Renata Pereira Navajas Mancilha Barbosa

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TRILHANDO CAMINHOS CONHECIDOS DA CIDADE SOB NOVOS OLHARES DE CRIANÇAS Renata Pereira Navajas Mancilha

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Resumo: Este artigo relata um trabalho de mediação cultural sobre o patrimônio histórico arquitetônico de São José dos Campos, no interior paulista. Foi realizado com alunos de Ensino Fundamental acompanhados e observados no decorrer de visitas aos principais pontos do acervo cultural da cidade. A pesquisa permitiu despertar nos sujeitos o interesse pela descoberta da tradição histórica e cultural que se revela nos espaços públicos de uma cidade. Os alunos participantes construíram mapas pessoais evidenciando os locais ou aspectos que se destacassem, sob o seu ponto de vista, como patrimônio cultural da cidade. Reuniu -se os mapas pessoais, construindo-se um coletivo. A metodologia da pesquisa foi de abordagem qualitativa, realizada por meio de pesquisa de campo, que possibilitaria uma relação de interdependência e dinamismo entre o sujeito e o mundo real. A pesquisadora fez, durante os passeios culturais, intervenções espontâneas, conforme as oportunidades surgidas. Os alunos puderam observar tudo a seu modo, isto é, não havia roteiros de observação impostos, nem questionários a serem respondidos. O objetivo era proporcionar o contato dos sujeitos com os locais e com as produções artísticas ali encontradas, de forma livre e espontânea, e, antes de qualquer informação sobre essas produções, o que se pretendia era investigar o olhar das crianças para as produções, a partir das suas próprias referências. Por meio da construção dos mapas pessoais e da montagem do mapa coletivo os alunos fizeram um exercício do olhar, demonstrando interesse, ampliando visão de mundos e seus conhecimentos ao se envolverem com as questões ligadas ao patrimônio histórico e cultural da sua cidade. Palavras-chave: Patrimônio histórico. Mediação cultural. Memória.

1. Introdução Como aluna do Programa de Pós-Graduação da Universidade Mackenzie eu me vi diante do desafio de participar de uma pesquisa coletiva para a realização de uma ação mediadora sobre patrimônio cultural da cidade de São Paulo. O primeiro entrave foi residir em São José dos Campos, fora da capital de onde são todos os demais pesquisadores, colegas da Pós- graduação. Tendo obtido permissão de realizar a pesquisa na cidade de São José dos Campos, onde eu moro , foi vencido o obstáculo inicial e passei para a próxima etapa, que foi a proposta de construção de mapas pessoais que colocassem em evidência locais ou aspectos que se destacassem como patrimônio cultural da cidade. Para a construção dos mapas pessoais foi necessário estabelecer alguns objetivos. Entre eles estão o desenvolvimento do exercício do olhar dos sujeitos da pesquisa, a

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Professora da rede pública e a luna do Programa de Pós-Graduação da Universidade Mackenzie, no curso de Educação, Arte e História da Cultura. 75 Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, São Paulo, Brasil. 9 , 10, 11 de outubro de 2012 – ISBN: 978-85-62309-06-9


necessidade de lhes apresentar, por meio de visitas, os espaços privilegiados da cidade onde moram, observar

o interesse e o envolvimento que esses sujeitos pudessem ter,

intensificando, assim, suas relações com o patrimônio histórico e cultural da sua cidade. Determinados os objetivos, foram planejados os passos para a realização da pesquisa. Com uma abordagem qualitativa, que me possibilitaria uma relação de interdependência e dinamismo entre o sujeito, o mundo real e ele próprio, foi escolhida a técnica da pesquisa de campo e planejei visitas à espaços tidos como patrimônio cultural de São José dos Campos. Delimitei o espaço urbano da cidade e defini alguns locais tombados como patrimônio pela lei municipal para as visitas e investigação. Escolhi os sujeitos da pesquisa: três crianças do Ensino Fundamental, na faixa etária compreendida entre nove e treze anos de idade A escolha dos locais se deu a partir de uma pesquisa no site oficial da cidade, através do qual as crianças tomaram conhecimento da existência de vários lugares e escolheram alguns: Parque Vicentina Aranha, Museu de Arte Sacra, Parque Burle Marx, e o Museu do Folclore também situado no Parque Burle Marx . As visitas ao patrimônio Cultural de São José dos Campos ocorreram em quatro sextas- feiras no período da tarde, no mês de outubro de 2011. Durante esses passeios culturais minhas intervenções foram feitas de modo natural. Optei por deixá- los observarem tudo a seu modo, isto é, não havia roteiros de observação impostos, nem questionários a serem respondidos. A idéia era a de proporcionar o contato das crianças com os locais e com as produções artísticas ali encontradas, de forma livre e espontânea, e, antes de qualquer informação sobre essas produções, o que se pretendia era investigar o olhar das crianças para as produções, a partir das suas próprias referências. Em sintonia com o pensamento de Larrosa, que afirma a importância de gestos de interrupção como “... parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais devagar, escutar mais devagar, parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes” (Larrosa, 2004, p. 160 e 161) para que algo nos aconteça ou nos toque, durante as visitas, havia abertura para as perguntas que surgissem das crianças, para esclarecimento de alguma dúvida, para seus comentários pessoais, sendo que estes eram sempre valorizados, e também para os seus silêncios diante do que observavam.

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Essa postura foi importante para desenvolver o pensamento estético das crianças, pois o intuito maior era estabelecer possíveis relações dos sujeitos com um conhecimento que faz parte da sua identidade, do seu entorno.

2. São José dos Campos: um pouco da sua história Segundo informações colhidas no site oficial da cidade de São José dos Campos 2 houve uma formação de povoado por volta do ano de 1630, inicialmente

como aldeia,

organizada pelo jesuíta Leon, que veio com a missão francesa para catequizar os índios guaianazes, que viviam na região. Nessa época sua economia era basicamente agrícola voltada para as plantações de café e algodão. Posteriormente, em 1767, passa à categoria de cidade e, devido ao clima ameno, ficou conhecida como a cidade dos „‟bons ares‟‟, fato que proporcionou a construção, entre outros,

do Sanatório Vicentina Aranha, sob a

responsabilidade da Santa Casa de Misericórdia da cidade de São Paulo, com o objetivo de tratar os tuberculosos, muito comuns naquela época. O decreto 7007 de 12 de março de 1935 oficializou São José dos Campos, como „‟Estância Climática‟‟. Por volta de 1940 a 1950 houve a construção da rodovia Preside nte Dutra que atravessa toda a cidade e em 1940 houve a construção do Centro Técnico Aeroespacial (CTA) que impulsionou o processo de industrialização. Atualmente é uma cidade moderna, conforme se pode ver pela Figura 1, a seguir, constituindo-se um importante tecnopolo industrial do país, destacando-se pela produção de material bélico, metalúrgico, têxtil, cerâmico, e também como sede do maior complexo aeroespacial da América Latina, com importantes centros de ensino e pesquisa aeroespacial.

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FIGURA 1: Vista aérea parcial de São José dos Campos FONTE: site oficial da Prefeitura de São José dos Campos. SP

A cidade de São José dos Campos, localizada no Vale do Paraíba, possui grandes áreas arborizadas, boas oportunidades de entretenimento e

mesmo se desenvolvendo

rapidamente ainda guarda características das cidades pequenas do interior, pois há bairros que comemoram as festas dos padroeiros com quermesses, jogos de bingo, comidas típicas e procissões ao redor da igreja. É típico dessa cidade ter um especial respeito à preservação de sua herança cultural e histórica. Há nela uma tendência de transformar locais diversos, construídos para finalidades também diversas, em espaços de acesso à Arte, ou seja, em patrimônios culturais. Os locais tombados como patrimônio cultural da cidade, exceto a Biblioteca Municipal, contam com o trabalho de um monitor que é alguém formado pela Fundação Cultural Cassiano Ricardo, com a responsabilidade de apresentar as informações históricas sobre os locais aos visitantes.

3. O desenrolar da pesquisa Indubitavelmente a curiosidade foi o elemento decisivo na escolha, pelas crianças, dos locais a serem visitados. Visitando o site oficial do município, elas foram tomando conhecimento do acervo histórico da cidade e ficaram muito entusiasmadas. Como eram muitos os locais, foi preciso eleger 5 entre eles para serem visitados. São eles:

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3.1 Museu de Arte Sacra, situado no centro da cidade ao lado do Mercado Municipal. De acordo com as informações oferecidas pelo monitor o prédio que abriga atualmente o museu trata-se de uma capela construída em estilo neoclássico por volta de 1908, como se pode observar na figura 2, a seguir:

FIGURA 2: Capela Nossa Senhora Aparecida, que abriga o Museu de Arte Sacra. FONTE: foto da pesquisadora

Essa capela foi importante espaço de negociação para os trabalhadores que vinham da roça e traziam suas mercadorias para vender no mercado. Eles aproveitavam para rezar na capela e oferecer água aos cavalos, no bebedouro do lado dela. A antiga igreja de Nossa Senhora Aparecida foi tombada por lei municipal e atualmente faz parte do patrimônio histórico da cidade. Em seu interior estão expostas belas obras sacras que compõem um acervo de cinquenta peças de arte dos séculos XIX e XX como bandeiras de procissão, imagens de santos confeccionadas em madeira e gesso policromado, ostensórios, vestimentas litúrgicas, fotos de procissão e de festas religiosas, baldaquinos de metal e banhados em prata, livros, etc. sendo que todas as peças são acompanhadas de p ainéis explicativos. São José dos Campos é uma cidade de fortes influências religiosas marcada por um calendário católico que enfatiza comemorações tais como: Festa de Santa Cruz, Festa do Divino Espírito Santo, Festa de Santana entre outras.

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As crianças participantes da pesquisa nunca tinham ido ao museu e ficaram surpreendidas com a existência de tantas obras antigas e sacras numa cidade totalmente moderna e industrializada. Dentre as peças apreciadas no interior do museu, as que mais chamaram a atenção das crianças, justificando a foto mostrada como Figura 3, abaixo, foram as batinas e os vestuários sacerdotais para celebrações, expostas no segundo andar da capela. De acordo com a crença popular, confirmada pelo monitor da capela, um padre teria realizado um milagre vestido com uma daquelas batinas.

. FIGURA 3: Vestes litúrgicas FONTE: Foto da pesquisadora

Um dos sujeitos da pesquisa disse literalmente: – Que “da hora”! Tem tipo guardaroupa de padre dentro do vidro! (Sujeito 1- 9 anos). Após a visita ao museu, as crianças ficaram encantadas com a existência de tantas peças religiosas e, um dos sujeitos da pesquisa, de tão encantado, disse que convidaria a sua avó para visitar o museu. Aqui se configura uma ação mediadora de um dos sujeitos, quando envolve, mesmo que de forma indireta, em intenção, outras pessoas a participarem do conhecimento que ali foi possível construir. Outro sujeito mencionou seu interesse pelos painéis explicativos e ficou espantado com a história da vida de uma santa que ficou durante muitos anos presa em uma torre e era filha de pais muito ricos. A criança acreditava que a vida dos santos fosse diferente da vida das pessoas comuns e que não tivesse tanto sofrimento. Como santa, ela não poderia ter ficado presa, segundo o menino. 80 Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, São Paulo, Brasil. 9 , 10, 11 de outubro de 2012 – ISBN: 978-85-62309-06-9


Na saída do museu já no caminho para casa o Fred bem entusiasmado disse : – Nunca que eu ia vir no museu de Arte Sacra, nem pensava que tivesse esse lugar na cidade”. (Sujeito 2- 10 anos ).

3.2 Biblioteca Municipal A Biblioteca Municipal, diferentemente dos demais espaços administrados pela Fundação Cassiano Ricardo, conta com funcionários que atendem ao público para entregar os livros solicitados. Nela são desenvolvidos projetos de oficinas de histórias e de confecção de fantoches, máscaras relacionadas aos temas do folclore, carnaval, Monteiro Lobato entre outros, sendo coordenados pela professora Maria José Nóbrega, artesã joseense. Porém, o referido trabalho não está relacionado com as obras de Cassiano Ricardo e também não há nenhum vínculo deste com a Fundação Cultural, sendo um projeto interno da Biblioteca Municipal. O prédio é histórico e foi construído para ser teatro em 1910. Depois de reformas passou a ser utilizado para sediar a Biblioteca Municipal que homenageia o poeta e escritor joseense Cassiano Ricardo. Ele foi membro da Academia Brasileira de Letras. Sua obra foi influenciada por costumes rurais, pois quando pequeno adorava ler e percorrer a pé as margens do Rio Paraíba, que atravessa o território joseense. Era tímido e pouco brincava. Escritor com grande projeção nacional dirigia jornais e revistas. Foi, poeta, ensaísta e memorialista, porém o destaque maior da sua obra é para a poesia.

FIGURA 4: Fachada atual da Bib lioteca Municipal, localizada no centro da cidade de São José dos Campos FONTE: Foto da pesquisadora. 81 Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, São Paulo, Brasil. 9 , 10, 11 de outubro de 2012 – ISBN: 978-85-62309-06-9


As crianças se encantaram com as poesias do escritor e pediram à estagiária um exemplar do caderno de poesias dele, disponível na Biblioteca. Essa visita, além de muito divertida, proporcionou muitos conhecimentos sobre a vida e a obra do autor e, mesmo que algumas informações literárias não tenham ficado muito claras, foi muito válido e enriquecedor conhecerem sobre um escritor nascido em São José dos Campos. Após a visita, ao chegar em casa um dos alunos participantes, espontaneamente, escolheu uma poesia de Cassiano Ricardo e fez uma ilustração bem divertida sobre ela. – “Puxa! Eu sabia que tinha esse escritor, mas não tinha ouvido falar que ele era nascido em São José dos Campos. Achei legal isso de ter “um cara” famoso aqui”. (Sujeito2, 10 anos).

FIGURA 5: Ilustração de poema feita por u m dos sujeitos da pesquisa FONTE: foto da pesquisadora

3.3 Parque da Cidade Burle Marx O Parque da Cidade fica localizado no bairro de Santana e é mais conhecido como parque „‟Burle Marx‟‟, considerado importante e belíssimo patrimônio turístico histórico, e cultural da cidade.

O Parque abrange

uma extensão de um milhão de metros quadrados

em área verde e pertenceu à família Gomes que veio de São Paulo para administrar a antiga Tecelagem Parahyba, fábrica de brim e de cobertores, situada dentro do parque. Após o acordo entre o Estado e o Município a propriedade passou a ser pública em troca de pagamento de dívidas da família Gomes para com o Estado, que repassou a 82 Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, São Paulo, Brasil. 9 , 10, 11 de outubro de 2012 – ISBN: 978-85-62309-06-9


propriedade para a prefeitura, a qual interessou-se pela área. Atualmente, o prédio da antiga fábrica de cobertores foi reformado e abriga a Secretaria de Cultura e o Instituto de Saúde Pública do Estado de São Paulo.( IAMSP). Primeiramente a família morou na casa da sede, algum tempo depois nasce Olívio Gomes em 1949 – arquiteto modernista que é considerado uma das principais referências para compreender o modernismo brasileiro. O arquiteto foi responsável pela construção da residência familiar e sua obra promove elementos inovadores com soluções arquitetônicas que remontam às antigas fazendas coloniais. A residência tem sido utilizada, temporariamente, para sediar cursos e palestras para empresas. O artista plástico Roberto Burle Marx (1909-1994) ficou conhecido por projetos artísticos e trabalhou juntamente com Olívio Gomes na construção da casa da família, bem como executou importantes obras ao lado de Niemyer e foi responsável por todo o projeto paisagístico da propriedade onde hoje se situa o Parque.

FIGURA 6: Jardim da residência da família Go mes, localizada dentro do Parque da Cidade. FONTE: foto da pesquisadora

As informações sobre o local estavam dispostas em painéis explicativos espalhados pelo parque. O grupo que acompanhava a pesquisadora foi autorizado a visitar o interior da casa sede, embora esta estivesse fechada para visitantes. A única restrição feita foi a de não tirarmos fotografias no interior da residência nem da parte externa da casa. Assim, ilustra-se essa visita com a Figura 6, apresentada acima. 83 Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, São Paulo, Brasil. 9 , 10, 11 de outubro de 2012 – ISBN: 978-85-62309-06-9


Maravilhados com a beleza e tamanho do parque as crianças comentara m sobre o trabalho do arquiteto: –“Nossa! Nunca pensei que o arquiteto fizesse tanto trabalho legal porque é uma profissão que a pessoa é meio jardineiro, engenheiro e projetista. Talvez eu queira ser arquiteto”. (Sujeito 3- 13 anos). A partir da fala do aluno é possível refletir na importância de propiciar ações educativas que abram possibilidades de conhecimento sobre Arte, Cultura, História, profissões e escolhas futuras. Neste sentido

a mediação

está atrelada a

uma

interdisciplinaridade de informações sobre diferentes assuntos.

3.4 Museu do Folclore O Museu do Folclore está localizado na antiga residência da família Gomes construída em estilo arquitetônico neocolonial, expressado por elementos como o tijolo de barro no revestimento, cobertura com telha cerâmica e refinado acabamento interno. A temática do museu é o homem e a sua cultura e tem por objetivo atender as camadas mais amplas da sociedade e reconhecer a importância das diversas culturas para aprender e ensinar a respeitar a diversidade. Na ótica da organizadora, o museu ajuda o homem a viver a globalização sem perder a sua identidade. Nesse espaço foram encontradas poucas informações sobre a cidade, apenas peças confeccionadas em argila por artistas desconhecidos, máscaras, bonecões e roupas utilizadas nas festas de Folias de Reis em comemoração ao Divino Espírito Santo. A informação mais relevante para as crianças foi conhecer sobre a Santa Perna, que pode ser observada na Figura 7, apresentada a seguir. Conforme contam os antigos, a imagem teria sido encontrada na beira de um rio no bairro do Jaguari. A perna era milagrosa, de acordo com a crença do povo, conforme informou a funcionária do museu que atendeu ao grupo, pois curava feridas. Ao lado da imagem estavam as mensagens de agradecimentos das graças alcançadas pelos fiéis.

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FIGURA 7: Sala do Museu do Folclore de S. J. dos Campos. SP - Santa Perna, no canto inferior esquerdo, ao lado de mensagens dos seus devotos FONTE: Foto da pesquisadora

A comida e os sistemas alimentares fazem parte da identidade e cultura de um povo e a funcionária do Museu informou que a comida típica da cidade é o bolinho caipira, preparado com carne crua no recheio e massa de farinha de milho, depois frito em óleo bem quente. No momento da visita não havia comida típica para ser servida, mas apenas informações sobre elas. O Museu do Folclore tem um programa chamado Museu Vivo e Cultura Popular Expressão da Identidade no qual pessoas da comunidade expõem de maneira prática se us saberes (saber- fazer) nas tardes de domingo. Assim, o tradicional bolinho caipira, o bolo de fubá, a taiada- doce feito com caldo de cana e farinha de mandioca – são feitos na presença dos visitantes e consumidos por eles.

3.5 Parque Vicentina Aranha Segundo as informações obtidas com funcionários no local, por volta de 1914, o Hospital Central de São Paulo não dava conta de atender ao alto número de vítimas da 85 Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, São Paulo, Brasil. 9 , 10, 11 de outubro de 2012 – ISBN: 978-85-62309-06-9


enfermidade pulmonar conhecida como tuberculose e Dona Vicentina de Souza Aranha, ilustre dama da sociedade paulista, que dedicava sua vida à luta contra aquela doença, organizava muitas quermesses no Jardim da Luz para arrecadar recursos para a construção de um sanatório. Foi então que a Santa Casa de São Paulo, em acordo com a municipalidade de São José dos Campos adquiriu uma Chácara para a edificação do hospital, mas, Dona Vicentina faleceu de tuberculose antes de a construção ficar pronta e o seu marido propôs que fosse dado o nome da esposa ao hospital. A construção foi do arquiteto e engenheiro campineiro Francisco de Paula Ramos de Azevedo (8/12/1851 a 01/07/1928) grande arquiteto formado na Bélgica e depois estabelec ido em Campinas, onde foi responsável pela construção da catedral da cidade. Desenvolveu muitos projetos arquitetônicos ao longo de sua carreira. Seu modelo de Arquitetura possibilitou a integração de técnicas e materiais do mundo industrial aos programas e moldes de urgente modernização da época, seus projetos respondem com talento e competência aos novos conhecimentos, à Arte e à racionalidade. Ramos de Azevedo revela um conhecimento técnico sobre as construções de hospitais e chefiou várias obras de construções hospitalares dentre elas destaca-se o sanatório Vicentina Aranha reconhecido como o melhor e o mais completo arranjo espacial de hospital que configura a obra mais importante da América Latina na década de 20. O prédio do hospital, mostrado na Figura 8, a seguir, é do tipo pavilhonar: possui edifício central com várias edificações de apoio ao redor, e na época, contava com pomar, biblioteca e horta. Trata-se de uma arquitetura clássica do ecletismo da época e era uma entidade independente da cidade e foi inaugurado pelo Dr. Washington Luiz Pereira de Souza, então governador de São Paulo, em 1924. O piso era original de cerâmica francesa, na entrada do hall da frente do pavilhão central, apresenta uma marquise de ferro fundido no estilo Art Nouveau. Contempla um belíssimo paisagismo com canteiros em desenho ao estilo Versailles. Nos bosques há espécies raras de plantas como araribá, louro, cabreúva, mogno, peroba-rosa, jequitibá, jacarandá da Bahia, sapucaia, pau mulato, entre outras. O sanatório funcionou até os anos 80, cessando nesse ano suas atividades. Tempos depois passou a ser utilizado como hospital geriátrico e, em 1996, conforme a Lei Municipal 86 Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, São Paulo, Brasil. 9 , 10, 11 de outubro de 2012 – ISBN: 978-85-62309-06-9


4928/96 de 28/08/96, a prefeitura incluiu as dependências do hospital na categoria de “setor de preservação”. O tombamento foi feito em 1998, pela Secretaria da Cultura, através do CONDEPHAAT. .

FIGURA 8: Vista parcial do antigo Sanatório, hoje Parque Vicentina Aranha FONTE: site oficial da cidade

Atualmente nas dependências do Parque funcionam espaços para caminhada no bosque, o projeto “Leitura no Bosque” proporcionado pela Secretaria da Cultura apresentação de orquestra sinfônica, missas aos domingos na capela, visitas monitoradas. O espaço conta com uma capela dedicada ao Sagrado Coração de Jesus, totalmente financiada pelo conde Lara, natural de Tietê- SP. Atualmente, patrimônio do Município, a capela serve de palco para apresentações da Orquestra Sinfônica da cidade. O patrimônio é muito valorizado pelos moradores que sentem verdadeiro orgulho por essa propriedade tão grandiosa do ponto de vista estético, artístico e cultural, onde a natureza, a arquitetura e a atividade humana se completam. Após cada visita os participantes desenharam os locais que tinham conhecido para a construção do mapa coletivo, conforme mostra a Figura 9, a seguir, proposto no início da pesquisa. Foi discutido entre as crianças como seria construído o mapa contendo todos os lugares visitados. Elas definiram o tamanho do papel e uma delas sugeriu que fossem recortados os desenhos feitos e colados em outro fundo para ser o cenário do novo mapa.

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Este foi montado em cartolina, incluindo recortes de revistas, pintura com giz de cera, colagem com terra e imagens retiradas do site oficial da cidade, além dos desenhos feitos durante as visitas. A construção do mapa representou um importante momento da pesquisa porque trouxe oportunidade de trabalho em grupo, discussão de quais estratégias seriam as melhores para ilustrar a caminhada, abriu a possibilidade de ouvir o outro, de repensar as idéias que iam surgindo a cada minuto e principalmente e de desenvolvimento da criatividade e colaboração entre os membros do grupo .

FIGURA 9: Mapa coletivo fe ito pelos participantes da pesquisa. FONTE: Foto da Pesquisadora

4. Considerações Finais Como pedagoga e autora desta pesquisa sobre o patrimônio cultural, a pesquisadora acredita que se faz necessária uma ação mediadora que mobilize as pessoas à descoberta, à investigação sem o formato escolar, de aula expositiva ou visita monitorada.

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Com jeito de conversa de tarde de domingo aconteceram, nas sextas- feiras, as visitas aos locais considerados patrimônios culturais da cidade e foi feito o possível para que a ação se tornasse acolhedora e prazerosa, abrindo sempre espaço para o pensar, o agir, o perceber das crianças em sua forma singular, pois Arte e História não fazem parte só da escola, mas acontecem nos espaços onde as pessoas vivem, convivem, interagem umas com as outras. As visitas por São José dos Campos para conhecer e visitar seu patrimônio cultural mostraram que a cidade não é um lugar estático com informações decodificadas, mas um lugar de movimento que abriga, produz e reproduz cultura através dos tempos. Neste sentido, conhecer a identidade cultural torna possível valorizar e preservar aquilo que se reconhece como seu. Olhar o conhecido com olhos diferenciados foi muito prazeroso durante a pesquisa e desenvolveu nas crianças o sentimento de responsabilidade, curiosidade e desejo de saber mais. A ação mediadora é diferente de ensinar e não se constitui como metodologia, mas, como uma atitude que propõe postura investigativa e interdisciplinar que envolve a capacidade de pesquisar do mediador atento ao seu grupo e ao que se quer estudar. Diferentemente de transmitir informações prontas, mediar é romper com o que está definido, é ter um olhar ampliado que possibilita ao outro a descoberta. E isso foi o que ocorreu nessa pesquisa por meio da mediação. É surpreendente identificar o quanto as crianças são abertas aos conhecimentos estéticos. A partir dessa experiência sensível foram identificados nos registros e nas falas dos participantes, a presença de sensibilidade, pensamento estético, percepção e desejo de aprender sobre Arte e História e, principalmente, a capacidade dos sujeitos em mediar com outras pessoas as informações dialogadas durante as visitas. Os conhecimentos abordados nas visitas evidenciaram importantes informações sobre a arquitetura joseense, a história e a arte da cidade e chegou-se à conclusão de que a cidade tem grandes representações do momento histórico modernista. Em toda a minha jornada docente, eu nunca havia trabalhado de forma tão diferente alegre, comprometida e prazerosa. A mediação permitiu uma dinâmica que envolveu

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pesquisador e sujeitos de forma tal que os estudos, investigações e curiosidades sobre o patrimônio foram construídas conjuntamente. A pesquisa foi uma experiência muito rica que desenvolveu o exercício do olhar e ampliou as possibilidades de expressão, atenção, interpretação, pensamento, improvisação e principalmente o desejo de buscar informações significativas sobre o assunto julgado interessante. Referências Bibliográficas BARBOSA, Ana Mae (Org.) Arte/ Educação Contemporânea. Consonâncias Internacionais. São Paulo. Cortez, 2005. BARBOSA, Ana Mae e COUTINHO, Rejane Galvão (Orgs.). Arte/ Educação como Medi ação Cultural e social. São Pau lo: Ed itora Unesp, 2009. MARTINS, Miriam Celeste; PICOSQUE, Gisa; GUERRA, M. Terezinha Telles. Teori a e Prática do Ensino da Arte. A Língua do Mundo. S. Paulo : FTD, 2010. PREFEITURA DA CIDADE DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS. SP. Fotos de locais do acervo patrimonial do município. Disponíveis em < http://www.sjc.sp.gov.br/>. Acesso em: 17 out. 2011. PROGRAMA MUSEU VIVO. Cultura Popular e expressão da Identi dade. Fo lder de divulgação. Idealização do Museu do Folclore da Fundação Cultural Cassiano Ricardo, de São José dos Campos.

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