Livro catálogo DAQUI PRA FRENTE - Arte Contemporânea em Angola

Page 1


DAQUI PRA FRENTE - Arte Contemporânea em Angola / FROM NOW ON - Contemporary Art in Angola Coordenação Geral: Anderson Eleotério; Curadoria e Textos: Michelle Sales; Organização Editorial: Anderson Eleotério e Izabel Ferreira; Revisão de Textos: Rosalina Gouveia; Versão para o Inglês: Carolyn Brissett, Design Gráfico: Mauro Campello. Rio de Janeiro, CAIXA Cultural / ADUPLA, 2017. 56 p. Il. color. 23 x 21 cm Catálogo da exposição realizada na CAIXA Cultural Rio de Janeiro, Galeria 3, de 21 de março a 14 de maio de 2017. A exposição apresenta obras dos artistas Délio Jasse, Mónica de Miranda e Yonamine. Textos em português e inglês ISBN 978-85-64507-25-8 1. Arte Contemporânea - Século XXI. 2. Fotografias, Vídeos e Instalações (Arte) - Exposições. 3. Arte Brasileira - Século XXI. I. Sales, Michelle II. Eleotério, Anderson III. CAIXA Cultural Rio de Janeiro.


apresenta

arte contemporânea em angola

Délio Jasse mónica de miranda Yonamine

Curadoria

michelle Sales

CaiXa Cultural rio de Janeiro 21 de março a 14 de maio de 2017

catalogo Daqui pra frente_7.indd 1

4/13/2017 1:29:49 AM


Daqui pra Frente Dos territórios e das fronteiras A exposição “Daqui pra frente: arte contemporânea em Angola” é movida pelo interesse em falar das relações de ex-colônias africanas, particularmente Angola, com a antiga “metrópole” discutindo as tensões existentes nesse atravessar de fronteiras. A busca recorrente pelo trazer de determinados trabalhos dos artistas angolanos Yonamine, Délio Jasse e Mónica de Miranda foi no mapeamento possível de uma fronteira estética entre Angola e as imagens submersas e muitas vezes escondidas de um passado colonial recente. A representação da fronteira, excessivamente recorrente no pensamento atual que discute as trocas culturais, as diásporas, a situação pós-colonial (ou se quisermos pós-Independência) de muitas ex-colônias é na maioria das vezes território esquecido, vigiado e vazio, como fica mais evidente aqui no trabalho de Mónica de Miranda. A experiência do trabalho An ocean between us (2012), por exemplo, põe-nos diante de uma condição de trânsito muito própria dos deslocamentos contemporâneos, dessas ausências de toda uma comunidade dispersa em territórios alheios ou identidades forjadas na falta de fixidez e de raízes. O trabalho de Délio Jasse consiste num embate ainda mais direto dessas referências que fazem alusão à crise de todo o modelo colonial e seus desdobramentos contemporâneos: guerra, exílio, perdas. A série Além-mar (2013) revela o aspecto “idílico” da ocupação portuguesa na África de onde extraímos quase a certeza de que Portugal foi um país de “brandos costumes”, como até mesmo nosso pensador Gilberto Freyre defendeu no ensaio O luso e o trópico, patrocinado pela comissão de cultura do governo militar e ditatorial de Salazar (1926-1974). Tardes frugais de banhos de mar e piscina, abraços calorosos entre militares e jovens negras, encontros festivos numa tarde qualquer. Tudo isso a se passar durante a Guerra de Independência nos anos 1960-70 antevendo o processo de descolonização que veio após o 25 de Abril em Portugal. Sutilmente, Délio nos revela por meio dessas fotografias de viagem o lado mais sombrio e perverso da colonização e da ocupação portuguesa. E toca também em fronteiras cujo navio naufragado de Mónica Miranda celebra silenciosamente a solidão e a morte.

From Now On Territories and Boundaries The exhibition entitled From Now On / Daqui pra Frente: Contemporary Art in Angola is inspired by the wish to explore the links between former Portuguese colonies in Africa, particularly Angola, and what was once the ‘motherland’, sifting through these cross-border stresses. The ongoing quest to gather together works by Angolan artists Yonamine, Délio Jasse and Mónica de Miranda follows the possible mapping of an aesthetic boundary between Angola and the submerged and often shrouded images of its recent colonial past. With portrayals of boundaries recurring frequently (perhaps too often) in the current rationale discussing cultural exchanges and diasporas, the post-colonial (or post-Independence, if preferred) status of many former colonies is usually a neglected but observed wasteland, as clearly apparent here in the work of Mónica de Miranda. For example, the experience of An Ocean Between Us (2012) brings us face-to-face with an aspect of travel that is very characteristic of modern displacements, these absences of entire communities scattered in foreign lands or identities forged through ripped-up roots and no fixed abodes. The work of Délio Jasse consists of an even more direct face-off with these references alluding to `the crisis of the entire colonial model and its contemporary outcomes: war, exile, losses. The Overseas / Além Mar (2013) series reveals the ‘idyllic’ aspect of the Portuguese occupation of Africa, underpinning a quasi-certainty that Portugal is a country of ‘gentle ways’, to the extent that it was even defended by renowned Brazilian sociologist Gilberto Freyre in his essay on Portugal in the tropics entitled O Luso e o Trópico, sponsored by the Culture Commission set up by the military dictatorship headed by Antonio de Oliveira Salazar (1926-1974). Lazy afternoons at the beach or around the pool, friendly hugs between soldiers and young black women, casual get-togethers … All this was taking place while Angola fought for its independence from colonial rule from the 1960s through to 1974, as a foretaste of what was to happen after Salazar was toppled from power through the Carnation Revolution on April 25, 1974. Through these travel snaps, Délio subtly unveils the darker and more perverse side of colonization and occupation by Portugal. He also touches on borderlines where Mónica de Miranda’s shipwreck silently celebrates solitude and death.

2

catalogo Daqui pra frente_7.indd 2

4/13/2017 1:29:49 AM


In the series entitled Poetic Identity / Identidade Poética, through his depiction of faces dug out from an old antiques fair in Lisbon, Délio raises the challenge of what colonial practices mainly strove to eliminate: identities. All the red-tape entangling these border crossings is also there: rubber stamps, signatures, stiff headshots. The two-faced discourse of globalization conceals alarms, x-rays, endless immigration line-ups and unwanted travelers – better to wreck and bury everyone not allowed to travel. Here, this crossing finds its own iconography and imagery. Both archaeological, these works reflect efforts by the artist to expropriate outside images through the addition of appropriate texts and contexts. Finally, artist Yonamine leads us into a jarring clash with a jumble of cultural references to the political and economic chaos of postIndependence Angola, through language that recalls urban art, with references rooted in graffiti, silk-screening, painting, collage and the graphic arts. Yonamine is the artist of contamination, of cultural overlaps and clashes triggered by the violent processes of predatory capitalism that are commonplace in the megacities of Africa today, such as Luanda. There is little room for comment on travel, speaking openly of daily deals or fading ancestral customs overridden by new consumer cultures absorbed from the USA, China, Korea…. The colonial past sought in the works of Yonamine was systematically wiped out during the years after the Angolan civil war, occupied by Russia and Cuba, followed by China and Korea. There are many layers of history worked visually by Yonamine as seams and strata that blend to produce this amassment, not always explanatory and almost always resulting in images that are deeply disturbing and destabilizing. Allusions to the contemporary world are clear through the repeated use of newspapers. Yonamine is talking about a country whose historical past was systematically wiped out for the benefit of ‘higher’ interests: the worms gnawing slowly and steadily away at any resistance in Micro Life (2008). Fire is used as a metaphor for the destruction of an entire heritage. Michelle Sales Curator

Na série Identidade poética, através do retrato de rostos escavados numa antiga feira de antiguidades de Lisboa, Délio nos coloca frente a frente com aquilo que mais as práticas coloniais ocuparam-se de apagar: as identidades. A burocracia desse atravessar de fronteira também está toda ali: carimbos, assinaturas, retratos forçados. O discurso hipócrita da globalização esconde alarmes, raios X, filas de imigração e viajantes indesejados. Enterra e naufraga todos aqueles a quem não é permitido viajar. E aqui essa travessia encontra uma iconografia e um imaginário próprio. Ambos os trabalhos são arqueológicos, consistem num esforço do artista de se apropriar de imagens alheias acrescentando o contexto e o texto apropriado. Por fim, o artista Yonamine, com sua linguagem que nos remete à arte urbana, usando referências que vem do grafite, da serigrafia, da pintura, da colagem e das artes gráficas, coloca-nos num embate violento com o acúmulo de referências culturais de um caótico cenário político-econômico de Angola pós-Independência. Yonamine é o artista da contaminação, das sobreposições culturais e do choque advindo de um violento processo capitalista predatório tão próprio das megalópoles contemporâneas de países africanos, como Luanda. Já não dá texto para viagem, fala abertamente da negociação diária ou da impermanência de referências culturais ancestrais com os novos padrões de consumo cultural americanos, chineses, coreanos. O passado colonial reivindicado na obra de Yonamine é sistematicamente apagado pela posterior Guerra Civil, pela ocupação russa, cubana, chinesa, coreana… São muitas camadas históricas que Yonamine trabalha nas formas visuais como layers que se somam, produzindo esse acúmulo que nem sempre é esclarecedor e quase sempre resultará em imagens profundamente perturbadoras e desestabilizadoras. A alusão ao tempo presente é claro com o uso recorrente dos jornais. Yonamine fala de um país cujo passado histórico foi sistematicamente apagado em detrimento de interesses “maiores”. São os vermes a roer lentamente e de maneira organizada qualquer resistência de Micro life (2008). É a metáfora do incêndio como destruição de uma memória. Michelle Sales Curadora

3

catalogo Daqui pra frente_7.indd 3

4/13/2017 1:29:49 AM


4

catalogo Daqui pra frente_7.indd 4

4/13/2017 1:29:49 AM


5

catalogo Daqui pra frente_7.indd 5

4/13/2017 1:29:52 AM


6

catalogo Daqui pra frente_7.indd 6

4/13/2017 1:29:53 AM


7

catalogo Daqui pra frente_7.indd 7

4/13/2017 1:29:54 AM


8

catalogo Daqui pra frente_7.indd 8

4/13/2017 1:29:56 AM


9

catalogo Daqui pra frente_7.indd 9

4/13/2017 1:30:00 AM


10

catalogo Daqui pra frente_7.indd 10

4/13/2017 1:30:01 AM


11

catalogo Daqui pra frente_7.indd 11

4/13/2017 1:30:03 AM


12

catalogo Daqui pra frente_7.indd 12

4/13/2017 1:30:04 AM


13

catalogo Daqui pra frente_7.indd 13

4/13/2017 1:30:05 AM


14

catalogo Daqui pra frente_7.indd 14

4/13/2017 1:30:06 AM


15

catalogo Daqui pra frente_7.indd 15

4/13/2017 1:30:08 AM


16

catalogo Daqui pra frente_7.indd 16

4/13/2017 1:30:11 AM


17

catalogo Daqui pra frente_7.indd 17

4/13/2017 1:30:13 AM


18

catalogo Daqui pra frente_7.indd 18

4/13/2017 1:30:16 AM


19

catalogo Daqui pra frente_7.indd 19

4/13/2017 1:30:20 AM


20

catalogo Daqui pra frente_7.indd 20

4/13/2017 1:30:21 AM


21

catalogo Daqui pra frente_7.indd 21

4/13/2017 1:30:23 AM


22

catalogo Daqui pra frente_7.indd 22

4/13/2017 1:30:25 AM


23

catalogo Daqui pra frente_7.indd 23

4/13/2017 1:30:26 AM


24

catalogo Daqui pra frente_7.indd 24

4/13/2017 1:30:31 AM


25

catalogo Daqui pra frente_7.indd 25

4/13/2017 1:30:34 AM


26

catalogo Daqui pra frente_7.indd 26

4/13/2017 1:30:35 AM


Délio Jasse (Luanda, 1980)

Délio Jasse (Luanda, 1980)

TIME

TEMPO

Arriving in Lisbon at 18 years of age, he began to work in silkscreen studios, which is a technique that indelibly characterizes his artistic practice. Living in Portugal for several years as an illegal immigrant, together with many relatives and friends, he was unable to visit Luanda. This left a scar that is still apparent in his artistic output. The output of Délio Jasse is based largely on experimental photographic processes such as cyanotyping and vandyke (more familiar as blue-printing and brown-printing). His works consist of photographic recreations of images found during his strolls through the city. He often reshoots photographs of unknown faces in attempts to recreate memories and rewrite untold histories. Time is a vital dimension in his work, where it appears twice: as part of the long process of developing a ‘latent image’ where time is a primary discursive factor, and also the ontology of photography, with its recording and archiving characteristics. Through the faces in Poetic Identity / Identidade Poética, the individual path of the artist can be reconstructed, following his personal trail as an immigrant seeking his papers in Portugal, in parallel to conceptual aspects that appear more frequently in his work. In this series, Délio portrays the complex paperwork piled up through contemporary travels and migrations, rephotographing and reinserting marginalized people into society, especially Angolan immigrants who fled to Portugal after the fall of military dictator Salazar on April 25, 1974, only to be trapped by countless complications triggered by shifts in social arrangements between the erstwhile ‘motherland’ and its newly-liberated colony. This is also allegory for the artist’s eagerness to tell their stories, retrieving individual memories swept away by the broad brushstrokes of official narratives. Portugal’s overseas colonies are there, together with the struggle for independence, the Angolan civil war and the flight of countless Angolans to Portugal. The outlook is that other narratives will be spotlighted. The gesture of photographing a photograph is endowed with a performatic nature that is very specific to the use of this technique in contemporary art, restoring it to a key position in the field of experimentation as a mainstream aspect of Délio’s discourse, together with the use of unconventional printing and developing techniques.

Aos dezoito anos chega a Lisboa e começa a trabalhar em ateliês de serigrafia, técnica que marca de maneira indelével a sua prática artística. Vive alguns anos em Portugal como imigrante ilegal, assim como muitos de sua família e amigos, impedido de visitar Luanda. Essa cicatriz marca daí em diante seu percurso como artista, como veremos. O trabalho de Délio Jasse está majoritariamente baseado em processos experimentais fotográficos como a cianotipia e o Van Dyke. Alguns trabalhos consistem na recriação fotográfica de imagens encontradas nas deambulações do artista pela cidade. É prática comum de Délio refotografar retratos de rostos desconhecidos na tentativa de recriar uma memória e de reescrever uma história não dita. O tempo é dimensão fundamental no seu trabalho e encontra nele dupla inscrição: integra os processos analógicos de revelação de uma “imagem latente” cujo tempo é fator discursivo preponderante mas também a ontologia da fotografia, sua natureza arquivística e de captura. Atrás dos rostos de Identidade poética é possível reconstruir o percurso individual do artista, sua trajetória pessoal como imigrante em Portugal em busca dos papéis, assim como aspectos conceituais mais recorrentes em seu trabalho. Na série, Délio nos fala da demasiada burocracia presente nas migrações e nos trânsitos contemporâneos, refotografa e reinsere socialmente indivíduos marginalizados, em especial os imigrantes angolanos que vão para Portugal após o 25 de Abril e que tropeçam com inúmeras dificuldades próprias de um rearranjo social entre excolônia e “metrópole” advindo da descolonização. É também a alegoria do desejo do artista em recontar histórias, memórias individuais apagadas pelas grandes narrativas oficiais. O Portugal ultramar está lá, a Guerra Civil está lá, a luta pela descolonização, a fuga de muitos angolanos para Portugal. A perspectiva de fazer emergir outras narrativas. O gesto de fotografar a fotografia a reveste de um caráter performativo muito próprio do uso dessa técnica na arte contemporânea, reinserindo-a como lugar central de experimentação e que, ao lado do uso de técnicas pouco convencionais de impressão e revelação, é o principal vocabulário discursivo de Délio. 27

catalogo Daqui pra frente_7.indd 27

4/13/2017 1:30:35 AM


28

DÉLIO JASSE Série Identidade Poética, 2009

catalogo Daqui pra frente_7.indd 28

4/13/2017 1:30:37 AM


DÉLIO JASSE Série Além Mar, 2013

catalogo Daqui pra frente_7.indd 29

29

4/13/2017 1:30:38 AM


30

DÉLIO JASSE Série Além Mar, 2013

catalogo Daqui pra frente_7.indd 30

4/13/2017 1:30:42 AM


DÉLIO JASSE Série Além Mar, 2013

catalogo Daqui pra frente_7.indd 31

31

4/13/2017 1:30:45 AM


32

DÉLIO JASSE Série Além Mar, 2013

catalogo Daqui pra frente_7.indd 32

4/13/2017 1:30:49 AM


DÉLIO JASSE Série Além Mar, 2013

catalogo Daqui pra frente_7.indd 33

33

4/13/2017 1:30:50 AM


34

DÉLIO JASSE Darkroom, 2013

catalogo Daqui pra frente_7.indd 34

4/13/2017 1:30:50 AM


35

catalogo Daqui pra frente_7.indd 35

4/13/2017 1:30:51 AM


36

catalogo Daqui pra frente_7.indd 36

4/13/2017 1:30:53 AM


Mónica de Miranda (Porto, 1976)

Mónica de Miranda (Porto, 1976)

LANDSCAPE

PAISAGEM

Much of Monica’s work is grounded on visual research into

O trabalho de Mónica está em grande parte sedimentado pela pesquisa visual sobre a paisagem. Essa paisagem em seu trabalho aponta direções todas subjetivas que nos leva quase sempre a uma busca pela identidade e pela identificação aos lugares por onde passa. Essa espacialidade visual é o próprio exercício lírico da artista, uma compreensão visual da existência multipla de uma identidade cultural sedimentada no esforço da diáspora. A paisagem na fotografia da artista e também nos trabalhos em vídeo nos remete, portanto, ao desejo de pertencer aos lugares que fotografa.

landscape, pointing in highly subjective directions that almost always lead to a quest for identity and the identification of the places through which she passes. This visual spaciality is the real lyrical exercise of this artist, a visual understanding of the multiplied existence of a cultural identity rooted in the drive of the diaspora. In her photographs and video works, landscapes consequently prompt the wish to belong to the places that she shoots. Born to an Angolan mother in Porto, Portugal, her origins greatly influence the construction of the artist’s eye when striving to record in greater depth the meaning of this nonbeing or non-belonging to a place that is also her home. In the course of her work as a visual artist, she also revisited Luanda in an apparent quest for subjective engagement, also constructing a place of memory. This journey back is permeated by other wanderings, in an attempt to represent or reorganize her cultural references while travelling, recorded through images of a lost family genealogy, as in Born and

Die (2016). Monica takes photographs like a writer records impressions in a travel journal. For the moment, the performatic issue

Mônica nasceu no Porto em Portugal e é filha de mãe angolana. Essa condição influencia muito da construção do olhar da artista quando parte de um registro mais profundo sobre o que representa esse não estar ou não pertencer a um lugar que também é de origem. Ao longo do trabalho de artista visual ela tem revisitado Luanda e parece-nos buscar uma inscrição subjetiva, construindo também um espaço de memória. Essa viagem de retorno é permeada por outras andanças da artista na tentativa de representar ou reorganizar suas referências culturais enquanto viaja, inscrevendo com imagens uma genealogia familiar perdida, como em Born and die (2016). Mónica fotografa como um escritor registra impressões num caderno de viagem. Por ora, a questão performativa em sua fotografia também é central, é um corpo entremeado que surge em meio à paisagem como um desejo de existir, como uma produção de presença, como em diferentes trabalhos tal qual Twin house (2016) e Landing (2016).

in her photography is also a key factor, a body entwined into the landscape like a wish to exist, a production of presence, that is apparent in several works, such as Twin House (2016) and Landing (2016).

MÓNICA DE MIRANDA Break-line, 2016

catalogo Daqui pra frente_7.indd 37

37

4/13/2017 1:30:55 AM


38

MÓNICA DE MIRANDA An Ocean between us, 2012

catalogo Daqui pra frente_7.indd 38

4/13/2017 1:30:55 AM


MÓNICA DE MIRANDA Casa Portuguesa, 2017

catalogo Daqui pra frente_7.indd 39

39

4/13/2017 1:30:58 AM


40

MÓNICA DE MIRANDA Hotel Globo, 2015

catalogo Daqui pra frente_7.indd 40

4/13/2017 1:30:58 AM


MÓNICA DE MIRANDA Field Work, Crosswinds, 2016

catalogo Daqui pra frente_7.indd 41

41

4/13/2017 1:31:00 AM


42

MÓNICA DE MIRANDA Bitting nations, 2007

catalogo Daqui pra frente_7.indd 42

4/13/2017 1:31:03 AM


MÓNICA DE MIRANDA Sem título, série Erosion, 2013 MÓNICA DE MIRANDA Born and die, 2016

catalogo Daqui pra frente_7.indd 43

43

4/13/2017 1:31:04 AM


MÓNICA DE MIRANDA Landing, 2016 44

MÓNICA DE MIRANDA City-scape, 2016

catalogo Daqui pra frente_7.indd 44

4/13/2017 1:31:05 AM


45

catalogo Daqui pra frente_7.indd 45

4/13/2017 1:31:06 AM


46

MÓNICA DE MIRANDA Twin house, 2016

catalogo Daqui pra frente_7.indd 46

4/13/2017 1:31:08 AM


47

catalogo Daqui pra frente_7.indd 47

4/13/2017 1:31:09 AM


48

catalogo Daqui pra frente_7.indd 48

4/13/2017 1:31:11 AM


Yonamine (Luanda, 1975)

Yonamine (Luanda, 1975)

CHAOS

CAOS

Born in Luanda a year after Angola gained its independence from colonial rule and the Carnation Revolution in Portugal, Yonamine sought refuge from the civil war in several countries, including the Congo and the UK.

Nasceu em Luanda no ano que marca a independência de Angola e o 25 de Abril em Portugal. Como muitos, por conta da Guerra Civil em Angola, viveu em diferentes países, como Congo, Brasil e Reino Unido.

He is the artist of chaos: political chaos, cultural chaos and above all linguistic chaos. His work is violent, not only in terms of the issues he highlights, but also its belligerent language, with self-vandalism, experimentation, overlapping techniques and transgression. Music, video, silk-screening, painting and photography for the aesthetic vocabulary of this artist, strongly influenced by experimenting with the graphic arts.

Yonamine é o artista do caos. Do caos político, do caos cultural e, sobretudo, do caos linguístico. Seu trabalho é violento não apenas nas questões que aponta, como também na maneira indócil de sua linguagem eleita. Autovandalismo, experimentação, superposição de técnicas, transgressão. Música, vídeo, serigrafia, pintura, fotografia compõem o vocabulário estético do artista fortemente influenciado pela experiência com as artes gráficas.

Voraciously assimilating the chaotic scenes of Africa’s megacities, especially Luanda, he goes even further, calling himself PortugueseCongolese, visually triggering a singular effective cartography through which he reconstructs his relationship with his homelands in Africa and the links between Angola and its neighbors, in a drawing that denies its status as a former colony through a direct connection to Portugal. From piles of newspapers to heaps of words, Yonamine overlaps countless layers of history that are already of no interest to archives, heritage or even memory as entries in the records, but rather as a critic of the theft of his African ancestry, its references and culture. Taut with tensions like the city itself, the work of this artist resembles a wall in front of a large office building: graffiti, posters, garbage and street people. Setting out on an aesthetic quest is a familiar step in Latin America as well, where layers also overlap in hybrid cultures. Whether in his installations displayed here or his work in general, Yonamine is a fierce critic of the consumer society, in his visual explorations of contemporary Africa. Through this approach in different works – such as Can (2010) and La Carpa (2011) – Yonamine absorbs mass culture icons and references. However, in contrast to the Pop Art generation of the 1950s, whose protagonists portrayed the consumer society around them in order to criticize its values and the starlets of capitalism, Yonamine updates this discourse in his work: no longer mere social criticism, there is an awareness that we will all be plunged into the same mudpit through these barbaric attitudes that reflect a deep-rooted crisis in values. Finally, this iconography derived from a mass global culture blends with and is altered by its juxtaposition to modern references to the current political and cultural situations in Angola, translating the style of Yonamine into a kind of post-colonial Pop Art. In his own words: imagining oneself in an African country today means undergoing a virtuous symbolic catharsis.

Incorpora de maneira voraz o cenário caótico das megalópoles africanas, em especial Luanda, mas não só. O próprio artista designa-se luso-congolês, o que nos dispara visualmente uma cartografia afetiva singular em que ele reconstrói sua relação com a terra natal na África e com as ligações entre Angola e os países vizinhos, num desenho que nega a relação da ex-colônia em sua ligação direta com Portugal. Do acúmulo de jornais ao acúmulo de palavras, Yonamine sobrepõe muitas camadas históricas já sem interesse pelo arquivo ou pela memória no sentido de uma inscrição arquivística, mas como uma crítica ao roubo da ancestralidade africana, suas referências e sua história. Como a cidade, lugar de tensões, a obra desse artista é como um muro na frente de um grande edifício corporativo: pichações, cartazes, lixo, ocupações. Parte em busca de uma pesquisa estética que na América Latina também nos é familiar e cujo hibridismo e superposição dá a marca. Seja nos trabalhos instalativos aqui presentes seja na sua obra de maneira geral, Yonamine aponta, ao pensar visualmente uma África contemporânea, uma feroz crítica à sociedade de consumo. É dessa forma que em diferentes trabalhos, como Can (2010) e La Carpa (2011), ele se apropria de ícones e referenciais da cultura de massa. Todavia, diferentemente da geração de arte pop dos anos 1950, em que os artistas citavam a sociedade de consumo em que estavam inseridos para criticar os valores e as vedetes do capitalismo, no percurso de Yonamine há uma atualização desse discurso: já não se trata de uma simples crítica social, há a consciência de estarmos todos imersos no mesmo lamaçal, na mesma barbárie marcada pela crise profunda dos valores. E por fim, essa iconografia advinda da cultura de massa global se mistura e é alterada pela justaposição a referências atuais do cenário político-cultural angolano, traduzindo o estilo de Yonamine numa espécie de pop pós-colonial. Segundo ele: imaginar-se num país africano hoje significa experimentar uma virtuosa catarse simbólica.

49

catalogo Daqui pra frente_7.indd 49

4/13/2017 1:31:12 AM


50

YONAMINE Can, 2010

catalogo Daqui pra frente_7.indd 50

4/13/2017 1:31:12 AM


51

catalogo Daqui pra frente_7.indd 51

4/13/2017 1:31:13 AM


52

YONAMINE La carpa, 2011

catalogo Daqui pra frente_7.indd 52

4/13/2017 1:31:14 AM


YONAMINE M de M, 2016

catalogo Daqui pra frente_7.indd 53

53

4/13/2017 1:31:14 AM


54

YONAMINE Micro Life, 2008

catalogo Daqui pra frente_7.indd 54

4/13/2017 1:31:15 AM


LISTA DE OBRAS | WORKS

DÉLIO JASSE Série Identidade Poética, 2009 Impressão fotográfica 30 x 40 cm Série Além Mar, 2013 Impressão fotográfica 100 x 70 cm Darkroom, 2013 Projeção de slide Dimensões variáveis

MÓNICA DE MIRANDA Break-line, 2016 Impressão fotográfica 60 x 90 cm cada An Ocean between us, 2012 Hd video, cor, som, 6’ Direção e Edição: Mónica de Miranda Camêra: Tiago Mata Angelino Performance: Bruno Giordani e Mónica de Miranda Uma casa portuguesa, 2017 Hd video, cor, som, 04’33” Direção e Edição: Mónica de Miranda Performance: Paulo Pascoal

Hotel Globo, 2015 Hd video, cor, som, 9” Direção e Edição: Mónica de Miranda Camêra: Tiago Mata Angelino Performance: Andre Cunha e Mónica de Miranda

YONAMINE

Field Work Crosswinds, 2016 Hd vídeo, Som, 8’

La carpa, 2011 Tenda, projeção de slide Dimensões variáveis Ed. 3

Bitting nations, 2007 HD video, som, cor, 3’20” Instalação três monitores Sem título - série Erosion, 2013 Instalação fotográfica Dimensões variáveis Born and Die, 2016 Impressão fotográfica Dimensões variáveis

Can, 2010 vídeo, som, cor, loop, 25’09’’ Dimensões variáveis Ed. 3

M de M, 2016 Vídeo, p/b, som, 10’54’’, loop Dimensões variáveis Ed. 3 Micro Life, 2008 Vídeo instalação com jornais DVD PAL, looping, sem som, 3’04’’ Dimensões variáveis Ed. 3

Landing, 2016 Impressão fotográfica 60 x 94 cm cada City-scape, 2016 Impressão fotográfica 75 x 90 cm cada Twin house, 2016 Impressão fotográfica 40 x 65 cm cada

55

catalogo Daqui pra frente_7.indd 55

4/13/2017 1:31:16 AM


EXPOSIÇÃO | EXHIBITION

Instalação Multimídia | Multimedia Installation Linha D Montagens

Curadoria | Curatorship Michelle Sales Coordenação Geral | General Coordination Anderson Eleotério Produção | Production Izabel Ferreira Programação Visual | Art Direction Mauro Campello Assessoria de Imprensa | Press Liaison Raquel Silva Iluminação | Lighting Antonio Mendel – Espaço Luz, Iluminação em Artes Projeto Expográfico | Exhibition Design Anderson Eleotério Assistentes de Produção | Production Assistants David Motta Felipe Paladini Montagem e Cenotécnica | Art Mounting and Scenographic Technology Luis Carlos Gonçalves Renato Cecílio das Dores Sergio Gomes Lima

PROJETO | PROJECT

Impressão Fotográfica | Photographic Print Barracão de Imagens CSN

CATÁLOGO | CATALOG

AGRADECIMENTOS | ACKNOWLEDGMENTS

Organização | Organization Anderson Eleotério Izabel Ferreira

António Pinto Ribeiro Bruno Miguel Francisco Vidal Fundação Calouste Gulbenkian Galeria Cristina Guerra Galeria Filomena Soares Galeria ZDB Hangar Centro de Investigação Artística Josué Mattos Kiluanji Kia Henda Lino Damião Lucca Campello Lucia Conceição Marcelo Duarte Marcos Kabenda Mauro Saraiva Mirian Tavares Rachel Korman Ricardo Duarte Susana Anágua Taissa Campello Teresa Anacleto Tiago Mendonça

Produção Editorial | Editorial Production Raquel Silva

Sinalização | Signposting Gaspar Manoel Fernando – Ginga Design

Textos | Texts Michelle Sales

Revisão de Textos | Texts Revision Rachel Valença

Design Gráfico | Graphic Design Mauro Campello

Seguro | Insurance Pro Affinite – ACE Seguradora

Fotos | Photos Leonardo Ramadinha Raquel Silva

Transporte | Transportation Art Quality

Revisão de Textos | Texts Revision Rosalina Gouveia

Projeto | Project Anderson Eleotério Michelle Sales

Versão Inglês | English Version Carolyn Brissett

Proponente | Proponent FLUA Produções Culturais Ltda.

Impressão e pré-impressão | Printing Gráfica e Editora Positiva

Produção Executiva | Executive Production ADUPLA Produção Cultural Ltda. Patrocínio | Sponsor Caixa Econômica Federal Governo Federal

PRODUÇÃO | PRODUCTION

CAIXA Cultural Rio de Janeiro - Galeria 3 Av. Almirante Barroso, 25 Centro Tel. (21) 3980-3815

www.caixacultural.gov.br Baixe o aplicativo CAIXA Cultural facebook.com/CaixaCulturalRiodeJaneiro

PATROCÍNIO | SPONSOR

56

catalogo Daqui pra frente_7.indd 56

4/13/2017 1:31:17 AM


DAQUI PRA FRENTE - Arte Contemporânea em Angola / FROM NOW ON - Contemporary Art in Angola Coordenação Geral: Anderson Eleotério; Curadoria e Textos: Michelle Sales; Organização Editorial: Anderson Eleotério e Izabel Ferreira; Revisão de Textos: Rosalina Gouveia; Versão para o Inglês: Carolyn Brissett, Design Gráfico: Mauro Campello. Rio de Janeiro, CAIXA Cultural / ADUPLA, 2017. 56 p. Il. color. 23 x 21 cm Catálogo da exposição realizada na CAIXA Cultural Rio de Janeiro, Galeria 3, de 21 de março a 14 de maio de 2017. A exposição apresenta obras dos artistas Délio Jasse, Mónica de Miranda e Yonamine. Textos em português e inglês ISBN 978-85-64507-25-8 1. Arte Contemporânea - Século XXI. 2. Fotografias, Vídeos e Instalações (Arte) - Exposições. 3. Arte Brasileira - Século XXI. I. Sales, Michelle II. Eleotério, Anderson III. CAIXA Cultural Rio de Janeiro.



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.