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Campinas, 21 a 27 de maio de 2012 - ANO XXVI - Nº 527 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
IMPRESSO ESPECIAL 1.74.18.2252-9-DR/SPI Unicamp
CORREIOS
FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT
Fotos: Antoninho Perri/ Antonio Scarpinetti / Divulgação
Perigo Pesquisa coordenada pelo professor Wilson de Figueiredo Jardim, do Instituto de Química (IQ), revela que a água potável consumida em 16 capitais do país apresenta contaminação por substâncias ainda não legisladas, entre as quais a cafeína, cuja presença pode ser um indício de que outros contaminantes saem das torneiras. Os cientistas também encontraram, por exemplo, atrazina (herbicida), fenolftaleína (laxante) e triclosan (substância presente em produtos de higiene pessoal). As amostras foram analisadas no Instituto Nacional de Ciências e Tecnologias Analíticas Avançadas (INCTAA), cuja sede fica no IQ.
Amostra de água analisada pelos cientistas
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O açúcar que não engorda e faz bem à saúde Página 4
Pesquisador avalia potencial de 6 biomassas Página 5
Um menisco artificial à prova de sobrecarga Página 9
A Comissão da Verdade vai abrir a caixa-preta? Página 12
Não é o que parece Afeto e gênero no mercado transnacional do sexo Página 6
Por que mulheres com HIV/Aids decidem abortar Página 7
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Campinas, 14 a 20 de maio de 2012
ARTIGO
por: Marcelo Knobel e Renato H. L. Pedrosa
Unicamp quer saber como os seus alunos vivenciam a Universidade Fotos: Antonio Scarpinetti
O que é o programa Vida Estudantil em Universidades de Pesquisa Os estudantes de graduação da Unicamp terão a oportunidade, desta semana até 13 de julho, de contar sua experiência na Universidade a partir de vários pontos de vista. A Unicamp, por iniciativa da Pró-Reitoria de Graduação e do Grupo de Estudos em Educação Superior (GEES), integrante do Centro de Estudos Avançados (CEAv) da Unicamp, firmou parceria com o Centro de Estudos em Educação Superior da Universidade da Califórnia-Berkeley, para realizar um piloto da enquete Student Experience in the Research University International (SERU-I), que pode ser traduzido como Vida Estudantil em Universidades de Pesquisa (VEUP). Há hoje 24 instituições que participam do programa no mundo todo, incluindo África do Sul, China, Estados Unidos, Holanda. Há universidades de outros países, como Reino Unido e Rússia, que estão, atualmente, em fase de adesão ao consórcio. Mais informações sobre o piloto internacional estão na página http://cshe.berkeley.edu/research/ seru/intlconsortium/index.htm.
Marcelo Knobel
Ouvindo os estudantes e ações para a melhoria da graduação
Formulação do questionário
O questionário que os estudantes de graduação da Unicamp responderão nos próximos dois meses é composto de duas partes principais: um módulo comum, derivado do questionário base, usado por todas as instituições participantes, e um módulo desenvolvido pela Unicamp. A parte principal, o módulo comum, trata de diversos aspectos da vida estudantil: envolvimento acadêmico, uso do tempo, desenvolvimento acadêmico e pessoal, ambiente no campus, objetivos, planos, aspirações, experiência educacional. Também trata do engajamento cívico, comunitário e outros interesses que desenvolvem ao longo do curso, finalizando com informações pessoais, tais como onde vivem, como chegam ao campus, situação civil, se tiveram filhos recentemente, entre outras. Esses tópicos, em conjunto, permitirão avaliar de forma bastante detalhada como os estudantes da Unicamp vivenciam seu dia-a-dia de uma forma bastante profunda, e traçar um perfil, até o nível de cada curso e do ano de ingresso. O questionário também traz perguntas que permitirão distinguir a vida nos vários campi, e as diferenças sentidas entre o período diurno e o noturno. A segunda parte consiste de um módulo específico que, neste primeiro piloto, buscará identificar o grau de satisfação dos estudantes em relação à escolha de curso em que estão matriculados. Também tentará identificar até que ponto os estudantes teriam interesse em um sistema em que o curso não seria escolhido no momento do ingresso, mas mais à frente, ao longo de seus estudos universitários, uma tendência crescente no Brasil e em outros países. Em cada aplicação do questionário é possível desenvolver módulos que tratam de questões específicas de interesse de cada instituição.
Como exemplo recente, um artigo dos principais pesquisadores do programa em Berkeley analisou os dados dos questionários, em particular dos itens em que os estudantes avaliam seu próprio desenvolvimento, e compararam com seu desempenho acadêmico ao longo do curso. A análise permitiu identificar quais aspectos da vida estudantil estão associados ao bom desempenho e também em que medida a auto-avaliação é adequada para se avaliar o progresso acadêmico dos estudantes. Os resultados indicam que esse tipo de avaliação é válida para tais fins e que podem ser complementares a outras avaliações. Com os dados da Unicamp, tanto do VEUP como do Enade, poderemos testar se isso também ocorre aqui. Assim, teríamos alternativas que permitirão aprofundar as análises de qualidade dos nossos cursos, utilizando os resultados de ambos os sistemas. O VEUP permitirá, no entanto, avaliar isso de forma mais detalhada, uma vez que estaremos associando esses resultados vários outros aspectos da vida estudantil e acadêmica nos nossos campi.
Os dados obtidos permitirão que a Unicamp localize problemas, idealize e desenvolva projetos de aprimoramento da graduação
Confidencialidade
Renato Pedrosa
camp, até o valor total de R$500,00 A partir desse momento, questões nacionais puderam passar a ser comUm aspecto fundamental do pro- para cada contemplado. paradas, uma vez que esse conjunto grama é que todas as informações de instituições representa o que seria, coletadas serão tratadas de forma a Breve histórico no Brasil, o conjunto das melhores preservar o caráter confidencial do do SERU (VEUP) sistema, ou seja, nenhum estudanO programa existe já há cerca de universidades federais e estaduais. Em 2010, iniciou-se a extensão te terá suas respostas divulgadas 10 anos, tendo sido desenvolvido ou mesmo apresentadas a pessoas inicialmente como um sistema de do programa para instituições fora que não tenham sido autorizadas, avaliação da experiência estudantil dos Estados Unidos, o SERU-I. O mediante o processo usual adotado para as diversas universidades que projeto piloto, em andamento, conta pela Universidade para estudos en- compõem a Universidade da Cali- a partir de agora com a participação volvendo indivíduos. Seguirá, por fórnia, por pesquisadores do Centro da Unicamp, sendo a primeira uniexemplo, os mesmo critérios ado- de Estudos em Ensino Superior do versidade do Brasil e da América tados quando dados do questionário campus de Berkeley. Esse sistema de Latina a aderir à versão internacional socioeconômico do vestibular, ou instituições públicas (são universida- do programa. dados acadêmicos mantidos pela des estaduais) incluem algumas das DAC (notas em disciplinas), são melhores universidades americanas Relevância acadêmica e utilizados em pesquisas acadêmicas: e, em alguns casos, do mundo (como institucional do programa nenhum conjunto de informações UC Berkeley, UCLA - Los Angeles Desde 2002 o sistema vem sendo pode ser divulgado que permita e UC San Diego). avaliado e testado de diversas formas, isolar indivíduos. Além disso, a parA partir de 2006, o sistema foi e muitos estudos são desenvolvidos a ticipação na enquete é totalmente vo- sendo ampliado, formando-se um partir dos dados coletados, tanto para luntária. Entretanto, a qualidade das consórcio que inclui algumas das um campus individualmente como informações certamente dependerá melhores universidades públicas para conjunto de instituições e para de que o conjunto dos participantes americanas, como Rutgers, Universi- o sistema como um todo. Como o seja representativo de todos os cur- dade do Texas-Austin, de Michigan- programa é aplicado todos os anos, sos e grupos que compõem o seu Ann Arbor, da Carolina do Norte forma-se uma sequência de dados quadro discente. Assim, a Unicamp – Chapel Hill, de Minnesota, da que permitem análises que levam incentiva fortemente a participação Virgínia, de Pittsburgh, da Flórida, em conta mudanças tanto oriundas de todos, para que possamos ter entre outras. da estrutura das instituições como uma ideia mais precisa de da população estudantil em como os estudantes veem a transformação. Esses resul Programe-se Universidade. Para incentitados vêm sendo utilizados Período das entrevistas: de 21/05 a 13/07 var a participação dos estupara o aprimoramento dos Os estudantes receberão uma mensagem no endereço dantes, a Unicamp sorteará, serviços das universidades, eletrônico institucional (RA) com instruções e senha entre os que completarem o dos programas dos cursos, e Aqueles que não receberem a mensagem até 25/05 questionário, cinco prêmios, até mesmo da forma em que deverão enviar um mail para veup@reitoria.unicamp.br para compostos por um conjunto as aulas e o espaço físico são solicitar a senha de livros da Editora da Uniorganizados.
O principal aspecto do VEUP é que a Unicamp, pela primeira vez, ouvirá seus estudantes de graduação de forma bastante detalhada, envolvendo praticamente todos os aspectos da vida universitária, utilizando um instrumento que já vem sendo testado há vários anos em instituições bastante semelhantes à nossa. A Unicamp já tem buscado fazer isso, com relação às atividades em sala de aula, seja no modelo do questionário preenchido em sala para cada disciplina, seja pelo Programa de Avaliação de Graduação (PAG), em desenvolvimento pelo Espaço de Apoio ao Ensino e Aprendizagem (EA2), órgão da PRG dedicado às questões de ensino na Unicamp. Os dados obtidos via VEUP e PAG deverão ser integrados, assim como aqueles fornecidos pelo Enade, permitindo à Unicamp localizar problemas, idealizar e desenvolver projetos de aprimoramento da graduação em todos os seus aspectos e momentos, do ingresso à colação de grau. A diversidade de avaliações é fundamental para que não se limitem as possibilidades e para que não haja interpretações que foquem apenas alguns dos aspectos da vida estudantil na Universidade. O VEUP vem trazer novas dimensões, seus resultados serão avaliados cuidadosamente por uma comissão de especialistas, a partir da perspectiva do aprimoramento da graduação na Unicamp. 1 http://cshe.berkeley.edu/research/seru/ papers.htm 2 Douglass, J.A., Thomson, G., Zhao, C.-M., The learning outcomes race: the value of selfreported gains in large research universities, Higher Education, 2012. http://www.springerlink.com/content/hhwt366w82615354/
Marcelo Knobel é pró-reitor de Graduação; Renato H.L. Pedrosa é coordenador do Grupo de Estudos em Educação Superior (GEES) do Centro de Estudos Avançados (CEAv) da Unicamp
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas Reitor Fernando Ferreira Costa Coordenador-Geral Edgar Salvadori De Decca Pró-reitor de Desenvolvimento Universitário Paulo Eduardo Moreira Rodrigues da Silva Pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários João Frederico da Costa Azevedo Meyer Pró-reitor de Pesquisa Ronaldo Aloise Pilli Pró-reitor de Pós-Graduação Euclides de Mesquita Neto Pró-reitor de Graduação Marcelo Knobel Chefe de Gabinete José Ranali
Elaborado pela Assessoria de Imprensa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Periodicidade semanal. Correspondência e sugestões Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, CEP 13081-970, Campinas-SP. Telefones (019) 3521-5108, 3521-5109, 3521-5111. Site http://www.unicamp.br/ju. E-mail leitorju@reitoria.unicamp.br. Twitter http:// twitter.com/jornaldaunicamp Coordenador de imprensa Eustáquio Gomes Assessor Chefe Clayton Levy Editor Álvaro Kassab (kassab@reitoria.unicamp.br) Chefia de reportagem Raquel do Carmo Santos (kel@unicamp.br) Reportagem Carmo Gallo Neto, Isabel Gardenal, Luiz Sugimoto, Maria Alice da Cruz, Manuel Alves Filho, Patricia Lauretti e Silvio Anunciação Editor de fotografia Antoninho Perri Fotos Antoninho Perri e Antonio Scarpinetti Coordenador de Arte Luis Paulo Silva Editor de Arte Joaquim Daldin Miguel Vida Acadêmica Hélio Costa Júnior Atendimento à imprensa Ronei Thezolin, Patrícia Lauretti e Jaqueline Lopes Serviços técnicos Dulcinéa Bordignon Everaldo Silva Impressão Pigma Gráfica e Editora Ltda: (011) 4223-5911 Publicidade JCPR Publicidade e Propaganda: (019) 3327-0894. Assine o jornal on line: www.unicamp.br/assineju
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Campinas, 21 a 27 de maio de 2012
Potável,
Pesquisa acusa presença de contaminantes emergentes na água fornecida em 16 capitais brasileiras
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porém contaminada
Fotos: Antonio Scarpinetti
MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br
água potável fornecida em 16 capitais brasileiras, onde vivem aproximadamente 40 milhões de pessoas, apresenta contaminação por substâncias ainda não legisladas, mas que podem ser potencialmente nocivas à saúde humana. A constatação é de uma pesquisa desenvolvida pelo Instituto Nacional de Ciências e Tecnologias Analíticas Avançadas (INCTAA), que está sediado no Instituto de Química (IQ) da Unicamp, em colaboração com outras instituições. Os pesquisadores identificaram, por exemplo, a presença de cafeína em todas as 49 amostras coletadas no cavalete (cano de entrada) de residências espalhadas pelas cinco regiões do país. “Esse dado é relevante, pois a cafeína funciona como uma espécie de traçador da eficiência das estações de tratamento de água. Ou seja, onde a cafeína está presente, há grande probabilidade da presença de outros contaminantes”, explica o professor Wilson de Figueiredo Jardim, coordenador do estudo e do Laboratório de Química Ambiental (LQA) do IQ. Além de cafeína, os cientistas também encontraram nas amostras analisadas concentrações variadas de atrazina (herbicida), fenolftaleína (laxante) e triclosan (substância presente em produtos de higiene pessoal). No caso da cafeína, as duas capitais que apresentaram maiores níveis de contaminação pela substância foram, respectivamente, Porto Alegre e São Paulo. “A liderança de Porto Alegre nesse ranking foi uma surpresa. Há uma hipótese para explicar a situação, mas ela evidentemente depende de confirmação. Segundo essa conjectura, a contaminação estaria ocorrendo porque os gaúchos são grandes consumidores de erva mate, que, por sua vez, tem grande concentração de cafeína. Independentemente da origem, a presença da cafeína na água fornecida aos porto-alegrenses e aos demais moradores das capitais consideradas no estudo demonstra que os mananciais estão contaminados por esgoto e que as estações de tratamento não estão dando conta de remover este e outros compostos do produto que chega às torneiras das residências. Ou seja, é a prova inequívoca de que estamos praticando o reúso de água há muito tempo”, explica o docente da Unicamp. De acordo com Wilson Jardim, por não serem legislados, esses contaminantes emergentes – são emergentes não porque são novos, mas porque estão cada vez mais presentes no ambiente – não são monitorados com frequência. Ademais, a ciência ainda não sabe ao certo qual o limite de proteção ao ser humano e nem que efeitos deletérios eles podem causar ao organismo do homem. “Entretanto, já dispomos de estudos científicos que apontam que esses compostos têm causado sérios danos aos organismos aquáticos. Está comprovado, por exemplo, que eles podem provocar a feminização de peixes, alteração de desenvolvimento de moluscos e anfíbios e decréscimo de fertilidade de aves”, elenca o professor da Unicamp. Quanto aos humanos, prossegue Wilson Jardim, há indícios de que os contaminantes não legislados, especialmente hormônios naturais e sintéticos, como o estrógeno, podem provocar mudanças no sistema endócrino de homens e mulheres. Uma hipótese, que carece de maiores estudos, considera que esse tipo de contaminação poderia estar contribuindo para que a menarca (primeira menstruação) ocorra cada vez mais cedo entre as meninas. “Estabelecer esse nexo causal é difícil. Entretanto, temos que estar atentos para problemas dessa ordem. Acredito que, com o tempo, os contaminantes emergentes também terão que ser legislados.
O professor Wilson Jardim: “A presença da cafeína demonstra que os mananciais estão contaminados por esgoto e que as estações de tratamento não estão dando conta de remover este e outros compostos da água”
camente. Antes, uma pessoa usava, em média, três produtos de higiene pessoal antes de sair de casa. Hoje, usa dez. Há alguns anos, as pessoas passavam filtro solar apenas para ir à praia e à piscina. Agora, muita gente passa diariamente para ir trabalhar, inclusive por recomendação médica”, exemplifica.
Pesquisadora opera um dos equipamentos responsáveis pela análise da qualidade da água: trabalho será estendido para as demais capitais
O trabalho que estamos realizando tem por objetivo exatamente fornecer subsídios para a formulação de políticas públicas que possam assegurar à população o fornecimento de uma água potável de maior qualidade”, diz. Na opinião do especialista, o melhor caminho a seguir, num primeiro momento, é dar continuidade às pesquisas com vistas ao estabelecimento de normas que concorram para preservar o ambiente. “Esse tema será discutido em congresso científico que será realizado brevemente. A Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental [ABES] tem refletido sobre essa questão e deverá formular uma proposta de limiares de proteção da vida aquática. O passo seguinte, acredito, deverá estender esses parâmetros em relação ao ser humano”, prevê o docente. Conforme Wilson Jardim, o trabalho de análise da água potável fornecida nas 16 capitais contou com a participação de 25 pesquisadores das seguintes instituições, além da Unicamp: Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) e Universidade Federal do Paraná (UFPR). Depois de coletarem as amostras de água nos cavaletes das residências, seguindo procedimentos previamente estabelecidos, os pesquisadores as enviaram à Unicamp, onde as análises químicas foram realizadas. Os métodos analíticos empregados atualmente, destaca Wilson Jardim, são bastante precisos. Tanto é assim que determinados contaminantes foram identificados em concentrações equivalentes a nanogramas por litro. Um dado interessante proporcionado pelo estudo, segundo o professor da Unicamp, é que as capitais costeiras,
como Florianópolis, Vitória e Rio de Janeiro, apresentaram níveis de contaminação inferiores às demais. A explicação para isso, cogita o especialista, é o fato de esses municípios lançarem parte do esgoto diretamente no mar. “Desse modo, os rios de onde a água é captada para posterior fornecimento à população apresentam concentrações inferiores de poluentes”, argumenta. No caso do Brasil, insiste o docente, a alternativa de curto prazo para enfrentar esse tipo de problemática é estabelecer novos valores de referência para a potabilidade da água. Wilson Jardim lembra que já existem tecnologias disponíveis capazes de remover os contaminantes não legislados. A própria lei brasileira, segundo ele, estabelece que as concessionárias de água devem adotar métodos de polimento mais sofisticados contra substâncias potencialmente nocivas, mesmo que elas não estejam legisladas. “É claro que um investimento desse tipo pode encarecer o custo de produção da água potável. Entretanto, temos que considerar que determinados compostos acarretam custos sociais ainda maiores, visto que podem trazer sérias sequelas não apenas ao ser humano exposto, com também aos seus descendentes”, pondera. Wilson Jardim assinala que, se olharmos o cenário mundial, perceberemos que até mesmo os países que tratam 100% do seu esgoto enfrentam problemas de contaminação da água potável. Isso decorre de uma série de fatores, entre os quais o crescimento e adensamento populacional e a chegada ao mercado de novas substâncias. “Estudos indicam que 1.500 substâncias são lançadas anualmente no mundo. São moléculas novas, às quais não estamos tendo tempo de estudar. Além disso, o padrão de consumo da sociedade tem crescido freneti-
Continuidade De acordo com Wilson Jardim, as pesquisas em torno da qualidade da água potável das capitais brasileiras terá continuidade. O INCTAA CAPITAIS vai se dedicar PESQUISADAS ao tema por mais dois anos. Belo Horizonte Nesse período, os pesquisadoCuiabá res trabalharão em duas frentes. Curitiba PrimeiramenDistrito Federal te, as análises realizadas nas Florianópolis 16 primeiras Fortaleza cidades serão repetidas, para Goiânia verificar se João Pessoa houve alguma alteração. Em Natal seguida, o traPalmas balho será estendido para as Porto Alegre demais capitais. “Queremos traPorto Velho çar um panoraRecife ma geral do país por intermédio Rio de Janeiro desses municíSão Paulo pios. Penso que temos prazo Vitória suficiente para concluir essa tarefa”, calcula o docente da Unicamp. Ele informa que os estudos realizados pelo Laboratório de Química Ambiental (LQA) em conjunto com o INCTAA já têm contribuído para que as concessionárias considerem promover melhorias em seus sistemas de tratamento de água. Em Campinas, por exemplo, a Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento S/A (Sanasa) demonstrou interesse em adotar novas tecnologias que possam reduzir a presença de contaminantes não legislados na água fornecida aos campineiros. Além da Sanasa, outras concessionárias do Estado de São Paulo também estão iniciando conversações com Wilson Jardim com o mesmo propósito.
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Campinas, 21 a 27 de maio de 2012
FEA desenvolve
açúcar funcional Fotos: Antoninho Perri
Metodologia permite produção em larga escala de alimento cujas propriedades são prebióticas
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ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br
stá disponível para o setor industrial uma metodologia inédita de reação enzimática que permite produzir em larga escala um tipo de açúcar conhecido como FOS (fruto-oligossacarídeos). Considerado alimento funcional (também chamado prebiótico), ele traz benefícios à saúde, além de ter propriedades nutritivas. A metodologia emprega uma liga de nióbio (um minério usado em alguns tipos de aços inoxidáveis) e de grafite para imobilizar a enzima de interesse, a qual acaba de gerar um registro de patente no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi). O produto tem potencial para substituir com benefícios outros oligossacarídeos tidos como fibras solúveis, como a inulina por exemplo. Não engorda, não provoca cáries e ajuda o trânsito intestinal, já que passa direto pelo trato digestivo alojando-se no intestino. Segundo a doutoranda e autora da pesquisa Elizama Aguiar de Oliveira, da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA), a escolha do nióbio é oportuna, já que o Brasil é o maior produtor desse minério no mundo. As suas jazidas são enormes e estão mais concentradas no Estado de Minas Gerais, na Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração, próxima da região de Araxá, e no Estado do Rio de Janeiro, na Companhia Fluminense. Ocorre que o nióbio nacional em geral é exportado para outros países por inexistir uma estrutura que incentive a sua permanência no mercado interno. Os seus destinos mais comuns são a Agência Espacial NorteAmericana (Nasa), mostrando aplicações em espaçonaves, e a mesa cirúrgica, nos implantes. “Como não representa mal algum como implante, ele certamente pode ser aplicado na indústria de alimentos”, avalia a autora da tese. Imobilizando-se a enzima nesse minério, evita-se que ela se dissolva no meio; e, ao esvaziar o reator na etapa de laboratório, o resultado é um xarope rico em oligossacarídeos, sacarose, frutose e glicose. A fase seguinte é a de purificação até culminar com o seu encaminhamento para o setor industrial, quando vários produtos com FOS poderão ser processados. Embora largamente disseminados na natureza em uma gama de frutas, folhas e vegetais, como a alcachofra, a cebola, a banana e o mel, entre outros, os FOS ainda não conseguem ser metabolizados pelos seres humanos, como acontece com o açúcar comum, por constituírem uma molécula muito grande e que precisa ser quebrada em partículas menores com enzimas específicas, não existentes no organismo humano, para ter seu total aproveitamento.
Setor industrial A autora do trabalho e o seu orientador, Francisco Maugeri Filho, pensaram em oferecer um projeto totalmente nacional para a indústria, já que, além da matéria-prima, o microrganismo empregado na pesquisa, e produtor da enzima, é originário da Mata Atlântica. Foi isolado em uma investigação de doutorado da FEA a partir de amostras de flores e frutos, sendo inicialmente caracterizado como levedura. O microrganismo isolado cresce em resíduos da indústria alimentícia como o melaço de cana e a água de maceração de milho. A sacarose então é empregada como substrato para a enzima, que polimeriza a
Elizama Aguiar de Oliveira, autora da pesquisa: xarope é rico em sacarose, frutose e glicose
O açúcar desenvolvido: potencial para substituir com vantagem outros oligossacarídeos
sua frutose, permitindo que os FOS sejam formados. “O que é resíduo para a indústria é matéria-prima para a pesquisa”, compara a engenheira. Ela contextualiza que, mesmo com a riqueza de FOS no país, eles não são praticamente processados aqui. A maioria do que é hoje consumido vem da Europa, do Japão e dos Estados Unidos, lugares em que os fruto-oligossacarídeos são ingeridos de uma forma mais variada e há mais tempo. Os brasileiros que planejam adquirir esse açúcar, lamenta a autora da tese, ainda terão que pagá-lo mais caro por um tempo e comprá-lo sem que esteja agregado aos alimentos. Por isso é importante estudar uma metodologia que contemple a sua produção nacionalmente, encoraja ela. A engenheira reconhece que, com o ritmo frenético da vida atual, realmente fica difícil ter uma dieta superbalanceada, mesmo porque a extração dos FOS direto de suas fontes primárias exigiria uma grande quantidade de matéria-prima (sacarose, nióbio, melaço). “Seriam necessárias toneladas e mais toneladas para atingir uma produção significativa”, assinala. No Japão, há cerca de 20 anos os FOS são vendidos em diversos produtos como os chicletes, sorvetes, biscoitos, doces e sucos, sobretudo dentro da linha de alimentação infantil e animal. “A nossa ideia é propor o seu uso ao setor industrial para que fabrique exclusivamente os FOS, que venda a outras indústrias de alimentos ou então que a própria indústria produza alimentos tendo FOS
como base”, sugere a pesquisadora. O Brasil, expõe ela, dispõe no momento de algumas tecnologias de extração química de FOS. No entanto, elas têm derivado diversos reagentes tóxicos. É o que acontece por exemplo com a extração da chicória, que é por demais complexa e com efeitos indesejados como esse. Por outro lado, com tecnologias como a de reação enzimática, aponta Elizama, com um único lote de enzimas consegue-se produzir uma infinidade de FOS, que pode ser usada por dias, semanas ou meses, ao invés de extraí-los de um lote de chicória, cujo rendimento não é alto. “Além disso, com a tecnologia de reação enzimática, é possível trabalhar com manipulação, fazendo com que a enzima trabalhe a nosso favor, criando-se um produto almejado tanto na quantidade quanto na velocidade e controlando melhor o processo”, garante a doutoranda.
Consumo Os FOS exibem um poder higroscópico muito elevado, com uma capacidade de absorver a umidade mais rapidamente do que o açúcar de mesa. “Ocorre que, como é pouco adotado para uso culinário, o ideal seria a sua introdução nos alimentos processados, o que possibilitaria controlar a sua adição”, ensina. Normalmente o que as pessoas fazem é consumir os FOS puros, em colheradas, ou então dissolvidos em água. Na verdade, afirma Elizama, estarão consumindo FOS
do mesmo jeito. Fala-se hoje na ingestão de uma cota de oito a dez gramas por dia, informa, mas esse é um parâmetro que deve ser avaliado de pessoa para pessoa. Acima desses valores, há um crescimento exagerado dos microrganismos no intestino, ocasionando um quadro de desconforto, que inclui diarreia. Também, quando acrescentados em excesso, podem se formar aglomerados que não permitem adoçar como o esperado. “É necessário consumi-los com regularidade em doses menores ou processados”, sugere a pesquisadora. Os FOS não são tão doces quanto o açúcar de mesa (têm cerca de 60% da doçura da sacarose), porém são mais finos e mais brancos. Mesmo a produção do açúcar comum sendo mais barata, ele tem outros inconvenientes além de causar a cárie dentária e engordar. Em excesso, representam perigo à saúde. “Se é possível obter doçura semelhante com outro componente que não a sacarose, é melhor”, avisa Elizama, principalmente abordando a obesidade. “As pessoas não engordam com FOS porque não são digeridos pelo organismo. Somente viram alimento numa determinada parte do intestino para microrganismos específicos denominados probióticos (a favor da vida), que se mostram extremamente proativos”, explica a doutoranda. À medida que se alcança um maior número desses microrganismos, o trânsito intestinal fica mais fácil, existe a sensação de bem-estar e acontece uma maior recuperação por gripes, resfriados e tratamento pós-cirúrgico. Em oposição, quando as pessoas não estão cuidando da sua alimentação, podem estar favorecendo a microflora putrefativa, que tende a formar substâncias tóxicas. “O bom de se consumir FOS é que eles auxiliam o crescimento de microrganismos probióticos”, conta a doutoranda. Além do mais, os FOS possuem um sabor doce sem provocar consequências indesejadas, como as cáries, isso porque os microrganismos que ficam alojados na boca – os promotores das cáries – não conseguem consumi-los.
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Tese: “Estudos sobre as propriedades catalíticas da frutosiltransferase de Rhodotorula sp. livre e imobilizada em suporte inorgânico” Autora: Elizama Aguiar de Oliveira Orientador: Francisco Maugeri Filho Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)
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Campinas, 21 a 27 de maio de 2012
Fotos: Antonio Scarpinetti
Grupo analisa materiais que podem ser usados como fontes de geração de energia LUIZ SUGIMOTO
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sugimoto@reitoria.unicamp.br
professora Katia Tannous, da Faculdade de Engenharia Química (FEQ), orienta um grupo de pesquisadores que avaliam tipos de biomassa disponíveis no Brasil como fontes alternativas para geração de energia. Foi com este objetivo que o físico Francisco Otávio Miranda Farias, professor do Centro de Estudos Superiores de Parintins, da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), abordou em sua tese de mestrado seis biomassas de diferentes regiões do país: a casca de arroz do Sul, o bagaço de cana do Sudeste, a fibra de coco do Nordeste, a madeira caixeta do Centro-Oeste e do Norte, o ouriço de castanha do Brasil e a madeira jequitibá rosa. Segundo Katia Tannous, que orientou a pesquisa, as seis biomassas mostraram grande potencial para fins de aproveitamento energético, mas ela pondera que a geração de energia é o processo final de uma planta química. “Para garantir alta eficiência no processo, é preciso que a biomassa esteja em condições apropriadas. Existe um nível de complexidade nos estudos, por conta de questões tecnológicas envolvendo a transformação das biomassas em energia, seja elétrica ou como combustível sólido, líquido ou gasoso. O grande desafio é o conhecimento fundamental da matéria-prima com que iremos trabalhar”. A pesquisadora explica que este processo químico começa com o resgate da matéria-prima no meio ambiente (cadastramento das biomassas), passando ao pré-tratamento (moagem e separação) e depois à etapa físicoquímica (secagem). “No caso das madeiras, por exemplo, não vamos derrubar árvores e sim recuperar resíduos produzidos em indústrias moveleiras ou mesmo podas de árvores no meio urbano. A serragem, o pó mais fino gerado na fabricação de móveis, é um grande contaminante do meio ambiente que podemos aproveitar transformando-a em um granulado maior, como os chamados peletes. No momento, nosso interesse é a obtenção de uma madeira triturada para que consigamos caracterizá-la dentro das técnicas disponíveis no laboratório.” A casca de arroz e o bagaço de cana, por outro lado, advêm de processamento agroindustrial, ao passo que a casca do coco verde é simplesmente descartada depois de consumida sua água (albúmen líquido), o mesmo acontecendo com o ouriço da castanha do Brasil depois de extraídas as sementes. “A casca do coco verde é um resíduo bastante poluidor. No entanto, devido à alta resistência, sua fibra já vem sendo utilizada em parte no estofamento de veículos e na manufatura de colchões – destino mais nobre do que apenas queimá-la. É o que também buscamos com estas caracterizações, mapeando as biomassas para outras finalidades”, observa Katia Tannous. Para se projetar um conversor químico – como um combustor ou gaseificador – é importantíssimo que o material a ser utilizado tenha padronizações. O trabalho de Francisco Farias foi de grande abrangência ao envolver as caracterizações física, química e térmica das seis biomassas, bem como de escoabilidade – parâmetro importante para transporte (escoamento de sólidos) – e de estocagem em silos. “O interesse dele, que vive na região amazônica, é o fornecimento de energia elétrica a um custo compatível para as comunidades ribeirinhas. A estimativa é de que 1,5 milhão de brasileiros
Biomassas de madeira (à esq.) e de ouriço da sapucaia: análise do potencial das matérias-primas
Uma ‘usina’ de
biomassas
A professora Katia Tannous, orientadora do grupo de pesquisadores: investigando novas fontes renováveis
ainda não possuem energia elétrica em casa”, diz a orientadora da tese.
Passos no laboratório Em seu laboratório na FEQ, a docente apresenta amostras de outras biomassas, como de eucalipto proveniente de reflorestamento no Sudeste e de ouriço da sapucaia (castanha da região Norte), que vêm sendo estudadas por outros alunos de graduação e de mestrado, dando continuidade ao trabalho de Farias e aprofundando as particularidades de cada etapa deste grande projeto. “A primeira etapa é a recepção da matéria-prima, que é trazida de outra região ou gerada na própria planta industrial, a exemplo do bagaço de cana. Em geral, as biomassas são estocadas em pilhas no próprio pátio e armazenadas em silos após o pré-tratamento mecânico (quando for o caso). Um problema é que, depois de moído, o material ganha novas propriedades físicas, como na sua forma, ou especificamente com a madeira, na largura, comprimento e espessura. A questão é como deslocar facilmente esse novo material até o processo de conversão.”
Por isso, observa Katia Tannous, o próprio processo de estocagem já representa um desafio, visto que o silo é somente um reservatório, necessitando de instrumentos auxiliares para o transporte do material. “A idéia, então, é caracterizar a matéria-prima para que ela tenha a propriedade de se deslocar por si só (como por gravidade), até a próxima etapa do processo. Estudamos vários parâmetros e metodologias a fim de determinar o ângulo de repouso (escorregamento) da biomassa, onde ele será aplicado na confecção da base cônica do silo. As técnicas diferem e é importante diagnosticar quais resultados podem ser aplicados para cada biomassa.” Da estocagem e transporte passa-se à unidade de secagem, pois é sabido que o poder calorífico da biomassa é dependente do teor de umidade. O processo de secagem pode ser feito através da tecnologia de leito fluidizado, onde o material particulado entra em contato com um gás quente que elimina a umidade existente na amostra. A mesma tecnologia é muito utilizada nas indústrias de petróleo, farmacêutica e de minério, por sua alta eficiência. “As
biomassas são consideradas difíceis de suspender e por isso, em muitos casos, usa-se um material inerte, como areia, para auxiliar na sua movimentação e tornar mais eficiente o processo”, explica a docente da FEQ. Ela informa, a título de ilustração, que a madeira do jequitibá rosa e a casca de arroz não se sustentam dentro do reator, necessitando de um suporte para se movimentar e promover uma troca térmica eficiente. “Se processarmos apenas a casca, criam-se canais preferenciais e o material fica estacionado. Há biomassas mais complicadas de manusear, por causa de uma estrutura química mais complexa, como é o caso da casca de arroz, que possui alto teor de cinzas (15%) e se solidifica em temperatura elevada.” Katia Tannous acrescenta que leitos fluidizados permitem a obtenção das condições ótimas de operação, mediante o controle das vazões de ar, pressão e temperatura do sistema. Agora, quando se fala em mistura entre materiais distintos, sem condições de operação controláveis nos geradores, a separação entre a biomassa e o inerte é inevitável – situação geralmente des-
favorável para obtenção do material energético. “Cada material apresenta uma particularidade e temos que fazer trabalhos experimentais, já que a literatura não nos traz estas informações. Também queremos evitar o arraste de materiais poluentes para o meio ambiente de onde já foram resgatados.”
Planta térmica A professora da FEQ anuncia que o próximo passo em laboratório será a montagem do que chama de planta térmica, exatamente para gerar energia com estas biomassas que estão devidamente caracterizadas. “São todas biomassas com grande potencialidade, tanto que Francisco Farias dará continuidade à pesquisa no doutorado, procurando fechar a cadeia de produção. Ele deve usar estas e outras matérias-primas que já estamos resgatando na região Norte. Uma das possibilidades é o ouriço da sapucaia, que largam no ambiente depois de retirar a castanha, quando não o queimam em fornos justamente para secar o fruto. A ideia é evitar o deslocamento de materiais, fazendo com que as próprias comunidades montem uma pequena unidade de geração de energia elétrica em suas regiões.” Segundo a pesquisadora, devido ao curto tempo para a realização de um mestrado e à diversidade e amplitude do tema, outros alunos de graduação e pós-graduação estão complementando e inovando os trabalhos já iniciados. “A tese de doutorado de Vadson Bastos do Carmo, por exemplo, discutirá a questão custo-benefício na utilização de um conjunto de biomassas para geração de energia durante a entressafra nas usinas de cana-de-açúcar. É preciso um volume muito grande de matériaprima para gerar a mesma quantidade de energia elétrica vinda de uma fonte não renovável.” Katia Tannous considera que seu grupo está cada vez mais estimulado a estudar novas fontes renováveis, por acreditar que está contribuindo para a melhoria do meio ambiente e o desenvolvimento do país. “Sabemos que, a curto e médio período de tempo, precisaremos de alternativas para ter uma cadeia energética equilibrada.”
............................................................. ■ Publicação
Tese: “Estudo da potencialidade energética de biomassas vegetais brasileiras: caracterização e escoabilidade” Autor: Francisco Otávio Miranda Farias Orientação: Katia Tannous Unidade: Faculdade de Engenharia Química (FEQ)
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NÃO É O QU
Investigações de pesquisadores do e do mercado transnacional do sexo revelam e lançam luz sobre temas nã
Para além da lei da oferta e da procura Foto: Antoninho Perri
SILVIO ANUNCIAÇÃO
E
silviojp@reitoria.unicamp.br
studos etnográficos recentes desenvolvidos por pesquisadores da Unicamp e de universidades internacionais e nacionais, mensuram o peso das articulações entre o sexo, o dinheiro e o afeto na mobilidade de pessoas. Os trabalhos exploram diferentes aspectos, ainda pouco analisados na academia, envolvendo estes deslocamentos e o chamado mercado do sexo. As investigações abarcam, sobretudo, a circulação entre os habitantes do Brasil, Espanha, Itália, Portugal e Estados Unidos. Para a antropóloga da Unicamp Adriana Gracia Piscitelli, pesquisadora do Núcleo de Estudos do Gênero Pagu, os estudos “alargam” a noção de “geografias de poder marcadas pelo gênero”, estabelecida em 2001 pelas teóricas norte-americanas Sarah Mahler e Patrícia Pessar. Apesar de fundamental para os avanços nos estudos de gênero, esse conceito tende a restringirse a relações entre homens e mulheres. São raras, segundo Piscitelli, as pesquisas que consideram as experiências de deslocamentos de pessoas “que embaralham as fronteiras entre masculinidade e feminilidade, como as das travestis”. Um exemplo relevante para este entendimento é a relação que turistas gays estrangeiros, principalmente dos Estados Unidos, estabelecem com garotos de programa do Rio de Janeiro que se autoidentificam como heterossexuais e que possuem namoradas ou esposas e, às vezes, filhos. “Estes turistas acabam, de alguma maneira, se integrando à família desses homens, tornando-se padrinhos dos seus filhos e enviando remessas de dinheiro para ajudar sua família. E esses homens que se consideram heterossexuais dizem que não se apaixonam por esses estrangeiros, contudo, ao longo dos anos, vão criando sentimentos de carinho e de gratidão pela ajuda recebida. Com travestis, as relações são ainda mais surpreendentes, como aquelas entre travestis brasileiras e seus maridos italianos”, revela. A estudiosa do Pagu reuniu mais de uma dezena de pesquisas acerca do tema no livro Gênero, sexo, amor e dinheiro: mobilidade transnacionais envolvendo o Brasil, que acaba de ser lançado no âmbito do programa de doutorado em Ciências Sociais do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH). A obra também é organizada pelos pesquisadores do Pagu José Miguel Nieto Olivar e Gláucia de Oliveira Assis, atualmente, professora da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Adriana Piscitelli lidera na Unicamp linha de pesquisa sobre sexualidade que vem produzindo desfechos relevantes nos estudos nacionais e internacionais ao longo dos últimos 13 anos. Os resultados exigem, segundo ela, uma nova conceitualização sobre o termo “mercado do sexo”. A antropóloga defende, com base em resultados empíricos, que a expressão não pode se resumir ao conceito que supõe apenas a oferta e a demanda por sexo.
Os pesquisadores José Miguel Nieto Olivar e Adriana Gracia Piscitelli: novas abordagens sobre as articulações entre o sexo, o dinheiro e o afeto
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Livro: Gênero, sexo, amor e dinheiro: mobilidade transnacionais envolvendo Brasil Organizadores: Adriana Piscitelli, Glaucia de Oliveira Assis e José Miguel Nieto Olivar Editado pelo Núcleo de Estudos de Gênero Pagu (IFCH) E-book: http://www.pagu.unicamp.br/sites/www.ifch.unicamp.br.pagu/files/Livro.pdf Páginas: 582
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Deste modo, ela questiona a ideia de que o turismo sexual esteja restrito somente à prostituição, no sentido da realização de ‘programas’. “Embora uma parcela da população envolvida em turismo sexual faça programas, existe também outra grande parcela que não faz. Atualmente se fala na indústria do sexo, pensada em uma sofisticada organização de empreendimentos, como hotéis, indústria turística e internet e que gera muitos lucros. Mas nas pesquisas empíricas que realizei por diversos anos, principalmente no Nordeste do Brasil, eu me encontrava com uma oferta de sexo comercial quase artesanal. Esta oferta, às vezes, remetia à prostituição, mas muitas vezes não. Havia também intercâmbios sexuais e econômicos que não envolviam dinheiro, mas outros tipos de benefícios e que operavam como um lugar de afeto. Ou seja, trocas nas quais quem oferece sexo é ajudado, se apega, se acarinha…”, analisa. Outra conclusão importante dos trabalhos é a que questiona as visões que consideram todos esses deslocamentos como tráfico de mulheres para exploração sexual. A migração de brasileiras para atuarem no mercado do sexo nos Estados Unidos e países da Europa está ligada, principalmente, à busca de oportunidades, sejam elas econômicas ou sociais, afirma a antropóloga. “O termo ‘exploração’ remete a uma ideia de trabalho forçado. Mas isso nem sempre ocorre e não foram essas as percepções demonstradas pelas minhas entrevistadas na Espanha. O maior medo de muitas delas era da polícia migratória e não das redes de tráfico. Tendemos a pensar a prostituição e o mercado do sexo como se fossem fechados. Nos dois países onde pesquisei, na Itália e
Espanha, eu percebi que as brasileiras eram uma presença significativa no mundo do trabalho sexual, mas elas também constituíam um dos principais contingentes de estrangeiras que casavam com italianos e espanhóis. Comecei, então, a notar que também existia uma forte imbricação entre os mercados do casamento e do sexo”, relata.
Vitimização Seguindo na linha de Piscitelli, o pósdoutorando José Miguel Nieto Olivar explica que para muitas mulheres a prostituição constitui-se num campo de potencialização da autonomia. “A prostituição se configura em relações nas quais muitas mulheres podem exercer mais poder sobre suas vidas ou reduzir a violência. Eu tenho várias narrativas de mulheres que antes de entrarem na prostituição tinham relações conjugais fortemente marcadas pela violência. Ao saírem dessas relações e entrarem na prostituição por sua conta própria, elas relatam que têm menos violência e lidam melhor com isso porque não dependem de ninguem”, confirma. Olivar desenvolve seu pós-doutorado pesquisando o universo das prostitutas na região do Alto Solimões, na tríplice fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia. “Trabalha-se com ideias muito fixas sobre prostituição e mercado do sexo, principalmente nos espaços políticos e da mídia. E, nestes sistemas de pensamento, o lugar da prostituta como vítima e/ou perversa é muito forte. Ou, então, é o empresário que é naturalmente perverso. O que estamos construindo e tentado colocar nas discussões no âmbito acadêmico e político são as vozes dessas pessoas. Nós tentamos fornecer dados para complexificar essas discussões, no sen-
tido de reconhecer experiências de vidas que são válidas, mas que muitas vezes são apagadas”, crítica Olivar. Por outro lado, Adriana Piscitelli admite as dimensões de violências que estão presentes na prosituição e no mercado do sexo. “Há dimensões de violência e de sofrimentos das pessoas, vinculadas, nas minhas pesquisas, ao pavor das brasileiras à polícia migratória e ao que elas viam como maus tratos para além da deportação. Há também o fantasma com a violência dos clientes, principalmente entre aquelas que faziam trabalhos sexuais em apartamento. Uma coisa é levar em conta essas dimensões de violência; outra, é considerar essas pessoas, a priori, como vítimas. Minhas entrevistadas não se consideram vítimas… Para muitas, o trabalho sexual e a migração faziam parte de estratégias, em seus projetos de vida, que, em algumas vezes, foram bem sucedidas e, em outras, não”, conclui.
Sexualidade tropical A antropóloga também constatou que a imagem de uma brasilidade tropical, difundida no exterior como um atributo sexual, não justificava a demanda por sexo com as mulheres brasileiras na Espanha. Piscitelli afirma que elas “desapareciam” enquanto singularidade e nacionalidade nesse contexto. Para justificar sua proposição, a pesquisadora cita a dinâmica de funcionamento das casas de sexo da Espanha, onde há uma lógica de selecionar as mulheres seguindo certa hierarquia. “No topo estavam as espanholas. Depois, as mulheres do leste Europeu, que eram tidas como mais cultas e mais eficientes. No meio havia uma faixa com as latino-americanas e, por último, as africanas negras. E as brasileiras eram englobadas no leque mais amplo de latinoamericanas. E, lutando para se posicionar neste mercado e atrair clientes, o que as brasileiras acabavam afirmando não era nem a morenice, nem a sexualidade tropical, mas atributos relacionados à higiene e carinho. E os critérios dos clientes também não privilegiavam nenhuma nacionalidade”, demonstra. Obra O livro Gênero, sexo, amor e dinheiro: mobilidade transnacionais envolvendo Brasil, também publicado no formato e-book, envolve pesquisas em parcerias com estudiosos de universidades internacionais e nacionais. Entre as estrangeiras estão a Universidade de Northwestern (EUA), a Universidade de Milão (Itália) e o Instituto Universitário de Lisboa (Portugal). Das nacionais, participam a Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Estadual Paulista (Unesp), Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Universidade do Vale do Rio Doce (Univale) e Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). A obra, de acordo com Piscitelli, foi concebida a partir do seminário Trânsitos Contemporâneos: turismo, migrações, gênero, sexo, afetos e dinheiro, realizado no final de 2010 na Unicamp.
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UE PARECE
o Nepo e do Pagu acerca do aborto m nuances que embaralham o senso comum ão raro tratados como tabus
Pesquisa mensura peso do HIV no aborto
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Foto: Antoninho Perri
CRISTIANE KÄMPF Especial para o JU
ntitulado “HIV/Aids e trajetórias reprodutivas de mulheres brasileiras”, o primeiro estudo no país a analisar especificamente o aborto induzido entre mulheres vivendo com HIV traz uma revelação surpreendente: elas recorrem ao aborto induzido por razões parecidas àquelas apresentadas por mulheres não portadoras do vírus. O fato de ser soropositiva não é, portanto, o motivo central e nem mesmo o único apresentado para justificar a interrupção da gravidez. Apesar da importância do diagnóstico na decisão de abortar, para a maioria das mulheres vivendo com HIV/ Aids esta foi somente uma entre muitas outras razões de ordem social, pessoal e afetiva. Um dos aspectos mais importantes mencionados foi a relação com o parceiro: ter ou não um homem que pudesse dividir a responsabilidade de criar a criança foi um fator fundamental que influenciou a decisão de manter ou interromper a gravidez. Coordenado por Regina Maria Barbosa, médica com doutorado em saúde coletiva e especialista em saúde reprodutiva e sexual, do Núcleo de Estudos da População (Nepo) da Unicamp, o estudo foi financiado pelo CNPq e contou com a parceria do Centro de Referência em DST/Aids de São Paulo e com a participação de pesquisadores de várias instituições de pesquisa. Os dados foram obtidos por meio de dois estudos complementares: uma pesquisa transversal, implementada em 13 cidades brasileiras de novembro de 2003 a dezembro de 2004, a qual incluiu 1.777 portadoras e 2.045 não portadoras; e um estudo qualitativo que realizou, entre 2009 e 2010, entrevistas detalhadas com 85 mulheres de 18 a 47 anos, pertencentes aos estratos médios e populares da sociedade e vivendo com o vírus HIV, em seis cidades localizadas nas cinco regiões geográficas do país. Estas informações revelaram que 13,3% das portadoras já haviam recorrido ao aborto induzido, enquanto 11% das não portadoras fizeram o mesmo – uma diferença de somente 2.3%. A idade (a porcentagem de abortos induzidos por mulheres mais velhas é maior), a idade na qual as mulheres tiveram sua primeira experiência sexual (abaixo de 17 anos), a ocorrência de três ou mais parceiros durante a vida sexual e o fato de terem sofrido violência sexual foram aspectos associados ao aborto induzido nos dois grupos. Os resultados da análise sugeriram que fatores similares influenciam o processo decisório reprodutivo em ambas as situações, entre os quais: o acesso limitado a serviços de saúde reprodutiva e planejamento familiar; o desconhecimento em relação aos métodos contraceptivos (regulares e de emergência) e a iniquidade social e de gênero – como a que coloca a contracepção como responsabilidade da mulher e não do homem. A pesquisa qualitativa demonstrou
que, para a maioria das portadoras, a decisão de induzir um aborto nem sempre foi tomada pelo fato de estar infectada com o vírus HIV e este não foi o único fator determinante desta decisão. “Estas mulheres foram influenciadas por fatores que vão além do nível individual e envolvem valores culturais relacionados à maternidade, aos valores morais, relações interpessoais e circunstâncias específicas relacionadas ao HIV e à gravidez. Os resultados indicaram que há similaridades e correlações entre os contextos associados com a infecção por HIV e as práticas e decisões reprodutivas”, explica Regina. Ela enfatiza, ainda, que pesquisadores e profissionais do serviço de saúde devem considerar estes dois contextos conjuntamente para que possam entender melhor as decisões reprodutivas das mulheres que vivem com HIV/Aids e assim oferecer o suporte que elas necessitam, especialmente em casos de gravidez indesejada. O trabalho aponta que, entre os diversos fatores que contribuem para aumentar a vulnerabilidade das mulheres ao HIV, à Aids e à gravidez indesejada está na dificuldade dos profissionais da saúde de discutir abertamente desejos e necessidades sexuais e reprodutivas de mulheres e homens vivendo com HIV e ir além da mera prescrição de uso de preservativo em todas as relações sexuais. De acordo com a especialista, esta questão poderia ser resolvida com intervenções concretas, como o oferecimento de treinamento adequado e a reestruturação dos serviços de saúde. “Entender as decisões das mulheres com HIV/AIDS relacionadas à reprodução, contracepção e aborto exige pensar sobre os mais variados aspectos que interferem em suas escolhas nesta área. As mulheres optam por manter ou não uma gravidez levando em consideração fatores que vão além do desejo individual de procriar”, afirma. A linha de pesquisa do Nepo na qual o trabalho foi desenvolvido é chamada “Saúde Reprodutiva e Sexualidade” e trabalha com um conceito que compreende saúde reprodu-
tiva como um estado completo de bem-estar físico, mental e social em todos os aspectos relacionados ao sistema reprodutivo, suas funções e processos e não como a simples ausência de doença ou enfermidade. Esta linha de pesquisa faz parte do Nepo desde a data de sua criação, em 1982, é formada por pesquisadores de diferentes áreas (médicos, antropólogos, psicólogos, cientistas sociais, estatísticos) e tem contribuído de maneira determinante para a produção de conhecimentos e capacitação de recursos humanos no país. Segundo o estudo, as mulheres representam 35% dos 597 mil casos conhecidos de Aids em 2010 no Brasil, sendo que, assim como em outros países, mulheres jovens na idade reprodutiva têm sido especialmente afetadas pela epidemia de HIV. A maioria das brasileiras portadoras do vírus tem baixos níveis de educação e renda e apresenta dificuldades para negociar o uso do preservativo com seus parceiros. Elas também iniciaram a vida sexual mais cedo e, mesmo depois de diagnosticadas com o vírus, continuam com uma frequência baixa de uso da camisinha. Além disso, uma grande proporção de mulheres HIV positivas já usou drogas e tem um histórico de doenças sexualmente transmissíveis, além de ter sido vítima de violência sexual em algum momento da vida. O advento e o acesso à terapia antirretroviral transformaram a Aids em uma doença crônica e têm contribuído para que mulheres infectadas pelo vírus possam viver uma vida mais longa e saudável, assim como para a diminuição do risco de transmissão do vírus da mãe para o bebê. Isto estaria, então, alterando o contexto dentro do qual as mães decidem ter ou não a criança e, ao mesmo tempo, colocando desafios a ser enfrentados, em termos de direitos sexuais e reprodutivos que, segundo o estudo, precisariam ser discutidos. “Adotar este ponto de vista significa reconhecer que estas mulheres têm o direito
A pesquisadora Regina Maria Barbosa: “Os resultados indicaram que há similaridades e correlações entre os contextos associados com a infecção por HIV e as práticas e decisões reprodutivas”
de desfrutar de uma vida sexual, caso desejem, e escolher se, quando, com quem e como elas terão filhos, sendo capazes de exercer estas escolhas de maneira segura e com um risco mínimo à saúde”, afirma a pesquisadora do Nepo. Regina também lembra que as leis brasileiras são bastante restritivas e abortar devido à infecção por HIV é considerado, portanto, ilegal. “Apesar disso, o aborto induzido é uma alternativa usada frequentemente no país. Há estudos que apontam que uma em cada cinco mulheres brasileiras de até 40 anos já praticou pelo menos um aborto induzido durante a vida”. Uma pesquisa conduzida pelo Ministério da Saúde em 2009 mostrou que o aborto no Brasil é feito principalmente por mulheres entre 20 e 29 anos de idade, com até oito anos de escolarização e que tem algum tipo de trabalho. O método de indução do aborto mais usado por estas mulheres é o consumo de citotec ou misoprostol, que é comprado no “mercado negro”, já que sua venda em farmácias está proibida desde 1998. “O desejo de postergar a maternidade, a falta de condições econômicas para criar uma criança e de estabilidade na relação com o parceiro são razões comumente apontadas por elas para a prática do aborto, o qual é comumente descrito como uma experiência traumática, principalmente entre as mulheres mais pobres, que estão geralmente sozinhas, enfrentando esta situação de maneira clandestina e insegura, tanto em termos físicos quanto psicológicos”, afirma Regina Barbosa. Segundo a pesquisadora, apesar dos avanços nos programas de prevenção da transmissão vertical do vírus (da mãe para o bebê), o estigma contra as pessoas com Aids ainda faz com que muitos profissionais acreditem que uma mulher soropositiva não deva ter filhos. De acordo com ela, para algumas portadoras, a decisão de abortar depois do diagnóstico está diretamente relacionada ao vírus, apesar de também estar associada a outras circunstâncias da vida. Entretanto, para outras, a decisão de fazer um aborto estava mais relacionada à falta de desejo de estar grávida naquele momento da vida. “Para estas mulheres que já têm que lidar com o estigma relacionado ao vírus, recusar uma gravidez por não querer lidar com o peso da maternidade naquele momento, ao invés de querer proteger a vida futura de seus filhos ou sua saúde, traz de volta a discussão sobre os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres. Portanto, não se trata somente de solidariedade com mulheres vivendo em contextos extremamente difíceis, mas também um reconhecimento do direito de abortar em qualquer circunstância como um requisito para a cidadania plena destas mulheres”, finaliza. Os detalhes dessa pesquisa poderão ser acessados em breve em dois artigos, previstos para serem publicados em julho, nas revistas Reproductive Health Matters e Ciência e Saúde Coletiva. Antes disso, porém, seus resultados estarão sendo apresentados para profissionais e gestores das Secretarias Estadual e Municipal de Saúde de São Paulo, no próximo dia 24 de maio, no Seminário “Saúde e direitos reprodutivos no contexto da epidemia de HIV/Aids: incorporando o conhecimento às ações de cuidado”(maiores informações em www.nepo.unicamp.br).
Nas n bas Estudo revela alterações causadas ca 8
Campinas, 21 a 27 de maio de 2012
por droga que controla a epilepsia
Estudo pode auxiliar na interpretação do mecanismo de ação do ácido valproico ISABEL GARDENAL
T
bel@unicampi.br
ese de mestrado de Marina Barreto Felisbino, desenvolvida no Instituto de Biologia (IB), acaba de resultar num artigo inédito na renomada revista norte-americana PLoS One, publicada on-line. Intitulado Chromatin remodeling, cell proliferation and cell death in valproic acidtreated HeLa cells, o artigo conseguiu mostrar, mediante métodos de análise de imagem de células em cultura, que o ácido valproico – uma das drogas mais adotadas mundialmente para controlar crises epiléticas – produz alterações estruturais na cromatina, material básico dos cromossomos que contém o DNA, a sede da informação genética. Esse trabalho, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), foi possível graças aos avanços no campo da Epigenética, uma área do conhecimento que vem se despontando mais recentemente como crucial para explicar a regulação da função genética do DNA. O trabalho da bióloga registrou nos primeiros meses pós-publicação mais de 1.200
acessos com 300 downloads. Leia o artigo (http://www.plosone.org/article/ info%3Adoi%2F10.1371%2Fjournal. pone.0029144). Conforme menciona a professora titular do IB Maria Luiza Silveira Mello, orientadora da dissertação de Marina e também autora do artigo, na tarefa da expressão gênica o DNA não está sozinho. Substância química que contém o código para a fabricação de todas as proteínas do organismo, determinando as características genéticas dos indivíduos, como a cor dos olhos, dos cabelos, entre outras, o DNA está complexado com proteínas dos tipos histônicas (que têm papel significativo na regulação dos genes), não histônicas e pequenos RNAs (ácidos ribonucleicos) que formam a estrutura da cromatina. A docente explica que o patrimônio genético está no DNA e que, para ele se expressar, também precisa ser regulado. Tal regulação pode ser feita por meio de modificações nas proteínas histônicas que, por sua vez, podem ser afetadas pelo ácido valproico e pelo próprio DNA. Tal achado, afirma, ganha maior relevância ainda ao fazer uma conexão com a descoberta de um grupo dinamarquês, o qual determinou que, em células tumorais do tipo HeLa tratadas com ácido valproico, 6% dos seus genes eram desregulados. A importância dessa pesquisa, dimensiona a docente, é que ela deverá auxiliar na interpretação do mecanismo de ação dessa droga, mas não exclusivamente em células nervosas. Nos Estados Unidos, salienta, existe um recente interesse do ácido valproico em ser usado no tratamento de alguns tumores, agora com uma ação um pouco diferente do que teria em células nervosas. “Saber como ele atua ao nível nuclear morfológico sugere a ocorrência de alterações ao nível molecular.”
Fotos: Antoninho Perri
A professora titular do IB Maria Luiza Silveira Mello (em pé), orientadora, e a aluna Marina Barreto Felisbino: artigo na PLoS One
As alterações morfológicas na microscopia são reveladas com o uso de um analisador de imagens em associação a experimentos de Biologia Molecular. “Ao usar essa droga no tratamento de tumores, é imprescindível saber quais elementos químicos, dentro das células, serão afetados”, demarca a docente.
Contraindicações Apesar do ácido valproico ser considerado uma das melhores drogas contra a convulsão na epilepsia, ressalva Maria Luiza, ele também possui contraindicações, especialmente entre as gestantes, pois pode desencadear a malformação fetal, impedindo a boa formação do sistema nervoso e podendo levar o feto a óbito. “Sabendo que o ácido valproico age sobre o funcionamento dos genes, pode-se compreender melhor que ele é capaz inclusive de desregular o desenvolvimento embrionário.” A descoberta de Marina é vista pela
professora Maria Luiza como uma contribuição adicional ao entendimento da desregulação gênica por certas drogas como o ácido valproico. De acordo com a docente, se quiserem detectar o efeito sobre a estrutura da cromatina numa célula que integra um tecido animal que foi tratado com essa droga ou também em uma célula em cultura, o acesso com análise de imagem, efetuada em nível de microscopia de luz, será perfeitamente possível. Empregandose um equipamento computacional automatizado, ele permitirá identificar alterações na organização dos componentes nucleares. No caso da cromatina, prossegue a orientadora, verifica-se que ela fica com uma espécie de “frouxidão”. Isso é demonstrado mediante a análise das imagens, na qual atribui-se cores falsas (as pseudocores) a elementos que compõem a cromatina. A análise de um núcleo de célula que foi, por exemplo, tratada com a droga, mostra alteração sob a forma
dessas pseudocores, o que indica uma descondensação da cromatina. Quando uma droga é escolhida para um tratamento, às vezes ela não desvenda todo o seu mecanismo de ação de início, diz a docente. Não se sabia, exemplifica ela, que – nos primórdios da utilização do ácido valproico – ele pudesse ter alguma ação em células tumorais e ser benéfico por conseguir diminuir a proliferação celular. À medida que o tempo transcorre, novas questões são aventadas, e a problemática passa a ser abordada sob diferentes perspectivas. Isto é muito comum de ocorrer com pesquisas em ciência básica. No caso do uso de drogas para o tratamento das células tumorais especificamente, vai aí um bom tempo para que o produto de um estudo beneficie as pessoas. Nos Estados Unidos, o clinical trial para o uso do ácido valproico em células tumorais ainda está no nível 2. É preciso chegar ao nível 3 para ser utilizável no ser humano. Por isso, como os mecanismos de atuação da droga ainda não são totalmente conhecidos, é preciso haver cautela nas suas recomendações. “O caminho a ser percorrido pode ser demasiado longo”, adverte a orientadora. O trabalho de Marina Barreto Felisbino integra a linha de pesquisa de Cromatina do Departamento de Biologia Estrutural e Funcional do IB, linha essa que existe há mais de 30 anos, e teve a colaboração da professora Wirla Tamashiro, do Departamento de Genética, Evolução e Bioagentes do IB.
.............................................................. ■ Publicação
Felisbino, M.B.; Tamashiro, W.M.S.C.; Mello, M.L.S. Chromatin remodeling, cell proliferation and cell death in valproic acid-treated HeLa cells. PLoS ONE 6(12): e29144. doi:10.1371/ journal.pone.0029144.
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Método melhora atendimento em hospitais
Instrumento de avaliação foi desenvolvido a partir de análise de 166 pacientes
Foi pensando em buscar o melhor percurso assistencial do paciente, além de garantir a qualidade desse percurso, que a doutoranda Eneida Rached Campos conseguiu criar, há pouco, um instrumento de avaliação inédito no Hospital de Clínicas (HC), batizado como Método Pelc (Planejamento Epidemiológico de Linha de Cuidado). O projeto piloto, que resulta de sua tese de doutorado – orientada pelo docente Djalma de Carvalho Moreira Filho e defendida na Faculdade de Ciências Médicas (FCM) – foi aplicado no Departamento de Pediatria. A linha de cuidado escolhida foi a das crianças e adolescentes infectados pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV). Foram analisados 166 pacientes numa faixa etária de zero a 20 anos. O método se mostrou factível e reprodutível em qualquer tipo de linha de cuidado na área da saúde, podendo ser empregado em hospitais, clínicas e centros de saúde. Eneida, que é graduada em Ciência da Computação pela Unicamp, conta que o método tomou como referenciais teóricos a Epidemiologia e a Ciência da Administração, entre outros. Então correlacionou esses conhecimentos, muito próximos de sua prática profis-
sional, para identificar como essas áreas poderiam melhorar de modo integrado a qualidade da assistência. As abordagens atuais sobre qualidade, comenta ela, estão muito distantes do percurso assistencial. Essa linha de cuidado foi escolhida para a primeira aplicação do Pelc sobretudo em razão de haver nesse Departamento docentes muito experientes e uma perda mínima de seguimento de pacientes. Além disso, nota-se um vínculo intenso entre os docentes e as famílias e pacientes. Esse grupo, dimensiona Eneida, estava bem amadurecido e procurava ações de qualidade. Foi então estabelecida uma equipe de árbitros a fim de definir um tratamento padrão para a linha de cuidado. Nesta definição, a Pediatria – um dos principais serviços de referência no país – procurou se basear nas diretrizes e recomendações do Ministério da Saúde. O pediatra Marcos Nolasco, que coordenou o grupo de estudo, é um dos membros do Ministério a revisar essas diretrizes. Pela familiaridade com esse objeto, ele chegou a definir 21 requisitos na linha de cuidado, com uma pontuação para itens ligados ao paciente e à estrutura do serviço. Esses requisitos passaram pela adesão ao tratamento, pelo cumprimento do protocolo das diretrizes pelo serviço em relação a exames complementares, avaliação do desenvolvimento da criança e do adolescente, e obtenção de metas de tratamento. Para cada meta, conferiu-se uma pontuação e cada um dos 21 tópicos teve um peso para compor um escore – um grau de conformidade. De acordo com Nolasco, o Pelc carece agora de uma validação externa, que deverá acontecer à medida em que for aplicado em outras
toriais, o follow-up, etc. Nesse piloto, a doutoranda verificou o processo a partir da leitura dos prontuários dos pacientes.
Marcos Nolasco (à esq.), Eneida Rached, autora do estudo, e o professor Djalma de Carvalho Moreira Filho, orientador: linha de cuidado de crianças e adolescentes
instituições e em outros tipos de linha de cuidado. No entanto, como o tratamento padrão é um instrumento de medida, reconhece o médico, foram tomados alguns cuidados.
Consistências A primeira consistência esperada, realça Eneida, envolve exigir que esse tratamento padrão tenha poucas linhas próximas dele. A segunda consistência é que, no tratamento padrão, parte dos requisitos tenha a ver com estrutura e processo, e parte dos requisitos tenha a ver com resultado, que se enquadra na lógica de estrutura, processo e resultado de Donabedian, um dos médicos que mais contribuiu para a qualidade em saúde, conta. Na tese, o tratamento padrão demonstrou que as linhas com estrutura-processo apresentaram-se mais adequadas, ocorrendo o contrário com as que não tiveram. A terceira consistência feita para o
tratamento padrão é que todos os Pelcs foram entregues ao grupo de Nolasco. Houve concordância entre os escores de cada paciente e a impressão que os profissionais do serviço tinham sobre os aspectos de processo e de resultados no cuidado aos pacientes. “Criou-se um instrumento de mensuração do grau de qualidade dessa linha de cuidado e fizemos testes comprovando sua robustez. Tudo leva a crer que ele poderá ser usado em outras pesquisas em linha de cuidado pediátrica de HIV e doenças crônicas”, expõe Eneida. A linha de cuidado oferecida ao paciente é formada por etapas e ações que são encadeadas para definir o seu percurso assistencial até que a sua necessidade de saúde seja modificada. É um processo que começa com uma necessidade de saúde de um consumidor de saúde. Inclui o ingresso do paciente no sistema de saúde, o seu acompanhamento, os exames labora-
Proposições Essa tese indicou que o planejamento epidemiológico da linha de cuidado das crianças e dos adolescentes infectados pelo HIV deveria ser composto de ações assentadas sobre evidências como diminuir faltas às consultas de rotina e vulnerabilidades sociais dos pacientes, e aumentar a adesão à terapia antirretroviral. Isso foi apontado epidemiologicamente no estudo. Nolasco relata que o atendimento aos pacientes com HIV em pediatria no HC é hoje ambulatorial. E, graças a este método, descreve, será possível trabalhar com a universalidade do cuidado, permitindo comparar linhas de cuidado para verificar como estão se comportando em diferentes regiões do Brasil. A contribuição desse trabalho se pauta em fornecer indicadores semiquantitativos para avaliar a qualidade da linha avaliada, contemplando a riqueza da interação paciente, equipe de saúde e serviço, informa Eneida, que é professora do Programa de Desenvolvimento Gerencial e uma das autoras da Metodologia de Gestão por Processos da Unicamp. (Isabel Gardenal)
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Tese: “Método Pelc – Método de Planejamento Epidemiológico de linha de cuidado” Autora: Eneida Rached Campos Orientador: Djalma de Carvalho Moreira Filho Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)
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Campinas, 21 a 27 de maio de 2012 Foto: Antoninho Perri
Célio Hitoshi Wataya, autor da pesquisa: polímero reticulado é capaz de absorver líquidos sem se dissolver
À prova de
Químico desenvolve menisco arti�icial a partir da técnica de prototipagem
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ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br
acientes com problemas de menisco, cartilagem do corpo humano localizada no joelho, foram alvos de atenção de uma pesquisa de doutorado realizada na Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM). O seu autor, o químico Célio Hitoshi Wataya, acaba de desenvolver um menisco artificial a partir de uma adaptação na técnica de prototipagem rápida, a qual permite fabricar objetos físicos diretamente de fontes de dados gerados por sistemas auxiliados por computador (CAD). O diferencial do trabalho está na obtenção de um dispositivo de hidrogel, polímero reticulado capaz de absorver líquidos sem se dissolver –, a partir de imagens do joelho em tomografia computadorizada, que podem servir de base à construção de uma modelagem exata do menisco. O resultado foi um produto personalizado e artesanal já testado quanto à citotoxicidade em modelo animal, visando aplicações na área médica. Ele não exibiu rejeição local e, nos testes mecânicos, apresentou comportamento – quanto à tração e à compressão – similar ao suportado por um menisco submetido à carga. Mostrou ser promissor para essa aplicação, segundo Célio. O material usado na prótese, o polivinil álcool (PVA), é o polímero sintético solúvel em água mais usado do mundo, estando presente em itens como cosméticos, produtos farmacêuticos e roupas de queimados. É encontrado comercialmente na forma de pó ou de grânulos e tem sido bastante estudado no momento, embora o seu conhecimento já remonte à década de 1920, por suas propriedades medicinais.
Importância De acordo com Célio, dois detalhes foram fundamentais para chegar ao produto
impacto final. O primeiro foi o tratamento computacional dado à imagem da tomografia do joelho com o Invesalius e o Rhinoceros, dois softwares livres. O segundo foi o uso do dimetilssulfóxido (DMSO), um agente de reticulação empregado num arsenal de medicamentos, sob as formas de gel e de solução, indicados como anti-inflamatório e analgésico de uso tópico nos traumatismos, hematomas e edemas. Célio conta que pensou em produzir um menisco artificial pelo grande impacto social que teria para a vida dos pacientes, já que, após lesionado, o menisco ‘original’ não se regenera. A área de contato do joelho fica reduzida algo em torno de 50%, submetendo a cartilagem articular a um maior risco de lesões. Conforme o autor da tese, a regeneração é complicada porque o menisco é pobre em vasos sanguíneos e, consequentemente, com irrigação mínima. Quando a regeneração ocorre, o resultado é um tecido com baixa propriedade mecânica que, ao ser submetido a esforços, pode se romper com facilidade, o que comprometeria o seu funcionamento, uma vez que o menisco atua como um amortecedor, impedindo o atrito entre órgãos próximos, como a tíbia e o fêmur. A sua principal função, inclusive, é absorver cerca de 50% da carga compressiva na articulação do joelho em extensão e 85% da carga em flexão. No caso da existência de lesões, o procedimento de escolha em geral é a extirpação do menisco, a meniscectomia, sobretudo com vistas a eliminar a dor, que é relatada como intensa pelos pacientes. Isso porque a lesão continua se propagando e chega a um ponto que a cirurgia torna-se inevitável. As maiores vítimas de rompimento do menisco são os desportistas, as vítimas de acidentes automobilísticos e os idosos que sofreram quedas.
Testes Um estudo de Kobayashi, feito no Japão, já tinha usado o PVA agregado ao DMSO no joelho de coelhos, relata Célio. A parte da fixação da prótese foi testada pelo autor com fios de nylon e, as perfurações na tíbia, feitas com brocas. Houve ainda avaliação da reação dos animais, notando-se, após o período de dois anos, que o órgão não tinha provocado irritação local. Estava praticamente intacto. A resposta foi favorável, conta o químico, sinalizando a sua viabilidade de uso.
Com base nessa mesma investigação, Célio estudou como introduzir o menisco em seres humanos. Ao conversar com especialistas do Centro de Tecnologia da Informação “Renato Archer” (CTI), ele constatou a alternativa de personalizar o PVA a partir de uma sequência de tomografia computadorizada. O pesquisador avaliou as imagens tridimensionais do joelho, que o ajudaram a reproduzir um molde do menisco para ser envasado com PVA. Esse menisco, moldado de PVA e DMSO, passou por congelamento e irradiação de raios gama, por meio de irradiador multipropósito do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) da USP, até chegar ao menisco artificial. Amostra desse material irradiado foi introduzida na calota craniana de animais de laboratório, a fim de verificar a sua biocompatibilidade. Semelhantemente aos resultados de Kobayashi, além de não se observar rejeição do material, não houve hemorragia no local após 12 dias. Também foi avaliada a reação no organismo dos ratos. “Pela lâmina, percebeu-se que não houve irritação. Pelo contrário, houve a formação protetora de uma cápsula de tecido conjuntivo envolvendo esse material, conforme se esperava”, relata o doutorando. Os testes de material in vitro foram efetuados no Núcleo de Medicina Experimental da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) e in vivo no Instituto de Cirurgia Plástica Craniofacial (Sobrapar). Outros laboratórios envolvidos no trabalho foram os da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM), da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) e do CTI.
Processo Normalmente o PVA reticulado atua como uma esponja hábil em absorver os líquidos, inclusive o sinovial, que é uma mistura de água e de sais minerais, esclarece Célio. Depois que ele intumesce, tornase mais flexível, sendo capaz de amortecer as pressões feitas pelos membros. As imagens virtuais do menisco passam por um equipamento de prototipagem rápida, que possui funções semelhantes às de uma impressora. Só que, ao invés dessa impressora ter um tubo de tinta, no seu lugar acomoda outros materiais, que podem ser metais, polímeros e outros. No caso deste trabalho, a tecnologia foi adotada para a obtenção do molde do menisco, e a prótese foi confeccionada a partir do envase do polímero não reticula-
do. “Na tomografia foi possível visibilizar várias fatias de imagens, com dimensões que iam de 1 a 4 mm. Quanto mais fina a camada, mais preciso foi o produto final”, expõe Célio. Em cada processo, revela ele, se faz um único menisco, que demora por volta de duas a três horas para ser finalizado. De acordo com o pesquisador, ainda não existem equipamentos próprios para esse polímero. Ele tentou empregar raios ultravioletas e infravermelhos, porém sem lograr êxito. A saída foi partir para a moldagem e o envasamento, com posterior reticulação, ou seja, formação de ligações químicas que impedem a dissolução do polímero em presença do líquido sinovial. “Um equipamento de prototipagem rápida que puder produzir o menisco diretamente tornará o processo mais ágil”, garante o doutorando. O menisco artificial não é algo novo, comenta o químico. Kobayashi, por exemplo, produziu um menisco artificial a partir de uma barra de PVA, cortando-a em fatias redondas e adaptando-a manualmente. Já o mérito do trabalho de Célio, orientado pela docente Cecília Zavaglia da FEM e co-orientado por Vanessa Petrilli Bavaresco, do Departamento de Plásticos do Colégio Técnico de Campinas (Cotuca), foi ter alcançado a personalização da prótese. O novo processo de obtenção de menisco já foi apresentado em seis congressos internacionais, despertando grande interesse da comunidade científica. No último evento, na Alemanha, que ocorreu no mês de abril, especialistas belgas manifestaram a intenção de conhecer os detalhes do processo. O próximo passo, afirma Célio, seria entrar com pedido de patente, iniciativa que ele não pretende tomar. “A minha expectativa é disponibilizar a descoberta para o setor industrial para que um dia o acesso nas redes públicas de saúde seja viável”, ressalva. “Terá sido um grande avanço.”
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Tese: “Desenvolvimento de menisco personalizado de polivinil álcool (PVA) via prototipagem rápida (PR)” Autor: Célio Hitoshi Wataya Orientadora: Cecília Amélia de Carvalho Zavaglia Coorientadora: Vanessa Petrilli Bavaresco Unidades: Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) e Colégio Técnico de Campinas (Cotuca) Financiamento: Capes
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10 Vida Teses da semana Painel da semana Teses da semana Livro da semana Destaques do Portal da Unicamp
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Campinas, 21 a 27 de maio de 2012
Painel da semana Busca e redação de patentes do INPI - A Agência de Inovação Inova Unicamp organiza, de 21 a 24 de maio, a oficina “Busca e redação de patentes do INPI”. A oficina será realizada no auditório Incubadora de Empresas de Base Tecnológica da Unicamp (Incamp), situada na rua Bernardo Sayão 100. É oferecida dentro do projeto InovaNIT com financiamento da Finep. Mas informações no link http://www.inova.unicamp.br/ paginas/inovanit/curso50_inscricao.php Rumos do desenvolvimento e da gestão - O Laboratório de Economia e Gestão (LEG) da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp promove, de 21 a 25 de maio, na sede da FCA, em Limeira, a terceira edição do seminário “Rumos do desenvolvimento e da gestão”. O evento contará com a participação do professor Mariano Laplane, presidente do Centro de Gestão de Estudos Estratégicos (CGEE) do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação; Maria Celia Caiado, da Agência Metropolitana de Campinas (Agencamp), dentre outros pesquisadores que ministrarão palestras, workshops e minicursos. O LEG reúne docentes e alunos de iniciação científica da FCA dedicados ao estudo da economia regional e da gestão. A programação inclui atividades nos horários, diurno, vespertino e noturno durante os cinco dias de evento. A abertura oficial ocorre às 19h30, na sede da FCA, em Limeira-SP. Mais informações: telefone 19-9705-8119 ou e-mail carlos. etulain@fca.unicamp.br Atividades com Neil Silberman - O Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam), através do Laboratório de Arqueologia Pública Paulo Duarte, organiza entre 22 e 25 de maio, um evento constituído por ciclos de palestras e cursos com o professor Neil Silberman. Ele desenvolve inúmeras pesquisas nas áreas da Arqueologia Bíblica,
História e Patrimônio. Interessados em participar de uma Webconferência sobre “Patrimônio”, que ocorrerá no dia 1 de junho, às 9h30, devem enviar nome completo, instituição e formação para o e-mail silberman.unicamp@gmail.com. O número de vagas se limita a 95 participantes, que poderão interagir em tempo real com a palestra. Apoio: Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP), Faepes e Fapesp. Mais detalhes: http://www.nepam.unicamp.br/lap/
nova física - O Instituto de Física “Gleb Wataghin” (IFGW), através do Departamento de Raios Cósmicos e Cronologia (DRCC), organiza no dia 23 de maio, um seminário com o professor Fábio Alex Pereira dos Santos (PUC-Rio). Às 16 horas, no auditório Mesón Pi, ele aborda “Oscilação de neutrinos Mossbauer e nova física”. Site do evento: http://portal.ifi.unicamp.br/ drcc/seminarios-do-drcc?lang=br. Outras informações: 19-3521-5275.
Conferência com Anselm Jappe O Centro de Pesquisa sobre Utopia do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) organiza no dia 22 de maio, a conferência “Da utopia revolucionária à utopia negativa. Considerações sobre os situacionistas”. Ela será ministrada pelo professor Anselm Jappe, às 14 horas, na sala de aula CL-7 do IEL. Jappe ensina Estética na Accademia di Belle Arti de Frosinone (Itália). Doutorou-se em Filosofia e Ciências Sociais na École de Hautes Études en Sciences Sociales em Paris, sob a orientação de M. Nicolas Tertulien, com a tese “La critique du fétichisme de la marchandise chez Marx et ses développements chez Adorno et Lukács”. É autor de Guy Debord (traduzido em vários países, no Brasil pela Editora Vozes, Petrópolis, 1999), As aventuras da mercadoria – para uma nova crítica do valor (Antígona, Lisboa, 2006), e Crédit à mort. La décomposition du capitalisme et ses critiques (Nouvelles Éditions Lignes, Paris, 2011), que será em breve publicado em português.
Aula aberta de Artes Marciais Chinesas - A Coordenação do Curso de Graduação em Dança e o Departamento de Artes Corporais (DAC) do Instituto de Artes (IA) da Unicamp oferecem, dia 25 de maio, das 10 às 12 horas, uma aula aberta de artes marciais chinesas. A apresentação será realizada na sala AD01 do DAC. O evento contará com a participação dos professores Enrique Ortega, representante da Central Kungfu, e de Samuel Mendonça, representante do Instituto de Kungfu Brendan Lai. Incluirá palestra sobre aspectos culturais dos sistemas Choy Lay Fut e Louva-aDeus, bem como uma vivência nessas duas vertentes da arte marcial chinesa. As contribuições de uma experiência em artes marciais chinesas para a formação do bailarino constituem o tema de uma pesquisa da doutoranda Mariana Baruco Machado Andraus, aluna do Programa de Pós-graduação em Artes da Cena, do IA. As artes marciais chinesas, ou wushu – conhecido no ocidente pelo termo kungfu - incluem inúmeros sistemas, como Shaolin, Choy Lay Fut, Tong Long (Louva-a-Deus), Taijiquan (Tai Chi Chuan), entre outros. Mais informações: mari.baruco@gmail.com
Saiba Mais - O Serviço de Apoio ao Estudante (SAE), através do Programa Saiba Mais, organiza no dia 23 de maio, às 12 horas, na sala CB-18 do Ciclo Básico I, a palestra “Motivação otimizada e sucesso nos cursos da universidade”. Ela será proferida pelo professor José Aloyseo Bzuneck, do Centro de Educação Comunicação e Artes da Universidade Estadual de Londrina (UEL). A palestra é gratuita e aberta ao público em geral. Mais informações: 19-3521-6539. Qualidade de vida na sociedade contemporânea - O professor Miguel Arcanjo Áreas, do Instituto de Biologia (IB), abre a programação de 2012 do ciclo de palestras sobre qualidade de vida na sociedade contemporânea, organizado pelo IB. No dia 23 de maio, às 12h30, no IB-01, ele fala sobre “Sexualidade e saúde: do adulto jovem à melhor idade”. O ciclo é coordenado pela servidora Fátima Alonso. Arcanjo é mestre em Ciências Biológicas (Fisiologia) e doutor em Ciências de Alimentos pela Unicamp. Também é membro do corpo docente do Departamento de Biologia Estrutural e Funcional do IB e graduado em Ciências Biológicas pela PUC-Campinas. Atua na área de ensino de Fisiologia e pesquisa em Fisiologia Cardiovascular, principalmente nos temas: desenvolvimento de software educacional, eletrocardiografia, pressão arterial e reatividade vascular. Mais informações: falonso@unicamp.br Oscilação de neutrinos Mossbauer e
Música no Campus - O projeto “Música no Campus” prossegue com as suas atividades no dia 26 de maio, às 16 horas, no gramado do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp. Desta vez, as atrações são a dupla formada por Nilson Ribeiro e Henrique Torres - A música brasileira em seu melhor estilo - e o trio composto por Ana Salvagni (voz), Eduardo Lobo (violão de 7 cordas) e Maria Beraldo Bastos (clarinete). Dono de uma voz marcante e interpretações contundentes, Nilson percorre musicalidades de todos os cantos do Brasil em seu trabalho autoral; Henrique Torres é multinstrumentista de primeira linha, também cantor e compositor, é dono de uma técnica refinada nos braços do violão. Ana Salvagni concluiu o curso de Regência pela Unicamp em 1994, mesmo ano em que passou a cantar no Trio Bem Temperado. Premiada no 21º Prêmio da Música Brasileira em 2010 com seu CD Alma Cabocla, neste espetáculo a cantora apresenta um repertório de canções brasileiras que vão desde a modinha tradicional, passando pelo compositor Hekel Tavares, a quem dedica seu mais recente CD (Alma Cabocla), até compositores consagrados como Caetano Veloso e Dorival Caymmi. A organização é da Comissão de Assuntos Culturais da Reitoria da Unicamp. Mais informações: 19-3521-2145.
Tese da semana Alimentos - “Efeito da concentração de soro de queijo na produção e qualidade sensorial de bebidas lácteas probióticas” (doutorado). Candidato: Wellington de Freitas Castro. Orientador: professor José de Assis Fonseca Faria. Dia 21 de maio, às 14 horas, no Auditório I do DTA/FEA.
Livro
da semana
Computação - “O problema do corredor de comprimento mínimo: algoritmos exatos, aproximativos e heurísticos” (mestrado). Candidato: Lucas de Oliveira. Orientador: professor Cid Carvalho de Souza. Dia 23 de maio, às 14h30, no Auditório do IC. Educação Física - “Modelo para análise do ataque no futebol” (mestrado). Candidato: Fernando Santana Ziskind. Orientador: professor Sergio Augusto Cunha. Dia 28 de maio, às 14 horas, na sala 03 da FEF. Engenharia Elétrica e de Computação - “Análise da penetração de umidade em para-raios poliméricos de distribuição” (mestrado). Candidata: Daiana Antonio da Silva. Orientador: professor José Pissolato Filho. Dia 25 de maio, às 10 horas, na sala da Congregação da FEEC. - “Análise do mecanismo de segurança da arquitetura ims” (mestrado). Candidato: Francisco José Viudes Nobôa. Orientador: professor Yuzo Iano. Dia 25 de maio, às 9 horas, na sala PE11 da FEEC. Engenharia Mecânica - “Aplicação de redes neurais artificiais no processo de ajuste de histórico” (mestrado). Candidato: Luís Augusto Nagasaki Costa. Orientador: professor Célio Maschio. Dia 24 de maio, às 13h30, na FEM. Geociências - “Entre DNAs, pipetas e pacientes: os laboratórios públicos na produção das biomedicina e na constituição do fenômeno da biomedicalização” (doutorado). Candidata: Neide Mayumi Osada. Orientadora: professora Maria Conceição da Costa. Dia 24 de maio, às 10 horas, no auditório do IG. Instituto de Estudos da Linguagem “O discurso narrativo nas afasias” (doutorado). Candidata: Mirian Cazarotti Pacheco. Orientadora: professora Rosana do Carmo Novaes Pinto. Dia 22 de maio, às 9h30, na sala de defesa de teses do IEL. - “Crônicas em antologias, suas adaptações audiovisuais e os sentidos: o gênero na formação intercultural discursiva em comunicação social” (doutorado). Candidata: Silvânia Siebert. Orientadora: professora Silvana Mabel Serrani. Dia 24 de maio, às14h30, na sala de defesa de teses do IEL. - Odontologia - “Avaliação da microinfiltração na interface pilar-implante” (doutorado). Candidato: João Paulo da Silva Neto. Orientador: professor Mauro Antonio de Arruda Nóbilo. Dia 24 de maio, às 14 horas, na Congregação da FOP.
A forma do meio Livro e narração na obra de João Guimarães Rosa Autora: Clara Rowland ISBN: 978-85-268-0943-7 Coedição: Edusp Ficha técnica: 1a edição, 2011; 304 páginas; formato: 16 x 23 cm Área de interesse: Crítica literária Preço: R$ 50,00 Sinopse: A forma do meio é um estudo sobre a obra de Guimarães Rosa que enfrenta em novos termos problemas decisivos e complexos como a relação da forma do livro e do romance com a oralidade e a narrativa tradicional. Isso chegaria a sublinhar a importância deste trabalho notável. Mas há ainda a enorme inteligência da análise de uma questão, a do livro, que, sendo crucial na obra de Rosa, está praticamente ausente na sua fortuna crítica. Não se trata apenas de mais um ensaio sobre Rosa: não só não recusa a tradição de leitura, como nela se integra de modo que obriga a repensá-la radicalmente. É, em suma, um daqueles maravilhosos sobressaltos que fazem o destino da grande literatura. (Abel Barros Baptista) Autora: Clara Rowland é professora no Departamento de Literaturas Românicas da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e pesquisadora do Centro de Estudos Comparatistas da mesma instituição. Desenvolve o seu trabalho nas áreas da literatura brasileira e da literatura comparada.
DESTAQUES do Portal da Unicamp
Carol Collins e Roy Bruns recebem título de Professor Emérito no Consu MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br
Dois docentes aposentados do Instituto de Química (IQ), Carol Hollingworth Collins e Roy Edward Bruns, receberam no último dia 14 o título de Professor Emérito da Unicamp, pelos relevantes serviços prestados à ciência e ao desenvolvimento da Universidade. A entrega da láurea ocorreu durante sessão extraordinária do Conselho Universitário (Consu), presidida pelo reitor Fernando Ferreira Costa. Integrantes da Administração Central, diretores de unidades, professores, servidores e alunos também participaram da cerimônia. “É uma homenagem merecida, tendo em vista a brilhante trajetória profissional dos dois docentes e o pioneirismo que ambos exerceram em suas áreas de atuação”, afirmou Fernando Costa. Carol Collins teve como madrinhas as professoras Isabel Cristina Sales Fontes Jardim e Carla Beatriz Grespan Bottoli. Já Roy Bruns teve como padrinhos os professores Teresa Dib Zambon Atvars e Adalberto Bono
Maurízio Sacchi Bassi. Os dois mais novos professores eméritos nasceram nos Estados Unidos e chegaram à Unicamp no início da década de 1970, poucos anos após a fundação da Universidade, em 1966. Ajudaram não somente a constituir o IQ, mas também a implantar e consolidar linhas de pesquisas nas áreas de cromatografia e química teórica, respectivamente. Carol Collins orientou 34 teses e dissertações e teve 136 artigos publicados em revistas indexadas, que mereceram 1.342 citações. Roy Bruns orientou 43 teses e dissertações e publicou cerca de 200 artigos em revistas indexadas. Mesmo aposentados, os dois docentes continuam trabalhando voluntariamente no IQ. “A professora Carol sempre foi uma profissional exigente, mas extremamente dócil. Sempre tentou ajudar a todos. Até hoje, se mantém atualizada e ativa. Além de ministrar disciplina em sua área, ela revisa pelo menos 200 artigos escritos em inglês por ano, que são posteriormente submetidos às revistas científicas”, relacionou a professora Isabel Jardim em seu discurso. A
Foto: Antoninho Perri
Os professores Roy Bruns e Carol Collins, novos Eméritos da Unicamp, com o reitor Fernando Costa
professora Teresa Atvars, que saudou o professor Roy Bruns, também destacou a contribuição que o docente deu à ciência e ao crescimento ao IQ. Além disso, chamou a atenção para a forma de ser do homenageado,
que segundo ela é uma das marcas do sucesso dele. “Nas conversas que tive com colegas do Instituto, ouvi adjetivos como ‘ele nunca desanima ou nos desanima’ e ‘Bruns cuida dos seus alunos e amigos’. Penso que
tanto pela produção científica quanto pela figura humana que é, a concessão do título de Professor Emérito a Roy Bruns configura um crédito para esta Universidade”, disse Teresa Atvars. Ao agradecer a outorga do título, a professora Carol Collins afirmou que, assim como no início da sua carreira, ainda adora ensinar e orientar os alunos. E, demonstrando muita vitalidade, manifestou o desejo de ampliar as suas atribuições, envolvendo-se também nas atividades administrativas. “Eu vim para a Unicamp por recomendação do meu orientador, nos Estados Unidos. Na oportunidade, ele me disse que eu iria adorar o Brasil. E isso de fato foi verdade”. O professor Roy Bruns também agradeceu a homenagem e fez questão de compartilhá-la com seus alunos e ex-alunos de pósgraduação, que contribuíram para o desenvolvimento de suas pesquisas. “Também quero agradecer à Unicamp, que me deu a oportunidade de fazer a pesquisa que sempre quis. Não sou brasileiro de carteira, mas sou de coração”, concluiu. (Manuel Alves Filho)
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Campinas, 21 a 27 de maio de 2012 Fotos: Antonio Scarpinetti/Divulgação
Entre o Guarani e Jimi Hendrix
Rock e futebol são as paixões de Moisés Cunha, funcionário do Hospital de Clínicas
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MARIA ALICE DA CRUZ halice@unicamp.br
rinco de Ouro da Princesa, Campinas, 1972. Guarani 1 x 0 Corinthians. Campeonato Paulista de Futebol. Primeira partida de futebol presencial para Moisés Cunha, autor do livro Guarani F. C.: breve história, editado pelo Clube de Autores. Estádio do Maracanã, 23 de janeiro de 1991. Sepultura, Lobão, Megadeth, Queensryche, Judas Priest e Guns N’ Roses. Rock in Rio II. Primeira noite de rock na vida de Moisés Cunha, autor da página Jimi Hendrix e de uma página sobre os primeiros grandes shows de rock no Brasil. Futebol e rock: essas duas paixões jamais perderão lugar na vida de Moisés, mesmo desempenhando com responsabilidade suas funções como profissional para assuntos administrativos no Setor de Faturamento e Autorização para Internação do Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp desde 1989. Sem interferir em suas atividades, criou as páginas Bugrenet e Bugretotal com o seu único irmão, João Cunha, em 2001, e ainda encontra tempo para atuar como assessor de história e estatística da página Planeta Guarani. Em 2011, ano de centenário de criação do Guarani Futebol Clube, o funcionário decidiu reunir e publicar o maior número de dados sobre seu clube do coração. Ao longo de 206 páginas, a obra reúne o que mais de relevante aconteceu na história do Bugre, com aspectos não encontrados em literaturas anteriores. Uma viagem repleta de revelações e emoções para o garoto que, na década de 1970, conheceu o futebol num campo de terra localizado nos fundos do Estádio Brinco de Ouro, onde também eram realizadas as aulas de educação física da Escola Estadual
Acima, Moisés Cunha em frente ao HC, onde trabalha desde 1989, e à esq., com colegas do setor: “Falar sobre o meu time é irresistível”
Antônio Vilela Júnior, onde cursou o ensino fundamental. Sempre com o incentivo do irmão, o autor passou a seguir o rastro do time. Fosse em Campinas, São Paulo ou Rio de Janeiro, lá estavam Moisés e João Cunha, cuja foto desfraldando o estandarte verde e branco ajuda a compor a capa do livro. “Ele sempre me chama para irmos aos jogos, inclusive ao realizado no Morumbi, no dia 6 de maio, contra o Santos”, relata, com sorriso de quem se orgulha de acompanhar o time na vitória ou na derrota. Relata altos e baixos com detalhes, refletindo sobre a situação de dificuldades em que o clube iniciou o Campeonato Paulista de 2012 e a glória de disputar novamente uma final. Por falar em final, a escalação de 1978, quando o alviverde foi campeão brasileiro, é relembrada sem hesitação. “Não tem como esquecer”, emocionase Moisés ao relembrar as lágrimas do então técnico Carlos Alberto Silva, que estava de luto pela morte do pai e tinha a mãe hospitalizada na época. “Foi um misto de emoções. Impossível esquecer aquele momento”, recorda. Conforme reconta a história, uma das amigas de trabalho, comenta: “É a história do Guarani em pessoa.” Para enriquecer as informações que já acumulava, Cunha pesquisou vários acervos, inclusive as tão desejadas edições da revista Placar. Fotos de fundadores, resultados dos primeiros anos, detalhes de campanhas e os tão acalorados dérbis campineiros constam da publicação. As fichas dos campeões de 1978, contendo dados como estatura com a qual entraram no clube, idade, clube de origem, entre outros, enriquecem o trabalho meticuloso do autor. Mais que um torcedor, Cunha tornouse um pesquisador de seu time em 2001, quando passou a fazer parte da Bugrenet e do Bugretotal. Boa parte das informações foi fornecida pelo amigo Edson Fortuna, funcionário da Faculdade de Educação Física (FEF) da Unicamp, também torcedor do Guarani. Se a pesquisa exigiu um pouco mais
de maturidade, o ingresso em torcida organizada não esperou tanto. Já na adolescência, em 1978, ao lado do irmão, tornou-se um dos fundadores da Torcida Xavantes. “A torcida não teve uma vida longa, mas o amor pelo clube é eterno”, argumenta Cunha. Hoje, além de participantes do Planeta Guarani, eles são membros da ONG Garra Guarani. À medida que a timidez é deixada de lado, um Moisés articulado se revela, relatando com detalhes e riqueza vocabular não somente a história de seu clube, seus ídolos, mas a própria história, ou, mais precisamente, parte dela. A mudança dos pais, José Gonçalves da Cunha Filho e Anna Leonardo da Cunha, da zona rural para a zona urbana de Itapira e Mogi Mirim, e posteriormente a Campinas. “Falo muito pouco, mas quando se trata do livro e do Guarani, é irresistível”, confessa.
Quadrinhos A literatura foi inserida de maneira natural na vida de Cunha, a partir de revistas em quadrinhas oferecidas pelo pai. Mas mesmo entre as cores dos gibis, ele e o irmão buscavam um personagem apaixonado pelo futebol: Zé Carioca. A coleção se somava ao acervo farto de revista Placar. “Adorávamos futebol. Era nossa leitura preferida”. Mas, por outro lado, os quadrinhos sobre o Yellow Submarine (Submarino Amarelo), inspirados no filme de 1968 de uma das bandas mais famosas do mundo, The Beatles, faziam a cabeça de Cunha. Os encontros entre o pai e o tio em sua casa para cantar sucessos de Roberto e Erasmo Carlos também acabaram por estimular a audição de músicas do gênero. “O programa Som Pop, da TV Cultura, também foi uma motivação para apreciar rock”, acrescenta Cunha. Nesse baú aberto durante a conversa, surgem os títulos mais entoados no colégio, no final da década de 1970, como We are the Champion, da banda Queen. Nesta época, apesar da efervescência, os ídolos não puderam ser acompanhados de perto. “Meu irmão até chegou a adquirir ingressos para o show do Queen no
Estádio do Morumbi, mas na hora não teve como ir, perdendo o dinheiro dos ingressos.” Como a maioria dos LPs era importada, as audições aconteciam em reunião de amigos, que reproduziam em fita cassete, até a chegada das mídias digitais. Mas ao contrário da atenção dada ao Guarani, que ainda atrai Cunha aonde queira que jogue, o rock foi substituído pela leitura da Bíblia em um grupo de oração do Hospital de Clínicas, do qual ele participa. Entre um relato e outro, Cunha sempre enfatiza a importância da amizade em sua vida. Orgulha-se em dizer que quem o levou de volta para a igreja foi justamente uma amiga de trabalho, Rosangela Leite. A audição de programas da Canção Nova também foi importante para o retorno à igreja. Os projetos são admirados e apoiados pelos companheiros de jornada diária no hospital, que, na expectativa da entrevista a ser concedida pelo amigo, se mobilizam, oferecendo a própria sala para a conversa e até sugerindo o cenário para a foto. Emocionada, a técnica administrativa Andrea Cristina Tavares Franco de Godoy registra o momento especial para todos. “Moisés é uma pessoa maravilhosa, muito querido por todos. Ele é inteligente e conhece a nomenclatura de procedimentos médicos, pois o Setor de Faturamento e Autorização de Internação exige isso. É um orgulho para toda a equipe ver o livro sobre o Guarani concluído, pois é um sonho realizado e ele merece que a obra seja divulgada”, afirma Andréa. Pouco divulgada, a missão do setor onde Cunha trabalha é essencialmente importante para o HC. Atencioso, Cunha explica que foi um começo difícil, já que a área nasceu com a criação do SUS para faturamento dos procedimentos que exigem internação. “Na época, não tinha ideia de muitas coisas que lia para relacionar e classificar os procedimentos. Recebi ajuda de outros funcionários, inclusive alguns que vieram da Santa Casa de Misericórdia de Campinas. Hoje, quando temos dúvida, recorremos à internet ou consultamos um médico do Hospital de Clínicas, que sempre nos ajuda. Mas na época não existia rede virtual”, explica. Passadas as dificuldades, Cunha hoje fala seguramente da gratificação em atuar durante 22 anos e meio em seu setor. “Eu trabalhava em um banco, onde se visava exclusivamente o lucro. É uma honra para mim, hoje, trabalhar num ambiente hospitalar, onde o principal objetivo é garantir saúde às pessoas. Aprendo muito aqui”, declara.
12 Jornal daUnicamp
PENTE FINO NA
Campinas, 21 a 27 de maio de 2012
O historiador e professor Carlos Alberto Ungaretti Dias: “A escolha dos integrantes me surpreendeu de maneira positiva”
VISTA GROSSA
Foto: Lula Marques/ Folhapress
LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br
“A Comissão da Verdade e a Lei de Acesso à Informação, o que se espera” é o título da palestra que o historiador e professor Carlos Alberto Ungaretti Dias, diretor do Acervo Histórico da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, proferiu no último dia 17 no Instituto de Filosofia e Ciência Humanas (IFCH). Carlos Dias vem atuando neste semestre como docente junto à graduação do IFCH, dentro do Programa Especialista Visitante da Pró-Reitoria de Graduação (PRG). A palestra é oportuna porque a presidente Dilma Rousseff acaba de indicar os sete integrantes da Comissão da Verdade, que vai investigar violações de direitos humanos no Brasil no período de 1946 a 1988. São eles: o ex-ministro da Justiça José Carlos Dias, o cientista político Paulo Sérgio Pinheiro, a psicanalista e escritora Maria Rita Khel, o jurista e consultor da Unesco José Paulo Cavalcanti Filho, o ex-procuradorgeral da República Cláudio Fontele, o ministro do STJ Gilson Dipp e a advogada especialista em crimes políticos Rosa Maria Cardoso da Cunha. “A escolha dos integrantes me surpreendeu de maneira positiva, pois embora não tenhamos um bispo Desmond Tutu entre os seus integrantes, se trata de um grupo de altíssimo nível, com muita experiência e competência técnica”, avalia Carlos Dias. “Não creio que a documentação relevante já tenha sido totalmente destruída, tese sempre lembrada pelos que defendem o esquecimento, a ‘cultura do silêncio’. A minha experiência junto aos arquivos públicos me permite acreditar que um cuidadoso pente fino poderá trazer novidades, até mesmo porque a nossa tradição arquivística é marcada pela precariedade, pela desordem e até mesmo pelo caos – e isso também dificulta quem quer destruir informações”, é o que acrescenta o especialista na entrevista que segue. Jornal da Unicamp – A presidente Dilma Rousseff acaba de anunciar os nomes da Comissão da Verdade. O que achou da escolha? Carlos Dias – A escolha dos integrantes da Comissão me surpreendeu de maneira positiva, pois embora não tenhamos um bispo Desmond Tutu entre os seus integrantes, se trata de um grupo de altíssimo nível, com muita experiência e competência técnica. São figuras públicas reconhe-
cidas pelas entidades de defesa dos direitos humanos, pelos familiares dos desaparecidos e até mesmo pelos grupos que se opõem à instalação da Comissão da Verdade – o que lhe empresta maior legitimidade e coerência ao discurso oficial de que se trata de uma política de Estado e não de uma política de governo, de um partido, ideologizada. JU – Seguindo o título da sua palestra, o que se espera da Comissão da Verdade? Carlos Dias – Eu vejo com grande entusiasmo a instalação de uma Comissão da Verdade no Brasil. Chamo a atenção para o momento particular que vivemos: ao contrário do silêncio que prevaleceu na maior parte desses últimos 26 anos, estão colocadas para sociedade brasileira, de forma objetiva, a busca da verdade e a reflexão acerca daquele período obscuro e terrível. Esse processo já está acontecendo. Nos últimos meses vimos o fotógrafo Silvaldo Leung Vieira, que documentou a morte de Vladimir Herzog, descrever em detalhes como eram montadas as fotos nos anos 1970 para forjar versões oficiais encobrindo bárbaros assassinatos. Há algumas semanas, voltou ao noticiário a misteriosa história do desaparecimento de 2.000 índios waimiri-atroatri, que estariam atrapalhando a construção da BR-174, que liga Manaus a Boa Vista. Será verdade que jogaram pó químico sobre algumas aldeias? Onde foram parar os desaparecidos? Chamou a atenção a declaração do ministro Gilson Dipp, que presidirá inicialmente o colegiado, de que a Comissão está comprometida em apurar a verdade, “doa a quem doer”. Há muito a esclarecer e é plenamente factível apurar diversos acontecimentos daquele período. Não creio que a documentação relevante já tenha sido totalmente destruída, tese sempre lembrada pelos que defendem o esquecimento, a “cultura do silêncio”. A minha experiência junto aos arquivos públicos, onde trabalho desde 1995, me permite acreditar que um cuidadoso pente fino poderá trazer novidades, até mesmo porque a nossa tradição arquivística é marcada pela precariedade, pela desordem e até mesmo pelo caos – e isso também dificulta quem quer destruir informações. Os depoimentos são outra fonte importante e alguns agentes públicos envolvidos nos acontecimentos já se mostraram dispostos a se apresentar
à Comissão, como o cabo Anselmo. Mais nebulosos são os possíveis desdobramentos que os trabalhos da Comissão da Verdade poderão trazer. Certo é que o governo e os partidos no Congresso estabeleceram como objetivo da comissão apurar a verdade com vistas à conciliação. Por sua vez, o Judiciário reiteradamente negou a possibilidade da criminalização dos responsáveis devido à Lei da Anistia. No entanto, desde que o Tribunal de Nuremberg estabeleceu que a busca da verdade é um objetivo em si mesmo, que a verdade deve ser buscada para que as atrocidades contra os direitos humanos não sejam esquecidas e não se repitam, foram realizadas mais de 40 Comissões da Verdade em todo o mundo. Os especialistas destacam que nenhuma delas teve como objetivo inicial punir os responsáveis pelos crimes. Exemplo simbólico é o da Argentina, país pioneiro na América Latina, que instalou sua “Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas” logo após o término da ditadura, em 1983: a questão só foi colocada durante os trabalhos quando da elaboração de peças jurídicas cuidadosamente fundamentadas e circunstanciadas descrevendo os horrores, que causaram enorme indignação e grande mobilização popular. JU – Seu envolvimento com este tema deve ser grande, enquanto historiador e diretor do Acervo da Alesp. Carlos Dias – Iniciei minha militância política em 1968, no movimento secundarista, quando estudava no Colégio de Aplicação de São Paulo. Participei ativamente da luta pela redemocratização, que acabou me levando a trabalhar na Assembleia de São Paulo. Mesmo sem vinculação partidária há décadas, procuro contribuir com a construção de nossa democracia de diferentes maneiras. Entre elas eu incluo a dedicação à organização do Acervo Histórico da Assembleia de São Paulo. Em 1995, quando comecei a trabalhar na área, disponibilizar os milhões de páginas de documentos daquele acervo à sociedade era apenas um sonho. Hoje, 350 mil páginas de documentos históricos já podem ser acessadas pela Internet, desde março do ano passado. Com o enorme empurrão produzido pela entrada em vigor nesta semana da Lei de Acesso à Informação, pode-se imaginar que, até mesmo em poucos anos, a totalidade dos docu-
mentos acumulados na Assembleia em seus mais de 180 anos de história poderão estar disponíveis ao cidadão na internet – o mesmo terão que fazer, ao seu tempo, os demais órgãos públicos. É a chamada disponibilização proativa, que está revolucionando a pesquisa junto às fontes primárias. JU – Quais as atividades que vem desenvolvendo junto aos alunos do IFCH? Carlos Dias – O trabalho teve início com o desafio lançado pela professora Neri de Barros Almeida de organizar um curso para os alunos do IFCH trazendo não só a experiência no trabalho junto ao Acervo da Assembleia, como também uma reflexão sobre os arquivos públicos no Brasil e as novas perspectivas que se abrem à pesquisa. Curiosamente, quando apresentei o projeto, em meados de setembro, tanto a Lei de Acesso à Informação como a Lei da Comissão da Verdade eram ainda apenas projetos que tramitavam no Congresso – seriam aprovadas em 18 de novembro. Naturalmente foram temas presentes nas primeiras aulas. Ao tratar da Comissão da Verdade, analisamos o que passamos a chamar de “A experiência alemã”. Segundo nos informa o historiador Andreas Nachama em um excelente documentário produzido pela Globo News, exibido em nove de março último, os alemães rejeitaram o argumento de que se deve esquecer o passado, não foi feita qualquer concessão aos responsáveis pelos crimes durante o nazismo. Mesmo décadas após, já no final dos anos 1970, a exibição da série Holocausto fez com que cidadãos questionassem seus familiares sobre crimes durante o nazismo, tendo como referência a busca da verdade. Paralelamente ao desenvolvimento do programa, adaptamos “a experiência alemã” ao nosso curso: o trabalho de semestre foi transformado em um exercício de história oral, no qual os alunos vão entrevistar pessoas que têm o que dizer sobre o período autoritário, tendo como referência a Comissão da Verdade. Mesmo ciente das limitações metodológicas que enfrentamos, o entusiasmo e o envolvimento que demonstram os alunos é animador e aguardamos com ansiedade o resultado da reunião de dezenas de depoimentos, na sua grande maioria de cidadãos comuns, que viveram sob a ditadura no Brasil.
Militares ignoram aplausos da plateia após discurso da presidente Dilma Roussef sobre militantes que lutaram contra a ditadura na instalação da Comissão da Verdade, em cerimônia no Palácio do Planalto, em Brasília, no último dia 16