NOMODISMO

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junho.2019

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NOMODISMOm

Vanlife vida sobre quatro rodas

Conheรงa como vivem os adeptos deste estilo de vida junho 2019. Nomodismo


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ENTREVISTA

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POCHETE

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Eles renunciam ao luxo, rotina e segurança financeira, a fim de saciar a obstinação por conhecer o mundo e viver intensamente. De rebeldes, passaram a ícones nas redes sociais. O jeito nômade de viver não é novidade, mas muitos ainda ficam confusos por não o entenderem do que se trata. Quem acha que esse estilo de vida é estranho e desajustado se engana.

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NOMODISMO

IDENTIDADE

#HASHTAG RANGO

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08 16

Comida: a ambição dos viajantes Nem sempre um nômade busca sempre paisagens e experiência cultural. As vezes tudo que ele quer é comer bem.

49 TRIBOS

Yakisoba real oficial Para desvendar peculiaridades orientais, Camila e Manelkis usufruiram da culinária chinesa.

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CAPA Vanlife :

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a reinvenção da vida

TRIBOS

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Mídias digitais e seu poder Liberdades oferecidas pelo universo da internet.

TUDO BEM?

ALTERNATIVO Tradição no esporte

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Conheça os costumes que os antigos povos nômades preservaram por meio de competições esportivas na Ásia Central.

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Aventura segura Descubra quais os métodos indicados para garantir uma viagem mais segura.

48 O pulo do gato Para manter-se na vida nômade o @mochileiroSP fez do esporte e das redes sociais sua renda.

45 De um ano para a vida inteira A mulher que fez da viagem seu estilo de vida.

CARONA

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Antes de viajar Viajar não implica só em arrumar malas; há muita coisa envolvida. Entender isto o quanto antes pode livrá-lo de pequenos apertos.

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EXPEDIENTE

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DIRETORIA DE REDAÇÃO, COORDENAÇÃO DE PROJETO E CONSULTORIA GRÁFICA:

Ma. Andréia Moura Esp. Felipe Rocha EDITORA-CHEFE: Ana Paula Barbosa CHEFE DE REPORTAGEM: Victor Sotero SECRETÁRIAS DE REDAÇÃO: Julie Grüdtner e Sara Rabite DIAGRAMADORA CHEFE: Rafaela Vitorino DIAGRAMAÇÃO E PROJETO GRÁFICO: Eliandra Zanquetta, Letícia Bessa, Milena Martins e Rafaela Vitorino REVISORES: Julie Grüdtner, Letícia Bessa e Raiane Lívia. REPÓRTERES: Amanda Carvalho, Ana Mairene Alves, Ana Paula Barbosa, Analia Roa, Damáris Gonçalves, Eliandra Zanquetta, Fernanda Martinez, Gisele Calisto, Jeniffer Souza, Jocemara Mai, Kelyse Rodrigues, Leonardo José, Maria Teófilo, Mariana Avanzzi, Milena Martins, Nathalie Monteiro, Noemi de Almeida, Patrícia Custodio, Raiane Lívia, Sara Rabite, Sara Teixeira, Mayara Pereira, Stephan Max, Tátila França e Thaís Fowler INFOGRAFIA: Fernanda Martinez, Mayara Pereira e Milena Martins COLUNISTAS: Ana Paula Barbosa, Letícia Bessa, Julie Grüdtner, Rafaela Vitorino e Victor Sotero FOTOS: Leandro Becerra, Shutterstock e Fotos Públicas ILUSTRADOR: Felipe Carmo PUBLICIDADE: Matheus Tondo e Willy Stein

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EDITORIAL

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Retratos nômades

Ana Paula Barbosa

Editora-chefe

Estava eu sentada em frente a uma tela de computador. Havia trinta e poucas abas abertas – em cada janela. O expediente longo demais e os poucos intervalos que •iz me •izeram concluir que as ideias não viriam mais naquele dia. Então, deixei a redação. No caminho para casa abri meu Instagram e comecei a rolar para cima as inúmeras fotos de paisagens que sonhava visitar. Mais uma vez desejei estar num daqueles lugares. Sabia ser um desejo comum entre meus colegas. Foi quando me lembrei de coisas que eles me disseram sobre nômades, principalmente como conciliam viagem, vida e trabalho. Nos dias seguintes começamos a pesquisar mais sobre esses tais nômades e o estilo de vida deles, para lá de curioso. Descobrimos um número de pessoas em busca de uma vida similar exponencialmente maior do que imaginávamos. O que não sabíamos era que o mundo nômade estava muito além do mostrado nas redes sociais. Entender o quão inesgotável eram os questionamentos nos tornou curiosos o su•iciente para ir além da pesquisa: criar uma revista que não

somente respondesse às perguntas, mas funcionasse como uma comunidade onde todos pudessem compartilhar suas experiências. Percebemos que a revista também seria para nós, simpatizantes deste estilo de vida tão invejável. Não se trata de um conteúdo comum; se trata de um estilo de vida sem endereço •ixo. Diante dessa complexidade, escolhemos falar sobre todos os endereços possíveis. Roteiros fora da rota, curiosidades bizarras sobre os quatro cantos do mundo, re•lexões pessoais, administração •inanceira, cuidados com a saúde e histórias inspiradoras. Descobrimos países dentro de países, o sabor das culturas, na rua e no prato, maneiras de sustento alternativas e esportes que você nunca imaginaria praticar. Nos tornamos caçadores de histórias e realidades capazes de abrir a visão para um mundo que não conseguimos enxergar facilmente. A produção foi uma volta ao mundo. Propositalmente, ainda não passamos por todos os cantos. Mas a viagem ainda não terminou; iremos continuar e te convidamos a ir com a gente nessa aventura. junho 2019. Nomodismo


#HASHTAG

8 comida

Arte em F

Seal bagnão passar apurose

ê Para voc s de embarcar ante rante minutos ais segurança du de ça m para ter m, não se esque eal ,s ge de mala de a sua via e r c la ro Você po adiciona eck-list. h c u e , assim s bag, no rios sites preá v m e lo encontrá jas •ísicas, por um lo m e como essível. c a ço bem

lorença

Em Floren ça, a gale Uf•izi abr iu 14 nov ria italiana as cadas a p intores do salas dedis séculos e XVII. Ela XVI sa de artista brigarão 105 obra s de Ven eza e Flo s ça que e renstavam g uardadas museus. P em eças com o Urbino´´, de Ticiano ´´Vênus de , e ´´ del Popolo ´´, de Fede Madonna rico Baro estarão na cci, Galeria.

Festas juninas

Star Wars Chegou o momento em que a Disney vai conquistar o coração dos fãs de Star Wars. A nova atração, Galaxy´s Edge, localiza-se no Disneyland Resort da Califórnia e trouxe vida para algo que estava apenas na telinha. Além de poder construir os próprios droides e sabres de luz, os visitantes têm a oportunidade de operar uma espaçonave.

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Vai passar os meses de junho e julho pelo Brasil? Aproveite para rodar o país atrás das festas de São João. Se você deseja ver espetáculos super bem produzidos, compre sua passagem para o Nordeste do país. Se você curte algo mais calmo e com muita comida, não deixe de ir às festas pequenas da sua cidade e região.

undo BRT no mBus Rapid

Transit mais ma O siste nova aposta em sua o. A uma (BRT) é ades do mund ero de cid núm de 55 inuir o de im d é r meio a propost s atrasados po r maio es iro passage ais leves e com s desse m õe veículos s. As implantaç ie em sign d u a velocid mbém contrib ic a ta ção de sistema nte para a redu e o. •icativam ortes no trânsit m dentes e


9 Feira de

turismo

O Salã ocorrer o SP de Turis mo va en i junho n tre os dias 26 e2 o São Luís centro de conv 8 de enções . na sua O evento se e ncontra décima oitava e traz de mo diç gastron nstrações cult ão e ôm urais e assunto icas, além de discutir s atuais sobre o com p tur ro! da área issionais ren ismo omados .

bagagem Despachar baga A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) recomendou o veto à decisão que proibiu a cobrança por despacho de bagagem. De acordo com a assessoria da Anac, se isso não acontecer, as alternativas de serviços aos usuários serão reduo zidas, assim como a atratividade do s. tos. para futuros investimento país p

Visita ao Oriente Para viver um pouco da cultura japonesa, aproveite para visitar o Festival do Japão, que vai acontecer nos dias 5, 6 e 7 de julho no São Paulo Expo Exhibition &amp, na cidade de São Paulo. O evento tem o objetivo de preservar e divulgar as tradições japonesas, representando as 47 províncias que compõem o país.

inino Futebol fem e Fu Mundo d

do rá na A Copa acontece de o in in tebol fem e 7 de junho e 7 ntr , assim França e abertura e d o g jo o em julho. O disputad le á r e s l, a n como a !i a maior metrópo ceir o necessá Lyon, ter ã s s ia d s Trê ofrancesa. nhecer roteiros p o c a rios par a cidade. pulares d

Voos bara

tos

Quer viaja r para a sem gasta Europa r muito? A empres low cost N a orwegian já atua em território brasileiro . Os voos d poníveis s isaem do R io de Jane direto par ir o a Londres . Atualme te, a faixa nde preços se encontr em torno a de dois m il reais.

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#HASHTAG

10 comida

In

uvre o L a r a p gresso mar-

viagem stá com e ê ça de c o v Se se esque no ã n , is r ae a Pa cada par m antecedência ecio c n o h comprar u mais c onta e s u m o ra e. Por c trada pa , o Louvr e visitas e d a id c ade d do da e quantid menda que a d n a r g a d eco museu r a por diárias, o ingresso seja feit les p do uete sim compra íq t O . e sit meio do ros. Evite •ilas! u e 7 custa 1

Podcasts nômades

Harry Potter A escritora J.K. Rowling anunciou que lançará quatro novos livros eletrônicos em junho, oferecendo aos fãs de Harry Potter a chance de se aprofundarem mais ainda nas histórias mágicas. Os dois primeiros livros serão divulgados em 27 de junho e estarão disponíveis em inglês, francês, italiano e alemão.

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Se você gosta de escutar histórias, a plataforma Spotify tem algo perfeito para você. A série ´´Podcast Nômade´´, criada por Heitor Alves, traz diversas experiências de nômades brasileiros pelo mundo. Com episódios de uma hora, as histórias sobre vida móvel são apresentadas semanalmente para o ouvinte.

Escalada

Bateu-se n bidas na m ovo recorde de su ontanha m ais alta do mundo. M ais de 75 0 pessoas escalaram já o Everest em 2019. número d O e mortos ta mbém cre ceu. Ocor sreram 11 mortes ne ta tempor sada. De a cordo com base de da a dos do Him alaia, 5.29 pessoas c 4 hegaram ao topo Everest de do sde 1953.


11 Tecnolo g

ia 5D

A Inglat com a t erra é o mais no ecnolog vo país ia 5 chegou às terra G. A novidade s britân meio da icas po co r mas a su mpanhia telefô nica EE, a rival Vo d disponib afone já pla iliz dade de ar o serviço. A nejaa ssa cone velociixão 900 Mbp s, possib , em torno de ilit e jogos r apidame a baixar !ilm mes n missões t ao vivo d e e fazer transe alta qu alidade.

vi Autorização de viagem oO Parlamento europeu aproivou um novo sistema de autoride zação de viagens para turistas países que não precisam de visto para entrar na União Europeia, caso do Brasil. A autorização prévia de viagem passará a ser exigida a partir de 2021.

Síndrome Após o desaparecimento do turista britânico McAfee no Deserto de Negev, os médicos citaram a síndrome de Jerusalém como causa mais provável. A doença é uma espécie de angústia mental por visitar os lugares sagrados e faz o visitante acreditar na possibilidade de ter sido chamado para desempenhar um papel importante na segunda vinda de Jesus.

Novo apkplançou aplicativo

Faceboo m obcebook co e o a F m o fr Study os sobr oletar dad r usuác e d o v ti je po tros apps emuso de ou Segundo a e . e d a id e res d squisa d rios maio tivo de pe a c li p a ra os m presa, é u tará disponível pa os s n E mercado. dispositivo android er de poderá s usuários e depois ia d Ín a países. EUA e n m outros e m é b m baixado ta

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ENTREVISTA

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196 Sonhos A Disposto a quebrar um recorde no Guiness Book, Anderson vai visitar todos os países do mundo ANA PAULA BARBOSA E GISELE CALISTO FOTOS: ARQUIVO PESSOAL

O empresário Anderson Dias pretende visitar 196 países em pouco mais de um ano. Natural de Salvador, Bahia, sua família é de classe baixa e todos os bairros em que morou na infância eram periferias localizadas no Nordeste brasileiro. Apesar da situação precária, a mãe de Anderson sempre investiu na educação acreditando que o estudo poderia mudar a realidade da família. E assim aconteceu: o garoto que saiu de casa com R$ 350,00 para estudar já possui o título de humano mais rápido do mundo a visitar os 35 países da América. Durante a entrevista, Anderson, que ainda está na estrada, relata desa•ios e momentos memoráveis de sua jornada.

Para você, qual o significado de viajar e conhecer novos lugares? Para mim, viajar é expandir a mente. Quando a gente entende como as outras pessoas vivem – diferente da sua realidade –, saímos da nossa bolha, vemos que não existe certo e errado, e sim diferentes pontos de vista, de formas de viver e até de comer.

Como você consegue ganhar dinheiro para pagar todas as despesas que uma

viagem exige? Como você se sustenta entrando em contato com tantas moedas diferentes? Eu ganho dinheiro produzindo produto próprio. Tenho um curso, mentoria e parcerias no Instagram. Além disso, algumas empresas entram em contato comigo para fazer publicidades. Não gosto muito, mas uso quando preciso. Em suma, são muitos os meios dentro das plataformas digitais que rendem dinheiro para que consiga me manter. Em relação a moedas diferentes é tranquilo. Eu já me acostumei a estar sempre trocando de moeda. Sempre carrego dólar como reserva e vou trocando conforme o país.

Quais os maiores problemas que você já enfrentou em outros países? Eu sofri um assalto na Guiana. Me bateram e levaram todas as minhas coisas. Eu desmaiei, e, quando acordei, não tinha nem celular nem carteira. Eu também sofri preconceito em Trinidad e Tobago. Me colocaram num quarto horrível, além de cobrarem mais pela estadia. Também atrasaram meu check in de propósito. junho 2019. Nomodismo


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Quanto tempo durou o planejamento para a viagem? Como ocorreu, levando em consideração que viajar não exige apenas conhecer os pontos turísticos de um lugar, mas envolve cultura, costumes, conhecimento das leis dos países, entre outros? Houve um planejamento sim. Planejar é muito importante, mas também é preciso ter coragem para fazer. Eu passei em torno de 1 mês programando a rota que faria. Já durante a viagem, fui ajustando o planejamento de rota, clima, língua e de divulgação, entre outros pontos. Eu saí do Brasil para o Paraguai, fazendo a América do Sul primeiro.

O que você leva na mala? Eu levo seis cuecas, cinco pares de meia, uma bota (que !ica pendurada na mochila), dois sapatos, uma calça jeans, três bermudas e seis camisas básicas. Além dos equipamentos eletrônicos: carregador, câmera “normal”, câmera GoPro, dois celulares, dois power banks e um osmo pocket (estabilizador de câmera).

Qual a mensagem que você quer passar para as pessoas dando a volta ao mundo? A mensagem que eu quero passar é que não existe impossível. Às veNomodismo.junho 2019

zes a gente se limita ao que as pessoas falam. Muita gente vive conforme alguns estereótipos sociais, como, por exemplo, terminar o ensino médio com 17 anos, entrar na faculdade com 18 e terminar com 23, arrumar emprego, casar com 26 anos, ter !ilhos aos 30 e se estabelecer. A gente vive com esse padrão, mas por quê não fazer algo que goste de fato? Muitas vezes, as pessoas realizam algo somente pela estabilidade !inanceira ou porque os pais e a família querem. Penso que precisamos enveredar pelo que amamos, independente do que seja. A mensagem que eu quero passar é justamente essa. Para mim, o Brasil é o melhor país do mundo, e, os brasileiros, as melhores pessoas. O brasileiro tem um dom que muitas vezes não é reconhecido. Queria que todos entendessem e valorizassem o seu dom de maneira muito particular: fazer as pessoas acreditarem mais nelas mesmas. Muitas vezes o ser humano não tem nem noção do potencial que tem porque não se enquadra em “padrões”. Fazer isso pode inspirar e despertar nas pessoas o desejo de se descobrir como humano. Por exemplo, um cara que veio da favela, vendeu capinha de celular e conseguiu ter


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uma vida melhor. Se você tem um sonho, só você pode dizer se vai realizá-lo ou não.

Ao acompanhar seu Instagram, percebemos que não há só fotos e indicações de lugares para visitar. Você conta as histórias dos lugares. Como conhecer esses fatos te tornou mais humano, mais empático? Isso mudou sua visão de mundo e sua maneira de ver a vida? Temos uma mania feia de julgar os lugares e as pessoas pelo que a mídia fala. Penso que precisamos sair dessa bolha e procurar outros meios de nos informarmos. Quando você conhece a história do país, consegue entender as pessoas e os costumes que elas seguem. Só é possível compreendermos as expressões se entendermos o lugar diante seu contexto. Conhecer a história do local de destino, é fundamental para aprender como estas pessoas se sentem. Não é só ir para um lugar e tirar uma foto embaixo de um ponto turístico; a gente tem que se colocar no lugar de um nativo e aprender sobre o território.

Como lida com imprevistos no decorrer da viagem? Acredito que saber lidar com essa questão de imprevisto vai muito da inteligência emocional. No co-

meço da minha viagem, eu fazia uma “tempestade em um copo de água”. Eu saí de Recife com 24 anos, um garoto. Hoje, posso dizer que sou um homem. A inteligência emocional que a gente adquire em uma viagem dessa é muito grande. Quando você começa a !icar “cascudo”, digamos assim, vê que os problemas não são tão grandes quanto parecem, e tudo tem uma solução. É nela que você pensa. Hoje, os imprevistos da viagem são mais fáceis de resolver. É preciso parar e traçar um plano para superá-los. Já aconteceu várias vezes de passar pela imigração de um país e os !iscais perguntarem: “cadê a passagem de volta?”. Diante dessa pergunta, muita gente se desespera. Os imprevistos precisam ser resolvidos com uma inteligência emocional, parar pensar e resolver o problema.

O que você vai fazer quando a viagem acabar? A primeira coisa que eu quero fazer quando acabar a viagem é dar um abraço na minha família, nos meus amigos; sentar, me reunir com eles e matar a saudade. Tenho algumas palestras marcadas para fazer no Brasil e gosto muito disso. Entretanto, jamais quero parar de fazer o que eu gosto,

que é !ilmar, e passar um pouco do conhecimento que eu adquiri durante a viagem dentro dos lugares para as pessoas. Meu intuito principal é essa.

Conclusão O garoto que começou a trabalhar aos oito anos costurando e desenhando roupas não é o mesmo. A experiência precoce como comerciante o ajudou a arrecadar o su!iciente para um intercâmbio na Irlanda que abriu sua visão de mundo. O fato de não querer mais viver uma vida “padrão”, criou a vontade de superar limites. Após conhecer sobre o Guinness World Records, Anderson decidiu viajar o mundo e tentar ultrapassar o recorde atual. Dos 196 países, já passou por 117. A viagem que começou em 2018 o permitiu bater o recorde de humano mais rápido em visitar os países da América. Ao ver suas conquistas, quem diria que, quando estudante, passou fome por não ter dinheiro do aluguel e da comida. Vendeu livros e brinquedos para sobreviver. Sua história de vida e o sentimento de superar limites mostra alguém que preza pelo respeito e pelo lado humano de ser, deixando de lado os estereótipos e a visão de coisas “impossíveis”. junho 2019. Nomodismo


RANGO

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Comida: a ambição dos viajantes Viajar em busca de opções gastronômicas oferece novas experiências culturais NATHALIE MONTEIRO E SARA TEIXEIRA

FOTO: SHUTTERSTOCK

Uma coisa é certa, assim como paisagens e pessoas, a culinária também marca os turistas Nomodismo.junho 2019

Viajar em busca de experimentar comidas diferentes serve de motivação para várias pessoas deixarem suas raízes geográ•icas. Desvendar as opções culinárias de países tornou-se uma grande aventura para quem deseja descobrir mais sobre culturas e sentimentos guardados em cada prato. Considerando as possibilidades culinárias das regiões, alguns turistas procuram um bom vinho. Outros preferem comida de feira, mais barata. Há também os que apostam em seus dotes culinários e fazem seu próprio prato, a •im de reproduzir comidas típicas de onde estão. O que eles têm em comum? A vontade de experimentar novas opções gastronômicas em seus destinos. Para aqueles que não sabem, a gastronomia é, basicamente, conhecimento e inteligência. A•inal,

unir uma bebida a um determinado prato de forma a manter aspectos culturais tem lá seu grau de di•iculdade. Além disso, a arte gastronômica cultural envolve utensílios manuseados por nativos. Por exemplo, no Brasil, os brasileiros usam garfo, faca e colher durante as refeições. Já nas nações asiáticas, os naturais têm o costume de usar o hashi, um par de palitinhos. Enquanto isso, outros países têm o hábito de comer com as mãos. Ademais, a gastronomia cultural tem forte relação com a fauna e a •lora. Muitos a•irmam que é bastante comum a natureza mover a cultura alimentar de um local. Em suma, a comida representa um choque entre o ecossistema, o qual provê condições e ingredientes diferentes, e a cultura local, aquela que se aproveita de diversos costumes e recursos materiais.


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Novas aventuras

Como economizar?

Luís Hernández virou nômade digital por causa da gastronomia. Sempre foi apaixonado por novos sabores, fossem eles exóticos ou tradicionais. Isso o motivou a juntar tudo o que tinha de mais importante dentro de uma mochila e deixar para trás sua casa nos Estados Unidos. Atualmente, Hernández se mantém •inanceiramente com produção de vídeos e fotogra•ias, os quais aparecem com frequência em seu canal no YouTube, Nomad Cook, e em seu Instagram, @nomad.cook. Hernández já viajou por diversos países provando comidas consideradas raras, como surströmming, da Suécia, e lampredotto, um sanduíche italiano. Mas a comida que mais fez sucesso em seu paladar foi o pão de queijo mineiro, e agora é sua comida favorita. Já Henrikas Kaskeliavicius conta uma outra história. Ele prefere tirar proveito da gastronomia local por meio de suas próprias mãos. Assim, Kaskeliavicius compra os ingredientes necessários para preparar comidas nativas à própria maneira. Na sua opinião, o turismo gastronômico sairia muito caro.

A cada dia, o turismo gastronômico se torna mais comum. Tacos mexicanos, massas italianas, sorvetes franceses, feijoadas brasileiras, comidas japonesas; tudo é opção quando se trata de procurar novos sabores. No entanto, nem todos os itinerantes têm dinheiro para comer nos lugares mais clássicos de cada país. Por isso, quando precisam economizar, procuram os fast-foods. Mas, para Gustavo Klimczak que já esteve em 24 países, não vale a pena viajar e comer apenas “comidas rápidas”. Portanto, vale ressaltar que esses lanches não representam a única solução para quem deseja poupar dinheiro. A “comida de rua” também pode ajudar aqueles que querem ter contato com a culinária local sem gastar muito. Conforme Klimczak, as comidas de supermercado são as mais acessíveis para os turistas. Eles também podem encontrar comida barata e gostosa em restaurantes populares. Klimczak costuma consumir os clássicos de supermercado, mas não deixa de lado a experiência em restaurantes a •im de provar o mais típico possível de cada local.

O nômade Gabriel Varella foge de locais referenciados por turistas. “Pre•iro comer nos lugares que os ‘locais’ comem. Passo longe de lugares turísticos para comer”, comenta. Ele já esteve em 57 países e considera que o turismo gastronômico não envolve apenas a comida, mas um contato maior com os lugares e com os nativos.

Refeições marcantes Os nômades se lembram muito bem dos lugares que mais marcaram seu paladar. Klimczack escolheu Alemanha e Marrocos, especi•icamente o prato alemão ratsherrenteller. Varella gostou muito da carne de cachorro da Coréia do Norte. Já a mochileira Juliana Lima se encantou pelo salep, bebida popular no Império Turco Otomano, e pelo boeuf bourguignon, ensopado de carne francês. Klimczack pode dizer que vive uma experiência diferente. “Virei vegetariano recentemente, então em 95% dos países que visitei, ainda consumia carne”, aponta. “Hoje, como vegetariano, posso dizer que os pratos árabes são os meus favoritos”. Uma coisa é certa, assim como paisagens e pessoas, a culinária também marca os turistas. junho 2019. Nomodismo


COLINA

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Julie Grudtner

Sem romance

A

o que tudo indica, há uma intensa necessidade de lazer e de trabalho na vida dos nômades digitais. Nos últimos dez anos, boa parte da classe trabalhista norte-americana reduziu a sua carga horária em escritórios. Curiosamente, o que levou tantas pessoas a abandonar o roteiro tradicional de trabalho foi o mesmo motivo que levou os nômades ancestrais à vida de caça: sobrevivência. Hoje, os nômades chamam a busca por sobrevivência, antes física, de “espiritual”. Para eles, o tempo que passarão em determinado local é definido pelo suprimento de suas necessidades e pela sua felicidade. Em vários blogs sobre nomadismo digital, essa busca refere-se a uma vontade de conexão e pertencimento ao mundo. É tentador acreditar que a mudança geográfica constante pode promover algum tipo de excitação pela vida, mas onde sobra espaço para falar sobre burocracias? Nomodismo.junho 2019

A persona digital Alguns falam sobre nomadismo de forma errônea, dizendo que este estilo de vida não passa de uma extensão do ano sabático. Porém, a vida nômade moderna pouco tem a ver com a despreocupação de uma viagem, até porque ninguém quer estar o tempo todo conectado a algum dispositivo tecnológico para se desconectar das responsabilidades do dia a dia. Se a maioria dos nômades trabalha nas áreas de programação e criação de conteúdo online, presume-se que para ser nômade digital, é preciso ser uma pessoa digital. É preciso estar online e também on time. Ao contrário do que muitas pessoas pensam, uma vida e de produção constante não parece muito alheia à criticada vida roteirizada. Nos cernes dos relatos feitos por nômades que mal puderam aproveitar alguns dos seus destinos em função de deadlines apertados, ou que sofreram de ansiedade por

buscarem sempre os melhores preços para as próximas passagens, está a verdade de que nenhum estilo de vida se encontra livre de estresse. As burocracias estão em todos os lugares. Portanto, ninguém precisa viajar o mundo para descobrir isso. Nômade na rua de casa Os nômades modernos fizeram uma grande descoberta. A de que se conectar com o lugar onde se está inserido traz mudanças significativas e pode tornar a passagem do ser humano pela existência mais intensa e divertida. Isso não exclui tardes tediosas ou dores de cabeça, só deixa a essência do nomadismo mais clara. Se ser nômade é, no fim das contas, se conhecer através do contato com o diferente, então é possível ser nômade sem trocar de casa, ao entender que o extraordinário da vida encontra-se em se conectar verdadeiramente com o lugar onde você está, seja ele qual for.


TRIBOS

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POR FERNANDA MARTINEZ

IMAGEM: EDUCIMA.COM

Mídias digitais e seu poder A influência que os materiais midiáticos têm sobre as pessoas A forma mais simples para de•inir a palavra rotina seria: hábito de fazer algo sempre do mesmo modo. Você gosta de rotina? Muitos sofrem com a ideia de viver a mesma coisa todos os dias. Acordar no mesmo horário, comer o mesmo prato, realizar as mesmas tarefas no trabalho, voltar para casa e ligar a tv ou o computador, e logo já é hora de dormir. Ao ler essa introdução alguns podem se sentir cansados ou até negar ter uma rotina. Mas nem todos conseguem fugir disso. Muitos, por questões •inanceiras ou por não visualizar outra forma de seguir a vida, sofrem com a falta de opções acessíveis. Porém, o conteúdo midiático publicado nas redes sociais pode trazer sensação de liberdade. Acompanhar vídeos de viagens e per•is no Instagram faz a maioria conhecer o mundo sem sair de casa. Isso também acaba encorajando alguns a mudar o estilo de vida. Geovana Assis, servidora pública e dona do per•il no Instagram @ parentalizando, percebeu, mediante as mídias sociais, que a rotina não lhe trazia paz. “Meu interesse

surgiu quando constatei que a rotina rígida de trabalho em horários •ixos está ultrapassada e para mim é uma fonte para descontentamento. Isso deixa pouco espaço para a criatividade”, acredita. Ano sabá•co Alguns decidem tirar um ano sabático, como os jovens Eduardo Viero e Mônica Morás. Formados em administração de empresas, em 2014 embarcaram em uma viagem que continua até hoje. Por meio do Blog “Eduardo e Mônica” eles compartilham suas aventuras e principalmente seu trabalho fotográ•ico. Sendo nômades digitais - pessoas que não têm casa •ixa e realizam seu trabalho pela internet ou tecnologias que permitem mobilidade - carregam tudo na mala e o próprio negócio é administrado online. O casal demorou para entender que era ‘nômade digital’. “Tudo aconteceu muito naturalmente, sem pressão ou decisão concreta. Quando percebemos, já levávamos uma vida nômade. Cerca de um ano depois que começamos o ano sabático, planejamos melhor a vida para transformar em um negócio rentável mesmo”, conta Mônica.

O crescimento do Blog ocorre de mês em mês e através dele muitas pessoas são in•luenciadas. De acordo com a psicóloga Ilair Da Cruz, essa in•luência pode ocorrer de duas maneiras: “Tem aquele que vê, desperta um desejo dentro de si, mas controla seus impulsos. E tem quem cria um desejo novo a cada vídeo assistido, a própria mente está condicionada a criar novos desejos. Depende da personalidade do sujeito”, a•irma. Digital em disparada Jovens, adultos e idosos estão perdendo o medo de viajar sozinhos por in•luência do mundo digital. Medo é algo que o lituano Henrikas Kaskeliavicius não considera ter. Desde os 14 anos ele idealizava trabalhar como freelancer e viajar mundo a fora. Ele concretizou seu sonho e há quinze anos desenvolve projetos online para se sustentar. O crescimento das mídias digitais é contínuo. Cada vez mais pessoas tomam a decisão de largar a rotina comum para viver sem lugar •ixo e trabalhar via internet, assim como Henrikas, Eduardo, Mônica e outros ao redor do mundo. junho 2019. Nomodismo


POCHETE

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Carteira viajante Como administrar lucros e gastos antes e durante a vida nômade ANA MAIRENE ALVES E JOCEMARA MAI FOTO: SHUTTERSTOCK

Sabe-se bem que nem tudo na vida são •lores. Quem decide ser nômade não vive apenas de passeios e trips pelo mundo. A•inal, viajar não paga as contas e todo mundo tem despesas. Mas o que fazer com elas? Existem formas consideradas mais informais e acessíveis de se conseguir renda. Uma delas é trabalhar com plataformas digitais, como blogs e canais no Youtube, como a maioria dos nômades faz.

Principais rendas

A cada mudança, surge uma nova forma de recomeçar, de aprender novas culturas, costumes e de se adaptar a um novo local Nomodismo.junho 2019

Bruno Azevedo Nunes é administrador. Ao viajar para fora do Brasil em 2003 descobriu a necessidade constante de estar em situações que exigissem adaptação, e, por •im, resolveu conciliar o trabalho com uma vida nômade. Atualmente, trabalha como trader pro•issional, comprando e vendendo ativos de renda variável, e, sempre que pode, tira dúvidas dos seguidores nas redes sociais. “Minha

rotina não veio da vida nômade, e sim o oposto”, re•lete. Para Nunes, sua pro•issão o desa•ia e o obriga a se adaptar, e ele ainda garante nunca ter faltado recursos para o sustento. “Tudo vai se encaixando e acontecendo de uma forma melhor do que planejou”. Já aqueles que preferem trabalhar com os próprios recursos são chamados de nômades autônomos. Desenvolvem empreendimentos próprios, como artesanatos, música e dança. Essa foi uma das opções de Breno Branches. O arquiteto preferiu usar a música como recurso •inanceiro. “Passei grande parte da minha vida tranca•iado em um escritório trabalhando para outras pessoas, imaginando como seria viver um grande sonho – ter a liberdade de viver onde quisesse,” lembra. Branches enfrentou alguns problemas •inanceiros no começo, até •icou sem saber


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onde dormir, mas garante que essa foi a melhor etapa de sua jornada. “Hoje eu digo que sei me virar em qualquer situação que a vida me jogar”, conta. Felipe Schiavon, de 21 anos, integra o grupo de atletas nômades, que viaja para investir na carreira. Como lutador de jiu-jitsu, já recebeu os títulos de Campeão Paulista 2014, Campeão American Nationals peso absoluto, terceiro lugar no campeonato europeu e vice-campeão mundial. Entretanto, quem vê as medalhas do atleta não imagina os desa!ios por trás delas. Natural de Jacareí, interior de São Paulo, começou sua jornada como nômade funcional. Atuava como segurança e trabalhador braçal em construções e mudanças, um de recurso comum entre viajantes de curtas temporadas. Para Schiavon, a jornada não foi fácil, mas as coisas melhoraram após começar a trabalhar em uma academia.

Equilíbrio financeiro A função escolhida depende do per!il de cada pessoa e das oportunidades que encontra. O nomadis-

mo pode evitar certos gastos, mas outros surgem. O economista Haroldo Torres dá dicas para ajudar no equilíbrio !inanceiro. Para quem deseja ser nômade, Torres aconselha ter um orçamento que mostre o custo !ixo mensal, por exemplo, com alimentação e educação. O orçamento é o que ajuda na de!inição de um valor mínimo necessário a !im de cobrir todas as despesas. A outra dica é ter uma poupança como garantia. “É importante ter primeiro uma ideia de qual é o valor necessário para sua subsistência ou a mínima manutenção. Esse valor precisa ter pelo menos como poupança, caso não consiga uma atividade remunerada em alguns períodos”, aconselha. Para os que já vivem como nômades, é necessário concentrar os gastos variáveis. Um exemplo é a habitação, o maior peso !ixo. Outra forma é fazer um colchão: uma espécie de reserva !inanceira para os momentos de oscilação, quando não se está desempenhando nenhum trabalho. O economista ainda recomenda utilizar as reservas também para fazer investimentos.

Controle monetário Alguns iniciam a vida nômade em busca de conhecimento, outros querem ser pro!issionais ou realizar um sonho. Para que isso aconteça, precisa haver desapego - de objetos, e, algumas vezes, até mesmo de pessoas. Cada mudança é uma nova forma de recomeçar, de aprender novas culturas, de se adaptar a um novo local. Para a escolha desse estilo de vida, o despreparo, para alguns, é uma carta na manga e proporciona uma experiência diferente. “Quanto mais despreparado você estiver, mais forte vai !icar ao aprender a lidar com a vida”, aconselha Branches. Outros se baseiam no preparo, a !im de conseguir aproveitar ao máximo a vida nômade. “Eu acho mais importante é saber administrar seu dinheiro, fazendo curso administrativo ou pedindo ajuda a alguém que possa te ajudar com dicas, como foi no meu caso”, contrapõe Schiavon. Quem escolhe esse estilo de vida pode ter uma certeza: a espera de que cada dia será uma “caixinha de surpresas” - com ou sem preparo !inanceiro. junho 2019. Nomodismo


TUDO BEM?

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Aventura segura

Medidas preventivas de saúde precisam constar no check list de preparação para qualquer viagem KELYSE RODRIGUES, MARIA TEÓFILO E DAMÁRIS GONÇALVES FOTOS: SHUTTERSTOCK

P

ara muitas pessoas, o conceito de lar remete a ideia de uma casa •ísica. Já para os nômades, trata-se de uma imensidão de possibilidades pelo mundo. O “lar”, com endereço •ixo é como uma “bolha superprotetora”. Viajantes itinerantes não desejam isto para si. Longe da bolha, experimentam múltiplos lugares, coisas novas sabores, relacionamentos, paisagens. Embora encontrem certa liberdade, vivem sob alguns riscos. A viagem perfeita, bem planejada, pode ser arruinada por algumas enfermidades. Foi isso o que aconteceu com Pedro Motta, engenheiro de produção, que

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realizou expedição ao Peru. Sua intenção era subir a Vinicunca, a “Montanha Arco-íris”. Depois de quase 20 horas viajando de ônibus entre Lima e Cusco, o engenheiro começou a subida da trilha. A Vinicunca é uma das montanhas mais altas do país. Seu topo está a 5.200 metros de altitude. Foi exatamente a altitute que estragou o passeio de Motta. Sem preparação para enfrentar o ar rarefeito, logo sentiu os efeitos da falta de oxigenação. Visão turva, canseira, dor de cabeça, ansia. Pensou que pudesse ser por causa da altitude. Neste caso, se Motta tivesse mascado folhas de coca (como os peruanos fazem)

ou tomado um pouco do chá da planta, talvez, tivesse aproveitado melhor o passeio. Só conseguiu terminar a trilha devido a muito esforço. O engenheiro conta que já tinha enfrentado problemas de saúde em outra ocasião. “Cheguei a •icar doente durante minha viagem de 100 dias na Europa. Mas a situação no Peru foi mais tensa”, relembra. Motta sentiu dores fortíssimas nos músculos durante 15 dias, além de 11 dias com febre. Os médicos demoraram para descobrir o que ele tinha. “Sorte que eu estava na casa de um amigo e me tratei lá. Todos os médicos que eu via pediam exames


23 de HIV, porque eu estava com todos os sintomas”, revela. Após diversas análises, descobriu-se ser portador da toxoplasmose, infecção causada por um parasita encontrado nas fezes de gatos.

cias culinárias infelizes em suas aventuras. “Depois de chegar ao Pará, eu fui comer uma castanha que estava crua! Nossa! Nesse dia quase que fechei minha glote”, relata.

Alegria ou alergia? Segundo informações da Associação Brasileira de Alergias e Imunologia (Asbai), - em pesquisa divulgada pela revista Veja em 2018 - alimentos como leite, ovo, soja, trigo, nozes, amendoim, peixe e crustáceos são os maiores causadores de reações alérgicas. Se um indivíduo alérgico ingerir tais substâncias, pode desenvolver reação ana!ilática. A reação ana!ilática é uma resposta exagerada do organismo ante um elemento estranho. Pode se apresentar em vários níveis, desde uma coceira generalizada e inchaços, até arritmias cardíacas e colapso vascular (choque ana!ilático). Durante viagens, experimentar comidas especí!icas é quase obrigação. Temperos novos, sabores inusitados e ingredientes diferentes atraem os turistas. Mas é preciso tomar cuidado. Motta também já teve experiên-

Atenção e cuidado O nômade Bruno Nunes fala sobre outros perigos a que os itinerantes se expõem. “Já caí muitas vezes de snowboard e me machuquei bastante”, conta. Ele também enfatiza que sempre viaja com uma série de vitaminas para não adoecer. “Levo complexo Vit, ômega 3, biotina, magnésio, vitamina D e B12”, explica. Seja por uma dor de garganta ou uma reação alérgica à castanha, o sucesso da viagem pode !icar ameaçado. “Agora !ico de olho nas orientações dos locais e estudo as culturas na hora de viajar. É um jeito de evitar problemas” destaca Motta. Prevenção por vacinas Antes de viajar, é preciso seguir alguns passos. Entre os primeiros, de!inir o destino e cuidar dos pormenores legais para ir aos locais desejados. Quando uma pessoa planeja uma viagem

"Ao viajar, experimentar comidas especificas de cada destino é quase obrigação. Temperos novos, gostos inusitados, ingredientes diferentes atraem os turistas. Mas é preciso tomar cuidado"

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para diversos países, além de conhecer as regras de entrada, bem como os vistos necessários, ela precisa se atentar a outras questões. Exemplo são os requerimentos de saúde a serem cumpridos, tais como as vacinas. Para comprovar a dose recebida de cada vacina, o viajante precisa tirar um certi•icado internacional da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que pode ser adquirido em aeroportos. Gisele Marinho, enfermeira no Hospital das Clínicas de São Paulo, a•irma que as vacinas mais procuradas são as meningocócicas e a da febre amarela. “As doses exigidas variam entre os países, pois se relacionam com as epidemias enferentadas em cada região”, explica. Esse passo é imprescindível para quem quer viajar. Prevenir faz parte da aventura. Saúde mental Para o •ilósofo Gilles Deleuze, o nômade é uma pessoa que muda constantemente de um ambiente familiar para um nãofamiliar, ou seja, que está em um processo de desterritorialização. Para ele, o que faz uma pessoa Nomodismo.junho 2019

adotar o nomadismo como estilo de vida é justamente a ideia de movimento. Abigail Marinho da Silva, psicóloga que estuda a saúde mental dos nômades, acredita que para ele, o signi•icado da vida se encontra no processo de circular, de se ambientar, criar novos territórios e novas práticas. “O nômade é um inventor de existência, ele não é uma pessoa que pensa como outra qualquer. Para ele não é importante ter uma casa, uma panela, projeto de futuro. Nada disso importa”, observa. A principal diferença entre um turista e um nômade é que o turista retorna à sua terra-natal. Já o nômade, circula, não se prende a lugares, não necessita de laços para viver. Remédio na bolsa Há muitos tipos de nômades. Alguns conseguem manter o trabalho mesmo viajando. Caso de Lucas Teixeira, casado com Beatriz. Ele abraçou o nomadismo quando percebeu que poderia continuar trabalhando sem ter endereço •ixo. Teixeira cuidava de uma agência que prestava serviços

para clientes de todo o Brasil. Percebendo que grande parte dos trabalhos eram feitos por meio das redes sociais e que os clientes não precisavam ir à agência para adquirir os serviços, decidiu se aventurar com a esposa a •im de conhecer novos lugares. “Conhecemos boa parte de Minas Gerais.Capitólio, Ouro Preto, Tiradentes, Serra do Cipó, Caparaó, Carrancas. Esses foram alguns dos lugares que a gente passou”, conta. Ao falar sobre a experiência, Teixeira explica que está só no início da jornada, mas se sente realizado pela escolha que fez. Quando questionado sobre os cuidados que adotam em relação à saúde enquanto viajam, o casal a•irma que a única preocupação é andar com medicamentos básicos para dor e febre na mala. Novos contatos Os viajantes ainda tem outra preocupação. O perigo de relacionar-se sexualmente com pessoas aleatórias. A biomédica imunologista Nathalia Cruz comenta que, neste caso, uma doença sexualmente transmissível (DST) é sempre um risco.


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explica: “As relações sexuais nesse contexto sempre devem ser realizadas com proteção. A•inal, não há cura para doenças como a Aids”, enfatiza. Para Nathalia, os nômades podem adquirir doenças tanto quanto transmiti-las. É por isso que todos os viajantes precisam sempre se atentar a medidas básicas de proteção. É um detalhe simples, mas importante para impedir a disseminação de problemas graves. Não adianta nada se aventurar pelo mundo sem tomar os devidos cuidados em relação à saúde. Emergência. E agora? Muitas vezes, as pessoas não pensam nas emergências que podem surgir durante a viagem. Um acidente, assim como o desenvolvimento de alguma enfermidade, são riscos envolvidos no ato de viajar. O que fazer nestes casos? Teixeira revela uma opção para resolver esse problema, utilizada durante experiência pelo Brasil. Em um acidente, Beatriz quebrou um dedo do pé. Procurou o Sistema Único de Saúde (SUS) – um dos maiores sistemas de saúde pública do mundo - da

região que visitava, e recebeu o atendimento necessário. Apesar de não pertencer ao estado no qual se encontrava, o casal não percebeu nenhuma di•iculdade para receber atendimento. Quando se trata de viagens internacionais, o nômade precisa estar amparado por alguma empresa de seguros. Desde o ano de 2014, o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) determinou que serviços como despesas médicas, hospitalares e odontológicas são coberturas obrigatórias ao contratar o Seguro Viagem para o exterior. O seguro oferece indenização caso ocorra algum problema. Os bene•ícios disponibilizados dependem do tipo de pacote escolhido. De acordo com a responsável pelo serviço de seguros, Viviane Dionísio, da empresa IBRATUR Turismo, não contratar um sistema de proteção para viagens internacionais pode pesar no bolso. “Sistema de saúde fora do Brasil é caríssimo, e ao utilizar dos serviços do hospital, a pessoa precisa pagar a vista! Lá eles não tem sistema de parcelamento!”, alerta.

O seguro pode ser adquirido em agências de viagem. Os pacotes básicos estipulam um valor que cobrirá cada acidente que a pessoa sofrer. O seguro é contratado por diária, mas também está disponível para pacotes anuais. Viviane aponta que, caso haja problemas no exterior, acionar o seguro não é di•icil. “Basta acionar o número de whatsapp recebido na contratação e o cliente receberá orientações no seu idioma”, acrescenta. Preparação para viajar Escolher o nomadismo como opção de vida é uma iniciativa di•ícil, mas corajosa. Ao contrário do que algumas pessoas pensam, esta vida exige muito preparo. Entre os pré-requisitos que devem ser cumpridos por quem deseja “explorar o mundo”, o principal diz respeito à providencias em relação à saúde. É necessário fazer um check-up, acionar um seguro e levar na bagem todas as medicações mais básicas. Análgésicos, antitérmicos, curativos e pomadas. Caso o viajante tome remédios controlados, deve levar a medicação acompanhada de receita médica. junho 2019. Nomodismo


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Vanlife :

a reinvenção da vida Eles renunciam ao luxo, rotina e segurança financeira, a fim de saciar sua obstinação por conhecer o mundo e viver intensamente. Deixaram de simbolizar “rebeldia” para ser invejados nas redes sociais STEPHAN MAX, THAIS FOWLER FOTO: ARQUIVO PESSOAL E SHUTTERSTOCK

Imagine abrir a janela do seu quarto cada dia com uma paisagem diferente. Na segunda-feira, o cenário é formado por campos de lavanda com montanhas nevadas ao fundo. Na terça, um lago cristalino rodeado de pinheiros verdejantes. Na quarta, uma praia deserta de ondas baixas e suaves. Isso pode até soar fantasioso, mas faz parte da realidade de vários aventureiros ao redor do mundo com ousadia su•iciente para viajar em tempo integral dentro de uma casa ambulante. Ao reinventar o espaço de um veículo para se tornar sua casa, os adeptos desse estilo de vida deixam de lado a competição por status e descomplicam a de•inição de qualidade de vida da nossa era. Eles criaram o próprio lifestyle: a vanlife. E, por mais rebelde que possa soar sua origem, a nova geração do movimento só busca um pouco de sombra e água fresca.

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28 Os povos nômades ancestrais eram, em sua maioria, caçadores-coletores. Se mudavam a •im de buscar novas pastagens para o gado de acordo com a necessidade momentânea. No entanto, não cultivavam habilidades relacionadas à agricultura. Saltando para os tempos modernos, longe das tribos bárbaras ou dos povos que atravessavam desertos montados em camelos, vemos um movimento nômade bem diferente. Conhecido entre nós, talvez tenha in•luenciado muitos a se arriscarem pelo mundo em busca de novas experiências. Hoje é comum andar nas ruas e olhar a moda inspirada nesses nômades modernos: os hippies. Para o antropólogo Jesus Penã, esse movimento in•luencia outros grupos. “A cultura hippie é um movimento cultural ‘libertário’ e paci•ista que surgiu nos anos 60, nos Estados Unidos. Hoje, permanece socialmente ativa de formas diferentes e em outros movimentos, como neohippies, e in•luencia diretamente outros, como o nomadismo”, explica. De acordo com o antropólogo, os hippies enxergavam o paternalismo governamental, as corporações industriais e os valores sociais tradicionais como parte de um estabelecimento único que não tinha legitimidade. “O movimento nômade é um movimento ativista e ambientalista, composto de músicos, cantores, dançarinos, coreógrafos, editores grá•icos, pintores, artesãos e todas aquelas pessoas que, de um jeito ou outro, buscam formas de fazer protestos culturais

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29 em um ambiente urbano, devido aos grandes problemas ambientais que sofremos com a chegada da industrialização e da globalização”, constata. Na década de 1970, grande parte do estilo hippie se integrou à cultura principal, mas sua essência foi praticamente deixada para trás. A grande imprensa perdeu o interesse na subcultura hippie, apesar de muitos integrantes do movimento terem continuado a manter profundas ligações com esta. Como os hippies quiseram evitar publicidade após a era do Verão do Amor e de Woodstock, surgiu um mito popular de que o movimento não existia mais. Entretanto, ele continuou em comunidades mundo afora com andarilhos que acompanhavam suas bandas preferidas, ou, às vezes, nos interstícios da economia global. Ainda hoje, muitos se encontram em festivais para celebrar a vida e o amor. O jeito nômade de viver não é novidade, mas muitos ainda •icam confusos por não o entenderem. Os nômades também podem ser chamados de famílias móveis, vanslifers, nômades digitais, entre outros. Quem acha que esse estilo de vida é estranho e desajustado se engana. A tese de doutorado da brasileira Déborah Levitan, do Instituto de Psicologia e Educação da Universidade de Neuchâtel, na Suíça, traça um per•il inédito desses migrantes: desconstrói a imagem de desajuste, solidão, falta de rotina e privilégio, e mostra que são famílias unidas e estáveis. Na pesquisa, foram considerados casais com •ilhos que vi-

vem atualmente na Suíça, mas já moraram em pelo menos três países. A psicóloga analisou dados de 919 famílias móveis em diversas nacionalidades, incluindo brasileiras, e entrevistou em profundidade 29 delas. Nessa categoria estão expatriados, pessoas com posições diversas em empresas internacionais, diplomatas e pro•issionais liberais. Uma característica em comum entre eles era a migração em busca de trabalho. Tradicionalmente, a migração por motivos pro•issionais é encarada como uma forma privilegiada de mobilidade. A tendência, portanto, é pensar que famílias que mudam de país por trabalho passam por uma transição não tão impactante, com apoio das mais diversas fontes que garantem sua fácil adaptação e integração ao local de destino. Porém, a análise das condições revelou outra realidade. De acordo com os resultados, essas famílias recebem pouco apoio, mesmo em um país desenvolvido como a Suíça. Metade dos entrevistados reporta não contar com ajuda na mudança para um novo país. Em particular, cerca de quatro em cada dez não indicam o empregador como fonte de suporte. Como resultado, têm que lidar com múltiplos aspectos da adaptação sob condições semelhantes a dos residentes permanentes, mas sem as mesmas redes de apoio. A pesquisa também revela que a ideia de que a mobilidade internacional repetida possa prejudicar a família é mal fundamentada. Os resultados su-

Ao reinventar o espaço de um veículo para se tornar sua casa, os adeptos deste estilo de vida deixam de lado a competição por status

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"Um dia sentamos e nos perguntamos que estilo de vida estaríamos vivendo naquele momento se tivéssemos todo dinheiro do mundo. Concluímos que viajaríamos o tempo todo"

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gerem que, quanto maior a frequência com que membros da família migram juntos, mais os laços familiares se fortalecem. Aumenta também a capacidade de enfrentar mudanças, que se transformam em oportunidades de crescimento. Esses grupos mantêm rotinas consideravelmente estáveis e metódicas, e, onde quer que estejam, cultivam amigos e sabem usar a rede de contatos a seu favor. A mesma lógica é utilizada em relação a objetos. Como precisam se mudar com certa frequência, essas famílias tiveram que criar um modo de se relacionar com seus móveis e outros bens materiais. A estratégia re•lete também o fato de os pacotes de expatriação estarem cada vez mais magros. Outra característica é a incorporação das culturas por onde passam. Enquanto o migrante •ixo tende a reforçar as diferenças entre a cultura do país de origem e o atual, esses grupos trazem a hibridização como estratégia para se sentir em casa em qualquer lugar e preservar um grau de mobilidade em razão de mudanças futuras. De acordo com Débora, o resultado da pesquisa tem implicações para políticas públicas. A tese mostrou que 75% das crianças nômades estudam em escolas públicas na Suíça. Isso cria desa•ios para a integração de migrantes temporários. A ideia Foi ainda na época de colégio que J.R. e Kit decidiram ser piratas sem rumo, desbravando

o mundo, descobrindo novas paisagens e procurando novas espécies de pássaros. “Em 2012, vendemos tudo o que tínhamos, compramos a Sunshine (kombi alaranjada do casal) e iniciamos uma viagem sem linha de chegada”, registra Kit no Instagram do projeto @idletheorybus, onde também divulga seu diário de bordo para seus mais de 155 mil seguidores. Relatos como esse fazem crer que algumas pessoas nasceram para a vanlife. É como se fosse uma extensão natural de sua personalidade. Quando Fernanda Silva conheceu seu companheiro Leandro Puglia há 11 anos, ambos tinham acabado de chegar à maioridade. Aos 18, a ideia de viver viajando estava muito distante. Mudaram-se para Milão a •im de engatar a vida; Leandro trabalhava como engenheiro, e, Fernanda, como designer. “Um dia sentamos e nos perguntamos que estilo de vida estaríamos vivendo naquele momento se tivéssemos todo o dinheiro do mundo. Concluímos que viajaríamos o tempo todo. Mas, e a saudade de casa? Teríamos que dar um jeito de levar a casa conosco. Concluímos que, vivendo em uma van, poderíamos viajar em tempo integral sem sair de casa”, relata Fernanda. O documentário de Allan Robins “The Reality of #VanLife” (2018), coloca que “vanlife é um movimento a favor da liberdade (…), um tipo de jogo para jovens”. De fato, a maioria dos adeptos possui entre 20 e 28 anos, em sua maioria com pelo menos dois objetivos


31 em comum: conhecer o mundo e a si mesmos. A van e os equipamentos Se, por um lado, motorhomes e trailers tendem a so!isticar-se a cada geração, a ideia de viver em um veículo simples tem remado cada vez mais contra a maré. É o que os nômades do documentário citado anteriormente acreditam. Para eles, o caminho da satisfação na estrada está na simplicidade. Um dos entrevistados cita: “Não acredito que viver em uma van seja para qualquer pessoa. Sinto que a vanlife pode ser algo confortável, mas, para isso, você precisa estar confortável em meio ao desconforto. Nossa van tinha um fogãozinho, uma cama… só o básico do básico. Das coisas de cozinha só levamos o essencial, e logo na primeira curva metade das nossas coisas quebraram! Vai ver era um sinal”. O luxo agora é uma exceção, e a simplicidade, a regra. Certas vans possuem banheiros, geladeira e outras benesses, enquanto outras contam apenas com um colchão. A rota Ser vanlifer não é, necessariamente, se preocupar sempre com a rota. Esse nomadismo que prega o desapego e a simplicidade segue seu próprio rumo, e alguns lugares são mais propícios para o desenvolvimento dO estilo de vida. Entre os mais chamativos, estão os Estados Unidos - país pioneiro do movimento formalmente estabelecido - e a Austrália - com seus mais de

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32 50 mil quilômetros de extensão litorânea.Mas, ao falar de continentes, o destino mais comum é a Europa. Mas existe quem prefere •icar dentro do próprio país e explorar riquezas que, de outra maneira, não seriam tão vistas. Alessandra e Rogério viajam pelo Brasil há nove meses em sua Kombi. “Não temos uma rota de•inida. Nosso objetivo é conhecer o Brasil entre três e cinco anos”, conta Rogério. Já Fernanda, que viajou por oito meses com seu companheiro Leandro Puglia, explicita as di•iculdades de viajar em terras tupiniquins: “na Europa, em 20 minutos você está em um lugar totalmente diferente. A realidade é que, no Brasil, também tendemos a alimentar mais medos”. O casal fez amigos pela internet que viajam pelo Brasil e gostam da ideia. “Começamos pela Itália. Depois, fomos para a Croácia, e, então, Eslovênia. Voltamos para a Itália, e migramos para Portugal. Não descartamos a possibilidade de um dia viajar pelo Brasil”, acrescenta. A ro•na E quando, além da rota, a rotina também não é necessária? Acordar em lugares diferentes não signi•ica que todos os dias sejam desa•iadores, mas sim imprevisíveis. Em uma casa com rodas, os maiores choques de adaptação são as necessidades •isiológicas, o banho e a alimentação. “Às vezes, para você comer, precisa atravessar uma trilha, e, por isso, teria que acordar cedo. Outras vezes, •icávamos em uma praia perto de centros comer-

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33 ciais e despertávamos tarde. Ficávamos olhando a praia”, relata Leandro. Ele, que recentemente deixou de ser nômade junto à sua companheira, ainda revela que “conservar comida era impensável. Fazíamos comida todos os dias, almoço e jantar. Comíamos muitos enlatados no início, mas, com o tempo, fomos aprendendo a lidar com o tempo de conservação das frutas, legumes e verduras. Deixamos os enlatados pouco a pouco”. Além disso, reforça que, quem adere o estilo de vida vanlifer, deve se conformar com a falta de banhos diários. Leandro admite que o uso de banheiros públicos ou “•icar atrás da moita” não foi problema, “mas o banho foi sim um obstáculo”. A prática de exercícios •ísicos e esportes também acompanha o dia a dia dos viajantes sobre rodas. Ned e Emily viajam por zonas inóspitas dos Estados Unidos em sua Kombi 1992 equipada com duas bicicletas na parte de trás. Também possuem bambolês pendurados nas laterais, além de materiais apropriados para ginástica, pilates, uma prancha de surf e uma de snowboard. Fernanda vê na própria quebra de rotina uma oportunidade de exercitar-se: “Não havia como ser igual já que, a cada dia, o ambiente é outro e as circunstâncias mudam. Talvez a primeira descoberta que fazemos quando decidimos morar em uma van é se dar conta de que seu novo lar não é a van em si, mas o mundo. Você passa o dia inteiro do lado de fora escalando pedras, nadando em piscinas naturais e buscando

frutos em árvores. O exercício •ísico é uma consequência natural deste estilo de vida”, observa. O sustento Uma das primeiras indagações que vêm à mente ao nos depararmos com esse estilo de vida é a forma de sustento dos vanlifers. “Comentam em nosso canal no YouTube: ‘rico é assim mesmo’; ‘gastando a herança’; mas, quando saímos, tínhamos 300 euros no bolso, quase nada. Depois descobrimos que era justamente a média que precisávamos para viver em nossa van! No começo, gastamos o dobro, mas, com o tempo, aprendemos a nos adaptar e economizar”, conta Puglia, que se sustentou nos oito meses de vanlife como engenheiro freelancer. Sua companheira, Fernanda, virou youtuber e vendia ilustrações pela internet. Ela esclarece que seus gastos “eram basicamente combustível, comida, internet e gás para o fogão, que era bem barato. A verdade é que nunca sabíamos quanto dinheiro teríamos, mas também não nos preocupávamos com aquilo. Numa sociedade onde dinheiro é sinônimo de segurança, isso parece ser loucura. Mas descobrimos que é ilusão. Dinheiro não é segurança. Ter uns aos outros, sim”. Também existem estratégias para gastar menos na estrada: “o maior gasto dentro de uma van realmente é o combustível. Então se você não quer ou não pode gastar muito, é só não andar muito. Chegamos a •icar duas semanas parados no mesmo lugar, numa boa. Se ganhávamos menos, andávamos menos”, explica Puglia.

"Numa sociedade onde dinheiro é sinônimo de segurança, isto parece ser loucura. Mas descobrimos que é ilusão. Dinheiro não é segurança. Ter uns aos outros sim."

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34 A companhia Majoritariamente, vanlifers viajam em casais e famílias como a de Robin. Ele viaja com a esposa e seus três !ilhos pequenos, retratados no documentário “VanLifers: portrait of an alternative lifestyle”, de 2017. Os grandes polos de nômades oferecem áreas de campings que facilitam o senso de comunidade entre eles. “Vanlifers se reconhecem como família. Às vezes nos apegamos e andamos juntos em pequenas caravanas. Chegamos a viajar um mês com um casal”, relembra Fernanda. “Dávamos muitas caronas. Uma vez, demos carona pra um cara do Polo Norte. Eu nem sabia que alguém morava lá (risos)”, completa.

"Talvez o maior mérito da vanlife esteja justamente naquilo que lhe "falta" - pouco bagagem física

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Vale a pena? No vídeo do YouTube “Why I failed vanlife” (“Por que falhei na vanlife, em tradução livre), Jonathan Doornenbal explica por que não deu certo com o estilo de vida alternativo: “vi fotos e vídeos na internet e achei incrível, mas depois de um mês decidi voltar para casa. Não sabia para onde ir, nem o que fazer com meu tempo. Eu só cozinhava e limpava a van”. Fernanda admite que viver na van também possuía seus contras. “Quando chove por cinco dias seguidos, você faz o quê? Fica trancado. O frio e a chuva atrapalhavam coisas como banho e uso do banheiro. Quando chovia muito, íamos para a cidade, e !icávamos em uma cafeteria ou algo assim, para não precisar !icar dentro da van. Mas, faz parte”, admite. Ela deixou temporariamente a vanlife quando descobriu estar grávida. “A van ba-

lançava muito e me deixava enjoada. Muitas vezes, não queria sair da cama. Cogitamos voltar a viajar, mas, atualmente partimos para uma nova aventura”, esclarece. Tracy e John, retratados no documentário “VanLifers: portrait of an alternative lifestyle”, defendem que o valor de seu estilo de vida está em coisas que o dinheiro não pode comprar. “Às vezes, quando penso em desistir, olho para a vista, o pôr do sol, e penso: tenho esta vista, que normalmente se paga caríssimo em um hotel cinco estrelas para estar em um lugar tão lindo. Sou a pessoa mais sortuda deste mundo”, admite John, satisfeito. “Estar dentro da natureza possui uma energia única. Conhecer vários lugares que nunca pensei ou havia ouvido falar faz tudo valer a pena. A sensação de liberdade é algo que dá muita satisfação. Acima de tudo, percebemos que precisamos de quase nada para sermos felizes. Conhecemos um casal com uma !ilhinha de uns 2 anos que não tinha nem brinquedos. Ela brincava com folhas e galhos no chão, cães que passavam, qualquer coisa, e estava completamente feliz com aquilo”, conta Fernanda. Quem mora em uma casa móvel tem muita história para contar. Talvez o maior mérito da vanlife esteja justamente naquilo que tem “falta” - a pouca quantidade de bagagem !ísica. Mas, a bagagem que realmente importa na vida - diga-se de passagem -, como experiências e aprendizados, não cabem nem em uma

mansão. Só o mundo inteiro consegue abrigá-la.


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FERNANDA MARTÍNEZ

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COLINA

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Victor Sotero

“Ventos nômades”

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ocê já pensou como seria o seu hoje, se o sopro das nuvens fosse senhor do seu tempo? Como seriam as memórias, se fossem veladas pela experiência do novo e exótico? Ventos nômades nasceu de uma brasileira enfeitiçada por culturas diferentes, decidida a se perder além-mar para se achar dentro de si. Nascida em Salvador (BA), Manuela Marques Tchoe teve a primeira edição do seu livro publicada em 2017, mas foi só em 2018, por meio da Editora Pendragon, que a obra recebeu repercussão. A escritora vive na Alemanha desde 2005. “Quantas vezes, numa viagem, nos permitimos ver a vida com outros olhos?” – esta é a premissa do livro. A coleção de contos leva o leitor a navegar pelas descobertas dos personagens criados. Os enredos perpassam pelo amor de pessoas com etnias diferentes e excursões em lugares forasteiros. Contudo, a essência da obra litertária é clara: a jornada humana e a procura por ela. Nomodismo.junho 2019

Tudo o que ele mais queria era acabar com a saudade da Bahia, mas os ventos frios e o céu cinzento de Munique não permitiam. Tudo o que mais sonhava era desbravar terras distantes, mas o lugar onde nascera o prendia, pedindolhe para voltar às areias frescas das praias ensolaradas da Bahia. O primeiro conto – Milagres da Praça do Rei – introduz Guilherme, um nordestino que deixou o calor de casa para estudar e experimentar o frio da capital bávara. Poucos meses depois de chegar à Alemanha, tinha apenas o anseio de viver a alegria independente do sol e do calor, como se o tempo não tivesse in!luência na sua vida. No !inal das contas, o personagem revela triunfo. “Se antes meu coração mais parecia uma caatinga, seco e sem vida, veio uma chuva intempestiva trazendo esperança, vida nova para a aridez que meu peito carregava”. Entre as dez aventuras do livro, destaca-se a história de uma norte-americana à beira

da morte que encontra paz e abraço nas águas da ilha grega em Creta. A narrativa sinaliza a principal temática da obra de Tchoe: autodescoberta. Há cinco anos ininterruptos a doença levava rápido os poucos momentos de paz e eternizava as preocupações inerentes da moça. Depois de receber a notícia de que o tratamento não obtivera resultado, a norte-americana e o esposo decidiram largar tudo para realizar a última viagem da família. Foi perto do mar, onde ela sempre acalmava as suas preocupações, que a estadunidense decidiu passar a última estação. O conto termina com o último abraço da moça, as ondas azuladas da Ilha de Creta e uma mensagem para o leitor: “A morte iminente traz uma claridade de prioridade”. Manuela Tchoe levou para o papel não apenas as suas experiências como imigrante, mas a essência do itinerante – busca por lugares que não se limitam a territórios, com encontros e afetos internos.


CARONA

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POR ELIANDRA ZANQUETTA

FOTO: EXPLORA STORIES

Lugares e singularidades Todo lugar tem características próprias, algumas pessoas sonham conhecer todos os lugares, mas todas as pessoas tem lugares que as representam A variedade cultural dos países, exibida na arquitetura, estilo de vida dos moradores, funcionamento político e até no clima, fala da essência do povo. Todo viajante itinerante, por sua vez, não pertence à uma única cultura ou região. Quem gosta de perambular costuma viajar a lugares muito procurados por turistas, mas pode optar por regiões especí•icas que revelem singularidades especiais. Saas-Fee é uma comuna no cantão Valais com menos de dois mil habitantes. Em meio aos Alpes suíços, as casas de madeira parecem desaparecer na paisagem. As cores marrom, preto, vermelho e bege predominam dentro e fora dos locais, com iluminação su•iciente para relembrar as épocas natalinas. Localizada a 38 quilômetros de Zermatt, principal ponto turístico na Suíça, a hotelaria e alimentação são mais economicas. “Lá havia apenas moradores das redondezas que costumam passar uma temporada com os familiares. Em muitos restaurantes não havia menu em inglês. Assim, pude realmente imergir na cultura”, aponta Gabriela Siqueira, colecionadora de viagens a territórios fora de rotas turísticas.

Culturas miscelâneas Aos interessados em história e obras arquitetônicas, a Espanha tem um conhecido município tricultural. Os monumentos medievais revelam atributos judaicos, cristãos e islâmicos. Toledo, 70 km ao sul de Madri, foi declarada pela Unesco Patrimônio da Humanidade. Alguns acreditam na invasão romana em 220 a. C. Mesmo sem muitos registros, as ruínas materializam a passagem desse povo em teatros, estradas, aquedutos, destroços de banho e um circo com acomodação para treze mil pessoas. A história toledana consegue apresentar singularidades culturais por meio de cada edi•ício. Em 1923, Albert Einstein escreveu: “Toledo é como um conto de fadas”. O extremo da América do Sul também abriga uma região peculiar. Dividindo espaço entre Argentina e Chile está a Patagônia. O clima frio refugia parte da Cordilheira dos Andes e lagos glaciares. A vida selvagem é o principal atrativo. Gabriel Toledo e Julieta Russi destacam como a Patagônia espelha a vida nômade ao notar os “próprios moradores que viajam muito”. Os postos de gasolina por exemplo,

“todos possuem estruturas apropriadas para abrigar viajantes e são muito distantes um do outro”. O estilo de vida desligado à rotina •ica evidente pelos muitos mochileiros. O mundo em um país Mas, e se fosse possível rodar o mundo sem sair do Brasil? Pomerode, em Santa Catarina, representa os costumes alemães. A gastronomia por si só garante a lembrança. Mas as mais de trezentas casas em estilo Enxaimel concederam o título de município com maior número de construções do tipo. Já o Estado de São Paulo reproduz um pedaço do Japão. Considerado o maior reduto japonês do mundo, o Bairro Liberdade tem história, estrutura, gastronomia, tudo para se ter uma imersão em parte do continente asiático. Tentar colocar a diversidade cultural em papel seria como tentar contar estrelas. Há quem tome um pouco desta imensa diversidade para si ao decidir viajar. Para Julieta, nômade, a vida como andarilho signi•ica “se sentir em casa em todos os lugares. Se adaptar à outras realidades e fazer com que elas também se tornem suas”. junho 2019. Nomodismo


IDENTIDADE

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Residentes do mundo O mundo representa a casa dos viajantes transculturais GISELE CALIXTO E SOLIMAR

FOTOS: ARQUIVO PESSOAL E GOOGLE IMAGENS

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uitas vezes, o termo “cultura” lembra os amantes de música clássica e de teatro, ou ainda os intelectuais que admiram bons livros. Contudo, o signi•icado da palavra vai além. Algumas famílias passam a vida na estrada, se mudando devido ao trabalho e/ou aos interesses pessoais em um novo estilo de vida. Nesses casos, os •ilhos que viajam ao lado dos pais precisam se submeter a

Nomodismo.junho 2019

novos hábitos e costumes. Muitas dessas crianças não retornam tão cedo ao lugar onde nasceram – na maioria das vezes, elas passam o resto da vida conhecendo línguas e práticas diferentes. Por isso, surge a pergunta: com o que elas vão se identi•icar? Crianças que precisam se mudar constantemente se encaixam no termo Third Culture Kids (TCK), “Crianças de Terceira Cultura”. Isso quer dizer que elas se

ligam a várias culturas e não têm a própria nacionalidade bem de•inida. Geralmente empregado para designar •ilhos de nômades, missionários, militares, refugiados, imigrantes, diplomatas ou pessoas que precisam sempre se mudar por causa do trabalho, o termo TCK é mais do que as crianças vivem ao mover-se com frequência. Uma criança se torna de “Terceira Cultura”, quando não se identi•ica com a cultura na qual


41 nasceu (1ª cultura) e nem com a que vive atualmente (2ª cultura). Por esse motivo, ela precisa criar os seus próprios costumes – que geralmente envolvem aspectos de todos os hábitos que ela conhece - para se sentir encaixada. Renata Salas é mãe da Maria Antônia, de 11 anos. Desde que a •ilha única nasceu, a família já visitou 21 países diferentes. Natural de Houston, Texas, Maria já morou em três países. “Maria Antônia lida muito bem (com as mudanças), na verdade, ela não conhece outra realidade”, explica. Na pele de uma TCK Na escola, quase todos os amigos da Maria também vivem uma vida nômade. A maioria deles fala pelo menos duas línguas não tem família por perto e se muda com frequência. Apesar de estar acostumada, a adaptação da menina nem sempre ocorre com facilidade, portanto, Renata busca alternativas para confortá-la. “Para ajudar na adaptação, a primeira coisa

que eu faço é ser um exemplo. Não adianta tentar fazer seu •ilho se adaptar a um novo lugar, se você pessoalmente não está satisfeito. É preciso educar com ações, e não somente com palavras”, a•irma. Além disso, Renata acredita que alguns momentos ajudam a •ilha a entender a existência de muitas culturas. “Antes de viajar, estudamos como as pessoas daquele lugar vivem, o que elas gostam, os hobbies e a cultura em geral, para termos a chance de mergulhar o máximo possível na experiência que cada lugar nos trará”. O antropólogo John Cowart, da Universidade de São Paulo (USP), especialista em formas expressivas, acredita que “a transformação constante das relações sociais e culturais pode colocar em risco a formação de uma noção única ou •ixa de uma pessoa, o que pode levar a uma experiência de liminaridade constante.” Em contrapartida, para o professor, essa experiência pode ser muito rica, revelando as limitações de certas

"Antes de viajarmos, estudamos como as pessoas do lugar vivem, o que gostam, a cultura em geral, para termos a chance de mergulhar o maximo possível na experiência que cada lugar nos trará"

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ras mudanças aconteceram devido ao trabalho dos pais. Após se adaptar às constantes mudanças, ele se acostumou. “Eu acho que morar em vários países abre portas. Não digo que é fácil, mas é algo viável de se fazer”, declara. “Além de realizar aquele desejo de morar em outros lugares, conhecer outras culturas e muitas pessoas, isso expande bastante a mente”.

"Uma criança de 'Terceira Cultura' nada mais é que alguém que passou parte significativa de seu desenvolvimento longe de sua cidade natal" Nomodismo.junho 2019

Prós e contras Apesar das di!iculdades, para Cowart, ser uma criança de Terceira Cultura não é necessariamente algo negativo. “Essas experiências podem levar a uma visão ampliada do ser humano, além da valorização das diferenças culturais e enriquecimento do conceito de pertencimento” diz. Já Siqueira a!irma que “aprender outras culturas é sempre bom. Tem até estudos neurológicos que con!irmam que aprender outra língua ajuda a expandir a visão de mundo”. Para ele, é possível descobrir “outras maneiras de viver, ganhando uma visão expansiva de qual é o nosso papel no mundo para en!im chegarmos à conclusão de que somos todos iguais”.

Como nem tudo é um “mar de rosas”, há um lado negativo neste tipo de vida. O pesquisador sente um peso emocional na hora de se instalar novamente. “A gente tem que ir para um lugar que não conhece as pessoas e não tem amigos, começar do zero. Quando se é criança, é mais fácil, mas na medida que se vai crescendo, é mais complicado ir para algum lugar e refazer esses laços”, observa. Ele ainda re!lete que as vezes, quando as pessoas moraram em vários lugares, sentem di!iculdade de recuperar as raízes, sofrem com o sentimento de “não pertencer”. Homeschooling Frequentar uma escola é parte importante da rotina da criança, que pode sofrer para adaptar-se em um lugar novo. Conscientes disso, após decidirem viajar durante um ano pelo Brasil, Bruno e Carla Magalhães, apesar de nômades, não interrompem as aulas do !ilho, Bernardo. Antes de iniciar a viagem, Carla se reuniu com a professora de Bernardo, a !im de estudar o cronograma de atividades que o !ilho deveria aprender em uma institui-


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ção de ensino. “Eu e a professora montamos juntas o cronograma do que ele deveria aprender nessa idade, porque, caso ele volte a estudar em uma escola, já terá uma base para continuar na série seguinte”, explica. Com o objetivo de educar o •ilho de forma lúdica, Carla usa a criatividade. Por meio de livros e brinquedos coloridos montou, sozinha, um material de alfabetização. “Isso permite que Bernardo aprenda de maneira mais interessante. Com os métodos que usamos, percebemos que ele cresce mais do que quando estava na escolinha”, a•irma. Após quatro meses de expedição, o casal goiano já visitou cerca de 40 cidades do Brasil e percebeu resultados positivos na educação do •ilho. A viagem, que parecia um sonho distante para um casal com um •ilho de apenas quatro anos se revelou bastante educativa. viajante. Experiências a bordo de um veleiro Se ensinar um •ilho dentro de “casa” durante as viagens soa um tanto diferente, o que dizer sobre uma geração que é educada dentro de um barco? Os Schurman,

que desde 1984 viajam pelo mundo, tornaram-se a primeira família brasileira a dar a volta ao globo dentro de um veleiro. O preparo do grupo levou dez anos, e a família já passou mais três décadas no mar. A bordo da embarcação, Vilfredo e Heloísa Schurmann educaram os •ilhos, que só desembarcaram para fazer faculdade. Segundo Heloísa, “tem sido uma experiência grati•icante conhecer novas culturas, fazer novas amizades e aprender a se adaptar aos costumes, idiomas e culinária dos locais”. Para a viajante, viver entre várias culturas signi•ica levar uma vida emocionante. “Ler livros, ver vídeos e •ilmes de viagens é legal, mas estar nos lugares diferentes é o que nos dá riqueza de gostos, odores, sorrisos, abraços, pessoas, músicas, comidas e paisagens que nunca mais esqueceremos”. Heloísa comenta que o retorno para o Brasil sempre gera desconforto. Ela diz que se sente como uma “extraterrestre” e que é inevitável comparar o seu país às outras culturas visitadas. “Esse é um ponto que aos poucos vou trabalhando”, comenta. Por sua vez,

Emmanuel, neto da família Schurmann, presencia de perto as frequentes mudanças e acredita que precisa ser ágil para se adaptar. Resultado comportamental Pessoas que são expostas a mais de uma cultura podem surpreender pela forma como se comportam. Desenvolvem múltiplas linguagens, além de valorizar a importância de ouvir o próximo. Muitas vezes, esses seres ocupam margens interiores de diferentes grupos e áreas de transição e conseguem ter a percepção aguda de múltiplas exclusões, sendo altamente criativos no modo como articulam diferenças culturais. Em suma, para as Crianças de Terceira Cultura, a cultura representa um conjunto de hábitos formados em um determinado lugar. Um indivíduo que é exposto a inúmeras realidades ad quire certos bene•ícios, como o aprendizado e o crescimento. Experimentar diversas culturas traz uma realidade de independência e liberdade para o viajante, expandindo a sua visão de mundo e possibilitando o seu amadurecimento. junho 2019. Nomodismo


COLINA

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Rafaela Vitorino

Uno

S

empre há quem adore separar as coisas, polarizar mesmo, sabe? Direita ou esquerda, exatas ou humanas, preto ou branco. Porém, apesar de as diferenças estarem lá, a verdade é que tudo – ou, quase tudo – se mistura. Um tem um pouco do outro. E aqui, não falamos de elementos imiscíveis como água e óleo, mas de questões da sociedade. Dizer que esporte e política não tem nada a ver, até entendo – embora discorde piamente. Mas dizer que esporte e cultura não se misturam? Aí é demais. Um respira o outro e é formado e moldado por padrões construídos no esquema do vice e versa. Assim, esporte é cultura, ou cultura é esporte, você quem escolhe. Seja como for, a ordem dos fatores não altera o produto. Embora esporte seja muito mais do que cultura, é importante dizer que ele, com certeza, a engloba. Se alguém se interessa por manifestações culturais, sociedade e suas facetas, com Nomodismo.junho 2019

certeza também deve se interessar por esporte. A prática esportiva é também prática cultural, e, por isso, transmite tradições. Esse tipo de sentido construído e passado pelo esporte comunica aquilo para que veio e representa seu lugar de origem. A capoeira, por exemplo, foi desenvolvida no Brasil por africanos trazidos como escravos. Essa mistura de esporte, luta, dança e música representa muito bem aquele povo. O reflexo corre até hoje nas veias do povo nordestino –, principalmente dos baianos. É a realidade cultural criando e recriando a prática esportiva. Assim como a sociedade transforma o esporte, o esporte transforma a sociedade. Uma comunidade dedicada a ensinar a importância e a beleza da prática esportiva tende a sofrer menos com crianças que poderiam tomar um rumo bem diferente e muito mais comum. Da mesma forma, a falta dele também pode causar problemas sociais. Uma das pre-

ocupações da Organização Mundial da Saúde (OMS) é a obesidade, provocada pela negligência à alimentação e à prática esportiva. É um transformando o outro, dinâmicas completamente ligadas e indivisíveis. Para as mulheres, o esporte foi um instrumento muito utilizado na conquista de seus direitos. Em uma sociedade tomada pelo machismo, a francesa Alice Milliat reivindicou maior participação feminina nos Jogos Olímpicos ainda na década de 1920. As mulheres no esporte influenciaram o pensamento social, e, embora exista uma participação muito menor, aos poucos a realidade tem mudado. Existem coisas inegáveis. Minha professora costumava dizer que matemática é a única coisa realmente comprovável. À época, realmente me parecia muito plausível. Mas hoje, preciso, e não sinto em discordar. Podem até existir argumentos, mas duvido alguém provar que esporte e cultura não tem nada a ver.


ALTERNATIVO

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De um ano para a vida inteira A decisão que transformou a vida de uma mulher SARA RABITE

FOTO: ARQUIVO PESSOAL

Já pensou em se estabelecer, mobiliar a casa com móveis planejados e ter a segurança de um emprego tradicional? Escritório com ar condicionado, cafezinho e estagiário! Priscila Mattos já almejou tudo isso, mas concluiu que esta não é a fórmula da sua felicidade. Aos 29 anos, a jovem formada em Relações Públicas decidiu fazer uma viagem pela América do Sul. Com o dinheiro que havia poupado, o passeio que duraria dois meses se estendeu para seis. Após esta experiência, Priscila recebeu um convite para ser voluntária na Índia durante um semestre. Aceitou. No •im das contas, o que seria uma curta viagem se tornou um ano sabático. Ao retornar para São Paulo, enfrentou di•iculdades no mercado de trabalho. Contudo, devido à sua experiência no exterior, conseguiu um emprego no setor de turismo. Dentro do coração de Priscila havia um misto de sentimentos. Trabalhar viajando era uma realização pessoal, mas, ao voltar para “casa”, tinha certeza que não estava no lugar correto. “Olhar para dentro de mim” Após o término de um relacionamento, ela cogitou algumas possibilidades. Entretanto, a opção que mais a atraía era planejar um segundo ano sabático. Simultaneamente, sua amiga, Rayssa Ulian, começou a tirar dúvidas sobre os desa•ios de largar tudo e passar temporadas viajando. Independente de diferenças de personalidade, estilo de vida e até mesmo monetárias, as amigas de longa data em-

barcaram juntas para o tão planejado ano sabático. Aos 34 anos, com o apoio positivo de uns e negativo de muitos, elas arrumaram suas coisas, deram tchau para amigos e familiares e caíram na estrada - ou, nas nuvens - a •im de realizar sonhos. Priscila narra que, durante os primeiros meses de viagem, os momentos singulares foram muitos. Durante as viagens, a dupla dividia seu tempo em atividades individuais e conjuntas. “Assim, fazíamos nossa trip juntas com o mesmo objetivo, porém, às vezes cada uma fazia o seu próprio roteiro”, explica. Ir ou não ir? Durante a viagem, Priscila colaborou com um amigo e foi representar a empresa dele em Portugal. Os dois meses distantes do conceito inicial de sua trip agregaram experiência e um novo amor: Henrikas Kaskeliavicius. Por falta de recursos, a brasileira decidiu aprender a ser nômade digital, como seu namorado. O lituano Henrikas mudou-se para Guatemala com a nova escritora de artigos e gerenciadora de contas do Instagram. O ano sabático está chegando ao •im e Rayssa volta em alguns dias, mas a experiência de Priscila está apenas no começo. Apesar de amar seu país, ela só pretende voltar para matar a saudade dos queridos. A imersão no universo nômade virou sua paixão. “Ao olhar para dentro de mim senti a liberdade de poder mudar a qualquer hora, meu emprego possibilita esse prazer. É a realização de um sonho”. junho 2019. Nomodismo


46 MILENA MARTINS

Há quem diga que a forma mais fácil de conhecer novos países é experimentando comidas típicas. A variedade gastronômica encanta viajantes e curiosos ao redor do mundo. O que poucos sabem é que o alimento mais consumido no mundo é o mesmo que, quase, toda casa tem sempre, pelo menos, um pacote na dispensa: o macarrão. Não importa onde você vá, o macarrão vai estar ali também. Claro que com características locais, mas sempre presente servindo como um elo entre diferentes culturas.

Não, macarrão não é italiano! Na verdade, é uma invenção chinesa com, pelo menos, 4 mil anos de existência.

Os três tipos de macarrão mais utilizados são o de farinha de trigo, arroz e legumes.

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A Itália conheceu o famoso spaguetthi através dos árabes, em meados do século XIII.

O macarrão instantâneo, mais conhecido no Brasil com miojo, é considerado uma grande criação do Japão.

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SAÚDE

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NOEMI ALMEIDA

FOTO: OUT&ABOUTLIVE

O pulo do gato Como a prática de esportes pode melhorar a qualidade da vida nômade O @mochileiroSP é famoso no Instagram, apesar de nunca revelar seu nome. O Paulista é nômade e sua rotina serve de inspiração tanto para quem deseja viajar, quanto para quem quer qualidade de vida em meio a rotina frenética. Além das belas paisagens encontradas no feed do digital in!luencer, ele dá dicas de saúde, receitas de sucos e desa!ia seguidores a fazer uma das coisas que mais gosta: correr. A história do @mochileiroSP evidencia como a prática esportiva pode melhorar a vida nômade. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda no mínimo 150 minutos de atividade moderada por semana. Vinte minutos diários entre as refeições ou depois do trabalho. Mas para nômades, manter a rotina em meio às viagens não é fácil. De acordo com a médica Viviane Guimarães, o primeiro passo é colocar a saúde como prioridade. “Quem viaja muito e não tem tempo para atividade !ísica pode ajustar a sua rotina e encaixar caminhadas ou corridas. Além de serem grátis, não exigem um ambiente especí!ico e são muito bené!icas”, exNomodismo.junho 2019

plica. Viviane esclarece que para criar um hábito são necessários, em média, 66 dias, um tempo relativamente curto ao avaliar os bene!ícios capazes de perdurar a vida inteira. Foi essa visão que levou o @mochileiroSP a começar a treinar. Dez anos antes de ser nômade, já tinha decidido mudar a alimentação. Aos poucos foi experimentando atividades !ísicas e aprendendo a lidar com o corpo. “Antes sentia fadiga rápido, não me achava bonito e minha disposição era outra. Então, além de tentar me alimentar melhor, comecei atividades !ísicas. Já gostava de correr, mas na academia, timidamente”, relembra. Esses desa!ios diários prepararam o mochileiro para uma grande transição. Aos 40 anos e bem-sucedido no mercado !inanceiro, decidiu largar o emprego e embarcar na aventura de viajar pelo mundo. “Não tendo mais convênio médico e batalhando pela grana diária, usei tudo que aprendi nos anos anteriores”. Além disso, desde 2012 o nômade usa o Instagram para compartilhar suas experiências de viagens e isso o motiva a con-

tinuar. “As escolhas que !iz me permitem ter uma estima muito boa”, atesta o @mochileiroSP, aos 46 anos. “Hoje tenho muita resistência para corrida, mantenho o peso há mais de 15 anos, minha massa magra está acima do esperado para a idade e meus exames clínicos no check up não me preocupam”. Su!icientemente saudável para aproveitar a vida e as viagens que lhe dão tanto prazer. Pulo do gato @mochileiroSP acredita que mesmo nômades, acostumados com mudanças, precisam “sair da zona de conforto”. Levar um kit básico com luvas, elástico e corda pode tornar o treino mais prático e fácil. Com relação aos alimentos, a nutricionista Giovanna Bragália indica lanches rápidos. “Boas opções são castanhas, frutas, queijos e torradas integrais. Alimentos baratos e podem ser carregados em pequenas quantidades”, complementa. Outra dica é ter sempre ovos cozidos de step. Segundo Giovanna, isso garante aporte protéico quando a rotina impossibilita as principais refeições. E nunca esquecer da “boa e velha” garra!inha de água.


RANGO

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AMANDA CARVALHO

FOTO: SHUTTERSTOCK

Yakissoba real oficial A culinária chinesa de um m jeito que você nunca Conhecida por ser “a cultura dos pés pequenos”, a China se encontra no leste da Ásia. Um país curioso, dono de uma cultura exuberante com a qual quase todo mundo já teve contato de alguma forma. Quem nunca ouviu fatos intrigantes sobre essa nação? Quem nunca quis provar a comida chinesa original? Esse era o desejo de Camila Barreto, estudante da Southern Adventist University, situada no Tennessee (EUA). Enquanto ouvia algumas curiosidades sobre a China, Camila desejava aprender mais sobre o lugar. Então, quando surgiu a oportunidade, realizou seu sonho. Por meio de uma excursão feita pela escola, ela viajou com a amiga Manelkis Garcia. Embora estivesse muito empolgada, Camila tinha alguns receios em relação ao país que visitaria. Entre os medos da estudante, estava a possibilidade de não se adaptar ao cardápio local. Ela pensava que precisaria comer fast food todos os dias. Mas isso acabou não acontecendo. Após dar uma chance às novas experiências, ela se encantou pelos novos sabores. “Não vou mentir, eu

estava com um pouco de medo de não gostar da comida, mas quando tentei, eu amei”, admite. “Era tão diferente dos restaurantes chineses que eu tinha ido ao redor do mundo”. O primeiro prato que Camila provou foi batata com vinagre e pimenta. Para Manelkis, as coisas foram bem diferentes. Ela não tinha medo do que estava por vir. “Eu não !iquei preocupada porque os meus pais estiveram lá e me disseram que eu adoraria a comida. Eles estavam certos”, con!irma. Seu primeiro prato foi o de nozes secas. Além disso, conseguiu desenvolver alguns hábitos como tomar chá verde durante as refeições e comer arroz todos os dias. Desmis•ficando a comida Você já ouviu dizer que a carne da China é de rato? Provavelmente sim. Camila também, mas em pouco tempo percebeu que quem espalha esse mito, na verdade, nunca foi à China. “Se você pedir frango, eles lhe darão frango”, a!irma. A história surgiu porque os chineses são conhecidos pelos seus pratos exóticos. Eles usam iguarias como carne de cachorro, cobra, gafanho-

to e barbatana de tubarão, provenientes de um passado histórico de guerra e fome que assolou o país. Mas a cozinha chinesa não é formada apenas por esses pratos. Para aqueles que estão dispostos a experimentar os prazeres da culinária oriental, a China oferece uma in!inidade de comidas especiais. A !im de desmisti!icar outra história, a de que o cardápio chinês só envolve yakissoba, Camila assegura que nunca repetiu nenhuma refeição. No café da manhã, ela toma sopa de macarrão de arroz. No almoço, come legumes e tofu cozidos com molhos, como também arroz e sopa. Já no jantar, a estudante experimenta alimentos tradicionais da região. Para as duas meninas, muitos alimentos chineses se destacam. A coisa mais estranha que Manelkis comeu foi lótus, porque “tem um gosto estranho e ao mesmo tempo não tem gosto de nada”. Elas também contam que não foi di!ícil se adaptar à culinária chinesa. Manelkis até recomenda alguns pratos para quem quiser visitar o país. Arroz com macarrão, cogumelos com batatas, pães recheados, ovos e arroz com brócolis. junho 2019. Nomodismo


TRIBOS

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Nos bastidores da arte A história do circo e a viagem de uma acrobata brasileira para Las Vegas

ANALÍA ROA E PATRÍCIA CUSTÓDIO FOTO: GOOGLE IMAGENS

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onas coloridas, animais exóticos e centenas de !igurinos divertidos compõem a bagagem de um circo itinerante. Espetáculos de cores, acrobacias e shows de mágica fazem os olhos de todos brilharem. Não é possível a!irmar quando e onde a magia do circo surgiu, e sim, que ela existe há muito tempo. Alguns acreditam que as atrações circenses surgiram na China, porque lá encontraram pinturas de malabaristas, contorcionistas e equilibristas datadas de 5 mil anos. No Egito, as pinturas de malabaristas e contorcionistas também mostram o interesse do povo

Nomodismo.junho 2019

nesta arte. Na Índia há espetáculos sagrados que incluem saltos e contorcionismo, enquanto na Grécia a contorção já se constituiu como modalidade olímpica. O circo verde e amarelo A arte circense chegou ao Brasil em meados do século XIX. Recém-chegados ao país, vindos principalmente da Europa, o circenses encontraram um pouco mais de liberdade para se expressar. Entre os novos artistas, estavam os ciganos, que não eram bem-vistos por todos, embora fossem aceitos. Apesar disso, os shows de acrobacias apresentados em terras brasileiras por esses grupos encantavam o

su!iciente para prover o sustento do artista e da família. A despeito de ter encontrado mais liberdade no Brasil, a arte circense ainda era alvo de julgamentos. Por esse motivo, o circo passou a mudar-se de local constantemente – daí o termo “itinerante”. Como o público não era sempre o mesmo em todos os lugares, os espetáculos eram adaptados para o gosto local. Inicialmente, as apresentações manifestavam sentimentos e interesses comuns entre os artistas e a plateia. No entanto, após tantas viagens e adaptações para agradar ao público, o circo se transformou, incorporando inúmeras expressões artísticas re-


51 gionais. Devido a todas essas mudanças, os espetáculos perderam as suas características europeias. Ao contrário, carregavam as cores brasileiras e o humor ácido de palhaços como Carequinha e Piolin. O riso de um palhaço Há quem diga que os palhaços nasceram com os sátiros, na Grécia. Para Rômulo Guerra, que interpreta o palhaço Rabisco, “é di!ícil de!inir quando surgiu o primeiro palhaço, pois a arte do riso é praticamente impossível de se datar”. Segundo Alice Castro, autora do livro Elogio à Bobagem, esse personagem surge com a humanidade, quando as pessoas viviam nas cavernas e se juntavam para contar as proezas do dia. Curioso é saber que o palhaço nem sempre existiu da forma como as pessoas o conhecem hoje. Guerra acredita que o “arlequim” não é mais ou menos importante do que nenhum outro personagem circense. “O homem naturalmente quer rir, pois assim ele esquece os problemas ou ri deles”, destaca. Para ele este é o motivo de o palhaço ser a alma do circo. Piolin, Torresmo, Arrelia, Pimentinha, Carequinha e Fuzarca

são os nomes de alguns palhaços que marcaram o riso brasileiro. “O palhaço nasce do nosso ridículo. Aristóteles disse que ‘o homem é o único animal que ri’. Milo Fernandes completou a frase, dizendo que ‘rindo, mostra o animal que é’, comenta. Guerra ainda a!irma que o palhaço causa cócegas no coração e que adora causar isto. Do Brasil a Las Vegas Quem senta junto à plateia para assistir aos espetáculo circenses, não imagina quanto esforço e sacri!ício são necessários para dar vida ao show. Abrir mão do convívio familiar, da rotina e da agenda previsível faz parte da realidade dos artistas circenses. Entre estes artistas encontra-se a acrobata Mariana Marikawa, que foi com o Cirque du Soleil à Las Vegas. Mariana praticou Ginástica Artística dos 8 aos 18 anos de idade, mas foi apenas em Las Vegas que entendeu o preço de um espetáculo – aquilo que vai além das bilheterias. Longe do arroz com feijão por sete anos, Mariana se apresentava cinco dias por semana, duas vezes por dia. Os espetáculos, apreciados em um teatro localiza-

"Me apaixonei pelo circo desde o primeiro contato, ainda criança. Mantemos esta relação duradoura"

junho 2019. Nomodismo


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do dentro de um cassino, possibilitaram uma rotina de dedicação exclusiva às apresentações. Após acordar meio dia, cuidar da casa, comer, treinar e se maquiar, Mariana encontrava os holofotes. O descanso só era possível nos dias de folga, que aconteciam duas vezes por semana. Além de trabalhar, a artista matava a saudade de parentes e amigos brasileiros e assistia aos espetáculos de colegas que estavam na cidade.

De fato, viver como artista no Brasil não é um trabalho fácil, mas para artistas como Mariana, as adversidades podem ser superadas com paixão. Nomodismo.junho 2019

Dificuldades no caminho Para Mariana, ir para Las Vegas envolveu inúmeras adaptações. A mudança virou a sua vida de ponta cabeça. “A unica desvantagem desta vida é que na posição de acrobata há limitação no tempo de atuação, uma vez que a exigência !ísica é intensa. Isso gera a necessidade de diminuir ou parar com a atividade, para não se expor a lesões mais graves, prejudicando a carreira como um todo”, explica. Mariana comenta que, no Brasil, a arte não é valorizada, criando “di!iculdades !inanceiras” aos artistas. Além disso, a acrobata ressalta que há pouco espaço para a criação de novas o. De fato, viver como artista no Brasil não representa um trabalho

fácil, mas para artistas como Mariana, as adversidades podem ser superadas com paixão. “Me apaixonei pelo circo desde o primeiro contato. Mantemos esta relação duradoura”, enfatiza. Arte ou esporte? Toda apresentação circense gera expectativas de impacto no público, tanto pelo show como um todo quanto pelas habilidades dos artistas. Alguns atletas de ginástica – rítmica, acrobática ou artística - não têm nenhuma formação esportiva formal, apenas estão inseridos em um ambiente circense desde cedo. Em contrapartida, há ginastas pro!issionais, ex-competidores olímpicos ou pessoas graduadas que trabalham neste tipo de espetáculos. Formada em Educação Física pela Universidade de Campinas (Unicamp), Mariana pertence ao último grupo. Durante a faculdade, a acrobata descobriu uma grande diferença entre o atleta e o acrobata. “Um atleta treina para ganhar uma competição, ser avaliado por juízes e entrar para a seleção nacional. O artista circense treina para se apresentar em um espetáculo em forma de arte, expressar alguma história ou sensação atra-


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vés da virtuose acrobática e levar alguma mensagem para o público que assiste”, comenta. Ao contrário de Mariana, Kátia Alves, também acrobata, nasceu no circo. “Cresci vendo meus pais trabalhando e quis fazer o mesmo por amor”, conta. Para Kátia, as famílias que se dedicam ao circo “fazem arte por amor”, sem muitas preocupações com a economia, ainda que as modalidades praticadas no circo possam ser consideradas práticas desportivas por serem ensinadas em academias. Segundo a Confederação Brasileira de Ginástica (CBG), o circo representa uma prática esportiva não formal. Ela de•ine esporte como “prática metódica, individual ou coletiva, de jogo ou qualquer atividade que demande exercício •ísico e destreza, com •ins de recreação, manutenção do condicionamento corporal e da saúde e/ou competição”. Além disso, a lei nº 9.615/1998, explica que “o que pode diferenciar (o esporte) da prática num circo é o caráter remuneratório ou não dessa atividade, que pode ser con•igurada como artística”. O circo só se torna uma opção viável para os ginastas, quando há

um contrato com alguma companhia grande, sólida e renomada. “Batalhar para ter uma vida digna provavelmente será necessário. Infelizmente, no Brasil, a realidade para ser um artista circense é bastante dura •inanceiramente,” destaca Mariana. Segurança no circo Os circenses se caracterizam por viajar em seus próprios trens, caminhões e caminhonetes. Nesses veículos, os artistas levam toda a infraestrutura necessária para montar o espaço onde os espetáculos serão desenvolvidos, assim como a sua própria “casa”. Apesar de os improvisos chamarem a atenção do público também representam certo perigo, quando não são tomadas as devidas medidas de prevenção. Segundo estudo chamado Segurança no circo: questão de prioridade, feito por Diego Ferreira, existem riscos constantes nas atividades circenses. Em alguns casos, esses imprevistos seriam evitados, se os donos desses ambientes investissem mais em pessoas capacitadas. “As pessoas precisam deixar de priorizar outras demandas do circo, como luzes novas e •igurinos, para investir em

segurança. Tem que contratar um pro•issional quali•icado que entenda o que está fazendo ao invés de utilizar qualquer corda ou qualquer nó”, explica. Ferreira, em parceria com Marco Bortoleto e com a assessoria de uma engenheira, formatou um curso para o pro•issional circense que trabalha em altura, a •im de conscientizar e ajudar a padronizar regras. “A segurança pode ser sistematizada, independentemente de o circo ser de lona, apresentado em praça aberta, ginásio, dentro ou fora do Brasil. O primeiro passo é conheceros riscos. Saber como controlar os pontos fracos gera um bom protocolo”, informa. Ana Coll, artista formada pela Escola Nacional de Circo, indica o que levar em consideração na hora de executar uma apresentação. “Existem muitos fatores de risco numa apresentação, estrutura •ísica, como o aparelho que está ancorado”, declara. Para garantir a segurança, os organizadores precisam checar se há materiais de segurança, como colchão e rede, e se a iluminação está de acordo, a •im de não “cegar” o artista. Além disso, é preciso cuidar do aquecimento e concentração. junho 2019. Nomodismo


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CARONA

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Antes de viajar Saiba que mais importante do que preparar as malas, obter algumas informações básicas sobre o roteiro de viagem pode descomplicar a vida RAIANE LÍVIA

FOTO: SHUTTERSTOCK

Viajar para outro país pode ser mais complexo do que se imagina. Não é pensar apenas em passaporte, visto e idioma. Trata-se de conhecer o destino. Nesse processo, é normal surgir algumas dúvidas. A falta de conhecimento muitas vezes gera transtornos que podem ser evitados com informação. Por isso, antes de “turistar”, procure informações, a•inal, elas podem fazer toda a diferença. A seguir, estão três roteiros turísticos. Eles possuem o básico para você não passar aperto.

Já nas ruas, o turista pode sair despreocupado com seu celular à mão, sem temor de assalto Nomodismo.junho 2019

Turismo europeu Dentre os países da Europa, a Alemanha recebe destaque na procura turística. O fato de ser um país organizado e clássico chama a atenção de muitos. Se em algum momento você pensou em carimbar esse país no seu passaporte, seguem algumas dicas e curiosi-

dades do que fazer antes de viajar até a nação germânica. Ao chegar ao aeroporto, lembre-se de ter em mãos papéis legais informando seu período de estada, além de dinheiro vivo. A Alemanha não tem facilidade para pagamento via cartão, por isso, antes de viajar, faça um cálculo prévio para não ter problemas. Já nas ruas, o turista pode sair despreocupado com seu celular à mão, sem temor de assalto. Sua sel•ie no parque, ou em frente àquele ponto turístico marcante, está garantida. Quanto ao transporte, o público funciona como opção considerável para a excursão diária. Não há superotação, é amplo e circula o dia todo. Se você não quiser perder a condução, melhor se apressar; alemães são bastante pontuais. Não se esqueça de comprar o tíquete e validá-lo, pois há risco de


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multa caso tente entrar no transporte sem ele. O tíquete serve para viagens em ônibus, metrô e trem. Apesar do estereótipo de povo frio, alguma leis civis demonstram o lado terno da população. Quem for pego maltratando um animal recebe multa imediatamente, por exemplo. A engenheira química Magna Gerlane Albuquerque é amante das viagens. Ela a•irma que conhecer a Alemanha é uma experiência cheia de surpresas. “Para mim é admirável ver como o povo alemão é extremamente correto. Além disso, como uma apaixonada por animais, achei o máximo o modo como tratam eles. Acho que isso deveria ser seguido em todo o mundo”, ressalta.

Terra santa O próximo país está no Oriente Médio. Israel é um dos destinos turísticos arqueológicos e religiosos mais procurados. O fato de Jesus ter passado pela região explica muita coisa. Mas lembre-se: não é um destino tão barato. Durante todo o ano, o tempo é propício para visitar Israel. No inverno, o frio mais intenso atinge regiões mais altas. Já no verão, o clima é seco e o calor intenso. Para quem deseja passar pouco tempo,

em cinco dias é possível conhecer Telavive e Jerusalém; em sete, dá para esticar até Massada e Mar Morto. Agora, se quiser conhecer bem o país, •ique o máximo de tempo que puder. Se for passear pela cidade com transporte público, planeje roteiros de segunda a sexta-feira, pois não irá encontrar um transporte no shabbat (sábado), dia sagrado para os judeus. Além disso, por estar próximo a uma faixa de con•litos, você pode ser revistado ao andar pelas ruas. Jhonatan Fresno escolheu Israel em suas viagens e não se arrepende. “Não existe um país mais relevante em termos históricos. Ali subsistem as histórias das culturas antigas no mundo como Judaísmo, Cristianismo e Islamismo. Ali elas se juntam e a história do mundo é contada desde os primórdios”, enfatiza.

Mama África A rota agora chega ao continente africano, rico em detalhes culturais. Quem deseja imersão além de safáris e grandes centros, precisa visitar a República da Guiné. A capital Conacri, uma das maiores cidades do país, é região de língua francesa e religião muçulmana.

Rodrigo Sampaio já passou por mais de quinze países, mas o que mais marcou foi sua passada por Conacri. “O fato de encontrar uma realidade onde tudo é extrema pobreza. O cuidado com as coisas de higiene não é porque eles não querem, é porque eles não sabem. Inclusive o epicentro do ebola foi lá. Então, essas coisas acabaram chocando de início, a realidade social do país”, comenta. A cultura do povo da Guiné consiste em compartilhar o que se tem. Portanto, é bem capaz de enquanto estiver em sua casa, alguém aparecer inesperadamente e sentar à mesa para comer. “O povo da Guiné não se comporta com individualismo. Tudo que eles têm, dividem com os compatriotas. Assim como as coisas que você tem, você tem que dividir com todos”, explica Sampaio. Não é preciso muita complicação para chegar a esse país, apenas se planejar. Certi•ique-se de que as vacinas estão em dia e leve dinheiro em espécie. Prepare o passaporte e abra a mente para momentos de aprendizado e troca cultural. A população é calorosa e lembra, nesse aspecto, a hospitalidade brasileira. junho 2019. Nomodismo


ALTERNATIVO

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Tradição no esporte

Entenda como os Jogos Mundiais Nômades mantêm a cultura do nomadismo viva TÁTILA FRANÇA E JENIFFER SOUZA FOTO: GOOGLE IMAGENS

O

s estepes e pradarias da Ásia Central sempre foram desejados por conquistadores. Mongóis, chineses e russos, disputaram ao longo dos séculos a soberania do continente asiático. Em meio ao con!lito, várias etnias mantiveram a cultura do nomadismo viva através de tradições, rituais e esportes. Entre esses povos, destacam-se os quirguizes, remanescentes da prática nômade centro-asiática. A palavra Quirguistão, país onde os quirguizes vivem - território que já compôs a Rota da Seda e a extinta União Soviética (URSS), signi!ica “terra das quarenta tribos”. Os quirguizes surgiram no ano 210 a.C. no nordeste da Mongólia, mas migraram para o centro

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da Ásia e sul da Sibéria. Devido ao constante movimento do povo quirguistanês, toda a região foi povoada por esta nação durante dois séculos. Com a ascensão do Império Mongol, os quirguizes foram obrigados a migrar novamente, conquistando vários territórios, inclusive o atual Quirguistão. A prática do nomadismo foi preservada por tradição e necessidade. Para as “quarenta tribos”, a prática esportiva tinha forte relação com atividades militares, caça e instinto de sobrevivência. Invasão Sovié•ca Séculos após evitarem o domínio Mongol, o povo quirguistanês não conseguiu fugir do controle soviético. Em 1916, a URSS conquistou o Quirguistão, o que

descon!igurou a cultura nômade até então preservada. No início, o território se tornou uma república autônoma, mas logo se uniu à URSS, sendo desmembrado em cinco distritos. Por sua vez, os quirguizes – como membros da população soviética - não podiam mais se locomover como antes e começaram a desenvolver necessidades até então desconhecidas. Com o avanço do socialismo leninista, da industrialização e das mudanças econômicas, a cultura nômade dos quirguizes se manteve apenas nos rituais e esportes tradicionais, como a falcoaria, que passam a ser praticados apenas por tradição e diversão. Com a queda da URSS e o fechamento das indústrias estatais


59 russas, o povo quirguistanês perdeu as suas principais fontes de renda, fazendo com que a pobreza tomasse conta do país. Os quirguizes precisaram começar toda a sua jornada do zero. Simbolismos no Quirguistão Em 1993, o país conseguiu sua soberania enquanto o povo aprendia a lidar com o recente parlamentarismo. A cultura nômade, que havia salvado os quirguizes do Império Mongol, já não era mais um recurso para toda a população. Por isso, no esporte encontraram uma forma perpetuar a cultura do nomadismo. Criação dos Jogos A ideia original dos World Nomad Games (WNG), ou Jogos Mundiais Nômades, relacionavase apenas à cultura e aos esportes quirguistaneses, porém, mais tarde, os criadores decidiram estender a competição para diversas culturas nômades e suas respectivas práticas esportivas. O especialista em esportes do WNG, Belek Usenbekov, relembra como foi o processo de implantação dos jogos. “Nosso trabalho na preparação dos Jogos Mundiais Nômades começou em 2011. Desde então, apresentamos a ideia para várias

autoridades”, conta. Usenbekov também comenta que em 2014, o presidente Almazbek Atambaiev apoiou a iniciativa e anunciou o Quirguistão como sede dos primeiros jogos. A terceira edição do evento aconteceu em em 2018, em Cholpon-Ata, Quirguistão. Além da prática esportiva, vários fóruns, apresentações folclóricas e musicais compõem a competição que visa à preservação histórica dos povos nômades. Usenbekov acredita que o evento contempla muito mais do que apenas os que já fazem parte do nomadismo. “Ele também promove um novo ponto de vista sobre os nômades para as pessoas ao redor do mundo” , explica. Modalidades A originalidade dos jogos não se restringe apenas ao estilo de vida dos participantes. Ela também transborda nas modalidades que compõem o evento. As práticas esportivas dos nômades surgiram devido às necessidades de caçar e sobreviver e isto se re!lete nas modalidades da competição. O Wrestling, ou luta livre, tem grande espaço no evento. Geralmente, cada categoria de luta origina-se de um país ou povo

Além da prática esportiva, vários fóruns, apresentações folclóricas e musicais compõem a competição que visa à preservação histórica dos povos nômades

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diferente. Jogos de tabuleiro e estratégia derivados do século XVIII atraem aqueles que preferem esportes menos violentos. Existem ainda muitas outras modalidades, como as mencionadas abaixo. Ordo Tradicional do Quirguistão desde a antiguidade, o Ordo se tornou um dos jogos mais difundidos no país. Durante a competição, os participantes tentam conquistar a sede geral do palácio do Imperador Mongol Genghis Khan por meio de um mapa militar (ordo) que os guerreiros utilizavam para aprender a derrotar um inimigo.

As práticas esportivas dos nômades surgiram devido às necessidades de caçar e sobreviver e isto se reflete nas modalidades Nomodismo.junho 2019

Kyz Kuumai O Kyz Kuumai é tradicional do Quirguistão e Cazaquistão. Kyz Kuumai signi!ica “perseguindo uma menina”. O desa!io do competidor consiste em perseguir e beijar uma moça. Antes de iniciar o seu trajeto, o jovem deve esperar na linha de partida até que a garota, que anda a cavalo, esteja a uma determinada distância dele. Só depois pode iniciar seu percurso, também a cavalo. Se o rapaz conseguir alcançar o cavalo da jovem antes que am-

bos atinjam a linha de chegada, ele pode lhe roubar um beijo, o que representa a sua vitória. Por outro lado, se a garota não for alcançada a tempo, ela pode se virar para perseguir o rapaz de volta até a linha de partida. Se ela o alcançar, pode usar um chicote para vencer . Kok Boru Talvez o Kok Boru seja o jogo mais incomum do evento, e o mais popular, porque todos os competidores participam de uma partida desta modalidade. À primeira vista, o jogo lembra muito o pólo, pois os participantes são divididos em dois times de oito jogadores, que andam a cavalo para tentar levar um “objeto” ao alvo adversário. O esporte !ica cada vez mais complexo ao longo da partida, pois os cavaleiros podem desferir murros, chutes e até dar chicotadas uns nos outros para impedir que o outro time pontue. Entretanto,o mais curioso é o “objeto” a ser carregado: uma cabra decaptada que pesa cerca de 35 quilos. A regra principal do jogo é simples. O competidor tem que jogar a carcaça do animal através de uma linha desenhada, um barril ou um círculo na extremidade do


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campo adversário. O ponto marcado por um dos times pode ser visto como um gol do futebol, mas recebe o nome de goat (cabra, em inglês) devido ao fato de a “bola” ser a carcaça de uma cabra. Por mais estranho que pareça, há uma razão para a prática desse esporte – tão curiosa quanto a própria partida. Quando o rebanho de cabras ou ovelhas dos povos nômades eram atacados por lobos, eles se organizavam e partiam irados a cavalo atrás destes animais. Ao alcançá-los, os nômades os pegavam em plena corrida e os arremessavam contra os outros. Sim, por meio de uma adaptação da forma como esses povos castigavam os lobos que atacavam os seus animais, surgiu o esporte mais famoso da região. Brasil nos jogos Os jogos nômades não envolvem apenas os países que compartilham a cultura do nomadismo. Argentina e Equador, assim como outras nações não asiáticas, também participam. O Brasil, por exemplo, já foi convidado três vezes para competir na modalidade Kazak Kuresi, uma arte marcial parecida com o judô. Apesar da

semelhança com a modalidade praticada pelos brasileiros, os asiáticos têm vantagem, pois o esporte exige movimentos muito especí!icos. Além disso, o Brasil já foi convidado para participar das competições de Wrestling. Keila Calaça, lutadora de Wrestling, por estar bem classi!icada no Pan-Americano da Argentina, recebeu um convite para compor a equipe brasileira nos WNG. A brasileira, além de ter participado da competição, teve o privilégio de carregar a bandeira verde e amarela na abertura do evento. “Quando vi as representações de cada povo e etnia na abertura, tive um choque cultural. Uma experiência única e muito enriquecedora”, declara. O contato com outras culturas pode mudar opiniões e transformar diversas visões sobre o mundo devido à descoberta de algo diferente e incomum. “O que mais me impressionou foram as casas. Elas são tendas, feitas de couro e tecido, em formato de oca. É incrível pensar em como eles sobrevivem nessas casas, principalmente no inverno”. Em uma olimpíada, a cerimônia de abertura carrega a respon-

sabilidade de criar expectativas. Se a primeira impressão é a que !ica, a dos WNG é uma prova disso. Quem pensa que só as modalidades incomuns impressionam, se engana, pois a festividade também deixa os queixos caídos. João Schiffer, responsável por convocar os atletas brasileiros para as competições, já viajou para muitos países a trabalho e presenciou inúmeras aberturas de eventos esportivos. Apesar disso, o Quirguistão ainda conseguiu surpreendê-lo. “Os jogos nômades são de uma beleza ímpar, a abertura é fenomenal, mostrando a habilidade dos cavaleiros, danças e músicas folclóricas. Para mim, é superior à abertura das Olimpíadas”, informa. Próxima edição No início deste ano, anunciaram que a quarta edição dos Jogos Mundiais Nômades acontecerá em 2020. Pela primeira vez, o evento será realizado fora do Quirguistão, pois o local escolhido (Turquia) conta com uma estrutura melhor. Assim, os WNG seguem a tradição do seu povo originário e começam a caminhar pela Ásia, impulsionando a sua tradição pelos quatro cantos do continente. junho 2019. Nomodismo


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Esportes nômades MAYARA PEREIRA, AMANDA CARVALHO, FELIPE ROCHA E THAMIRES MATTOS

É possível ser ativo - e radical - em qualquer lugar do mundo. O espírito de aventura da vida nômade, que coloca a ênfase nas experiências, é facilmente transferido aos esportes radicais. As modalidades, que vão rapel à corridas automobilísticas, reforçam a autonomia física e mental dos praticantes, mas também podem ser exercidas em grupo. Confira algumas das atividades mais populares pelo mundo e desperte seu lado radical.

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junho 2019. Nomodismo


COLINA

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Letícia Bessa

Espíritos livres

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er nômade vai muito além do “largar tudo para viajar por aí”. A ideia tem mais a ver com a possibilidade de conhecimento do que com deixar a vida rotineira para trás. Explorar o mundo é isto, desbravar o desconhecido a •im de conquistar experiências que não seriam adquiridas nos velhos hábitos, em apenas um lugar, entendem? É preciso dizer que a rotina tem as suas peculiaridades, o seu grau de confortabilidade e não deve ser motivo de desprezo em momento algum. Mas a rotina não é um alvo desejado por todoss. Alguns desejam abraçar o mundo, portanto, precisam se desprender de tal forma que possam voar tão alto quanto seus sonhos. Quando alguém decide abandonar atividades usuais para viajar por diversos países, portas se abrem. De todas, a mais importante é a porta que direciona para uma formação completa, despertando o crescimento pessoal e pro•issional. Passar por ela signi•ica construir uma consciência mais rica em relação aos aspectos sociais da vida em cada nação. Isso quer dizer que as tradições folclóNomodismo.junho 2019

ricas dos países visitados, gírias, interpretações e opiniões, se revelam para os estrangeiros como algo completamente novo. E é bem aqui que entra a dica mais valiosa para um viajante de plantão. Ela não é, de forma alguma, um objeto que cabe dentro da mala, e sim, uma orientação para manter a mente aberta e receptiva. Não dá para conviver com os costumes de um povo ao qual você não pertence sem estar disposto a expandir a sua própria •iloso•ia. Para ter a melhor experiência em uma terra estrangeira, não tem nada melhor do que ir a um festival cultural. Lá haverá muito do que representa a cultura local. De histórias a danças, músicas e comidas. Não tem como sair de um festival como a Oktoberfest, em Munique, por exemplo, sem uma bagagem de aprendizado sobre as tradições alemães. Além da capital bávara, São Petersburgo (RUS), Valência (ESP) e Veneza (ITA) são cidades que sediam festivais com fortes representações culturais. Em São Petersburgo há o melhor da música clássica sob as luzes dos dias longos, nos quais o sol se demora mais. Já em Valên-

cia os turistas podem se divertir entre tomates disparados de um lado para o outro. E na grande Veneza? Ah, as máscaras... Imagine dez dias de festa com pessoas fantasiadas à la sociedade veneziana do século XVII. E não é só isso. Outros tipos de manifestações artísticas também enchem as ruas encantadoras da cidade. Ópera, shows de ballet, clima frio. O estrangeiro tem muito a aprender sobre a cultura russa. Já nas terras espanholas um viajante pode ser facilmente atingido por um tomate e o visitante pode desfrutar da felicidade sem medo. As lições não param nisto. Em meio aos encantos de Veneza, muito se aprende sobre uma nobreza distante e representações teatrais dos séculos passados. Enquanto a festa se estende, todos podem se transformar em personagens da Commedia Dell’Arte. Tudo isso - e mais - pode ser conferido em realidades muito distantes da brasileira,em solos longínquos de pátrias amadas por seres culturalmente distintos. Por isso, não se pode limitar horizontes. Ao contrário, é preciso se manter aberto ao novo.


TRIBOS

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POR MARIANA AVANZI

FOTO: SCHUTTERSTOCK

Contemplando o nascer do sol A fuga do imediatismo moderno e a paixão pelos detalhes da vida O que no passado parecia um um sonho, virou hoje um projeto de vida. A busca incansável pela felicidade e a vontade de se libertar dos padrões sociais fazem muitas pessoas procurar alternativas para sair da zona de conforto e encontrar outra forma de viver: viajando pelo mundo. Suzerlete Fernandes tem 42 anos e é professora de Artes. Apaixonada pelos detalhes da vida, considera-se refém da rotina e compromissos. Porém, a vontade de conhecer o mundo chegou cedo. Filha de caminhoneiro, costumava viajar com o pai e se encantava com cada novo lugar que conhecia. ‘’Lembro de meu pai dando carona para mochileiros. Eu viajava naquelas histórias, sonhando em conhecer o mundo com os meus próprios olhos. A ideia de ver o nascer do sol em diferentes lugares causa em mim um encantamento e desperta a vontade de voar”. Com a chegada da vida adulta, vieram os •ilhos e os planos tiveram que ser adiados. Hoje, mais de vinte anos depois, Suzerlete se sente novamente livre para arrumar as malas e sair da zona de conforto. Assim como ser nômade implica desapego,

ela demonstra não dar muita importância para patrimônios materiais. ‘‘Não adianta construir e possuir mil coisas para morrer sufocada pela luta diária da rotina. Além disso, não precisamos de muito para ser feliz, precisamos de coragem para buscar o que nos preenche de verdade’’, a•irma a educadora. Volta ao mundo Acostumada a viajar nos •inais de semana e feriados para suprir o desejo de ver o mundo, Suzerlete fez amizade com um casal italiano no Rio de Janeiro. Bella Dias, enfermeira, e Higor Rudi, biólogo, casados há dez anos, não estavam contentes com a vida que levavam no interior da Itália, por isso decidiram trabalhar por mais dois anos, vender casa e carro e usar o dinheiro para viajar pelo mundo. No início da vida nômade, o biólogo tinha contrato com uma empresa italiana e pesquisava as possibilidades de importar café do Peru para a Itália. Esses estudos eram uma das fontes principais de renda do casal, além de outros trabalhos que executavam por onde passavam. Ao término do contrato com a empresa, Rudi e Bella chegaram até a trabalhar como kitchen hands

na Argentina. “Superamos tudo com muito otimismo”, conta Bella. O casal nômade, já há sete anos na estrada, está atualmente na Bahia e pretende sair do Brasil ano que vem. O próximo destino é a Bolívia, e eles já estão fazendo contato com nômades de lá para tirar dúvidas e planejar o próximo roteiro. Em tempos onde depressão, ansiedade e outras doenças emocionais dominam grande parte da população mundial, buscar um estilo de vida alternativo pode ser uma resposta aos que não se encaixam no padrão imediatista e consumista. Para a psicóloga Jessica Lins, o nomadismo pode se relacionar diretamente a questões emocionais. “Assim como Suzerlete se sente sufocada, este pensamento permeia no mundo nômade. Eles querem fugir do que a sociedade quer impor sobre eles e viver de uma maneira mais leve, com desa•ios singulares”, expõe a pro•issional. Ainda segundo a psicóloga, desde que a pessoa se prepare para as mudanças e não crie a ilusão de não terá mais problemas ao adotar esse estilo de vida, o nomadismo pode sim ser uma solução para quem não gosta de rotina. junho 2019. Nomodismo


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