2K A nova
cidade do
rock Projetos sociais, tecnologia, histórias de amor e surpresas: tudo isso em um novo endereço
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designers Jobson Correia, Juliano Santos e Lia Costa
diretora de arte Carolina Inthurn
Chefe de reportagem Thais Alencar
Editora Chefe Emanuely Miranda
Secretária de redação Luciana Ferreira
Diretor de redação Ronaldo Pascoal
Coordenação e orientação de projeto Prof. Ms Andréia Moura
2KEXPEDIENTE
Infografia Juliano Santos, Jobson Correia e Maiara Fernanda
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Rap: Historicamente, música e militância têm harmonia
Food Truck: As carrocinhas de comida enchem a barriga e não esvaziam o bolso
Em terra de likes, Whindersson Nunes é joinha
Perfil
Jovens dispensam vida social para ficar em casa na companhia das séries
Reportagem
matéria
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CAPA As definições de Rock in Rio foram atualizadas
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fotógrafos Juliano Vitório e Kennedy Nunes
DIREÇÃO DE FOTOGRAFIA Juliano Vitório e Luciana Ferreira
sUPERVISÃO GRÁFICA E EDITORIAL Andréia Moura
COLUNISTAS Carolina Inthurn, Emanuely Miranda, Juliano Vitório, Lia Costa, Luana Teles, Luísa Nakayama, Luciana Ferreira e Thaís Alencar
rEPÓRTERES Victoria Coelho, Sabryna Ferreira, Thamiris Senis, Tabbta Morais, Ana Flávia, Kamila Freitas, José Eduardo, Andressa Viana, Michelle Fernandes, João Pedro Gil, Soane Andrade, Giovanni Manzoli, Larissa Schimmack, Aira Annoroso, Raiane Sousa, Letícia Alves, Roberta Camila, Elisa Miguel, Henri Farias, Rui do Amaral, Ygor Gomes, Carla Barbosa, AlbertoBunga, Bianca Machado
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Em tempos imagéticos, as Graphic Novels se são tendência
Quantas curtidas você vale?
Militar como e pra quê? Aqueles que resistiram à ditadura nos ensinam
Desenho animado nem sempre é coisa de criança
Jogos: Gamers mostram que a brincadeira pode virar coisa séria
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A Selva de Pedra é casa da resistência construída pelos poetas do Slam
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Com os pés na estrada e bagagem nas costas, os mochileiros seguem viagem
Reportagem
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Reportagem
EDITORIAL
Deserto. Geogra icamente falando, trata-se de uma região com pouca ou quase nenhuma incidência de precipitação, ou seja, escassez de água, seja em qual for o estado ísico. Metaforicamente, deserto se refere à falta, ao vazio e muitas vezes à solidão. “Jornalisticamente”, deserto se refere ao quinto semestre dos alunos do terceiro ano do Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp), campus Engenheiro Coelho. Éramos 60 em 2015 e hoje nem passamos de 30, entretanto, é prazeroso saber que ninguém da pequena turma morreu à seca. A sensação desértica desses seis longos meses de 2017 nos fez desejar água a todo custo. Procuramos e encontramos poços fartos, mas foi grande a decepção ao vê-los insu icientes para suprir a todos. Continuamos cavando e tudo o que encontrávamos eram riachos dos quais repartido em 30 sobravam apenas gotículas frente à tamanha sede que sentíamos. Quando tudo parecia sem esperança e quando todos achavam que ali terminava nossa jornada cansativa em busca do diploma, eis que surge a 2K Magazine. Um projeto aparentemente abortado, mas que com o tempo se tornou nosso oásis em meio a terra árida e pesada. A revista que você tem em mãos, caro leitor, é feita dos sonhos e da esperança de uma turma que se permitiu aprender e das convicções e aspirações de uma líder que nos guiou pelo caminho quente e áspero do deserto. É feita do trabalho ferrenho de diagramadores que não pouparam esforços para entregar a você um bom material. É feita ainda da força de jornalistas que con iaram no melhor que poderiam fazer. A 2K é o resultado de uma caminhada longa, mas que chega ao destino. Esta revista é pensada e trabalhada, desde o rafe ao layout, da identidade visual à matéria de capa, para que você,
Diretor de redação
Ronaldo Pascoal
querido leitor nascido nos anos 2000, entenda a importância da cultura como agente transformador da vida. A letra “K” é uma homenagem a vocês, milhares de iéis internautas que não se cansam de nos surpreender. Temos a singela missão de “causar”! Causar em você amigo, de um jeito divertido e descontraído, com a sua linguagem e no seu tempo, a crítica e a re lexão. E para isso é preciso inspirar e, para inspirar, é preciso re letir. Para re letir é preciso observar e como toda observação produz mudança, queremos mudar, se assim nos for permitido, a sociedade em que vivemos. Nessa edição especial falamos de militância, de partilha e empatia. Isso para que você perceba que a 2K Magazine é aberta ao diálogo, ao diferente, ao inovador e surpreendente. Falamos de cinema para que você entenda que os nossos mais íntimos desejos podem sim ser representados, interpretados e até mesmo personi icados com vários atos e faces. Falamos de música, para que você ouça no ritmo que quiser que a cultura é universal e que o erro é não se apropriar da hibridização dos povos, da tantas misturas que nos tornam unos. Aqui você encontra seu destino em meio a tantos possíveis caminhos e descobre que com uma pequena mochila é possível conquistar o mundo e acumular grandes experiências. Nosso objetivo único é servir a você um conteúdo rico, pensado e sério. Com a visão de que a educação é o caminho contrário à ignorância. Oferecemos a vocês um conteúdo que fala mais do outro do que da gente.A 2K Magazine é para nós um oásis e é com imenso prazer que partilhamos dessa fonte com vocês. Bebam, se fartem e se voltarem a ter sede, aqui vocês encontrarão água limpa em meio ao deserto sem vida. 2K
PRECIPITAÇÃO NO DESERTO
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NOTAS
Show da Poderosa
de volta ao Spotify
novas temporadas DA dc
A cantora Anitta está entre os artistas mais in luentes do mundo. Ela ocupa a 15ª posição do ranking numa lista cujo topo pertence à banda sul-coreana BTS. Em segundo lugar, está Justin Bieber, seguido por Shawn Mendes e Shakira. Anitta deixou para trás artistas como Halsey e Rihanna. A lista foi divulgada pelo site Billboard.
Os usuários do Spotify poderão voltar a ouvir as músicas da cantora Taylor Swift. Três anos após a saída, a artista volta às plataformas de reprodução de música em streaming. Todos os cinco álbuns já estão disponíveis. Eles podem ser acessados no recurso premium e nas versões grátis. A informação foi divulgada na página o icial de Taylor no Facebook.
A emissora norte-americana de TV, CW, anunciou a estreia das novas temporadas. Supergirl, The Flash, Legends of Tomorrow e Arrow, retornam em outubro. Só Raio Negro não tem data anunciada, mas pode chegar às telinhas em 2018. As quatro séries farão um crossover em dezembro. No Brasil, as séries da DC são exibidas pelo Warner Channel.
Mais um para o time
Rumo ao penta
Harry Styles no Brasil
O ator Chadwick Boseman con irmou a sua participação como Pantera Negra no elenco de Vingadores: Guerra In!inita. O ator publicou um vídeo em suas redes sociais e escreveu na legenda: “Aqui vamos nós… #PanteraNegra #GerraIn inita”. O lançamento do ilme está previsto para dia 26 de abril de 2018. Desta vez, participam os Guardiões da Galáxia, Homem-Aranha e Soldado Invernal, além do retorno de Thor .
O jogador espanhol Cristiano Ronaldo é novamente favorito à conquista do prêmio Melhor Jogador do Mundo em 2017. Foi ele quem levou a bola de ouro no ano passado. A conquista do Campeonato Espanhol e Champions League, as grandes exibições no inal da temporada iguram entre os motivos de seu favoritismo para esse ano. Caso ganhe, ele se iguala ao argentino Lionel Messi, com cinco vitórias nesta premiação.
O cantor Harry Styles, que icou conhecido por seu trabalho no One Direction, con irmou duas apresentações em terras brasileiras. A turnê tem início em março com shows pela Europa. O cantor chega ao país no dia 27 de maio para um show no Rio de Janeiro e segue para se apresentar em São Paulo no dia 29. Ele inaliza com uma série de apresentações pelos Estados Unidos.
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MAM visita Campinas
episódio extra
a Linha do tempo da arte
A Galeria de Artes do Instituto CPFL em Campinas recebe, até o dia 02 de julho, a mostra Paisagem Na Coleção do MAM – Museu de Arte Moderna de São Paulo. Entre as 69 obras que fazem parte da exposição, estão criações de Tarsila do Amaral e Alfredo Volpi. O agendamento das visitas pode ser feito pelo e-mail. A entrada é gratuita.
Os criadores de “Stranger Things” revelaram que a segunda temporada da série terá um episódio extra. A vida de Will permanece em ênfase e ele sofre com lashbacks do Mundo Invertido. Joyce tenta apagar os traumas através de um namoro. Já Hopper continua investigando a morte de Barb. A nova temporada da série estreia 31 de outubro na Net!lix.
O Museu de Arte Contemporânea de Campinas exibe obras tradicionais do seu acervo desde 1960 na mostra “Linha do Tempo”. A exposição contém diversos tipos de técnicas, materiais e linguagens da arte contemporânea. A exposição !ica disponível até o dia 23 de julho, de terça à sábado, das 10h às 18h. Nos domingos e feriados, das 9h às 12h. A entrada é gratuita.
energia das bicicletas
xeque mate
a astúcia da Marvel
Filmes projetados a partir da energia gerada por meio de pedaladas de bicicletas chega à Campinas. O cine Brasil começou o projeto no Rio de Janeiro e já passou por várias capitais brasileiras. O evento, idealizado pela produtora In!inito e organizado pela Raízen, será apresentado na Praça Arautos da Paz e conta com um baile ao ar livre. As exibições ocorrerão sábados e domingo, das 16h às 21h.
O Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) associa jogos de quebra-cabeça e xadrez ao tratamento de adultos e idosos que sofreram recentemente acidentes vascular cerebral (AVC). Os softwares criados são controlados a partir de movimentos corporais, mas ainda estão em fase de testes. Especialistas a!irmam que os games auxiliam a reabilitação neurológica.
Uma nova heroína baseada no personagem Chapolin Colorado, a série de TV mexicana, chega ao mundo dos quadrinhos. A personagem, RedLocust, foi criada pelo mexicano Humberto Ramos, em parceria com Mark Waid. A HQ da personagem vai tratar de temas como a luta contra o bullying e assuntos relacionados a esse público.
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NOTAS
artistas surdos
Festival de circos
O gra iteiro brasiliense Rafael Caldeira foi convidado para participar do Festival Internacional Clin d’Oeil, evento de artistas surdos que acontecerá em julho, na França. Ele dará uma o icina de gra ite para adultos e crianças com de iciência auditiva. O evento aconteceu pela primeira vez em 2003 e desde então tem edições a cada dois anos. O objetivo do festival é introduzir a linguagem de sinais em diversas formas artísticas.
Adultos e crianças puderam conferir espetáculos e vivenciar atividades circenses em 13 unidades do Sesc em São Paulo. A quarta edição do Circos - Festival Internacional Sesc de Circo - aconteceu no mês de junho e teve atrações diárias com ingressos acessíveis, além de alguns eventos gratuitos. Na quarta edição do evento, o foco foi a diversidade. Foram 13 atrações internacionais, inéditas em São Paulo, e 18 nacionais.
ExpoVINIS Brasil 2017 A capital paulista recebeu a 21ª edição da ExpoVinis Brasil. Este é o principal evento ligado à produção de vinhos no País. O encontro reúne produtores, especialistas, consumidores e fãs da bebida no Pavilhão Branco do Expo Center Norte. Realizado todo ano na Capital paulista, a reunião ocupa posição de destaque na rota do Wine Business e aparece entre os 10 eventos mais importantes do Brasil e do mundo para o setor.
Cinema na Unicamp O II Ciclo de Cinema do ForMa, promovido pelo Centro Cultural IEL da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), exibe, no mês de agosto, dois ilmes que dão continuidade ao circuito iniciado em maio. Os longas “Filhos do Silêncio” e “Códigos de Guerra” unem as temáticas de cinema e linguística. Os ilmes são passados no Miniauditório no Centro Cultural do IEL/ Unicamp às quintas-feiras, sempre às 15h30. A entrada é franca.
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Correio Gourmet O primeiro encontro do Correio Gourmet realizado em Campinas (SP), movimentou a cidade no primeiro dia de junho. Cerca de 100 pessoas participaram do evento que teve como objetivo a comemoração dos 90 anos do Correio. Um cardápio elaborado foi preparado pela Chef Mariane Coelho especialmente para a programação. O intuito do Correio é promover anualmente a combinação de pratos e sabores da região campineira.
Deslike no terrorismo Após ataques terroristas em Londres, o Facebook informou que se transformará em um ambiente hostil para os terroristas. Esse comunicado veio em resposta à atitude da primeira-ministra do Reino Unido Theresa May. Ela exigiu uma ação por parte das empresas de internet. Pediu maior regulamentação internacional e disse que as empresas do setor são responsáveis por dar espaço para que ideologias extremistas se desenvolvam.
NOTAS
1° Rock Bier Limeira 2017
Kuduro in Rio
casal no motorhome
O dia 28 de julho será dia de rock. O 1° Festival de Rock em Limeira ocorrerá na Hípica de Limeira, que ica na Via Antônio Cruanes Filho. O evento vai juntar o melhor da comida sobre rodas e muita música. Além de bandas de rock autorais e covers da região, o festival conta com diversos seguimentos de food truck, drinks e chopp à vontade. Dentro da programação haverá premiações para as três melhores bandas participantes.
A cantora angolana Titica, ícone do kuduro em seu país, será a convidada especial da banda Baiana System para atuar no Rock in Rio 2017. Pela primeira vez, a Angola subirá ao palco de um dos mais prestigiados festivais de música do mundo. Baiana System e a cantora já testaram a união. Juntos, gravaram “Capim Guine”. A faixa inédita, com ritmo dançante e letra sobre igualdade, será apresentada no show do dia 22 de setembro.
Para aproveitar o clima do dia dos namorados, os atores Max Fercondini e Amanda Richter publicaram o livro “América do Sul Sobre Rodas”. Eles contam sobre suas experiências vividas durante seis meses de viagem dentro de um motorhome por estradas sul-americanas. Os atores, que dividiram um espaço de 18 metros quadrados ao longo da aventura, passaram por Uruguai, Argentina, Chile, Equador, Peru e Colômbia.
Shows para a região
Festa Junina em Campinas
Arte na Unicamp
A programação de show na região está cheia de opções que alcançam todos os gostos. No dia 24 de junho, no Theatro Municipal de Paulínia, quem dá o tom da noite é a banda Ira! Já no dia 01 de julho, Tiago Iorc se apresenta na Red Eventos, em Jaguariúna. E em Indaiatuba, no dia 14 de julho, a banda CPM 22 une os grandes sucessos com os sons mais quentes. Opção é o que não falta. Agora é só preparar a agenda e o bolso.
O arraiá promete ser quente em Campinas (SP). Paróquias e clubes da cidade preparam festividades para a época tradicional do ano. As inscrições já estão abertas e podem ser feitas nas paróquias e clubes credenciados. Os eventos da temporada 2017 de festas juninas e quermesses envolvem quadrilhas, casamentos caipiras, músicas e comidas típicas da região campineira e adjacências.
A Galeria do Instituto de Artes (GAIA) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) recebe, até o dia 07 de julho, a exposição APOKALYPSIS, do artista Ernesto Boccara. A mostra apresenta pinturas em grandes formatos, esculturas, estudos sobre arte e criação de desenhos. Interessados em conhecer as obras do artista e em aprender mais sobre o assunto podem visitar a galeria entre as 12h e 17h, exceto aos domingos.
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Entrevista
COLORINDO PALAVRAS
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Comparar o ato de escrever com a respiração é só para os amantes das palavras. Criar textos que toquem o íntimo das pessoas é intenção de Matheus Rocha, dono do Blog Neologismo e autor do livro “No meio do caminho tinha um amor. ”
ROBERTA CAMILA E ELISA MIGUEL Jovem, formado em jornalismo, adora falar sobre a vida e acredita que o mundo possa ser um lugar legal para viver. Essas são algumas informações e características de Matheus Rocha. Atualmente soma quase 700 mil seguidores nas redes sociais e a cada texto publicado toca corações. Matheus escreve sobre a vida, transforma as palavras em auxílio para seu leitor, aproximando-se cada vez mais de cada um. Ele faz de suas experiências, combustível para escrever, com a intenção de passar ao leitor tudo aquilo que é verdadeiro. Autor do livro “No meio do caminho tinha um amor”, escreveu também “Muito amor por favor”, juntamente com Arthur Aguiar, Ique Carvalho e Frederico Elboni. Seu Blog chama-se Neologismo – fenômeno que consiste em atribuir um novo sentido as palavras que já existem – e é isso que Matheus vem fazendo, ele decidiu colorir o que era preto branco, escolheu fazer de sua vida uma aquarela. De onde vem sua inspiração para escrever? Você tem momentos específicos para isso ou em qualquer lugar que es ver e surgir uma ideia você para e “coloca no papel”? Costumo sempre atender aos chamados da inspiração. Às vezes, pode ser no meio do trânsito, no aconchego do quarto ou no meio de um voo. E ela vem sempre das minhas experiências. Do que eu vivo. Do que faz meu coração pulsar. Como você se sente em saber que seus textos são uma forma de ajudar as pessoas a passarem por momentos di!ceis?
Eu me sinto lisonjeado. É lindo falar de si e tocar o outro. É algo que me encanta desde a primeira vez que aconteceu e acho que vai ser especial para sempre. Em sua descrição no Blog Neologismo você diz que “sonha que pode abraçar as pessoas através das palavras ”. O que isso significa para você? É servir de colo para quem precisa de um afago. É ser ombro amigo para quem precisa desabafar. É emprestar os ouvidos para quem precisa gritar. O que você pretende passar ao seu leitor quando está produzindo um texto? Eu tento ser iel aos sentimentos. Mesmo que, às vezes, seja dolorido de ler. Acho que se eles perceberem que existe verdade em tudo aquilo, se identi icarão. A verdade fala por si só. Vivemos uma época em que os jovens têm deixado os livros na estante por conta de tanta tecnologia. Como você vê o uso das redes sociais nesse aspecto? Eu acho que existe uma magia no papel que nenhuma tecnologia irá suprir ou substituir. Mas as redes sociais chegaram para conectar, aproximar pessoas. Então, eu uso os meus canais virtuais para convidar as pessoas à uma experiência of line, no caso, com meus livros. O que significa “escrever” para você? Para mim é como respirar. Se, por algum motivo, não colocar tudo que sinto nos textos, acho que irei morrer as ixiado. Seu livro “No meio do caminho nha um amor” retrata a dificuldade do fim de um relacionamento e as delícias de se apai-
xonar novamente. Qual sua intenção ao escrever er essa obra? Eu quis mostrar que todo inal também é um recomeço. repleta de reecomeço. A vida é replet começos. história, por mais bonita s. Toda história que seja, pode acabar, mas isso não signi ica que nunca mais amaremos. Somos eternos e incuráveis apaixonados. Amaremos até o último suspiro de vida, mesmo que juremos que nunca mais. Você produz textos que falam sobre gra dão. Pelo que você é grato hoje? Sou grato por viver, poder escrever, por ter quem leia meus textos, meus livros, pelo amor que sinto, pela mãe que eu tanto amo. Gratidão engrandece a vida. O que o Matheus de ontem diria para o Matheus de hoje? Vai icar tudo bem. Tenha força, escreva, respire fundo e erga a cabeça. Uma das melhores qualidades do mundo é que ele gira. O que te dói hoje, vai passar. O que significou escrever o “Muito amor, por favor, ” com outros escritores? Foi uma experiência muito interessante. Quatro caras de lugares, idades e experiências diferentes, falando sobre a mesma coisa — o amor. Acho que o livro serviu para que todos os nossos leitores tivessem a possibilidade de perceber o amor sob diversos ângulos. Quais seus planos para o futuro? Quero continuar lançando novos livros. Já estou com o próximo quase pronto. Quero também migrar para o YouTube e seguir levando minhas palavras por onde o vento me guiar. 2K
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REPORTAGEM
OLHA O FRANGO COM QUIABO! Selva de pedra: a casa dos poetas livres KAMILA FREITAS E JOSÉ EDUARDO LOPES A arte é poesia e nos ensina. Traduz e exprime sentimentos que estão dentro de nós. Tudo através da criatividade. A obra poética esbanja recursos linguísticos e, quando entendida, é linda. O professor e poeta Luis García Ferreira diria que é “um ajuste de contas com a realidade” e o poeta Gabriel Celaya de ine como “uma arma carregada com o futuro”. Nas palavras do professor Frederico Fernández Moreno, uma poesia faz tremer e compreender. E quando o Slam Resistência chega, tudo treme. A transformação através da palavra é a essência trazida em versos por jovens adeptos ao movimento. O Slam é uma competição spoken word, ou seja, uma arte literária na qual músicas, poemas e histórias são faladas ao invés de cantadas. A Batida de Poesia ou Poetry Slam se resume em uma disputa entre poetas reunidos para recitarem suas rimas singulares. A organização teve início nos Estados Unidos na década de 80, junto ao movimento Hip Hop. A tendência se espalhou pelo país até chegar na Europa e então alcançou o Brasil nos anos 2000. Inspirado nas “Quintas de Resistência”, realizadas entre advogados ativistas, e nos movimentos sociais em 2013, Del Chaves idealizou, no ano de 2014, o Slam Resistência. O artista já frequentava outros grupos semelhantes em São Paulo; o Zona Autônoma da Palavra (ZAP), primeiro do Brasil fundado em 2008 e o Slam da Guilhermina, evento
do slamer Ericson Carlos Silva (conhecido como Banks), criado em 2012. O primeiro feito na rua. A experiência com manifestações anteriores deu a Chaves a bagagem para fazer sua resistência, cujo dia, horário e local são de inidos. Acontece todas as primeiras segundas-feiras do mês, às 19 horas, no escadão da Roosevelt com a Rua Augusta. Segundo o idealizador do movimento, a temática das rimas são os fatos que não ganham a atenção da mídia e quando ganham, são estereotipados. “O Slam Resistência surgiu desse abençoado luxo humanitarista de ativistas e do enfrentamento político”, enfatiza. O slamer Cleyton Mendes, enfatiza sua luta através das rimas, em prol das causas sociais. “Com a coluna ereta, com a mente aberta, disposição de atleta, tirando os vermes da reta, o topo é a meta. Eu não ‘tô’ sozinho. Vem comigo uma legião de poetas fazendo poesia para protestar, reivindicar”, declama. Segundo Banks, a primeira geração de slamers desbravou, difundiu e fomentou todo o universo da poesia falada e conseguiu concretizar a ideia de points do Slam na selva de pedra. A segunda, já teve em quem se inspirar e segue com uma equipe que se une em torno do mesmo ideal. Toda vez contam com um ou dois apresentadores, um responsável por calcular as notas, um assistente de produção, um videomaker, jurados escolhidos na hora, vez ou outra Djs e participações internacionais.
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“Morte por ingestão de 25 doses de vodca deixou o povo mais chocado do que a distribuição gratuita de balas por desconhecidos fardados” Trecho da poesia de Rafael Carnevalli (foto na p. 14)
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Mensagem lavrada e alma lavada.. A batalha de poemas de rua resiste às noites frias de São Paulo. O melhor poeta é escolhido por juri popular formado na hora da disputa.
Resis r No dicionário é possível encontrar várias de inições para a palavra “resistir”. Todas, se encaixam ao movimento, mas a que mais se aproxima seria: “qualidade de um corpo que reage à ação de outro corpo”. Dá para entender que há alguém impondo algo que outro alguém se nega a fazer? Talvez você pre ira Física a Português e entenda que a primeira Lei de Newton também serviria como de inição. A premissa a irma que quando nenhuma força é exercida sobre os corpos, eles permanecem em repouso. É a força que se opõe ao movimento. Existindo imposição, haverá resistência. Uma cena cresce e emerge uma sociedade de poetas livres. Livres ou resistentes ao sistema que oprime? São jovens engajados nas lutas por seus ideais e que entram numa briga de brincadeirinha e erguem a voz para expressar a batalha das suas histórias reais. A regra aqui é clara: 3 minutos sem nenhuma ajuda, além de falas que tem sempre muito a dizer sobre racismo, feminismo, machismo, luta de classes, homofobia, política, entre outros. E seguindo a lógica, os slamers resistem à sua maneira. Militância por justa causa Toda criança já resistiu a algo. Seja uma verdura que não gostava muito ou aquele sucão de beterraba, cenoura e
laranja. Os mais seletivos certamente resistiram ao frango com quiabo da vovó. Se a escolha de não comer o frango fosse além da repulsa pela baba do quiabo e tivesse inalidade de libertação do animal, por exemplo, sua resistência em comer o frango poderia ser caracterizada agora como militância. Esse termo consiste em uma causa a ser defendida pela minoria silenciada. Todavia, a militância não deve ter olhos apenas para os problemas que convém. Dessa forma se torna vazia. Por mais que lute por uma situação legitimada, reproduz outros tipos de opressão. O poeta do grupo Slam Resistência explica a relação por meio de rimas e versos. “Vocês diziam que odiavam o culto dos africanos, a macumba, pela galinha morta, mas na janta comem bife, usam jaqueta de couro e é de frango a sua torta”, defende. Até 1828 as mulheres brasileiras não podiam se matricular nas escolas, quanto mais em faculdades. Nessa época quem decidia se a mulher poderia fazer alguma coisa era o marido. Na primeira Constituição da República, o sexo feminino foi privado dos direitos políticos. Relutaram. Elas bateram de frente e resistiram ao que lhes era apresentado como ideal de vida. Caso de Nísia Floresta, nascida em 1809 e muitas outras contemporâneas. Apesar dos anos passados, a história se repete. Narriê é negra, estuda Esta-
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tística na Faculdade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e mora perto do campus, na favela da Maré. Uma vida normal a não ser pelo cabelo black power. “Tu é minoria, Narriê”, dizem. Alguém de iniu que seu cabelo não é bonito e que a moda recomenda o liso. A estudante olhou para as estatísticas mas não entende muito bem. “Se a maior parte do país é negra e não tem cabelo liso, por que sou minoria?”, questiona. Narriê entende que faz parte de um grupo social oprimido e em estado de subordinação só por causa da cor da pele ou mesmo o sexo. Narriê resiste aos estereótipos e preconceitos. A poetisa no Slam Resistência, Larissa Marques, partilha da luta e defende que cada um oferece apenas o que tem. “Eu aprendi a me ouvir, entendi e cheguei à conclusão que cada um oferece o que tem dentro do coração”, frisa. Casa dos militantes O dilema vivido por Narriê é um dos temas abordados pelo Slam. Dá-se espaço para a literatura marginal e seus eu-líricos. A alcunha de vandalismo lírico repousa sobre eles. De acordo com Banks, é um adjetivo enraizado. “Esse estereótipo, a gente carrega encravado no peito. Eternos suspeitos. Somos frutos do que a sociedade sabe fazer de mais direito. Marginais perfeitos!”, critica.
Sabotagem sem massagem
na mensagem
“Rimando fatos que não rolam no fantástico, mandando ideias de fogo contra esses papos de plástico. Podemos considerar as revoltas sociais que concorrem para a mudança do panorama social como uma cirurgia necessária, a fim de depor os regimes totalitários e seus representantes e, em esfera mais ampla, extinguir o tipo de política que engendra o padrão atual de governos e governantes. Trata-se de uma cirurgia de erradicação de políticos de baixo nível, nocivos às coletividades e ao nosso nível evolutivo” Del Chaves, idealizador do Slam Resistência
Ainda de acordo com Banks, a poesia que mais dialoga com o atual cenário da política é uma de sua autoria, feita há muito tempo, chamada “O Senhor da Limpeza”. Assim como na época em que escreveu, o governo busca fazer uma limpeza ética higienista. Gra ites e pichações foram apagados. “Limpando para icar agradável para os turistas e para os ricos. Os pobres, os doentes e os dependentes vão icando mais distantes e fora da visão da cidade”, lamenta. Na livre expressão que o Slam proporciona, voz virou munição para combate a atitudes como essa, características de um sistema considerado opressor. As meninas, na oportunidade que recebem, respondem aos machistas. Jade Fanny, vencedora da competição em 2016, fala por todas em suas rimas. “As olhadas, as faladas, as silenciadas. Mas ok. De acordo com a poesia se não for da sua família merecia, a inal quem mandou sair de casa sozinha? [...] Seus relacionamentos são a base do amor livre, magnetiza mulheres de baixa autoestima pro ranking. Usa como desculpa para manter sua masculinidade a lorada e perfeita. Se a proposta dela for com outra mulher, tem fetiche? E se for com outro homem, não aceita?”, protesta. E para manter vivo os protestos rimados, os slamers resistem até mesmo por ocupar uma praça pública. Eles chegaram, militaram, se espalharam e hoje
são mais de 30 grupos no país. Dez estão na terra da garoa. Entretanto, a arte rimada é repreendida pela Guarda Civil Metropolitana (GCM) e por moradores conservadores. Os slamers protestam sem violência. Os acontecimentos acumulados por todos ao longo da vida viram poesia “sem massagem na mensagem”, como determina o slogan dos militantes. Propagar esse pensamento é apostar na arte e na conscientização. Para isso, estimulam um espaço democrático. Embora haja muitos barulhos de carros, a voz dos resistentes se destaca. O último encontro ocorreu em 16 de junho. Del Chaves, Lika Rosa, Charles Jesus, Cérebro e Banks participaram. Os espectadores contaram com a presença internacional do poeta Jive, de New York. As Youtubers do canal “Estaremos Lá”, também compareceram Noite repleta de poesia para aquecer a alma. Com a alma quente, Charles enxerga o Slam como um encontro de pessoas para partilhar ideias coletivamente. Para o fundador do movimento, o grupo é um lugar de oportunidade para toda forma de expressão. Banks, por sua vez, caracteriza como um canal de liberdade sem medo de retaliações. “Cada vez que nos encontramos, gritamos para combater o preconceito”, conclui. E o grito de guerra resume: “Sabotagem sem massagem na mensagem. Slam Resistência!”. 2K
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COLUNA
laços frágeis Para quem já sentiu saudade do que costumava fazê-lo feliz agitada, então resolvi icar E stava sozinha para organizar minhas ideias. Distraída, mergulhei em pensamentos e só “acordei” quando um amigo chamou minha atenção. Ele sentou ao meu lado e prometeu contar episódios importantes sobre sua vida. Conversamos por alguns minutos sobre família, faculdade e interesses pessoais. De repente, pausa. Sem intenção de interromper a conversa, penso eu, ele se conectou ao primeiro Wi i disponível. Quando percebeu que eu também carregava o celular, exclamou em êxtase: “Você notou? aqui tem Wi i grátis!” A conversa não prosseguiu. Restava agora pegar o celular também. Ficamos navegando, somente. Voltei para casa martelando aquela frase na minha cabeça: “Wi i grátis”. Isso me incomodou. Pensei nas inúmeras vezes que, conectados às coisas, deixamos de nos aprofundar no outro. Aquele amigo deixou fragmentos de sua vida passarem despercebidos. Foi só por um instante, mas o tempo não volta mais. Ainda esses dias, procurei uma pessoa muito querida para pedir con-
selhos. Precisava ouvir de alguém com experiências maiores que as minhas, uma razão para estarmos tão distantes uns dos outros. José, aos seus 55 anos, dedicou parte do seu dia para recordar comigo suas lembranças. Retornou à adolescência, mais especi icamente, aos encontros de família. A sua memória recordava um momento especial: uma tia preparava chá de açúcar queimado para os visitantes e todos da casa sentavam unidos para ouvir e contar histórias. Nesse instante, percebi claramente pensamentos longes e um sorriso ausente. José revelou uma saudade gigantesca em seus olhos. Foi só conversar com ele para então compreender: o problema não está no avanço das coisas. Não é o tempo, muito menos o acúmulo de atividades. É a forma. Simplesmente deixamos de nos atentar aos pequenos detalhes que tecem uma relação e isso sim é desconfortável. Como José, eu também sinto saudade do que realmente importa! Das rodas lotadas de amigos para conversar ou desconversar, apenas. Sinto falta de dar as mãos, tocar o rosto e abraçar sem nenhuma restrição. Penso nos dias que sentávamos à mesa em família, despidos da tecnologia e
do irreal, quando nos entreolhávamos e sabíamos exatamente o que o outro queria dizer. Tenho lembranças dos relacionamentos regados com serenidade que ignoravam o senhor tempo. Nós erámos mais dispostos a esperar o momento do outro. Já fomos muito mais pacientes e tolerantes. Sinto saudade de me lançar em algo por pura emoção. Estou lotada de saudade, você não? Nós entramos no modo off e perdemos os momentos mais signi icativos, porque nos entupimos de tantas outras coisas que julgamos ser mais importantes. Incapazes de segurar a tempestade, esperamos o frio como nosso próprio cobertor. Entendo, estar sozinho é atrativo e, às vezes, necessário. Tudo bem, também acontece comigo. Já silenciei quando os gritos estampavam as paredes do meu eu, porém, não se engane porque ninguém consegue enfrentar um inverno rigoroso sozinho. O bilhete de embarque que nos levaria ao encontro das mais lindas histórias está escapando por entre nossos dedos, sendo levado pelo vento, por medo, vergonha, falta de segurança para dizer o que ocorre dentro de nós. Deixa. Deixa alguém te fazer um café. Juro que aquece a alma por dentro. Adormeça sua autodefesa, esqueça o desapego e jogue a indiferença pelo ar. Chegue mais perto, ique na janela e olhe o que acontece a sua volta porque o trem da vida só passa uma vez. 2K
LUANA ANA TELES LES
JORNALISTA ISTA
18 2K MAGAZINE • EDIÇÃO ESPECIAL JUNHO 2017
MATÉRIA
Diversão profissional
Os videogames que antes faziam a festa da garotada e às vezes estragavam a televisão da vovó, agora se revestem de seriedade e invadem o mundo virutal JOÃO PEDRO FRAGA
Do mundo ísico para a realidade virtual. Das quadras, pistas, campos para a tela de uma máquina que reproduz por meio de códigos um ambiente competitivo. Este é o cenário do e-Sports. Categoria de jogos eletrônicos que, para além da diversão, se tornou uma modalidade de competição pro issional. Os valores astronômicos pagos aos jogadores, a alta aplicação inanceira na área por parte de empresas, além do sólido investimento das emissoras para exercer o direito de transmissão dos torneios, aliado ao aumento de telespectadores levam à constatação de que videogame ultrapassou a ideia de diversão. Os jogos online sempre foram uma febre no mundo e no Brasil a onda não é outra. Do Counter-Strike (CS) 1.5, um dos primeiros games a fazer sucesso, ao League of Legends, o mais popular nos dias de hoje, os brasileiros compõem uma parcela signi icativa de logins em jogos eletrônicos. Um dos aspectos que justi icam o crescimento de jogadores e telespectadores no país é o sucesso de alguns brasileiros tanto dentro do Brasil, quanto no cenário internacional. Otávio Boccuzzi, comentarista da ESL pro League no Brasil (torneios de CS transmitido para o mundo), acha que o jogo voltou a ser destaque no país graças aos títulos conseguidos por brasileiros no exterior. Ainda assim, a estrutura de jogos e treinamento precisa melhorar muito. ”Apesar das di iculdades, estamos gradualmente caminhando para uma evoluação no gênero”, explica. Para compreender a importância e expressividade da participação brasileira em jogos online, nos Estados Unidos a equipe da SK Gaming é composta só por brasileiros contratados por uma empresa alemã. O grupo de jogadores saiu do Brasil para tentar a sorte no exterior e hoje defende os times da terra do Tio
Sam. Inclusive, a equipe do Counter-Strike Go, gênero evolutivo do Counter-Strike 1.5, é a única bicampeã mundial. Mas se por um lado o reconhecimento cresce no exterior, no Brasil os competidores ainda enfrentam vários empecilhos. Mesmo com a realização de torneios no país, Bernardo Bida, narrador da ESL pro League no Brasil, acredita que o dé icit na estrutura oferecida para o esporte não permite aos jogadores alavancar a carreira. “Acho improvável que um time no cenário brasileiro ganhe visibilidade fora do país, já que aqui não se tem patrocínio e estrutura para competir com os times de fora”, destaca. Diferente do CS, o League of Legends, conhecido como LOL, é o jogo com maior estabilidade e audiência no Brasil. Aqui, a estrutura e o patrocínio são maiores graças ao retorno inanceiro resultante das competições dos times no exterior. Um exemplo disso, foi a inal do campeonato brasileiro de LOL organizada no ginásio do Ibirapuera para mais de dez mil pessoas. O evento foi transmitido pela internet e pelo canal de TV a cabo SporTv. O vencedor garantia uma vaga para o torneio mundial. Em reconhecimento ao número considerável de espectadores do LOL, a emissora de TV americana ESPN fechou um contrato de 500 milhões de dólares
para ter o direito de transmissão dos próximos cinco anos com os torneios do jogo. Sem contar nos times de futebol e basquete que têm entrado nesse universo dos jogos online. Gabriel Torres, jogador de LOL no Brasil, comenta que apenas ter torneios no país não é su iciente. Os jogadores precisam de apoio e patrocínio para treinar no exterior. “É preciso treinar e competir com os melhores do mundo, a inal a competitividade e o talento dos asiáticos vão dominar o cenário das competições por muito tempo ainda”, argumenta. O desnivelamento dos jogadores brasileiros com os de outros países se comprova também pelo salário. Gabriel Kami um dos maiores salários do Brasil no LOL, recebe R$ 20 mil mensais, enquanto o coreano Lee “Faker”, maior jogador do mundo, recebe o equivalente a R$ 8, 5 milhões por ano. Todo o dinheiro envolvido, o crescimento de telespectadores pelo mundo e o empenho da Federação Internacional de e-Sports em fazer da modalidade um esporte legítimo, demonstram que a categoria pode ser incluida na lista de atividades esportivas mundiais. A inal, o retorno inanceiro é igual ou até maior que outros esportes tradicionais. Jogar videogame não é mais apenas uma brincadeira para amadores e crianças. 2K
Equipe de brasileiros, SK Gaming, vence CS Summit de 2017
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COLUNA
Graphic Novel: novo mundo Uma forma alternativa de quadrinhos que encontra e desperta uma legião de leitores que os brasileiros não leem A já irmar virou quase um mantra na boca do povo. Mas a inal, lemos ou não? E o que lemos? Segundo dados da 4° edição da Pesquisa Retratos da Literatura no Brasil, 13% do público leitor a irma ter preferência por histórias em quadrinhos ou RPG. Número próximo aos melhores colocados no ranking, como romance que angaria 22% dos leitores. Batman - a piada mortal de Allan Moore e Brian Bolland, V de Vingança também de Allan Moore e David Lloyal: títulos possivelmente familiares a certas pessoas. Mas se perguntássemos do que se trata, o que você responderia? Séries, ilmes, HQ? Caso desconheça, lhe apresentamos a Graphic Novel, uma manifestação artística em ascensão. Construída à semelhança de romances prosaicos, as Graphic Novels caracterizam-se como longas histórias contadas por meio de sequência imagética. Possuem começo, meio e im. Levam a história a um fechamento concatenado. Geralmente, é publicada em volume único, salvo algumas exceções, como por exemplo, Watchmen, de Alan Moore, disponibilizada em 12 edições durante um ano. A história e o elenco dessa arte são únicos. Elas são mais extensas e sustentam tamanhos variados, bem como distintas formas de encadernação (brochu-
ra, capa dura, etc). Além disso, apresentam um valor relativamente salgado. A mudança na produção dos quadrinhos surgiu a im de atender um público mais exigente, ansioso por um quadrinho extenso e completo, cujas temáticas são distintas dos gibis de super-heróis. Não que estes sejam inferiores ou tenham desaparecido, mas passaram a conviver lado a lado com o novo estilo. Vários títulos surgiram, como Sadman de Neil Gaimam, Do Inferno de Allan Moore e Eddie Campbell, Maus de Art Spiegelman, que, inclusive, foi vencedor do prêmio Pulitzer. Entretanto, há vários outros. Alguns com um fundo jornalístico, como no caso do trabalho de Joe Saco. Até produtoras de gibis de super-heróis familiares investiram na tendência. A editora Salvat em parceria com a Marvel Comics e a Panini (responsável pelo selo Marvel no Brasil) lançou a coleção o icial de Graphic Novels Marvel. A Editora Eaglemoss, por sua vez, publicou a coleção da DC Comics. De fato, ainda temos um público que se envolve com a literatura. Prova disso é o acréscimo no número de leitores. Em 2011, o país sustentava uma porcentagem de 50% e, em 2015, esse número aumentou para 56%. Ponderemos, pois, que este não é um acréscimo gigantesco. Entretanto, é um avanço a ser considerado. Estamos caminhando, embora lentamente, para o topo. O problema é quando o progresso bate de frente com as duras críticas disparadas às obras por vezes desconside-
radas como literatura, seja por fruto da dúvida ou do preconceito. As Graphic Novels são um exemplo da incerteza na de inição do que é literário. Alguns autores não consideram essas obras como literatura e, quem as lê, pode ironicamente ser tachado de não leitor. É irrefutável a existência de livros que apresentam uma beleza poética e re inamento. Eles devem ser apresentados a todos. Mas o processo de formação de leitores não apresentaria resultado mais e icazes se partíssimos do que já é lido para então direcionarmos as pessoas ao encontro dos grandes mestres da literatura? O sucesso das HQ’s, e das Graphic Novels, corrobora o argumento do professor da Unesp, João Luís Ceccantini. Ele diz que as obras mais lidas são aquelas que abrangem distintas plataformas e realizam uma interligação cultural. Aposta-se na adaptação e recriação que “convidam permanentemente à múltipla fricção de produtos”. Diante de tantas evidencias, o momento não é mais de usar pós-verdades e defender a bandeira de que brasileiros não leem. O essencial é buscar alterar o cenário de leitura do país que ainda está longe de ser o almejado. Se cada pessoa arraigada a essa premissa trocasse as pressuposições por livros, talvez a realidade fosse outra. E aceita humildemente uma sugestão? Comece agora mesmo a navegar no mundo colorido ou mesmo preto e branco das Graphic Novels. 2K
LUCI LUCIANA FERREIRA JORNALISTA RNAL ALISTA
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MATÉRIA
Conhecer é preciso
Um país do tamanho dos Estados Unidos, mas com quase metade de sua população, é o sétimo mais rico do mundo, mas também o décimo mais desigual LARISSA SCHIMMACK
As palavras que iguram acima foram tiradas da mais nova série transmitida pela Band. Era uma vez na história, sob o comando do ator Dan Stulbach e da historiadora Lilia Shwarcz, reconstitui um período fundamental do passado, mostrando desde o império até a proclamação da República. Quem nunca ouviu reclamações que questionam as origens de nossa colonização seguidas de várias teorias e supostos episódios ocorridos na história do Brasil. Sob Portugal despenca a culpa até da corrupção política atual. Fato é que o Brasil carece de boas referências históricas devido a alguns equívocos deixados nos livros didáticos de história. Era uma vez uma história traz uma viagem ao passado do país através da dramaturgia e de uma aula de história proporcionada por Lilia. Sua participação veio a partir de uma indicação de Dan. O colega de trabalho a de iniu como
perfeita para a série e se empolgou com a proposta dos produtores. “Fiquei empolgado por termos na TV aberta um espaço para mostrar a nossa história de uma maneira profunda e divertida. Seria bom fazer de todo jeito, mas em aberto alcançamos mais gente”, revelou o ator. Esse tipo de iniciativa faz a diferença para a população brasileira porque, como de ine o historiador português Sérgio Luís Carvalho, existem equívocos transmitidos durante anos a respeito de nossa história. “Em Portugal há uma ideia de que a colonização do Brasil foi pací ica, sem choques. Para eles, os nativos foram bem tratados, ao contrário do que sucedeu com a colonização espanhola. Este mito ainda é sedimentado em algumas leituras um pouco apressadas da obra de Gilberto Freire”, explica. O historiador elogia séries que servem para ensinar e ilustrar, pois considera di ícil transmitir para as
massas a mensagem histórica de forma correta. Segundo ele, outro equívoco é a ideia de que, se o Brasil tivesse sido colonizado pelos holandeses - como esteve prestes a ser -, seríamos mais desenvolvidos hoje. Isso seria direcionar a culpa que nos pertence para os outros. Para evitar esses enganos, o estudo da História se mostra essencial. Trata-se da chave para a compreensão do presente e, sem ela, não será possível compreender que se passa à nossa volta. Logo, não saberemos enfrentar os problemas do presente. Um povo que desconhece a sua História não tem passado e, portanto, não conhece o seu presente. Dessa forma, não há condições de se preparar para o futuro. 2K
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undo é Em terra de Monteiro Lobato e Machado de Assis, nem todo mundo queles leitor. Primeiramente, vale caracterizar esse per il. Leitores são aqueles e partes, nos últimos timos que leram pelo menos um livro, seja inteiro ou em atingi idade três meses. Os não leitores, por sua vez, não atingiram essa quantidade mínima no último trimestre.
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NA CAROLINA INTHURN, JULIANO SANTOS, RONALDO PASCOAL, EMANUELY MIRANDA, LUCIANA DRADE FERREIRA, THAÍS ALENCAR, YGOR GOMES, KENNEDY NUNES, LUANA TELES E SOANE ANDRADE
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Sertões da leitura
Ensino Superior Sup
Ensino Médio
Mulheres lh
Ho Homens
44%
LEITORES POR GÊNERO E ESCOLARIDADE
56%
ESTIMATIVA POPULACIONAL DE LEITORES 105,7 milhões de Brasileiros tem o costume de ler livros regularmente.
PRINCIPAIS FORMAS DE ACESSO AOS LIVROS O advento da internet ampliou as possibilidades de acesso aos livros quer seja nos pampas ou sertões. COMPRAS EM LOJAS FÍSICAS OU PELA INTERNET 43% 22 2K MAGAZINE • EDIÇÃO ESPECIAL JUNHO 2017
PRESENTES 23%
EMPRESTADOS POR AMIGOS OU FAMÍLIA 21%
E E
EMPRESTADOS PELAS ESCOLAS 18%
LEITORES POR REGIÃO NO BRASIL Um engano, porém, é achar que a maior parte dos leitores se concentram no Sul. Ao contrário do que se pensa, o Nordeste supera essa região.
Norte
53% leitores 47% não leitores
Nordeste
51% leitores 49% não leitores 57% leitores 43$ não leitores
Centro-Oeste
Sudeste
61% leitores 39% não leitores
50% leitores 50% não leitores
DISTRIBUÍDOS PELO GOVERNO 9%
BAIXADOS DA INTERNET 9%
Sul
EMPRESTADOS POR BIBLIOTECAS 7% 2K MAGAZINE • EDIÇÃO ESPECIAL JUNHO 2017
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REPORTAGEM DE CAPA
MAG MAGAZINE AGAZ AG AZIN AZ INE IN E • ED EDIÇ EDIÇÃO IÇÃO IÇ ÃO EESP ESPECIAL SPEC SP ECIA EC IALL JU IA JUNH JUNHO NHO NH O 20 2017 17 24 2K M
Rock in Rio , atualizando... Projetos sociais, tecnologia, histórias de amor e surpresas: tudo isso em um novo endereço SABRYNA FERREIRA, THAMIRIS SENIS E VICTÓRIA COELHO É bolacha ou biscoito? “Bixcoito”, responde sem pensar um rapaz de sorriso fácil e sotaque inconfundível. As rádios tocam samba e bossa nova. A maresia corre solta em cada ponto de uma calçada gigantesca, onde água de coco, água mineral e um biscoito de polvilho chamado Globo são vendidos. Os vendedores são maneiros, falam chiando e ao mesmo tempo sorrindo. Tem arte vendida na praia. Há gente tomando sol, banho de mar e jogo de vôlei. Do outro lado daquele calçadão, uma in inidade de prédios suntuosos. Sãos as moradias de quem é cheio da grana. Atrás desses mesmos edi ícios, vive uma outra galera que também é rica. Nesse caso, rica não de dinheiro, mas de carisma. Vivem em comunidades, em que as casas são construídas lado ao lado ou uma em cima da outra. São os famosos barracos. É tanta gente vivendo nesse contexto que o lugar tem título de cidade com a maior população em favelas do país. Não dá para esquecer dos bailes funk e escolas de samba. É a casa do Cristo Redentor e do Maracanã. Dessa terra boa veio até Machado de Assis. Lá também foi cenário de algumas tantas novelas transmitidas pela Globo. O lugar já foi palco para a Copa do Mundo e até mesmo para as Olimpíadas. Para um bom entendedor, só um trecho de uma música basta. Em 1969,Gilberto Gil compôs “Aquele Abraço”. Na canção, ele deixa bem claro o que qualquer um já sabe: “O Rio de Janeiro continua lindo”. 2K MAGAZINE • EDIÇÃO ESPECIAL JUNHO 2017
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Pai e filho: Rio e rock O Rio de Janeiro carrega consigo 452 anos de história. O Rio é pai. Teve um ilho em 1985. Nessa época, o país e, consequentemente, o Rio viviam um período bem complexo. Juntos se reerguiam da ditadura militar. A cidade ainda era imatura e aos poucos ganhava maturidade e caminhava rumo à democracia. Esse mesmo ano foi o auge dos cartuchos de games como o Atari 2600 e dos tocadores de músicas chamados de Walkman. Tudo isso, hoje, é considerado ultrapassado. Entretanto, nascia o ilho do Rio e por mais distante que pareça, ele só faz inovar até os dias atuais. É o famoso “cara de 32, corpo de 18”. O ilho nascido fez a alegria de quem tem uma
paixão forte pela música, em especial pelo Rock. O nome? Bem sugestivo: Rock in Rio. Tudo aconteceu em um terreno alagadiço com espaço equivalente a 12 estádios do maracanã. Lá, cerca de 1,4 milhão de pessoas foram protagonistas de um evento que seria o maior festival de rock do mundo até a contemporaneidade. Durante dez dias, 14 artistas internacionais e 15 atrações nacionais se apresentaram. O responsável de tudo isso é o empresário e publicitário Roberto Medina. Segundo a assessoria do evento, pela primeira vez, um país da América do Sul sediou um evento musical desse tipo. “Roberto Medina inventou sua própria fórmula para realizar um evento e com ela realizou um dos maiores festivais do mundo. Ele fez isso quando esse sonho parecia quase impossível no Brasil”, relembra. Assim, o ano de 1985 icou marcado na história. O país do verde amarelo icou preto, mas não de luto. Muito pelo contrário, o maior festival de música havia nascido. Aquela edição marcou Freddie Mercury, vocalista da banda Queen. Ele icou tão impressionado com o entusiasmo do público e, durante a canção Love of my life, decidiu reger a plateia em uma cena que se tornou mítica na história do rock’n’roll. Música, conscien!zação e ação
“Não consigo pensar em nada tão bom para comparar. Era o meu primeiro show de rock em um cenário fantástico. Um sentimento surpreendente que vou guardar pra sempre”
O Rock in Rioiria enaltecer a música, o Brasil e o rock.Desde sua primeira edição, já gerou mais de 180 milhões de empregos. Além de pessoas empregadas, o evento colabora com o meio ambiente. A assessoria do Rock in Rio revela que o evento já doou 3 milhões de árvores à loresta amazônica pelo projeto Por um Mundo Melhor, consolidado na terceira edição em 2001. “O Rock in Rio quer ajudar a transformar o planeta, não só através da música e entretenimento, mas também por meio de causas sociais e ambientais”, explica. O projeto começou bem simples: 98 milhões de pessoas se uniram em três minutos de silêncio por um mundo melhor. Parte da renda do festival foi utilizada em projetos sociais. Eles também oferecem um plano de sustentabilidade
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O terreno preparado para sediar a Olimpíada será agora a casa do Rock
às empresas que trabalham no evento. Um dos lemas do festival é “Música, conscientização e ação”. O filho que cresceu De 1985 para cá, 17 edições do Rock in Rio aconteceram. Em 2015, o ilho do Rio comemorava 30 anos de existência. Nesse mesmo ano, o Brasil protagonizou o maior desastre ambiental de sua história. Um processo de Impeachment contra a presidente Dilma também acontecia. Foram tempos complexos, mas, como os outros, repleto de realizações e comemorações. Uma delas, foi o aniversário do Rock in Rio. Para celebrar, duas edições aconteceram. Uma em casa e outra na terra do Tio Sam, em Las Vegas. Lá, o festival durou quatro dias e contou com 64 atrações. Na edição carioca, os 30 anos foram bem comemorados. A homenagea-
da especial foi à saudosa cantora Cassia Eller. De acordo com a assessoria do evento, naquele ano, mais de meio milhão de pessoas foram impactadas. No meio destes, estavam o analista de Suporte Matheus Marchesini, seus amigos e a realização de um sonho da infância. Em 1994, não houve edição do Rock in Rio, mas Mateus nasceu. A partir daí a Nação do Rock ganhara mais um integrante. A data certa de quando o rock se tornou uma paixão não é bem recordada por ele. Uma suposição é a in luência do irmão mais velho. “Meu irmão me apresentou várias bandas e eu cresci ouvindo. Para mim é um dos melhores estilos de música. Se for para escolher, eu sempre vou escolher rock”, deixa claro. Vamo? Vamo! Há quem diga que tudo começou antes de Mateus nascer, e quem sabe, ele
tenha nascido com o ritmo do rock correndo nas veias. Os anos passaram e a paixão pelo rock aumentou. Até que um dia uma ideia aparentemente maluca surgiu. “Vamos ao Rock in Rio? ” A ideia não precisou ser tão discutida assim. Resultado inal: ingressos comprados e uma van fretada. Saíram de São Gabriel da Palha, no Espirito Santo, em direção ao Rio de Janeiro. Foram mais de 500 quilômetros de viagem. Quilometragem se tornou insigni icante diante da ansiedade de estar no maior festival de música e entretenimento do mundo. Estavam em 12. Alguns até já tinham ido ao evento, mas Mateus vivia algo inédito. “Não consigo pensar em nada tão bom para comparar. Era o meu primeiro show de rock em um cenário fantástico”, relembra. A maior motivação para embarcar nessa aventura com os amigos foram as bandas que se apresentariam.
Mais de 20 mil pessoas se inscreveram para ser voluntárias no evento deste ano e 3 mil foram aprovadas na primeira fase
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Nem só de música vive o ROCK IN RIO. NESTA E NAS PRÓXIMAS EDIÇÕES UMA NOVIDADE PARA QUEM COMPARTILHA A PAIXÃO SOBRE ROCK E GAMES: AS ARENAS GAME XP
Naquele dia, haveria mais bandas de rock se apresentando do que nos outros. Uma das bandas que se apresentaria era a preferida de Mateus: Metallica. E mais uma vez, os momentos vividos ali são de inidos como extraordinários. Ele recorda que tudo que aconteceu foi único e o marcou de forma positiva. Havia muita gente, mas a sensação de estar lá, de acordo com suas palavras, superou qualquer coisa. “O sentimento é surpreendente e eu vou guardar para sempre”, reforça. A primeira impressão é a que fica O ilho do Rio e parente próximo de Mateus por um dia deixou ótimas impressões e, é claro, o desejo de viver tudo de novo. Ele icou impressionado com a organização do evento. Até a grama sintética da Cidade do Rock deixou saudade. Quando já era três da manhã e ele não se aguentava em pé, o gramado foi cama para um rápido cochilo. O show acabou lá pelas 5h. Voltaram para casa exaustos. Haviam andado de meio dia até o amanhecer do dia seguinte. Mesmo com o cansaço,
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a vontade de voltar prevalecia. E foi dito e feito. 2017 chegou e eles vão voltar. Em 2015, não deu tempo de conhecer a cidade maravilhosa. Dessa vez, vão antes para aproveitar o rock e a cidade que o sedia. Para Matheus, as atrações são imperdíveis. “Esse ano, Aerosmith estará lá. Eu gosto muito das músicas deles. É uma oportunidade incrível para conhecer bandas do exterior que nunca teria chance de ver.”, anima. As novidades do Rock in Rio 2017 estão sendo acompanhadas pelos meninos de São Gabriel da Palha desde o início. Mateus tem planos de deitar na grama sintética de novo, ir nos brinquedos e conhecer mais do Rio de Janeiro, a inal, ele continua lindo e cheio de amor. Ele + ela = rock ² Em se tratando de amor, quem pode dizer que não há razão nas coisas feitas em nome dele? Era o emblemático 17 de julho de 1994 – também conhecido como “é tetra!” ou “aniversário do Mateus”. Sergio Rodrigues, que na época nem era educador ísico ainda, tinha acabado de sair do estádio e as come-
morações do dia não podiam acabar ali. Perto de sua casa, rolava um show cover da banda de rock Metallica (a preferida de Mateus). Essa era a próxima parada de Sergio. E quem pensa que na metaleira não rola um clima, se engana. No meio da multidão tumultuada e barulhenta, ele tentava encontrar os amigos, e, sem querer, esbarrou em Flávia Carreiro. Ela, que também não sabia que um dia seria economista, prontamente se virou com a intenção de reclamar com o desatento. A moça pôs os olhos no rapaz cabeludo, todo pintado de verde e amarelo, e se esqueceu do esbarrão, da banda no palco, da multidão e até mesmo do que ia dizer. Quando recuperou a fala, logo tratou de fazê-lo saber de seu interesse através de seus amigos que, por acaso, eram os mesmos que Sergio procurava. Só foi preciso mais uma festa para eles se reencontrarem. Não foi surpresa, pois ambos eram (e ainda são) apaixonados por rock ‘n roll. Ponte feita, Flávia aproveitou a oportunidade para conversar com o rapaz até perceber que não poderia ir embora sem beijá-lo. E assim aconteceu, mas não graças a Sergio. Com ape-
nas 14 anos, Flávia já era uma mulher de atitude. “Quando meu colega disse que uma amiga dele queria me conhecer, eu iquei meio assustado e empolgado. Paguei para ver”, conta o rapaz entre risos. Ele mal podia acreditar. A garota “super linda” estava interessada nele. “Naquela hora, eu já iquei igual a um bobalhão atrás dela. Fiquei apaixonado de cara”, relembra o educador ísico. Sergio e Flávia eram muito parecidos e descobririam isso mais tarde. Ela era de Virgem e ele tinha 16, na época. Sergio não esqueceu a conversa, muito menos o beijo. Convidou a sweet child para o aniversário que ele já não lembra mais se era dele ou do irmão. Tudo o que ele lembra é que ela não foi. Parecia ser o im de algo que nem tinha começado. “Eu não fui porque meu pai não deixou”, se justi ica a moça. Apesar disso, eles deram um jeito de continuar. “Nos falávamos por telefone e nos vimos no inal de semana seguinte”, completa. O namoro começou e foi do jeito que Sergio sonhou que seria: com a permissão dos pais e ilminho no sofá da sala aos inais de semana. E foi assim por quatro meses, até Flávia convidá-lo para uma festa na qual ela não estava. Ele só descobriu esse detalhe uma hora depois. Dadas as orientações sobre onde seria a tal festa, Sergio chegou ao local. “Eu peguei o ônibus, saltei exatamente onde a gente combinou e entrei no condomínio”, recorda. Depois de esperar Flávia por uma hora onde ele achava que seria a festa, o porteiro do prédio informou que haviam mais dois condomínios à frente. Na procura, Sergio vê a dona da festa passar e pergunta pela namorada. “Ela disse que a Flávia ainda não estava lá. Eu não entendi porque havia marcado para uma hora antes”, relata. Bom brasileiro que é, não desistiu de procurar a amada e foi encontrá-la na casa de outra amiga no mesmo condomínio. Ao ver a cara amassada de sono de Flávia, toda a raiva de Sergio se dissipou. “Fiquei com cara de babaca de novo e icamos numa boa”, recorda. Flávia parecia disposta a não colaborar com o romance. Mais uma vez sumiu das vistas e, dessa vez, durante toda a festa. “Fiquei sozinho com os primos dela que eram
meu grupinho de amigos”. Lá pelo im do dia, Sergio só tinha conseguido fazer um som com os amigos. Não fosse pelo rock, a paciência do rapaz já teria passado dos limites. “Falei que ia embora, mas ela disse para esperar porque queria falar comigo”, conta o músico amador. Ele – Ela = Rock Ouvir aquilo foi como levar um tapa na cara. Sergio já sabia que seria o im. E de fato foi. “Eu realmente não sei o que aconteceu. Pre iro achar que foi porque nós éramos muito novos”, re lete. Terminaram 1994 assim, separados. A vida levou cada um para um lado. Flávia foi passar uma temporada no ex-
“Trabalhar no maior festival de musica e entretenimento do mundo traz muita experiência intelectual, profissional e cultural”
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o FESTIVAL NO CÉU PROMETE RECEBER A GALERA EM GRANDE ESTILO, COM LUZES E IMAGENS DESENHADAS
terior, enquanto Sergio decidiu cursar Educação Física no Rio mesmo. Como os shows de rock não deixaram de acontecer por conta do im do relacionamento, os dois também não deixaram de se encontrar. “A gente frequentava os mesmos lugares. O ciclo de amigos e o amor pelo rock eram os mesmos”, esclarece a economista. Sempre que se viam, icavam juntos e, entre muitas idas e vindas, reataram em 2005. “O pai dela abriu uma academia e eu estava precisando do famoso estágio”, menciona Sergio, transformando todos os S da frase em X. E Flávia, que nunca perdeu o interesse no carioca roqueiro, fez o esforço de ir malhar na academia do pai. “Nunca gostei de malhar. Ia só para vê-lo mesmo”, admite risonha. Mais uma vez
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Rock In Rio em numeros • 500 pessoas levantaram a cidade do rock em menos de 2 meses • 100.000 toneladas de materiais utilizados = quase 4 mil aviões cargueiros para transportar esse material • Mais de 15 mil credenciais emitidas = total de voluntários que trabalharam em 5 cidades-sede da copa de 2014 • 7 dias de festa – 150 atrações – 5.400 minutos de música = 60 jogos de futebol seguido • 595 mil fãs • Facebook – mais de 52 milhões de usuários = mais 8 vezes a população da cidade do Rio de Janeiro • Snapchat – mais de 800 mil visualizações • Food – 120 mil hambúrgueres – 27 mil cachorros quentes = um monte Fuji de salsicha e pão – 20 mil milkshakes = piscina de 6 mil litros • 26.409 mudas de árvores suficiente para ocupar quase 30 campos do Maracanã
A paixão reacendeu e os dois icaram juntos novamente. Sempre vale a pena acreditar no sonho que se tem. Os sonhos de Sergio e Flávia eram os mesmos: formar uma família. Em outubro de 2006, foram morar juntos na casa da mãe de Sergio. O quarto de solteiro do professor de educação ísica virou o ninho do casal. Foram dois até maio de 2008 quando chegou Nicolas. Quatro anos depois, eram cinco. O casal roqueiro teve os gêmeos Murilo e Joana. Em todos esses anos, os dois amaram muito os ilhos, um ao outro e também o rock como se não houvesse amanhã. Flávia só perdeu o primeiro Rock in Rio da história, em 1985, por ser nova demais. Aos 10 anos, icou alucinada vendo o Guns N’ Roses no palco do festival de 1991. Sergio não é diferente, sempre tocou em bandas com amigos. Alguns deles, são primos de Flávia. Desde sempre e até hoje, a vida do casal girou em torno do rock n’ roll. Até os quatro ilhos já nasceram com o coração batendo em ritmo de bateria. Em 2017, além de ganharem mais um integrante para a família-banda, o caçula Dante, o casal decidiu se casar no papel. Entre mamadas, Flávia recebeu um e-mail. O remetente? O Festival Rock in Rio, anunciando que aquele era o último dia para se inscrever no concurso “Eu vou Casar no Rock in Rio”. A econo-
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mista não pensou duas vezes e inscreveu o casal, contou a história dos dois e foi selecionada para a próxima fase. “A gente foi passando de fase sem acreditar. Nunca ganhamos nem uma rifa”, brinca. Agora, o que começou em um show cover de rock, em 1994, pede para ser o icializado, 23 anos, quatro ilhos, e muita metaleira depois, no maior evento do rock do mundo. Nenhum outro tipo de casamento seria mais adequado ao casal que a proposta do evento. Isso vai acontecer, graças a um casal tão apaixonados por rock quanto Flávia e Sergio. O amor está no Rock O ano era 2015, aniversário de 30 anos do Rock in Rio e a data do casamento tinha sido marcada “sem querer” justo em um dos dias do festival. Para não perder o show e muito menos o casamento, surgiu a ideia de se casarem lá. Desde então, Roberto Medina, presidente do evento, compra a ideia e abre a casa do rock para que casamentos sejam realizados. Amantes do rock do Brasil e do mundo o icializam seus relacionamentos em capelinhas montadas especialmente para isso. Na edição de 2017, 1300 casais se inscreveram no “Eu vou Casar no Rock in Rio”. O dia dos namorados não poderia ter sido mais especial para Sergio, Flávia e os outros seis casais que receberam o resultado do concurso. Agora é o icial: eles vão casar no maior festival de música e entretenimento do mundo. Fique à vontade, a casa é sua! A casa é tão sua quanto nova. Após 31 edições, o ilho do rio se mudou para um novo endereço. A nova cidade do rock vai ser montada no Parque Olímpico, onde aconteceu a maior parte das competições Olímpicas em 2016. A casa atual vai ser duas vezes maior que a antiga. Apesar da mudança, ainda é possível ouvir as ondas do mar, entretanto, pode ser que esse som seja abafado pelos solos de guitarra. Esse ano, os convidados serão recebidos com uma apresentação especial. As surpresas são incontáveis e nem sempre presas ao solo. Um festival no céu promete receber a galera em grande
estilo, com luzes e imagens sendo formadas. Não são fogos de arti icio, nem tão pouco a aeronáutica. A bola da vez são os drones. O espetáculo é inédito no Brasil e promete surpreender a todos com centenas de imagens projetadas no céu, como por exemplo o símbolo do evento, a guitarra do Rock in Rio. O movimento das luzes sairá embalado pelo ritmo do arranjo criado pela orquestra austríaca Passion for Life. O Palco Mundo, conhecido de outras edições, passa por reformas. A intenção é deixar os convidados mais acomodados e as noites ainda mais históricas. Grandes nomes do rock se apresentarão lá, o Guns N’ Roses e The Who. Que comecem os jogos Nem só de música vive o Rock in Rio. Nesta e nas próximas edições uma novidade para quem compartilha a paixão pelo rock e pelos games: as arenas GAME XP. Elas nasceram em uma parceria com o evento brasileiro de cultura pop, a Comic Con Experience (CCPX). Para um dos organizadores do evento, Jairo Junior, as arenas GAME XP são um orgulho para o festival. A novidade vem com um bônus: os convidados podem aproveitar todos os novos games com tudo “free”. Além disso, não é preciso ir a Hollywood para pisar na calçada da fama. O Rock District, um novo espaço construído cheio de estilo na Cidade do Rock contará com o Rock in Rio Boulevard e sua calçada da fama. Nela, as lendas do rock n’ roll serão prestigiadas. Não muito distante dali, uma vibração diferente poderá ser sentida. O espaço Eletrônica, como o próprio nome já sugere, é voltado para exibir os novos nomes da música eletrônica de todas as partes do mundo. Música, games e muita tecnologia. Essa última parte ica a cargo do Digital Stage, uma ótima pedida para quem curte assuntos voltados ao universo tecnológico. Lá, se concentrará as maiores estrelas do mundo digital atual. Para experimentar essase outras novidades, além de curtir os shows do início ao im, é necessária muita energia. Para isso, o Gourmet Square estará disponível com um espaço re-
frigerado com 14 gastrobares, a inal de contas, saco vazio não para em pé. Ossos do o!cio Há quem diga que trabalho e curtição não se encaixam na mesma frase. Os voluntários do maior festival de música e entretenimento do mundo não pensam bem assim. Para que um evento dessa proporção aconteça, muita gente precisa suar a camisa. São diretores, organizadores e colaboradores nas mais variadas funções. “Mais de 20 mil pessoas se inscreveram para ser voluntários no evento deste ano. Cerca de 3 mil foram aprovados só na primeira fase”, explica Jairo. O processo de seleção de voluntários terá mais uma fase. Aqueles que forem aprovados receberão treinamento durante quatro sábados seguidos num total de 16 horas de preparação. Há dois anos, o estudante Nathan Rir entrou para o time de voluntários do Rock in Rio. Desde então, tem unido o útil ao agradável. Por gostar de rock escolheu ser uma das tantas pessoas que se dedicam a fazer o festival acontecer. “Eu escolhi ser voluntário porque quero de alguma forma ser importante para o
evento. Ter o prazer de poder dizer que eu ajudei a fazer o Rock in Rio”, valoriza. A universitária Camila Bloom ield entrou nessa aventura no mesmo ano que Nathan. Além de trabalho e curtição, ela também pode experimentar o que pode ser uma das áreas de sua pro issão. “Trabalhar no maior festival de música e entretenimento do mundo traz muita experiência intelectual, pro issional e cultural. Além de tudo isso, ainda deixa o maior legado de todos: a amizade”, frisa a futura publicitária. O endereço é novo, lá o casal Flávia e Sérgio e outros seis casarão. Mateus e seus amigos curtirão cada momento do Rio e do Rock como se fossem únicos. Nathan e Camila e os outros voluntários cuidarão para que tudo aconteça da melhor forma para todos. Independentemente de onde cada um esteja, ou onde o Rock in Rio seja, novos amores, amizades e histórias surgirão. Nesse ano, o festival acontece em setembro, entre os dias 15 e 24. Apesar das de inições do festival terem sido atualizadas, o amor ao rock permanece o mesmo. 2K
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A NOVA CIDADE DO ROCK A localização dos palcos no Parque Olímpico procura atender ao máximo o público sem transtornos no deslocamento
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PALCO ELETRÔNICA Existente desde 2001, se trata de um palco com DJs do mundo inteiro específico para música eletrônica.
STRET DANCE Esta área da cidade do rock é dedicada ao hip-hop e a dança de rua, contando com diversos grupos nas apresentações.
ROCK DISTRICT Espaço totalmente novo no festival semelhante a um bairro que homenageará diversos nomes da música mundial.
DIGITAL STAGE Espaço que trará um encontro do público com os fenômenos da web, como Whindersson Nunes e Christian Figueiredo.
PALCO MUNDO Possui as principais atrações do festival, que este ano conta com mais de 25 artistas nacionais e internacionais.
PALCO SUNSET Conhecido espaço onde bandas e cantores de diversos gêneros musicais se apresentam, muitas vezes com convidados.
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PERFIL
O rei dos
joinhas Whindersson: nome complicado para o maior youtuber que você respeita
MAG MAGAZINE AGAZ AG AZIN AZ INE IN E • ED EDIÇ EDIÇÃO IÇÃO IÇ ÃO EESP ESPECIAL SPEC SP ECIA EC IALL JU IA JUNH JUNHO NHO NH O 20 2017 17 34 2K M
Rui do Amaral
Você já viu um vídeo dele e, provavelmente, é um dos 20 milhões de habitantes (ok, inscritos) da nação Whindersson. No Wikipédia, das quatro linhas utilizadas para descrever Palmeira do Piauí-PI, duas são dedicadas à maior estrela nascida entre as fronteiras da “terra da cachaça”. Com mais de 1 bilhão de views, o maior youtuber do Brasil sacramentou a dinastia que começou em 2013 (cerca de 15 anos atrás, em idade de internet) ao ocupar o primeiro lugar na lista dos maiores geradores de conteúdo digital do país. Porém, o que mais chama a atenção do humorista não é a quantidade, mas a variedade dos seguidores. “Tem muita criança que chega pra tirar uma foto comigo e diz: ‘minha vó é muito sua fã!’ Isso é o que mais me deixa doido, porque nunca me imaginei fazendo minha avó rir”, explica, admirado em agradar um público tão diversi icado. Whindersson atribui o sucesso do conteúdo produzido à infância humilde no Piauí. “Tudo que eu falo no meu show e nos vídeos é baseado no que eu experimentei a vida toda. É lógico que o pessoal acha graça, principalmente quem já passou pela mesma situação que eu. Eu também acho graça, senão não diria as coisas que eu digo. Mas na época era di ícil. A gente era pobre mesmo”. Hoje, com diversas marcas implorando para o patrocinar e com shows de stand-up agendados até nos Estados Unidos, não falta dinheiro na conta de Whindersson. “Não me sinto mal por comprar as coisas que eu compro e sempre vai ter alguém com inveja querendo criticar, mas nesse povo só cresce a língua. Acho que Deus é muito bom comigo e me ajuda a realizar todos os meus sonhos de moleque. Não tem problema nenhum nisso”. O youtuber está atualmente no terceiro show de comédia stand-up, inti-
tulado de “Proparoxítona”, em alusão ao “adjetivo” que utiliza em seus vídeos quando se refere a algo grandioso. “O show é como se fosse uma evolução do que eu já vinha apresentando, com novas histórias de infância e referências ao que acontece no Brasil”. Ao ser questionado sobre como é o processo criativo, Whindersson a irma que pouca coisa mudou desde as primeiras gravações. “É tudo muito espontâneo nos vídeos e, sinceramente, apenas os equipamentos mudaram, porque eu só falo um monte de bobagem e ica engraçado”. Já para a apresentações, ele explica que o cuidado é um pouco maior. “Não que eu faça os vídeos de qualquer jeito, não é isso. Mas o conteúdo do show tem que ser revisto mais vezes, já que é sempre o mesmo texto. Precisa ser bom e o mais redondo possível, mesmo que na hora sempre tenha improvisação”. Um dos clichês que ronda o mundo das celebridades talvez se faça ainda mais presente na vida das web-celebridades. Como separar a vida pessoal da mídia? É possível ter privacidade quando há 20 milhões de pares de olhos atentos a cada movimento seu? O youtuber não parece se preocupar muito com isso. Na verdade, Whindersson não parece se preocupar com nada que tenha potencial de o incomodar. “Tudo que eu tenho é graças a Deus e às pessoas que assistem meu canal e meus shows. Para mim, não é incômodo algum mostrar onde estou, o que faço, como ou bebo. Nem os haters me incomodam, por quê vou achar ruim meus fãs quererem saber da minha vida? Se não fosse por eles eu não teria nem metade das experiências que tenho hoje”.
E as experiências se ampliam. Seu humor se estende para além das fronteiras brasileiras. Com três shows nos Estados Unidos con irmados para o segundo semestre deste ano, em Boston, Orlando e Miami, o sucesso de Whindersson atravessou, o icialmente, qualquer fronteira que ainda pudesse existir. “Talvez agora os próprios brasileiros que às vezes falam mal de mim passem a me valorizar mais, né? Se qualquer coisa acontece nos Estados Unidos quer dizer que ela é boa”, revela em tom de ironia. Ao ser indagado sobre o que mais pretende realizar, já que para um youtuber de 22 anos o sucesso pro issional indiscutivelmente já chegou, o humorista é modesto. “Continuar a fazer o que eu gosto, ou seja, levar alegria pra esse povo brasileiro que é tão sofrido”. Whindersson sabe o que fala. Quanto mais a situação política do Brasil piora, sem mencionar pontos negativos historicamente conhecidos como saúde, violência e educação (é que falar mal de política realmente está em alta), mais o humor emerge como válvula de escape. Entretanto, Whindersson não quer saber de política. Inclusive, a tão falada polarização, que atinge todo e qualquer assunto que é discutido atualmente (política, feminismo, economia, movimento LGBT, racismo, religião) não chega nem perto do piauiense. No youtube, plataforma onde construiu seu império de in luência e popularidade, Whindersson Nunes se consagra rei cada vez mais. Mesmo diantede toda sua realeza consolidada, permanece simples. 2K
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REPORTAGEM
Espíritos livres A vida de quem leva grandes histórias e momentos i nesquecíveis nas pequenas bagagens e nas asas da aventura ANDRESSA VIANA E MICHELLE FERNANDES A mochila nas costas e os pés na estrada tem sido a realidade de muitos viajantes independentes por aí. A vontade de conhecer o desconhecido e viver aventuras faz com que muitas pessoas arrisquem a segurança da rotina para encarar algo que traga satisfação com o famoso frio na barriga. Seja passando alguns meses no meio do Japão ou sentindo o cheiro de massa quentinha da rica gastronomia da Itália, surgem histórias que são marcadas pelo desprendimento e curiosidade. Como diria Mário Quintana, “viajar é trocar a roupa da alma”. E foi em busca dessa troca que a estudante de engenharia civil Rebeca Bonel, de 22 anos, resolveu dar uma volta ao mundo. Com R$ 600,00 na carteira e umaBizoca, sua moto biz de 125 cilindradas, Rebeca descobriu que poderia desbravar o mundo e foi isso que fez. Dona de grande ousadia, a jovem não hesitou em colocar o pé na estrada, ou nesse caso, as rodas. No lombo de bizoca com vento no rosto e roteiro traçado, a estudante saiu de Sorocaba, interior de São Paulo, rumo ao desconhecido. Cada parada na estrada, uma nova história para contar. Seu objetivo? Passar por quatro países da América do Sul. A primeira parada foi no Uruguai, onde a jovem conheceu o litoral de Punta del Este. Depois, Buenos Aires e Chile. Em terras chilenas, a aventureira passou por uma situação que classi ica como engraçada. “Não existia local na sombra e como havia um sol intenso, estavam todos torrando. Foi então que lembrei que minha avó havia colocado um guarda-chuva na minha mochila. Foi muito engraçado. Adivinha qual era o pontinho
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preto no meio da ila de vários carros?”, lembra. A estudante seguiu viagem entre os carros, montada na moto e segurando seu guarda-chuva preto. Entre tantas experiências, a visão da cordilheira dos Andes é uma das mais marcantes na memória. No primeiro desa io, a sensação é de missão cumprida. No entanto, seu objetivo agora é traçar um destino rumo a América Central. A companhia da iel Bizoca é garantia. Não é de hoje, vem de antes Contudo, essa história não é apenas de Rebeca. Viajar numa moto é uma experiência de muitos outros. Entre eles, Ernesto Rafael Guevara de La Serna, o famoso “Che Guevara”, conhecido até hoje por instaurar um novo regime politico, unipartidário e socialista em Cuba, ideia que surgiu após sua experiência conhecendo novos povos. Foi em 1951 que Che Guevara, apenas um ano mais velho que Raquel agora, resolveu se aventurar pelo mundo. Na companhia do amigo Alberto Granado, ele encarou a brisa no rosto, o frio cortante e os barulhos da estrada. Juntos exploraram 6 meses de estradas sul-americanas a bordo de La Poderosa, uma Norton de 500 cilindradas. Se você acha que ser mochileiro faz parte dos tempos atuais, pode estar enganado. Nem mesmo o famoso revolucionário originou essa ideia. Acredita-se que na verdade foi em meados do século 17 que surgiram os pioneiros do mochilão.Na Europa, os nobres mandavam seus ilhos para o “grand tour”, uma viagem educacional que durava alguns meses e buscava ampliar os conhecimentos culturais e linguísticos dos alunos.
Já nos anos 60, surgiram os hippies com a incurável e incansável disposição pelo desconhecido. Eles foram os responsáveis pela criação da Trilha Hippie, uma rota entre a Europa e Índia que possui um preço popular. Esse caminho era visto como a viagem da libertação. Quem trilhasse o caminho seria liberto da sociedade que impunha limites. Assim, buscavam conciliar diversão com iluminação espiritual e muita aventura. Filhos brasileiros de Che A Turismóloga e blogueira Cristiane Marques de 32 anos é apaixonada por culturas diferentes e conta que desde pequena nas viagens de família tinha o hábito de carregar uma mochila no lugar das malas. “Para mim, o mochilão sempre foi algo natural porque eu nunca conheci outras referências de viagens que não fosse essa”, explica. No Brasil, o per il de mochileiros é diferente do per il dos europeus e norte-americanos. Muitos mochileiros ainda programam em seus mochilões, destinos e datas. A primeira experiência que Cris (como costuma ser chamada pelos seus seguidores no blog) viveu foi em 2009 durante a realização de sua monogra ia. Ela estudou o per il de mochileiros no Brasil. “Eu percebia que era diferente dos outros mochileiros que viajavam sem destino com um roteiro livre. Notei que aqui existe turista de mochila mas as pessoas programam tudo”, conta. Como boa brasileira, a sua primeira aventura também teve tempo e destinos traçados, mas durante o processo Cris percebeu que isso não era su iciente e hoje ela viaja de forma livre dando espaço também para imprevistos.
Já que traçar rotas faz parte do povo brasileiro, os médicos Marcel Lopes, 29, e Luiz Felipe, 27, não izeram diferente. Após três anos de preparação, incluindo o mapa impresso colocado em uma parede para traçar rotas e todos os procedimentos bem como vacinas necessárias, os amigos deram início à viagem de um ano pelo mundo. Mesmo com tudo aparentemente sob controle, o desapego foi essencial. Deixaram para trás amigos, família e carreira. Pediram demissão do emprego e partiram para o mundo desconhecido. Marcel conta que diariamente em seu local de trabalho via o sofrimento das pessoas e percebia o quanto a vida é curta. Notar a efemeridade foi uma das motivações. “Muitas vezes a gente se prende achando que a vida é só o que nos rodeia, mas na realidade vai além disso. Apesar de ser feliz pro issionalmente e de ter uma família maravilhosa, estava disposto a sair pelo mundo e ver o que ele oferece”, revela. Há três meses os amigos já estão na estrada e, nesse tempo, experimentaram comidas diferentes, conheceram novas pessoas e vivenciaram culturas outrora desconhecidas. Nesse momento se encontram no Japão e o desa io inicial é a comunicação, além do fuso horário. Essas coisas são facilmente superadas quando consideram a experiência do conhecimento. “Você aprende a conviver cada vez mais com o diferente, aceitar e saber viver em harmonia com as coisas que são distintas das suas”, considera Marcel. O médico conta ainda que nada substitui sua visão e contato em relação a outro local, seus costumes, sensações térmicas e gastronomia. “Uma coisa é você assistir pela televisão. Nesse caso, é
“Apesar de ser feliz profissionalmente e de ter uma família maravilhosa, eu estava disposto a sair pelo mundo para ver tudo que ele oferece”
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a visão que o repórter passa. Outra coisa é quando você está no lugar e consegue compreender com seus próprios sentimentos porquê aquele povo é assim. Isso é muito grati icante”, completa. Em família
“Você aprende a conviver cada vez mais com o diferente, aceitar e saber viver em harmonia com as coisas que são distintas das suas”
Se por um lado Rebeca e Che Guevara deram a volta ao mundo em uma moto e os médicos Marcel e Luiz deixaram tudo para colocar o pé na estrada, há um outro lado divertido da história. A aventura também cabe em outras áreas da vida. É possível mochilar em família. Bruno Lopes, tecnólogo de informação, e Geisa Lopes, professora, decidiram encarar a estrada com quatro rodas e levaram a ilha Beatriz, de dois anos, a bordo. No Natal de 2016, a família deu início às aventuras. O objetivo é percorrer cerca de 140 mil quilômetros, 80 países, em quatro anos de expedição. Com um carro equipado que se assemelha a uma casa, o casal nomeou o seu projeto como “Colorindo o mundo”. A pequena é encarregada de colorir no mapa cada local por onde passam. “Batizamos nosso carro com o nome de ‘Aquarela’, pois é nossa ferramenta para colorir o mapa”, esclarece Geisa. Mas as aventuras do casal antecedem a chegada da ilha. No dia 2 de dezembro de 2013, eles deram a largada o icial ao projeto “2 no Mundo”. Viaja-
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ram de ônibus, avião e trem. Dormiram em hostels e aeroportos. Conheceram Uruguai, Argentina, Chile Peru, Nova Zelândia e Austrália. Na mala, levaram apenas o essencial. “4 camisetas, 2 calças que viram bermudas, 4 roupas íntimas, 4 meias, 1 casaco que vira travesseiro, 1 capa de chuva, 1 bota, 1 tênis, 1 chinelo, material de higiene em versões compactas, 1 kit de remédios, 1 lanterna de cabeça, 1 mochila para trilhas, 1 saco de dormir, 1 laptop e 1 boa máquina fotográ ica”, listam. Só que imprevistos acontecem em todo mochilão e, no caso de Geisa e Bruno, ocorreu um que mudaria suas vidas. Ela descobriu que estava grávida em plena viagem. O projeto mudou de nome e se transformou em “3 no mundo”. Em outubro de 2014 nasceu a bebê. Na época, ambos trabalhavam, mas tinham o desejo de retomar as viagens. “À medida que nos aprofundamos nas pesquisas descobrimos que era possível viajar o mundo de carro”, conta Geisa. Nesse meio tempo, Bruno resolveu arriscar, pediu demissão e abriu a própria empresa de desenvolvimento de sistemas. O negócio prosperou e em pouco tempo compraram um carro para viajar, uma Defender 110 (ano 2014). O casal colocou tudo o que tinham à venda e as quatro rodas na estrada. O carro é equipado o su iciente para esse per il de
viajantes. Bruno ainda trabalha. A diferença é que seu escritório agora é móvel. Aos poucos, o veículocriou formas para o mochilão. Colocaram isolamento térmico e acústico na lataria. Os armários foram construídos pelo próprio casal. Tem geladeira, fogareiro, reservatório de água e tudo maisque se assemelha a uma casa convencional. Também há uma barraca que carregam no topo do carro. “A verdade é que redescobrimos que viver com menos é possível e muito prazeroso pra gente”, inaliza Geisa. Viaja quem quiser Muitas pessoas possuem o desejo de viajar pelo mundo, outras ainda estão presas a carreira e família. Essas de inem sucesso de outra maneira. O psicólogo Lucas Antonio Borges explica que, com o passar dos tempos, a sociedade se torna mais ansiosa e, por isso, as novas gerações já nascem cada vez menos adequadas a ideia de conformismo. Ele alerta para o fato de que isso pode causar di iculdades no estabelecimento de vínculos e relacionamentos duradouros. A turismóloga Cristiane explica que nem todas as pessoas têm essa facilidade e que é importante termos também pessoas que gostam de rotina. De acordo com ela, viajar, assim como icar no mesmo lugar, não deve ser pressão social. Caso contrário, o mundo se tornaria
uma bagunça. É preciso fazer uso da liberdade de decidir ir, vir e permanecer ou não. “Tem gente que não quer. Quem faz mochilão, tem que fazê-lo de forma livre. E se não tivéssemos gente nos bancos, professores na escolas”, re lete. Borges relembra que grande parte da massa que rege e movimenta o mundo é composta por pessoas que possuem um rotina diária e que nem por isso são ignorantes quando o assunto é viagens. “É possível conciliar momentos de lazer, estar ao lado de quem se ama, trabalhar com o que gosta e ainda assim poder planejar viagens rápidas com acesso à cultura e turismo”, enfatiza. Para quem tem o desejo de viver situações diferentes, a turismóloga explica que o lado positivo de se desprender de sua zona de conforto e seguir em busca denovas culturas nos ajuda a aceitar os outros como eles são, sem a necessidade de mudá-los, “A partir do momento que você respeita o outro (cultura), você aprende muito mais, porque você não tenta impor o que é seu. Quando a gente impõe o que é nosso, não há aprendizagem”, considera. Oportunidades para o desprendimento não faltam. Nem precisa de muito. Basta uma mochila recheada de disposição. A estrada, democrática do jeito que é, acolhe todo espírito livre que deseja se aventurar por ela. 2K 2K MAGAZINE • EDIÇÃO ESPECIAL JUNHO 2017
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COLUNA
Gerações unidas pela arte Tradicionais ou inovadores, antigos ou atuais; quais as razões dos musicais conquistarem gerações tanto de jovens e como de vovôs? lá nos primórdios da históU mriadia,do cinema, os cineastas descobriram a possibilidade de sincronizar som e imagem. Desta descoberta veio a ideia de se produzir algo novo. Uma junção de música, dança e atuação que pudesse contar histórias de maneira diferente. A música e a dança ocupariam o centro do palco, seriam as grandes responsáveis por dar o tom das cenas, ditar o ritmo da narrativa e envolver o espectador com a história e a realidade dos personagens, provocando emoção, entretenimento e re lexão. As primeiras produções dos chamados musicais, foram inspiradas em espetáculos da Broadway. Isso explica a similaridade do gênero com o teatro.A ideia deu certo e conquistou público. Logo após o im da Segunda Guerra Mundial, o gênero chegou ao seu auge que perdurou até a década de 1960. Passada a Era de Ouro dos musicais, marcada pela produção de grandes
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clássicos e uma considerável audiência, esse gênero icou um pouco de lado. Moulin Rouge, amor vermelho, lançado em 2001, dirigido porBazLuhrmann e bem premiado, trouxe com sua beleza e intensidade, um reaquecimento ao mercado dos musicais. Quase todos os ilmes deste tipo produzidos nos últimos quinze anos izeram um enorme sucesso e renderam a seus atores reconhecimento. Quem não se lembra da trilogiaHigh School Musical (2006-2008), a atuação memorável de Catherine Zeta-Jones em Chicago (2002) e o show de atuação e performance de Johnny Depp em Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet(2007)? Para falar de um exemplo bem recente, podemos citar o ganhador de seis Oscars e sete Globos de Ouro, La la Land – Cantando estações. Emocionante em alguns momentos, porém previsível, este talvez seja o principal fator que o coloque em desvantagem se o compararmos de maneira geral com alguns dos clássicos citados acima. Mesmo assim, a obra caiu nas graças do público e foi um sucesso de bilheteria. Décadas separam as gerações de 1950 e a de hoje. Qual será o segredo de um gênero para atrair pessoas de realidades sociais tão diferentes? A forma como o musical é construído pode apontar um caminho para a resposta. Este é um gênero que tem por principal objetivo envolver e entreter. Assim, quando uma pessoa entra no cinema para ver algo do tipo, ela já se desapega do seu compromisso com a realidade porque sabe que o que verá na
telona é um produto repleto de fantasia. Isso pode explicar as divergências existentes entre as avaliações dos críticos de cinema e as do público. O crítico, por conta de sua bagagem, sempre vai querer ver algo extraordinário. Que fuja da fórmula estabelecida a tanto tempo. O público deseja simplesmente sentar na cadeira do cinema e esquecer o mundo lá fora. Acreditar na possibilidade de um mundo menos cruel, mais justo, onde os super-heróis (outro fenômeno de sucesso na nossa era) serão capazes de resolver os problemas e lutar em prol do direito dos menos favorecidos, haja vista a invisibilidade deles no mundo real. As obras deste gênero que fazem sucesso não falam só de esperança. Abordam temas inerentes à existência humana como amor, justiça, vingança, inveja, ciúme e tantos outros. Assim, o espectador tem a oportunidade, mesmo que em diferentes graus, de se identi icar com o que está sendo transmitido. Se levarmos em consideração o quanto os musicais podem retratar a humanidade em sua essência, seus pontos fortes e fracos, suas ansiedades e esperanças, ainda que ilusórias, podemos entender o porquê de pais e ilhos, avós e netos poderem se sentar diante de um produto como este e depois ter o que discutir sob diversos pontos de vista, baseados em sua realidade e costumes. 2K
THAÍS ALENCAR CAR JORNALISTA
MATÉRIA
os rumos do novo cinema Uma nova forma de fazer cinema no Brasil para impulsionar a produção neste setor SOANE ANDRADE Em meados dos anos 90, mais precisamente em 1952, um grupo de jovens ligados à produção cinematográ ica decidiu dar uma nova cara ao cinema no Brasil. Cansados de seguir as normas do cinema convencional e sofrendo intempéries na luta por patrocínio para seus empreendimentos por parte das grandes empresas inanciadoras da mídia, cinegra istas discutiram acerca da viabilidade de produzir películas de maneira que demandasse menos recursos inanceiros e, em contrapartida, elevasse a quantidade e a velocidade da produção. Neste período havia também o desejo de colocar em cena temáticas sociais que abordassem os problemas enfrentados pela sociedade brasileira. Desta forma, a intenção principal era fazer uma produção com traços culturais puramente brasileiros, como defende Alexandre Figueirôa, doutor em cinema pela Universidade de Sorbonne. “O novo cinema procurava, sobretudo, uma independência cultural. Isso não signi icava ter apenas temas nacionais, mas encontrar um cinema capaz de traduzir a realidade nacional com base em uma estética autenticamente brasileira”, declara. Essa roupagem trouxe nova etapa para a sétima arte nacional. Em 1955, o ilme “Rio, 40 Graus” de Nelson Pereira dos Santos, marca o início desta nova fase.
Hoje, vemos uma produção em larga escala com diversos lançamentos ao ano. Apesar disso, a bilheteria ainda é inconstante. Prova disso é que a última produção tupiniquim a alcançar a liderança de vendas de ingressos nos cinemas brasileiros foi o ilme Tropa de Elite 2, de José Padilha, lançado em 2010, com mais de 11 bilhões de ingressos vendidos. De lá para cá nenhum outro ilme nacional alcançou tamanho sucesso de público. Matheus Siqueira, doutorando em Estética do Cinema na Universitat Pompeu Fabra (Barcelona), acredita no crescimento do cinema brasileiro e vê melhora em muitos aspectos. Entretanto, segundo ele, a maior di iculdade está na pouca valorização que os brasileiros dão ao que é produzido aqui. “Uma saída para educar a sociedade a consumir o cinema nacional seria disponibilizar espaços culturais de veiculação destas produções cinematográ icas para despertar o desejo por esse consumo. Essa é uma boa estratégia”, a irma. O maior consumo do cinema nacional por parte da população brasileira está diretamente ligado ao crescimento da produção desses ilmes e de uma maior qualidade na produção dos mesmos. O retorno das bilheterias será decisivo para manter o mercado nacional em movimento e expansão, pois implica na possibilidade de investir na produção, no pagamento das equipes envolvidas,
Filme: Eu Fico Loko (2017)
nas estratégias de divulgação, entre outros. “Esse incentivo ao consumo deve começar mesmo na infância, ou seja, nas escolas primárias em diante. Isso deveria ocorrer para que se crie um ambiente de procura por esse produto e, por consequência, haja fortalecimento desse mercado”, conclui Siqueira. Cinema Novo e Produções Independentes De 2011 para cá o número de produtoras independentes quase triplicou graças à lei da TV por assinatura (Lei 12.485). Neste período, as 175 produtoras existentes passaram a ser mais de 460 (Dados da ABPITV – Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão). A legislação foi discutida por quase cinco anos no sentido de estabelecer normas que promovam a cultura nacional e ainda possam fomentar o mercado audiovisual brasileiro, sem interferências mercadológicas. O cinema independente é, quantitativamente, o mais numeroso no Brasil. tem sua raiz no movimento do Cinema Novo. Esta lei vem em complemento, pois cria um ambiente favorável ao crescimento do mercado audiovisual. “O que a lei da TV por assinatura cria são mecanismos de estímulo e reconhecimento da produção nacional, impulsionando o aumento do público e o crescimento do setor”, avalia Manoel Rangel, presidente da ANCINE (Agência Nacional do Cinema). 2K
Filme: Ponte Aérea (2014)
Filme: Minha Mã
e é uma Peça 1
(2012)
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RONALDO PASCOAL, EMANUELY MIRANDA, LUCIANA FERREIRA E MAIARA FERNANDA
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REPORTAGEM
Séries: vilãs ou heroínas? Que aspectos da vida podem ser influenciados pelos seriados? Apesar dos perigos, elas até que têm um lado bom
TÁBBTA MORAIS E ANA FLÁVIA SILVA
Para mim elas são mais que uma simples distração. Eu realmente tenho um grande afeto por cada uma das séries que eu assisti
Vamos jogar? É simples. Eu dou as dicas e você adivinha de quem estou falando. Tem ilmes, mas também tem séries. É paga mensalmente. É o amor da vida dos solteiros e o motivo de muitas pessoas desmarcarem as saídas de im de semana. Se você pensou na Net lix, você não só está certo, como provavelmente já acessou essa que é, atualmente, a maior provedora de séries e ilmes do mundo via streaming. Mas nem só de Net lix vivem os fanáticos por séries. Antes dela, a televisão já produzia seriados que também eram acompanhados regularmente por pessoas como o administrador Ricardo Ferrari. Desde criança, as manhãs eram esperadas ansiosamente para que pudesse acompanhar novos episódios de Pokémon. Já quando a fase dos desenhos animados passou, vieram as séries de TV e até mesmo as novelas. As tardes eram recheadas de risadas com episódios de “Eu, a patroa e as crianças”, do clássico Chaves e as tardinhas completas com a companhia de Cabeção, Letícia, Gustavo e outros personagens de Malhação. Já com seus 12 anos, ainda in luenciado pela programação televisiva, deu seu primeiro passo rumo ao mundo das séries. Lost, transmitida pela Globo em 2006, foi a primeira que viu do início ao im. Ricardo já começava a adolescência completamente imerso no drama e na icção cientí ica. Seu gosto eclético para os seriados o levaram do drama para o musical - quando acompanhou Glee - e do musical para vários outros gêneros. Assim foi a infância e adolescência de Ricardo, 23, e que, apesar das pro-
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crastinações durante a época de TCC para terminar de assistir American Horror Story, se graduou em administração no ano de 2016. Trabalhando oito horas por dia e dividindo o resto do tempo livre entre família, namorada e demais compromissos, ele ainda encontra tempo para pôr em dia as séries atrasadas, dar início aos lançamentos e até mesmo ter vida social. Quando o autocontrole se faz mais forte, Ricardo assiste apenas dois ou três episódios por dia. Já em outros momentos, chega a passar quase 5 horas na frente da telinha , sempre usando aquela velha desculpa: “é só mais um”. E é com essa desculpa que ele se mantém atualizado nas mais de 20 séries que acompanha. “Geralmente, reservo meus inais de semana para maratona de alguma das que assisto”, relata. A namorada, que é tão viciada quanto ou até mais, não se importa de dividir o namorado com a tal da Net lix. Os dois já izeram maratonas de séries juntos e Ricardo já reviu temporadas inteiras apenas para acompanhar a namorada. “Já assisti How I metyourmother(HIMYM) 5 vezes e agora estou revendo com ela”, conta ele, cheio de alegria ao falar sobre uma de suas séries favoritas. Mas os seriados não servem apenas para roubar seus adeptos da vida social. Além de estreitar seus laços com a namorada através deles e ter momentos de lazer com a família que às vezes acompanha seu hobby, Ricardo também já tirou muitas lições de vida e confessa até que teve sua vida mudada por algumas séries. “Eu costumava ser exagerado e dar signi icado para tudo. Depois de acompanhar HIMYM, por exemplo,
passei a dar menos importância para coisas fúteis e mais para as pessoas. Aprendi a ouvir melhor e esperar as coisas acontecerem”, constata. O psicólogo Lucas Borges concorda com os bene ícios comportamentais que determinadas séries podem causar. “Histórias de amor podem inspirar comportamentos de afeto com o seu parceiro, podem conduzir o espectador a re letir sobre a própria vida, associar situações e mudar seu comportamento”, conclui. Os bene cios Os diferentes assuntos, situações e culturas aos quais os espectadores são expostos fazem com que as séries também sejam uma grande fonte de conhecimento e in luência. O estudante de direito Guilherme Cardoso ressalta o bene ício de acompanhar estes conteúdos. “Adquiri mais interesse por novas formas de cultura, como músicas, literatura e até mesmo mitologias usadas como referências nos episódios”, a irma. O jornalista Tales Tomaz concorda com a in luência das séries desde que sejam vistas com um olhar crítico e não apenas como um mero entretenimento. “As séries são produtos culturais e, como qualquer produto cultural, ela abre horizontes e possibilidades para as pessoas que consomem e prestam atenção”, acentua. Os temas abordados nos seriados comprovam mais ainda suas in luências, uma vez que poderiam inclusive moldar os pensamentos de uma parcela da sociedade. Um exemplo é a série HouseofCards, que trata da política americana e, em muitos momentos, até parece baseada na tumultuada história atual da política brasileira. O enredo traz
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um ponto de vista dos bastidores da política que jamais seria notado ou imaginado por cidadãos comuns. Outro ponto positivo proveniente do vício por séries - por menor que seja - é a oportunidade de acesso a outras línguas. A estudanteGabrielaClasen, 16, conta que seu conhecimento de inglês evoluiu e muito graças às horas que passou na frente das telinhas. O professor de inglês Bruno Rambo aprendeu muito daquilo que sabe através de séries e indica o método para aqueles que se dispõem a ter um pouco mais de tempo e até paciência. “As séries funcionam muito com aqueles que são audiovisuais e que inclusive aprendem ainda mais dessa forma”, a irma. Use com moderação O excesso de tempo dedicado a esses conteúdos pode acabar provocando uma inversão nas prioridades do telespectador. Escolher icar em casa ao invés de sair e socializar deixou de ser algo extraordinário. As maratonas também estão se tornando hábitos triviais na vida das pessoas. De acordo com o Índice de Maratonas, divulgado pela Net lix, os conteúdos são divididos em duas categorias: as séries “devoradas”, aquelas que prendem o assinante por mais de duas horas a cada acesso, e as “saboreadas” que são as que tomam até duas horas do tempo dos telespectadores a cada sessão. A pesquisa da Net lix ainda aponta que o tempo médio que os usuários levam para concluir a nova temporada de alguma série é de aproximadamente cinco dias. Aliás, essa é uma das características que fazem da Net lix a queridinha dos que se consideram – orgulhosamente – “viciados”: a plataforma segue o padrão de disponibilizar o conteúdo todo da temporada de uma vez. Isso poupa os telespectadores do sofrimento de esperar para saber o que vai acontecer com seu personagem preferido. Como nem toda in luência é positiva, tanto tempo frente a tela não poderia trazer apenas bene ícios. Gabriela admite a sua escolha de passar mais tempo em casa por conta das séries. Ela também reconhece os male ícios de abrir
mão dos momentos com os amigos e explica o porquê .“Ficar em casa tomando café e assistindo a uma nova série não tem preço pra mim”, admite. O mestre e especialista em administração de tempo, DeltonUnglaub, explica que tanto tempo dedicado exclusivamente a uma atividade como essa, pode trazer prejuízos sérios. Segundo ele, as pessoas não acham que isso é um problema porque os male ícios só poderão ser percebidos a médio e longo prazo. “Quando a pessoa está excedendo muitas horas, deixando de dormir, deixando de realizar tarefas de trabalho ou faculdade, a gente pode até considerar uma doença, porque a pessoa está viciada nessa atividade”, a irma. Unglaub explica que os prejuízos vão desde problemas de saúde como falta de sono, stress, até di iculdades mais sérias como transtornos psicológicos. Ele também alerta que nesses casos, é preciso buscar ajuda pro issional. “Essa pessoa precisa de tratamento psicológico para entender como está tendo perdas na vida”, completa. Efeitos Colaterais O psicólogo Lucas Borges explica que esse é um fenômeno perigoso. “Normalmente a pessoa começa a viver em prol do universo da série e começa a desmarcar encontros. Perde o interesse em outros assuntos ou eventos não relacionados ao seriado. Não tem interesse na convivência social”, analisa. Ainda segundo Borges, a adolescência é uma fase em que as pessoas têm mais tendência a vícios. “O fato de estar ainda em fase de amadurecimento pode ser um diferencial na questão do vício, a inal, os adultos normalmente têm família, ilhos e não dispõem de tanto tempo. Já o adolescente tem mais horários livres para esse tipo de atividades”, assegura. O que facilita a condução – às vezes inconsciente – de comportamentos extremos. Borges ainda chama a atenção para os riscos para a saúde psicológica dos ‘viciados’. E a lista de male ícios continua: “aqueles que fazem maratonas acabam dormindo pouco, por isso, terão reações durante o dia seguinte e podem relatar estresse, irritabilidade ou lerdeza nas suas atividades diárias”, alerta.
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Mesmo com todas as implicações negativas, as séries não deixam de ser uma ponte para conduzir o público à re lexão. Exemplo claro é Black Mirror, que trata sobre tabus como tecnologia e o comportamento. Outro exemplo é Skins, série que aborda questões sobre drogas, doenças psicológicas e orientação sexual. A maioria das produções também têm abordado, de o tabu LGBT.
UM RANKING DE SÉRIES
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MELHORES SÉRIES DE TODOS OS TEMPOS
Até os produtores sabem Quem produz seriados também reconhece a importância que esses conteúdos adquiriram com o passar do tempo. O produtor e radialista Guto Mello admite que a produção de séries de fato exerce in luências. “Infelizmente ou felizmente, alguns seriados in luenciam muito a vida dos telespectadores”, declara. Segundo o roteirista Daniel Maciel, essa in luência não é taxativa. Ele explica que a relação do produto com o telespectador é normalmente um diálogo e, portanto, as pessoas se identi icam com as histórias. “Não é como se o conteúdo determinasse o comportamento de alguém. Creio que alguém goste de um determinado gênero pela resposta emocional que esse alguém encontra naquilo que assiste”, pondera. Saber que as pessoas se identi icam com as histórias e com os personagens tem feito os roteiristas trabalharem mais duro. Cada vez mais, as produções tem maior qualidade. “Se a ousadia e experimentação são bem aceitas, capricha-se mais na roteirização dos episódios e por ai vai”, garante o roteirista Maciel. O radialista Eduardo Sales garante que a qualidade dos roteiros tem parte do crédito por manter a audiência. “É no roteiro que você encontra os anseios dos telespectadores. E a partir daí, você estabelece uma conexão com a audiência.”, pontua. O fato é que o mundo está se acostumando a essa nova possibilidade de entretenimento. Ninguém pode negar que a ascensão das séries é um fenômeno. Elas podem despertar paixões, incentivar o respeito e propiciar mais uma lista enorme de bene ícios. 2K
Friends Breaking Bad Game of Thrones Star Trek The Sopranos
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SÉRIES MAIS LONGAS
Days Of Our Lives (47 temp.) Doctor Who (33 temp.) The Simpsons (24 temp. Law &Order (20 temp. South Park (16 temp.)
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SÉRIES MAIS ASSISTIDAS NA TV
The Simposons Game ofThrones Grey’sAnatomy Revenge BreakingBad
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SÉRIES MAIS POLÊMICAS
Orange Is the New Black Sense 8 American Crime Skins Gracie e Frank
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COLUNA
eu gosto disso, é tão adulto! Desenhos animados estão presentes (em sua maioria) na vida das crianças, de fato. Mas, o conteúdo “infantil” trata de assuntos importantes para a vida adulta vou falar sobre mensagens sublin ãominares em desenhos infantis, tampouco sobre como a violência incita a violência. Nem vou me demorar sobre que raios os desenhos animados estão ensinando para os futuros cidadãos. De fato, tudo isso é relevante, mas antes de entrar em discussões do tipo, precisamos entender que desenho animado não é coisa de criança. Apenas. Você entendeu certo: Não é coisa apenas de criança. Ora, ora. Para começar, os desenhos animados são (necessariamente) feitos por adultos. Até que se prove o contrário, crianças não sabem fazer animações em 3D ou passar cinco horas fazendo uma cena de 2 minutos. Mas sim, as crianças são ótimas em fazer roteiros incríveis tanto quanto os adultos. Na verdade, os adultos que criam roteiros incríveis são nada mais nada menos do que pequenos que sobreviveram atrás de uma pilha de responsabilidades e várias garrafas de maturidade nas doses certas. Resumindo, não bloquearam a criatividade nem despacharam a imaginação para lidar com a vida.
Vamos ser francos. Não importa o que se diga, você gosta de desenho animado. Não cuspa no prato que comeu! Deixa rolar a musiquinha de introdução daquele seu desenho favorito para ver se não vai estar cantarolando. Ah, isso sem levar em consideração as falas decoradas que você tem na memória. Não menospreze o tempo que passou sendo aquele personagem daquele desenho. Foi divertido, não foi? Talvez foi assim que você teve a oportunidade de voar pela primeira vez ou de ser extremamente forte e poderoso, capaz de superar qualquer maldade. Se foi o caso, provavelmente foi assim também que você ralou o joelho e quebrou o braço. Mas isso são brincadeiras. Ninguém precisa de desenho animado para brincar. fato. No entanto, nos desenhos animados os limites não existem, enquanto na vida real as pessoas podem censurar a sua imaginação e criatividade com o rótulo de “infantil”. O que não deveria ser um problema se como infantil você paga suas contas e tem sua independência. Isso é o que fazem os adultos que produzem desenhos animados. Eles que desabafam suas iloso ias de vida em arte, na esperança de que pelo menos os futuros cidadãos prestem atenção na sua mensagem antes que a humanidade padeça (o drama é proposital, tem que ser bem expressivo mesmo). Ok. Talvez hoje você não tenha paciência para aqueles mesmos desenhos. Normalíssimo. Mas deixa eu contar uma coisa bem legal: ainda existem outros desenhos animados, outros milhões de roteiros! Inclusive se você curte passar horas e horas vendo episódios e temporadas de séries de ação e suspense, por exemplo, não deveria falar mal dos amiguinhos que assistem anime (as famosas
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animações japonesas). É a mesma coisa, só que ao invés de atores são animações. Uau! Roteiros de desenhos animados podem te fazer chorar, rolar de rir, re letir... E por que isso é relevante? Simples. Existem coisas que são esquecidas ao longo da nossa jornada em busca da maturidade. Coisas absolutamente normais para as crianças. Coisas que são essenciais para a vida adulta, como o perdão, a igualdade, a receptividade, o peito aberto, a mente ansiosa para aprender mais e os sonhos. “Ah, mas logo eu, um adulto, vou aprender qualquer coisa com uma criança ou com desenhos animados toscos?”, você deve ter se perguntado. Sinceramente, se você quiser ser um adulto saudável, sim. A sua criança interna nunca deve morrer sufocada. Do contrário, o adulto que você quer (ou pensa) ser nunca existirá. Larga o orgulho de lado, pega uma tigela com cereal e assista desenho animado. Se possível, com alguma criança. Provavelmente esse tempinho vai te ajudar a ser mais humilde, a saber lidar com os problemas da vida e a imaginar mais. No mínimo você usa o seus super-poderes adultos de senso crítico apurado e aconselha a criança sobre o que ela está assistindo. Agora, sem bloqueios e preconceitos, podemos discutir os problemas do primeiro parágrafo. 2K
LIA COSTA STA
JORNALISTA TA
MATÉRIA
comer na rua
Vender comida na rua não é coisa recente, mas a tendência dos Foodtrucks glamourizam este velho costume da humanidade LETÍCIA ALVES
Churros, hambúrgueres, churrasco e até cerveja. Essas e outras muitas opções fazem parte dos cardápios nos foodtrucks. Os “restaurantes móveis” transformaram o conceito de comida de rua e, de forma divertida, apresentam um leque de possibilidades para quem tem fome. Os primeiros no Brasil surgiram em 2013 e hoje são febre no país. A ideia começou nos Estados Unidos. Há alguns anos, a crise americana causou o fechamento de muitos restaurantes e deixou chefs desempregados. A melhor solução que encontraram foi eliminar os custos com aluguel e manutenção de um local tradicional. Então, apostaram no foodtruck. Assim nasceram estabelecimentos que hoje são referência em Los Angeles, Nova York e outras grandes cidades. O sucesso foi tanto que a moda rompeu fronteiras e se espalhou pelo mundo, chegando aqui no Brasil. O paulistano Marcelo Oliveira começou o empreendimento em 2014. Na época, ele estava desempregado e, em parceria com o cunhado, Alexandre Coelho, montaram um foodtruck de hambúrguer. Marcelo já tinha trabalhado em
lanchonete e angariou conhecimento gastronômico através de um curso. Alexandre, por sua vez, tinha o capital e entendia de administração. Assim surgiu o Giga Burguer, um restaurante simpático dentro de uma van adaptada. “No início, eu não colocava tanta fé no nosso negócio, mas eu decidi entrar de cabeça e tudo deu certo”, relata. No negócio ambulante, já viajaram pelo interior de São Paulo e costumam participar de festivais gastronômicos pela capital paulista. Silvia Pereira também participa de festivais. A vendedora de churros em porta de supermercado galgou à posição de microempresária. Quando ela percebeu que os foodtrucks atraiam público, usou um dinheiro que tinha guardado e investiu no negócio próprio. Seus churros hoje são coloridos e ainda mais enfeitados. O cliente pode escolher o recheio de um sabor e a cobertura de outro. O doce frito recheado faz sucesso em São Paulo, segundo a microempresária. A ilha de Silvia é suspeita para falar, mas a irma que o doce da mãe é o melhor que já provou. Depois de dois anos dessa mudança, Silvia demonstra
como é importante fazer o que se ama. “Sempre amei fazer churros, só mudei a forma de vender. Hoje tenho a certeza que iz as escolhas certas e sou feliz na minha pro issão”, conta. Para o público, as diversas opções de comida chamam atenção e o preço baixo anima os clientes a frequentarem os festivais de foodtruck. Paulo Castro é frequentador assíduo de locais que abrigam as “carrocinhas” de comida. “O melhor é que os foodtrucks têm o preço de comida de rua só que com uma qualidade muito superior”, a irma. Os carros de comida, além de coloridos e de boa aparência externa, trazem estrutura familiar de um restaurante tradicional. Eles têm geladeira, pia e forno. Os foodtrucks precisam ter os mesmos cuidados que um restaurante convencional, ou seja, tudo dentro das normas de higienização da Anvisa. A iscalização garante segurança que, por sua vez, se soma ao prazer de um bom sabor. Quem está com fome quer mesmo comida boa e, se o preço for bom, as calorias excedentes se transformam em sorrisos. 2K
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MATÉRIA
rECEITA CERTA
O fenômeno dos realities show de culinária é o fato de atingir todo tipo de público AIRA ANNOROSO E RAYANNE SOUSA
Cozinhar seguindo as receitas dos livros de receitas da vovó ou apenas fazer aquela tradicional comida caseira é muito simples e prático. Mas e quando precisa inventar pratos com algum ingrediente surpresa à sua frente tendo apenas 60 minutos para fazê-lo? Há quem diga que é impossível. Porém, os participantes dos reality shows de culináriamostram o contrário, pois são colocados à prova sobre essas e outras circunstâncias para ter sua permanência garantida no programa. Eles almejam o tão sonhado prêmio oferecidoaos vitoriosos. O público acompanha idedignamente cada tempero acrescentado. As massas provam e aprovam essa receita de misturar gastronomia e audiovisual. Programas de culinária já existem há um certo tempo na televisão brasileira, mas foi em 2008 quea apresentadora Ana Maria Bragaarriscou colocar o reality showSuper Chefem seu programa “Mais Você” pela Globo. Essa iniciativa na cozinha era nova na época, até porque o brasileiro estava acostumado
apenas com competições como o Big Brother Brasil. Super Chef durou apenas trêsedições. Os participantes não icavam completamente con inados e moravam em um hotel. Eles participavam de treinamentos e aulas com os mais renomados chefes brasileiros. Toda semana um participante era eliminado. Após três edições, Ana Maria arriscou o Super Chef Celebridades por mais três anos com os artistas do próprio canal de TV. Os realities desse cunho vingaram em terras tupiniquins e a Band decidiu investir na ideia. Atualmente, MasterChef é o novo queridinho dos brasileiros. O programa é apresentado pela jornalista Ana Paula Padrão e tem como jurados o chef francês Érick Jacquin, o brasileiro Henrique Fogaça e a argentina Paola Carosella. Todos ostentam bagagem em gastronomia nacional e internacional. Conquistaram a maior audiência nacional. O sucesso não se limita às telas da televisão nos dias de terça-feira. Quase sempre é o assunto nos trend topics do Twitter. O reality está em sua quarta temporada com 21 participantes e um ilho. Em 2015, teve também o MasterChef Junior Brasil, que teve 20 participantes com idades entre 9 e 13 anos. No MasterChef Júnior Brasil a graça é ver as crianças na cozinha.Asex-participantes mirins, Valentina Schulz de 14 anos e Ivana Coelho de 11 anos, acreditam que o sucesso do programa é justamente ver pequenas pessoas cozinhando e preparando pratos aparentemente impossíveis para gente grande. Os telespectadores da versão mirim do reality se questionam como é possível que aquela garotinha ou garotinho de 10 anos cozinhe melhor do que muito
MAG MAGAZINE AGAZ AG AZIN AZ INE IN E • ED EDIÇ EDIÇÃO IÇÃO IÇ ÃO EESP ESPECIAL SPEC SP ECIA EC IALL JUNHO 2017 IA 50 2K M
adulto. “Por mais que os participantes sejam crianças, tudo é muito diligente. Apesar de nossa idade, nos levam totalmente a sério”, garante Valentina.Ela, que via as versões internacionais, se empolgou quando abriram inscrições para sua faixa etária aqui no Brasil. Nem só de MasterChef vive a culinária Mas o MasterChef não é o único reality show na cozinha que você respeita. Os cardápios não têm só um prato para o público. O reality Bake Off Brasil, transmitido pelo SBT, é outra opção, sendo considerado o melhor da atualidade em conteúdo e termos técnicos. Como se não bastasse, o SBT criou a versão brasileira do Hell’s Kitchen, o reality Cozinha Sob Pressão. Este é o mais di ícil de todos por conta da pressão. A rede Record não icou para trás e também colocou em sua grade o reality Batalha de Cozinheiros com o maior confeiteiro do mundo, Buddy Valastro. As pessoas por trás dos chefs Nos realities de culinária é possível encontrar histórias de vida das mais variadas possíveis, como por exemplo, a de Raul Lemos, vice-campeão da segunda temporada do MasterChef Brasil, que foi ao ar em 2015. Ele sempre cozinhou em casacom o objetivo de garantir 10 reais para gastar no inal de semana. “A grana era curta e cozinhar era um ótimo instrumento de in iltração e manutenção da minha vida social falida inanceiramente”, comenta rindo. Aquilo que começou como uma alternativa engraçada ganhou tons sérios posteriormente. Raul seguiu carreira na área de comunicação e tudo ia bem até que os problemas de saúde começaram a aparecer por conta do excesso de tra-
balho. O publicitário pediu demissão, mudou sua rotina radicalmente e começou a se dedicar à culinária. Pouco tempo depois estava no programa para alegria dos amigos e da esposa que o pressionaram até que se inscrevesse. “Se dependesse de mim, eu não tinha ido”, confessa. Apesar da pressão e da cobrança dos chefs, ele pegou o jeito e conseguiu chegar à inal. “Durante as provas você se acostuma e percebe que essa cobrança é ótima para o crescimento”, analisa. Elisa Fernandes foi a vencedora da primeira temporada do MasterChef em 2014. Diferente de Raul, ela já foi professora e cozinhava em sua empresa de eventos culturais para ter um dinheiro extra. Como o volume de pessoas era muito grande nesses eventos, a professora contratava chefs e, então, se aproximou mais do mundo da gastronomia. “De um lado eu cozinhava e gostava do que eu fazia. De outro lado, eu conhecia pessoas que já trabalhavam nesse mundo e simpatizei com a carreira”, a irma. Após ter participado do reality, Elisa terminou o curso de gastronomia em
setembro de 2015 e trabalhou no restaurante do chef francês Alain Ducasse, um dos nomes mais tradicionais da culinária em Paris. O estabelecimento ica dentro de um dos hotéis mais chiques da capital francesa, o Hotel Plaza Athénée. Atualmente Elisa é chef da praça no restaurante La Bastide De Moustiers que também pertence ao chef Alain Ducasse. “Futuramente quero retornar ao Brasil e abrir meu próprio restaurante, mas antes quero começar a fazer eventos gastronômicos”, con idencia. Histórias como essa são apenas alguns exemplos daqueles que realizaram sonhos através da culinária. A gastronomia tem conquistado seu espaço crescente no coração de uma nação historicamente rica em temperos. Para Raul, cozinhar deixou de ser um simples entretenimento ou uma necessidade para se tornar algo cultural. As competições de culinárias provam isso. A inal, quem é que não tem uma receita em mente quando a fome aperta? Seja um macarrão instantâneo ou até mesmo a mistura de todos os ingredientes que a geladeira de casa oferece. 2K
As massas provam e aprovam essa receita que mistura gastronomia e audiovisual
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COLUNA
Frutos do Folk Em terras brasileiras, o estilo musical se enraíza, mas ainda precisa amadurecer
pensamento longe e letras V iolão, pensadas. O Folk vindo lá dos Estados Unidos a partir dos anos 50 e 60, traz uma pegada leve, normalmente acompanhado de um violão, gaita e poesia. Esse estilo musical se modelou de acordo com a época. Mais moderno, proporciona re lexões, além de uma tranquilidade audível a cada dedilhado das mãos que tocam. Folk vem do inglês “Folklore”. “Folk”, por sua vez, signi ica gente ou povo e “lore” quer dizer conhecimento. Como todo folclore, há acréscimos que fomentam uma hibridização. O Folk contemporâneo se mistura muitas vezes ao pop, rock, jazz e blues. Inverso ao tradicional, o atual é mais ousado. Entretanto, não perde a discrição e o toque de delicadeza.
Com várias vertentes, pode nascer de várias formas. A sementinha do Folk gospel no Brasil produz bons frutos, como é o caso da dupla Os Arrais, composta pelos irmãosTiago e André. Eles, porém, não se limitam a um rótulo apenas. Assumem que têm um pouco de rock e levam na letra um lirismo gospel somado a metáforas que fazem re letir. Outro nome que chama a atenção dos evangélicos é Marcela Taís. A cantora de apenas 29 anos faz um folk mais voltado para o MPB e Reggae. Suas letras são simples, poéticas e acessíveis. Como consequência, os ouvintes tornam-se cativos. Todavia, o segmento gospel desse estilo musical leve não é uma exclusividade brasileira. Bethel Music, um ministério de louvor americano,produz um folk acústico em suas músicas. Eles já estão na estrada desde 2003 cantando sobre assuntos diversos da Bíblia. Apesar da mensagem evangélica que suas letras propõem, o Folk não é aceito em todas as igrejas. Há um processo de aceitação pela frente. Com uma escalada em movimento, o estilo cresce e se faz aceito aos poucos. A conquista do público vem recheada de poesia, citações bíblicas e muita re lexão. Sutilmente, esse modo de fazer música se introduz na adoração. A cada álbum de compositores, nem sempre conhecidos, mais pessoas são alcançadas. Como o termo “gospel” associado a uma vertente de origem secular costuma impactar igrejas tradicionais, os cantores exploram também outras possibilidades. Muitos artistas, que não querem atingir apenas o público de suas determinadas religiões, optam por fazer uma música audível para todos, independente da titulação que carregam. Para eles, a mensagem é propagada de maneira
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mais rápida e com mais e iciência. Dessa forma, surge a construção de uma ponte entre mundos distintos. Os “não crentes” obtém paz de espirito através da mensagem cristã, sem necessariamente ser de alguma denominação religiosa. A inal, música em todos os aspectos tem um poder signi icativo e lhe permite várias sensações. No gênero em questão, ela tem o poder de re lexão e isso não é rotulado apenas para músicas de cunho evangélico. Sendo assim, este novo gênero cuja nova vertente tem inclinação para o lado religioso, quebra tabus entre jovens evangélicos e se aproveita do tamanho amplo desse público. Apesar disso e de toda inovação que propõe, ganha outras faixas etárias. Tudo que é novo gera especulação e não será diferente até que o Folk Gospel se enraíze entre seus ouvintes. O estranhamento diminui e a admiração cresce. As novidades geram receio e pré-conceito. No entanto, as terras brasileiras, como sempre receptivas à diversidade, podem ser uma sugestão interessante para o Folk fazer morada. Com está nova safra de música gospel, podemos esperar surpresas e adeptos. Há quem diga que não há problema nenhum em tocar os frutos dessa safra em rádios seculares, mas isso é um assunto a ser amadurecido, até lá o gênero escala rumoao ápice inde inido. 2K
LU LUISA NAKAYAMA YAMA MA JORNALISTA ALISTA
MATÉRIA
s o d a c i s ú Am s o d a j e l ca Música e protesto atravessaram o século e se encontraram em outros gêneros musicais no mundo todo. MPB, Rock e até Rap.
GIOVANNI MANZOLI “Pai, afasta de mim esse cálice de vinho tinto de sangue”. Esse era o brado que a arte, por meio da música de Gilberto Gil e Chico Buarque, exclamava na época da ditadura militar no Brasil. Na música, a palavra “cálice” possui duplo signi icado. Além de ser uma taça onde se coloca a bebida durante a cerimônia cristã de Santa Ceia, também recebe a conotação do verbo “cale-se”, representando a cesura que o governo militar impunha na época. Nesse momento histórico, música e militância se tonaram carne e unha. O regime ditatorial durou de 1964 a 1985. Nesse período, muitos cantores começaram a protestar por meio da música. A classe que lutava contra a política tradicional que o país enfrentava era formada, muitas vezes, por pessoas de vasto poder aquisitivo e intelectual. No dia 13 de dezembro de 1968, o Ato
Institucional n° 5 foi decretado. Esse novo integrante constitucional dava permissão para que todos os governantes punissem de forma arbitraria quem fosse contra o regime. Os dados são de pesquisa divulgada no portal online do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fundação Getulio Vargas (FGV). A partir daí muitos artistas que protestavam começaram a ser perseguidos pelos militares. Mas é importante lembrar que não só a elite protestava por causas sociais através da música. Felipe Garibaldi, mestre em criação musical pela Escola de Comunicações e Artes (Eca) da Universidade de São Paulo (USP), con irma que a periferia também usava a arte para reivindicar. Ele relembra que o samba, usado como resistência, veio dos morros cariocas. “Eu acredito que nas classes sociais menos privilegiadas também há, no contexto do século vinte, música de protesto. Vai passar pela época da ditadura vindo até o Rap contemporâneo”, expõe. Música e protesto atravessaram o século e se encontraram em outros gêneros musicais no mundo todo. MPB, Rock e até o Rap. Esse último nasceu na Jamaica por volta da década de 1960. Gênero musical muito popular nos guetos do país. A palavra Rap em inglês signi ica rhythm and poetry . Traduzido para o português, ritmo e poesia. Esse estilo vem da cultura Hip Hop. Foi levado da Jamaica para os EUA por volta dos anos de 1970. Esse tipo de música teve repercussão, de início, em bairros pobres de Nova Iorque, onde negros e hispânicos o receberam. Com um ritmo bem marcado, a letra em forma de
discurso retrata as di iculdades que as pessoas enfrentam nas periferias das grandes cidades. No Brasil, tudo começou em São Paulo por volta de 1986. Um dos primeiros a popularizar as apresentações foi o DJ Theo Werneck. No entanto, as pessoas possuíam uma retração em relação à novidade, pois a julgavam marginalizada. A despeito disso, o Rap resistiu e, nos anos 90, conquistou as rádios do país. Nomes de prestígio da época são Thayde e DJ Hum. A exemplo do que aconteceu com o samba, os rappers usavam sua arte para falar sobre as mazelas. Apesar de o Rap desde o princípio realizar reinvindicações sociais, será que é correto a irmar que ele é militante? “Eu não enxergo o Rap como militante, porque o projeto do Rap é mais denúncia do que o protesto como agenda política”, defende o músico Gerson Arrais. Seu ponto de vista vai de encontro ao pensamento de muitos que elevam a música de origem jamaicana a uma posição universal de força contra algo que maltrata, insiste e caleja. Sem considerar rótulos que o de inem, o rapper Hallan Depetriz, conhecido também como Sasquatch, classi ica aquilo que faz como uma forma de se expressar e apresentar soluções. “Em minhas letras gosto de escrever sobre sentimentos, momentos di íceis e o caminho para chegar ao im dos problemas. O Rap é minha terapia pessoal. Enquanto eu tiver dor, terei letra”, declara. A sociedade opressora faz render muitas letras. A esperança da arte é fazer com que a justiça e a igualdade façam parte das margens e, de tão intensas, transborde para além delas. 2K
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QUANTOS LIKES EU VALHO? Os problemas e desafios de uma geração que calcula sua autoestima com base nas reações do Facebook nunca postou uma foto lopaQ uem da¹ no Facebook, se sentiu mal e apagou? Mesmo que tenhamos gostado da foto, se ninguém curtiu,ela não é tão legal assim. Ou então, quem nunca pensou diversas vezes em postar o que realmente pensa no Twitter com medo de não receber um retweet? Parece que estamos vivendo menos por nós e mais pelos outros. E o mais assustador disso tudo é que viver assim nos dá prazer. Estamos inseridos em uma realidade quedenominamos de “Me MeMeGeneration”, classi icada pela revista Times como uma geração narcisista, acomodada e crente que é especial. O problema nunca foi colocar um iltro, mudar de lado, tirar as imperfeições e tantos outros retoques que obrigatoriamente damos nas fotos antes de postar. O grande e real perigo é necessitar de reações para suprir carências e necessidades pessoais. Será que toda viagem só é bacana no momento que atingimos 100 likes? Será que só somos bonitos se nossas fotos passam de 50 comentários? Será que nosso valor está ligado intrinsicamente ao que as pessoas acham das nossas postagens? Vivemos num mundo tão virtual que nossos espelhos foram trocados de lugar. Antes, na parede do quarto. Hoje, num feed de uma rede social. O que
somos está ali, escancarado, para quem quiser entrar e conhecer. Desde quando somos tão transparentes? Muitas vezes o que está exposto nem somos nós, mas quem gostaríamos de ser. E aí uma hora, como de costume, caímos na realidade e nos deprimimos porque nada daquilo é verdade. Você já notou como nossa felicidade é afetada pelo que está, literalmente, em nossas mãos? Não me vejo muito longe de um episódio da série britânica BlakMirror chamado NoseDive. Nesse episódio, as pessoas são classi icadas em notas e avaliadas conforme seu comportamento. Essas notas icam disponíveis para que todos naquela sociedade tenham acesso, podendo também dar avaliações positivas ou negativas para as atitudes de qualquer um que encontrar na rua. Pessoas com notas muito baixas são consideradas a escória da sociedade, sendo privadas de diversos privilégios. Já as pessoas com notas altas têm os melhores empregos e vivem uma vida cinco estrelas. Mesmo sendo parte da grande massa popular, nota-se nesses personagens a falsidade de cada ato e a infelicidade em viver uma vida para agradar. É até fácil imaginar um futuro assim. Apesar de nos assustar um pouco quando vemos na série, estamos caminhando lentamente para um modelo de categorização de pessoas. Quanto mais popularidade, mais interessante nostornamos. O problema é que isso nem sempre signi ica realização pessoal. É muito fácil ter mais de 10 mil seguidores e se sentir solitário. Estamos sempre conectados a todos e menos conectados em nós mesmos. Nós paramos de ser autossu icientes. Precisamos de outras pessoas para conquistar aquilo que queremos. Precisamos que olhem, que notem, que nos vejam e que nos curtam. Não para massagear o nosso
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ego, já passou disso faz tempo. Mas simplesmente para encontrar um motivo de viver. É assustador para você saber que tem gente que vive de um “gostei” no Instagram? Não? Deveria ser. Imagine que vivemos em uma sociedade da seguinte forma: aquilo que você posta é a sua mercadoria e você precisa que as pessoas comprem. O like é a moeda de troca. Você tem que chegar a casa no im do dia com uma quantidade razoável de curtidas, porque senão você não consegue alimentar o que precisa (que tal a autoestima?). Quando você não é tão bem-sucedido em vender, consequentemente consegue poucos likes, então ica extremamente triste. Mas mesmo se sentindo péssimo, você coloca um sorriso falso no rosto e faz com as pessoas acreditem que está tudo bem. Somos sempre tão felizes como aparentamos ser? Mesmo chorando, posso facilmente postar uma foto sorrindo. Quem vai dizer que é mentira? A vizinha que não. Ela vai olhar a foto e achar que a minha vida é sempre maravilhosa. Que eu nunca choro. Que eu nunca caio. Que eu nunca erro. Então vai se achar uma derrotada porque ela mesma não é assim. 3, 2, 1... E VAI: A corrida para ver quem é mais feliz e realizado começou. Logo depois ela posta uma foto com um sorriso ainda maior. No fundo, as duas estão quebradas. De inteiro, só a tela do nosso celular – ou nem isso. 2K
CAROLINA ROLINA INTHURN THURN
JORNALISTA ALISTA
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Tal pai, tal filho deste solo A resistência do passado nos tornou povo heroico e até hoje nos inspira.
Quadros saiu varrido em 1961. J ânio Após a renúncia do presidente caricato, o vice João Goulart assumiu a presidência em seu lugar e deu abertura às organizações sociais. Os conservadores se irritaram com a adoção de medidas que favoreciam as classes outrora olvidadas. Sem pestanejar, acusaram o presidente de proximidade com o comunismo. Essa premissa respaldou o golpe militar de 1964.Para todos os discordantes, a opressão ferrenha foi oferecida generosamente. Foram tempos di íceis para os insatisfeitos. Insatisfeitos, porém não imobilizados. Não tinham armas. Eram armas. Seus corpos, munidos de ideias e talentos, lutaram. Jornalistas escreviam clandestinamente e músicos compunham disfarçadamente. Todos militavam. Os militantes, tragicamente, carregam o mesmo radical dos radicais daquela época. Militantes versus militares. Se por um lado havia desejo ardente de liberdade, por outro existia arbitrariedade em abundância. Toda esquina apresentava um perigo e o sinal permanecia fechado para os jovens. Apesar disso, o amanhã prometia ser outro dia. Chico Buarque cantava essa fé. Com sua voz, militava. E, por causa de sua militância, angariou um exílio. Muitos outros semelhantes seus, igualmente engajados, sofreram outras fatalidades.
EMANANUELY MIRANDA JORNALISTA
A despeito de tudo, os ilhos da pátria não fugiram à luta e, depois de muitos instantes, o sol da liberdade brilhou no céu em raios fúlgidos. A nova estação, prometida no cheiro vindo do vento, chegou apenas em 1985. Essa vitória custou o sangue de guerreiros acumulado durante os 21 anos que passaram em cadência lenta desde o princípio das dores. No entanto, a geração que os sucedeu não se mostra disposta a ir tão longe quanto eles foram. Atualmente, militam sem causa esclarecida ou estudada. Os militantes da contemporaneidade, em sua maioria, se valem de argumentos infundados e compõem um exército emburrecido. As redes sociais se tornaram espaço para que qualquer um de nós expressasse as ideologias nas quais acredita. Se antes houve música sangrada para despistar a censura, hoje há textão no Facebook sem necessidade de metáforas. Essa transparência nos permite enxergar com clareza as falhas nos discursos. É cômodo demais postar ideias vazias, mas demanda muito trabalho fundamentá-las com racionalidade. Outra demanda em desfalque é a empatia necessária para escutar a opinião alheia e valorizá-la. Desfalcados somos vulneráveis e cada vez mais ignorantes. A massa padece na inércia sem entender que o engajamento coletivo se faz crucial. A juventude de hoje não precisou enfrentar a aridez da ditadura, mas está longe de viver em um contexto ideal. Ainda há muito conservadorismo intolerante permeando nossas relações. Diante disso, a militância ainda é necessária.
Trata-se da prática fomentada por pessoas que defendem uma causa e buscam transformação da sociedade através da ação. Isso implica, às vezes, em uma postura de enfrentamento. Para enfrentar é preciso estar preparado da mesma forma que os militantes anteriores um dia estiveram. Somos todos soldados com a certeza ixadiante dosolhos feito vislumbre, aliada ao exemplo do passado deixado nas mãos. Devemos seguir a canção com o mesmo brado retumbante de nossos pais. 2K
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Mosaico
JULIANO VITÓRIO E KENNEDY NUNES
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NOVOS DIAS DE UM NOVO TEMPO Na luta da TV por seu espaço, a inimiga internet se mostra aliada utro dia estava eu tomando um ônibus interestadual voltando para casa de uma viagem. O trajeto não é muito longo, mas o su iciente para tornar-se entediante. Sentei na poltrona e olhei para o teto do ônibus procurando uma televisão. Sempre foi de praxe assistir um ilme ou musical enquanto fazia aquele percurso. Cadê a TV? Não havia nenhuma. Só uma placa dizendo “Wi- i 4G”. Pronto! Problema mais que resolvido. Conectei meu celular à rede, escolhi o que queria ver e garanti uma ótima viagem até meu destino. Veículos com acesso à internet não são nenhuma grande novidade, na verdade é algo muito comum hoje. Na cidade de Santos por exemplo, todos os veículos de transporte urbano possuem internet livre, mas, o episódio descrito acima expõe uma realidade atual. Segundo a última Pesquisa Brasileira de Mídia, a televisão perdura como o meio de comunicação mais utilizado. 63% dos brasileiros utilizam o aparelho. Esse número pode ser um tanto indigesto para a geração da conexão, mas acredite, atelevisão ainda existe. Outra pesquisa porém, a Nacional de Amostras de Domicílios de 2015, revelou que mais da metade da população havia acessado a rede mundial de computadores em um período de 3 meses, quase 7 milhões a mais de brasileiros conectados que no ano anterior. A TV ainda é muito assistida, mas o número de consumidores de vídeo sob
O
demanda não para de crescer. O espectador gostou da ideia de ter o poder de assistir o que quiser quando quiser, sem enrolação e sem comerciais. A Net lix por exemplo, no início do ano já somava 100 milhões de assinantes no mundo, e convenhamos, o número real de usuários é muito maior. Quem tem divide sua conta com quem não tem e essa camaradagem, apesar de ilegal, não incomoda a empresa. O YouTube domina no quesito é vídeo sob demanda. É praticamente impossível não encontrar algo após uma simples busca no site. Escolher o que assistir é o grande trunfo da tecnologia. Diante deste cenário desleal, a velha televisão luta para manter seu público e tem uma tarefa ainda mais complicada: conquistar os novos consumidores que praticamente nasceram conectados. Para o im, a TV está se apoderando da transmídia e da segunda tela, garantindo a interação e a participação direta do público na composição de seu conteúdo, além de disponibilizar também sua programação sob demanda na internet. Um fato interessante foi o ocorrido com a rede de televisão americana NBC e a série criada por ela chamada Community. Todos os anos a produção amarga baixíssimos índices de audiência e anualmente o canal cogita encerrar a série. Bastaram os primeiros rumores do im e os usuários onlinese manifestaram contrariamente. Concluindo: conteúdo produzido pela televisão convencional está sendo consumido, porém, de
maneira diferente. Cabe aos canais televisivos encontrar uma maneira de explorar esse fenômeno, o que não é fácil, haja vista que a audiência é medida pelo número de aparelhos ligados em um canal. O faturamento com anúncios depende diretamente destas informações. Outra estratégia é trazer celebridades da rede, como blogueiros e youtubers para a televisão. Na verdade, a internet virou uma área de testes da TV convencional. O que dá certo na rede é aderido à programação dos canais convencionais. Um exemplo é o Manual do Mundo que nasceu na internet em 2008 como website e canal no YouTube. A criação de Iberê Thenório, tem a proposta de ensinar experimentos cientí icos, pegadinhas, mágicas e truques de maneira divertida, com linguagem fácil e dinâmica. Logo o Manual do Mundo fez muito sucesso e foi premiado algumas vezes. Anos depois lá estava Iberê e sua esposa Mariana Fulfaro apresentando um programa próprio na televisão.Hoje os youtubers são os ídolos de uma faixa etária que há alguns anos atrás venerava apresentadores e atores da televisão. Ainda existe público para a velha televisão, entretanto, uma série de adaptações terão de ser feitas. O fato é que o caminho a ser trilhado pela televisão nos próximos anos não escapa da internet. Realmente o novo dia de novos tempos já começou. 2K
JULIANO ANO VITÓRIO RIO
JORNALISTA TA
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