Fortaleza - CE 2018
Copyright ©2012 by Editora Armazém da Cultura Editora Albanisa Lúcia Dummar Pontes Administrativo Veridiana Silva Projeto gráfico, capa e editoração eletrônica Suzana Paz Assessora de Comunicação Mariana Dummar Pontes Revisão Vessillo Monte (Proibida a reprodução total ou parcial deste livro, por qualquer meio ou sistema, sem prévio consentimento da editora)
texto estabelecido conforme o novo acordo ortográfico da língua portuguesa
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Lima, Stélio Torquato Primas em cordel : versões rimadas de 12 clássicos da literatura universal / Stélio Torquato Lima ; ilustrações André de Miranda. -Fortaleza : Armazém da Cultura, 2012. ISBN: 978-85-63171-51-1 1. Literatura de cordel I. Miranda, André de. II. Título. 12-13089 CDD-398.2 Índices para catálogo sistemático: 1. Literatura de cordel : Folclore 398.2 1ª edição - 1ª Reimpressão - 2018
Todos os direitos desta edição reservados a Editora Armazém da Cultura Rua Jorge da Rocha, 154 – Aldeota Fortaleza – Ceará – Brasil CEP: 60150.080 Fone/Fax: (85) 3224.9780 Skype: armazem.da.cultura Site: www.armazemcultura.com.br E-mail: armazemdacultura@armazemcultura.com.br
Este trabalho tem por objetivo contribuir com a popularização, através do cordel, de textos consagrados pela tradição como obras de referência da literatura ocidental. Nessa perspectiva, selecionamos 12 obras-primas, as quais representam vários períodos literários, a saber: Período clássico: Ilíada (Homero), Odisseia (Homero) e Eneida (Virgílio); Período pré-renascentista: Divina Comédia (Dante Alighieri) e Decamerão (Giovanni Boccaccio); Período maneirista: Dom Quixote (Cervantes) e Romeu e Julieta (Shakespeare); Período romântico: Fausto (Goethe), O Corcunda de NotreDame (Victor Hugo) e O Médico e o Monstro (Stevenson); Período realista: Madame Bovary (Flaubert) e O Vermelho e o Negro (Stendhal). Dada a finalidade que nos levou à composição dos textos em cordel, é importante ressaltar que de nenhuma forma se pretende substituir a leitura das obras-fontes pelas versões em cordel aqui expostas. Antes, esperamos que nosso esforço motive o leitor a buscar os textos originais, neles observando toda a beleza e o apuro estético que os levaram a ser concebidos pela crítica especializada como obras-primas da literatura universal. O Autor
Ao Matheus, ao Lucas e ao Vinícius, meus filhos; À Eliana Carlos, minha esposa; Às minhas três Marias: a do Carmo (minha avó), a das Graças (minha mãe) e a José (minha sogra).
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(Homero)
Zeus era o maior exemplo Dessa minha afirmação: Vivia traindo Hera, De quem era esposo e irmão. Isso era causa de brigas E dos raios na amplidão.
Queira Deus que eu consiga Narrar com graça e esmero Os feitos do grande Aquiles, Herói afamado e fero Da grande epopeia grega, A Ilíada, de Homero.
Dessa forma, os doze deuses Do Olímpico Conselho Viviam sempre às turras, Brigando como um fedelho: Se um queria o azul, Outro queria o vermelho.
Na Grécia, existe um monte; Olimpo é denominado. Seu pico, por ser tão alto, Fica por nuvens tomado. Na crença do povo grego, Por deuses era habitado.
A inveja e a disputa Grassavam como moléstia: Brigavam Hefesto e Apolo; Hermes brigava com Héstia. Só havia ódio e contenda; Não se via ali modéstia.
Na mitologia grega, Deuses não eram perfeitos, Os habitantes do Olimpo Tinham vícios e defeitos. Assim, eram como nós, “Humanos” e imperfeitos.
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Cada deus alimentava Inveja pelos seus pares. Assim era com Deméter, Com Atena e com Ares, Com Ártemis e Afrodite E Posêidon, deus dos mares.
Aquele ardil de Discórdia Teve pronto resultado: As deusas que ali estavam, Com o orgulho afetado, Julgavam ser inconteste Donas do pomo dourado. Logo se instaurou ali Uma terrível discussão, E o Olímpico Conselho Foi palco de confusão. Discórdia, então, sorridente, Retirou-se do salão.
Um dia, houve uma festa (Tétis casou com Peleu!). Para esse rega-bofe, Que no Olimpo ocorreu, Cada um dos deuses todos Um convite recebeu. Porém, a deusa Discórdia, Por um óbvio motivo, Foi posta fora da lista Daquele evento festivo, E isso acirrou na deusa Um instinto vingativo.
Só havia uma forma De a intriga cessar: Seria definir logo Quem deveria ficar Com o pomo que Discórdia Trouxera para o lugar. Mas aquele julgamento Era tarefa arriscada, Pois todos eles sabiam Que a deusa não votada Seria então, do votante, Inimiga declarada.
Logo no primeiro encontro Do Conselho imortal, Discórdia foi ao Olimpo Com um projeto fatal E cujo desdobramento Teria um fecho letal. Sobre uma mesa, frente aos deuses, Lançou um pomo de ouro E disse: “Para a mais bela, Reservei este tesouro, Pois a beleza é um dom Precioso e duradouro”.
Pra resolver o problema Que aos deuses, então, aterra, O mensageiro dos deuses É enviado a Terra. A Hermes cabia achar Alguém pra pôr fim à guerra. 10
É então que ao pastor Páris Cabe a ingrata missão De eleger a mais bela Entre as deusas em questão. Ficaria, assim, com ele O ônus da eleição.
Páris era apaixonado Pela bonita Helena. Por isso, deixou de lado Os dons de Hera e Atena. Seu voto foi pra Afrodite, Cujo dom valia a pena. Afrodite foi eleita A mais bela imortal, E Páris roubou Helena, Mulher do rei Menelau: Eis a origem da guerra, A do cavalo de pau.
Pra garantir a vitória, Afrodite, Atena e Juno, Todas elas em segredo E malícia de gatuno, Vão subornar o juiz Em um momento oportuno. Juno, deusa dos impérios, De Hera também chamada, Promete fazer de Páris Rei de fortuna invejada, Desde que ele a escolhesse Na eleição programada.
Pois acontece que Páris Não era um mero pastor: Seu pai chamava-se Príamo, Rei de prestígio e valor Da mui afamada Troia, Terra de grande esplendor. Essa filiação real Era a ele novidade: Páris cria que pastores Eram seus pais de verdade: Eles o tinham criado Desde a mais tenra idade.
Pouco depois, vem Atena, Deusa da sabedoria. Promete que o pastor Páris Um grande sábio seria Se ele a indicasse Na eleição que haveria. Por fim, lhe chega Afrodite, Eterna deusa do amor. Oferta, em troca do voto, Fazer dele um sedutor: Da mulher que ele quisesse, Se tornaria o senhor.
Páris fora abandonado Num bosque para morrer, Pois um profeta previra: “Troia irá padecer Por causa deste menino Que acabou de nascer”. 11
Um pastor que então passava Ouve o menino a chorar. Tomando o bebê pra si, Levou-o para seu lar. E, assim, Páris cresceu Sem nada desconfiar.
No Estige, rio famoso, Tétis o filho banhou. Isso o fez invulnerável, Exceto onde não molhou. Ou seja, nos calcanhares, Onde a mãe o segurou. Outro herói mui afamado Da troiana expedição Foi o valoroso Ulisses, Mestre da persuasão, Pai do cavalo de pau, Sua grande criação.
Agora, ao saber ser filho De um rei forte e poderoso, Páris seguiu para Troia Com seu troféu precioso, Que era a bela Helena, Dona de olhar gracioso. Mas tinham os reis da Grécia Um acordo bem selado: Eles se aliariam Se um deles fosse atacado. Assim, o rei espartano Foi por todos apoiado.
Com Ulisses e Aquiles, Os gregos tinham vantagem: Eram duas excelências, O ardil e a coragem. Os dois se complementavam, Dando aos gregos boa margem. Foi assim por nove anos Naqueles campos de luta: As vitórias se seguiam Como prêmio de disputa, E, assim, a hoste grega Grandes vitórias computa.
Então Troia se tornou Inimiga ao povo grego. Este, sedento de sangue, Como um horrendo morcego, Partiu em vários navios, E acabou-se o sossego. Estava entre os gregos Que cruzavam o Egeu, O filho da deusa Tétis E do grande rei Peleu. Aquiles era o nome Do herói que cito eu.
Mas um dia, Agamenon, Dos gregos o comandante, Tomou Briseida de Aquiles, Sua escrava e amante. Este negou-se a lutar Daquele dia em diante. 12
Sem a força de Aquiles, Sobreveio o fracasso: A derrota era frequente E o êxito escasso. Mortos se multiplicavam Como estrelas pelo espaço.
Mas a coragem de Pátroclo E o seu desprendimento São inúteis no combate, Que é bastante sangrento. E o saldo da luta atroz É o seu falecimento. Bem longe de sua pátria, Pátroclo queda sem vida. A dor cobre a hoste grega Ante perda tão sentida. E a noite veste de luto A tropa tão comovida.
No acampamento grego, Também a peste grassava, Que, enviada por Apolo, Muitos guerreiros ceifava. Essa terrível notícia Os troianos alegrava. Agamenon, perturbado, Pede que Ulisses o acuda Para convencer Aquiles A lhe prestar sua ajuda. Mas a Aquiles não comove, E a situação não muda.
Foi Heitor, irmão de Páris, Que matou o jovem fino. Assim, o bravo troiano Selaria seu destino. Pois pagaria com a vida O ato que ora discrimino. Ao saber do fim do amigo, Aquiles se enche de dor. Mas logo lhe chega a fúria E da vingança o sabor: Para vingar seu amado, Cabe dar fim a Heitor.
Seguem-se as derrotas gregas, E a grande mortandade. Ambas, a peste e a guerra, Ceifam almas sem piedade. Muitos filhos de guerreiros Conhecem a orfandade. Um fato, porém, altera O curso da narração: Pátroclo, por quem Aquiles Nutria grande afeição, Veste os trajes do herói E pro embate segue então.
Tétis, a deusa marinha, Ante esse intento obscuro Que dominava Aquiles, Guerreiro forte e maduro, Se dirige até o filho E lhe fala do futuro: 13
“Filho, só tens dois caminhos Para a tua trajetória: Vida longa e conforto, Mas sem honra e sem glória, Ou uma existência curta, Mas eterna na História”.
Depois desse ato cruel, Levou pro acampamento O corpo ao qual negava Digno sepultamento, Pois a aves agoureiras O dava por alimento. Tais sombrios pensamentos Punham o herói absorto. Mas, de súbito, lhe chega O pai do troiano morto: O próprio rei, em pessoa, Vinha a buscar conforto:
Aquiles, sem hesitar, Mostrou seu desiderato: “A uma existência longa, Mas presa ao anonimato, Prefiro a breve, se os homens Me eternizarem de fato”. Assim, dois grandes guerreiros, Um grego e outro troiano, Bateram-se num duelo Sangrento e desumano. No final, só um vivia: Aquiles, o soberano.
“O cadáver de meu filho Lhe peço, por piedade. Respeite a dor de um pai A quem a tristeza invade. Quero enterrar meu filho Com toda a dignidade”. As lágrimas do troiano Fazem Aquiles lembrar Que Peleu, seu nobre pai, Nunca o irá sepultar. Por isso, atende o pedido Que o rei veio apresentar.
Ante o corpo de Heitor, Aquiles disse pra si: “Pátroclo está vingado, O seu matador venci. Que os deuses lhe reservem Um lugar melhor que aqui”. Mas, no coração de Aquiles, Ainda a fúria se abriga. Por isso, tomou o corpo E, prendendo-o a uma biga, Arrastou-o ante os muros Da cidade inimiga.
Mas depois do belo gesto Do herói nobre e viril, Mais sangrenta do que nunca, Recomeça a guerra vil, A cruel carnificina Sob o manto azul de anil. 14
(profstelio@ufc.br) nasceu em Fortaleza, em 08 de outubro de 1966. É doutor em Letras pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Iniciou a carreira docente em 1995, na Universidade do Estado Rio Grande do Norte (UERN), em Mossoró, RN, como professor de Teoria Literária. Foi também professor de Literaturas de Línguas Vernáculas na Universidade Estadual do Ceará (UECE). Atualmente, é professor de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa na Universidade Federal do Ceará (UFC), onde coordena o Grupo de pesquisa “Literatura Popular em Versos”. Recentemente, seu cordel “Lógikka, a bruxinha verde” foi uma da obras selecionadas no Prêmio Mais Cultura, promovido pelo Ministério da Cultura.
(André Luiz Pinto de Miranda) Rio de Janeiro, RJ, 1957 Brasil.
Trabalha e reside no Rio de Janeiro – RJ – Brasil. Gravador, pintor, desenhista, ilustrador e arte educador. Iniciou sua atividade artística em 1975, no Rio de Janeiro. Estudou desenho e pintura com Jemile Diban e Maria Cecília de Castro Pinto, xilogravura com Ciro Fernandes, Marcelo Soares, J. Borges e Anna Carolina, e gravura em metal com Marcelo Frazão e Heloísa Pires Ferreira. Estudou Desenho de Artes Gráficas e Desenho de Propaganda no SENAI/RJ. Já realizou mais de 120 exposições individuais e coletivas tanto no Brasil como no Exterior. Recebeu diversos prêmios ao longo de sua carreira, entre os principais: 2011 — Menção Especial na 5ª Bienal de Gravura Olho Latino, 2004 — 9º Premi Internacional de Grabado — Premi el Caliu 2004 — Olot, Espanha, 2003 — 8º Premi Internacional de Grabado — Premi el Caliu 2003 — Olot, Espanha – (premio aquisitivo). Possui obras em importantes acervos de museus no Brasil e dos seguintes países: Suécia, Macedônia, Japão, Romênia, China, Itália, França, Espanha, Argentina, Bulgária e EUA. e-mail: mirandart@gmail.com
Esta obra foi composta em Goudy Old Style e Peixe Frito, impressa sobre o papel couchê fôsco 120 g/m2 para a Editora Armazém da Cultura em jnaeiro de 2018. Impressa na Gráfica LCR.