Reggio emilia, educação em forma de arte • boletim arte na escola • edição #77 • agosto setembro 201

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BOLETIM ARTE NA ESCOLA • EDIÇÃO #77 • AGOSTO / SETEMBRO 2015

PELO MUNDO

Reggio Emilia, educação em forma de arte

Nas escolas e creches que integram a rede Reggio Emilia, crianças são constantemente estimuladas a tomarem decisões com o claro objetivo de desenvolver todas as suas potencialidades Rosiane Moro

Reggio Emilia, no norte da Itália, não faz sucesso por seus prédios históricos, o suntuoso teatro municipal, ou pelos inúmeros festivais de música. Por ali, o maior interesse está nos inúmeros desenhos coloridos que decoram lojas, restaurantes, bares e ruas da cidade. A vasta coleção não é assinada por nenhum artista renomado, mas pelos alunos da rede de ensino infantil Reggio Children, criada há mais de 50 anos pelo professor Loris Malaguzzi e pela própria comunidade para oferecer um ensino focado no desenvolvimento intelectual, moral, social e emocional das crianças por meio da representação simbólica. A abordagem reggiana, considerada um dos melhores modelos pedagógicos do mundo, nasceu de uma mistura de várias teorias educacionais, como Piaget, Montessori, Dewey e Vigotsky com a visão bem peculiar de Malaguzzi de que a


criança possui múltiplas linguagens e deve usar todas no processo de aprendizagem. Conhecido como “As Cem Linguagens da Criança”, o modelo utiliza a arte como principal veículo de formação do conhecimento. “Em Reggio Emilia não se aprende da forma tradicional: eu digo isso e você faz aquilo. Aqui a aprendizagem é a construção de significados feita em conjunto”, conta a educadora italiana Paola Struzzi, pedagogista das creches e escolas de educação infantil de Reggio Emilia, que esteve no Brasil em agosto para uma formação de professores.

Em Reggio Emilia não se aprende da forma tradicional: a aprendizagem é a construção de significados feita em conjunto

O tempo e o espaço Nas 21 escolas e 13 creches que integram a rede Reggio Emilia, crianças de zero a 6 anos são constantemente estimuladas a tomarem decisões com o claro objetivo de desenvolver todas as suas potencialidades. Para isso, as salas de aulas foram transformadas em amplos ateliês, com a oferta de vasta gama de materiais de trabalho. Uma professora e uma atelierista trabalham em conjunto, incentivando a reflexão e a experimentação. “Gostamos de fugir da folha branca para instigar as crianças à pesquisa, oferecendo diferentes suportes como papel ondulado, uma folha transparente ou preta, o plástico, a parede”, explica Paola. As atividades são sempre complementadas por narrativas das próprias crianças, que vão criando em conjunto e construindo linhas de raciocínio, relações com o trabalho do colega, novos olhares. “O aprendizado é uma nutrição recíproca, por isso é importante utilizar a transversalidade da linguagem. A narração é uma espécie de imagem mental e não está isolada do desenho no papel ou da palavra escrita. Tudo tem uma relação”, esclarece a educadora.


As atividades também não têm hora para terminar e ao final do dia todos os trabalhos permanecem no lugar em que estão sendo realizados. “Dessa forma as crianças aprendem que uma obra precisa de tempo para ser construída, não necessariamente apenas um dia. Essa relação pacífica com o tempo contribui para a formação do pensamento analítico, crítico e até para descontruir tudo e começar de novo, se for o caso”, pontua Paola. A educadora é terminantemente contra processos que só valorizam desenhos figurativos. “As crianças constroem o conhecimento de forma diferente. Precisam de um contexto de qualidade, de oportunidades para pensar. Quando pedimos que desenhem uma casa, que operações cognitivas, narrativas e emocionais elas estão realmente trabalhando? Que tal desenhar o vento? ”, sugere. Atualmente, a Reggio Children vem trabalhando na documentação da aprendizagem das crianças que saem da rede e vão para a escola tradicional, ou seja, no período de 6 a 12 anos. A ideia não é mensurar o aprendizado quantitativo, por exemplo, se sabem contar ou escrever, e sim as contribuições das experiências trazidas do ensino infantil no seu aprendizado futuro. “Por enquanto, o que constatamos é que as nossas crianças são muito curiosas, bem mais disponíveis para experimentar e bastante acolhedoras, inclusive em relação às crianças com necessidades especiais. Também são questionadoras, discutem as várias propostas em sala de aula. Mas o melhor de tudo é que elas são crianças dispostas a aprender e a trabalhar em grupo”, analisa a educadora. Mensagens planetárias Outro ponto importante da filosofia Reggio Emilia é a participação dos pais e da comunidade nas proposições. É muito comum encontrar eventos de contação de histórias, exposições e apresentações de música pelas ruas da cidade. Os pais frequentam constantemente as escolas e também participam dos projetos com os alunos. Mas os educadores querem fazer dessa experiência algo maior. Foi assim que nasceu o projeto “Mensagens Planetárias”, que começou com indagações, pensamentos e desejos que as crianças gostariam de passar para o mundo. O trabalho foi registrado em vídeo e exibido em um telão no centro da cidade italiana na época do Natal.


O resultado foi tão surpreendente que a experiência virou global. A rede Reggio Children abriu o projeto para outras localidades e está concentrando as mensagens de crianças de várias partes do mundo em um único site.

Para que as crianças entendam que uma obra precisa de tempo para ser construída, as atividades não têm hora para acabar

Fotos:

Preschools and Infant-toddler Centers – Istituzione of the Municipality of

Reggio Emilia


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