Rebanho bem cuidado é a segurança da família de Vanda e Ednaldo

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cisterna direto para os cochos, explica Ednaldo sobre a construção. Na verdade, ele adaptou a base de um antigo biodigestor que não funcionava direito numa cisterna para captar água para os animais. Também em 2010 construíram uma cisterna-calçadão por meio do P1+2. Eu enterrei 7 carneiros na construção da cisterna-calçadão, brinca Ednaldo. Deu muita pedra no buraco, paguei três horas de máquina, 22 dias de serviço (incluindo o meu, de Linaldo e Galego) para aplainar o fundo do buraco. No final, tive que aprofundar mais de dois metros por causa das pedras. E como a cisterna ficava muito enterrada, por minha conta, subi mais uma linha de placas. Assumi os custos de cinco sacos de cimento, mais o cano e a mão-de-obra. Hoje a nossa cisterna armazena 65 mil litros de água e no ano de 2013 é a única fonte de água para os animais pois não choveu o suficiente para encher o barreiro. Numa tentativa de resolver o problema da água, cavaram um poço artesiano com recurso do Pronaf Estiagem. Mas a experiência não foi muito bem sucedida, pois a água é muito salgada e não dá para aproveitar nem para os animais. Todos os anos plantam feijão, feijão macassa, fava, feijão preto, gordo pingo de outro, batatinha. O milho é plantado para comer verde, para fazer pamonha, para vender no PAA, na feira Agroecológica, tirar a semente de plantar no outro ano e para guardar para as galinhas. Tanto a palhada do milho, como a das outras culturas são guardadas no roçado para depois passar na forrageira para os animais. Fazendo as contas, só a palhada do feijão rendeu 160 quilos de ração para o gado. Em 2013, a família tem 4 cabeças de gado, incluindo o boi de serviço, 49 ovelhas, um bode, algumas galinhas e perus que são criados para vender na época do Natal. Todos os dias, botam ração, tiram o leite da vaca e soltam os animais no cercado de baraúna de aproximadamente 3 hectares. Ao final do dia, botam ração novamente. Para essa quantidade de criação, organizam por volta de 8 caixas de ração entre os diferentes cochos e cercados. Deixam os animais solteiros no curral e reservam o cercado ao lado para tratar os animais jovens. Não temos quase problema de doença nos bichos, explica Vanda. Acho que é pela qualidade da ração e do manejo dos animais. Participei de uma oficina sobre sanidade dos animais e vi que o Ednaldo já fazia muita coisa certa, outras, incentivei que continuasse aprimorando e outras ensinei para ele. Aprendi sobre a limpeza do curral, sobre como detectar vermes, quando os animais estão com anemia. Por exemplo, se vejo que um bicho está com sinal de anemia trato logo com beterraba e rapadura. Para verme usamos a babosa ou o café com alho. Até para a gente essa receita é boa. Piso o alho roxo miúdo, que é melhor, boto na água para ferver, depois boto o café e deixo cozinhando. Depois que o café assenta é só coar. Aí dou para as ovelhas, mas Edinaldo ensinou que é bom fazer isso na força da lua. É só observar quando está para ser nova ou cheia e considerar 3 dias antes e 3 dias depois. É assim que os animais vêm permitindo que a família se organize. Foi com o dinheiro da criação que investiram na propriedade, que puderam dar socorro para os filhos quando tiveram problema de saúde, que permitiu que Galego pudesse estudar e que vem permitindo Lindaelma seguir o mesmo caminho. É com coragem, com determinação e muita criatividade que Vanda e Ednaldo seguem inventando novas formas de viver com dignidade e com felicidade no seminárido brasileiro. Realização

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Ano 7 nº1260 Remígio

Rebanho bem cuidado é a segurança da família de Vanda e Ednaldo Vanda e Ednaldo são agricultores de mão cheia! Gostam de observar, de experimentar, de inventar e foi dentro dessa criatividade que criaram seus 3 filhos: Linaldo, Lindaelma e Lindoaldo, o galego, como é mais conhecido. Vanda e Ednaldo moram no assentamento Corredor, em Remígio, em 7 hectares das terras conquistadas por meio da reforma agrária. Hoje eles são ricos, como costuma brincar Vanda. Mas tudo que conquistaram foi fruto de muito trabalho, muita coragem, muita persistência e a certeza do trabalho que faziam. Casaram-se muito cedo, em 1987, na cidade onde nasceram, em Serra Branca, no Cariri Paraibano. Para começar a vida, Ednaldo criava animais nas terras de seus pais. Foi dessa atividade e das viagens que fez à São Paulo que conseguiram criar 10 reses. Incentivados por um primo de Ednaldo, juntaram tudo que tinham, e foram para Remígio, no Agreste da Paraíba. Moraram por 7 meses em Caiana e depois em Jenipapo, ambas comunidades do Brejo do município. A vinda para o Brejo não foi fácil. Em Jenipapo foram recomeçar a vida. Vanda assumiu com os filhos o cuidado das terras do patrão, enquanto Ednaldo cuidava dos animais em Jenipapo mesmo e em mais três outras fazendas do mesmo patrão: em Malacacheta, Doroth e em Areia. Em Jenipapo tinham certa liberdade, conta Ednaldo. Podíamos botar roçado, criar de tudo um pouco, tínhamos galinhas, patos. Mas era muito trabalho para mim e para os três meninos, eles ajudavam muito porque Ednaldo era só no meio do mundo, completa Vanda. Ednaldo cuidava do gado do patrão que era criado solto. Uma pessoa só vale o que tem, explica Ednaldo. E um agricultor se não tiver o gado, não tem nada na vida. Encontrei a liberdade, então fui criar mesmo sem terra. Da bezerra que Lindaelma ganhou do patrão, Vanda e Ednaldo fizeram 10 reses novamente. E da marrã que Galego ganhou, fizeram mais 10 ovelhas. Criavam os animais, vendiam quando estavam gordos e compravam dois animais menores e mais magros para engordar novamente. Assim foram refazendo seu rebanho. Foram os animais que permitiram com que a família pudesse ter condições de cuidar de Linaldo, filho especial do casal. Para investir na construção de um prédio em Campina Grande, o patrão resolveu vender seus animais e suas terras. Deixou o sítio onde Vanda e Ednaldo moravam por último. O casal manteve


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seus animais nos cercados dessa terra e com a capineira que plantavam. Água tinha o suficiente para todos os gastos. Em 1999, Ednaldo ficou sabendo de um projeto de assentamento e fez sua inscrição pelos correios. Vanda ainda se lembra de que teve muito medo, pois naquela época tinha outra visão sobre o movimento sem terra. Mas acabou dando apoio e suporte para que o marido pudesse manter seu trabalho e ainda botar juntos o roçado nas terras que seriam desapropriadas. Ednaldo ainda relembra que chegaram a produzir 8 sacos de feijão, fora o feijão macassa que comeram verde. Em 2001, Ednaldo combinou com o patrão de trocar seus direitos de trabalho por horas de trator. Foi quando passou a organizar as novas terras. Antiga fazenda de sisal, a área era toda ocupada por uma capoeira alta. Abriu primeiro um barreiro, que nos anos seguintes, colocou mais horas de trabalho por três vezes. Com o trator abriu também 4 hectares para a área do roçado e a da casa. E foi cercando aos poucos a propriedade de acordo com a necessidade da criação dos bichos. Em 2003, construíram a casa onde moram, mas só se mudaram para lá no dia 05 de agosto de 2004, lembra Vanda. Quando a vida parecia que ia melhorar, trabalhavam agora na terra e por contra própria, no dia 12 de outubro desse mesmo ano, um incêndio veio do lixão que tinha perto até a porta de casa. Vanda relembra ainda com desespero dos momentos que passou. Não sobrou uma gota d'água dentro do pote, usamos tudo para apagar o fogo, conta. Ednaldo estava com os meninos numa lagoa. Parecia que eu estava no céu, conta Ednaldo, e quando cheguei no inferno. Quando cheguei estava tudo dentro da cinza. Quando viemos morar no assentamento, trouxemos 14 reses e aqui tinha muito pasto nativo para o gado. Tinha uma mata cobrindo o agave, com muitas plantas nativas dentro e ficamos sem nada. Desde quando me entendo por gente, cuido de bicho dos outros. Conhecia todas as plantas de espinho, explica Ednaldo. Cheguei a perder um bezerro porque comeu uma cabeça de agave queimada. Em março de 2005 tirei o gado daqui, nessa época já estava com 8 reses. Já não tinha mais nada para os bichos. Os animais ficaram por um ano aos cuidados de um amigo, Luiz Berto, em Gruta Funda. Lá tinha chovido mais e teve condições para fazer pasto, explica Ednaldo. Em 2006, quando formou novamente um pouco de pasto no cercado, Vanda e Ednaldo trouxeram novamente os animais. Nesse mesmo ano trocaram duas vacas e ainda completaram mais 100,00 reais por uma máquina forrageira, que compraram do mesmo Luiz Berto. O investimento na forrageira ajudou muito na mão-de-obra, no reaproveitamento da ração, da palha de milho, explica Vanda. Antes a gente pegava a palha do milho e jogava no curral. O que acontecia era que os animais comiam a palha e ficavam pisando no cambão. Agora a gente passa tudo na forrageira e a gente aproveita tudo. Passa a palha, a cabeça de agave ou o mandacaru quando chega a seca, completa. Tudo que moer um pouco se multiplica. De pouca palma, por exemplo, se faz muito, explica Ednaldo sobre os benefícios da forrageira. Foi nesse mesmo ano que Vanda e Ednaldo conheceram a experiência do silo. Participaram de uma reunião com a

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Embrapa sobre o reaproveitamento do sisal e nessa época, eles ensinaram a fazer silo com o bagaço do sisal moído na peneira. Nessa época, Vanda era presidente da associação do assentamento Corredor e fez um casamento da associação com Sindicato e com a AS-PTA. Ednaldo foi o primeiro a se interessar em fazer o silo e desde então não parou mais de fazer. Os silos são sempre feitos em mutirão. No início, com a máquina da Embrapa, depois com uma máquina do Polo da Borborema que atendia a muitos municípios e desde 2009, com uma máquina que o Sindicato administra com os grupos de mutirões para armazenamento de forragem de Remígio. Vanda e Ednaldo começaram armazenando em um silo superfície, depois em um silo buraco, e desde 2012, Ednaldo inventou o silo-cisterna, como a família apelidou o silo construído com anéis de placas de cimento, como o das cisternas de placas. Em 2013, a família armazenou em dois silos (buraco e silocisterna) 13,4 toneladas de forragem. Em março de 2007, Vanda e Ednaldo venderam um boi gordo, num ano de seca braba e em 2008, veio chover só no final de abril. O que segurou a criação foi os silos. Foi nessa época que os outros agricultores vizinhos passaram a acreditar que o armazenar a ração dá certo, conta Ednaldo. Logo quando se mudaram para o assentamento, plantaram 1/25 de palma. Só em 2008, quando pegaram o Pronaf é que plantaram mais 1,5 hectares e em 2013, montaram um experimento com palma orelha de elefante e palma baiana para se prevenirem do ataque da cochonilha do carmim, já que essas espécies são resistentes. A palma é uma planta bastante estratégica para a família e é explorada em seus limites: o caule seco da planta é aproveitado como ração quando passado na forrageira e oferecido aos animais na época de estiagem, a planta é oferecida junto da palhada do milho para diminuir a água oferecida aos animais. Água é ainda um problema para a família. Em 2010, venderam todos os animais, só deixou o boi manso porque não tinham água para dar de beber. Foi com esse dinheiro que aproveitaram para organizar mais o curral construindo o aprisco, uma cocheira, um armazém. Eles não desperdiçam nada, fizeram um mourão com a sobra de cimento, um brete de funil com mourão de algaroba para amansar boi bravo, uma cocheira redonda aproveitando as placas de cisternas. Fizeram também uma cisterna dentro do curral aproveitando a água do armazém e do telhado do aprisco. É da


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