Museu do Oriente

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O museu que veio do frio

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Por fora um volume quase cego, uma massa imponente, um marco à beira Tejo. Por dentro um contentor negro, uma dimensão diferente, um contraste de cor, de l uz, de sensações. João Luís Carrilho da Graça adaptou um armazém frigoríco a espaço museológico e assim nasceu o Museu do Oriente. A T raço convida-o a visitá-lo

Texto de Ana Rita Sevilha

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Fotos de Hugo Gamboa

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o dar de caras com o edifício existente, puro e duro, a opinião era unânime: “é impossível que isto se transforme num museu!”. Mas nasceu, é hoje uma espaço museológico fantástico, e uma peça de arquitectura que de uma forma sublime se adequou às novas funções. Um projecto que contou com o desenho exímio de João Luís Carrilho da Graça. A Traço dá-lhe as boas vindas ao Museu do Oriente. De frigorífico a museu Parece quase surreal, um cenário para lá do que a nossa mente consegue conceber, mas é real. O volume à beira Tejo plantado, que hoje alberga o Museu do Oriente foi em tempos um armazém frigorífico de bacalhau e de frutas, e aí reside grande parte do desafio. “Conceber um museu é uma oportunidade única para confrontar o carácter substantivo do espaço com a intangibilidade da cultura e do conhecimento”, lê-se no livro lançado pela Fundação Oriente relativo ao

projecto de arquitectura do museu. Para criar um espaço que tem como objectivo dar a conhecer, “o arquitecto ordena o espaço, organiza percursos, orienta a luz, exibe conteúdos e assegura a sua protecção e a sua conservação”, refere o mesmo documento. Esta foi também a oportunidade para reflectir sobre uma questão paradigmática: “o contentor arquitectónico como suporte neutro e silencioso, virtualmente inexistente, garante da afirmação e da exaltação de um conteúdo, versus a obra arquitectónica per se, que se auto-exibe, para a qual o conteúdo não é muito mais que um mero pretexto”. O objectivo? 쏡쏡쏡쏡쏡

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Albergar uma colecção centrada numa temática comum: o Oriente. O lugar? Uma pré-existência, o Edifício Pedro Álvares Cabral, uma construção portuária do início dos anos 40, implantado na Avenida Brasília, em Lisboa, classificado como património municipal e destinado durante a maior parte da sua existência a armazenar bacalhau. Métrica obsessiva Com uma volumetria dominante naquela zona da cidade – composta por uma grande superfície e seis pisos de altura – é característica do edifício a quase inexistência de fenestrações, bem como uma organização longitudinal e simétrica que assenta num corpo central ladeado por duas alas mais baixas. Interiormente, uma densa e obsessiva estrutura de pilares de planta quadrada estende-se ao longo do volume e repete-se nos vários pisos. Um cenário desafiador para Carrilho da Graça, uma vez que entre outras condicionantes o edifício tinha já estabelecido aspectos estruturantes da sua organização. Mas o desafio não ficou por aqui, à estrutura juntava-se um baixo pé-direito que era inadequado à generosidade espacial exigível para um espaço desta natureza, e a “irreversível substituição de alguns pilares por suportes horizontais”, lê-se no livro da Fundação Oriente sobre o museu. Para acrescentar ao leque de dificuldades e condicionantes o encerramento dos alçados levantava dificuldades acrescidas no que diz respeito à iluminação e ventilação. Com o objectivo de conciliar a identidade arquitectónica do edifício com o novo uso que iria receber, a procura de Carrilho da Graça foi no sentido de reesclarecer a estrutura organizativa do mesmo. 쏡쏡쏡쏡쏡 2 2

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E nasceu um museu Numa visita guiada pelo Museu do Oriente a Traço pode constatar diante de visitantes e funcionários que hoje a opinião é generalizada, o Museu do Oriente alberga uma colecção fantástica, e João Luís Carrilho da Graça fez um trabalho notável. Não há quem não fique indiferente à forma como a métrica de pilares se encaixa no espaço expositivo de uma forma sublime e subtil, quem não destaque o contraste entre o colorido das peças e o negro do contentor, que não se confunda com um cenário onde as peças parecem se mover, entrar dentro de outras vitrinas, alongar-se no espelhado do tecto, quem não fique surpreendido por se sentir desafogado com um pé-direito tão baixo e quem não sinta a místi-

ca do Oriente à flor da pele. Em termos de disposição espacial, no piso 0 ficaram os espaços mais públicos, tais como a recepção, a loja e uma área destinada a exposições temporárias. Este, a par com o piso 5, são os que maior ligação têm com o exterior. Ocupando um antigo saguão foi colocado um elevador vidrado que dá acesso aos pisos 1 e 2 , pisos de estrutura idêntica que contêm exclusivamente as áreas de exposição permanente. Ao nível expositivo, a solução passou por envolver os pilares existentes no interior por vitrinas em vidro que em simultâneo “absorvem os dispositivos de reforço estrutural resultantes da subtracção de pilares”, refere o livro. Com configurações diversas estas vitrinas são ilhas de luz que exibem o conteúdo museológico e funcionam como suporte gráfico para a informação, num espaço dominado pelo negro. Subindo na estrutura organizacional do espaço, no piso 3 ficam as zonas destinadas a reservas, conservação e restauro, e no piso 4 as salas de reuniões. O quinto piso coroa a massa do edifício, e nele estão o auditório, o restaurante e as zonas administrativas. De um armazém frigorífico nasceu assim um espaço museológico, numa adaptação ímpar que prova que a reutilização de edifícios é um contributo indiscutível.

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