Ano 8 • nº 1610 Julho/2014 Massapê
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas
O quintal produtivo da família Arcanjo
D
e mãos estendidas. Foi assim que fomos recebidos na casa dele. Um verdadeiro anjo que nos acolheu de forma alegre, caminhando pacientemente até nossa direção. O nome dele é Miguel Arcanjo de Lima. Nasceu e mora até hoje na localidade de Gregório no município de Ipaguaçu-Mirim, em Massapê, distante 272,3 km de Fortaleza. Antes de conhecer seu Miguel, vamos conhecer um pouco de sua cidade natal. Massapê começa sua história com a Miguel Arcanjo e sua companheira Rita de Cássia passagem da estrada de ferro ligando Sobral a Camocim. Banhada pelo Açude Acaraú Mirim, a cidade tem esse nome de origem latina e significa solo argiloso. Muitos índios habitaram nas terras como as tribos Anacé, Tacari-Arariu e Tabajara. Foi nessa terra que a família de seu Miguel fez morada e até hoje conserva suas raízes e sua história. Bastou “um boa tarde, tudo bem?” para a conversa começar e a tarde passar rapidinho. O lugarejo pacato, sossegado, cercado pela natureza foi cenário para uma prosa boa para lá de simpática e emocionante. Seu Miguel tem 70 anos. É ativo, participa da vida da comunidade, das ações promovidas pelo Sindicato dos/as Trabalhadores/as Rurais de Massapê, do qual é sócio. Há 50 está casado com dona Rita de Cássia, que tem a mesma idade. A família e os vizinhos fizeram festa para comemorar as bodas de ouro do casal, lembra seu Miguel. Do fruto dessa união nasceram 13 filhos. Daí em diante dá pra ter ideia do que seu Miguel teve que fazer para criar e sustentar uma família tão grande. Ele é falante e contador de muitas histórias. Algumas delas nos ajudaram a contextualizar a vida desse agricultor, que fez de sua terra natal um lugar sagrado, sustentável, único e possível de morar. De início ele alerta que trabalhar na roça não é para todo mundo. “É um trabalho muito duro, exige força e coragem. Na roça é assim, mão de obra pesada”. Contou que passou muitas dificuldades para conseguir sustentar os filhos. Mas hoje quando vê todos crescidos e criados, olha para trás e se orgulha por ter vencido junto com sua esposa. “Uma herança que a gente não perde é a família”, disse emocionado.
Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Ceará
Com muitos filhos para criar, seu Miguel não tinha muitas opções de trabalho. Como havia muita plantação de carnaúba - planta característica do semiárido nordestino, ele resolveu trabalhar com a bagana. A bagana é uma espécie de palha que vem da extração da cera da folha e que serve como adubo. Seu Miguel se deu bem. Muitos agricultores da região compravam seu produto. Até empréstimo em banco ele foi atrás para dar continuidade ao negócio. Trabalhou por muitos anos nessa atividade. No entanto, por conta da idade, o ritmo do trabalho pra conduzir a produção da bagana foi diminuindo. Seu Miguel já não tinha tanta resistência. “É um trabalho pesado que exige muito esforço. Já não tinha tanta idade pra continuar”. Além de trabalhar com a bagana, também era comerciante, cuidava de vacas e trabalhou durante muito tempo na agricultura. Hoje ele concentra forças no quintal produtivo que tem ao redor de casa. Ele cuida das plantas, animais, e de si próprio, pois encontrou no quintal uma forma de ocupar o tempo com mais qualidade e saúde gostando do que faz. No quintal tem verduras como cheiro verde, tomate, pimentão e diversas frutas como laranja, banana, none, goiaba, coco, graviola, caju e mamão. “Tem muita coisa que tá só no começo, mas vai aumentar. Se Deus quiser!”, comentou seu Miguel. Além das frutas e verduras, ainda dedica seu tempo no cuidado de gansos, galinhas, porcos, capotes e um lago onde cria cará-tilápia. Saímos em caminhada pelo quintal. Boa parte dos alimentos produzidos é consumido pela família. A produção ainda é pequena para comercializar. Além disso, a água é escassa. A água que molha o quintal é pouca e vem de um braço do Rio Acaraú que passa nos fundos da casa. É bombeada por um motor pequeno que não comporta o volume de água e isso dificulta o cultivo de mais plantas. “Se a bomba fosse maior seria bem mais fácil. Dava pra subir mais água e garantir o quintal mais molhadinho”.
Braço do Rio Acaraú nos fundos do quintal do seu Miguel
A família aguarda a solução para esse problema com a chegada do projeto de quintais produtivos do Governo do Estado, do qual estão inscritos. “Aí vai dar pra gente se animar mais ainda, né? Com mais água e organizando melhor tudo aqui, o quintal vai ficar uma beleza”, contou seu Miguel cheio de esperanças. No final da caminhada pelo quintal chegamos ao viveiro dos peixes. Não deu para contar, mas pela disputa de alimentos que faziam dentro da água dava para perceber que eram muitos. Enquanto jogava comida para alimentá-los, seu Miguel falou da dificuldade de manter a criação, dos custos altos com ração, limpeza, mas ele afirma que mesmo assim vai continuar. Depois de ver e ouvir toda essa história, a sensação é de bem-estar e completa sintonia com o mais profundo do que a natureza pode expressar. Seu Miguel e sua família são privilegiados por preservarem um espaço tão verde e belo de se ver. Dá gosto o quintal e a união dessa família que garante o acesso a alimentos saudáveis e de muita qualidade.
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