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ANTÔNIO FRANCISCO PEREIRA - Belo Horizonte, MG

ANTÔNIO FRANCISCO PEREIRA - Belo Horizonte, MG Aposentado (Juiz Federal).

AMOR SEM FIM

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Aconteceu em Tomé-Açu, no Pará, como poderia ter acontecido em Queluzito, Propriá ou Quixeramobim. O sexagenário Alcino Andrade não se conformou com o fim do relacionamento decretado pela namorada de 22 anos e tentou reconquistar a moça. Apesar dos 40 janeiros que os separavam, ainda confiava no seu taco. Por isso, não deu trégua: mandava flores todos os dias, mensagens no celular e músicas na rádio local, de Dolores Duran (“A noite do meu bem”) a Jacques Brel (“Ne me quitte pas”).

Tudo em vão. Mas ele não se deu por vencido. O último amor da vida não se perde para um aventureiro qualquer, não se deixa escapar das mãos como um passarinho assustado. Por isso, foi à luta com um plano mirabolante, certamente inspirado nos filmes ou gibis, de bandido e mocinho, que ele via no século passado. Contratou três desocupados da cidade, que sequestraram a jovem e a mantiveram em cativeiro por três dias. Falaram até em resgate, para dar maior verossimilhança ao episódio. Só que, na última hora, antes de qualquer pagamento, apareceria Alcino e salvaria a assustada mocinha das garras dos bandoleiros. E, assim, a façanha do Zorro paraense lhe devolveria o coração agradecido da amada. Coração e acessórios.

Mas a farsa durou pouco. E seu atrapalhado mentor acabou confessando a tramoia, tirou a capa de herói e terminou a aventura atrás das grades, junto com os comparsas. Perdeu o dinheiro, a liberdade e o amor da sua Esmeralda. E agora precisa de um advogado.

Eu alegaria insanidade temporária, de cara limpa, sem brandir nenhum código ou tratado de direito penal. Insanidade causada pela paixão outonal, que fez Alcino derrapar na “curva perigosa dos cinquenta” (ou sessenta), para lembrar Drummond. E se, no código de Camões, “o amor é fogo que arde sem se ver”, “é dor que desatina sem doer”, então, no coração descontrolado do sexagenário, só mesmo o Alzheimer poderia aplacar esse fogo e essa dor.

Claro, sua peripécia não merece palmas no Domingão do Faustão, até porque cerceou a liberdade de outra pessoa. Mas também não se enquadra na estatística macabra – média de 10 por dia - dos primatas brasileiros que, em pleno século XXI, matam barbaramente suas ex-companheiras por não se conformarem com a separação. Pelas fotos que saíram nos jornais, Alcino mais parece com o Dom Quixote, que também perdeu o juízo de tanto pensar na sua Dulcineia.

Dizem os carcereiros que, enquanto não consegue um habeas corpus, o nosso cavaleiro da triste figura passa os dias na cadeia recitando o mesmo verso: “.... Mais servira, se não fora para tão longo amor tão curta a vida. ” Até quando vai ao banheiro.

Ou seja, fez tudo errado, mas não perdeu o lado poético da vida, nem atrás das grades. Quem sabe, ao final, ao dar a sentença, a Justiça considere esse aspecto como circunstância atenuante?

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