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A responsabilidade do transitário - Jorge Urbano Gomes
A responsabilidade do transitário
O Tribunal da Relação do Porto, num recente acórdão de 11 de Janeiro deste ano de 2021, aborda a temática da responsabilidade do transitário pelos actos praticados por outrem, mormente pelo transportador com quem celebrou o contrato de transporte. Partes nesta acção eram duas empresas transitárias: a Autora, que tinha sido contratada por uma determinada sociedade para realizar o transporte de 13 volumes de carga, de Portugal para França; a Ré, que foi, por sua vez, contratada pela Autora para tratar de todos os trâmites e formalidades necessárias para expedir 13 volumes de carga, desde Portugal até França, em regime de grupagem, ou seja, juntamente com mercadorias de outros clientes e via terminal da Ré. A mercadoria chegou ao seu destino com danos, decorrentes do transporte e seu manuseamento logístico. A Autora vem demandar a Ré no pagamento de um montante que, por sua vez, tinha sido condenada a pagar à sua cliente, o que fez a título de eventual direito de regresso nos termos do disposto nos artigos 37.º e 39.º da Convenção Relativa ao Transporte Internacional de Mercadorias por Estrada (CMR). De notar que o transitário responde perante o seu cliente pelo incumprimento das suas obrigações, bem como pelas obrigações contraídas por terceiros com quem haja contratado, sem prejuízo do direito de regresso. A Ré, por sua vez, alega ter sido contratada unicamente como empresa transitária, pelo que ao caso em concreto não é aplicável o CMR, mas sim o Decreto-Lei n.º 255/99, de 7 de Julho, que regula o regime da actividade das empresas transitárias, e que, tendo decorrido um período superior a dez meses da data da conclusão da prestação do serviço contratado, qualquer direito de indemnização da Autora resultante da sua responsabilidade se encontraria prescrito nos termos do disposto no artigo 16.º do mencionado Decreto-Lei n.º 255/99. O Tribunal da Relação do Porto, aliás, na senda do que já tinha sido decidido na primeira instância, entendeu que, tendo a Ré actuado unicamente como empresa transitária, ou seja, como “arquitecto do transporte”, não é aplicável à relação contratual o CMR, mas sim o Decreto-Lei n.º 255/99, que no seu artigo 1.º define a actividade transitária como a prestação de serviços a terceiros, no âmbito da planificação, controle, coordenação e direcção das operações necessárias à execução das formalidades e trâmites exigidos na expedição, recepção e circulação de bens ou mercadorias – ou seja, «uma actividade diversificada e complexa, que não se confina, em regra, nos estreitos limites da deslocação das mercadorias do ponto de partida para o ponto de chegada, ou, o que vale o mesmo, não se esgota na mera operação de transporte “tout court”, pelo que confirmou a sentença da primeira instância que absolveu a Ré do pedido, uma vez que à data de instauração da acção já o eventual direito de indemnização da Autora estava prescrito, nos termos do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 255/99. Refere ainda o Acórdão que não pode ser aplicada à relação contratual o CMR também porque a Ré não assumiu contratualmente a obrigação de deslocação das mercadorias (o que se deu como provado), o que levaria a estarmos perante a figura do transitário-transportador. Este acórdão vem frisar a importância da distinção da actividade transitária com a actividade de transportador, como em anteriores crónicas alertamos. As empresas transitárias devem unicamente assumir, perante os seus clientes, as obrigações atinentes à sua actividade, com os limites estabelecidos pelo artigo 13.º do diploma que regula a actividade, ou seja, a prática de todos os actos necessários ou convenientes à prestação de serviços, bem como assumir em nome próprio ou em nome do cliente ou do destinatário dos bens, toda e qualquer forma legítima de defesa dos interesses correspondentes, podendo ainda celebrar contratos com terceiros em nome próprio, por conta do expedidor ou do dono da mercadoria, bem como receber em nome próprio ou por conta do seu cliente, as mercadorias que lhe são entregues pelo transportador e actuar como gestor de negócios, sob pena de eventuais dissabores na responsabilização das mesmas por algo que corra menos bem.
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Jorge Urbano Gomes Sócio da Gomes, Ferro & Associados, Sociedade de Advogados, SP, RL jug@gfaadvogados.pt