De volta para casa: A alegria que vem do sertão

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Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ano 6 | nº 936 | Set | 2012 São Raimundo Nonato - PI

De volta para casa: A alegria que vem do sertão O nome dela é Maria Damasceno de Miranda Sousa. As feições bem conservadas não retratam as experiências da longa jornada de vida da mulher de 49 anos, mas por baixo dos traços sérios e resistentes, uma história de amor pelo sertão se revela. Maria Damasceno poderia ser mais uma Tereza, João, José e tantos Raimundos que nascem no campo e se veem obrigados a mudar para cidades grandes do Brasil em busca de uma vida melhor. Histórias de filhos de agricultores que vendo a realidade difícil dos pais saem de sua terra natal em busca de trabalho e segurança, buscando em outros lugares o que não tem ao seu alcance E esse sonho de uma vida menos dura fez com que Maria Damasceno buscasse novos rumos Maria Damasceno: uma declaração de amor à terra ainda cedo. No início da década de 80 ela saiu da zona rural de São Raimundo Nonato (PI), local em que cresceu e aprendeu a cultivar a terra ao lado dos 13 irmãos e dos pais, e partiu em busca da promessa de trabalho em Brasília (DF). Em sua vida de caminhante passaria ainda por Goiânia (GO).

A batalha pela sobrevivência e o recomeço O início da vida na cidade grande foi como o de muitos nordestinos que fazem o mesmo percurso: duro. Mas aos poucos a jovem apaixonada pelo campo foi se adaptando e se moldando à correria dos centros urbanos. Uma realidade completamente diferente da que Maria estava acostumada. No entanto, o sonho de voltar para a terra em que nasceu permanecia num cantinho à espera da primeira oportunidade. E um dia ela iria chegar.

Caprinocultura se destaca na propriedade da família

“Sempre tive muita vontade de voltar pra roça, saudade de trabalhar a terra e mexer com plantas”, conta ela. Mas foi somente depois de 26 anos respirando outras culturas que Maria pôde

Piauí


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finalmente voltar para o lugar em que cresceu. Viúva, ela trouxe junto com a bagagem, o filho Paulo Miranda Lustosa, de 27 anos, e um novo amor, o esposo Francisco Soares de Carvalho, 46 anos. Há cinco anos ela fez o caminho de volta – sonho de tantos que partiram nas mesmas condições – e voltou para São Raimundo Nonato. Feliz da vida, Maria comprou seu primeiro pedaço de chão: uma propriedade com cerca de 70 hectares destinados ao plantio de cereais e criação animal. Aos poucos, o rebanho vai crescendo e já conta com 300 cabeças de ovelhas e bodes Produção se destaca no cinza de mais uma seca espalhados entre a paisagem retorcida da caatinga. Capim e palma são plantados em outra área do terreno para garantir a alimentação dos bichos. As coisas vão dando certo que ela até arranjou uma forma ainda mais gratificante de matar a saudade do cultivo da terra: a horticultura. Maria reativou um poço cacimbão cavado e há muito tempo abandonado na propriedade recémadquirida por ela e pelo marido. Ao redor do poço tratou de plantar capim para incrementar a alimentação dos animais, e canteiros de coentro e cebola para temperar a comida, acrescentando sabores típicos da culinária local. “Eu vi que o coentro tinha uma boa saída e aí comecei a plantar para consumir na minha casa. Depois plantei mandioca, milho e outras coisas”, explica. “Aqui você pode ter de tudo um pouco, então por que não trabalhar e por que não ter a verdura dentro da minha casa e a ração para os meus bichos?”, interroga. “Quando eu comecei a plantar muito coentro, as pessoas foram se informando e descobriram que eu estava produzindo, aí começaram a encomendar bastante coentro. Meu filho começou a entregar no 'verdurão' de um povoado próximo”, enfatiza. E assim o negócio começou e vem se destacando nas redondezas do povoado em que vive. “Compensa, vale a pena. É só ter coragem de trabalhar”, destaca. As hortaliças de Maria são produzidas sem o uso de 'veneno', aqui não há espaço para agrotóxicos, ela faz questão de afirmar. Para ela, o único trabalho é visitar o canteiro produtivo pelo menos uma vez ao dia para regar as plantas. O cultivo da horta tem dado tão certo que o casal já investiu em pequenos mecanismos de irrigação e pensa em ampliar a área produtiva. “O resultado foi bom demais e a gente quer aumentar o plantio. Se você tem água, tem tudo”, diz ela, que ainda acrescenta os benefícios do capim fresco para o trato com o rebanho: “Com isso aqui não tem falta de chuva. Você pode plantar na seca e também no inverno, tendo sempre capim para os animais”. A família produz quase tudo que consome. Além das hortaliças, a carne que vem de porcos, caprinos e aves, além de leite e muitos outros alimentos são produzidos no quintal de casa. Eu achei uma dificuldade muito grande encontrar verduras quando cheguei aqui, então comecei a produzir para mim. Deu certo. E se tiver mercado, no futuro quero ampliar”, comemora Maria Damasceno. De migrante com saudade da terra natal, Maria se tornou agricultora experimentadora e vem adaptando cultivos à sua realidade. Uma mulher exemplo de dedicação e coragem. Apoio:

Programa Cisternas CÁRITAS DIOCESANA DE SÃO RAIMUNDO NONATO


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