Após três anos de Nova Iorque surgiu a oportunidade para voltar para o Brasil. Não era uma volta definitiva. Era um projeto novo que o banco iria desenvolver no país. Por ser nativo o banco me escolheu para fazer parte da equipe, apesar de não ser ligado ao meu departamento. A viagem seria para levantar informações e modelar uma divisão de securitização de safras agrícolas. A securitização consiste no processo de comprar a safra antes de ser plantada, ou do animal a ser criado. Desta forma o produtor rural garante o faturamento, a lucratividade e a indústria que compra a produção garante os preços dos insumos. Era uma operação de risco, mas lucrativa, que necessitava de um profundo conhecimento do mercado e do povo com quem iria se negociar. Lá fui eu de volta para o Brasil. Voltar para o Brasil talvez seja mais difícil do que sair do país. Ficamos habituados às facilidades do primeiro mundo. Ao chegar a recepção foi a usual. Muita festa, fartura de comida, vizinhos e familiares em profusão entrando na casa e eu me sentindo como um animal no zoológico. Matei a saudades da família em pouco mais de um dia. Na segunda estava no banco às 9:00 da manhã conforme combinado. Pouco mudou na disposição dos moveis no Banco. A grande mudança estava nas pessoas. A Marisa e Mr Haber continuavam no banco, mas a recepcionista não era mais a mesma. Fui direto para a sala que haviam separado para a nossa equipe. Os meus colegas de New York chegaram logo depois. O trabalho a ser desenvolvido era muito grande. Seria necessário fazer várias viagens pelo país. O primeiro dia de trabalho no Brasil durou até às 20:00 hs. Jantamos em uma churrascaria e eu segui para casa. Dormi como uma pedra. No dia seguinte a mesma rotina, assim como o seguinte e toda a semana. No final de semana estava exausto. Não fiz nada, só dormi. Tinha uma dificuldade enorme em me adaptar à rotina da minha casa novamente.
Na segunda semana de trabalho fizemos a primeira viagem. Fomos conhecer umas fazendas no interior do estado. Eram plantações de cana. Visitamos também uma usina de açúcar e álcool. Foi muito bom voltar as minhas raízes caipiras. Na semana posterior fomos para o vale do São Francisco. Na seguinte foi Goiás e mato grosso. As grandes distâncias fizeram o banco fretar um avião No final do mês foi o Rio Grande do Sul. Em 30 dias tinha rodado o país de norte a sul. Era hora de fazer o relatório, despedir da família e voltar para casa. A despedida do pessoal do banco foi no limite do protocolar. A minha casa hoje estava em Nova Iorque e era esta a sensação que tinha no vôo de volta. O vôo, o aeroporto, o deslocamento, a burocracia da alfândega... Tudo isto se tornara familiar. A Big Apple era, agora, o meu porto seguro. Ali estava o meu apartamento, o meu quarto, a minha cama, os livros e a parte mais privada casa: O banheiro. Mesmo que tudo isto fosse alugado ou comprado de segunda mão. Entreguei a minha parte do relatório e voltei para minha mesa, de volta aos meus afazeres. Os dias seguiam normalmente, ou o que se pode chamar de normal para um trabalho em um banco. Exatamente duas semanas depois de voltar do Brasil sou chamado na sala do mr Caldwell. Com a educação de sempre ele pedeme para sentar. Sinto um pouco de tensão. Não tenho a menor idéia do motivo pelo qual fora chamado. Não poderia ser uma demissão. Poderia ser uma promoção. Mais um projeto no coração da África? Talvez. Conseguia relaxar um pouco olhando pela janela. Via os edifícios de Manhattam e as pessoas lá embaixo. Como de costume Mr. Caldwell começou a conversa com algum rodeio. Elogiou o meu trabalho, fez alguns comentários relembrando o trabalho da África do Sul e como eu conduzi os trabalhos no Brasil. Agradeci pelos elogios, mas não tinha a menor idéia onde esta conversa chegaria. Coube até uma breve divagação filosófica a respeito das semelhanças e diferenças entre os países da América do Sul e África. Algo bem superficial e com um viés preconceituoso. Finalmente ele entra no assunto.
É um convite para gerenciar a divisão de securitização no Brasil. Uma honra para mim. Na verdade convite é um eufemismo, não haveria como recusar, nem eu queria. Receberia uma promoção, com um conseqüente aumento no salário. A emoção foi tão grande que mal conseguia falar. Na verdade aquela viagem fora um teste. Um teste para mim e para os meus colegas. Todos foram avaliados e eu fora o escolhido. Voltaria para o país como um vitorioso.