou o braço e apontou. Anthony mal teve tempo de reconhecer a forma escura de uma arma na mão do homem, quando ouviu o som inconfundível do engatilhar de uma arma de fogo. Um segundo mais tarde, um tiro foi ouvido, acompanhado pelo resplendor da trajetória da bala. A bala ricocheteou ao 236


chocar-se na pedra. O atacante voltou armar novamente a sua pistola e a atirar. Desta vez, quando nem o casaco e nem o chapéu caíram ao chão, pareceu perder a paciência. Deu meia volta e correu sobre seus passos pelo caminho de cascalho. Anthony correu para fora das sombras. Ao ouvir os passos pesados atrás dele, o homem parou, virou-se, ergueu a pistola e disparou novamente, apontando para as sombras. Não estranhou que a bala ricocheteasse no tronco de uma árvore. No entanto, Anthony chegou à conclusão que persegui-lo não era certamente, a manobra mais inteligente. Ele também estava armado com uma pistola, mas não estava disposto a começar a atirar em alguém que não conseguia identificar. Relutantemente, parou no limite do parque, deixando a presa desaparecer na noite. O sangue pulsava em suas veias. ─Droga! Os tiros não passaram despercebidos. Ouviam-se gritos de alarme das janelas com vista para a praça. Anthony voltou para a ninfa, a fim de recolher seu casaco e chapéu. Enfiado nas sombras, tanto quanto possível, para evitar ser visto pelas pessoas que olhavam pelas janelas, deixou o parque e atravessou a rua. "Eu não deveria visitá-la agora", ele pensou. No entanto, encontrouse subindo as escadas do número doze. Louisa gostaria de ser informada dos fatos. Afinal de contas, era uma jornalista. E, ele morria de vontade de vê-la. Não precisou utilizar a aldrava. A porta se abriu de par em par, muito antes que ele erguesse a mão. Louisa estava ali, olhando-o ansiosamente através de seus óculos.

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─Meu Deus! O que aconteceu? Eu ouvi os tiros, desci as escadas e olhei pela janela, quando o vi cruzando a rua. Você está bem? Por que você está aqui? Tentaram atacá-lo? Ao vê-la, sentiu-se imediatamente de bom humor. Ele estava certo, pensou estranhamente satisfeito. Tinha um aspecto deliciosamente tentador de camisola e pantufas. E, tinha a resposta para a pergunta vital da noite. Ela dormia com o cabelo solto.

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Capítulo 32 ─Meu Deus! Você está com dois buracos de bala em seu casaco ─ Consternada, Louisa olhava fixamente a parte de trás da peça ─ Poderia têlo matado. ─Se eu estivesse usando o casaco naquele momento ─ disse Anthony, Atravessou a biblioteca na direção da mesa de bebidas e serviu-se de um conhaque. Viu que Louisa sustentava o seu casaco contra a luz, verificando novamente que, sim, era possível, ver através dos buracos que havia na parte de trás. A sua indignada consternação o comoveu profundamente, porém a sua falta de lógica o fez sorrir. ─Como eu lhe disse, cobri a estátua com ele. ─Ele está bem, querida ─ intermediou Emma suavemente ─ O Sr. Stalbridge explicou-lhe que não estava vestindo o casaco quando atiraram nele, ou melhor, contra a estátua. ─Mas, não é essa a questão ─ Louisa jogou o casaco sobre o encosto do sofá e se virou para olhar Anthony ─ A questão é que você não deveria ter corrido esse risco. Andar sozinho à noite. O que você estava pensando, senhor? Ele tomou um gole de conhaque e deixou o copo. ─Eu tinha a impressão de que este era um bairro respeitável. ─É, mas isso não significa que alguém possa andar sozinho a qualquer momento, convertendo-se em alvo perfeito para um bandido qualquer. ─Não foi um bandido qualquer que atirou no meu casaco ─ disse Anthony. 239


Louisa e Emma olharam para ele. ─Que diabos quer dizer? ─ sussurrou Louisa. ─Tenho quase certeza de que foi Hastings ─ refletindo, ele fez uma pausa ─ Embora eu suponha que também possa ter sido Easton ─ disse, sacudindo a cabeça ─ Acho que Easton estava bêbado demais para me seguir no nevoeiro, e muito menos para apontar-me uma arma. No entanto, como não tinha a certeza absoluta, decidi não disparar. ─Meu Deus! ─ disse Louisa, abrindo muito os olhos ─ Você está armado com uma pistola? ─Eu a comprei quando estive no oeste dos Estados Unidos. As armas ali são muito comuns. Após a morte inesperada Thurlow, me pareceu prudente usá-la ─ deu de ombros ─ Muito embora, fosse improvável que eu poderia acertar um alvo em movimento esta noite, não com este nevoeiro. Uma das coisas que aprendi em minhas viagens ao Extremo Oriente é que os revólveres são notoriamente imprecisos, exceto a curta distância. ─Oh, Deus! ─ exclamou Emma ─ A situação está tomando um rumo muito inquietante. ─O que faz você pensar que tenha sido Hastings? ─ Louisa perguntou. Anthony ponderou brevemente. ─A mesma altura. Algo na maneira como ele se movimentava. Acho que ele me seguiu desde o clube, à espera de uma oportunidade. ─Uma oportunidade para assassiná-lo ─ Louisa afundou em uma cadeira, horrorizada ─ Meu Deus! Sabe que o estamos investigando. ─Não necessariamente ─ disse Anthony ─ Acho que é mais provável que tenha chegado à conclusão de que fui eu quem pegou o colar e os objetos que utilizava para chantagear, guardados em seu cofre forte. Isso é 240


tudo o que sabe no momento, porém, é mais do que suficiente para se sinta extremamente preocupado. Não tem maneira de saber o que eu pretendo fazer com as evidências de chantagem ou com o colar. Louisa olhou para ele, franzindo a testa. ─O que o trouxe aqui a esta hora da noite? ─Eu queria colocá-la a par de certas apostas infelizes que estão acontecendo nos clubes. ─Apostas ...? Emma olhou para cima, seus olhos cheios de preocupação. Anthony apertou com força o seu copo de conhaque. ─Eles estão fazendo apostas sobre o nome da mulher casada com quem eu, supostamente, mantenho um relacionamento íntimo. Emma parecia surpresa. ─Eu pensei que todo mundo acreditasse que Louisa e você mantivessem um caso. ─Easton espalhou o boato de que eu uso especificamente Louisa, uma mulher inocente, para esconder um caso com a esposa de outro cavalheiro ─ disse Anthony calmamente. ─Isso é ridículo! ─ interrompeu Louisa energicamente ─ Eu não sou uma mulher inocente ─ Anthony olhou para ela. E, Emma também. Nenhum dos dois falou e Louisa ergueu o queixo ─ Sou um jornalista. Com o canto do olho Anthony viu que Emma levantou os olhos para o teto e, em seguida, tomou um saudável gole de conhaque. Ele seguiu o seu exemplo. ─Podemos voltar para a questão mais premente do tiroteio? ─ perguntou Louisa com os olhos baixos. ─Certamente ─ Anthony assentiu ─ Acho que podemos dizer que é um bom sinal. 241


─Um bom sinal? ─ exclamou Louisa ─ Que alguém tentou matá-lo? ─E, que não tenha conseguido ─ Anthony examinou a lógica da situação ─ Ele corre um grande risco e falhou. Da próxima vez vai ser muito mais cauteloso, porque sabe que, agora, estou em guarda. ─Da próxima vez? ─ Louisa estava completamente horrorizada, agora. ─Alegre-se, minha querida ─ disse saboreando o pequeno calafrio de satisfação que sacudiu ─ Acho que estamos fazendo progressos. ─Como você pode chamar de progresso, o fato de estar a ponto de perder a vida no parque? ─ perguntou indignada. Emma pensativa olhou para Anthony.E, interveio: ─Se ele estiver certo e Hastings tentou matá-lo esta noite, eu acho que é seguro dizer, que este deve estar muito nervoso. Na verdade, deve estar muito ansioso para correr o risco de tentar assassinar um Stalbridge. Ele estivera misturando o conhaque em seu copo. ─Confio que seja assim. Homens ansiosos cometem erros.

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Capítulo 33 ─Devo dizer que estávamos todos aliviados quando ouvimos boatos sobre Anthony e você ─ confidenciou Clarice alegremente. Louisa tropeçou em uma pequena pedra no caminho. Desequilibrouse um pouco e esteve prestes a perder a sombrinha, antes de recuperar o equilíbrio. ─Sentiram alívio? ─ conseguiu dizer, consciente de que sua boca devia estar aberta de maneira nada lisonjeira. Ela e Clarice passeavam pelos jardins localizados na parte traseira da mansão dos Stalbridge. Anthony tinha permanecido com seus pais, no interior da mansão. Não foi a primeira vez que um comentário de um dos membros do clã Stalbridge havia deixado Louisa confusa. Havia se sentido assim desde que Anthony a conduzira ao elegante salão da família e fizera as apresentações, há uma hora atrás. Nada era como ela esperara. Embora Anthony a tivesse assegurado o contrário, estava preparada para receber uma sombria desaprovação. Em vez disso, eles a tinham recebido com um entusiasmo perturbador. Ninguém parecia espantar-se nem um pouco com os rumores de que teria um caso com Anthony, ninguém mostrou o menor sinal de aversão ou surpresa por seu trabalho como jornalista do The Flying Intelligencer. E o Sr. e Sra. Stalbridge e Clarice se haviam mostrado encantadores e corteses. Pareciam fascinados, no lugar de horrorizados com ela. A descoberta de que a Sra. Stalbridge e Clarice serem fiéis seguidoras do movimento a favor das mulheres vestirem-se de forma 243


sensata, foi outra surpresa agradável. Mais de uma vez, perguntou-se por que tinha assumido que os membros da família de Anthony seriam pessoas menos extraordinárias que ele. Emma tinha lhe avisado que os Stalbridge tinham fama de excêntricos, todos, sem exceção. Mantinha-se cautelosa, claro. Dado o seu passado negro, não podia permitir-se ter muita intimidade com ninguém. Não obstante, havia sido incapaz de reprimir uma simpatia imediata por Clarice. Há muito tempo que não tinha uma amiga de sua mesma idade. Navegar em águas da amizade era uma proposta traiçoeira quando se mantinha um terrível segredo. ─Estamos muito satisfeitos que Anthony demonstre interesse por você, pois estávamos muito preocupados ─ disse Clarice ─ No ano passado, após a morte de sua noiva, ficou completamente obcecado com a ideia de que havia sido assassinada. Seu humor mudou por semanas. Nós ficamos muito assustados, para ser muito sincera. ─Eu entendo. Clarice fez girar a sombrinha. ─Pensávamos que ele havia superado quando foi forçado a abandonar a sua investigação no ano passado, mas quando, de repente, voltou à investigação, há duas semanas, percebemos que estava tão convicto quanto antes, da sua teoria que Fiona tinha sido morta. Então ouvimos os rumores sobre vocês dois. Mamãe e papai ficaram muito animados. A verdade é que eu também. ─Por Deus! ─Agora que tivemos a oportunidade de vê-los juntos, é óbvio que o rumor é verdade e é por essa razão que estamos tão satisfeitos em conhecêla hoje.

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─Eu não estou segura de seguir o seu raciocínio ─ disse Louisa cautelosamente ─ Minha relação com seu irmão é baseada em um pacto de cooperação. Como eu expliquei, estou apenas o ajudando em sua pesquisa. Quando isso acabar, tenho a intenção de escrever um artigo para o The Flying Intelligencer. ─Sim, é claro ─ Clarice sorriu docemente ─ Tenho certeza que vai ser uma matéria jornalística de primeira. Mas, é óbvio que vocês estabeleram uma ligação íntima e nós não poderíamos estar mais felizes. É muito bom vê-lo olhar para uma mulher, da maneira como ele olha para você. Louisa suspirou. ─Vocês temiam que seu coração houvesse partido quando Fiona morreu. E, agora acreditam que, pelo menos, está disposto a permitir-se uma distração com outra mulher, mas eu acho que não devem tirar conclusões sobre a natureza de seus sentimentos por mim. ─Bobagem ─ Clarice riu ─ Não há outra explicação, que justifique a sua óbvia mudança de humor. ─ Talvez, esteja mais feliz esses dias, por sentir que está mais perto de resolver o mistério da morte da Fiona ─ disse Louisa. ─Pode ser que isso tenha alguma coisa a ver, mas suspeito que você é a causa de seu bom humor. ─Sinceramente, não acredito nisso ─ Louisa respondeu fracamente. ─Vamos, Sra. Bryce. Não se subestime. Garanto-vos que o meu irmão não a teria convidado para tomar chá com o papai e mamãe, em nossa casa, se não estivesse apaixonado por você. Louisa parou de repente, horrorizada. ─Eu lhe asseguro que o seu irmão não está apaixonado por mim.

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─Está tudo bem, Sra. Bryce. Você não precisa fingir nesta família. Não somos como a maioria das pessoas que circulam em nosso círculo. Nesta casa, temos sido sempre muito diretos. ─Desculpe-me, mas penso que todas estas peças emocionantes que tem escrito para o Teatro Olimpia devem ter afetado sua imaginação. Clarice assentiu melancolicamente. ─Eu admito que seja muito sugestionada pela ideia dos amores proibidos. E, sempre incluo pelo menos um, em minha obras. ─Já

assisti

várias

de

suas

obras.

Embora,

todas

sejam

maravilhosamente divertidas, eu não pude deixar de notar que nelas, todos os amores proibidos acabam mal. Clarice fez uma careta. ─Só porque o público e os críticos esperam que por esses finais. Curiosamente, todos estão ansiosos para saborear a emoção de uma relação proibida no palco, porém sentem que só podem justificar seu prazer se tiverem um final infeliz. ─Eu entendo ─ Louisa suspirou profundamente e retomou a caminhada ─ O mesmo acontece nos romances. ─Correto. As convenções literárias e os críticos têm um efeito muito repressivo na arte - disse Clarice com ar sábio. ─Você acha que se as convenções e os críticos não existissem, seria possível escrever um romance em que um amor ilícito tivesse um final feliz? ─É claro ─ disse Clarice. Louisa se deteve novamente e voltou a olhar para ela. ─E, então? ─ perguntou impaciente ─ Como acabaria? Clarice assentiu. ─Os amantes se casariam, é claro. 246


─Hum! Clarice olhou com curiosidade. ─Não gosta desse final? ─Eu acho que vejo um problema com a sua lógica. ─Qual? ─Se os amantes casassem, a relação não seria ilegal, não é? Clarice ficou pensativa. ─Eu entendo o que você quer dizer. Mas o casamento é o único final feliz concebível para um relacionamento ilícito, não é? ─Acho que sim. "E no meu caso ─ pensou Louisa ─ um final impossível." Anthony estava de pé em frente à janela, com as mãos cruzadas nas costas. De um lado estava sua mãe, e de outro o pai. Os três observavam como Clarice e Louisa passeavam pelo jardim. ─Elas duas parecem estar muito bem ─ anunciou Marcus agradavelmente ─ Devo dizer que gosto muito da sua Sra. Bryce. Uma jovem fascinante. ─Eu disse que era mulher incomum ─ respondeu Anthony. Marcus sorriu e deu uma palmadinha no ombro dele. ─Certamente, e nunca tinha sido tão preciso na descrição de uma senhora. ─Formam uma bela imagem passeando na a luz do sol com as sombrinhas abertas ─ observou Georgiana, lançando um olhar de soslaio para o filho ─ A sua Sra. Bryce ficou viúva muito jovem, não é? ─Esse parece ser o caso ─ disse com cuidado. ─ Criou uma carreira interessante para si ─ disse Marcus ─ Não é de admirar que ela e Clarice tenham se entendido tão bem. Elas têm muitas coisas em comum. 247


─Não sei o que elas estão falando ─ interviu Georgiana ─ mas seja o que for, ambas parecem muito absortas no assunto. ─Quem sabe, jardinagem... ─ sugeriu Anthony, mas ele duvidava. A tensão nos ombros de Louisa lhe avisava que a conversa tinha ido para o lado pessoal.

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Capítulo 34

Anthony foi acompanhá-la a sua casa, uma hora depois. Estava preocupado com seu silêncio durante a viagem, mas suas tentativas de iniciar uma conversa haviam falhado. Louisa parecia concentrada em seus pensamentos. Ninguém atendeu a porta quando subiram os degraus da casa. Observou como Louisa puxou a chave de sua manga. Ele a pegou e abriu a porta. ─Onde está todo mundo? ─Os criados tiraram a tarde livre ─ Louisa entrou no salão, desatando as fitas do seu chapéu ─ Emma está em sua reunião semanal da Sociedade Botânica. Não voltará dentro de algumas horas. Ele a seguiu até o vestíbulo. ─Compreendo. Ela olhou como se não soubesse bem o que fazer com ele, agora que estava dentro da casa. ─Quer ir para a biblioteca, senhor? Anthony sentiu-se de bom humor imediatamente. ─Obrigado. Ela pendurou o chapéu na prateleira e começou a caminhar pelo vestíbulo na frente dele. ─Eu acho que deveríamos comparar as anotações sobre a nossa investigação. Eu estive pensando sobre algumas informações que recebi antes de sermos sósios.

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As esperanças Anthony caíram por terra. Não foi convidado para a biblioteca, porque queria estar com ele. Planejava discutir a maldita investigação. ─Claro ─ ele disse, seguindo-a pelo corredor até a biblioteca ─ Mas primeiro eu gostaria de lhe fazer uma pergunta. ─Do que se trata? ─ perguntou, cruzando a pequena sala em direção à mesa. ─Você e Clarice passaram bastante tempo no jardim. O que vocês falavam? ─Sua irmã é muito agradável ─ Louisa sentou-se em frente da mesa, tirou os óculos e começou a poli-los ─ Eu gostei muito dela. ─Fico feliz ─ Anthony se aproximou da mesa e ficou olhando para ela ─ Parecia bastante à vontade com você, porém isso não responde à minha pergunta. Deve tê-la pressionado para revelar a natureza da nossa relação, certo? ─Pelo contrário, parecia saber muito bem qual a natureza da nossa situação, senhor. Anthony cruzou os braços e disse: ─Meus pais chegaram a uma conclusão semelhante. Ela voltu a colocar seus óculos e olhou para ele com aguda desconfiança. ─O que lhes disse? ─De acordo como combinamos, eu insisti que entre nós, o que existe é um acordo de negócios ─ lembrou Anthony. Ela fez uma careta. -Não acreditaram, não é? -Não.

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─Sua irmã também não acreditou em mim quando eu tentei dizer o mesmo. Todos pensam que mantemos um caso ilícito. ─Eu lhe avisei que meus familiares tendem a ser muito francos. Eles também são bastante inteligentes. ─Bem, suponho que devemos ver o lado positivo da questão ─ disse Louisa alongando os ombros ─ O fato de que os membros de sua família pensam que mantemos um caso, indica que nossa pequena farsa funciona, apesar de tudo, não é? ─ Ele optou por não responder, porque sentia que estava ficando com raiva. Ela limpou a garganta ─ O que eu quero dizer é que, se sua família acha que há algo entre nós, Hastings também deve acreditar, e isso é o que importa, não é? ─ Anthony continuou observandoa, sem falar. Ela corou ─ Pare de me olhar assim! ─Como? ─Eu não sei, ele disse ─ apertando as mãos ─ Como se estivesse prestes a pular ou algo parecido. Em que você está pensando, senhor? Ele descruzou os braços, colocou as mãos sobre a mesa e se inclinou para frente. ─Estou pensando ─ disse sem se alterar ─ que a conclusão da minha família não é nada mais, nada menos do que a verdade. Mantemos um relacionamento ilícito. Ela piscou e recostou-se na cadeira. ─Não exatamente. ─O que você está dizendo? ─Terá que admitir, senhor, que a nossa relação é um pouco complicada. Essa foi a última gota. Sua paciência tinha um limite. Ele endireitouse, caminhou em torno da mesa até chegar junto dela, levantou-a da cadeira. 251


─Admito que alguns aspectos da nossa associação sejam um pouco difícil de explicar ─ outorgou ele ─ mas, neste em particular não é. Temos uma aventura, Louisa. ─Sim, bem, eu acho que se poderia dizer que, no sentido técnico da palavra ... ─Em todos os sentidos da palavra. Ela corou. ─Talvez devêssemos voltar ao assunto da nossa investigação. Como eu disse, eu tenho algumas ideias que quero compartilhar com você. ─Ocorre-me uma ideia melhor ─ disse Anthony. Ela piscou de novo, os olhos muito abertos. ─Do que se trata, senhor? ─Vou lhe mostrar. Pegou-a e dirigiu-se para a porta. ─Meu Deus! ─ Ela se agarrou aos seus ombros ─ Posso saber o que está fazendo? Onde você está me levando? ─ Para cima ─ Anthony inclinou para sair com ela em seus braços pela porta e caminhou em direção as escadas ─ Eu acho que haverá alguma cama no andar superior. ─Claro, mas o que isso tem a ver com ...? ─ fez uma pausa, finalmente entendendo ─ Certamente não está planejando ... ─Fazer amor na cama confortavelmente? Sim, é isso o que eu pretendo fazer ─ disse ele, subindo os degraus. ─Em plena luz do dia? ─Você disse que Lady Ashton e a criadagem não estarão de volta dentro de algumas horas, não é verdade? ─Sim, mas ... ─Então nós vamos aproveitar de sua ausência ─ Anthony concluiu. 252


─Você não pode estar falando sério, senhor ... ─Por que não? Este é o tipo de coisas que fazem os amantes ilícitos. ─Não exatamente ─ foi a opinião de Louisa ─ Todo mundo sabe que se reúnem à noite e em segredo, em jardins e lugares iluminados pela lua ou em lugares desse tipo. ─Isso nós já tentamos ─ ele respondeu ─ e não acabou muito bem, se você se recorda. Ela abriu a boca para responder, mas depois mudou de ideia. ─Não deveria subir as escadas comigo em seus braços, senhor. Você pode se machucar. ─Muito provavelmente, mas serei recompensado. Continuou a subir. O patamar estava próximo. Ela hesitou. ─Por acaso não sou pesada, para subir uma escada comigo em seus braços? ─Sim, de fato, você é ─ ele chegou ao patamar e fez uma pausa para respirar ─ Mas tenho certeza de que o exercício vai me fazer bem. Qual é o seu quarto? ─A primeira porta à direita. ─Estou com sorte. Eu não vou ter transportá-la até o final do corredor. ─Ora, meu senhor, será que irá reclamar muito sobre isso? Os amantes de romances e peças nunca o fazem. ─Suponho que os autores omitem esses pequenos detalhes. Eles são prejudiciais para as vendas. A porta do quarto estava entreaberta. Anthony usou o pé para abri-la completamente, entrou com sua carga no quarto e a depositou de pé, ao lado da cama. 253


Louisa estava vermelho, os olhos brilhantes. Gentilmente, ele tirou seus óculos e os colocou sobre a mesinha de cabeceira. Cada músculo de seu corpo estava tenso de desejo. ─Seus olhos são âmbar ─ disse suavemente ─ Belíssimos. Ela estava assustada. ─Muito obrigado ─ disse, franzindo os olhos para estudá-lo mais de perto ─ Os seus são uma combinação de verde e ouro. Ele sorriu, e então começou a retiraras forquilhas, uma por uma. Os escuros e sedosos cabelos derramaram-se sobre os ombros de Louisa. Quando terminou, ele tinha uma ereção. E, ele ainda nem havia tirado sua roupa. ─Queria vê-la assim, desde que a conheci ─ sussurrou. Ela parecia confusa. ─Sem os meus óculos? Ele riu. ─Com seus cabelos soltos. Ele tirou a jaqueta e a jogou em uma cadeira. Observou enquanto ela assistia enquanto tirava a gravata. Divertia-lhe a sua fascinação. Ele olhou para a janela. De frente para a rua e para o pequeno parque no centro da praça. Concluiu que ninguém poderia vê-los. Não havia necessidade de fechar as cortinas. Estava livre para apreciar a visão de Louisa nua à suave luz do sol, nas primeiras horas da tarde. Ele pegou o rosto dela entre suas mãos e beijou-a, lentamente, desta vez, com a intenção de seduzi-la, não para sua própria satisfação. ─Anthony? ─Esta é a parte que você gosta, lembra? Os beijos? ─Ah, sim, claro.

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Ela emitiu um ruído suave, feminino, de antecipação e abriu os lábios para recebê-lo. Ele beijou-a lentamente, passando com a língua todos os cantos de sua boca, saboreando-a, mas sem pressioná-la. Quando ele sentiu seu corpo relaxado e trêmulo, baixou suas mãos até os botões da frente do seu vestido. Lentamente desabotoou o corpete, e o deslizou sobre seus ombros, mantendo sua boca cativa todo tempo. Um calafrio de desejo o sacudiu ao sentir os dedos dela na frente de sua camisa. Louisa se atrapalhou um pouco antes do desprendimento da peça. Logo, sentiu suas mãos sobre o peito, com os dedos femininos enroscando-se em seus pelos, o suave tormento ameaçando destruir o seu controle. Beijou seu pescoço e seios para distraí-la. Quando Louisa apoiou a cabeça em seu ombro, e fechou os olhos, retomou a tarefa de desnudá-la. Finalmente, conseguiu libertá-la de seu vestido, deixando-a com a camisa, calças, meias e sapatos. Beijou Louisa novamente, sua língua invadindo-a suavemente. Quando sua língua tocou a dela de uma forma curiosa e experimental, não pode reprimir o grunhido que saiu de sua garganta. Sua resposta pareceu encorajá-la. Ela o abraçou mais apertado. E, ele beijou-a mais profundamente. Quando seus lábios se separaram, ele viu que os dela, estavam molhados e inchados. E traçou seu contorno com a ponta do dedo. Ela respondeu movendo-se um pouco. Sua pele estava quente e incrivelmente macia, em contato com suas mãos. Inclinou-se e retirou o edredon de uma vez só. Então, rodeou Louisa pela cintura, ergueu-a acima do círculo formado por seu vestido caído no chão, e a deitou na cama. 255


A imagem dela, o seu cabelo negro espalhado sobre o travesseiro branco, os lábios entreabertos, os olhos semicerrados de desejo, foi a visão mais maravilhosamente erótica que já tinha visto. Ele ficou surpreso por não atingir o orgasmo imediatamente. Ele se forçou a ficar longe o suficiente para se despir. Quando terminou, ele hesitou, esperando um sinal de aprovação. Ela recostou-se na cama e apalpou a cabeceira, procurando por seus óculos. Ao encontrá-los, os colocou e olhou para ele com expressão de espanto. ─Oh, meu Deus! ─ Exclamou perplexa ─ na outra noite eu percebi que suas medidas eram consideravelmente maiores do que as estátuas de homens nus que eu tinha visto, porém não havia reparado na enormidade da situação presente. Anthony não tinha certeza de como reagir. ─Eu acho que nunca fui comparado com uma estátua ─ respondeu finalmente. Ela começou a rir. O riso tornou-se uma gargalhada, que ela tentou esconder tapando a boca com a mão. Seus olhos brilhavam. Foi sacudido por outra onda de euforia e desejo incontroláveis. Puxou do bolso de sua calça um lenço de linho, recém-lavado e recémpassado, e se aproximou da cama. Pegou pela segunda vez seus óculos e deixou os colocou na mesa de cabeceira. Agachado ao lado da cama desfez os laços de uma de suas pequenas botas, de salto alto, e depois da outra, deixando-as cair no tapete. Lentamente, suas mãos acariciaram a superfície lisa e arredondada de sua perna, despojando-a da liga e da meia que a cobria. Em seguida, fez o mesmo com a outra perna.

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Ele subiu na cama e ficou ao lado dela. Sua respiração tornou-se rápida e irregular quando levantou a camisola e puxou-a sobre sua cabeça. Porém, quando ele se inclinou para beijar seus mamilos rosados, ela soltou um gemido de impaciência, cravou-lhe as unhas em seus ombros, em seguida, arranhou suas costas. Anthony acariciou seu corpo, saboreando-a, deixando-a se acostumar com o seu toque. Quando as pernas de Louisa começaram a moverseinquietas, retorcendo-se, para chegar mais perto dele, livrou-a de sua calcinha. Louisa estremeceu ao sentir cair a última barreira de pudor. Ele olhou para cima e viu que seus olhos estavam bem fechados, mas não tentou voltar atrás. Ela colocou a mão entre eles, envolvendo-o suavemente. O chicote do desejo que experimentou quase o fez gozar. Passou os dedos no triângulo, localizado no topo de seus quadris e apalpou seu interior com a mão. Ela estava molhada, receptiva, inchada. Acariciou delicadamente buscando o ponto mais sensível. Quando o encontrou, ela pensou que ia levitar. ─Anthony ─ murmurou, cravando as unhas em seu braço. Brincou até que ela estremeceu de prazer e tentou apertá-la mais firmemente contra a palma da sua mão. Então, de repente introduziu dois de seus dedos profundamente, e curvando-se ficou sobre ela. Louisa lançou um grito abafado, arqueando seu corpo. Ele olhou para ela. Nesse momento, ela deixou para trás qualquer sinal de pudor ou inibição, presa no êxtase de sua própria paixão. Nenhuma mulher jamais havia sido tão linda, pensou Anthony. Ele afundou entre suas pernas. Antes que ela pudesse imaginar o que ele estava tentando fazer, colocou os lábios entre as pernas dela, beijando-a no fundo do seu ser. 257


- Mas o que ...? ─ gritou ─ Oh, não, não, você não deve..... Desesperada, agora, tentou sentar-se, afastando-se dele. Ele agarroua pelos quadris, e voltou a colocá-la na posição, e imobilizando-a, continuou acariciando-a com sua língua. O gosto e o odor do seu corpo eram uma droga que teria matado para conseguir. Ela o segurou pelos cabelos. ─Anthony? Ele sentiu a tensão em seu corpo e sabia o que estava acontecendo antes dela. Possuiu-a com seus dedos, esticando-a suavemente. ─Meu Deus! ─ gemeu ─ Meu Deus, Anthony! Não disse mais nada. Abandonou-se ao orgasmo. E, ele esteve quase ao ponto de fazer o mesmo. Mudando de posição a possuiu, antes que o fogo que ainda ardia em suas entranhas se apagasse completamente. Ela se apertou contra ele, destruindo o pouco autocontrole que lhe restava. A explosão do orgasmo lhe sobreveio depois de apenas umas poucas investidas. A duras penas, conseguiu sair do estreito e úmido orifício de Louisa a tempo de derramar-se em seu lenço. Quando tudo havia terminado, se deixou cair sobre os travesseiros, sentindo-se, pela primeira vez, mais em paz que nunca desde a morte de Fiona.

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Capítulo 35

Notou que Louisa abandonou lentamente do limbo agradável em que ela havia estado. Ao sair da sua letargia, estendeu a mão e apalpou o criado mudo, por fim, seus dedos encontraram os óculos. Ela os colocou e olhou para o chão ao lado da cama. Sua camisola estava caída, em cima de uma pequena pilha de roupas amassadas. Ela pegou e vestiu-se. Sentindo-se um pouco mais decente, sentou-se na cama, em cima dos lençóis, e observou Anthony. Ele estava deitado de bruços, pernas afastadas, com o rosto sobre o travesseiro e voltado para ela. Seus olhos estavam fechados, seu cabelo escuro despenteado. Os marcados músculos de suas costas tinham um aspecto relaxado e excitantemente poderoso. Ela estava encantada com o peso de seu corpo sobre o dela, esmagando-a contra a cama. Estendeu a mão e acariciou seu ombro, não querendo acordá-lo. ─Tenho que lembrar-me de trazer Cartas Francesas, a próxima vez ─ disse Anthony como se estivesse falando com o travesseiro. Ela levou um susto e retirou a mão como se tivesse tocado em algo muito quente. ─Eu pensei que você estivesse dormindo ─ disse ela. ─ Quase ─ disse sem abrir os olhos ─ Você me deixou esgotado. ─O que são as Cartas Francesas? ─ perguntou curiosa. Ele abriu os olhos e deu um sorriso lento e convidativo. ─Preservativos. Notou que ela corava violentamente. ─Entendo. 259


─A técnica que usei até agora, não é totalmente confiável. ─Oh. Ela corou ainda mais. Como uma mulher do mundo, que mantinha uma relação ilícita, teria que se acostumar com a discussão informal sobre assuntos tão íntimos, ela recordou a si mesma. ─Bem? ─ perguntou, olhando-a fixamente. Ela parecia confusa. ─Bem, o quê? Ele virou-se e colocou os braços atrás da cabeça. ─Foi uma experiência mais agradável? Seu rubor era tão grande que ele não ficaria surpreso se os lençóis pegassem fogo. ─Claro que sim ─ limpou a garganta ─ Agora eu entendo porque as aventuras ilícitas estão tão na moda. ─Não diga. Já não parecia tão satisfeito como tinha estado, um momento antes. ─Anthony? ─Sim? -Eu preciso perguntar uma coisa. Algo muito pessoal, portanto irei entender caso você não queira me responder. Com um de seus braços que estavam sob sua cabeça, a puxou para ele. ─De que se trata? Ela cruzou os braços sobre o seu peito e apoiou o queixo sobre eles. ─Ouvi rumores sobre o que aconteceu entre você e sua noiva, pouco antes de sua morte. Sua boca se contraiu em um sorriso forçado.

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─Não me surpreendo. Entre os tabloides, jornais decadentes e fofocas desprezíveis da alta sociedade, praticamente toda Londres conhecia os boatos. ─Algum deles era verdade? Você planejava terminar seu compromisso, porque a encontrou na cama com outro homem? Seu silêncio foi tão longo que ela pensou que ele não responderia. ─Sim ─ ele disse finalmente ─ Mas, eu nunca disse nada a ninguém. Eu não sei como os boatos começaram. Só posso supor que o homem com quem a encontrei, contou a alguém que, por sua vez, gerou todo o boato. ─As aventuras ilícitas raramente conseguem ser mantidas em segredo. ─Verdade. ─Você deve ter sido muito apaixonado por ela ─ disse Louisa. Ele sentou-se, de repente, passou as pernas sobre a cama e levantou. ─Meu amor por Fiona morreu no dia em que a encontrei com seu amante ─ Anthony disse. Louisa sentiu uma pontada de simpatia. ─Deve ter sido terrível para você. ─Pensando bem, acho que ela queria que eu descobrisse dessa maneira ─ afastou-se da cama para pegar suas roupas e calças ─ Não tinha coragem de dizer a verdade cara a cara, mas no fundo eu acho que ela queria que eu soubesse que amava outro homem. À sua maneira, tentou ser honesta comigo antes de nos casarmos. ─Eu não entendo. Se amava outro homem por que, simplesmente, não dizer? ─Não poderia fazer isso ─ Anthony colocou suas calças e abotoou ─ Sua família ficaria horrorizada. Estavam extremamente felizes com o

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casamento. Assim como a minha família, devo acrescentar. Era o desfecho ideal dos anos de amizade entre os nossos pais. ─Em outras palavras, Fiona sofria uma grande pressão para realizar esse casamento. ─É uma história muito comum ─ disse, abotoando a camisa com dedos ágeis ─ Ao contrário de todos os romances e peças que você acha tão inspiradores, ambos sabemos que a grande maioria dos casamentos é baseada em dinheiro, propriedade e ligações familiares. ─Sim ─ foi invadida por uma tristeza nostálgica ─ Suponho que seja essa a razão pelas quais os romances e obras teatrais sejam tão emocionantes. É tão bom pensar na ideia do amor verdadeiro ... ─Eu não sei ─ disse ele friamente ─ Eu não sou um grande fã desse tipo de entretenimento. Louisa sorriu e não disse nada. Ele interrompeu o ritual de vestir e agarrou fortemente uma das colunas da cama. ─Você acha engraçado? ─ ele perguntou. ─Um pouco ─ Louisa dobrou os joelhos e os abraçou ─ Tudo que disser das novelas e do teatro, a verdade é que você tem a alma romântica de um verdadeiro herói. Anthony a olhou como se ela tivesse anunciado que poderia voar. ─De que diabos você está falando? ─ perguntou baixinho. ─É por isso que você está tão determinado a conseguir que se faça justiça com Fiona ─ explicou ─ Apesar de ter se apaixonado por outro homem, o seu amor por ela é inabalável. Anthony apertou a coluna com mais força entrecerrou os olhos. ─Permita-me deixar uma coisa bem clara aqui, Louisa. Não estou envolvido nesta aventura porque a morte de Fiona partiu o meu coração. 262


Isso a deixou imobilizada por alguns segundos. ─Não? ─ perguntou com cautela. ─Não se engane. Eu gostava dela. Nós nos conhecemos na escola. Ela era minha amiga, assim como minha noiva. Sinto-me responsável por encontrar seu assassino, porém não foi amor eterno que me levou a esta investigação. Não tente me tornar um herói romântico. Ela assentiu, profundamente desconcertada. ─Então, por que motivo lançou-se em uma investigação sobre as circunstâncias de sua morte? ─No início de tudo, há pouco mais de um ano, eu precisava descobrir se ela havia cometido suicídio porque eu estava prestes a anunciar o rompimento do nosso noivado ─ As palavras soaram como se tivessem vindo das tumbas ─ Você entende agora? Eu precisava saber, ao certo, se a causa de sua morte foi por ela não estar preparada para suportar a humilhação de ser rejeitada. ─Anthony. ─Eu não sou um herói, Louisa. Mas, agora, eu tenho certeza que ela foi assassinada, preciso saber se foi minha culpa que tenha sido exposta ao perigo. ─Como poderia ter sido sua culpa? ─Eu não sei. Talvez, a minha intenção de acabar com o nosso compromisso a tenha empurrado a correr algum risco terrível, que de outra forma teria evitado. É possível que tenha se sentido desesperada. Tudo o que sei é que era minha amiga, e que foi minha noiva. Eu tenho que descobrir o que aconteceu naquela noite. ─Basta! Já chega! ─ Horrorizada, Louisa desdobrou as pernas, saiu da cama e levantou-se. Segurou em seu braço, agarrou-o como ele estivesse prestes a ser arrastado pela correnteza ─ Escute com atenção. Parece 263


improvável que Fiona tenha sido assassinado da forma como suspeita. Mas, mesmo que tenha sido assim, ou se tiver se suicidado, não é sua culpa. ─Você não entende. Ela era tão inocente ... não tinha experiência do mundo. ─Inocente ou não, jogou-se no rio, porque temia a humilhação da ruptura do seu compromisso, foi porque ela assim o quis. Se viu envolvida em uma aventura perigosa, que não foi sua culpa. ─Estava sob muita pressão, não só de sua família, como da minha, mas também da sociedade ─ Anthony suspirou profundamente, como se tivesse escapado das profundezas de sua alma ─ Nenhum de nós sabia que ela era tão infeliz. Se me tivesse dito alguma coisa ... ─Foi sua decisão de arriscar se apaixonar por outro homem ─ Louisa não disse nada ao ser atacada por outro pensamento, e prosseguiu ─ O que nos leva a outro ponto. Se, mantinha relações íntimas com outro homem, não teria planejado se casar com ele, uma vez rompido o seu compromisso? ─Isso foi uma das razões que me fez duvidar de suicídio ─ ele admitiu ─ Todas as evidências indicam que seu amante a amava, e como ele não era casado, poderia se casar com ela. ─O que aconteceu com ele? ─Culpa-me por sua morte e me despreza desde então. ─Julian Easton ─ ela disse lentamente. Anthony levantou as sobrancelhas. ─Como foi que você descobriu? ─É óbvio que tem um rancor enorme de você. ─Nunca se atreveu a fazer qualquer acusação, porque não tem nenhuma prova. Também, porque eu acho que é cuidado para não se envolver em fofocas. A família de Fiona ficaria furiosa se a sua memória

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fosse manchada, revelando que havia tido um caso com ele, sem estar casada. Louisa inclinou um pouco a cabeça, pensando. ─Não sei se deveria perguntar, mas existe alguma possibilidade de que Easton a matasse? ─Não. ─ passou a mão pelo cabelo ─ Examinei essa possibilidade de imediato. Várias pessoas testemunharam o seu ir e vir naquela noite. Desapareceu do salão por alguns minutos, mas voltou quase que imediatamente. Depois foi ao clube, acompanhado por alguns amigos, e ficou lá, jogando cartas, até o amanhecer. O corpo de Fiona foi resgatado do rio, quase a mesma hora. Naturalmente, não teria tempo para matá-la e livrar-se do corpo. ─Porém, Easton faz todo o possível para que as pessoas pensem o pior de você. ─Porque acredita que ela se suicidou, e me culpa por induzi-la a isto. Sua ideia de vingança é manter vivo o rumor. Louisa pensou na cena da rua, em frente à casa dos Lorrington. ─Na realidade, eu acho que ele se culpa. Anthony parecia confuso. ─O que quer dizer? ─Se, ele a amava, é possível que tente convencer a si mesmo e aos outros, que a culpa é sua, porque quer evitar a culpa que, certamente, deverá sentir por não ter conseguido protegê-la. Anthony deu de ombros e terminou de abotoar a camisa. ─Tudo que sei é que me odeia. ─Mas, não tem o direito de torná-lo o bode expiatório! ─ Louisa exclamou ─ Não é justo. Em que trágico enredo terminou tudo isto! Anthony torceu ironicamente a boca. 265


─Obviamente, Easton e Fiona foram vítimas do poder esmagador dos amores ilícitos, que segundo você é a aventura mais emocionante que existe. ─Engana-se, senhor ─ disse asperamente se afastando ─ As paixões proibidas são, sem dúvida nenhuma, uma força muito poderosa, mas estamos todos equipados com a força necessária para resistirmos a ela, se assim escolhermos. ─Então, agora é uma escolha, certo? ─ a olhou com sua expressão sarcástica ─ Não uma força avassaladora da natureza? ─Não brinque, senhor. Eu estou falando sério. ─Sim, eu vejo. ─Uma coisa é achar uma pessoa atraente. E outra muito diferente é deixar-se levar por essa atração e estar disposto a assumir os riscos que virão junto. Essa é a escolha que Fiona fez. Você não tem nada a ver com isso. Ele olhou para ela com uma expressão estranha, que nunca chegaria a decifrar, porque naquele momento, eles ouviram vindo da rua, o barulho de um coche. ─Meu Deus! Que horas são? ─ Aterrorizada, Louisa olhou para o relógio ─ Cinco e meia. Oh, não! Deve ser Emma. Ele olhou para ela em dúvida. ─Você tem certeza? -Sim. Você deve sair imediatamente. Emma não pode nos encontrar aqui, quando eu estou seminua. Apresse-se. Ele recolheu suas botas. ─Você deve ter notado que essa é uma das desvantagens dos amores proibidos. Não se pode baixar a guarda nunca. Louisa pegou o quimono que tinha pendurado em um cabide. 266


─Você não pode sair pela porta principal. Ela o veria. Terá que usar a escada de serviço e sair pelo jardim. Anthony pegou o seu casaco. ─Eu não sei como lhe dizer isso, mas o meu chapéu está no vestíbulo. ─Droga! Eu tinha me esquecido completamente do chapéu. Teremos que ir buscá-lo. Louisa correu até a porta. Ele parecia se divertir com suas maldições, mas a seguiu obedientemente. Louisa desceu correndo a escada, com Anthony em seus calcanhares. Na rua, o coche havia parado. Louisa pegou o chapéu do aparador do vestíbulo e atirou-o para o ar. ─Vá embora ─ ordenou suavemente. Ele pegou seu chapéu com a mão esquerda, sem esforço. ─Uma pergunta antes de eu ir, Louisa. ─Nada de perguntas, não há tempo ─ fazia gestos desesperados para ele saísse ─ Deve se apressar, senhor. Emma vai entrar por aquela porta a qualquer minuto. ─Realmente, eu preciso de uma resposta. ─ advertiu ele, embora tenha começado a caminhar pelo corredor em direção a porta de trás, carregando na mão o casaco e chapéu. ─Pelo amor de Deus! Peço-lhe para não levantar a voz ─ implorou, apressando-lhe para sair. Anthony abriu a porta de trás e parou de pé na porta, dando meia volta. ─A pergunta é: você experimentou esta tarde algo como a sensação de transcendência? ─ Perguntou. 267


Ela estava horrorizada por ele continuar ali. ─Por favor, senhor, não é hora de falarmos sobre esse assunto. ─Eu não vou sair até receber uma resposta. ─Sim,

sim,

tudo

foi

uma

experiência

maravilhosamente

transcendente, como aquelas que descrevem os romancistas. E agora, saia imediatamente. Ele sorriu, voltou a beijá-la, muito rápido e muito possessivamente na boca, e saiu. A Louisa pensou ter ouvido que ele estava deixando o jardim assobiando. Fechou a porta tão silenciosamente como pôde e subiu correndo as escadas estreitas de serviço. De volta ao quarto, fechou a porta e puxou os lençóis. Diria a Emma que tinha decidido tirar um cochilo, pensou. Isso explicaria que os lençóis estivessem amassados e ela de roupão. Mirou-se no espelho e ficou surpresa de como estava corada e despenteada. Não tinha tempo para prender o cabelo. A porta da rua se abriu. Louisa pegou uma touca branca de dormir, colocou em sua cabeça e tentou botar todo o seu cabelo dentro. Em seguida, com um pulo se meteu na cama. Logo depois, Emma subiu as escadas e bateu suavemente na porta. -─Você está descansando, querida? ─Sim ─ disse Louisa ─ Foi uma tarde exaustiva ─ Vou contar-lhe tudo, em um minuto, lá embaixo. ─Não posso esperar para saber os detalhes do seu encontro com os Stalbridge. Fique à vontade. Eu vou trocar de roupa. Os passos de Emma se perderam no caminho corredor até seu quarto. Com um estremecimento de alívio, Louisa se sentou na cama. Ainda estava respirando rapidamente. Por muito pouco não foram pegos. 268


Ele lentamente se levantou e caminhou para o armário. Um lenço de seda azul marinho, pendurado no encosto de uma cadeira chamou sua atenção. A gravata de Anthony. Assustada, ela pegou o lenço, dobrou-o cuidadosamente, e o escondeu em uma gaveta. Por muito pouco não foram descobertos. Felizmente, Emma não tinha aberto a porta. Os amores proibidos eram muito emocionantes, mas eram uma dura prova para os nervos.

Era a primeira vez que tinha sido forçado a fugir pela porta dos fundos, Anthony pensou enquanto subia as escadas de sua casa. Não havia dúvida que a vida se tornara mais interessante desde que tinha encontrado a Sra. Bryce. A partida incomum, o havia obrigado a uma desafiante mudança de caminho, porém tinha bem claro, que não pensava em escapulir por becos e jardins indefinidamente. No entanto, a lembrança dos tremores e ofegante paixão de Louisa quando chegou ao clímax em seus braços, compensava quase tudo, incluindo uma saída tão indigna. Não poderia deixar de sentir-se de bom humor, apesar da falta de progresso na investigação. Não se devia somente ao fato do ardente encontro tê-lo posto de bom humor, pensou. Foi a exaltada insistência de Louisa, apesar do que tinha acontecido com Fiona, em acreditar totalmente em sua inocencia. Uma coisa era ouvir de sua família, que sempre tinha estado a seu lado. Porém, que Louisa o defendesse tão fortemente, era algo completamente diferente. Por um momento, na escuridão de seu quarto com o gosto do seu corpo, ainda na língua, ele permitiu-se a acreditar que ela estava certa. A porta se abriu antes que encontrasse a chave. 269


─Bem-vindo, senhor ─ disse a governanta –Faz alguns minutos, uma mensagem chegou para você. ─Obrigado, Sra. Taylor. Anthony entrou no saguão. A nota repousava sobre uma bandeja de prata. Anthony pegou o envelope e rasgou. Ficou plenamente satisfeito ao reconhecer a assinatura de Miranda Fawcett.

...convidar a vós e Sra. Bryce, esta noite, às dez horas, em ponto, para que conheçam o meu bom amigo.

Clemente Corvus tinha mordido a isca.

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Capítulo 36

Miranda Fawcett estava comodamente instalada em seu sofá dourado. Louisa pensou que ela parecia ainda mais dramática do que o habitual, com seu moderno vestido de seda azul-claro e de veludo azul. As pérolas reluziam em seus dedos, rodeavam seu colo e brilhavam em seu cabelo. ─Ah,

finalmente

minha

querida

Louisa

-

disse,

sorrindo

afetuosamente e saudando-a com a mão ─ Sente-se, por favor. ─ virou-se para Anthony ─ Que prazer em voltar a vê-lo, senhor! Estou tão feliz que você estivesse livre esta noite ... Sou consciente de não tê-lo avisado com suficiente antecipação. Anthony pegou sua mão e curvou-se. ─Da mesma forma. Estou muito ansioso para encontrar seu bom amigo. ─O Sr. Corvus já está aqui – disse Miranda com uma piscadela ─ Espera nos bastidores, por assim dizer. Meu querido amigo passou tanto tempo ao meu lado, que tenho medo que tenha aprendido o valor de se fazer uma boa entrada. Louisa sentou-se muito ereta, em uma das poltronas estofadas em cetim e ajeitou os óculos. ─Foi muito gentil de sua parte marcar este encontro. Miranda riu. ─Asseguro que o Sr. Corvus tem muito interesse em conhecer o Sr. Stalbridge, principalmente, depois de ler os papéis que me deu, e eu entreguei para ele. Um homem falou da porta. 271


─É verdade, senhor. Eu tinha um enorme interesse em conhecê-lo. Louisa virou a cabeça e viu um homem surpreendentemente baixo e bem trajado. Ainda que não fosse mais alto que ela, transparecia um ar inconfundível de refinada ameaça. Clement Corvus, não havia recebido a alcunha de “O Corvo” apenas por seu sobrenome. Um ligeiro calafrio percorreu seu corpo. Seu cabelo, que tinha sido de um negro azeviche, era agora de um prateado impressionante. Ele estava recém-barbeado e vestido com um terno impecavelmente cortado. Anthony cumprimentou-o com uma ligeira inclinação de cabeça, como modo silencioso de reconhecimento por estar diante de um semelhante. ─Boa noite, senhor. Os olhos de Corvus enrugaram ligeiramente nos cantos. Louisa teve a impressão que ele estava satisfeito pelas maneiras respeitosas de Anthony. ─E, esta é a Sra. Bryce, que você conhece muito como I. M. Phantom ─ disse Miranda ─ Sra. Bryce, o Sr. Corvus. Corvus caminhou até Louisa e a cumprimentou formalmente, com uma reverência. ─Sra. Bryce, é um privilégio de conhecê-la. Eu sou um grande fã de seu trabalho. ─Obrigado, senhor ─ ela sorriu ─ Esta noite o prazer é meu. Finalmente, tenho a oportunidade de dizer-lhe o quanto sou grata, pelo que, sinceramente, suspeito tenham sido os seus conselhos de bastidores, em diversas ocasiões. Corvus sorriu com indulgência.

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─Miranda vai dizer que eu acho muito divertido poder ajudar uma jornalista tão ousada. A Sra. Fawcett gargalhou. ─É claro que o que Clement quer dizer, é que é sempre um prazer enorme ajudar I. M. Phantom a remover alguns de seus rivais de negócios, que casualmente pertencem à alta sociedade. Algo frio e brilhante iluminou os olhos escuros de Corvus. -Não é a concorrência o que me importa, querida. Afinal de contas, eu sou um homem de negócios, e desfruto da atividade. Mas, admito que me irrito profundamente, com certos cavalheiros que optam por participar de aventuras comerciais que satisfazem a gostos depravados, ou aqueles que se aproveitam de pessoas que menos favorecidas. Esses senhores nunca pensariam em convidar para tomar uma taça de conhaque um homem com o meu passado, no entanto, não hesitam em colocar suas mãos em negócios sujos que eu jamais tocaria. Anthony levantou as sobrancelhas. ─Eu concordo. A hipocrisia é bastante evidente em alguns casos. ─Sem dúvida nenhuma, foi no escândalo Bromley e do desfalque da mina da Califórnia ─ disse Corvus ─ Posso oferecer-lhe um copo de conhaque, senhor? Miranda só compra o melhor. ─Porque eu compro para você, Clement ─ ela murmurou. Corvus sorriu. ─Obrigado, querida ─ disse sem tirar os olhos de Anthony. ─Um conhaque me parece uma excelente ideia ─ disse Stalbridge. Corvus caminhou até uma mesinha com licores, levantou a garrafa de cristal lapidado e serviu dois copos de conhaque. Com as taças na mão, se reuniu com o grupo, o som de seus passos abafados pelo grosso tapete, e deu um dos copos para Anthony. Os olhares 273


dos homens estavam interligados. "Dois caçadores avaliando um ao outro", pensou Louisa. ─À sua saúde, senhor. Anthony ergueu a taça como uma pequena saudação. ─À sua, senhor. Louisa observava como ambos bebiam uma dose de conhaque. Quando Corvus afastou o cálice de seus lábios, parecia tranquilamente satisfeito. Louisa tinha a impressão que Anthony havia passado por outro pequeno teste. ─Por favor, sente-se, senhor ─ disse Corvus, à espera de Anthony sentar-se em uma das cadeiras, antes dele. -Entendo que a razão pela qual fomos convidados a nos reunirmos esta noite aqui, é porque achou interessante os papéis que lhe entreguei – arriscou Anthony. Corvus assentiu. ─ Tal como você esperava. Anthony encolheu os ombros. ─Eu adquiri alguma experiência cuidando dos investimentos familiares. ─Eu sei ─ Corvus riu ─ Na verdade, se diz que, por sua causa os Stalbridge conseguiram se livrar da ruína.. ─Apenas, porque sou o único membro da família que não demonstrou talento para atividades criativas de qualquer tipo ─ disse Anthony ─ Me vi mais ou menos limitado aos assuntos de dinheiro. Eu aprendi o suficiente para reconhecer um negócio fraudulento assim que o vejo. Corvus agitou seu cálice, revolvendo o líquido âmbar.

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─Eu me oponho à fraude, por princípio. Raramente acaba sendo um bom negócio. Mas acho particularmente ofensiva quando a vítima sou eu, Sr. Stalbridge. Anthony franziu os lábios em um meio sorriso. ─Eu entendo. ─Estou em dívida com você, senhor, espero que saiba. Eu gosto de pagar minhas dívidas. ─ Assim, ouvi ─ disse Anthony. Corvus assentiu. ─Já imaginava. Não vou incomodá-lo perguntando como um cavalheiro como você está ciente de minhas excentricidades. Vamos direto ao ponto. Você me fez um grande favor. Como posso agradecer? ─A Sra. Bryce e eu gostaríamos de fazer-lhe algumas perguntas sobre Elwin Hastings ─ disse Anthony ─ Estaria disposto a respondê-las? ─É claro, se eu puder ─ a boca de Corvus torceu-se em um gesto de desagrado ─ Dadas as suas intenções para enganar-me, não devo a Hastings, a habitual lealdade que concedo aqueles com quem faço negócios. Louisa se inclinou para frente. ─Posso perguntar-lhe o que o levou a fazer negócios com o Sr. Hastings? Corvus tomou outro gole de conhaque. ─Há pouco mais de um ano, fui convidado para participar de um de seus negócios. Os resultados foram muito lucrativos. Naturalmente, no mês passado, quando ele sugeriu outra chance de fazer um investimento semelhante, eu estava predisposto a considerá-la favoravelmente. Anthony parecia intrigado.

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-─Manteve negócios com Hastings na época da morte de sua esposa, Sr. Corvus? ─Sim, mas a Sra. Hastings ainda estava viva na época ─ Corvus levou o copo aos lábios e tomou outro gole ─ É claro, eu nunca a conheci. Obviamente, eu não me movimentava nos mesmos círculos sociais. Todos os meus negócios eram feitos com Hastings e seu homem de confiança, Grantley. Sobre tudo com Grantley, eu poderia acrescentar. Era o intermediário. Eu tinha a impressão que Hastings estava preocupado em ser visto comigo. ─Com certeza, deverá saber que Fiona Risby morreu poucos dias antes da Sra. Hastings morrer na mesma circunstância ─ disse Anthony. ─Tenho conhecimento que sua noiva morreu nessa mesma semana, senhor. Dou-lhe as minhas condolências. As duas mortes ocupou as primeiras páginas dos tabloides por alguns dias ─ Corvus fez uma pausa ─ Até que foram substituídas pelo assassinato de Lord Gavin, é claro. Louisa sentou-se muito ereta, mal ousando respirar. Ninguém olhou para ela. ─Eu tenho razões para acreditar que a Srta. Risby não cometeu o suicídio ─ aventurou Anthony. Corvus o olhou com curiosidade. ─Sério? ─Eu tenho fortes suspeitas de que foi morta por Elwin Hastings. Se eu estiver certo, acho possível deduzir que também matou sua esposa. Que as duas mulheres tenham se jogado no rio, em tão pouco tempo, é muita coincidência. Uma fria indagação iluminou os olhos de Corvus. ─Uma teoria muito interessante. Você tem provas?

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─Sim. Quando eu encontrei esses papéis, eu também encontrei evidências que relacionavam Hastings com a morte da Srta. Risby. ─Eu entendo ─ Corvus olhou Louisa ─ Eu posso presumir que participa desta investigação porque planeja escrever um artigo para a imprensa sobre as misteriosas mortes das senhoras? ─Sim ─ disse ela, subindo um pouco mais os olhos ─ O Sr. Stalbridge e eu queremos descobrir a verdade. Olhos de Miranda se arregalaram. ─Uma investigação criminal. Que emocionante! ─Há um detetive da Scotland Yard, que também questiona o que aconteceu naquela noite ─ Anthony continuou ─ Seus superiores o forçaram a abandonara as investigações, mas está pronto para intervir se descobrirem provas irrefutáveis da culpa de Hastings. ─Temo que provas é algo que eu não posso dar ─ disse Corvus ─ Eu só posso dizer o que sei. Cerca de duas semanas atrás, Hastings entrou em contato comigo e me pediu para procurar dois guarda costas. Eu os encontrei. ─Em troca de uma grande soma em dinheiro, claro ─ Miranda interveio. O olhar de Corvus se tornou muito malicioso. ─Meu relacionamento com Hastings se baseia em mútuo interesse mútuo em certos negócios, e não na amizade. Em qualquer caso, é bastante rico e não se opôs a pagar o que eu pedi por meus homens. Na verdade, ele parecia muito aliviado por ter os seus serviços. Eu tive a impressão de que ele estava muito nervoso. ─Tivemos um encontro com um dos guardas, uma noite durante um baile.

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-Sim, eu sei ─ Corvus parecia divertido ─ Quinby, o guarda que os viu, relatou-me o incidente, e também que vários itens haviam desaparecido do cofre forte Apollo. Ele não sabia exatamente o que era porque Hastings havia se recusado a dizer-lhe. Claro que, quando Miranda me entregou os papéis, eu tive um pressentimento ─ olhou para Anthony ─ Antes de continuar, eu tenho uma pergunta para você, caso não se importe. Anthony assentiu. ─Claro. ─O que mais desapareceu do cofre forte? ─Objetos que Hastings utilizava para conseguir dinheiro de velhinhas ricas ─ disse Anthony. ─Chantagem ─ as sobrancelhas de Corvus arquearam-se ─ Eu não tinha ideia que Hastings estivesse envolvido em assuntos dessa natureza ─ fez uma pausa ─ Posso perguntar o que aconteceu com os objetos de extorsão? ─Foram devolvidos anonimamente para seus proprietários. Um sorriso delineou-se no rosto de Corvus. ─Sim, é claro. Anthony virou sua taça nas mãos. -─Você sabe por que Hastings pediu dois guarda costas? Pelo que tenho visto, estes dias, não vai a lugar nenhum sem eles. Não há dúvida de que algo o preocupa. ─Disse-me que seu agente de negócios, Phillip Grantley, havia morrido em circunstâncias suspeitas ─ repondeu Corvus ─ Mesmo que a imprensa diga que Grantley suicidou-se. Louisa fixou-se nele. ─Mas, Hastings não pensa assim? Corvus pensou sobre isso durante algum tempo. 278


─Tenho a impressão de que esperava que o veredicto de suicídio fosse verdade, mas por algum motivo ele se mostrou cético. Curiosamente, quando soube que Thurlow também tinha tirado sua própria vida, ficou histérico, segundo Quinby e Royce. ─Os dois, Grantley e Thurlow, trabalhavam para ele ─ disse Anthony ─ No princípio pensamos que Hastings os havia assassinado, mas não parece ser o caso. Corvus assentiu. ─Concordo. Posso lhe dizer que Hastings estava genuinamente alarmado com as duas mortes. Não há dúvida de que suspeite de que esteja correndo perigo. Por essa razão precisava dos guarda costas. ─Pensando bem ─ disse Louisa ─ Hastings tem razão para ter medo. Afinal de contas, é um chantagista. É possível que receie que uma de suas vítimas tenha seguido a pista de Grantley e Thurlow, e ele seja o próximo. Corvus assentiu. ─O que você disse parece muito razoável, Sra. Bryce. Não me surpreenderia nem um pouco que seja exatamente o que está pensando. ─Sem dúvida, explica os temores de Hastings ─ admitiu Anthony ─ mas, não acho que o assassino seja nenhuma das vítimas de chantagem. Foram escolhidas com astúcia. Todas são idosas que tentavam proteger os membros mais jovens de suas veneráveis famílias. Miranda olhou maliciosamente. ─Nunca subestime uma mulher, senhor. ─Acredite em mim quando eu digo que este não é o caso ─ disse Anthony com alguma simpatia ─ Mas, eu não acredito que as senhoras tenham acesso aos recursos necessários para seguirem os rastros de Grantley e Thurlow. Também, é muito difícil imaginar uma delas

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conseguindo uma arma, aprendendo a atirar, esgueirando-se nas casas desses homens e assassiná-los. Louisa olhou para ele. ─Acabo de pensar uma coisa. Talvez, uma das senhoras tenha contratado alguém para matar Grantley e Thurlow. Corvus parecia divertido. ─Contratar um assassino para matar dois homens, aparentemente respeitáveis, é um pouco mais complicado do que você possa pensar, Sra. Bryce. Acredite em mim quando lhe digo que esse tipo de assunto teria chegado aos meus ouvidos. Um ligeiro arrepio percorreu a coluna de Louisa. ─Compreendo ─ disse. ─Inclino-me a pensar como o Sr. Stalbridge ─ continuou Corvus lentamente ─ Eu duvido que qualquer uma das vítimas tenha assassinado Grantley, ou Thurlow, ou pagou alguém para fazer isso. O ponto é que os chantagistas inteligentes não tentam obter dinheiro de vítimas que podem ser perigosas. Melhor procurar em outro lugar. ─Tenho outra pergunta, se não se importa ─ disse Anthony suavemente. Corvus esperou educadamente. ─Quantas pessoas, além de você, sabiam que Grantley e Thurlow trabalhavam para Hastings? Corvus levou algum tempo para pensar. ─Tomei o cuidado de averiguar tudo que foi possível sobre Hastings, antes de fazer negócios com ele. Ouvi sobre Grantley desde o princípio, porque era ele quem se ocupava dos detalhes do negócio. Porém, não sabia nada sobre Thurlow. Se não tivesse perguntado a Miranda sobre a possibilidade de Hastings ter outros empregados e não lhe dessem uma 280


descrição aproximada, duvido que eu tivesse chegado a saber sobre ele. Na verdade, tive que pesquisar muito para descobrir que existia alguma conexão entre Thurlow e Hastings. ─Em outras palavras ─ resumiu Anthony ─ a ligação entre Grantley, Thurlow e Hastings não era um fato conhecido de todos. ─Não ─ respondeu Corvus com séria convicção ─ Não era um fato conhecido por todos, de maneira nenhuma.

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Capítulo 37

Pouco tempo depois, Anthony ajudou Louisa a subir na carruagem que havia alugado. Sentou-se, ajeitou a saia e ficou olhando enquanto ele sentava-se na cadeira em frente. À luz da lanterna que iluminava o interior do veículo, delineava as suas severas linhas faciais. ─Em que você você está pensando? ─ perguntou em voz baixa. ─Quem quer que tenha assassinado Grantley e Thurlow e devia conhecer suas conexões com Hastings. ─Sim, e obviamente Hastings deve ter chegado à mesma conclusão, por isso pensa estar em perigo ─ Ela hesitou ─ É possível que o assassino seja alguém que foi traído nos negócios. ─E, nesse caso é possível que o assassino tenha conhecido Grantley, mas quais seriam as chances de também ter conhecido Thurlow? Inclusive Corvus desconhecia a ligação entre Thurlow e Hastings, e nos assegurou que investigou a fundo este último, antes de fazer negócio com ele. Louisa suspirou. ─E, além disso, por que matá-los? A pessoa enganada não teria ido diretamente atrás de Hastings? ─O assassinato de um cavaleiro da posição social de Hastings daria muito falatório. Sairia nos jornais durante semanas. Mesmo que o assassino tivesse conseguido simular outro suicídio, teria despertado um alto grau de atenção. É bem provável que não quisesse correr este risco. ─Correto ─ disse hesitante ─ Essas mortes simplesmente não fazem sentido. ─Não estou tão certo sobre isso ─ Anthony cruzou os braços e esticou as pernas ─ Tenho a impressão que matando Grantley e Thurlow, o 282


assassino se livrou de duas das pessoas que mais sabiam sobre os negócios sujos de Hastings. ─Oh! Ele sorriu ligeiramente. ─O que você acha? ─Acho que se eu me propusesse a destruir um homem sem ter necessariamente que assassiná-lo, eu poderia considerar eliminar todas as pessoas de sua confiança que se ocupassem de seus assuntos financeiros. ─Porém, você não pararia aí ─ acrescentou Anthony lentamente ─ não, se você tivesse a intenção de destruí-lo. Se você estiver certa, Hastings ainda corre grande perigo. ─Muito bem. Vamos abordar a questão de outro ângulo ─ ela continuou resolutamente ─ Quantas pessoas conheceriam o seu negócio bem o suficiente e teriam por sua vez, uma razão para querer destruí-lo? ─Você quer dizer, além de mim? ─ Disse secamente. Ela corou. ─Sim, é claro. Além de você, senhor. E, também as idosas que foram vítimas de chantagem. Anthony pensou por uns instantes. ─Como você disse, é possível que alguém que foi traído por ele quisesse a sua vingança. Deveria parar por aí. Qualquer pessoa com bom senso não abriria mais a boca, porém não pôde evitar. Anthony estava faminto de respostas. Ela também. Devia arriscar-se. ─Nossa lista de suspeitos, ─ ela disse, escolhendo as palavras com muito cuidado ─ incluem, apenas, aqueles que conheciam intimamente os assuntos ilegais de Hastings, e aqueles que teriam razão para querer matar os dois homens que o ajudavam em suas atividades secretas. 283


─Certamente uma lista muito pequena, como você diz, porém, se Clement Corvus não pode sugerir-nos mais nenhum suspeito, duvido muito que sejamos capazes de encontrar algum. ─Ocorreu-me um suspeito! ─ disse ela lentamente. ─Quem? ─Sua falecida esposa.

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Capítulo 38

Para a surpresa de Louisa, Anthony não descartou imediatamente a ideia. Em vez disso, ele a observou solenemente intrigado. ─O que faz você pensar que Victoria Hastings poderia estar envolvida neste assunto? ─ perguntou sem rodeios. ─Não tenho certeza, claro ─ se apressou a contestar Louisa ─ É um pressentimento vago que tem se formado gradualmente na minha cabeça. Eu queria comentar quando voltamos para a Praça Arden, depois do chá com sua família, naquela tarde, mas nos distraímos, se você se lembra. Ele sorriu lenta e maliciosamente. ─Asseguro Louisa, que me lembro de cada detalhe de nossa deliciosa distração. Ela corou e continuou, atrevida. ─Eu me pergunto se, talvez, devêssemos investigar a possibilidade de Victoria Hastings ainda estar viva. ─Muito bem, vamos considerar a sua teoria. Primeiro assumiremos que esteja viva. Por que mataria Grantley e Thurlow? ─Eu não sei ─ Louisa fez um gesto, virando as palmas de suas mãos enluvadas para cima ─ Mas, você terá que admitir que era uma das poucas pessoas que saberia que os dois homens eram importantes para Hastings. Anthony ficou em silêncio por um momento. Em seguida, acenou com a cabeça. ─Vá em frente, eu estou ouvindo. Ela procurou alguma coisa em sua manga, tirou seu caderninho, e, abrindo as páginas com iniciais VH, repassou os poucos fatos que havia anotado. 285


O que me impressionou desde o início deste assunto foi o fato de nunca terem recuperado o cadáver de Victoria. ─Isto acontece algumas vezes com quem se afoga ─ Anthony lembrou. ─Sim, eu sei, mas você tem que admitir que deixa em aberto a possibilidade de que possa ter sobrevivido ─ disse ela. ─Teria que ter tido uma sorte incrível, e além de saber nadar. Poucas mulheres aprendem a fazê-lo. Louisa olhou-o nos olhos. ─Victoria sabia nadar. Anthony a observava com curiosidade crescente. ─Como diabos você sabe disso? ─Emma me disse. Tivemos uma longa conversa sobre Victoria. Veja bem, Emma também sabe nadar, e mencionou de passagem que Victoria Hastings era a única mulher de boa família que tinha conhecido, e que também sabia nadar. ─Interessante. Não obstante, ainda que Victoria soubesse nadar, não podemos descartar o fato do peso do seu vestido e de suas anáguas que a levariam para o fundo. ─Você está supondo que Hastings a tenha jogado no rio. Mas, e se ela mesma forjou o seu próprio suicídio? Ele ficou em silêncio. ─De onde você tirou semelhante ideia? Deveria andar com muito cuidado. Não poderia dizer-lhe que tinha pensado nessa possibilidade, porque ela mesma havia forjado sua própria morte, e a inspiração havia sido o suicídio de Victoria Hastings, principalmente porque o seu corpo não tinha sido encontrado. Ela fez todo possível para se parecer um gesto casual. 286


─Oh, eu acho que todos esses romances e peças de esposas desaparecidas e maridos que sempre aparecem no final da história ... alegando haver sobrevivido milagrosamente a um naufrágio ou alguma outra catástrofe. ─Arruinando assim a possibilidade de um final feliz para o casal que mantinha um caso ilícito ─ observou Anthony. Corando, Louisa olhou para suas anotações. ─Sim, bem, ademais, uma das pessoas que entrevistei antes de começar a trabalhar com você, foi a criada de Victoria. Elwin a demitiu pouco depois do desaparecimento de Victoria. ─Você localizou o paradeiro da criada? Estou impressionado. Demonstra que você tem muitos recursos. ─Obrigado ─ consultou suas notas ─ É claro que, naquela época só me interessava informações relativas ao Sr. Hastings, porém anotei algumas das coisas ditas pela criada, sobre a sua antiga patroa. ─O que ela disse exatamente? ─A empregada se chama Sally. Depois de perder o emprego na mansão de Hastings, entrou para o serviço de Lady Mounthaven, que me permitiu falar com ela. Sally me contou que sua última tarefa antes de deixar o emprego na casa de Hastings, tinha sido embalar todas as roupas e pertences de Victoria e enviá-los para uma instituição de caridade. Mencionou que a única peça que faltava no guarda-roupa era uma camisola. ─Isso parece ir contra a sua teoria de que tenha representado a sua própria morte. É improvável que uma mulher que planeje desaparecer na noite, estivesse vestindo apenas uma camisola. ─Mas, e se o alegado suicídio havia sido planejado com antecedência? Teria tido tempo para comprar um vestido sem que a sua 287


empregada soubesse. Poderia tê-lo escondido até que necessário. Ao desaparecer, deixando para trás seu guarda-roupa, seu marido sentir-se-ia mais propenso a pensar que realmente tinha sofrido um colapso nervoso, teria se encaminhado para o rio e se jogado nele. ─Você andou pensou muito sobre esse assunto, não é verdade? Ela hesitou novamente, escolhendo as palavras com cuidado. ─Emma e você concordam que Victoria Hastings não parecia ser o tipo de mulher que cometeria suicídio. ─Verdade. ─Emma disse que Victoria sempre lhe pareceu uma mulher de grande força de vontade e determinação. Ficou muito surpresa ao saber pela imprensa que a Sra. Hastings era propensa a crises nervosas e melancolia. ─Certamente foi Hastings que lançou esse boato ─ disse Anthony ─ O que mais lhe disse a empregada? ─A informação mais interessante que me forneceu foi que Hastings e Victoria conversavam muito sobre questões financeiras. Disse que sua antiga patroa era muito inteligente quando se trata de assuntos deste tipo, e que o Sr. Hastings sempre seguia os seus conselhos. Anthony ficou em silêncio. ─Você tem razão. Isso é muito curioso. Nenhum dos rumores, que eu ouvi nos clubes, sugeria que ela participasse ativamente em seus consórcios. ─Bem, ─ disse Louisa ─ seria esperar demais que os cavalheiros da alta sociedade considerassem, por um momento, que uma mulher poderia ter talento para os negócios. ─Não há necessidade de lembrar-me que um homem pode, às vezes, ser alheio às habilidades de uma senhora ─ Anthony afundou ainda mais no 288


canto do seu assento, pensativo ─ Quando Hastings e Victoria casaram-se, havia rumores de que Hastings estava à beira da ruína, mas alguns meses depois

do

casamento,

parece

que

suas

finanças

melhoraram

consideravelmente. Ele começou a criar vários empreendimentos que foram muito bem sucedidos. Louisa teve uma ideia. ─As chantagens também ocorreram enquanto Victoria estava viva. ─Porém, se fosse Victoria quem planejava a parte intelectual da manobras financeiras ─ disse Anthony, impaciente ─ por que iria desaparecer, deixando tudo, inclusive o dinheiro? Continuo achando que ele a matou. ─É possível que você tenha razão, ─ admitiu Louisa ─ mas por que matá-la se ela era a fonte de sua nova riqueza? ─Pode ser que estivesse convencido que já não precisasse mais dela. Você descobriu mais alguma coisa, através da criada? Louisa virou a página de seu caderno e leu o que tinha anotado. ─Disse-me que ela e o restante dos empregados domésticos tiveram a noite de folga, no dia do desaparecimento da Sra. Hastings. ─Que coincidência oportuna ─ comentou Anthony ─ Isso é tudo? Louisa tossiu. ─Bem, há mais uma coisa. ─O quê? Respirou fundo e se preparou para a próxima revelação. ─Sally mencionou que o Sr. E a Sra. Hastings tinham o que ela descreveu como uma vida privada das mais “vigorosas” ─ disse tentando parecer profissional e mundana. Anthony levantou as sobrancelhas. ─Vigorosa? 289


Louisa fechou sua caderneta rapidamente. ─É difícil de imaginar isso, mas não há dúvida que empregassem um chicote. ─Eu entendo. O tom de voz de Anthony soava suspeitosamente neutro. Ela olhou para cima e o encontrou observando-a com diversão. Suas faces ficaram vermelhas. ─De acordo com informações fornecidas por Roberta Woods, Elwin Hastings continua desfrutando do chicote. De fato, esses são os serviços solicitados em visitas semanais a Phoenix House. ─Eu acho ─ disse Anthony ─ que precisamos de mais informações sobre Phoenix House. Anthony ficou em silêncio novamente, observando-a das sombras. ─O que você está pensando, Sr. Stalbridge? ─ perguntou depois de alguns instantes. Ele sorriu lentamente, seus olhos brilhando misteriosamente. ─Você realmente é uma mulher extraordinária. ─Oh! ─ ela não sabia exatamente como acatar o elogio ─ Bem, você também é extraordinário, senhor. ─Fazemos uma boa dupla, você não acha? Ela se animou. ─Sem dúvida, nossa parceria funciona muito bem ─ Houve outro silêncio. Ela olhou para ele ansiosamente ─ O que você está pensando agora, senhor? ─ perguntou, não podendo mais resistir ao suspense. ─Estou pensando que comprei umas Cartas Francesas, esta tarde a caminho de minha casa, depois que saí da Praça Arden. Louisa sentiu seu rosto arder.

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─Eu entendo ... ─ A curiosidade levou a melhor sobre ela ─ Oh! E onde se compra esse tipo coisa? ─Compra-se da mesma forma como se compra livros ─ disse, sorrindo ainda mais ─ Em uma loja. ─Entendo ─ franziu as sobrancelhas com espanto ─ Há lojas especializadas em semelhantes artigos? ─Sim. Esta loja em particular anuncia itens garantidos para satisfazer cavalheiros envolvidos em ilicitudes, e preocupados com a discrição. ─Que interessante! ─Estou surpreso que você não tenha tomado nota dessas informações em seu caderninho. ─Uma excelente ideia, senhor. Obrigada, por lembrar-me ─ ela disse começando a procurar em sua manga. Ele riu suavemente, segurou-a entre seus braços e a sentou em seu colo. ─Antes de escrever qualquer coisa, eu sugiro que você experimente uma de minhas novas compras ─ disse quase a beijando disse ─ Só para ter certeza de que funciona de forma satisfatória, é claro. Vibrou de emoção. Acariciou seu rosto com a mão enluvada. ─Em um coche, senhor? ─Por que não? Eu soube de uma fonte muito segura, que os coches são populares entre os amantes clandestinos. Anthony fechou as cortinas das janelas e uma cálida e convidativa penumbra os envolveu. Sua boca se fechou sobre a dela, sedutora, atraente e exigente. Ela tirou as luvas e em seguida, desabotoou-lhe a camisa. As Cartas Francesas funcionaram conforme o anunciado.

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─Pense no tempo economizado sem ser preciso lavar e engomar os seus lenços ─ Louisa comentou um pouco mais tarde.

Capítulo 39 ─Sinto muito tê-la incomodado com outra mensagem, Sra. Bryce – disse Roberta Woods enquanto servia chá, em uma grossa xícara ─ mas, me disse que gostaria de ser informada sobre qualquer coisa interessante que tivesse a ver com o Sr. Hastings e suas visitas a Phoenix House. ─É verdade, Roberta, por favor, não peça desculpas. Adorei receber sua mensagem ─ Louisa pegou seu livro de notas e um lápis de sua manga, e os colocou sobre a mesa ─ O que você soube? Estavam sentadas no minúsculo salão localizado no piso superior, da pequena casa de Swanton Lane. Era fim de tarde e se respirava certa tranquilidade a essa hora. Mulheres da rua só saíam bem mais tarde da noite. Um som de tachos e panelas provinha da cozinha, onde a cozinheira e sua ajudante estavam ocupadas com os preparativos para o jantar. Roberta era uma mulher forte e saudável, que parecia animada, da cabeça aos pés, com a energia entusiasmada e a determinação de uma devotada reformadora social. Colocou os copos sobre a mesa e sentou-se defronte à Louisa. ─Uma mulher que disse chamar-se Daisy, apareceu aqui antes do amanhecer ─ ela explicou ─ A pobrezinha tinha um aspecto terrível. 292


Trabalha na Phoenix House. Há poucos dias, um de seus clientes deu-lhe uma surra, que quase lhe custou a vida. ─Meu Deus! Já foi atendida pelo médico? Ela se recusou a ver qualquer pessoa. Disse que não pode pagar. Eu informei a ela que este estabelecimento pagaria os honorários do médico, mas ainda assim, recusou. Ela está obviamente aterrorizada. ─Disse o nome de quem bateu nela? ─Não, essa é a parte interessante ─ os olhos de Roberta se estreitaram ─ Estava com medo da proprietária do bordel. ─Madame Phoenix? ─Sim. ─Disse o motivo? ─ perguntou Louisa. ─Parece que Daisy foi mais ou menos vendida à proprietária, por um dos credores do seu marido. Os dedos de Louisa crisparam-se ao redor do lápis. ─Não é a primeira vez que ouvimos essa triste história de uma mulher que trabalha na Phoenix House, não é verdade? ─Não ─ concordou Roberta com tom frio ─ Não é. De qualquer maneira, Daisy tinha certeza de que a proprietária ficaria furiosa se descobrisse que uma de suas garotas tinha escapado, antes de quitar a dívida que tinha com ela, por assim dizer. ─Continue. Roberta tomou um gole de chá e colocou o copo sobre a mesa. ─Esta manhã Daisy deixou Phoenix House para sempre. Trazia uma pequena mala com ela. Veio aqui em busca de ajuda. Disse que tinha ouvido rumores que alguém deste estabelecimento estaria disposto a pagar, para obter informações sobre um de seus clientes na Phoenix House: Elwin Hastings. 293


─Você lhe deu o dinheiro? ─Sim. E, a enviei para a La Agencia. Ali estará protegida, pelo menos por enquanto. Irão proteger a sua identidade. ─O que disse Daisy sobre Hastings? ─Não muito ─ disse Roberta ─ mas, talvez se aproveite alguma coisa. Por causa do espancamento, Daisy ficou vários dias sem poder trabalhar. Ela foi colocada para trabalhar como empregada doméstica até que se curasse, além disso, lhe disseram para ficar de olho nos clientes. Uma de suas tarefas era faxinar todos os dias a casa de banho privativa de Madame Phoenix. ─Sim? ─Bem,

ontem,

quando

eu

estava realizando

suas

tarefas,

acidentalmente ouviu uma conversa entre Phoenix e seu amante. Louisa olhou para cima. ─A dona do bordel tem um amante? ─Obviamente que sim. Daisy estava limpando o banheiro nesse momento. Não ouviu tudo, mas entendeu o nome de Elwin Hastings. ─O que disseram sobre ele? ─Daisy escutou apenas trechos da conversa, mas era óbvio que estavam discutindo por causa dele. Madame Phoenix queria esperar um pouco mais, antes de fazer alguma coisa. Seu amante disse que deveriam agir imediatamente. ─Fazer o quê? Roberta fez um gesto frustrado com a mão. ─Apenas isso. Daisy não sabe. Tudo o que sabe, é que não Madame Phoenix e seu amante não concordaram sobre quando deveriam fazer alguma

coisa

a

respeito

de

Hastings.

Insistiu

que

discutiram

acaloradamente. 294


Louisa

observou

e

recostou-se

na

cadeira,

avaliando

as

possibilidades. ─Disse quem ganhou a discussão? ─Certamente, Madame Phoenix. Daisy disse que ela tem uma vontade de ferro. Ninguém se opõe a ela, nem mesmo sua amante. De acordo com, ele faz o que Madame Phoenix diz. Louisa pegou sua xícara e tomou um gole de chá. ─Daisy sabe o nome do amante dela? ─Disse que ninguém sabe. Sai e entra pela porta da cozinha, e não pela porta da frente, e sempre usa as escadas de serviço. Os funcionários são orientados a deixá-lo entrar sempre que apareça. ─Suas visitas são frequentes? ─Isso é uma das coisas mais interessantes que Daisy me disse ─ falou Roberta num sussurro ─ Parece que o amante se reúne frequentemente com Madame Phoenix, em seus aposentos privados, enquanto Hastings recebe “tratamento.” Louisa bateu na mesa com a ponta do lápis. ─Como descreveu a sua aparência? ─Disse que é um homem bonito, para quem gosta de homens com aparência dura e cruel. Claro que Daisy não gosta desse tipo de homem. Ele tem o cabelo escuro, e sempre usa um casaco até os tornozelos, quando vai visitá-la. ─Essa descrição se encaixa em milhares de homens. Mais alguma coisa? ─Só mais uma coisinha ─ disse Roberta ─ Dayse falou que ele usa um anel luxuoso, de ouro e ônix. Louisa engasgou. Cuidadosamente escreveu um nome em seu caderno. Quinby. 295


Capítulo 40

Louisa voltou correndo para a Praça Arden, tentando encontrar sentido em tudo que havia averiguado até então. Claro, isso poderia não significar nada além do óbvio. O que queria dizer que Quinby mantivesse relações com Madame Phoenix? De acordo com Daisy, ele tinha começado a visitar Phoenix House um par de meses atrás, o que significava que ele conheceu Madame Phoenix antes mesmo de se tornar um dos guarda costas de Hastings. O que tinha de estranho na relação entre Quinby e a proprietária do bordel? Afinal de contas, Quinby era um homem bonito, se você ignorasse seus olhos reptilianos. Madame Phoenix tinha motivos de sobra para sentirse atraída por ele e vice-versa. Certamente, eram da mesma laia. A porta do número doze se abriu, antes mesmo que pudesse colocar a chave na fechadura. -Bem vindo ao lar, Sra. Bryce ─ a Sra. Galt-se afastou-se para deixála entrar ─ Há outra mensagem para você. Chegou há pouco mais de cinco minutos, eu a deixei sobre a mesa do escritório. ─Obrigada, Sra. Galt. Louisa desatou as fitas do chapéu e pendurou no cabideiro. Caminhou até a biblioteca, tirou suas luvas. Havia um envelope branco em cima da mesa.Segurou-a, abriu-a e leu o bilhete curto escrito com letra bonita. Consegui o “Milton” por um preço razoável. No entanto, outro cliente está ansioso para comprá-lo e certamente irá pagar mais por ele.

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Dou-lhe até cinco horas, desta tarde para pegar o livro. Se eu não receber notícias suas, avisarei ao outro cliente. Atenciosamente, DIGBY Maldito Digby! Tinha que vender o “Milton” na mesma tarde em que ela tinha outros negócios para tratar. Olhou para o relógio de parede que havia no canto. Quatro e meia. Se saísse imediatamente, poderia chegar até a loja de Digby às cinco, pegar o livro e voltar para casa por volta das cinco e meia. Tempo suficiente para informar Antônio de suas recentes descobertas após retornar da loja. Voltou ao vestíbulo, colocando as luvas. ─Sra. Galt? A governanta saiu da cozinha, enxugando as mãos no avental. ─O que deseja, senhora? ─ Preciso sair novamente ─ Louisa foi até a porta e pegou seu chapéu ─ A mensagem era de Digby. Ele encontrou o livro que eu quero muito comprar. Estarei de volta às cinco e meia, no máximo. ─Muito bem, senhora. É melhor que leve o casaco. Não vai querer se resfriar. ─Tem razão. Louisa pegou o seu casaco e o colocou sobre os ombros. ─Espero a visita do Sr. Stalbridge. Se chegar antes de mim, por favor, peça para esperar-me. Pegou seu protetor de mãos e correu em direção à porta.

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Capítulo 41

Abriu a porta da Livraria Digby e entrou em seu sombrio interior. Não havia clientes. Digby não estava sentado em sua mesa atrás do balcão. ─Sir Digby? Não recebeu nenhuma resposta. A porta que conduzia para a sala dos fundos estava fechada. Esperou um momento. Quando não apareceu ninguém, contornou o balcão e bateu na porta. -─Sir Digby? O senhor está aí? Vim buscar o “Milton”. Ainda não são cinco horas. Se, por um acaso, vendeu o livro a outro cliente, vou ficar muito aborrecida. Não se ouvia o menor ruído do outro lado da porta. Segurou a maçaneta com uma mão enluvada e girou suavemente. A porta abriu-se totalmente, revelando uma sala de fundos sombria, abarrotada e sem luz. Um montão de livros foi empilhado em cima de uma mesa de trabalho. Por todos os lugares se viam caixas e gavetas empilhadas. Havia uma grande quantidade de papel e uma tesoura em cima da mesa. Um ligeiro odor adocicado a fez enrugar o seu nariz. Tentava identificá-lo quando notou os resistentes sapatos aparecendo atrás de uma caixa de papelão aberta. Os sapatos sobressaiam por baixo das pernas de uma calça marrom. ─Sr. Digby! O que aconteceu? Entrou correndo no quarto e deu a volta na caixa de papelão. Digby estava de bruços no chão. Seus olhos estavam fechados. Não havia sinal de

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sangue em qualquer lugar. Era possível que tivesse tido um infarto ou uma embolia. Ajoelhou-se ao seu lado, tirou uma luva, colocou os dedos no pescoço de Digby e sentiu seu pulso. Sentiu um grande alívio ao descobrir que ele ainda estava respirando, ainda que ligeiramente, e tinha pulso constante, embora um pouco lento. Começou a afrouxar-lhe a gravata. Uma tábua rangeu atrás dela. Foi o único aviso que recebeu antes de um poderoso braço masculino rodeá-la e levantá-la pelo ar. Louisa abriu a boca para gritar. Um pedaço de pano amassado, o lenço de um cavalheiro ou um guardanapo, cobriu-lhe o nariz e a boca obrigando-a a respirar através do tecido. Agora, o cheiro doce de clorofórmio era inegável, seus gases tampavam suas narinas e chegavam aos seus pulmões. A sensação de tontura ameaçou entorpecer os sentidos. Lutou desesperadamente até ficar com seus braços imobilizados. Chutou furiosamente, batendo com os pés nas caixas de papel para derrubá-las. Voltou a tentar. Desta vez, ouviu um baque surdo mais satisfatório, seguido por um xingamento furioso quando o salto de sua bota fez contato com a canela de seu agressor. ─Puta maldita! ─ sussurrou Quinby, agarrando-a com mais força ─ Dá mais problemas do que vale a pena. Se fosse por mim, eu já teria cortado a sua garganta há muito tempo. A tontura foi aumentando. Sentiu um calor e um nó no estômago. Tinha ouvido falar, em algum lugar, que o clorofórmio fazia efeito geralmente em um par de minutos, muitas vezes menos. Muita quantidade poderia matá-la. Restava-lhe muito pouco tempo. Parou de enfiar as unhas no braço de Quinby e, de repente, ficou imóvel, esperando que ele acreditasse que a droga havia funcionado, mas

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era óbvio que seu captor não queria arriscar e manteve o lenço pressionado firmemente contra a sua boca e nariz. Mal podia pensar, tudo era confuso. Estava vagamente consciente de que teria que fazer alguma coisa, quando desmaiou. Quinby arrastou-a pelos aposentos, ansioso para tirá-la da loja. Ela sentiu o peso do seu protetor de mãos pendurado pela fina tira de veludo, amarrada ao seu pulso. Retorceu levemente a mão, na esperança que, se Quinby notasse, ele pensaria como sendo uma mera indicação que a sua resistência tinha praticamente acabado. A última coisa que ouviu foi o som de uma porta se abrindo. Sacudiu a mão ligeiramente, e sentiu que se desfazia do peso do seu protetor de mão, porém não podia ter certeza. A escuridão e o aterrador perfume do clorofórmio reclamaram a sua consciência.

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Capítulo 42 ─Como assim, não voltou? ─ Anthony tirou o relógio de ouro do bolso e verificou a hora. É quase seis e meia. Está uma hora atrasada. ─Sim, senhor Stalbridge, já me dei conta ─ A Sra. Galt franziu a boca, em um gesto de desaprovação ─ De acordo com a minha experiência, a Sra. Bryce não liga muito para horários. Também é muito propensa a sair sem dar a ninguém uma ideia clara do seu destino ou de quando volta. Pelo menos desta vez, ela mencionou que ia visitar a loja de Digby. Interrogar a Sra. Galt era inútil. Examinou o vestíbulo. O chapéu e o casaco de Louisa não estavam ali. Isso só confirmou que não estava em casa, coisa que já sabia. ─Disse se queria que eu a esperasse? ─ insistiu. ─Sim, senhor. Quando voltou de sua visita a Swanton Lane, mencionou algum assunto que gostaria de falar com você o mais rápido possível. Esse detalhe lhe chamou a atenção. ─Ela foi à Swanton Lane esta tarde? ─Sim, senhor ─ a Sra. Galt bufou ─ Não sei por que insiste em ir lá tantas vezes. Uma coisa é dar dinheiro aos fundadores de obras de caridade, mas não há necessidade que uma senhora se envolva pessoalmente, nesse tipo de assunto. ─Obrigado, Sra. Galt. A senhora foi muito útil. Eu vou sair para encontrar a Sra. Bryce ─ disse Anthony. ─Boa sorte é tudo que eu posso dizer, senhor. Sra. Galt abriu a porta.

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Ele desceu os degraus pensando em seu próximo movimento. Faltava muito pouco para o anoitecer e não gostou de saber que Louisa andava por aí, em algum lugar, sozinha. Começaria com Digby. Talvez o livreiro tivesse alguma ideia de onde ela poderia ter ido, depois de deixar sua loja.

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Capítulo 43

Louisa acordou com uma leve dor de cabeça e com o cheiro de mofo que normalmente está associado a sótãos e espaços subterrâneos. Ela estava em uma superfície dura e fria. O pânico tomou conta dela. "Estou no necrotério. Meu Deus! Eu estou morta. " Não, estava errada. Certamente, se estivesse morta, não estaria se sentindo tão desconfortável. A menos, claro, que tivesse ido direto para o inferno pelo pecado de ser uma assassina. Abriu os olhos. Estava envolvida em sombras densas, mas vislumbrou uns feixes de luz refletidos numa parede. Os feixes de luz eram bastante claros, nem um pouco embaçados. Bom. Ainda usava seus óculos. Era outro indício de que ainda estava no mundo dos vivos. Tentou se lembrar de alguns fatos consistentes que explicariam a presente situação. Veio à sua cabeça a imagem do corpo inerte de Digby, desmaiado no chão. De repente, lembrou-se da sensação assustadora de ser imobilizada por um braço de aço, enquanto chutava e lutava. "Maldita puta!" Era a voz de Quinby. A partir desse momento, não se recordava de nada. Sentou-se com cuidado e ajustou firmemente os óculos sobre o nariz. Felizmente, a dor de cabeça não piorou. No entanto, seu estômago estava instável. Respirou fundo e devagar várias vezes. Isso pareceu ajudá-la. Quanto tempo havia se passado? Levantou-se meio que cambaleando e girou lentamente sobre seus saltos, tentando descobrir os detalhes de onde estava. A luz fraca de uma lâmpada passava através de três barras de ferro da única abertura, na pesada porta de madeira. Estava em um espaço 303


pequeno, baixo, de teto abobadado. Não havia janelas. Uma antiga câmara de armazenamento, concluiu, ou a cela de uma freira. A julgar pelos muros de pedra e alvenaria, deveria datar de tempos medievais. Caminhou até a porta, sem muita esperança e girou a maçaneta. Não se moveu. Ao sentir o frio do ferro sob seus dedos, percebeu que havia perdido uma luva. Tinha uma vaga lembrança de tê-la removido para verificar a pulsação de Digby. A abertura da porta estava no nível dos seus olhos. Espiou pelas grades e encontrou-se observando outra câmara semelhante, com paredes de pedra e teto baixo. Havia uma lâmpada sobre uma mesa baixa, no centro da sala. Graças à luz fraca, viu uma porta fechada e, em frente à ela, o espaço escuro de uma escada estreita e desgastada. Estava prestes a virar-se para explorar o lugar, quando ouviu o eco fraco de sapatos de couro sobre a pedra. Foi invadida por uma nova onda de medo. Alguém estava descendo pelas escadas. A primeira coisa que viu foram as saias de um elegante vestido preto e um par de botas da última moda combinando. A mulher desceu o último degrau e entrou na câmara principal. O último elemento do seu guarda-roupa, um pequeno chapéu preto, coroava uma bonita cabeleira ruiva. Um denso véu de seda preto ocultava as suas feições. Louisa respirou fundo. ─Victoria Hastings, se eu não estou enganada? Ou devo chamá-la de Madame Phoenix? Ela parou, assustada porque tinha sido reconhecida. Então, avançou lentamente sobre o chão de pedra e parou na diante da porta da cela. Sem demonstrar nenhuma emoção, levantou o véu com a mão enluvada de negro e deixou que caísse em dobras sobre a aba do chapéu. Victoria 304


possuía o rosto de um anjo, Louisa pensou, porém o brilho desagradável e cruel de seus olhos era absolutamente demoníaco. ─Lamento muito, mas tive que sequestrá-la ─ disse Victoria ─ Porém, a culpa é inteiramente sua. Na realidade, você estava chegando demasiadamente próxima da verdade, Sra. Bryce, ou prefere que eu a chame de I. M. Phantom?

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Capítulo 44 O cartaz de “Fechado”, estava pendurado na janela da loja de Digby. Anthony o ignorou e tentou entrar. A porta estava trancada. Porém, pegou as ferramentas que sempre carregava em sua bota, e começou a trabalhar. Demorou dez segundos para entrar no local envolto em trevas. Ao abrir a porta uma campainha tocou. ─Quem está aí? ─ Perguntou uma voz ansiosa dos quartos do primeiro andar ─ Vá embora! A loja está fechada hoje. Anthony entrou na loja e parou no pé da escada. Digby, de cima, olhou para ele. Parecia bastante nervoso. ─Desculpe-me incomodá-lo ─ disse ─ Sou Stalbridge. Espero que você se lembre de mim. Estive aqui perguntando por um livro de Milton. Digby o olhou fixamente. ─Lembro-me muito bem. O que faz aqui? ─Procurando a Sra. Bryce. Você a viu? ─ perguntou. ─Hoje, não! Graças a Deus. Já tive problemas suficientes ─ disse o livreiro. ─Você enviou-lhe uma mensagem, no início da tarde. ─Eu não fiz isso. ─Tem certeza, Sr. Digby? ─É claro que eu estou! ─ Digby parecia irritado ─ Eu não tinha nenhuma razão para enviar-lhe uma mensagem. ─Tem certeza que ela não veio aqui às cinco horas dessa tarde? ─Eu já disse que não a vi. E, agora eu peço-lhe que saia, senhor. Não estou me sentindo muito bem. ─Você está doente? 306


─Agora, não. ─ Digby colocou a mão em sua testa, com ar preocupado ─ Pelo menos, eu acho. Recentemente sofri uma tontura. Não sei o que aconteceu, devo ter desmaiado. Acordei no chão do quarto dos fundos. Acho melhor eu ir para a cama. ─Esteve desmaiado por algum tempo? ─ Anthony perguntou. ─Sim, meia hora ou mais. Por quê? ─ Há quanto tempo recuperou a consciência? ─Bem, eu não olhei para o relógio ─ Digby fez um gesto irritado ─ Suponho que passavam das cinco horas. ─Me permite que eu dê uma olhada em seu quarto dos fundo, Sr. Digby? ─Para quê? ─Preocupo-me ... a segurança da Sra. Bryce. ─Neste caso, então, procure em outro lugar. Eu disse que ela não esteve aqui. ─Seria apenas por um momento ─ disse Anthony. Dirigiu-se para o quarto dos fundos e acendeu a luz. ─Um momento, senhor ─ gritou Digby do alto da escada ─ Você não pode vir aqui e começar a fuçar. Anthony o ignorou, estudando a sala abarrotada, com uma sensação de desastre cada vez maior. Havia uma caixa de livros virada ao contrário. Era como se tivesse sido chutada. Ele foi até a caixa, parando para ver uma luva no chão. Um calafrio congelou suas entranhas. Recolheu a luva. ─O que você encontrou? ─ perguntou Digby da porta ─ Parece a luva de uma dama. ─É a luva de uma dama. ─Como chegou até aqui? ─ Digby parecia irritado e perplexo, ao mesmo tempo ─ Eu sou a única pessoa que entra nesta sala. 307


─Uma excelente pergunta ─ Anthony rondou por entre as caixas e viu um lenço amarrotado ─ É seu, Digby? Relutante, Digby aproximou-se para olhar de perto. ─Não. Eu não uso lenços de renda. Esse é o estilo de um cavalheiro. O lenço exalava um perfume, leve e doce. "Não é perfume", pensou Anthony. Demorou um segundo para identificar o odor. Quando o fez, uma onda de medo ameaçou consumi-lo. ─Acho que sei a causa da tontura que sofreu esta tarde, Sr. Digby ─ anunciou ─ Alguém lhe aplicou clorofórmio. ─Droga! Você tem certeza? Anthony estava prestes a responder quando notou o protetor de mãos. Estava no chão, perto da porta que dava no beco. Outro calafrio percorreu seu corpo, gelando suas veias. Recolheu o protetor. O caderno e lápis, que Louisa levava a todos os lugares, ainda estavam lá dentro. Lembrou-se dos comentários da Sra. Galta sobre a visita de Louisa à Swanton Lane. Procurou no protetor de manga, tirou sua caderneta e abriua procurando pela anotação mais recente. A primeira coisa que viu foi o nome de Quinby. Ao seu lado havia uma pequena seta apontando para outro nome: Madame Phoenix. Vinte minutos mais tarde, batia na porta dos fundos, da pequena casa em Swanton Lane. Uma mulher de aparência severa observou-o através da portinhola de ferro. ─Não é permitida a entrada de cavalheiros neste recinto ─ disse. ─Meu nome é Stalbridge. Anthony Stalbridge. Sou um amigo íntimo da Sra. Bryce, e tenho razões para acreditar que corre grave perigo. Preciso de sua ajuda. 308


Capítulo 45

Louisa deu dois passos para trás, afastando-se da luz que filtrava através da porta para entrar na cela sombria. Ela também poderia ser misteriosa, pensou. ─Suponho que me trouxe aqui com algum propósito ─ disse. Victoria aproximou-se da porta, olhando através das grades. ─Tenho medo que seja outro suicídio infeliz no Tamisa. Desta vez, a vítima é uma parenta distante de Lady Ashton, uma provinciana jovem e pouco atraente. Muito triste. ─Você cometeu um grande erro ao sequestrar-me. O Sr. Stalbridge não ficará nada satisfeito. ─Quando Stalbridge entender o que aconteceu, será tarde demais para fazer alguma coisa sobre isso ─ disse Victoria ─ Em qualquer caso, eu duvido que ele se preocupe muito com a sua morte, mesmo se suspeitar da verdade. ─Parece ter muita certeza sobre isso. O sorriso de Victoria estava cheio de arrogância e segurança. ─Tenho certeza, porque, ao contrário de você, eu o compreendo. Uma vez que se compreenda um homem , uma vez que você descubra o seu maior desejo, ele estará à mercê de seu controle. ─Como você pode dizer que conhece o Sr. Stalbridge? Segundo ele, encontraram-se, apenas de passagem, em eventos sociais. Victoria agarrou as barras de ferro embutidas na porta. ─Já disse que eu sei o que ele quer. Ele é obcecado por vingar a morte de sua amada Fiona. Suspeitou desde o início de que sua morte não havia sido um suicídio, entende? 309


─Ele estava certo, não é verdade? Victoria sorriu friamente. ─Sim. E, em breve, vou lhe dar o que mais deseja: o assassino de Fiona. Não tenha a menor dúvida de que o interesse de Stalbridge em sua segurança é inteiramente baseado na sua utilidade para que ele possa atingir o seu objetivo. Uma vez que você esteja morta e ele consiga suas respostas, você deixará de ter qualquer valor para ele. ─Hastings assassinou Fiona, não é verdade? ─Com a minha ajuda ─ Victoria encolheu os ombros com um floreio ─ Não tivemos escolha. Casualmente esbarrou conosco naquela noite, nos jardins do baile. Não sei por que saiu, talvez quisesse tomar um pouco de ar fresco. Em qualquer caso, ouviu a altercação entre Hastings e eu. A discussão tratava sobre os detalhes da chantagem que eu tinha organizado. Funcionavam muito bem, porém meu marido queria expandir o negócio. ─Chantagear as idosas foi sua ideia? ─Claro. Todas as ideias das quais Hastings tem se beneficiado, foram concebidas por mim ─ o rosto de Victoria contraiu-se de raiva ─ Mas o idiota estava convencido de que ele era a mente brilhante por trás de cada aventura. Meu erro foi deixar que ele se enganasse a si mesmo. Ele chegou à conclusão de que não precisava mais de mim. ─O que fizeram com Fiona? ─Ao ouvir um barulho do outro lado da cerca, eu soube imediatamente que havia alguém e que, sem dúvida, tinha ouvido o suficiente para nos levar à ruína. Dei a volta na cerca viva e lhe dirigi gentilmente palavra, como se nada tivesse acontecido. Hastings a surpreendeu por trás e bateu na cabeça dela com seu bastão. ─Meu Deus! ─ Louisa sussurrou.

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─Uma vez inconsciente, saímos com ela pela porta do jardim e a deixamos no beco, amarrada e amordaçada com algumas peças das roupas que levamos. Deixá-la ali era um risco, porém não conseguimos pensar em mais nada. Voltamos para o baile, chamamos um coche e saímos como se nada tivesse acontecido. ─E depois voltaram e a levaram para o rio? ─Elwin cuidou dessa parte. Ele pegou uma das minhas capas e voltou ao beco para livrar-se de Risby. Estava inconsciente, porém não estava morta, ele a envolveu com o manto. ─Como ele conseguiu transportá-la do beco para o rio? ─ Louisa perguntou. ─Deve ter notado que Hastings é um grande homem. A Srta. Risby era uma mulher pequena. Elwin, simplesmente a jogou sobre seu ombro e a tirou do beco como se fosse um fardo. Quando ele chegou a uma rua com pouco trânsito, chamou um coche. ─Como explicou o volume que carregava para o coche? Victoria sorriu. ─Isso foi muito fácil. Ele disse que a mulher que estava com ele era uma prostituta que lhe dera prazer e que tinha desmaiado ao ingerir uma quantidade enorme de genebra. E, como ele era uma pessoa boa, queria deixar a mulher em sua casa, perto do rio. O motorista não fez perguntas. Louisa tremia. E, concluiu com sua dedução: ─Porém, Hastings cometeu um erro. Ele não resistiu à tentação de ficar com o colar que Fiona usava naquela noite, e o arrancou antes de jogá-la no rio. Victoria riu. ─Não deve colocar a culpa pelo desaparecimento do colar em Elwin. Fui eu quem o tirou da Srta. Risby, antes de sair do beco. Eu não poderia 311


deixar que uma joia tão valiosa acabasse no rio. Claro, que já tinha planejado aproveitar as pedras em um design mais moderno. ─Eu entendo por que você e Hastings decidiram matar Fiona Risby, mas o quê a levou a desaparecer para voltar novamente como proprietária de um bordel? É uma humilhação, você não acha? Com a velocidade de um raio, as belas feições do rosto de Victoria transformaram-se em uma máscara de raiva. ─Você está louca? ─ berrou ─ Você acha que eu queria isso? Eu o amava. Você está me ouvindo? Elwin era o único homem na terra em quem confiei. Pensava que éramos iguais, que nós fossemos feitos um para o outro. Ensinei-lhe tudo o que sabe sobre as maneiras de ganhar dinheiro e a ganância que consome a maior parte das pessoas. Tudo. Louisa percebeu que não respirava. Victoria parecia à beira de um precipício interno. ─O que aconteceu? ─ perguntou baixinho. ─Foi quando o velhaco decidiu que não precisava mais de mim. Acredito que matar Fiona Risby deva ter lhe dado uma sensação de poder. Depois de matar uma vez, ele poderia facilmente fazê-lo novamente. Alguns dias mais tarde, ele se aproximou de mim enquanto eu dormia, e me aplicou clorofórmio. Despertei tarde demais para fazer alguma coisa além de opor-lhe uma débil resistência. Subjugou-me até que completasse o trabalho. ─Porém, você sobreviveu ─ disse Louisa. ─Foi a sorte e o destino que me salvaram aquela noite. Eu estava parcialmente acordada quando caí na água. Sabia nadar e estava vestindo uma camisola, em vez de vestido e espartilho. Fui tirada da água por um homem perturbado que vivia em uma cabana na margem do rio. ─O que você fez? 312


Victoria franziu os lábios e apertou os olhos. ─Sobrevivi. É algo que sei fazer muito bem, Sra. Bryce. ─Sim, eu posso ver isso. ─O homem que me tomou por uma espécie de ser de outro mundo, que tinha sido enviado para ele ─ recordou Victoria ─ e cuidou de mim com extraordinário cuidado. Quando me recuperei, fiz meus planos. ─Por que não foi à polícia e explicou às autoridades o que tinha acontecido? Victoria deu um sorriso desdenhoso. ─Eu não posso acreditar que seja tão ingênua, Sra. Bryce. Eu não tinha provas de que Elwin tinha tentado me matar. Você sabe tão bem quanto eu, que as autoridades tendem a concluir que qualquer mulher, seja a esposa ou não, que apresente acusações contra um cavalheiro com a linhagem de Hastings, padece de histeria. Recordações do cruel ataque de nervos perpetrado por Lord Gavin antes de seu investida final, fizeram Louisa balançar novamente. Então já sabia que, se tivesse corrido para as autoridades, decidiriam que sofria de histeria feminina. ─Sim ─ respondeu ─ Eu sei. ─Na melhor das hipóteses, eu seria trancada em um hospício. A outra possibilidade, porém a mais provável, é que Elwin tentasse me matar novamente. ─Por isso permaneceu escondida. ─E, planejei minha vingança. ─Estou surpresa que simplesmente não assassinasse Hastings. ─Eu pensei muitas vezes sobre isso, mas seria muito fácil. Eu queria fazê-lo sofrer. Desejava vê-lo consumir-se em uma fogueira. Queria que

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visse a sua destruição, como alguma coisa lenta e inevitável que paira sobre sua cabeça ─ disse Victoria não sem veemência. ─Você matou a ex proprietária da Phoenix House, não é? As feições de Victoria relaxaram-se, recuperando sua beleza habitual. ─Não foi difícil livrar-me dela e assumir o controle deste lugar. ─Como uma dama que se movimenta nos melhores círculos da alta sociedade, passar a dirigir um bordel? Victoria parecia friamente divertida. ─Ora, ora, Sra. Bryce, não adivinhou? Eu conheço o negócio porque eu cresci em um. Louisa ficou olhando para ela. ─Você era uma prostituta? ─Meu padrasto me vendeu para um bordel quando eu tinha doze anos. A verdade é que eu aprendi o meu ofício muito bem. Quando fiz dezoito anos, dirigia o local. Conheci Elwin Hastings aos vinte e dois anos. Era um cliente. Nós nos casamos dezoito meses mais tarde, depois que eu o convenci que o faria ficar rico. Eu mantive minha promessa, mas o canalha não manteve sua. ─Você tem me seguido e me espionado nas últimas semanas ─ disse Louisa. ─Ouvi boatos que alguém estava fazendo perguntas sobre a Phoenix House entre as mulheres que vão ao estabelecimento da Sra. Woods em Swanton Lane. Pensei que seria melhor descobrir o que estava acontecendo. Imagine a minha surpresa ao descobrir que você é correspondente do The Flying Intelligencer. Embora Louisa não soubesse o que dizer, optou pelo óbvio:

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─Você é uma mulher incrível, Victoria ─ olhou para o teto abobadado ─ Onde eu estou? Será que é o porão de seu bordel? ─Sim. Bem-vinda ao Phoenix House. Deixe-me assegurar que os benefícios aumentaram tremendamente desde que eu comecei a dirigir o estabelecimento. ─Eu não posso acreditar que você tenha voltado voluntariamente a este mundo. Victoria fez um gesto de zombaria. ─E, eu pensei que você teria uma visão mais mundana do assunto, Sra. Bryce. A verdadeira razão é que eu precisava de dinheiro para levar a cabo a minha vingança. No caso de você não ter percebido, é praticamente impossível para uma mulher que não tenha ligações familiares ou um marido rico fazer fortuna no, supostamente chamado, mundo moderno. ─Foi difícil atrair Hastings a este lugar? ─De maneira nenhuma ─ Victoria sorriu novamente ─ Afinal de contas, eu conheço os seus gostos melhor do que ninguém. E, como já lhe disse, uma vez que compreenda as coisas que um homem deseja acima de tudo, você o terá debaixo de seus pés. ─Desconfio que vá matá-lo. ─Sim. Na verdade, será esta noite. Eu não havia planejado que seria tão cedo. Primeiro queria Elwin sofresse dificuldades econômicas. Planejei durante meses. É lamentável que o plano de investimento, que tanto o orgulhava, tenha falhado. Ele perderia tudo, e então, supostamente, cometeria suicídio. Em seguida, eu reapareceria como a sua viúva inconsolável. Com os benefícios que obtive na Phoenix House, poderia voltar a ocupar o meu lugar na sociedade. ─O plano de investimentos foi ideia sua? ─ Louisa perguntou.

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─Claro. Utilizei Grantley para ocupar-se dos detalhes e convencer Elwin. ─E, quanto não precisou mais de Grantley, o matou. Victoria deu de ombros. ─Pensei que seria melhor. ─E, Thurlow? Por que matá-lo? ─Descobriu a minha identidade aqui em Phoenix House. Descobri que uma das meninas prestava seus serviços fora daqui, às escondidas. Ele suspeitou de algo que ela disse e conseguiu vir aqui se passando por um cliente. Subiu furtivamente ao andar de cima e me espionou. Viu-me por um instante sem o véu e me reconheceu imediatamente. ─O que ele fez? ─O idiota quis me chantagear. Ameaçou contar a Elwin que eu ainda estava viva. ─Então, foi vê-lo, esperou ele voltar para casa e o matou com um tiro ─ deduziu Louisa. ─Thurlow era um homem extraordinariamente bonito, porém temo que não tenha sido muito inteligente. ─Como Elwin Hastings vai morrer? ─ Louisa perguntou. ─Como eu já disse, você e Stalbridge me obrigaram a agir mais rápido do que eu queria. Victoria não escondeu sua raiva pelo rumo dos acontecimentos. ─Por isso, esta noite, Elwin sofrerá um ataque cardíaco, enquanto desfruta de sua sessão semanal na Phoenix House. -─Como você planeja para simular um ataque cardíaco? ─Não é nenhum segredo que uma quantidade suficiente de clorofórmio provoca parada cardíaca. ─E, logo após, eu vou acabar no rio, certo? 316


─Temo que sim. Vai deixar um triste bilhete explicando que entregou o seu coração ao Sr. Stalbridge, e percebeu que seu relacionamento estava condenado ao fracasso por causa da diferença de classe social. As mulheres sempre se jogam de uma ponte depois manterem relações ilícitas. Incrível, não é verdade? ─ Victoria sacudiu a cabeça ─ Eu nunca entendi o motivo das pessoas quererem morrer por amor, mas os fatos falam por si. ─O Sr. Stalbridge não vai acreditar ─ disse Louisa. ─Minha querida Sra. Bryce, realmente, não compreende a natureza dos homens. Eu lhe disse que Stalbridge só está interessado em você, porque pensa que pode ajudá-lo a desmascarar Hastings. Acredite em mim, quando souber que Hastings está morto, sentir-se-á satisfeito e porá fim à sua caça. Não há razão para que se sinta tentado a investigar sua morte. Simplesmente, você não é importante para ele. ─Creio que é você quem corre perigo de julgar mal o Sr. Stalbridege ─ Louisa arriscou ─ Concordo que não esteja apaixonado por mim, mas eu garanto que, independentemente, sentir-se-á obrigado a questionar a minha morte súbita. ─Engana-se, Sra. Bryce ─ Victoria fez uma pausa ─ Sabe? Eu lamento ter que matá-la. ─Você realmente espera que eu acredite em você? ─É verdade. Apesar da sua incrível ingenuidade no que se refere a Anthony Stalbridge, você é uma mulher interessante. Admiro suas realizações como jornalista. Em outras circunstâncias, eu teria gostado de conhecê-la melhor. Tenho certeza de que teríamos muitas coisas sobre o falar. ─Eu duvido. Victoria ignorou. 317


─Infelizmente, por causa de seus esforços jornalísticos, tornou-se um problema para mim. É um fato que suas investigações foram se aproximando mais e mais da verdade. Era só uma questão de tempo que descobrisse a minha verdadeira identidade. Infelizmente, encontra-se na mesma situação que Fiona Risby. Eu tenho medo, que saiba demais, Sra. Bryce. Dificilmente poderei voltar a ocupar meu lugar na alta sociedade, uma vez que Hastings esteja morto, e criar novas oportunidades de investimentos para os cavalheiros dessa mesma sociedade, se uma jornalista do The Flying Intelliger souber que a inconsolável viúva era a antiga proprietária de um bordel.

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Capítulo 46

Marcus colocou as mãos nos quadris e olhou para cima, apertando os olhos, olhando para as janelas iluminadas do piso superior da Phoenix House. ─Você tem certeza de que está aqui? ─ perguntou. ─Não ─ disse Anthony, mas parece o mais provável. A verdade, é que eu não sei mais onde procurá-la. Ambos estavam no beco atrás do bordel. Ele e seu pai usavam vestes adequadas e resistentes que eram utilizadas pelos trabalhadores, que adquiriram apressadamente em uma loja da Oxford Street. Os chapéus enfiados até os olhos completavam o traje. Uma carroça puxada por um cavalo aguardava atrás deles. A noite envolvia a cena. Ele sabia que seu plano, tal como era, só poderia ser definido como desesperado, mas tinha sido incapaz de encontrar outra solução para o problema e sua intuição lhe dizia que não dispunha de tempo. Tampouco poderia imaginar a possibilidade de que Louisa estivesse morta. Esse caminho só conduzia à loucura. ─O mais provável é que não prendam ninguém no andar térreo ─ disse ele ─ Seria óbvio demais. Roberta Woods me disse que o bordel foi construído sobre as fundações de um antigo mosteiro e há algumas celas no porão. Logo, antes de entrar em pânico, eu vou começar a olhar por lá. ─Eu vou trabalhar de cima para baixo ─ disse Marcus. ─Nos encontraremos na cozinha. Marcus parou olhando para ele. ─O que faremos se não a encontrarmos?

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─Não tenho nenhuma intenção de sair de mãos vazias ─ disse Anthony calmamente ─ No mínimo levarei comigo Quinby ou Madame Phoenix. Eu suspeito que um deles poderá me dizer a verdade. Marcus olhou para ele, incrédulo. ─Supondo que concordem em falar com você. Anthony flexionou os dedos de sua mão esquerda. ─Um dos dois vai falar. Marcus olhou para ele e suspirou. ─Muito bem. Eu estou pronto para fazer a minha parte, assim que der o sinal. ─Agora! ─ Anthony exclamou. Marcus dirigiu-se para a traseira da carreta e tateou sob a lona. Pegou uma cesta contendo quatro garrafas com rótulos de um conhaque muito bom. Sem dizer uma palavra, caminhou até a porta dos fundos do bordel. Anthony observou a porta aberta. Uma mulher apareceu com aspecto de estar sobrecarregada. ─Trouxe o conhaque que Madame Phoenix encomendou para seus convidados especiais desta noite ─ disse Marcus, imitando o sotaque da classe trabalhadora. A mulher o olhou perplexa. ─Ninguém me falou nada sobre uma encomenda de conhaque. Marcus deu de ombros. ─Se você não quiser, eu não me importo. Meu chefe disse que no final do mês irá enviar a fatura das garrafas para Madame Phoenix. Talvez ela não se importe em pagar por um conhaque que nunca apareceu. Ela hesitou e abriu a porta. ─Muito bem. Leve o conhaque para o vestíbulo. Beth vai saber o que fazer com ele. 320


Marcus desapareceu dentro da casa. Anthony olhou para o relógio. Ele não teve que esperar muito tempo para ver os primeiros sinais de fumaça, saindo de uma janela parcialmente aberta no andar de cima. Quase imediatamente, se escutaram os gritos de alarme. ─Fogo! O grito veio de dentro do bordel. Apesar de ser difícil ver a fumaça no escuro, Anthony sabia que logo invadiria os corredores da casa, criando pânico. Pouco tempo depois, várias pessoas começaram a sair para o beco pela porta da cozinha, as primeiras foram as cozinheiras e seus aventais furados. Foram seguidas por três moças seminuas. Todos eles se amontoaram, falando em voz alta e olhando as colunas de fumaça que, agora, saí das janelas do andar superior. ─Alguém deveria alertar os bombeiros! ─ Exclamou uma cozinheira. ─Madame Phoenix não vai querer expor os seus convidados ─ disse uma criada com seios proeminentes ─ Aí dentro estão alguns homens muito importantes. ─Sim, mas eu duvido muito que queira que as chamas acabem com o edifício ─ disse alguém. ─Tenho certeza de que não vai demorar muito para sair ─ disse a empregada ─ Devemos deixar que seja ela quem decida o que quer fazer. Saiu fumaça de outra janela. Houve mais gritos na noite. Anthony entrou no prédio pela porta de serviço. Ninguém percebeu e ninguém perguntou-lhe onde ia. Roberta Woods havia desenhado um plano muito básico do estabelecimento, com base na descrição de uma mulher que se chamava

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Daisy. Tinha estudado antes, tentando pensar como se fosse um sequestrador. O lugar mais óbvio para esconder um prisioneiro era o porão. De acordo com a jovem que recentemente fugiu do bordel, Madame Phoenix negou a entrada no porão, a menos que ela mesma ordenasse o contrário. Caminhou pelo corredor, procurando a porta que dava para as escadas que conduziam ao porão. Um homem de meia-idade e aspecto familiar passou por ele. Nervoso e com o rosto vermelho, corria com a camisa desabotoada e gravata, sem o laço, balançando no ar. Anthony abaixou a cabeça e virou o rosto para a parede, mas não havia necessidade de se preocupar de que o Conde de Pembray pudesse reconhecê-lo. Era óbvio que Pembray só pensava em fugir. Pelo que Anthony tinha ouvido falar da formidável Lady Pembray, parecia uma decisão prudente. A grande dama ficaria enormemente contrariada se o nome de seu marido aparecesse na imprensa, relacionado com um incêndio em um famoso bordel. Mais dois homens, parcialmente vestidos e três mulheres trajando túnicas vaporosas, quase transparentes, passaram correndo junto a Anthony. Ninguém prestou atenção nele. Ele encontrou a porta do subterrâneo, justamente onde Daisy havia indicado. Ela estava trancada com chave, como ela tinha avisado. Anthony puxou seu conjunto de ferramentas e começou a trabalhar.

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Capítulo 47

Gritos de alarme, abafados e vagos, fizeram com que Louisa ficasse em pé. Dirigiu-se para a porta da cela e agarrou as barras de ferro. Passos de botas ecoou nos degraus de pedra. Quinby, vestindo seu casaco, saiu da escuridão que envolvia a escada. À luz da lâmpada, seu rosto parecia marcado por linhas sombrias. Em uma das mãos segurava um anel de ferro velho com chaves. Na outra, uma pistola. ─O que é isso? ─ perguntou ela ─ O que está acontecendo? ─Disseram que é um incêndio no andar de cima. Nós não podemos arriscar que os bombeiros encontrem seu corpo aqui. Fariam muitas perguntas. Venha comigo. Vai para o rio agora, em vez de mais tarde. Introduziu a chave na fechadura da porta e girou. A porta antiga abriu com dificuldade, rangendo e chiando em suas dobradiças. Uma ponta de excitação palpitou em Louisa. Um incêndio supostamente trazia caos e confusão. Talvez tivesse oportunidade de atrair a atenção de alguém ou, inclusive, de escapar. A porta se abriu bruscamente. Quinby colocou a arma no bolso do casaco e entrou na cela. Agarrou Louisa pelo braço. ─Depressa! ─ ordenou, arrastando-a ─ Não há tempo a perder. ─Tenho certeza que não espera que eu corra vestida dessa forma ─ disse ela ─ É impossível. Todo mundo sabe que, se uma mulher é forçada a andar muito rápido, suas pernas ficam presas nas saias de seus vestidos. ─Se cair, eu vou arrastá-la ─ jurou Quinby ─ A escolha é sua. E, nem se incomode em gritar. Ninguém vai ouvir.

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De muito pouco serviu sua ridícula advertência. A única coisa que podia fazer era ir com ele e esperar por uma oportunidade. Inclinou-se para a frente, recolheu boa parte de sua saia, com as duas mãos e as levantou até os joelhos. Quinby a tinha presa forte e dolorosamente pelo braço. Com um puxão a empurrou para sua frente. Sua esperança ruiu vendo que era conduzida à porta do compartimento adjacente, e não para a escada. Sua intuição lhe disse que provavelmente não era uma boa ideia. Quinby a estava arrastando pela câmera e introduziu uma chave na fechadura que mantinha a porta fechada. Esta se abriu lentamente, revelando um túnel de pedra, Louisa ouviu ruídos de passos rápidos. Ratos, pensou. Um cheiro horrível que flutuava na escuridão revirou seu estômago. ─Suponho que não poderá entrar aí, sem uma lâmpada ─ disse. Quinby parou furioso. Xingando, deixou cair o pesado chaveiro no chão. Sem deixar de apertar o braço de Louisa, voltou à mesa para pegar a vela. Estava muito próximo de fazê-lo, quando a voz de Anthony ecoou das escadas. ─Solte-a, Quinby. Quinby reagiu imediatamente. Pôs um braço ao redor da garganta de Louisa, enquanto virava-se para Anthony. As costas de Louisa estavam contra o peito de Quinby. Ele a utilizava como um escudo humano. Ele percebeu que tinha levado a arma. O cano da arma não apontava para Anthony, estava cravada em sua têmpora. Ela olhou para Anthony. Estava ao pé da escada, usando botas e roupas pesadas. Ele também sustentava uma arma. ─Afaste-se ─ ordenou Quinby furioso ─ ou, vou dar um tira em sua cabeça. Eu juro que farei isso. 324


─Solte-a, Quinby, e não vou impedi-lo de sair por esse túnel ─ disse Anthony calmamente. ─Ela vem comigo ─ Quinby disse ─ Largue a arma agora, se não quiser vê-la morta. ─Já não precisa dela ─ disse Anthony se aproximando da mesa de madeira ─ Fosse qual fosse, o plano fracassou. Está livre para fugir. ─Fique onde está, ─ a voz de Quinby soava furiosa e instável ─ ou seu cérebro vai espirrar na parede. ─Muito bem. Anthony parou em frente da mesa. ─Coloque a arma no chão e chute-a ─ ordenou Quinby. ─Ela só irá retardar a sua fuga ─ disse Anthony suavemente ─ e terá que correr para salvar a sua vida, porque Clement Corvus sabe que, ultimamente, tem servido a dois senhores. E não gostou nada disso. ─Maldito seja, Stalbridge! ─ seu rosto ficou vermelho de raiva ─ Meu único amo sou eu mesmo! ─Infelizmente para você, Corvus na tem a mesma opinião ─ disse Anthony ─ E, eu duvido que Madame Phoenix partilhe da sua opinião. Para os dois, você não passa de um servo, Quinby. Nada além disso. ─Não sou o maldito servo de ninguém ─ proferiu Quinby ─ Meu pai era um cavalheiro, filho da uma cadela. Apesar de ter nascido na rua, meu sangue é melhor do que Clement Corvus e tão bom quanto o seu. Só porque o meu pai não se dignou a se casar com minha mãe, isso não muda nada. ─Faz muito tempo que é amante de Madame Phoenix? ─Tempo suficiente ─ respondeu Quinby, com voz triunfante ─ Vai casar-se comigo. ─Por que diabos irá querer casar-se com a dona de um bordel? ─Madame Phoenix é Victoria Hastings ─ interveio Louisa. 325


Anthony levantou as sobrancelhas. ─Eu entendo. Quinby sorriu friamente. ─Eu vou casar-me com ela, Stalbridge. Sei que a boa sociedade nunca vai me aceitar, mas aceitará meus filhos e meus netos. ─Se eu fosse você, eu não confiaria que Victoria Hastings mantenha a sua promessa ─ advertiu-lhe Louisa ─ E, certamente não acho que seja uma mulher maternal. Quinby sorriu confiante. ─Ela me ama, precisa de mim. Irá casar-se comigo. ─Realmente, você não acredita nisso, não é verdade? ─ disse Anthony disse ─ Se acredita, então é porque é um estúpido. ─Dizem que um cavalheiro sangra tão facilmente quanto um bastardo ─ Quinby apontou para Anthony com sua pistola ─ Vamos ver se é verdade. Louisa ouviu o som assustador de metal contra metal. Quinby tinha engatilhado sua arma, certamente consciente de que Anthony nunca atiraria enquanto ela estivesse entre eles. Terror se apoderou dela. Tudo estava acontecendo depressa demais. Fez a única coisa que lhe ocorreu. Jogou-se com todas as suas forças para trás. Quinby havia concentrado toda sua atenção em Anthony. A mudança repentina de peso o pegou desprevenido. De maneira inflexível apertou a garganta de Louisa com seu braço, sufocando-a. Ao mesmo tempo, deu dois passos rápidos para trás, lutando para manter o equilíbrio e apontar para o seu alvo, mas o peso de Louisa, combinado com a saia volumosa de seu vestido, puderam mais que ele. Quinby perdeu o

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equilíbrio, arrastando Louisa consigo. Foi atravessada por uma pontada de dor quando seu ombro chocou-se contra a pedra rígida. A arma disparou, deixando-a surda. Vagamente, ouviu a bala ricocheteando nas paredes de pedra. Anthony interveio rapidamente. Com um pontapé jogou para longe a arma que Quinby sustentava em sua mão. A arma deslizou sobre o chão. Quinby grunhiu e soltou Louisa para pegar o tornozelo Anthony com ambas as mãos e torcê-lo violentamente. Anthony perdeu o equilíbrio, caindo sobre Quinby. Louisa virou sobre si mesma, saindo do caminho. Golpes secos e alarmantes de punhos golpeando a carne soavam em seus ouvidos. Cambaleando, se pôs de pé e caminhou até a arma mais próxima. Da escadaria de pedra chegou um eco de passos. Estima que, provavelmente, não teria tempo para pegar a arma. Mesmo que pudesse se apossar dela, não tinha certeza de saber como usá-la. Mudou de rota e recolheu o anel de ferro com chaves que Quinby havia jogado ao chão, e correu. Chegando perto da escada, pressionou suas costas contra uma das paredes de pedra ao lado. As saias de um vestido preto e a ponta de uma bota elegante apareceram no vão da escada. Victoria parou e viu os dois homens presos em um combate mortal. Uma pequena pistola de cano curto brilhou em sua mão enluvada de preto. Calculou imediatamente a situação, e com a mesma rapidez, esqueceu-se de Anthony e Quinby. Virando-se, olhou para a porta semiaberta da cela. ─Apareça, Sra. Bryce. Há um incêndio no edifício. Temos que sair imediatamente ─ engatilhou a arma e apontou para a entrada da cela ─ Está me ouvindo? Saia imediatamente. Você não vai querer morrer carbonizada. 327


Quando não recebeu nenhuma resposta do interior da cela, Victoria deu uns passou adiante, afastando-se das escadas. Louisa afastou-se da parede de maneira apressad, balançando o anel de ferro pesado com todas as suas forças. No último instante, Victoria sentiu um movimento atrás de si e começou a virar-se, mas já era tarde demais. O anel de ferro golpeou sua cabeça, logo acima da orelha direita. Gritando de dor, caiu sustentando-se sobre um joelho. O sangue escorria por um lado de seu rosto. Com os olhos cegos de raiva, apontou o cano da arma para Louisa. Incapaz de pensar em qualquer outra coisa, Louisa a golpeou uma segunda vez. Victoria desabou no chão de pedra. Desta vez, não se moveu. "Da mesma forma como Lord Gavin." Louisa se virou. Os dois homens continuavam lutando furiosamente. Enquanto assistia, Quinby sacou uma faca. Horrorizada, correu em direção a eles, mas Anthony, que tinha notado o novo perigo, soltou Quinby e se afastou dele, rolando. Quinby levantou-se e jogou-se contra ele, empunhando a faca. A mão de Anthony agarrou a coronha de uma das armas. Apontei, levantou e atirou. Quinby balançou violentamente, caindo para trás até bater na parede. A faca caiu no chão. ─Canalha! ─ Quinby olhou fixamente para Anthony, cada linha do seu rosto de era tingida de puro ódio ─ Você arruinou tudo. Tudo. Segurando o ombro ferido com a outra mão, ele se virou, e cambaleando desapareceu na escuridão do túnel. A sala ficou em silêncio. Louisa correu para Anthony. ─Você está bem? ─ Ele perguntou, com o fulgor da luta ainda brilhando em seus olhos. 328


─Sim ─ ela sussurrou ─ E você? ─Sim. Ele levantou-se e olhou para Victoria. Louisa seguiu seu olhar. O sangue tingia os cabelos loiros de Victoria, formando uma poça no chão de pedra. Mais uma vez, a imagem de Lord Gavin, sangrando e morto, apareceu diante de Louisa, retorcendo seu estômago. Abriu a boca para recuperar o fôlego. Não poderia ficar doente, pensou, ainda não. ─Ela está morta? ─ Louisa perguntou. ─Eu não sei. Anthony atravessou a sala e se agachou ao lado de Victoria. ─Está viva ─ anunciou ─ Você não matou. As contrações no estômago cessaram milagrosamente. Louisa respirou profundamente. ─E, Quinby? ─Agora é o problema de Clement Corvus. Anthony rasgou o tecido de uma das anáguas de Victoria e o utilizou para amarrar-lhe os pulsos. Repetiu o procedimento com os tornozelos. Novamente, se ouviram mais passos descendo as escadas, desta vez de botas pesadas. Louisa sentiu um arrepio e virou-se para enfrentar o intruso da frente. Anthony apontou o cano da arma para a escada. Era Marcus Stalbridge. Ele sorriu de orelha a orelha ao ver Louisa. -─Ah! Vejo que você a encontrou. Vamos, então?A polícia e bombeiros chegarão em breve. Será melhor que ninguém veja a Sra. Bryce deixando um bordel ─ piscou para Louisa ─ Não que fosse impossível resolver o problema, caso se apresentasse, é claro. ─Minha capa ─ disse Louisa ─ Está na cela.

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Anthony desapareceu no pequeno aposento. Ao sair, levava a capa de Louisa na mão. Colocou-a sobre seus ombros, cobrindo-a da garganta aos pés e ajustou o capuz para que ocultasse seu rosto. ─Vamos, querida ─ disse baixinho ─ Já está na hora de deixar este lugar. Eu acho que, por hoje, mesmo uma jornalista intrépida como você, vai querer fazer uma pausa. "Querida?" Uma maneira de falar, sem dúvida, pensou, subindo as escadas rapidamente, atrás de Marcus. Não havia tempo para pensar nessa suave ternura. Chegando ao vestíbulo vazio, Louisa viu uma estranha e inodora coluna de fumaça branca, flutuando misteriosamente no ar. ─Eu não vejo as chamas. ─Porque não há nenhuma ─ disse Marcus, rindo ─ Veja você, no Teatro Olimpia, os estábulos não podem incendiar, então eu tive que procurar alternativas. ─Não estou entendendo. ─Explicarei mais tarde. ─Leve-a para o coche, senhor ─ disse Anthony ─ Eu quero dar uma olhada nnos aposentos privados de Madame Phoenix, antes da polícia chegar. Parou por um tempo suficiente para beijar Louisa apaixonadamente na boca. Antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, Anthony desapareceu pelas escadas. ─Vamos, querida. Marcus a escoltou através da porta de serviço, para a rua, onde os gritos e o caos encheram a noite. Nenhuma das pessoas que lotavam o beco, repararam neles.

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Poucos minutos depois, Marcus a encaminhou para um beco perto de onde um coche fechado os esperava. A porta do veículo se abriu, e surgiu uma mulher envolta em uma capa. ─Depressa! ─ pediu Clarice com sua voz cheia de emoção ─ Temos que tirá-la daqui, Sra. Bryce. Não queremos correr o risco que possa ser vista por alguém da imprensa. Você sabe como são estes correspondentes, quando se trata de uma história fascinante e chocante em que estão implicadas pessoas que circulam na alta sociedade. Atordoada, Louisa entrou no coche. Ao sentar-se, percebeu que Clarice não estava sozinha. Georgiana Stalbridge ocupava o banco da frente. Ela também, estava coberta da cabeça aos pés com uma capa. ─Graças a Deus você está segura ─ disse Georgiana ─ Temos estado tão preocupadas ... Você sofreu algum dano, querida? ─Não ─ conseguiu dizer Louisa ─ Eu estou bem. De verdade. ─Que alívio! ─ respondeu Georgiana. Olhou para Marcus enquanto ele entrava no coche ─ Onde está Anthony? ─Ele ficou para trás para dar uma olhada antes que a polícia chegue ─ disse Marcus ─ Vai encontrar-se conosco em casa. O coche começou a andar com um ruído surdo. Alternadamente, Louisa olhou para Clarice, Georgiana e Marcus. Na obscuridade do interior apagado da carruagem, era difícil ver a expressão em seus rostos. ─Eu não entendo ─ disse olhando Georgiana ─ O que você e Clarice estão fazendo aqui? Sei que Anthony deve ter se sentido na obrigação de me salvar, e foi muito gentil da sua parte, senhor Stalbridge, ajudá-lo ... mas, certamente não havia necessidade de você e Clarice correrem o risco de serem vistas perto da Phoenix House. Georgiana se inclinou e afagou-lhe a mão. 331


─Clarice e eu nos recusamos a ficar em casa, enquanto a futura esposa de Anthony estava em perigo. Nesta família, permanecemos unidas. "A futura esposa de Anthony." Horrorizada, Louisa a olhou fixamente. ─Eu temo que tenha havido um terrível mal entendido. ─Tenho certeza de que não é este o caso ─ rebateu Clarice, muito feliz ─ Agora, vamos para casa e relaxar bebendo uma taça de conhaque, enquanto esperamos por Anthony.

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Capítulo 48

A porta no final do corredor estava fechada. Todas as outras foram deixadas abertas durante a fuga dos funcionários e clientes. Anthony parou no patamar. Sua intenção era subir diretamente ao piso superior, onde se encontravam os aposentos privativos de Madame Phoenix, porém a porta fechada chamou a sua atenção. Ele caminhou pelo corredor e parou. Segurando a arma firmemente, deteve-se diante da porta e experimentou a maçaneta, que girou com facilidade em sua mão. Abriu, empurrando-a com a ponta da bota, mantendo-se fora da linha de tiro, se fosse o caso. Nenhum tiro veio de dentro do quarto. Em vez disso, ele escutou o som frenético de sussurros, seguido de um gemido insistente. Esquadrinhou o quarto. As paredes estavam cobertas de veludo preto. Uma variedade de chicotes e outros instrumentos extravagantes estavam exibidos em uma caixa de vidro situada em um canto. Encontrou Elwin Hastings deitado de barriga para cima, em uma cama forrada de lençóis de seda preto, os com punhos e tornozelos acorrentados as colunas da cama. Ele estava nu e amordaçado. Ao ver Anthony, o alívio substituiu o medo que se lia em seus olhos. Voltou a gemer. Anthony foi até a cama e tirou a mordaça. Elwin gaguejou de indignação. ─Stalbridge. Eu não o reconheci com essas roupas. Que diabos está ...? Não importa. Pensei que ela estivesse voltando para me matar. Liberteme. Depressa. Eu ouvi os gritos. Há um incêndio. -Não há incêndio nenhum ─ disse Anthony. 333


─De qualquer forma, eu tenho que sair daqui. Você não entende, ela está tentando me matar ─ fez uma pausa, finalmente reparando no revólver que Anthony segurava ─ O que você está fazendo com isso? ─Encontrei com sua esposa e seu amante, há uns instantes. As coisas ficaram um pouco complicadas. Os olhos de Elwin se arregalaram. ─Você já encontrou Victoria? ─Sim. A polícia não tardará a chegar aqui. Há um tal Sr. Fowler Sr., da Scotland Yard, que vai querer falar com você. Lembra-se de Fowler, não é? É o homem que investigou o suicídio de sua esposa e Fiona Risby. Eu soube que se recusou a cooperar da última vez que ele tentou entrevistá-lo. Os olhos de Elwin estavam esbugalhados. ─Olha, eu não sei o que você quer dizer, Stalbridge, mas você tem que me ajudar. ─E, por que eu faria uma coisa dessas? ─Maldito seja! Como você pode me perguntar isso? Nós dois somos cavalheiros. E, os cavalheiros têm a obrigação de proteger um ao outro. ─Curiosamente, curiosamente, eu não sinto nenhuma obrigação em relação a você. Minha única responsabilidade neste assunto é assegurar-me que se faça justiça, no assassinato de Fiona Risby, e é isso que eu pretendo fazer. ─Está louco se pensa que pode provar que eu a matei. Anthony colocou a mão no bolso de seu áspero abrigo, e tirou um saco de veludo verde. Abriu, deixando que o colar Fiona escorregasse sobre a palma de sua mão. As pedras brilhavam com a ajuda das centelhas do fogo, da luz do aplique preso na parede. A surpresa deixou Elwin sem palavras. ─Então, eu estava certo. O ladrão era você. 334


─Digamos que eu o recuperei do seu cofre forte. Tenho esperado o momento certo para que o encontrem. Acho que hoje é um bom momento. Voltou a guardar o colar na bolsa e puxou o cordão dourado. ─O que você está fazendo? ─ gritou Elwin. Anthony não respondeu. Atravessou a sala, e aproximando-se do casaco preto de Elwin pendurado em um gancho fixado na parede, colocou o saco em um bolso. ─Não vai funcionar, canalha! ─ Elwin gritou ─ Eu vou dizer à polícia que foi você quem o colocou aí. Será a palavra de um cavalheiro contra outro. Não investigaram nada. Anthony sorriu. ─Felizmente, nós também teremos o veredicto dos tabloides. Pense no que dirão as notícias dos jornais e revistas. Sua esposa, supostamente morta, dirige um dos bordéis mais famosos de Londres, e você despido em um dos quartos. Sem contar que, também tem interesse financeiro em um estabelecimento de má reputação. ─Feche essa boca maldita! ─Creio que podemos antecipar que quando a polícia chegar, a primeira Sra. Hastings vai ficar muito satisfeita em acusá-lo de tentar matála no ano passado. Some-se a isso, a descoberta, em sua posse, do colar de uma mulher morta e eu acho que nós poderemos concluir, com toda certeza, que o peso da opinião pública vai estar do lado da justiça. ─Filho da puta. Você não pode fazer isso. ─Inclusive, se a polícia não acusá-lo de assassinato, você é um homem arruinado Hastings. Na melhor das hipóteses, será forçado a sair do país. Nenhum clube vai aceitá-lo. Nenhuma das senhoras da alta sociedade vai enviar-lhe um convite. E, agora, que se provou ser um bígamo, sua segunda esposa está livre para abandoná-lo. Disseram-me que seu avô é um 335


excelente homem de negócios, e que tomou medidas para proteger os interesses econômicos de sua neta, antes do casamento. Quando Lilly deixá-lo, levará a sua herança com ela. ─Como você ousa me ameaçar? ─ o rosto de Elwin se contraiu ─ Você deveria estar morto. Ouviu bem? Deveria ter morrido na noite em que eu o segui do clube até sua casa, e eu estive prestes a matá-lo. Se não fosse para o nevoeiro e o truque que fez com seu casaco ... Harold Fowler apareceu na porta, um policial atrás dele. ─Sr. Crawford, anote os comentários do Sr. Hastings relativos à sua intenção de assassinar o Sr. Stalbridge. ─Sim, senhor. O agente pegou um lápis e um bloco de notas do bolso. Anthony olhou para Fowler. ─Vejo que recebeu minha mensagem. ─Sim. Esperamos até que seu pai abandonasse o prédio, acompanhado por uma jovem coberta com uma capa, da forma como foi sugerido. Elwin olhou Fowler com desespero em seus olhos. ─Eu posso explicar tudo. ─Não haverá muito tempo de sobra para explicações, senhor. Fowler olhou para Anthony. ─Também quero falar com você. ─Claro ─ Anthony assentiu ─ Eu estou a sua disposição, detetive. É possível que também esteja interessado em falar com a falecida Victoria Hastings. A última vez que a vi, estava inconsciente no porão. Com sorte, ainda deve estar lá. As sobrancelhas grossas de Fowler subiram. ─Compreendo. Este caso parece ser um pouco complicado. 336


─Não ─ disse Anthony ─ É simples. Tinha razão, detetive. Quando se trata de cometer um assassinato, só existe um pequeno número de razões. A ganância, a vingança, a necessidade de esconder um segredo e a loucura. Neste caso, parece ter sido um pouco de tudo.

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Capítulo 49

Dois dias depois, Louisa estava lendo o artigo no The Flying Intelligencer, sentada à sua mesa. Como de costume, o Sr. Spraggett tinha escolhido um título criado para captar a atenção de uma enorme variedade de leitores. Na realidade, vários títulos. Spraggett nunca se limitava a uma manchete sensacional, quando poderia usar duas ou três:

O ASSASSINATO MAIS HORROROSO OCURRIDO NA ALTA SOCIEDADE. OS SANGRENTOS ACONTECIMENTOS OCORRIDOS EM UM BORDEL. DETIDOS VÁRIOS MEMBROS DA ALTA SOCIEDADE. ESPOSA DESAPARECIDA VOLTA DE SEU TÚMULO FLUVIAL.

Por I. M. PHANTOM

A notícia da recente prisão do Sr. Elwin Hastings, acusado do assassinato de uma jovem senhora, Fiona Risby, ocorrido um ano atrás, e da tentativa de assassinato de sua primeira esposa, Victoria Hastings, suposta autora de seu próprio suicídio, causou consternação nos círculos seletos da alta sociedade. Quando as autoridades descobriram o Sr. Hastings em um bordel, encontraram-no na posse de um valioso colar que pertenceu à jovem assassinada, Srta. Risby. A primeira esposa de Hastings, Victoria, que foi por muito tempo considerada morta, também estava no prédio. Os leitores irão se surpreender ao saber que a primeira senhora Hastings é proprietária do famoso estabelecimento de Winslow Lane, 338


conhecido como Phoenix House, do qual seu marido é sócio e cliente habitual. No momento da descoberta, a Sra. Hastings estava atordoada e sangrando, em consequência de um ferimento na cabeça. De acordo com testemunhas, padecia de um agudo ataque de nervos. Ao ver o seu marido, a primeira senhora Hastings foi acometida de um violento ataque de raiva. Acusou o Sr. Hastings de ter tentado matá-la, jogando-a no rio. Atribuiu sua salvação à sorte. Além do Sr. e Sra. Hastings, se diz que havia outro homem, supostamente envolvido em atividades criminosas, no local dos acontecimentos. O homem desapareceu antes que as autoridades pudessem interrogá-lo ...

Bateram à porta. Louisa deixou o jornal e ouviu a Sra. Galt atravessando o hall de entrada. A porta se abriu. Reconheceu a voz de Anthony. ─Não se preocupe, Sra. Galt. Eu sei o caminho para a biblioteca. ─Vou colocar a chaleira no fogo ─ disse a Sra. Galt. Louisa ouviu os passos de Anthony se aproximando da biblioteca. Um pequeno familiar estremecimento de ansiedade e emoção oprimiu seu estômago. Ele entrou na aconchegante biblioteca com um pacote embaixo do braço. ─Bom dia, meu amor ─ disse ele, aproximando-se da mesa ─ Espero que não tenha interrompido nada. ─Não ─ ela disse rapidamente ─ Estava lendo o jornal da manhã. ─O excelente artigo de I. M. Phantom sobre os assassinatos recentes ocorridos na alta sociedade, suponho. ─Sim, é. 339


─Notícias surpreendentes ─ Anthony colocou o pacote sobre a mesa, foi até ela e a levantou da cadeira ─ Tão incrível, que se tornam uma leitura fascinante. Ele a beijou apaixonadamente. Louisa rodeou-lhe o pescoço com os braços e se abandonou. Quando Anthony finalmente separou-se dela e olhou para ela, com um brilho familiar de desejo em seus olhos, ela ficou vermelha e reposicionou seus óculos pequenos. ─Você já teve mais alguma notícia do Sr. Fowler? ─ perguntou, sentando-se muito rapidamente. Ele respirou fundo e sentou-se em uma das poltronas de leitura. ─Esta, segundo parece, é uma das grandes dificuldades que surgem quando alguém começa um romance ilícito com um membro da imprensa. Ela olhou para ele com surpresa. ─O que você está falando? Ele fez um gesto impotente. ─As últimas notícias, rumores e fofocas vêm sempre em primeiro lugar. ─Ah! Você sabe muito bem que isso não é verdade. Beijou-me antes que eu tivesse a chance de perguntar como tinha sido o seu encontro com Fowler. O apontou um dedo. ─Só porque aprendi que eu tenho que mover-me rapidamente quando se trata de você ─ disse Anthony. Ela juntou suas mãos sobre a mesa. ─Bem? ─Duvido que as coisas acabem tão bem quanto se poderia desejar, mas mesmo assim, alguma justiça será feita ─ Anthony esticou as pernas e relaxou na cadeira ─ No momento, não há nenhum indicio sobre o 340


paradeiro de Quinby, mas Fowler não parece muito preocupado. Confessou-me, sigilosamente, que espera que Clement Corvus se ocupe dele. Ela respirou com dificuldade. ─Pobrezinho! Olhos de Anthony endureceram. Não precisa sentir pena de Quinby. Pois, ele não hesitou em sequestrá-la. Ele sabia muito bem que Victoria Hastings planejava jogá-la no rio. Na verdade, ia usá-lo para realizar a ação. ─Sim, acho que isso é verdade. No entanto, não posso deixar de sentir alguma pena por este pobre homem. Deve ter sido terrível para ele viver uma vida privada dos privilégios que ele teria desfrutado se o pai o tivesse reconhecido. ─Você tem um coração muito mole, querida. Enquanto Quinby, não deveria ter cometido o erro de irritar Clement Corvus. ─Qual a situação do Sr. e da Sra. Hastings? ─Segundo Fowler ainda estão trocando acusações e oferecendo provas da culpabilidade do outro. Enquanto isso, diz-se que a segunda Sra. Hastings se mudou para a casa de seus pais e, em breve apresentará um pedido divórcio baseada na bigamia de seu marido. Seu avô já retirou todo o dinheiro de Hastings. Para amenizar o escândalo, há rumores que em breve Lilly se casará, discretamente, com um jovem de sua escolha. Suspeito que seja o mesmo jovem que levou ao seu quarto na noite em que abri o cofre de Hastings. ─Fico muito feliz por ela. E Hastings? ─Segundo os boatos que circulam nos clubes, Hastings não tardará em encontrar-se na miséria. Claro, fundos de investimento dissolveram-se.

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Mesmo que não seja enforcado, será completamente destruído, excluído para sempre do único mundo que realmente importa para ele. ─A boa sociedade. ─Sim. ─Eu me pergunto o que será de Victoria Hastings. ─Fowler está convencido de que Victoria é louca e provavelmente vai acabar em um asilo. ─Hum ...! Anthony a olhou com curiosidade. ─Você não acredita que seja não é? ─Não me surpreenderia que tivesse dissimulado se acredita que com isso possa salvar o seu pescoço. ─Eu lhe asseguro, que se não estiver louca, acabar trancafiada em um asilo, é um destino muito pior do que dizer a verdade. Louisa estremeceu. ─Eu não duvido. ─Eu tenho mais uma coisa a dizer ─ Anthony disse calmamente. ─Sim? ─Esta tarde encontrei com Julian Easton, no meu clube. ─Oh! Como foi? ─Estava muito abatido. Na verdade, me pediu desculpas. Você estava certa. Parece que se sentia culpado pela morte de Fiona. Na noite em que ela morreu, tinha ido ao jardim para encontrar-se com ele. Eles haviam marcado um encontro, mas Fiona cruzou com o Sr. e Sra. Hastings antes de Easton se juntar a ela. Quando chegou ao lugar do encontro, ela já não estava. Louisa suspirou. ─Que trágico! 342


─Isso é tudo o que tenho para lhe informar ─ disse Anthony ─ Sugiro que iniciemos outro assunto mais interessante. Ela o olhou com curiosidade. ─Qual? ─Nós, é claro. Ela piscou, paralisada, e então rapidamente tirou os óculos. ─Justamente, eu queria falar sobre o mesmo assunto ─ tirou um lenço do bolso e, às pressas, começou a limpar uma mancha imaginária em uma das lentes de seu óculos ─ Temo que sua família tenha uma impressão completamente errada e infeliz natureza da nossa relação. Ele apoiou os cotovelos sobre os antebraços da cadeira e cruzou as mãos no ar. ─Acham que vou casar com você. ─Sim, eu sei ─ Louisa recolocou seus óculos e olhou para ele ─ Tentei esclarecer o mal-entendido, na outra noite quando saímos Phoenix House e prosseguimos o caminho para sua casa, mas eles não me quiseram ouvir. Ele sorriu. ─Com o tempo, você vai descobrir que, uma vez que colocamos uma ideia na cabeça, meus familiares tendem a ser decididamente teimosos. Eu tenho medo que seja uma característica da família. Ela se inclinou para frente, nervosa. ─Isso é muito desconfortável para mim, Anthony. Não me parece certo deixar que acreditem em uma mentira tão descarada. ─Então, temos que converter isso em realidade. ─O que diabos você está falando? ─ Ele se levantou da cadeira, caminhou ao redor da mesa e colocou Louisa de pé uma segunda vez ─ Anthony, por favor, você não pode resolver este problema me beijando. 343


─Eu amo você, Louisa. Sentiu como se o chão se abrisse sob seus pés. ─O quê? ─Eu amo você ─ ele repetiu, desta vez mais gentilmente ─ É tão difícil de acreditar? Louisa não conseguia respirar. ─Mas, nos conhecemos há tão pouco tempo, e há coisas que você não sabe e que provavelmente, faria você mudar sua opinião sobre mim. ─Duvido sinceramente ─ Anthony pegou suas mãos e beijou seus dedos ─ Eu vou lhe dar todo o tempo necessário para você se apaixonar por mim. Tudo o que eu peço em troca, é que me prometa que vai pensar seriamente sobre a minha proposta de casamento. ─Não preciso de tempo ─ disse Louisa e com confiança e sem pensar ─ Eu estou apaixonada por você. Só que o casamento é totalmente impossível. Ele soltou suas mãos, pegou o pacote que havia deixado sobre a mesa e deu para ela. Hesitante, sem saber mais o que fazer, ela começou a desamarrar as fitas com as mãos trêmulas. ─Já sei que você gosta muito de relações ilícitas ─ ele começou a dizer enquanto assistia como se desfazia do papel marrom ─ Eu admito que não posso garantir que o casamento irá fornecer o mesmo grau de emoção, mas, na minha opinião, seria muito mais confortável. ─Não, realmente, não seria ─ disse ela, lutando contra as lágrimas ─ Nem um pouco. ─Só acho que poderíamos compartilhar uma cama quente a cada noite, em vez de ter que nos contentar com as mesas de jardineiro e momentos roubados. Poderíamos tomar café juntos todas as manhãs,

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enquanto saboreamos os últimos e brilhantes artigos do The Flying Intelligencer. ─Antohony, chega. Você não sabe o que diz. O pacote foi aberto. Ela olhou de boca aberta, a cópia encadernada em couro, do livro “Paraíso Perdido”, de Milton. ─Oh, Anthony! ─Não se preocupe. Eu não o roubei do cofre forte de Pepper. Ele concordou em renunciar a ele. Era só uma questão de encontrar o preço certo. Ela acariciou a capa de pele manchada com a ponta dos dedos. ─Eu não sei o que dizer. ─Diga que você vai se casar comigo, querida. Eu prevejo que todas as dificuldades que você antecipar, em relação a minha família, deixarão de existir. Ela sentiu um nó enorme, que oprimia seu coração. Lágrimas transbordaram de seus olhos e correram pelo seu rosto. Tirou os óculos, pegou um lenço e começou a secá-las rapidamente. Sabia que esse momento iria chegar, se lembrou. Só queria um pouco mais de tempo para desfrutá-lo. ─Isso é o que acontece com as aventuras ilícitas ─ Ela baixou o lenço e olhou para ele através de lágrimas ─ Não podem acabar bem. ─Há sempre exceções à regra. ─Este não é um daqueles momentos em que você pode fazer uma exceção. ─Por que não? ─Há um segredo no meu passado, tão terrível, que se você soubesse ficaria horrorizado. Eu não posso impô-la a sua família. Não seria correto. Ele a olhava com divertimento. 345


─Eu não posso imaginar que você tenha um segredo de semelhante magnitude. Não deveria dizer nada, pensou. Se tivesse um mínimo de bom senso, instinto de sobrevivência manteria a boca fechada e pediria que se fosse. Mas, ela o amava. Não poderia despedir-se com uma mentira. ─Anthony, eu sou a mulher que assassinou Lord Gavin. ─Sim, eu sei ─ ele respondeu casualmente ─ Bem, sobre a minha proposta ... Louisa olhou para ele com espanto. Talvez ele não tenha ouvido bem. ─Você sabe? ─ conseguiu dizer. ─Deduzi há alguns dias ─ Seus olhos brilhavam com alegre impaciência ─ E, agora podemos voltar ao assunto da minha proposta? ─Você não entende! ─ Louisa afastou-se, colocando-se atrás da cadeira e apertando o encosto com tanta força, que cravou as unhas na madeira ─ Anthony: Eu o golpeei na cabeça com o atiçador. Ele era um cavalheiro muito importante. ─Ninguém parece estar sentindo a sua falta. Tenho a impressão que, se você ainda não sabe, a viúva de Gavin e outros membros da família estão muito agradecidos a você, em particular. Para não mencionar o restante das mulheres que você salvou a vida. Gavin era um homem cruel. ─Essa não é.....a questão. Eu sou procurada por assassinato. Se a polícia me encontrar, um dia, serei presa. Pense no escândalo. ─Ninguém a procura pelo assassinato. No que se refere à polícia, você cometeu suicídio, lembra-se? ─Mas ... ─O caso está encerrado. Ninguém está procurando por você, meu amor. 346


─E se, algum dia, alguém me reconhecer? ─É muito pouco provável, mas se assim for, eu e minha família, ficaríamos feliz em cometer perjúrio, no assunto de sua identidade. Quando você se casar comigo, você vai irá se tornar uma Stalbridge. Nós protegemos os nossos ─ Ele sorriu com aquele sorriso fleumático, e cúmplice ─ Confie em mim quando eu digo a você que ninguém jamais iria contradizer-nos. ─É verdade ─ disse Emma da porta ─ Louisa, minha querida, eu acho que disse a você, quando tudo começou, que os Stalbridge podem se dar ao luxo de ignorar boa parte da sociedade, porém a sociedade não pode ignorá-los. A família tem o tipo de conexões e dinheiro que torna as pessoas invulneráveis. Você estará a salvo com eles. Louisa a olhava, e as diminutas e quentes brasas de esperança que tinha mantido enterradas dentro dela, de repente se reavivaram fortemente, como labaredas. ─Oh, Emma. Você realmente acha isso? Emma riu. ─Confio, claro, que quando você for uma mulher casada, encontrará tempo para me ajudar a terminar minhas memórias. Nós estávamos chegando às partes mais emocionantes, como você se lembra. ─É claro ─ disse Louisa, sorrindo com os olhos úmidos. Louisa virou-se para Anthony. ─Tem certeza que é isso o que você quer? ─Isso é mais do que uma questão de querer ─ Ele puxou-a para ele ─ Eu preciso de você, meu amor. Você e eu somos as duas metades de um todo. Eu acho que nós fomos feitos um para o outro. Uma onda de felicidade tomou conta dela. Louisa rodeou o pescoço com os braços, e o apertou. 347


─Sim ─ disse simplesmente. ─ Bem-vinda à família. Anthony a beijou. Louisa se abandonou ao amor, onde ambos estariam seguros no futuro.

FIM

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Resenha bibliográfica

AmandaQuick Nascida em 1948, em Seattle, foi bibliotecária e licenciada em História. Tanto

se

diverte

escrevendo

romances

históricos, com o pseudônimo de Amanda Quick, ou contemporâneos

como

Jayne

Ann

Krentz,

ou

futurísticos como Jayne Castle. Escreve fascinantes histórias de amor entre homens e mulheres fortes e inteligentes. Com seu senso de humor único, sexo e suspense romântico, reuniu uma legião de leitoras leais ao longo dos anos. Seus mais de quarenta títulos já foram traduzidos em numerosos idiomas e já vendeu mais de vinte e cinco milhões de exemplares em todo o mundo.

CRÍTICA "A incomparável Quick (também conhecida pelo seu nome verdadeiro, Jayne Ann Krentz) reescreveu um romance de suspense excelente romântico, cheio de diálogos espirituosos, humor e ação em pleno andamento." Booklist O interesse dos leitores de Quick é capturado a partir da primeira linha com um enredo engenhoso, o suspense de forma constante e forte sensualidade, combinadas em um conto de intriga que revela o submundo

de

Londres

na

época

vitoriana.

Personagens

são 349


inesquecíveis e nos fazem querer explorar segredos sombrios, soltando nós e ajudá-los a resolver o crime.'' Romantic Times "Um grande suspense romântico. Como todos os romances de Quick, este livro é realista, porque os personagens, que de outra forma não se encaixam no molde que a sociedade procura impor. Uma história encantadora, com muita ação e algumas surpresas. "

Ebooks distribuídos sem fins lucrativos e de fãs para fãs. A comercialização deste produto é estritamente proibida

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