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crise ecológica e socioambiental
from Revista Universidade e Sociedade nº 72
by ANDES-SN | Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior
alto risco de morte”, como denominam as populações atingidas, em detrimento à denominação utilizada pelas mineradoras: “zonas de autossalvamento (ZAZ)”7. Nesse contexto, inúmeros são os casos de violências perpetradas, dentre as quais: perseguição às lideranças locais, especialmente às mulheres; contaminação do solo, água e ar; descaso com a retomada dos modos de vida das famílias removidas, umas vez que há famílias residindo em hotel no centro da cidade de Mariana há mais de um ano; e repressão policial às manifestações pacíficas realizadas pela comunidade, aos movimentos sociais e entidades sindicais ao garimpo tradicional, prática secular realizada no território e que conforma o modo de vida e subsistência de famílias há gerações, dentre outras.
A partir dessas exemplificações, destacamos que inúmeros outras comunidades são submetidas à “rota da lama”8 e à destruição de suas culturas, paisagens, meio ambiente e vida nos territórios de Minas Gerais onde a mineração extrativista acontece.
A região do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais possui, em seus municípios, diferentes instituições de ensino públicas, que abarcam os diferentes níveis de escolaridade. Ela comporta, também, a existência e atuação de inúmeros sujeitos coletivos, especialmente movimentos sociais, entidades sindicais e frentes amplas. A mineração extrativista é uma atividade econômico-produtiva que organiza e concentra fortemente os interesses antagônicos classistas na região, que se expressam pelos diferentes âmbitos da vida social, adentrando fortemente na esfera da educação e moldando as resistências populares.
A educação está envolta em permanente disputa, seja para manter-se enquanto política social pública e assumir um caráter universal de acesso enquanto direito social ou enquanto mercadoria, altamente rentável e acessível somente àqueles que podem pagar pelo acesso, ou seja, elitizada e inacessível à classe trabalhadora em geral. Nesse sentido, ganham relevância as instituições de ensino públicas, dentre as quais destacamos a Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), o Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG) campus Ouro Preto e, além dessas, as escolas das comunidades destruídas pelo rompimento criminoso da barragem de Fundão: a Escola Municipal de Bento Rodrigues e a Escola Municipal de Paracatu de Baixo. Acerca do contexto escolar, importa evidenciar que ambas as instituições foram atingidas e destruídas. Até o momento, passados mais de sete anos, permanecem em sedes provisórias no centro de Mariana, e esse processo abrupto de o local de trabalho ter sido atingido/destruído, de mudança geográfica do local de trabalho, de contato cotidiano com crianças e adolescentes diretamente atingidos/as desenca- deou um contexto novo e desafiador aos/às docentes. Melhor dizendo, um contexto adoecedor, como demonstrado no relevante estudo realizado por Hunzicker (2019). A autora ressalta que havia um “silêncio pedagógico”, que não eram discutidos os danos socioambientais provocados pela mineração antes do RBF. Situação propícia para as mineradoras que adentravam o ambiente escolar para inserir discursos que remetem a uma imagem de empresas ambientalmente responsáveis. Os cursos de capacitação que eram ofertados pelas mineradoras aos professores da escola de Bento Rodrigues não dialogavam com o contexto, não discutiam os problemas ambientais locais. [...] A maioria dos professores entrevistados representava a mineração como atividade necessária para a economia do município de Mariana, todavia, depois do RBF, os professores são impelidos a alterar seus conhecimentos e práticas educativas, tornaram-se mais críticos sobre as práticas de extrativismo mineral, passaram a discutir essa temática em suas aulas e, até mesmo, alguns docentes chegaram a produzir materiais junto com seus alunos para refletir sobre os danos socioambientais do RBF, tanto em âmbito local, em Bento Rodrigues, como ao longo da Bacia do Rio Doce (HUNZICKER, 2019, p. 139).
Percebe-se que a disputa ideológica se impõe no ambiente escolar. Da mesma forma, adentra as instituições de ensino técnico profissionalizante e superior, tais quais o IFMG campus Ouro Preto. A instituição oferta diferentes cursos, em que destacamos: técnico em mineração, técnico em metalurgia, técnico em segurança do trabalho e técnico em meio ambiente, formações essas que são diretamente requisitadas no contexto laboral da mineração extrativista. Compreende-se que é ofertado um nível de escolaridade e de formação profissional mínimo, que permite que os indivíduos possam vender sua força de trabalho na atividade econômico-produtiva que predomina no território. Esse é o horizonte laboral de grande parte da juventude, dos filhos e filhas da classe trabalhadora da região, o que acaba por limitar outras possibilidades empregatícias e de formação acadêmico-profissional para além desse contexto e por conformar uma vinculação geracionalfamiliar à atividade.