Certificado digitalmente por: LEONEL CUNHA
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1609655-4, DA 2ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE MARINGÁ Apelante
:
MINISTÉRIO PÚBLICO
Apelados
:
AMARILDO TREIN e OUTRO
Relator
:
Des. LEONEL CUNHA
EMENTA 1)
DIREITO
ADMINISTRATIVO.
IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. ART. 11 DA LEI Nº 8.429/92. VIOLAÇÃO A PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. FISCAL DE OBRAS DO MUNICÍPIO DE MARINGÁ QUE, COM A PARTICIPAÇÃO DE TERCEIRO, REALIZAVA PROJETOS POR ELE MESMO FISCALIZADOS. AUSÊNCIA DE PROVAS DA CONDUTA
ÍMPROBA
IMPUTADA.
SENTENÇA
DE
IMPROCEDÊNCIA QUE SE MANTÉM. a)
Comete,
em
tese,
ato
de
improbidade
administrativa tipificado no art. 11, inciso I da Lei nº 8.429/92, na modalidade dolosa, o agente público (fiscal de obras) que, com a colaboração de terceiro particular (engenheiro civil), apresenta projetos de obras por ele mesmo fiscalizadas, em evidente prejuízo à Administração Pública. Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 1 de 25
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b)
Todavia, a condenação por imputação desse
jaez deve estar fundamentada em elementos seguros de prova,
que
demonstrem,
sem
sobressaltos, a
ocorrência do fato.
c)
Não
tendo
o
Ministério
Público
se
desincumbido de tal ônus, deve ser mantida a sentença de improcedência.
2) APELO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
Vistos, RELATÓRIO
1) Em 24.09.2012, o MINISTÉRIO PÚBLICO ajuizou AÇÃO CIVIL PÚBLICA C/C RESPONSABILIDADE POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA em face de AMARILDO TREIN e PAULO MINEO MATSUMOTO (fls. 03/29 – mov. 1.1 do projudi), alegando que: a) em 17.10.2011, instaurou Procedimento Preparatório e posteriormente convertido em Inquérito Civil Público – autos nº MPPR-0088.11.002571-0 para apurar eventuais irregularidades nas fiscalizações de obras atribuídas aos servidores do Município de Maringá; b) apurou-se que o Réu AMARILDO TREIN ingressou no Município de Maringá na data de 04 de julho de 1986, através de Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 2 de 25
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aprovação
em
concurso
público
e
atualmente
desempenha o cargo de agente fiscal lotado na Secretaria Municipal de Gestão, porém anteriormente integrava a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano; c) referido servidor, ao invés de proceder à fiscalização nas obras edificadas na municipalidade, passou a concorrer deslealmente com os profissionais de engenharia e arquitetura da cidade de Maringá, eis que pela condição privilegiada do exercício do cargo trocou a figura do contribuinte (fiscalizado) pelo de cliente, pois idealizava e até acompanhava a execução de projetos de obras desses clientes mediante a cobrança de numerários e das respectivas taxas para processar/regularizar junto à própria municipalidade a que serve como funcionário concursado; d) o próprio servidor, ora Réu, combinava com os contribuintes (ou clientes)
que
providenciaria,
como
de
fato
providenciava, um profissional de engenharia para somente assinar o(s) projeto(s) que idealizava, e para se responsabilizar perante o órgão competente, ou seja, o CREA; e) ocorre que a maioria dos agentes fiscais, quando
do
processamento
dos
próprios
projetos
idealizados, seriam designados para vistoriá-los; f) pelos elementos de prova colhidos no Inquérito Civil, ficou devidamente comprovado que o Réu AMARILDO Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 3 de 25
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TREIN, ao invés de atender as disposições do Decreto Municipal nº 386/99, para orientar, inspecionar e exercer a fiscalização de construções irregulares e clandestinas,
cometeu
atos
de
improbidade
administrativa, na medida em que violou os princípios da
Administração
Pública
(legalidade,
moralidade,
impessoalidade e eficiência), sendo desleal à instituição Município de Maringá a que serve, descumprindo regra de sua competência, sujeito, portanto, as cominações legais; g) por outro lado, também é inegável que o engenheiro PAULO MINEO MATSUMOTO concorreu para as condutas irregulares e ilegais do Réu AMARILDO TREIN, na medida em que sabia que não teria sido ele o autor do projeto arquitetônico, e mesmo assim apôs a sua assinatura nos aludidos projetos, para dar o aspecto de legalidade perante os órgãos competentes. Assim, tendo os Réus cometido os atos de improbidade tipificados no art. 11, inciso I da Lei nº 8.429/92, pediu sua condenação nas sanções do art. 12, inciso III, da mesma Lei.
2)
AMARILDO
MATSUMOTO apresentaram
TREIN
e
PAULO
Defesa Prévia
MINEO nas
fls.
448/453 (mov. 33.1 do projudi) e 468/476 (movimento 39.1 do projudi). Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 4 de 25
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3) A decisão de fls. 893/897 (mov. 61.1 do projudi) recebeu a inicial, afastando as preliminares arguidas.
4) Contra tal decisão os Réus interpuseram Agravos Retidos (fls. 920/924 – mov. 75.1 do projudi e 957/961 – mov. 99.1 do projudi).
5)
AMARILDO
TREIN
contestou
(fls.
1039/1063 – mov. 151.1 do projudi), alegando que: a) ingressou nos quadros funcionais da Prefeitura do Município de Maringá em julho de 1986; durante quase a totalidade dos anos em que prestou serviços, esteve lotado na Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo; em período bem posterior (2011) passou a trabalhar na Secretaria de Gestão; b) em ambos os lapsos exercia o cargo efetivo de agente fiscal e tinha como atribuições principais o desenvolvimento de trabalhos administrativos internos, a fiscalização de comércio e de ambulantes; eventualmente (e, depois da mudança de lotação) realizava fiscalização em obras nas zonas centrais da cidade; c) o trabalho era realizado
com
70%
do
tempo
em
serviços
administrativos internos e 30% nas outras atividades por conta de uma deficiência física que impede o Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 5 de 25
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Requerido de se locomover de forma contínua e por longos
períodos
(como
seria
necessário
em
fiscalizações); quando tinha um ano de idade, sofreu de poliomelite; em decorrência disso, ficou com sequelas em sua perna esquerda (atrofia muscular); tal quadro foi agravado quando sofreu acidente (fratura do fêmur): passou por diversos tratamentos, ficou afastado do trabalho de setembro de 2010 a setembro de 2011 e, por conseguinte, quando retornou ao trabalho, foi direcionado aos serviços internos; d) sempre solícito com os contribuintes e detentor de vasto conhecimento sobre a legislação e sobre os procedimentos internos da Prefeitura, durante os 28 anos que prestou serviços à municipalidade, o Requerido era muito procurado pelos contribuintes e pelos diretores para o esclarecimento de dúvidas; e) consoante a inicial, nos anos de 2008 a 2012 (período objeto da ação), o Requerido teria deixado de exercer corretamente suas funções como servidor público para disputar, ilegalmente, os clientes de
engenheiros/arquitetos/projetistas;
contudo,
da
análise das avaliações de desempenho referentes a esse lapso, verifica-se que o Requerido trabalhava, na Prefeitura, durante todo o horário de expediente e cumpria corretamente a respectiva carga. Além disso, era regularmente procurado (por contribuintes e por Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 6 de 25
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colegas
de
relacionadas
trabalho) à
para
legislação
esclarecer
municipal,
em
dúvidas diversas
esferas; f) o Autor não demonstrou qualquer protocolo de processo em nome do Requerido (simplesmente porque inexistem) e mais, não comprovou o pagamento ou a existência de (suposto) benefício recebido por ele; g)
não
obstante
isso,
ainda
que
o
Requerido
pretendesse “agraciar” qualquer administrado com supostos benefícios (o que não é o caso), ele não teria poderes suficientes para tanto, uma vez que seria impedido
pela
própria
sistemática
processual-
administrativa adotada pela Prefeitura de Maringá; h) ademais, sua própria condição financeira atual infirma a conclusão de que haveria recebido benefícios; i) quanto à
alegação
de
que
teria
cometido
os
atos
de
improbidade tipificados no art. 11 da Lei nº 8.429/92, os casos de improbidade disciplinados pelo mencionado dispositivo
apenas
restam
caracterizados
se
evidenciada a atuação dolosa do agente; i) ao contrário do disposto pelo Autor, o Requerido não deixou de atender às disposições do Decreto Municipal n.º 386/99 e da Lei Complementar Municipal n.º 239/98 (porque, frise-se,
realizava a
contento
suas
funções);
não
incorreu nas penalidades do art. 170, da referida Lei Complementar Municipal (inexistiu prova nos autos de Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 7 de 25
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que tenha logrado proveito em detrimento da função pública ou de que tenha recebido vantagem em razão de sua atribuição) e, por conseguinte, não deixou de atender orientar, inspecionar e exercer a fiscalização de construções
para
se
permitir
em
concorrer
deslealmente com os profissionais de engenharia e arquitetura desta cidade – até porque, como dito, essa prática seria fisicamente inviável; por consequência, nem se poderia cogitar que ele tenha atuado com dolo, isto é, com vontade livre e consciente de lesar a Administração Pública. Em razão disso, pediu fosse julgada improcedente a pretensão inicial.
6)
PAULO
MINEO
MATSUMOTO
ofertou
contestação (fls. 1112/1136 – mov. 168.1 do projudi), alegando que: a) o Ministério Público presumiu, na inicial, que o engenheiro civil precisa obrigatoriamente confeccionar os projetos das obras que, de alguma forma,
participa;
essa
afirmação,
contudo,
é
plenamente falsa e decorre, talvez, da confusão feita pelo Órgão Ministerial com o regramento da área jurídica, em que os advogados somente podem assinar as peças em cuja confecção colaboraram; as regras atinentes à engenharia civil descritas na Lei 5.194/66 não impõem ao profissional a participação desde o Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 8 de 25
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início do projeto até a sua conclusão. Noutras palavras, é
possível
que
uma
obra
envolva
diferentes
profissionais da engenharia, a depender dos projetos necessários (ex. arquitetônico, estrutural, hidráulico, elétrico, prevenção contra incêndio, telefônico etc.); b) o particular, via de regra, não pode ser agente do ato de improbidade administrativa isoladamente, senão quando induzir, concorrer ou se beneficiar dos atos previstos na Lei n. 8.429/92, consoante preceitua o art. 3º desta última; c) tal dispositivo autoriza a conclusão de que a responsabilização do particular por atos de improbidade administrativa depende que este saiba que um agente público também está praticando a conduta e almejando a finalidade atentatória aos princípios administrativos (no caso em tela), e resolva aderir à conduta do agente público; d) nenhum dos fatos narrados na inicial está refletido nas provas acostadas à inicial; ademais, mesmo quanto ao que as provas demonstram, vê-se que o Réu PAULO não tem qualquer envolvimento quanto aos fatos; e) dito de outro
modo,
não
há
qualquer
prova
efetiva
da
contribuição do Réu PAULO para a prática dos supostos atos de improbidade administrativa, o que importa em dizer que o Autor não provou o seu dolo. Assim, pediu o julgamento improcedente do pedido. Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 9 de 25
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7) Réplica do MINISTÉRIO PÚBLICO nas fls. 1147/1149 (mov. 172.1 do projudi).
8) Realizada audiência de instrução, foram colhidos os depoimentos pessoais dos Réus e inquiridas 09 (nove) testemunhas arroladas pelas partes (fls. 1235/1247 – mov. 228.1 do projudi e 1263/1265 – mov. 236.1 do projudi).
9) A sentença (fls. 1325/1342 – mov. 261.1 do projudi) julgou improcedente o pedido formulado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, entendendo não ter havido a produção de provas que demonstrassem a prática dos atos ímprobos alegados na inicial. 10) O MINISTÉRIO PÚBLICO apelou (fls. 1366/1379 – mov. 271.1 do projudi), afirmando que: a) ao contrário do afirmado na sentença, com a prova documental
juntada
aos
autos,
a
oitiva
das
testemunhas, bem como o depoimento pessoal dos Réus, restou claramente comprovada a conduta dolosa de
ambos
os
Réus;
b)
as
provas
documentais
constantes dos autos são praticamente irrefutáveis e, por si sós já deixam claro que, de fato, no caso da obra localizada na Rua Chapecó, sem número, na quadra 0,
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lote 107-C, na Gleba Patrimônio Iguatemi, houve atuação da forma como narrada na petição inicial. O documento constante na fl. 06 do mov 5.1 (fls. 174/175 do ICP) elaborado pela agente de fiscalização do CREAPR Patricia Bruder Barbosa Olini, que instruiu a inicial, comprova que o fiscal AMARILDO TREIN de fato elaborou os “desenhos” ou projetos da obra localizada na Rua Chapecó s/n°, nesta cidade, na quadra 0 de lote 107-C, na gleba Patrimônio Iguatemi, de propriedade de Marcos Antônio de Souza, sendo que o engenheiro PAULO MINEO MATSUMOTO nunca esteve na obra; c) no tocante à prova testemunhal, o que se extrai de mais importante
é
comprovação
da
regularidade
dos
procedimentos adotados pela fiscal do CREA, signatária do documento mencionado em petição inicial, conforme trecho da oitiva de Djalma Bonini, ratificado pela declaração de Bruno Trevisan Takemura e pela própria fiscal
que
depoimentos
diligenciou pessoais
na
obra;
d)
quanto
dos
Réus,
nota-se
que
aos há
contradições importantes em relação aquilo que foi declarado
perante
o
MINISTÉRIO
PÚBLICO,
principalmente quanto às declarações que o Réu Amarildo prestou na fase inquisitorial e seu depoimento pessoal em juízo; e) todos os elementos colhidos conduzem à conclusão de que houve prática de atos de Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 11 de 25
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improbidade. Em razão disso, pediu a reforma da sentença, com a condenação dos Réus, na forma do quanto foi pedido na inicial.
11) Contrarrazões de AMARILDO TREIN nas fls. 1397/1412 (mov. 287.1 do projudi) e de PAULO MINEO MATSUMOTO nas fls. 1414/1436 (mov. 288.1 do projudi).
12)
Encaminhados
os
Autos
à
Douta
Procuradoria-Geral de Justiça, esta se pronunciou pelo não provimento do Apelo, mantendo-se na íntegra a sentença (fls. 10/20 – TJ).
É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO
O Apelo não comporta provimento, devendo ser mantida a sentença que julgou improcedente o pedido do MINISTÉRIO PÚBLICO de condenação dos Apelados
AMARILDO
TREIN
e
PAULO
MINEO
MATSUMOTO pela prática de ato de improbidade administrativa
tipificado
no
art.
11
da
Lei
nº
8.429/1992. Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 12 de 25
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Inicialmente, merecem
ser
mencione-se
conhecidos
os
que
Agravos
não
Retidos
apresentados pelos Apelados nos movimentos 75.1 e 99.1 dos autos originários. A uma, porque se voltam contra o recebimento da inicial, sendo certo que o recurso
cabível,
em
tal
caso,
é
o
Agravo
de
Instrumento, conforme previsão do art. 17, § 10 da Lei de Improbidade. A duas, porque ainda que assim não fosse, os Agravos Retidos não foram reiterados nas Contrarrazões à Apelação, providência que era exigida pelo art. 523, § 1º do revogado Código de Processo Civil de 1973. Feito
tal
esclarecimento,
e
conforme
relatado, a acusação imputa ao Apelado AMARILDO TREIN, fiscal de obras do Município de Maringá, a idealização e execução de projetos (arquitetônicos) de obras realizadas naquele Município, com a participação do
Apelado
AMARILDO
PAULO
fosse
o
MINEO
MATSUMOTO,
responsável,
embora
justamente,
pela
fiscalização de tais obras. Dessa forma, teriam os Apelados incidido na previsão dos arts. 3º e 11 da Lei nº 8.429/1992: “Art.
3°
As
disposições
desta
lei
são
Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 13 de 25
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aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta. Art.
11.
Constitui
ato
de
improbidade
administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole
os
deveres
de
honestidade,
imparcialidade,
legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência”. A violação ao princípio da legalidade estaria na
não
observância
dos
deveres
atribuídos
pelo
Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Maringá (Lei Complementar nº 239/1998), em especial aqueles inscritos nos arts. 169 e 170:
“Art. 169. São deveres do funcionário: I – exercer com zelo e dedicação as atribuições do cargo; II – ser leal às instituições a que servir; III
–
observar
as
normas
legais
e
regulamentares”.
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“Art. 170. Ao funcionário é proibido: (...) XII – valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública; (...) XIV
–
atuar,
como
procurador
ou
intermediário, junto às repartições públicas municipais, salvo quando se tratar de benefícios previdenciários ou assistenciais de parentes até o segundo grau, de cônjuge ou companheiro; XV – receber propina, comissão, presente ou vantagem de qualquer espécie, em razão de suas atribuições; (...) XX – exercer quaisquer atividades que sejam incompatíveis com o exercício do cargo ou função e com o horário de trabalho”.
Todavia, assim como entendeu a sentença recorrida, não se pode afirmar, pela prova produzida nos autos, e sem dúvida razoável, que os fatos efetivamente
ocorreram
tais
como
narrados
pelo
MINISTÉRIO PÚBLICO. Deve-se ter em mente que a imputação de improbidade deve ser efetuada em relação a fato ou fatos certos e específicos, não bastando a mera
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alegação genérica de “mau proceder” do servidor público. No caso específico, a única imputação concreta formulada em face dos Apelados diz respeito à obra realizada na Rua Chapecó, sem número, da quadra 0 de lote 107-C, Gleba Patrimônio Iguatemi, no Município de Maringá, de propriedade de Marcos Antônio de Souza. Não obstante, antes de adentrar no exame da prova produzida, esclareça-se que, por força da prejudicialidade existente entre a conduta do servidor público e a conduta do terceiro partícipe do ato ímprobo, primeiro se analisará os fatos atribuídos ao servidor público, sendo certo que, apenas em caso de juízo
positivo
referente
à
existência
de
ato
de
improbidade, é que se cogitará da análise da conduta do particular.
Neste
sentido
é
a
jurisprudência
do
Superior Tribunal de Justiça:
“ADMINISTRATIVO. ADMINISTRATIVA.
IMPOSSIBILIDADE
IMPROBIDADE DE
FIGURAR
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APENAS PARTICULARES NO POLO PASSIVO DA AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE AGENTE PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. (...) 4. É
inegável que o particular sujeita-se à Lei de Improbidade Administrativa, porém, para figurar no polo passivo, deverá, como bem asseverou o eminente Min. Sérgio Kukina, "a) induzir, ou seja, incutir no agente público o estado mental tendente à prática do ilícito; b) concorrer juntamente com o agente público para a prática do ato; e c) quando se beneficiar, direta ou indiretamente do ato ilícito
praticado
pelo
agente
público"
(REsp
1.171.017/PA, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/2/2014, DJe 6/3/2014.) (grifo nosso). 5. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido
de
que
"os
particulares
não
podem
ser
responsabilizados com base na LIA sem que figure no pólo passivo um agente público responsável pelo ato questionado, o que não impede, contudo, o eventual ajuizamento de Ação Civil Pública comum para obter o ressarcimento do Erário" (REsp 896.044/PA, Rel. Min. Herman
Benjamin,
16.9.2010,
DJe
Segunda 19.4.2011).
Turma, Agravo
julgado
em
regimental
improvido. (AgRg no AREsp 574.500/PA, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 10/06/2015, destaquei). Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 17 de 25
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Além disso, deve ser destacado que o ato ímprobo não se confunde com o mero ato ilegal; ao revés,
a
improbidade
é
ilegalidade
tipificada
e
qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente.
Neste sentido, confira-se o entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça:
“PROCESSUAL CIVIL E
ADMINISTRATIVO.
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA.
CONTRATAÇÃO
IMPROBIDADE DE
ADMINISTRATIVA.
SERVIDOR
SEM
CONCURSO
PÚBLICO. PRÁTICA DE ATO VIOLADOR DE PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS.
ARTIGO
11
DA
LEI
8429/92.
RECONHECIMENTO DE DOLO GENÉRICO. PENALIDADE APLICADA. CONJUNTO
PROPORCIONALIDADE. FÁTICO
E
PROBATÓRIO
REEXAME DOS
DO
AUTOS.
IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. A jurisprudência
desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que não se pode confundir improbidade com simples ilegalidade. A improbidade é a ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Assim, para a tipificação das condutas descritas nos artigos 9º e 11
da
Lei
8.429/92
é
indispensável,
para
a
Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 18 de 25
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caracterização de improbidade, que o agente tenha agido dolosamente e, ao menos, culposamente, nas hipóteses do artigo 10. (...) (AgRg no REsp 1500812/SE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA,
julgado
em
21/05/2015,
DJe
28/05/2015,
destaquei). Ademais,
a
comprovação
do
elemento
subjetivo deve ser feita levando-se em conta as situações fáticas concretas, não se podendo afirmar, de antemão e em tese, quando tal ou qual conduta será dolosa ou culposa. E, concluiu a
no
caso
sentença,
presente,
não
se
conforme
pode
afirmar,
bem com
segurança, que as condutas dos Réus AMARILDO TREIN e PAULO MINEO MATSUMOTO sequer foram provadas, quanto mais, portanto, caracterizadas pela presença de elemento doloso.
Confira-se, a esse respeito, o quanto foi afirmado pelos Réus e pelas testemunhas na audiência de instrução: “Foi aprovado em concurso público em 1986 para o cargo de auxiliar administrativo; em 1993
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passou para o cargo de agente fiscal; sua atribuição era fiscalizar obras e serviços em geral; no começo fazia atividade externa, durante uns 4 ou 5 anos; após, passou a trabalhar internamente, o que fez por 17 anos, até se aposentar; conhece Paulo Matsumoto por realizar
atendimentos
a
ele
na
fiscalização;
não
acompanhava projetos de contribuintes; nunca cobrou qualquer valor de algum contribuinte; é impossível ter ocorrido o que o Ministério Público acusa, porque, além da
fiscalização,
qualquer
protocolo
passava
por
inúmeros outros setores, como o planejamento; os protocolos eram atendidos por ordem de chegada, então não havia como agilizar para algum interessado; não tem conhecimento de técnica de desenho; não sabe usar o AutoCad; em 2002, chegou a fazer rascunhos, pelos quais cobrava R$ 100,00, para que os profissionais elaborassem os projetos; nunca fez projeto que foi assinado por Paulo Matsumoto; com relação à obra da Rua Chapecó, não participou em nada; naquele período estava de licença médica, e o engenheiro Paulo, por ter relações com seu filho, que desenhava, apenas o consultava, em casa, sobre a legislação do Código de Obras; houve sindicância, e o inquirido e outros 14 servidores que estavam na fiscalização de obras foram afastados e demitidos da Prefeitura; no Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 20 de 25
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período de 2002 a 2014, só fazia trabalho externo em casos esporádicos; só fez desenho até 2002; seu filho fez curso de AutoCad, e passou a desenhar também”. (AMARILDO TREIN, depoimento pessoal). “É
engenheiro
desde
1977;
sobre
a
alegação de que Amarildo idealizava os projetos e o depoente apenas assinava, não é verdade o alegado; prepara um esboço do desenho, e terceiriza os projetos; depois verifica se estão de acordo com as normas técnicas e o Código de Obras do Município; Amarildo não elabora projetos; com Amarildo apenas confirmava os detalhes da parte técnica das obras, como recuos, etc;
em
nenhum
momento
assinou
projeto
que
Amarildo teria criado; a relação com Jean, filho de Amarildo, se dava por conta do programa Autocad, já que Jean o dominava, e o depoente não; não cobrou quantias de nenhum contribuinte, para fazer os projetos andarem com Amarildo; o desenhista apenas faz o projeto, mas não assina qualquer documento; quem assina e possui responsabilidade é o engenheiro” (PAULO MINEO MATSUMOTO, depoimento pessoal). As alegações realizadas pelos Réus foram corroboradas
pelos
depoimentos
prestados
pelas
testemunhas das partes. Confira-se: Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 21 de 25
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“Amarildo era excelente funcionário; tinha muito conhecimento do Código de Obras do Município, mas não sabia usar o Autocad; nunca percebeu nenhum desvio de função da parte dele; não elaborava projetos; nunca viu contribuintes indo “atrás” dele para contratálo; não dava para Amarildo interferir no andamento dos processos administrativos” (Eunice Carneiro, gerente de análise de projetos). “Quando o Amarildo veio trabalhar comigo, nem sabia mexer no computador; acho que nem sabia mexer no Autocad”. (Milton Camargo Pinto, agente fiscal e gerente de fiscalização). “Trabalha no setor de análise de projetos; desconhece se Amarildo idealizava e acompanhava projetos para contribuintes, particulares; Amarildo não usava Autocad e que não havia nem razão para usar por conta do trabalho por ele desenvolvido (interno)” (Hamilton
Florentino
Martelli,
funcionário
público
municipal). Neste cenário, embora se pudesse dar crédito para as alegações formuladas na inicial pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, de molde a fundamentar o recebimento
da
ação, tais
alegações
não
foram,
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entretanto,
devidamente
sustentadas
pela
prova
produzida na instrução. Especial destaque deve ser dado ao fato de que
o
único
elemento
que
poderia
ensejar
a
responsabilização dos Apelados – e que inclusive motivou o ajuizamento da presente ação – seria o depoimento do proprietário da obra anteriormente mencionada, dando conta de que o Réu AMARILDO teria idealizado o projeto arquitetônico e contribuído para um andamento mais rápido do procedimento perante a Prefeitura. Todavia, como bem averbou a sentença recorrida, “o proprietário da supracitada obra sequer foi ouvido em Juízo como testemunha para esclarecer eventuais equívocos ou corroborar a tese sustentada pelo autor desta Ação Civil Pública. Antes, durante o curso do Processo Administrativo Disciplinar instaurado para averiguar eventuais faltas funcionais praticadas pelo primeiro réu, afirmou, categoricamente, que não houve nenhuma participação de AMARILDO TREIN na elaboração do projeto arquitetônico de sua obra, nem foi favorecido, de forma alguma, durante o trâmite processual de seu projeto perante a Administração
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Pública local (vide evento 51.6, pg. 06 – PROJUDI)”. Donde
se
conclui,
portanto,
pela
insuficiência da prova coligida nos autos, não tendo o MINISTÉRIO PÚBLICO se desincumbido do seu ônus (art. 333, inciso I do CPC/73, atual art. 373, inciso I do CPC/2015).
ANTE O EXPOSTO, voto por que seja negado provimento ao Apelo, mantendo-se a sentença recorrida tal como lançada.
Sem condenação em custas e honorários advocatícios na instância originária.
DECISÃO ACORDAM os integrantes da Quinta Câmara Cível do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ, por unanimidade de votos, em negar provimento ao Apelo, nos termos da fundamentação.
Participaram
do
julgamento
os
Desembargadores CARLOS MANSUR ARIDA, Presidente
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sem voto, LUIZ MATEUS DE LIMA e ADALBERTO JORGE XISTO PEREIRA.
CURITIBA, 20 de fevereiro de 2018.
Desembargador LEONEL CUNHA Relator
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