7 minute read

Em Rede

Next Article
Segurança

Segurança

O 5G será uma “nova corrida do ouro” para os provedores regionais

Em 1948, o jornal New York Herald publicou uma notícia sobre a descoberta de ouro no rio South Fork American na Califórnia. Instantaneamente, em um movimento frenético contra o tempo, milhares de pessoas se deslocaram para a região com o objetivo de desbravar o garimpo, maximizando a vantagem da busca antecipada do metal valioso enquanto a concorrência ainda era relativamente baixa e a oferta abundante.

No lastro desta corrida, muitas oportunidades que pareciam ser menos “reluzentes” acabaram por se tornar também negócios extremamente lucrativos. O preço de uma bateia (bacias usadas no garimpo) subiu de US$ 20 centavos para US$ 15 em questão de dias. Um alfaiate local criou uma calça de tecido grosso e com rebites para aguentar o trabalho pesado de mineração, e aliado a um imigrante chamado Levi Strauss começou a produzir o produto em escala. A população não indígena da Califórnia na época era de 10 mil pessoas e em pouco tempo 300 mil imigrantes chegaram à região. Logo, mais infraestruturas precisaram ser construídas, como a primeira ferrovia transcontinental a unir as costas leste e oeste, batizada de Golden Spike (‘Cavilha de Ouro’). A partir daí, vários setores, como varejo, manufatura e serviços acabaram por proliferar seus negócios e pavimentaram o caminho que desenvolveu aquele estado, cujo PIB atualmente é de US$ 3,4 trilhões, mais que o dobro do Brasil.

É imperioso considerar, contudo, que na corrida do ouro vários processos foram feitos de forma desordenada. A falta de planejamento, estruturas deficitárias, restrições logísticas, regras de mercado não claras, entre outros aspectos, trouxeram reflexos negativos aos negócios e à população em âmbitos econômicos, sociais e ambientais.

O objetivo deste artigo é traçar um paralelo no qual a tecnologia 5G representa uma nova “corrida do ouro” para os provedores regionais, especialmente em localidades mais afastadas com coberturas de

conectividade ainda limitadas. Nessa metáfora, o ouro representa o cliente final, a ser conquistado pelos ‘donos’ do acesso. Mas esta conquista pressupõe infraestruturas muito mais amplas e necessárias ao provimento dos serviços, como as ferrovias no exemplo californiano, e que também surgem como oportunidades laterais de negócios. Um dos aspectos potenciais mais relevantes é o uso da rede de fibra óptica já existente como meio de transporte, de forma a dar vazão ao enorme volume de dados que será gerado. É preciso ressaltar que o 5G não vem substituir o acesso em fibra óptica, e sim preencher algumas lacunas, desde cobertura até aplicações, em uma relação colaborativa que beneficia os clientes e amplia perspectivas de crescimento do mercado para ambas as tecnologias.

O termo 5G acaba sendo utilizado de maneira indiscriminada, o que frequentemente gera uma confusão sobre o que realmente representa. Ele não é somente uma evolução de velocidade em relação ao 4G/4,5G, mas um novo conceito que incorpora uma série de características únicas, as quais permitirão oferecer serviços que eram inviáveis na tecnologia anterior. A figura 1 descreve resumidamente oito destas especificações e algumas diferenças de performance comparadas.

No aspecto regulatório, a Anatel classifica atualmente duas classes de prestadores de serviço que podem se beneficiar dos avanços do 5G. • SMP – Serviço Móvel Pessoal – Tratase dos telefones celulares pessoais, cujas aplicações fundamentais são de voz e acesso à Internet móvel. Nessa categoria, as licenças 5G de espectro foram leiloadas em novembro de 2021, e a implementação comercial ainda está em andamento. Várias faixas de frequência foram leiloadas (700 MHz, 2,5 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz), com abrangências geográficas nacionais ou regionais. • SLP - Serviço Limitado Privado Orientado principalmente a aplicações IoT - Internet das Coisas, desde

Esta seção aborda aspectos tecnológicos das comunicações corporativas, em especial redes locais, mas incluindo também redes de acesso e WANs. Os leitores podem enviar suas dúvidas para Redação de RTI, e-mail: inforti@arandanet.com.br. Fig. 1 – Oito especificações diferenciais do 5G

Fig. 2 – Diagrama simplificado de arquitetura de rede 5G

manufatura até agronegócio, e cujas áreas de cobertura geográfica são geralmente bem mais restritas. Nesse modelo, a arquitetura de implementação é por Redes Fixas sem Fio (FWA), nos quais os dispositivos têm limitada ou nula capacidade de deslocamento, em contraste ao SMP.

Com efeito, os provedores regionais podem se beneficiar de oportunidades nestas duas classes de serviços, com enfoques de atuação diferentes, atendendo diretamente os clientes, na condição de SLP, ou também antecipando infraestrutura de fibra para interconexão do SMP. Aqueles que se prepararem mais cedo terão vantagens competitivas, tal qual ocorreu com o FTTx, em explorar oportunidades de descentralização, em complementariedade às grandes operadoras, que em geral focam inicialmente nos principais centros. Levantamento da IDC Brasil apontou críticas em relação ao cronograma do 5G no Brasil feito pela Anatel. Segundo o estudo, as empresas entendem que o calendário ficou mais favorável ao consumidor do que focado nos interesses dos negócios, como nas áreas de manufatura, mineração, agronegócio e turismo.

Em relação à arquitetura, de forma muito simplificada, a rede 5G tem o modelo descrito na figura 2, no qual as estações de rádios (RAN - Radio Access Network) estão conectadas a um núcleo (core) que faz o gerenciamento dos dispositivos de rede e conectividade com a Internet. Os equipamentos de usuário (UE, sejam eles pessoas, dispositivos ou sensores) comunicam-se com as estações de rádio em frequências definidas. Conforme já mencionado, o 5G engloba características técnicas bem mais amplas que o 4G e o 4,5G, e a diversidade de frequências de operação trará consequentemente equipamentos e implementações bastante distintas. A volumetria de usuários por área, velocidade de tráfego de dados, distância entre estações de rádio, modelos dos terminais, características das antenas e dimensionamento do x-Haul (front, middle e backhauls) são apenas alguns aspectos a considerar na estratégia de projeto e implementação dos serviços.

Considera-se fundamental levar em conta os seguintes pontos nessa estratégia: • No 5G, as redes precisam de alocação de espectro inteligente e automática. Para que tudo funcione de uma maneira adequada, os investimentos deverão incluir uma revisão completa da arquitetura e topologia de rede, passando pelo x-Haul, equipamentos de core e sites de agregação.

• As redes definidas por software (SDN) e a virtualização das funções de rede (NFV) também terão um papel fundamental nessa jornada. São elas que irão possibilitar uma alocação mais flexível e automática de recursos, aproveitando as economias de escala baseadas em nuvem. • Os requisitos de sincronismo de rede são muito mais complexos e restritivos que os presentes no 4G e no 4,5G, o que requer padrões não disponíveis na maioria dos links típicos das conexões atuais. • Em geral, o espaçamento entre as estações de rádio 5G é mais curto, o que leva a uma demanda bastante grande por capilaridade em fibra necessária à conexão entre elas. • Aspectos de interoperabilidade são fundamentais para serviços flexíveis e evolução das redes. Quanto menos dependentes de soluções proprietárias, maiores são as possibilidades de compor arquiteturas de integração com outros fornecedores, sejam eles de equipamentos ou serviços, bem como possibilitar colaboração de compartilhamento de infraestrutura (um capítulo à parte, objeto do tema redes neutras). • Há uma fronteira muito tênue entre telecomunicação e tecnologia de informação, fazendo com que aspectos tradicionalmente não foco dos provedores e operadoras de serviços passem a compor o portfólio de projetos.

Diante do exposto e reforçando o aspecto da janela de tempo aos provedores regionais quanto ao tema 5G, destaco algumas oportunidades concretas de negócios: • Propor casos de uso práticos a clientes desatendidos, por exemplo oferta de FWA a fazendas agrícolas, mineradoras, portos, armazéns e indústria 4.0, todos mercados em franca expansão e especialização, demandadores de conectividade orientada à IoT. • Utilizar tecnologias com XGS-PON para fazer backhaul de estações rádio, já que permite links de até 10 Gbit/s simétricos. O “pulo do gato” aqui é compartilhar a estrutura de fibra existente em GPON, o que maximiza a rentabilidade de um ativo já investido. Nesse caso, o cliente passa a ser outra(s) empresa(s) que pretende(m) ofertar serviços 5G, usando redes de terceiros para conectar suas estações. • Oferta de soluções de valor agregado mais alto, muito além do acesso, e que sinergicamente interagem com a TI.

Em retrospectiva, há 1,5 século muitos garimpeiros ágeis na decisão fizeram literalmente fortunas, enquanto outros mais lentos penaram em explorar leitos de rios já exauridos. A informação, e consequentemente a necessidade de acesso a ela, é o mais importante ativo do mundo atual, tanto para pessoas quanto empresas. É um caminho sem volta e, portanto, aqueles que se anteciparem construir essa ponte de acesso colherão benefícios consideráveis.

O cientista Charles Darwin provou que na natureza aqueles que sobrevivem não são os maiores ou mais fortes, mas os que rapidamente se adaptam às mudanças. Os pequenos e médios provedores regionais que compreenderam bem isto no início do processo de implementação de fibras ópticas obtiveram muito sucesso.

O 5G apresenta uma nova fase de mudanças. Como você quer ser lembrado? Um garimpeiro ágil ou um explorador de leitos exauridos?

This article is from: