Brejo dos Crioulos: luta pelo território e esperança de conquista dos direitos do povo quilombola

Page 1

Ano 8 • nº 1280 Fevereiro/2014 São João da Ponte

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Brejo dos Crioulos: luta pelo território e esperança de conquista dos direitos do povo quilombola “Tenho muito orgulho de ser e pertencer à comunidade quilombola Brejo dos Crioulos. Temos um sonho de ter a posse das nossas terras para trabalhar e conquistar a nossa liberdade” - com essa frase a quilombola Paula Cardoso de Oliveira, 49 anos, demonstra a esperança de viver em paz após 12 anos de luta pelo território que está em processo de regularização fundiária. De costumes simples, nascida e criada no quilombo de Brejo dos Crioulos, na comunidade Caxambu, a quilombola Paula é casada com Marcelo Batista de Lima e mãe de oito filhos. Ela relembra que a comunidade quilombola foi fundada por ancestrais negros que ainda preservam as atividades culturais, sociais, econômicas e produtivas por várias gerações. A comunidade quilombola conta que, nesta época, o território era livre, que não era propriedade de ninguém. Território de terras férteis, a vida quilombola girava ao redor das atividades de subsistência das roças guiadas pelo período das chuvas, favorável a plantação de arroz, milho, feijão, cana, mandioca, algodão e também a criação de pequenos animais – gado, galinha e da pesca nas lagoas e ribeirões. A partir da década de 1930, o Estado colocou as terras quilombolas à venda para quem quisesse comprar. Alguns quilombolas resistiram e conseguiram permanecer nas terras. Essa divisão configurou um marco entre os tempos de “terras livres” para propriedade privada concretizando o início do processo de expropriação abrindo as portas para que fazendeiros viessem se instalar na região, com objetivo de expandir o agronegócio. Assim, a comunidade quilombola começou a sofrer e os conflitos começaram a surgir. Em meados dos 2002 e 2004, a comunidade começou o enfrentamento para retomar o território – desde então, aguardam providências do Governo e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para a regularização de suas terras. O Quilombo possui área total de 17.300 hectares e fica na divisa entre os municípios de São João da Ponte, Verdelândia e Varzelândia, no sertão do Norte de Minas Gerais, região semiárida.


Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Articulação Semiárido Brasileiro – Minas Gerais

A quilombola diz que as famílias que ali vivem querem apenas administrar o seu território para ter acesso às novas áreas de produção familiar, que também possam ser áreas de reserva legal, de manejo extrativista além de áreas de proteção e recuperação, ampliação da oferta de água. Que seja novamente um território dos quilombolas, sem a presença de fazendeiros, que historicamente degradaram a área. Foi com o objetivo de refletir sobre a realidade do território e construir a proposta de desenvolvimento para os quilombolas que Paula se uniu a outros quilombolas visando construir entre os anos de 2011 e 2012, o Plano de Etnodesenvolvimento do Quilombo. Foram feitas oficinas com jovens, mulheres, homens e anciãos, além de intercâmbios para apontar metas, ações e metodologia de execução dentro dos eixos de gestão ambiental e territorial; fortalecimento da economia quilombola e desenvolvimento social e cultural. O processo de elaboração do Plano foi coordenado pelo Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas – CAA/NM, selecionado através de uma chamada de ATER – Assistência Técnica e Extensão Rural do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). O documento foi construído em um momento em que o Quilombo vivenciou e, ainda vem vivenciando, a desapropriação do território ocupado por fazendeiros onde a atenção estava voltada para estes momentos de tensão. De certa forma, literalmente, isso impede o avanço das elaborações e ações propostas no plano. A quilombola afirma também que, mesmo com esses problemas, o Plano de Etnodesenvolvimento é uma forte referência para o desenvolvimento do trabalho que vem sendo construído em conjunto com as comunidades quilombolas e os parceiros. Houve também o envolvimento direto da direção da Associação e do recém-criado Conselho de Gestão Territorial do Quilombo Brejo dos Crioulos que cumprem a tarefa de planejar de forma participativa o uso e ocupação do território. Paula explica que há muitas coisas a serem feitas para melhorar a vida no quilombo, entre elas a maior participação e ampliação da presença das mulheres nas ações e oficinas no território. Assim, ela aponta que, para que o plano seja aplicado é necessário melhorar e fortalecer a organização interna do quilombo, seguindo a pauta de reivindicações coletivas para que sejam concretizadas. Paula conta que o povo quilombola é alegre; e uma de suas riquezas é a conservação dos traços culturais que pode ser identificada na dança dos batuques, que soam como instrumento de alegria, força e esperança de continuar a vida em um território livre.

Realização

Patrocínio


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.