Foto: Cenipa
Risco aviário é mapeado
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Estudo monitora a fauna nos cinco principais aeroportos estaduais de São Paulo para reduzir o risco aviário – possibilidade de colisão de aeronaves com pássaros – e aumentar a segurança.
Simulador ‘dá vida’ a robô
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Simulador criado em pesquisa conjunta com o Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI) ajuda a criar habilidade de andar sozinho para robôs autônomos em desenvolvimento.
Jornal daUnicamp Foto: Antonio Scarpinetti
www.unicamp.br/ju
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Campinas, 17 a 23 de junho de 2013 - ANO XXVII - Nº 565 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
9.91.22.9744-6-DR/SPI Unicamp/DGA
CORREIOS
FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT
Fotos: Antoninho Perri
Técnica diminui recidiva em câncer de colo de útero
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Funcionária restaura mobiliário descartado Sistema melhora funções de lesionados medulares
12 Foto: Divulgação
IMPRESSO ESPECIAL
A missão do físico José Joaquín Lunazzi
Nas xilogravuras, as cores da festa ~
Marola ou tsunami ? 6 e7
André Biancarelli, Antonio Carlos Macedo e Silva, Francisco Lopreato, José Maria da Silveira, Maryse Farhi e Pedro Rossi, professores do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, fazem um diagnóstico da conjuntura econômica brasileira.
Produtos expostos em hipermercado em Campinas: inflação entra na pauta
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Campinas, 17 a 23 de junho de 2013
Restaurar para preservar Projeto de funcionária da DGRH deixa novo mobiliário normalmente descartado
(e usufruir)
Fotos: Antoninho Perri
MARIA ALICE DA CRUZ halice@unicamp.br
espaço escolar pode se tornar visualmente mais alegre sem dispêndio significante. Uma mesa diante da qual o pequeno usuário sequer consegue alcançar folhas de papel e aquarela pode ter os pés cortados, a madeira restaurada, pintada e apoiar as primeiras obras de arte ou as primeiras letras. Nesta história, a mesa foi captada em um lugar chamado Seção de Bens Disponíveis da DGA. Se alguém está à espera da aprovação de projetos dispendiosos e precisa preservar o dinheiro público, que tal fazer uma visita a este setor e conhecer o projeto de restauração da enfermeira e atualmente assessora da Coordenadoria da Diretoria de Recursos Humanos Valéria Fernandes Ferreira Bonfim? Ao contemplar seus pequenos alunos sendo educados com um mobiliário a se deteriorar, Valéria, na época diretora da “escola”, inquietou-se e, movida por aspectos educacionais, procurou restauradores, analisou a diferença orçamentária entre comprar e restaurar e transformou bens rejeitados por outras unidades da Universidade em bens úteis até hoje para os filhos de funcionários frequentadores da creche. Até o momento, Valéria restaurou 182 peças encontradas ou a caminho do setor de Bens Disponíveis. Habituada a ver algumas pessoas da família reaproveitando recursos, desde batentes e portas até jogo de sofás, Valéria não consegue entender por que as pessoas ou empresas esperam a hora de poder realizar o famoso “troca tudo”, sendo que muitas vezes a solução está à mão. “Tenho uma tia de mais de 90 anos que adora juntar material e um irmão que tem uma chácara cheia de material de demolição. Meu pai também sempre procurou restaurar a comprar novo”, declara. A mesma sensação experimentada na creche ela teve ao chegar à Diretoria Geral de Recursos Humanos da Unicamp, em 2009, para trabalhar na Divisão de Educação Infantil e Complementar (Dedic). Tudo o que seis pessoas tinham para começar a trabalhar naquele espaço da DGRH, eram duas mesas e duas cadeiras. Diante da preocupação das colegas em obter mobiliário, sugeriu a busca de móveis no setor de Bens Disponíveis. Logo, com o trabalho de um bom restaurador, tinham o mobiliário mais novo e diferente em cores e formas. “Cadeiras com aquele couro verde e rasgado ganharam uma estampa moderna e inusitada.” A sala com cara de nova logo chamou a atenção de outras áreas da DGRH, e os pedidos se apressaram e se agigantaram. Valéria confessa ter se sentido triste e incomodada durante seus primeiros dias no espaço físico da DGRH, pela imagem e pelas condições do ambiente. A conversa com a então Coordenadoria foi inevitável, mas não sem ter em mãos uma proposta de restauração, que trazia em seu bojo a sensibilização para um espaço sustentável. Nada muito oneroso que obrigasse a troca de todas as peças ali existentes, já que trazia na bagagem a experiência de visualizar as potencialidades de um bom móvel, que necessitasse apenas de um restauro e não de um descarte. A conversa com a Coordenadoria teve respostas positivas e hoje a área de recursos humanos tem um ambiente repaginado. Aos poucos, estofamentos rasgados e sem espaldar deixam de passar uma mensagem negativa para as pessoas recepcionadas. Estavam, na verdade, à espera de uma oportunidade de trocar tudo, mas isso demandaria tempo e recursos financeiros, na opinião de Valéria. Hoje, os olhos até brilham ao contemplar as salas e as recepções mais aconchegantes. A mesa de pinho de riga e peroba (madeiras em extinção), vinda de Portugal, teria outro destino não fosse o senhor José Moreira (funcionário aposentado da extinta marcenaria da Unicamp) tê-la apresentado a Valéria, que decidiu encaminhar para restauração e coloração com tinta automotiva azulclaro. A peça era utilizada como apoio na referida marcenaria. “Achei muito bonita, e o foco dele estava na qualidade da madeira”, relembra Valéria. Quis deixar na cor natural, mas como estava danificada pelas ferramentas, pediu para lixar e, com o restauro, uma nova mesa decorava o rol da DGRH. Hoje, ela não mais é castigada pelos serrotes, mas suporta uma exposição permanente sobre a história do logotipo da DGRH, segundo Valéria. Diante da peça, na parede, informações sobre a procedência, a matéria-prima, data de restauro. “É importante ter essa sinopse diante dos bens recuperados para que os visitantes e os novos funcionários, ao chegar, saibam que numa área de rejeito de material havia uma mesa com essa qualidade, que representou uma histó-
Valéria Fernandes Ferreira Bonfim, funcionária da Coordenadoria da Diretoria de Recursos Humanos: em busca do espaço sustentável
Móveis restaurados: cara de novo em ambiente repaginado
ria da universidade – quando a Unicamp tinha sua própria marcenaria e produzia seus próprios móveis. Tenho orgulho de deixar essa história registrada para as próximas gerações”, explica. Valéria salienta que todas as peças de muito valor, são acompanhadas de uma placa com resgate histórico. A iniciativa visa não apenas o registro da memória, mas o estímulo para que outras pessoas cotem o restauro antes de recorrer à substituição por um bem novo. As sinopses são acompanhadas de uma referência à “Declaração de Política Ambiental da Unicamp”. Durante o projeto de restauração, alguns valores especiais, como a mesa pertencente a dona Lourdes Pretti, falecida ano passado, que prorrogou por muitos anos sua aposentadoria por dedicação ao DGRH, dirigido por ela durante muito tempo. “Estas coisas precisam ser registradas”, diz Valéria. Além de harmonizar o ambiente, o que na opinião de Valéria é muito importante num local de recepção de visitas e de captação de novos profissionais para a Unicamp, as restaurações representam uma economia de 55% a 75% em relação à aquisição de produtos novos. “Sempre procuro negociar um bom valor nas restaurações, por se tratar de uma iniciativa no setor público” e com o intuito de mostrar às pessoas que vale a pena, tanto pelo recurso economizado, quanto pelo valor educacional, que a atitude transmite.
Valéria também promove a permuta de material, pois muitas vezes um móvel que não interessa mais a uma área pode ter serventia importante a outra. Foi o caso de algumas cadeiras adquiridas por determinada área, mas eram baixas para a mesa de reuniões. “Foi uma economia importante para o GGBS”, diz o funcionário Roberto Carlos Índio. Antes de modificar o ambiente, Valéria envolve toda a área a ser redecorada. “Preservamos o gosto das pessoas, mas com cuidado para que não fique nem muito ousado e nem muito contido”. A mistura entre o azul e o café-comleite tem de ser harmoniosa, em sua opinião. Além de um espaço novo, as unidades têm a chance de resgatar móveis de qualidade atualmente descartados, já que há alguns anos era possível à Universidade adquirir produtos de primeira linha. Hoje, a oferta aumentou, e a probabilidade de adquirir um bem de menor qualidade, com tempo de vida útil também menor, é grande. A iniciativa de Valéria provocou a procura por parte de outras unidades da Unicamp, principalmente depois de sua apresentação na Semana Interna de Prevenção de Acidentes de Trabalho (Sipat) e no Congresso dos Profissionais das Universidades Estaduais de São Paulo (Conpuesp). Em 2013, o projeto foi apresentado no Fórum Permanente da Universidade. “É gostoso ver tudo acontecendo de forma natural, e não impositiva. As pessoas tomam conhecimento e nos procuram”, observa. Para Valéria, as pessoas precisam tomar cuidado para que as expressões de impacto criadas de tempos em tempos, como: sustentabilidade, qualidade de vida, qualidade ambiental ou qualidade no trabalho, não se tornem apenas um modismo, mas sim uma busca real e coerente da sua significância e de possíveis desdobramentos. No caso da Unicamp, a Declaração da Política Ambiental agora é um documento legitimado, que pode ser utilizado para fundamentar escolhas e ações mais sustentáveis para toda a comunidade universitária, inclusive apoiando projetos, como desta natureza, segundo Valéria. Se a pessoa repete o tempo todo tais expressões, ela tem de se comprometer e buscar meios para concretizar sua ideia, na esfera de atuação que cada um pode ter, na opinião da assessora. Para ela, as pessoas precisam pensar no que efetivamente podem fazer para mostrar seu engajamento nesses setores. “A Declaração da Política Ambiental é algo relativamente recente, mas é um documento reconhecido e sua aplicação tem de ser efetiva”, pontua.
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Campinas, 17 a 23 de junho de 2013
Simulador transforma equações matemáticas
Ferramenta ajudará pesquisadores no desenvolvimento de tecnologias para componentes autônomos
em veículo robótico virtual ALESSANDRO SILVA alessandro.silva@reitoria.unicamp.br
esquisadores da Unicamp estão desenvolvendo em laboratório a capacidade de um veículo elétrico terrestre andar sozinho, como se escrevessem um novo “código genético”, apoiado em matemática e leis da física, para um novo robô que irá “nascer”. Essa habilidade permitirá que, um dia, uma máquina possa deslocar-se, sem auxílio humano, em um terreno normal ou acidentado antevendo eventuais riscos de derrapagens, quedas e obstáculos em sua rota, como se tivesse um senso de direção e equilíbrio, além de uma percepção autônoma de ameaças. Também podem sair desses estudos novas ferramentas para evitar que motoristas envolvam-se em acidentes, uma aplicação conhecida como “auxílio à condução”. Mas não é preciso esperar o veículo-robótico ficar pronto para testar essa habilida-
de de andar sozinho, graças a um simulador e a um modelo matemático desenvolvidos no mestrado da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM), que permitem verificar a reação dessa máquina no computador por meio do processamento de centenas de cálculos complexos – no caso, por analogia, que formam o “DNA” dessa habilidade, as informações que permitem avaliar os comportamentos esperados do veículo diante dos mais variados tipos de terreno. Quando a ferramenta de simulação estiver pronta, ajudará pesquisadores no estudo de novas tecnologias para essa área da robótica. “O ambiente do simulador é usado pelo projetista para o desenvolvimento de controladores de veículos-robôs”, explica o professor Ely Carneiro de Paiva, docente do Departamento de Projeto Mecânico da FEM, orientador da pesquisa realizada pelo engenheiro de controle e automação Rafael de Angelis Cordeiro, com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Foto: Antonio Scarpinetti
O “simulador de veículo terrestre” foi criado no contexto do Projeto Vero (Veículo Robótico), uma iniciativa do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI) para o desenvolvimento de um veículo autônomo capaz de andar em terrenos irregulares – onde há aclives, declives e condições de baixa aderência, por exemplo. Na prática, a habilidade e a ferramenta em estudo na Unicamp serão integradas ao veículo elétrico adquirido por essa unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), para servir como um grande laboratório de pesquisas das mais diversas sobre robótica no país. Para entender o trabalho do engenheiro Rafael Cordeiro, é preciso analisar as etapas de um projeto de veículo robô destinado a “todo terreno” – ou seja, que irá enfrentar os mais diversos tipos de obstáculos. Primeiro, foi necessário recorrer a inúmeras variáveis matemáticas e a leis físicas para encontrar um modelo capaz de descrever o comportamento do veículo e chegar a um simulador capaz de materializar o comportamento do robô. Quando em movimento, surgem forças que podem levar um veículo a escorregamentos (longitudinais) ou derrapagens (laterais) das rodas e até mesmo à perda de aderência.
agricultura, ou para o desenvolvimento de novas ferramentas de auxílio à condução, capazes de alertar o motorista sobre o risco de situações que podem levar a derrapagens e a acidentes no trânsito. Os veículos robóticos em geral, como o do projeto Vero, podem ser classificados segundo o meio em que operam (subaquáticos, aquáticos de superfície, terrestres e aéreos) e forma de locomoção (rodas, esteiras, patas, hélices etc) e o grau de atuação. Na modalidade mais simples de operação, podem ser guiados remotamente, mas também podem vir a funcionar de modo autônomo. Traduzindo, o veículo em questão é uma versão terrestre de “VANTs” (Veículos Aéreos Não-Tripulados) ou “UAVs” (do inglês, Unmanned Aerial Vehicle), também conhecidos como “drones”, que começaram a ser empregados no Brasil, recentemente, pela Polícia Federal e pela Força Aérea Brasileira, bastante conhecidos pelo emprego militar no Afeganistão e no Iraque. Voam operados de um ponto remoto e, no caso de perda de sinal, retornam sozinhos à base. VANTs também vêm sendo desenvolvidos por empresas nacionais visando aplicações agrícolas além das possibilidades de aplicação na área de segurança.
FERRAMENTA
Da esq. para a dir., Rafael Angelis Cordeiro, Samuel Siqueira Bueno e Ely Carneiro de Paiva e o veículo robótico: plataforma usada no estudo
Ensaio irá validar dados de computador Na tela do computador, é possível observar a trajetória programada sendo percorrida pelo veículo robótico em desenvolvimento e acompanhar o desempenho dele, nas retas e nas curvas, de acordo com a aderência ao solo, conforme as variáveis lançadas pelo programador para analisar a habilidade de “andar sozinho”. Por enquanto, a interface com o usuário é simples, mas poderá ser aprimorada a exemplo de outros simuladores. Os visualizadores atuais permitem observar o veículo em movimento, como se o projetista olhasse o movimento de cima (e visse o circuito programado), de trás e de lado, acompanhando as reações da máquina conforme o terreno programado – e as forças físicas que atuam no robô ao longo do percurso. Numa curva mais fechada, com terreno menos aderente, é possível ver o veículo derrapando e corrigindo automaticamente a rota para retornar ao trajeto inicialmente previsto. Nos próximos dois meses, os parâmetros obtidos com o simulador e o modelo matemático criado no mestrado na Unicamp serão validados, ou seja, os resultados obtidos com as simulações serão confrontados com os dados recolhidos em ensaios reais realizados com o veículo VERO – sensores desse robô irão captar informações durante um percurso pré-selecionado, real, e o mesmo teste será realizado no simulador para verificar a exatidão oferecida pelos dois ensaios. Os testes finais serão realizados no
Laboratório de Ensaios Dinâmicos (LabEDin) da Unicamp, sob a coordenação do professor Pablo Siqueira Meirelles, diretor associado da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM). Para que um veículo robótico realize um trajeto de forma autônoma, os projetistas precisam assegurar que ele o fará de forma segura, sem risco de acidentes e de perda do equipamento. O veículo robótico elétrico do CTI Renato Archer, que será utilizado para os ensaios reais, recebeu o mesmo nome do projeto: Vero. A bordo dele, estão sensores que ajudarão a confirmar a capacidade de acerto do simulador e do modelo criado pela Unicamp. “As características do veículo permitem seu uso experimental em contextos bastante realistas – seja, por exemplo, no âmbito de ambientes similares aos urbanos, seja no campo agrícola – mas de menor complexidade que no caso dos veículos finais (automóveis ou máquinas agrícolas de grande porte). Ademais, guardadas as devidas diferenças, o veículo constitui opção para o desenvolvimento e experimentação voltadas a outras configurações de veículos terrestres, ou mesmo outras modalidades – como veículos aéreos, por exemplo, dado que validações iniciais em veículo terrestre são muito mais simples e seguras”, escreveram pesquisadores que participam do Projeto Vero no artigo “Uma plataforma para pesquisa e desenvolvimento em robótica terrestre de exterior”, publicado em 2009.
E por que é necessário um simulador? “Não podemos desenvolver técnicas de controle de um veículo autônomo ou para auxílio à condução diretamente no veículo, porque é caro, arriscado”, afirma o autor da dissertação de mestrado “Modelagem e Controle de Trajetória de um Veículo Robótico Terrestre Exterior”. Assim, com o apoio do computador, projetistas podem escapar de problemas e imprevistos no desenvolvimento, por exemplo, dos controladores que irão guiar o veículo autônomo, a exemplo do que acontece na Unicamp. Segundo os pesquisadores, a criação de um modelo dinâmico (matemático) para um veículo terrestre é complexa e envolve fenômenos de difícil mensuração, notadamente em relação ao contato pneu-solo. Nesse estudo, é como se o projetista elaborasse, com antecedência, todos os efeitos, forças e comportamentos que provocarão impactos no veículo robótico, levando em conta os mais diversos tipos de terreno aos quais ele será submetido quando estiver em funcionamento. Apesar de existirem simuladores hoje no mercado, todos guardam áreas sensíveis em segredo, o que dificulta o controle de toda tecnologia pelo pesquisador - por isso a importância do trabalho desenvolvido entre a Unicamp e pelo CTI Renato Archer. Além disso, certos parâmetros usados para analisar o comportamento do veículo-robô são muito bem guardados pelos fabricantes de componentes, como no caso dos pneus, explicam os envolvidos nesse estudo. “O trabalho realizado pela Unicamp aborda a parte desafiadora para essa classe de veículo [todo terreno], que trafega em situação de aderência variável e em locais sujeitos à inclinação”, afirma o pesquisador Samuel Siqueira Bueno, da Divisão de Robótica e Visão Computacional do CTI Renato Archer. A questão central dessa pesquisa é caracterizar o comportamento do veículo e como controlá-lo, seja para que um trator ande sozinho, por exemplo, em um projeto de automação para a
IMPORTÂNCIA Estratégias de controle e de seguimento de trajetória de um veículo robô, como as que estão em estudo na Unicamp, constituem a base para a concepção de navegação autônoma, como destacam os autores da pesquisa em um artigo sobre o trabalho. As possibilidades de aplicação desse tipo de tecnologia são várias e estratégicas para o país, conforme prospecção de oportunidades científico-tecnológicas realizada pelo CTI Renato Archer e pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Além de financiamento do governo federal (MCTI), as pesquisas em torno do projeto Vero recebem recursos da Fapesp, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Sistemas Embarcados Críticos (INCT-SEC). O Projeto Vero também conta com parceiros internacionais, como o Instituto Nacional Francês para a Pesquisa em Ciências Computacionais (INRIA) e a Universidade de Tecnologia de Compiègne (UTC), na França, além do Instituto Superior Técnico (IST) de Lisboa, em Portugal. No caso da pesquisa realizada na Unicamp, o mestrando estudou em Lisboa, sob a orientação do professor José Azinheira (IST), onde aprofundou as formulações iniciais, realizadas em Portugasl, sobre modelagem e controle de trajetória de um veículo robótico terrestre.
Publicação Dissertação: “Modelagem e controle de trajetória de um veículo robótico terrestre de exterior” Autor: Rafael de Angelis Cordeiro Orientador: Ely Carneiro de Paiva Unidade: Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) Financiamento: Fapesp
VERO Fabricante: Freedom Veículos Elétricos Ltda Dimensões: 2,3 m de comprimento, 1,35 de largura e 1,5 m de altura (com barras de fixação para os sensores) Suspensão: independente nas quatro rodas, com sistema mola-amortecedor Rodas: Aro 0,72, com pneus todo-terreno Motorização: dois motores elétricos de corrente contínua, atuando independentemente nas rodas traseiras Alimentação: 4 baterias tracionárias de 6V e 210A Velocidade máxima: 12 km/h Carga útil: 200kg
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Campinas, 17 a 23 de junho de 2013
Primeiros passos de uma longa jornada Fotos: Divulgação
SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br
tese de doutorado do engenheiro de computação Guilherme Nunes Nogueira Neto é dedicada integralmente aos voluntários anônimos que colaboraram com suas investigações. A esperança destes pacientes, alimentada pela expectativa imposta por suas próprias condições de vidas, marcou os testes conduzidos pelo pesquisador da Unicamp. Ele, porém, teve de se manter firme à realidade, frustrando, algumas vezes, os sonhos destas pessoas. “Uma pergunta emblemática que o lesionado medular faz quando chega ao nosso laboratório é: ‘escuta, mas eu vou voltar a caminhar?’ Infelizmente, temos de deixá-lo alerta quanto à realidade do problema, explicando que, inicialmente, é só um exercício. Mas, no fundo, eu acredito que a estimulação elétrica neuromuscular tenha perspectivas futuras”, prevê Guilherme Nogueira. O seu doutorado foi defendido no início deste ano junto à Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da Unicamp. A proposta do trabalho consistiu em viabilizar um sistema automático de estimulação elétrica para lesionados medulares, empregando uma nova técnica de controle motor. “Nós já conseguimos, em ambiente de laboratório, que alguns pacientes fiquem de pé, apoiados em barras. Agora, o próximo passo é fazer com que eles deem alguns passos para que possamos monitorá-los. Existe toda a possibilidade que isso aconteça por meio da estimulação elétrica. O grande problema é sempre a etapa fora do laboratório, ou seja, fazer com que isso se transforme num sistema no qual os voluntários usem na rua, em casa, no dia a dia”, reconhece. O principal ganho do sistema de estimulação elétrica neuromuscular é o benefício à qualidade de vida dos pacientes, embora ainda não seja possível recuperar os movimentos naturais perdidos pela lesão. As investigações podem, no entanto, auxiliar no desenvolvimento de novas terapias que permitiriam a realização dos sonhos dos lesionados. O sistema elaborado pelo pesquisador da Unicamp restaura, artificialmente, as funções perdidas pela musculatura, que ficaram inativas, muitas vezes, por longo período. O diferencial é o monitoramento e controle automático dos movimentos por meio da mecanomiografia, grandeza mecânica responsável por registrar a vibração dos músculos em contração. O estudioso afirma que os exercícios utilizando a estimulação elétrica neuromuscular previnem uma série de acometimentos comuns aos lesionados medulares, como má circulação sanguínea, incontinência urinária e intestinal, osteoporose, úlceras, trombose, embolia pulmonar, entre outros. “O sistema traz benefícios do ponto de vista fisioterapêutico e fisiológico, podendo auxiliar médicos, clínicas de fisioterapia, além de pesquisadores que trabalham na área”, garante o engenheiro da computação. De acordo com ele, o método funciona por meio de um equipamento controlado por um software. O trabalho é resultado de parceria entre a Unicamp e a Pontifícia Univer-
Estimulação elétrica neuromuscular permite maior controle motor em lesionados medulares Não é um sinal completo porque a grandeza é a mesma. Já com a mecanomiografia, a vantagem seria poder aplicar a estimulação elétrica monitorando o sinal motor durante todo o tempo, que passa a ser integral”, compara. O sinal motor inserido em um sistema automático permite, conforme o estudioso da Unicamp, antecipar o momento crítico da perda de desempenho, causado, por exemplo, pela fadiga muscular. Além disso, seria possível traçar objetivos mais claros para as sessões de treinamento, determinando, assim, a angulação do movimento. “O sistema de controle se responsabiliza, automaticamente, para que a perna vá até determinado grau e diminua. Seria possível, inclusive, desenvolver um programa de biofeedback, que forneceria informações importantes para que os próprios pacientes desenvolvam melhorias nas suas terapias”, acrescenta Nogueira.
ACEITAÇÃO E
APRIMORAMENTOS
A aceitação do uso dos sistemas de estimulação elétrica neuromuscular ainda é uma barreira, admite o investigador da Unicamp. “A quantidade de cabos pode, por exemplo, causar certa rejeição por parte do paciente. E, de fato, isso é compreensível”, reconhece. Guilherme Nogueira revela que novas técnicas de imagens cinemáticas já vêm sendo testadas para tornar o uso da estimulação elétrica mais aceitável aos pacientes. “O objetivo é tentar registrar o ângulo articular por uma câmera para reduzir a quantidade de cabos. A ideia é fazer com que o voluntário se sinta mais ele”.
Publicações
Paciente lesionado é submetido ao tratamento: sistema restaura, artificialmente, as funções perdidas pela musculatura
sidade Católica do Paraná (PUCPR), da qual Guilherme Nogueira é docente. O pedido de patente já foi requerido junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi). A orientação da pesquisa de Nogueira coube à docente Vera Lúcia da Silveira Nantes Button, do Departamento de Engenharia Biomédica da FEEC. O professor Percy Nohama, que atua na PUCPR e na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), coorientou o estudo. Houve financiamento parcial do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O pesquisador da Unicamp informa que os ensaios com voluntários lesionados e hígidos (não lesionados), ambos sem treinamentos prévios, foram realizados no Laboratório de Engenharia de Reabilitação (LER) da PUCPR e na Associação dos Deficientes Físicos do Paraná (ADFPR). Os testes foram divididos em quatro etapas.
SISTEMAS DE CONTROLE
A estimulação elétrica neuromuscular tem auxiliado lesionados medulares a contornar as dificuldades impostas pela perda de
movimentos. Os estímulos elétricos de baixa intensidade ativam a musculatura, permitindo a realização de movimentos funcionais durante os exercícios. A técnica necessita, porém, de sistemas de controle artificiais devido à perda, pela lesão medular, do controle motor natural daquele membro. Fenômenos como a fadiga muscular também comprometem os movimentos realizados pela estimulação elétrica, complementa o engenheiro da computação. “A constituição muscular dos lesionados é diferente da nossa. Portanto, a capacidade de sustentar uma posição, mesmo que artificial, para eles é bem difícil. A musculatura é mais fraca. A perda de desempenho por conta destes fatores é um dos problemas que a estimulação elétrica neuromuscular enfrenta”, expõe Guilherme Nogueira. É neste sentido que os sistemas de controle vêm sendo estudados e aperfeiçoados, situa o pesquisador. “A ideia do nosso trabalho foi usar uma nova estratégia como sistema de controle, capaz de acompanhar, indiretamente, as condições metabólicas e fisiológicas da musculatura durante o exercício. Existem algumas técnicas clássicas, como o acompanhamento de lactato e a utilização da eletromiografia, procedimento mais convencional empregado para monitorar as contrações musculares”, explica.
ALTERNATIVA
Engenheiro de computação Guilherme Nunes Nogueira Neto: foco em voluntários anônimos
A inovação da pesquisa, assegura Guilherme Nogueira, foi utilizar outra técnica que permitisse um monitoramento mais eficiente. “A estimulação elétrica é uma grandeza elétrica, assim como a eletromiografia. Desenvolvemos um primeiro sistema a partir da eletromiografia, mas ele não era rápido suficiente. Por se tratar das mesmas grandezas, um sinal interferia no registro do outro. A ideia foi partir para uma alternativa, usando a mecanomiografia, que monitora a grandeza mecânica”, justifica. Com a mecanomiografia, não há interferência do estímulo elétrico no sinal mecânico. “Nos sistemas convencionais, a leitura do sinal pela eletromiografia é realizada nos intervalos, ou seja, quando não se aplica a estimulação elétrica. É o chamado sinal residual.
KRUEGER-BECK, E. et al. Mechanomyographic response during FES in healthy and paraplegic subjects. In: ANNUAL INTERNATIONAL CONFERENCE PROCEEDINGS OF THE IEEE ENGINEERING IN MEDICINE AND BIOLOGY SOCIETY, 2010, Buenos Aires. Anais… Buenos Aires: IEEE, 2010. p. 626-629. KRUEGER, E. et al. Analysis of functional electrical stimulation parameters by muscular contraction time and knee joint angular variation. Biomedical Engineering Letters, v. 3, n. (in press), 2013. NOGUEIRA-NETO, G. N. et al. Triaxial mechanomyography of the biceps brachii muscle during sustained submaximal isometric contractions. In: IFMBE PROCEEDINGS WORLD CONGRESS ON MEDICAL PHYSICS AND BIOMEDICAL ENGINEERING, 2009, Munich, Germany. Anais… Munich, Germany: Springer, 2009. p. 1502-1505. NOGUEIRA-NETO, G. N. et al. Sistemas implantáveis de estimulação elétrica funcional para controle artificial de movimentos funcionais. Revista Brasileira de Engenharia Biomédica, v. 26, n. 2, p.121-142, 2010. SCHEEREN, E. M. et al. Investigation of muscle behavior during different functional electrical stimulation profiles using mechanomyography. In: ANNUAL INTERNATIONAL CONFERENCE OF THE IEEE ENGINEERING IN MEDICINE AND BIOLOGY SOCIETY, 2010, Buenos Aires. Anais… Buenos Aires: IEEE, 2010. p. 3970-3973.
Tese: “Viabilidade do emprego de mecanomiografia no controle motor artificial em lesados medulares empregando estimulação elétrica neuromuscular” Autor: Guilherme Nunes Nogueira Neto Orientadora: Vera Lúcia da Silveira Nantes Button Coorientador: Percy Nohama Unidade: Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) Financiamento parcial: CNPq
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Campinas, 17 a 23 de junho de 2013
Parceria amplia
Fotos: Divulgação
segurança em aeroportos de São Paulo
Asa de avião avariada depois de choque com ave: de 2006 a 2010, ocorreram 2,33 colisões a cada 10 mil movimentos no Brasil Foto: Antoninho Perri
Pesquisadores reúnem informações sobre a presença de pássaros e animais em aeroportos do Daesp
O professor Wesley Rodrigues Silva, coordenador do levantamento: próxima etapa prevê a elaboração de planos de manejo
ALESSANDRO SILVA alessandro.silva@reitoria.unicamp.br
inóculos e caderneta nas mãos. Cada pássaro é observado, tudo é registrado. O objetivo é entender como aves e outros bichos utilizam o espaço de um aeroporto e, em razão disso, quais riscos representam para os aviões que pousam e decolam ali. Esse trabalho é de extrema importância para a segurança do voo, já que um pequeno pássaro pesando meio quilo pode gerar um impacto de até quatro toneladas ao colidir com um avião em movimento, dependendo da velocidade. Pesquisadores da Unicamp, em parceria com o Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo (Daesp), estudam e reúnem informações preciosas sobre a fauna local para subsidiar a elaboração de planos de manejo específicos para cinco aeroportos estaduais: Jundiaí (Rolim Adolfo Amaro), Campinas (Amarais), Ribeirão Preto (Leite Lopes), São José do Rio Preto (Eribelto Manoel Reino) e Presidente Prudente, que juntos, no ano passado, receberam cerca de dois milhões de passageiros. Nessa parceria, a Unicamp fornece especialistas para a identificação de espécies residentes nos aeroportos ou em trânsito (que passam por ali), também para a análise de hábitos desses animais e, por fim, a elaboração de planos com ações específicas para mitigar os problemas, segundo o coordenador executivo desse levantamento e docente do Departamento de Biologia Animal, Wesley Rodrigues Silva, do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp. “Fomos procurados para montar um estudo que pudesse fornecer subsídios para a elaboração de planos de manejo de faunas”, explica. O Laboratório de Planejamento Ambiental (Lapla), da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Unicamp, sob a coordenação da docente Rozely Ferreira dos Santos, participa desse trabalho e está responsável pela elaboração de planos de manejos específicos para os aeroportos.
Mas não precisa se alarmar. A preocupação com o risco aviário (“bird strike”, em inglês) é um tema da agenda mundial da segurança de voo e os estudos existentes mostram que a ocorrência de casos de colisões de aviões com pássaros está abaixo da média estatística mundial. No Brasil, no período de 2006 a 2010, ocorreram 2,33 colisões a cada 10 mil movimentos, abaixo da média de 5 ocorrências/10 mil, numa escala que vai de zero a dez, segundo a dissertação de mestrado profissional de segurança de aviação e aeronavegabilidade continuada “Método de Avaliação do Risco Aviário em Aeroportos” (veja texto nesta página), apresentada no ano passado pelo tenente-coronel-aviador Francisco José Azevedo de Morais, na pós-graduação em engenharia aeronáutica e mecânica do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Nesses cinco anos (2006 a 2010), ocorreram mais três mil colisões de aeronaves com pássaros no país, conforme reportes recebidos pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), ligado ao Comando da Aeronáutica. Inicialmente, a parceria com a Unicamp atinge cinco aeroportos estaduais (Jundiaí, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, Campinas e Presidente Prudente), três deles utilizados pela aviação regular e dois que integram a lista de aeródromos considerados prioritários para o gerenciamento do risco aviário pelo Comando da Aeronáutica. Juntas, essas localidades representam 71% do total de passageiros atendidos em 2012 pelos
aeródromos estaduais. “A meta final é implantar planos de manejo em todos os aeroportos da rede estadual, priorizando sempre os que têm aviação regular e, em seguida, aqueles com aviação executiva com maior movimento”, explica a assessora ambiental do Daesp, Mika Saito. A elaboração de planos de manejo de fauna em aeroportos é uma exigência da legislação aeronáutica para minimizar os riscos decorrentes da possibilidade de colisão entre aeronaves e animais presentes em áreas operacionais. Em 2009, de acordo com o Sindicato Nacional das Empresas Aéreas (SNEA), as colisões entre aeronaves e pássaros registradas no país provocaram prejuízo estimado de US$ 21 milhões.
INÍCIO
O trabalho da Unicamp com o Daesp existe desde 2007, quando a universidade começou o levantamento da fauna no Aeroporto de Jundiaí. Já foram realizados dois períodos de um ano de acompanhamento nessa localidade, um concluído em 2008 e o outro em 2011. “Precisamos de no mínimo um ano, porque as espécies sofrem variação de comportamento nesse período por causa do clima”, explica o coordenador do levantamento e docente da Unicamp, Wesley Silva. Nesse intervalo, foram testadas e aprimoradas metodologias específicas para os aeroportos. “Percebemos que não poderíamos trabalhar da
20% dos aeroportos do país registraram colisões
Coruja-buraqueira em aeroporto: legislação aeronáutica exige planos para que riscos sejam minimizados
Dos 744 aeródromos existentes no país, considerados também os helipontos, 155 (20,83%) registraram ocorrências de colisões com aves no período de 2006 a 2010, conforme reportes recebidos pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA). Foram contabilizadas 3,3 mil ocorrências em um universo de quase 13 milhões de movimentos aéreos (pousos, decolagens e toques/arremetidas) realizados no país. Os números fazem parte de dissertação de mestrado profissional de segurança de aviação e aeronavegabilidade continuada apresentada no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) pelo tenente-coronel-aviador Francisco José Azevedo de Morais, do Cenipa, que analisou a questão do risco aviário no Brasil. Segundo o estudo, a maior parte (92,46%) das colisões de aeronaves com aves
ocorre abaixo de mil metros de altitude, levandose em conta o total de ocorrências de colisões nas quais foi possível identificar a altitude da aeronave. O levantamento mostrou ainda que, de 2006 a 2010, não foi possível identificar o tipo de ave na maioria das ocorrências (54,33%) e que morcegos e fauna terrestre contribuíram em um número pequeno de registros (1,84%). No Brasil, 33 espécies de aves provocaram 43,82% das colisões analisadas, com predominância para o quero-quero (29,18%), urubu (26,14%), carcará (8,57%), coruja (8,44%), gavião (5,53%) e pombo (4,56%). As seis espécies de aves mencionadas, apesar de representarem 18,18% daquelas envolvidas nos registros de colisões de aeronaves com pássaros, contribuíram com 82,42% das ocorrências no período analisado pelo autor do estudo.
mesma forma como em uma mata, em um levantamento normal de fauna, porque alguns detalhes são muito importantes no contexto desse trabalho.” Na sequência, o levantamento da fauna foi ampliado para os Aeroportos de Ribeirão Preto, de São José do Rio Preto, de Campinas (Amarais) e de Presidente Prudente. Ornitólogos (aves) e mastozoólogos (mamíferos) integram a equipe do professor Wesley Silva que está mapeando a área dos aeroportos paulistas controlados pelo Daesp. Nesse trabalho, os pesquisadores dividiram a área em setores (pista principal, cabeceiras, pátio etc) para facilitar a observação. Acompanharam rotineiramente a aparição de pássaros e de outros bichos, a interação deles com o espaço local (por exemplo, se chegam à pista de pouso/decolagem) e buscaram rastros para radiografar a população de espécies com hábitos noturnos. “O quadro foi muito parecido em todos os aeroportos, pois as espécies tendem a repetir-se nos aeroportos”, explica o professor da Unicamp. Na parte de fauna, conforme a pesquisa, há seis espécies que geralmente são mais problemáticas para questão da segurança das operações aéreas, umas ligadas ao risco de colisões no ar (urubus, gaviões e pombas) e outras ao risco em solo, no caso de pousos e decolagens (coruja-buraqueira, carcará e quero-quero). A questão do manejo e das ações em estudo será tratada nos planos de manejo a serem elaborados pelo Laboratório de Planejamento Ambiental (LAPLA). “Para uma parte desses animais, o manejo é possível. Para outros, que chegam voando e simplesmente passam por ali, é muito difícil”, avalia. Segundo o professor, o trabalho de levantamento da fauna nos cinco aeroportos está na fase final e o de Jundiaí será o primeiro a receber um plano de manejo, até o ano que vem. Na sequência, ficarão prontos os demais. Para a elaboração desse documento, também serão analisados fatores externos de atração de animais, como a proximidade de lixões. “Para atender demandas em certas áreas de conhecimento, o Daesp tem procurado as universidades em busca de novas metodologias e para garantir a qualidade da prestação de serviços”, explica Mika Saito, assessora ambiental da autarquia paulista. O Daesp administra 27 aeroportos no interior de São Paulo, por onde passaram 2,8 milhões de passageiros em 2012.
A situação do risco aviário no país em 2012
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colisões com pássaros foram reportadas ao Cenipa
São Paulo,
onde estão importantes aeroportos brasileiros, é o Estado com maior número de reportes, seguido de Rio de Janeiro, Paraná e Ceará
Aviação regular ou comercial, concentra o maior número de ocorrências Fonte: Cenipa/Comando da Aeronáutica
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CONJUNTURA
Campinas, 17 a 23
Para onde caminha n
ndré Biancarelli, Antonio Carlos Macedo e Silva, Francisco Lopreato, José Maria da Silveira, Maryse Farhi e Pedro Rossi, todos docentes do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, analisam, nestas páginas, a desaceleração da economia brasileira, tema que ocupa a pauta da mídia nas últimas semanas. Os especialistas projetam cenários diante de um quadro marcado pela piora de indicadores e opinam acerca da posição do país no contexto mundial. ÁLVARO KASSAB kassab@reitoria.unicamp.br
Fotos: Antoninho Perri e Antonio Scarpinetti
CLAYTON LEVY clayton@reitoria.unicamp.br
O mês de junho começou com uma piora da economia brasileira. A inflação está em alta e o Banco Central deve aumentar os juros. O PIB desacelerou e o IPCA bateu no limite da meta. Além disso, a atividade industrial continua desacelerada. Diante desse cenário, em sua avaliação, para onde caminha a economia do país? O que fazer para retomar o caminho do crescimento? André Biancarelli – Em primeiro lugar, é preciso qualificar a piora na conjuntura econômica brasileira. A inflação está em níveis relativamente elevados nos acumulados em 12 meses, mas nos valores mensais a tendência é de queda. Com o crescimento do PIB e da indústria, o quadro é similar: há tendência de aceleração nos últimos dados, mas o problema é o patamar muito baixo do qual se parte e o ritmo da melhora, inferior ao desejado e ao que se projetava. As contas externas, por sua vez, pioram bastante e rapidamente, por conta da balança comercial. Influenciadas por eventos e expectativas no exterior, assiste-se também nos últimos dias movimentos nos fluxos de capital e de pressão especulativa sobre a taxa de câmbio. Mas a piora maior é no “clima” econômico. Ao lado dela, uma importante mudança de direção na política macroeconômica nos últimos dias: elevação maior de juros, permissão para flutuação bem mais livre do câmbio e sinalização de aperto fiscal. Medidas nesta linha contrastam com a diretriz pró-crescimento que vinha caracterizando o governo Dilma – ainda que com resultados tímidos – e podem abortar a recuperação econômica em nome da queda mais rápida da inflação e de uma almejada recuperação da “credibilidade”. O pano de fundo – tanto para a construção do pessimismo, quanto para a mudança na política macro – parece ser o cenário pré-eleitoral, o que certamente não é bom para o futuro da economia brasileira. Este, para além da conjuntura complicada, segue promissor, guiado pelo mercado consumidor grande e ainda em expansão; os investimentos na infraestrutura logística e social; a exploração dos recursos naturais – petróleo à frente. Com este foco mais longo, a estratégia que me parece mais apropriada deve concentrar esforços na recuperação do investimento, na reversão dos processos regressivos na estrutura produtiva – que se refletem no comércio exterior – e no reforço dos vínculos entre os objetivos econômicos e sociais que vêm marcando o desenvolvimento nos últimos tempos. Antonio Carlos Macedo e Silva – Começo por um reparo: a inflação subiu de setembro do ano passado a janeiro deste ano, mas a partir daí taxas menores têm sido registradas. O aumento dos juros pelo Banco Central contribuirá de forma importante para conter a inflação, especialmente se tiver seu efeito habitual sobre a taxa de câmbio, valorizando o real – o que não ocorreu inicialmente, devido ao aumento global da procura por dólares. Aumento dos juros e valorização do real, porém, terão efeitos negativos sobre produção e emprego. Por achar que a economia brasileira precisa crescer e pode crescer mais, defendo que o governo, simultaneamente, acelere o investimento público, o que, ao contrário do que muitos pensam, estimula a produção, o emprego e o investimento privado. Claro que, com a taxa de desemprego baixa que hoje temos, o crescimento gerará pressões de custo. Mas isso é inevitável, se quisermos dar emprego formal e bem-remunerado à grande massa de trabalhadores domésticos e subem-
Macedo e Silva: “Defendo que o governo acelere o investimento público, o que, ao contrário do que muitos pensam, estimula a produção, o emprego e o investimento privado”
André Biancarelli
Antonio Carlos Macedo e Silva
Francisco Lopreato
José Maria Silveira
Maryse Farhi
Pedro Rossi
pregados que ainda existe no país. Paralelamente, é indispensável adotar políticas industriais e de comércio exterior que possibilitem a retomada do crescimento das exportações de produtos relativamente mais sofisticados. Francisco Lopreato – O governo Dilma, apesar dos traços de continuidade em relação aos anos Lula, trouxe novidades no ataque aos problemas de infraestrutura e na condução da política macroeconômica, com o aumento dos benefícios fiscais em favor da indústria, a desvalorização do câmbio, a redução da taxa de juros e as propostas de mudanças na estrutura tributária. Os resultados até agora não foram os esperados. O baixo crescimento industrial e do PIB veio acompanhado de piora no comportamento das contas públicas e aumento da inflação. Além disso, cresceu a pressão política dos agentes com interesses contrariados. A queda dos juros mexeu nos ganhos fáceis do setor financeiro, e a alteração do marco regulatório dos setores de energia, transporte, portos e outros, alimentou as incertezas. A dificuldade de aprovação no Congresso de matérias cruciais à estratégia oficial também contribuiu para conturbar o ambiente macroeconômico. Os desafios à frente não são triviais. Os impasses na política cambial e fiscal, os entraves à recuperação da indústria, os osbstáculos do setor externo e as duras negociações no campo tributário revelam a dimensão dos problemas no futuro próximo. Os sinais, no entanto, não são desalentadores. A inflação apresenta tendência de queda; o emprego e a renda dos assalariados continuam em níveis bem satisfatórios e a indústria demonstra estar em recuperação, com o investimento crescendo em ritmo maior do que o consumo. A rápida deterioração do balanço comercial dos primeiros meses do ano não deve se manter, com a entrada da safra recorde de grãos e a baixa probabilidade de repetição dos resultados da conta petróleo. Finalmente, a aprovação da Lei dos Portos, a retomada das concessões dos campos de petróleo e os leilões de outras áreas de infraestrutura devem, num futuro breve, sustentar o aumento dos investimentos e a retomada do PIB, melhorando o ambiente macroeconômico. José Maria da Silveira – Há visível deterioração do núcleo de economia do governo, com a saída de seu economista mais importante, Nelson Barbosa. Não é fácil culpar apenas o governo. A forma escolhida para manter a economia aquecida já criou nos agentes econômicos – e esses são muito bons nisso – a expectativa de déficit público crescente, devido às isenções dadas ao setor produtivo. O diagnóstico do assessor do BNDES Jorge Arbage é que o problema central está na perda de competitividade da indústria brasileira. O professor [Luiz Gonzaga de Mello] Belluzzo, curiosamente, por ser de linha teórica distinta e até divergente da do Jorge Arbage, concorda que o Brasil ficou preso em um conjunto de setores que correspondem à indústria tradicional e que o período de hiperinflação dos anos 1980 teve um forte impacto estagnante sobre a indústria. A vinculação das políticas sociais e de renda, como o aumento persistente do salário mínimo com a perda da competitividade da indústria em relação ao que ocorre na Ásia, é precária e careceria de mais estudos.
Biancarelli: “O pano de fundo – tanto para a construção do pessimismo, quanto para a mudança na política macro – parece ser o cenário pré-eleitoral, o que não é bom”
Não dá para afirmar isto diretamente, mas o que é claro é que várias atividades intensivas em mão de obra minimamente qualificada batem no muro do fosso educacional brasileiro, que se explica tanto pelo desleixo com a educação no passado, como pela péssima distribuição de infraestrutura para o treinamento tecnológico dos trabalhadores destinados à tarefa que demanda qualificação existente no país. Há uma diversificação regional das atividades sem uma correspondente expansão de infraestrutura para o ensino técnico. Isto apesar da política dos fundos setoriais de privilegiar as regiões Norte e Nordeste do Brasil. A expansão do ensino superior também não segue quaisquer metas de aumento de produtividade do sistema, principalmente da indústria, como menciona o deputado Roberto Freire em seu artigo sobre Unicamp e USP, publicado recentemente. A ação deletéria de parte do Congresso Nacional na tentativa do governo de desengargalar os postos e reduzir os chamados demurrage costs da exportação brasileira sinaliza para a dificuldade em modificar o tipo de arranjo federativo que gerou esse monstro tributário que faz um estranho toma-láda-cá com a classe média brasileira, mas que certamente mina a competitividade da indústria. Em resumo, a percepção de uma crise iminente no Brasil é boa para reverter o falso otimismo que gerou um tipo de investimento perdulário e sustentou loucuras como realizar a Copa do Mundo e as Olimpíadas, no mesmo período, e licitar o TGV brasileiro. A crise tardiamente revelada da Petrobras mostrou a ineficiência sistêmica das políticas ditas estruturantes, como aquelas baseadas no pré-sal, que nem mesmo vêm acompanhadas de políticas claras no campo científico-tecnológico e minam os esforços antes sinalizados em direção das economias renováveis. Espera-se com isto que o período eleitoral desta vez reflita este debate e que os candidatos não fiquem discutindo o problema da Santa Casa de Ameríndia. Pedro Rossi – O pior já passou. Tudo indica que a inflação vai dar trégua e a economia brasileira deve retomar um ciclo de crescimento puxado pelo investimento, não tão intenso quanto esperávamos, mas, sem dúvidas, uma aceleração do crescimento. Nesse ponto, acho relevante chamar a atenção do leitor para os projetos de desenvolvimento para o país que estão em disputa no debate público brasileiro.
3 de junho de 2013
nossa economia? No primeiro semestre deste ano, as páginas econômicas da imprensa foram recheadas de um pessimismo exagerado e de análises apressadas que anunciavam o fracasso de um modelo econômico no qual o Estado tem um protagonismo importante. Por detrás desse discurso subsiste um projeto liberal envolto por fortes interesses políticos que propõe um retorno às políticas de redução do papel do Estado e dos bancos públicos, privatizações, abdicação do uso ativo da política macroeconômica, a redução da carga tributária, etc. Nessa concepção, o Brasil ideal seria um país especializado na produção de commodities com um setor financeiro desenvolvido. Do outro lado, está o projeto social desenvolvimentista, que defendemos na Unicamp. Esse projeto é desenvolvimentista, pois o Estado tem um papel extremamente relevante no processo econômico e o “social” é o eixo orientador do desenvolvimento. O período recente mostrou que a distribuição da renda, além de fazer justiça social, é também um elemento capaz de gerar dinamismo econômico. Esse dinamismo se manifesta pela formação de um mercado de consumo de massa indutor da indústria e do investimento produtivo. O social desenvolvimentismo propõe o aprofundamento desse processo, mas que esse seja complementado com uma expansão do investimento em infraestrutura econômica e social, para que o setor produtivo não esbarre em gargalos, e para que a inclusão social seja feita não apenas pelo acesso aos mercados de bens privado, mas também pela garantia de serviços públicos universais de qualidade, como educação e saúde.
Esse desempenho da economia brasileira tem causado reações no Exterior. O Brasil, que até pouco tempo era enaltecido como vedete entre os Brics, agora gera olhares desconfiados nos investidores internacionais. A agência de classificação de risco Standard & Poor’s colocou a nota do país em perspectiva negativa, com a possibilidade de rebaixamento. Motivo alegado: baixo ritmo de crescimento do PIB e os gastos do governo. Diante desse cenário, quais as perspectivas para o Brasil no contexto mundial? André Biancarelli – O pessimismo com o Brasil no Exterior, refletido até em inusitadas sugestões na imprensa internacional sobre os condutores da política econômica brasileira, me parece motivado por outros fatores além dos últimos indicadores. A linha de maior protagonismo do Estado e a redução nas taxas de rentabilidade de alguns setores da economia, ensejada pela queda no patamar das taxas básicas de juros, geram fortes reações, aqui e lá fora. Tal postura crítica deve ser amenizada com os últimos movimentos da política macro e da regulação dos fluxos de capital. Ou não. Um suposto descontrole nas contas públicas é sempre parte do discurso de analistas ortodoxos e outros agentes de mercado, independentemente das reais condições de sustentabilidade da dívida pública e das comparações internacionais. Quanto às agências de rating, apesar de influenciarem as decisões de investidores menos dedicados, suas avaliações não deveriam ser tomadas, no debate público, como juízos objetivos ou desinteressados, como provado cabalmente na crise financeira de 2008. Ao mesmo tempo, é preciso não perder de vista que nem a importância brasileira no mundo, tampouco o investimento externo, se resumem àquelas modalidades mais voláteis de aplicação financeira – cujos montantes haviam sido reduzidos pelos instrumentos de controle de capital e pela redução do diferencial de juros nos últimos dois anos. E que neste momento são guiados por expectativas, do meu ponto de vista, infundadas, de uma reversão próxima nas políticas de estímulo monetário nas economias centrais. Para além destes fluxos de carteira, o investimento direto estrangeiro para o Brasil segue em ritmo muito forte, provavelmente guiado pelas perspectivas e oportunidades de prazo mais longo mencionadas anteriormente, e que devem sobreviver à conjuntura ruim. Antonio Carlos Macedo e Silva – Como minha resposta anterior sugere, não será possível, no cenário corrente, caracterizado por uma economia global que também cresce muito lentamente, acelerar o crescimento brasileiro e ao mesmo tempo conter o gasto governamental. Então, não há como contentar a Standard & Poor’s. Creio, porém, que as implicações de um eventual rebaixamento não são demasiadamente graves, e que esse rebaixamento pode nem ocorrer, se o investimento público liderar, como espero, uma retomada do crescimento econômico.
Rossi: “O pior já passou. Tudo indica que a inflação vai dar trégua e a economia brasileira deve retomar um ciclo de crescimento puxado pelo investimento”
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bizarras da lei de licitações, vozes esparsas começam a chamar a atenção de que ela é um enorme estorvo para a inovação tecnológica no país. A macroeconomia é importante, mas aí se deve perguntar a razão de governos de esquerda fazerem políticas muito assemelhadas às políticas de outros governos, principalmente em relação ao câmbio. A histeria da imprensa com a desvalorização do real em relação ao dólar em 10% depois de um ano de taxa estável, argumentando que isto causa inflação, mostra como o sistema de interesses está bem organizado no país e que sua defesa tem nome e endereço. Termino este item da mesma forma que o outro: que a eleição sirva para alguma coisa. As eleições custam muito caro ao país para discutir se tal sujeito elege até poste, se o eleito usa ou não brilhantina ou se oposição ama ou não o mais amado.
Silveira: “A percepção de uma crise iminente no Brasil é boa para reverter o falso otimismo que gerou um tipo de investimento perdulário e sustentou loucuras”
Francisco Lopreato – A conjugação de sinais negativos na economia brasileira no primeiro trimestre do ano ampliou a incerteza em relação ao futuro e criou um ambiente macroeconômico hostil, inflado pela manifestação da agência Standard & Poor’s de que poderia rebaixar a nota do país. As dificuldades, inerentes a qualquer momento de mudanças, existem e precisam ser atacadas. Entretanto, não parece estar em curso nenhuma situação capaz de abalar a perspectiva do Brasil no cenário internacional. A inflação, fator de preocupação, dá mostras de retração e a dívida pública não preocupa. O PIB, na comparação com os países da América Latina e os europeus, mostrou evolução e tende a crescer no restante do ano com a retomada do setor industrial. No front externo, o comportamento do balanço comercial não deverá repetir o resultado dos primeiros meses do ano, apesar de continuar como motivo de atenção a baixa competividade da indústria no mercado mundial, sobretudo, dos setores de maior conteúdo tecnológico. A solução do problema exige medidas de longo prazo e depende do sucesso da política industrial em curso e da retomada dos investimentos na área. A atual situação do balanço de pagamentos, mesmo com obstáculos, está longe do quadro de crise que o país enfrentou em outros tempos. O volume elevado das reservas internacionais e a perspectiva favorável de novos investimentos externos, principalmente na área de infraestrutura, garantem o financiamento da conta de transações correntes e a travessia tranquila desse período de turbulência, sem afetar a boa posição do país no contexto internacional. A visão otimista não impede reconhecer que a melhor condição no futuro depende da adoção de uma política de desvalorização lenta da taxa de câmbio e da capacidade de aproximar os custos sistêmicos domésticos – tributos, logística, energia, etc – aos internacionais, o que permitiria elevar a competitividade externa da indústria brasileira e reforçar a perspectiva favorável criada com o pré-sal. José Maria da Silveira – Eu considero esta reversão de expectativas um fato positivo. É melhor ser pessimista que atrair investimentos irresponsáveis e justificar ações fadadas ao fracasso. O sistema financeiro vive de avaliações infladas e rapidamente desinfladas. São especuladores e todo este otimismo característico do período eleitoral anterior foi negativo para o Brasil. Agora, percebe-se com clareza o quanto os diferentes grupos de interesse no país reagem quando constatam que suas fontes de ganho fácil são colocadas em risco, dos sindicalistas que dominam os portos até os empresários que centram seus investimentos em commodities baseadas em escala (bulk) e têm pavor de setores que demandem maiores esforços em C&T&I. Há uma parte do governo que realmente se esforça e se preocupa com inovação tecnológica na indústria. Chegam ao ponto de tentar imitar o modelo Embrapa, esquecendo-se que este modelo resultou de uma combinação entre ciência e desenvolvimento tecnológico que aproximou a iniciativa privada do setor público. É preciso deixar claro que parte do sistema brasileiro de inovação é voltado para inovação e parte dele não merece este título, pois se volta a justificar apenas os recursos para a pesquisa científica, dominada também por grupos de interesse. Daí a luta de algumas organizações do governo para alterar este cenário mudando algumas regras do jogo no meio do caminho e assim criando uma forte indisposição com o setor privado, principalmente no campo das concessões e na definição de tarifas que determinam o investimento futuro do setor e da economia. Utilizando o que o economista Massahiko Aoki chama de três níveis para a formulação de políticas, há um consenso em relação à necessidade de aumento da produtividade e dos setores que utilizam o conhecimento como base para o desenvolvimento. Há também tentativas de fazer com que este consenso se plasme em conceitos que guiem as ações – por exemplo, a valorização da propriedade intelectual e da defesa da concorrência, dois casos de relativo sucesso, contrapostos ao funcionamento precário das agências regulatórias. Há, porém, uma enorme dificuldade em transformar essas ideias e conceitos em regras, normas e incentivos operacionalizavéis e eficazes. O exemplo da reforma fiscal, com três níveis de tarifas, é paradigmático de que todos aceitam a necessidade da reforma fiscal; há um certo consenso na ideia de simplificar o sistema e, na operacionalização, propõe-se manter a complicação tarifária. É preciso que os diferentes agentes na economia se convençam de que não há nenhum brilhantismo na economia brasileira e que o que foi vendido com otimismo há menos de três anos não passou de histrionismo eleitoreiro. O país sofre de deficiências que precisam ser sanadas duramente com medidas efetivas que corrijam o descalabro tributário, aumente a eficácia do sistema educacional e desgargale o sistema de logística de transporte do país. Depois de anos de aplicações
Maryse Farhi – A atual deterioração na percepção dos investidores internacionais abrange os Brics e as demais economias emergentes, não se restringindo ao Brasil. Não é de hoje que a dinâmica dos fluxos de capitais para essas economias tem seguido uma dinâmica volátil que toma a forma de ciclos no quais se encadeiam fases de liquidez seguidas por períodos de escassez. A conjuntura internacional está marcada pelas expectativas de uma retomada da economia americana e, possivelmente, da economia japonesa. Se confirmada, tal retomada deverá, em algum momento, levar à paulatina retirada dos estímulos monetários e uma posterior elevação das taxas de juros. Essas expectativas provocam um aumento da aversão aos riscos, penalizando as economias emergentes. Até o início deste século, fases de escassez de fluxos internacionais de capital tinham profundas repercussões macroeconômicas. Desde então, muitas dessas economias constituíram elevadas reservas em divisas que atenuam seu impacto.
Lopreato: “A dificuldade de aprovação no Congresso de matérias cruciais à estratégia oficial também contribuiu para conturbar o ambiente macroeconômico”
Pedro Rossi – O Brasil bem avaliado pelo mercado financeiro internacional não é necessariamente o país que queremos. Antes da crise, predominava no debate econômico a ideia de que os mercados financeiros eram capazes de fiscalizar os governos e forçá-los a fazer a sua “lição” de casa. Com as políticas econômicas “corretas” e a tutela dos mercados, capazes de punir os indisciplinados com fugas de capital, o desenvolvimento estaria encaminhado. Essa ideia caiu por terra quando a crise financeira evidenciou que os mercados financeiros eram incapazes de monitorar a si próprios. Hoje sabemos que a tutela dos mercados financeiros conduz o país para um projeto de desenvolvimento que interessa a poucos, pois promove a concentração da renda e desconstrói as políticas voltadas para o bem-estar da população. Por isso, é preciso um certo distanciamento das avaliações das agências de risco como a Standard & Poor’s. O importante é notar que vivemos um cenário externo extremamente turbulento. No plano do comércio internacional, a concorrência por mercados consumidores aumentou enormemente. A estagnação na Europa e o crescimento baixo nos EUA redirecionaram as exportações chinesas para outros mercados, como o brasileiro. Já no plano das finanças internacionais, o excesso de liquidez monetária no sistema provocado pela resposta americana à crise – injeção de mais dólares no sistema –acrescentou volatilidade às variáveis financeiras e às taxas de câmbio. Na prática, o sistema monetário internacional se tornou disfuncional. Nesse cenário, a saída brasileira é buscar um modelo de desenvolvimento que aproveite o potencial de seu mercado interno nos moldes do social desenvolvimentismo. Para isso, é preciso buscar uma inserção internacional virtuosa, com uma política de comércio inteligente que dê preferência à integração latino-americana, e com um controle dos fluxos financeiros de curto prazo para evitar a apreciação da taxa de câmbio e uma volatilidade excessiva.
Maryse: “A atual deterioração na percepção dos investidores internacionais abrange os Brics e as demais economias emergentes, não se restringindo ao Brasil”
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Campinas, 17 a 23 de junho de 2013
Técnica aumenta sobrevida em casos de câncer de colo de útero Fotos: Antoninho Perri
Procedimento associa a radioterapia com braquiterapia de alta taxa de dose e a quimioterapia com cisplastina
BENEFÍCIOS
ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br
câncer de colo de útero é uma doença de evolução lenta que acomete a priori mulheres com idade acima dos 25 anos. Tem como principal causa o papiloma vírus humano (HPV), um grupo de vírus que infecta a pele, formando verrugas ou promovendo alterações celulares no colo uterino. A melhor maneira de prevenção é o Papanicolaou, exame em que se coleta o muco cervical para avaliação. Mas, quando a doença já está adiantada, o tratamento de escolha é a radioterapia, que destrói células tumorais com o emprego de feixe de radiações ionizantes. Esta conduta é um consenso mundial. Testes inéditos feitos na tese de doutorado do radioterapeuta Antonio Carlos Zuliani de Oliveira com 147 mulheres com câncer no estádio IIIb mostraram agora a propriedade de associar a radioterapia com braquiterapia de alta taxa de dose e a quimioterapia com cisplastina. Os experimentos indicaram uma melhora significativa da saúde de 10% das mulheres que tinham um quadro grave. Essa melhora se refletiu no controle local e na sobrevida livre da doença. A perspectiva de metade das pacientes tratadas nesse estágio da doença é o óbito antes de cinco anos, mesmo após o tratamento radioterápico. Deste modo, 10% das pacientes que não sobreviveriam e teriam recidiva, não vão ter mais. “Esse percentual significa muito em oncologia”, assinala Luis Otávio Zanatta Sarian, orientador da pesquisa, que foi feita no Serviço de Radioterapia do Hospital da Mulher “Prof. Dr. José A. Pinotti” Caism. A nova sistemática vai colaborar para que menos pessoas evoluam para óbito em razão do câncer do colo avançado. Mundialmente, esse câncer causou 275 mil mortes em 2008. “Graças a essa pesquisa, hoje não somos mais autorizados a indicar só a radioterapia. Agora, as pacientes são tratadas com radio-
Já na radioterapia externa, a radiação tem que passar pela pele, pela gordura, pelo músculo e pelas demais estruturas até chegar à região do tratamento. Deste modo, acaba-se levando uma quantidade de radiação às áreas que estão também no caminho. Na braquiterapia, a radiação sai de dentro do órgão-alvo, por isso protege mais o tecido que está em volta.
Técnica acompanha, em monitores, exame feito no Caism: experimentos indicaram uma melhora significativa da saúde de 10% das mulheres
terapia e quimioterapia concomitantemente, o que mudou o protocolo do hospital e o modo de encarar a patologia”, festeja Antonio Carlos. O motivo é de fato para comemorar, pois o Brasil tem um número considerável de casos avançados da doença. Foram 17.540 em 2012. Mas a despeito disso, esse novo protocolo já deu um passo a mais na terapêutica do câncer avançado, sinalizando que também pode ser melhor nos estádios iniciais. A investigação demorou dez anos: entre 2003 e 2013.
TERAPÊUTICA O autor da tese explica que o câncer do colo uterino, em relação a outros tipos de cânceres, é prevenível. Nos países desenvolvidos, é diagnosticado ainda em fase curável, pela eficácia dos programas de rastreamento já em estádios iniciais. Conforme esse rastreamento piora, aparecem os casos mais avançados. “Sabe-se que os tumores atingem com maior gravidade as populações mundiais menos privilegiadas economicamente”, revela o professor. Nos casos avançados – dificilmente encontrados nos EUA, Canadá e Europa, países nos quais se concentra boa parte dos ensaios clínicos –, não se sabia se a quimioterapia associada iria prejudicar mais a doente do que beneficiar. Antonio Carlos pensou justamente nesse grupo e viu que o tratamento é uma saída positiva. Ele explica que o estadiamento do câncer de colo do útero vai do grau 1 ao 4, conforme a gravidade. Quando chega ao último grau, a doença torna-se sistêmica, afetando órgãos a distância.
Até o estádio IIa, a abordagem dos casos é cirúrgica. A partir de então, parte-se para a radioterapia, visto que a cirurgia já não é mais possível, não surte bons resultados e sua toxicidade é muito alta. Antonio Carlos notou melhora no controle local e na sobrevida livre da doença dessas mulheres com o novo tratamento. Por outro lado, não notou progresso no índice de sobrevida total, provavelmente pelo tempo de seguimento dessas pacientes e pelo número da amostra. Mas, como a maioria dessas mulheres, quando morrem, é por recidiva local, então há uma grande probabilidade desse tratamento ter um importante impacto até na sobrevida total dessas mulheres. Um outro aspecto avaliado, relata o radioterapeuta, foi a adoção de dois braços na pesquisa, tanto no de comparação quanto no do tratamento com a braquiterapia de alta taxa de dose, que é uma terapêutica local de radiação intracavitária no útero bem mais rápida do que a baixa taxa de dose. No tratamento com baixa taxa de dose, a mulher necessitava ficar internada no hospital de dois a três dias. Era algo desconfortável, porque a paciente era obrigada a permanecer na mesma posição 72 horas com a fonte radioativa no canal vaginal: ficava em decúbito dorsal horizontal, sem sequer poder virar de lado. Ocorre que a braquiterapia emprega fontes de radiação interna. O material radioativo é colocado, por meio de aparatos específicos, próximo à lesão tumoral, em contato direto com a região pretendida. Terminado o tratamento, o material é retirado do corpo. Esse tratamento permite aplicar doses de radiação muito menores nos tecidos e órgãos ao redor da doença.
Pelo novo protocolo, a mulher recebe em média quatro aplicações por mês numa mesa ginecológica, aonde ela fica em decúbito dorsal, em posição de semi-litotomia (deitada com a face voltada para cima, com flexão de 90º de quadril e joelho). A aplicação, que antes levava até três dias, agora é feita em cerca de 40 minutos. “É um tratamento mais rápido e adequado às pacientes, que já procuram o hospital muito fragilizadas pelo diagnóstico”, frisa o docente. Agora, como quase todo tratamento, ele traz um desconforto à mulher, apesar de tolerável e passageiro: a introdução de um aplicador dentro do útero, mas que elimina a necessidade de anestesia na maioria dos casos. Contudo, esse aplicador possui uma espessura menor do que a de um dispositivo intra-uterino (DIU), tranquiliza Luis Otávio. Na braquiterapia de alta taxa de dose, a radiação é aplicada numa velocidade muito maior. Por isso, especulava-se na literatura se, associada à quimioterapia, a toxicidade não seria proibitiva. Antonio Carlos chegou à conclusão que não. O tratamento tem toxicidade compatível com o esquema anterior, que envolvia somente a radioterapia. A vantagem é que, enquanto é feita a radioterapia, a pessoa também recebe a quimioterapia. Desta forma, não aumenta o tempo da terapêutica proposta, expõe o pesquisador. A investigação de Antonio Carlos é uma evidência tipo 1 – o melhor tipo de estudo que pode ser feito, de ensaio clínico randomizado. Nesta intervenção, parte-se da causa em direção ao efeito.
Publicação Tese: “Braquiterapia com alta taxa de dose e cisplatina concomitante no tratamento do carcinoma espinocelular do cólo do útero estádio IIIB: comparação histórica e ensaio clínico aleatorizado” Autor: Antonio Carlos Zuliani de Oliveira Orientador: Luis Otávio Zanatta Sarian Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)
Em busca da prevenção De acordo com Luis Otávio, epidemiologicamente atribui-se como causa do câncer de colo a infecção pelo HPV. Só que, das mulheres com idade entre 25 e 40 anos que têm infecção por esse vírus, somente 0,01% desenvolverá o câncer de colo avançado, esclarece. Na maior parte, resulta de transmissão sexual, embora haja relatos de uma minoria que nunca teve relações sexuais e que também foi infectada por esse vírus, que é de certa forma mais comum do que se possa imaginar. O doutorando ainda não sabia se a quimioterapia para os portadores de câncer do colo avançado potencializaria os efeitos da radioterapia, pois há efeitos tanto para os tratados com quimioterapia como para os tratados com radioterapia. O estudo apontou que, associando a quimioterapia, não aumentariam os efeitos colaterais do tratamento – os efeitos residuais. Antonio Carlos Zuliani de Oliveira, autor (à esq.), e Luis Otávio Zanatta Sarian, orientador da pesquisa: testes com 147 mulheres
Esses efeitos podem ser notados nos órgãos mais próximos do colo do útero, que são o intestino e a bexiga. Incluem alteração do hábito intestinal e urinário, cansaço e, numa situação mais complexa, sangramento. Existe uma graduação de toxicidade que chega a demandar cirurgia, entretanto sua incidência foi mínima no estudo e comparável nos dois braços da pesquisa. As doses alcançadas com braquiterapia foram bem superiores às alcançadas com radioterapia externa, porque o útero afasta os órgãos próximos (reto e bexiga), que recebem doses muito menores. Os resultados desse trabalho serão apresentados oralmente no Congresso da Sociedade Americana de Radioterapia, que ocorre em setembro em Atlanta, Estados Unidos. Terá sido a primeira exposição oral de estudo brasileiro no evento, o mais renomado na área.
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Detecção refinada
Pesquisadores da FEEC formulam novo princípio de operação para radares meteorológicos Foto: Antoninho Perri
MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br
esquisa desenvolvida para a dissertação de mestrado do engenheiro eletricista Marco Antonio Miguel Miranda, defendida na Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da Unicamp, formulou um novo princípio de operação para radares meteorológicos. O objetivo do trabalho, orientado pelo professor José Cândido Silveira Santos Filho, com participação dos professores Gustavo Fraidenraich e Michel Daoud Yacoub, foi chegar a equipamentos mais baratos e eficientes que os existentes no mercado, para serem vendidos principalmente para pequenas prefeituras do país. O estudo contou com apoio da empresa Orbisat da Amazônia S.A. e financiamento da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). De acordo com o professor Cândido, esta é a primeira pesquisa do gênero realizada na FEEC. “Até então, eu nunca tinha tido a oportunidade de atuar nessa área, embora houvesse alguma similaridade entre o sistema que nos propusemos a desenvolver e o que é normalmente trabalhado na linha de pesquisa que coordeno. Nesse sentido, a cooperação com a Orbisat foi um desafio interessante para o grupo”, afirma. Conforme o docente, a proposta da configuração de um novo sistema partiu da empresa, que tem vasta experiência no desenvolvimento de radares. Ocorre, porém, que os seus pesquisadores vinham enfrentando dificuldades para chegar à modelagem matemática e estatística adequada. Alguns aspectos não estavam funcionando como o esperado, e os técnicos da Orbisat não sabiam identificar onde estava o problema. “A empresa percebeu, então, que precisava de uma ferramenta analítica para estudar esse sistema, e por isso nos procurou”, conta o professor Cândido. Dito de maneira simplificada, o que a Orbisat pretendia era conceber um radar meteorológico que tivesse baixo custo de fabricação
Marco Antonio Miranda (à esq.), autor do trabalho, ao lado do professor José Cândido: objetivo foi chegar a radares mais baratos e eficientes
e manutenção e que fosse mais eficiente que os equipamentos convencionais. Os potenciais compradores do equipamento, nesse caso, seriam os pequenos municípios, que poderiam usar os equipamentos, por exemplo, na formulação de planos de contingenciamento contra desastres provocados por tempestades. Dentro desse conceito, a meta era conseguir que o mapeamento dos 360 graus em torno do radar fosse realizado em menos de um minuto. “Os radares convencionais levam entre 5 e 15 minutos para cumprir essa tarefa. Desse modo, a tela do radar precisa desses mesmos 5 a 15 minutos para ser atualizada, o que é um tempo longo. Na prática, se uma tempestade estiver se aproximando, o operador obterá informações sobre ela somente depois dessa atualização, o que pode retardar um eventual alerta e, consequentemente, uma ação de emergência”, exemplifica o autor da dissertação. O baixo custo do sistema, esclarece Miranda, decorre principalmente do fato de o modelo proposto operar com somente duas antenas fixas. Os equipamentos convencionais ou fazem uso de antenas giratórias, que são pesadas, dispendiosas e exigem alto custo de manutenção, ou de
um grande conjunto de antenas fixas, estrutura que também requer significativos investimentos. “Utilizando somente duas antenas fixas, os custos caem de forma importante”, assegura o engenheiro eletricista. Já a maior eficiência do sistema proposto vem justamente do princípio adotado, que não utiliza nem a varredura mecânica feita pelas antenas giratórias e nem a combinação eletrônica de várias antenas fixas. No caso do estudo realizado na FEEC, os pesquisadores propuseram um princípio de operação diferente, que explora a similaridade entre o que a primeira e a segunda antena “veem”. “Por hipótese, consideremos que as duas antenas estão ‘vendo’ uma nuvem. Nesse caso, existe algo similar entre o que uma e outra ‘enxerga’. O que nós fizemos foi projetar um algoritmo de processamento de sinais capaz de explorar essa similaridade para determinar com maior precisão a posição da nuvem”, pormenoriza o professor Cândido. Antes de chegarem a essa modelagem matemática, porém, os pesquisadores foram a campo para realizar um teste que forneceu parâmetros ao estudo. Eles se dirigiram até São José dos Campos, no interior de São Paulo, para coletar dados brutos obtidos através de radares convencionais. “Esses dados nos auxiliaram na definição da modelagem. Nós chegamos a um modelo simplificado, mas que atendeu bem às nossas expectativas”, assegura Miranda. De acordo com ele, uma importante contribuição do trabalho foi desenvolver o algoritmo que tivesse a capacidade de tomar a melhor decisão com base nos sinais coletados. Ou seja, a tecnologia confere um tratamento ótimo para os sinais e decide se de fato existe uma nuvem ou qualquer outro fenômeno meteorológico num determinado ângulo. “Os radares convencionais combinam os sinais das antenas antes de realizar o processo de detecção. O nosso sistema vai além, otimizando o processo de detecção antes de combinar os sinais”, reforça o professor Cândido.
A despeito dos avanços obtidos com o estudo, os pesquisadores da FEEC concluíram que ele não é tão promissor quanto a Orbisat imaginava. “Para funcionar da maneira como a empresa pretendia, esse modelo precisaria de um conjunto de antenas tão grande quanto o do sistema convencional, o que não representaria uma vantagem em termos econômicos”, relata o docente da Unicamp. “Uma coisa é a contribuição científica dada pelo trabalho. Outra é gerar uma recomendação para a empresa. De todo modo, a cooperação entre a Faculdade e a Orbisat está tendo continuidade. O próprio Marco Antonio deverá seguir com a pesquisa no doutorado, procurando refinar os princípios de operação do radar”, acrescenta. O professor Cândido fez questão de ressaltar que esse tipo de parceria entre a academia e a indústria é muito positivo, pois proporciona ganhos em vários âmbitos. Primeiro, contribui para formar recursos humanos qualificados para o país. Segundo, gera conhecimento novo, o que impulsiona o desenvolvimento científico e tecnológico. Além disso, ainda propicia que os estudos tenham uma aplicação e, com isso, tragam benefícios econômicos e sociais para a sociedade.
Publicação Tese: “Radar meteorológico com antenas fixas: proposta, modelagem e análise de desempenho” Autor: Marco Antonio Miguel Miranda Orientador: José Cândido Silveira Santos Filho Colaboradores: Gustavo Fraidenraich e Michel Daoud Yacoub Unidade: Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) Financiamento: Finep Apoio: Orbisat da Amazônia S.A.
Quando a piada reforça o estereótipo PATRÍCIA LAURETTI patricia.lauretti@reitoria.unicamp.br
Alan Lobo de Souza saiu de Salvador para morar fora. Ingressava no mestrado em Linguística, na Unicamp e, quando desembarcou em São Paulo, levou um susto. Ele sabia da existência das piadas sobre os baianos, mas se surpreendeu ao constatar que os estereótipos a eles associados vão muito além daqueles relacionados à preguiça. “Descobri estereótipos que eu nem sabia que existiam”, diz Alan, autor da dissertação de mestrado “Estereótipos em piadas sobre baiano”. O ponto de partida de seu o trabalho foi um livro de piadas, desses vendidos em bancas. Não que ele tivesse qualquer dificuldade para encontrar muitos exemplos. Há muitos que consideram as piadas ou “enunciados” politicamente incorretos, preconceituosos, sem graça. “Qual discurso se constrói a partir da leitura dessas piadas? Como essa piada circula, e de que forma as pessoas se manifestam sobre aquele enunciado, foram algumas das minhas indagações iniciais”, diz. O método para estudar as piadas veio da Análise do Discurso (AD), um campo da Linguística que estuda o funcionamento dos sentidos na relação da língua com a história, isto é, objetiva analisar as condições de produção de determinado discurso. Para as teorias da AD, todo discurso é construído historicamente.
PREGUIÇA HISTÓRICA Como foi construído historicamente o estereótipo que relaciona o baiano ao sujeito preguiçoso? Uma das possíveis explicações Alan encontrou em estudos sobre o período de escravidão. Salvador, capital
Estudo desenvolvido no IEL demonstra como anedotas podem ampliar preconceito
baiana, é a cidade com maior número de negros fora do continente africano, e os escravos eram comumente chamados de preguiçosos. Outro estereótipo verificado nas piadas analisadas pelo autor é o do baiano ignorante. É possível, ressalta, que o estereótipo esteja relacionado com a migração em massa do nordestino para outros cantos do país a partir da década de 50. “A Bahia oferecia mão de obra barata, sem estudo, que acabava ocupando dessa forma sempre cargos marginais. Nesse caso, o baiano é caracterizado a partir do outro escolarizado, detentor de cargos socialmente valorizados e bem remunerados”, assinala. Nas piadas, a figura que está sendo tratada como objeto do riso já sofreu retaliações e, por isso, quem reconhece a história não acha graça na piada, mesmo tratando-se de humor, acredita o autor, que também ressalta um dos aspectos do humor. “O texto humorístico é voltado para o riso, mas não é bem isso que acontece. Nem todo texto humorístico é encarado como tal”. De acordo com Alan, nos últimos anos o texto humorístico, por ter como base o estereótipo, passou a ter a ênfase do preconceito. “Vários teóricos do humor afirmam que o humor trabalha com o rebaixamento, o mote inicial do humor é rebaixar seu adversário por vias de terceiros que ouvem e compartilham daquele riso. Hoje isso é encarado como politicamente incorreto”. O autor observa, no entanto,
que as tentativas de impor limites ao humor vem desde a Antiguidade – rir das autoridades e políticos locais poderia ser um mau negócio. Na Idade Média, por exemplo, a Igreja era um dos alvos preferenciais. “A cada dia que passa, os grupos sobre os quais não se pode fazer piada defendem a existência do preconceito. É controverso porque os judeus, por exemplo, fazem piadas de judeus, brasileiros fazem piada sobre si mesmo”, afirma. Alan enumerou algumas piadas e as dividiu em três grupos. As que trabalham com o estereótipo do baiano preguiçoso, as que tratam o baiano como ignorante, indesejado ou marginal e um terceiro tipo foi postulado, que seria chamado de “piada de resistência”, que trabalha com o estereótipo do baiano esperto, que sabe “dar o troco”. Porém, o pesquisador encontrou apenas um exemplar desta forma de piada. “Nesta piada, o baiano está deitado numa rede, passa um paulista suado, de terno e gravata, e diz: ‘você sabia que a preguiça é um dos pecados capitais?’. Ao que o baiano responde: ‘a inveja também.’ ” Alan já decorou os enunciados: “nesse caso, se constrói um estereótipo a partir do estereótipo do outro”, acrescenta.
NÃO
É SÓ NA PIADA
Qualquer forma de manifestação do estereótipo relacionado a quem nasce na Bahia interessou a Alan durante a pesqui-
sa. Menciona um caso que repercutiu na mídia, envolvendo a cantora Gal Costa, que reclamou da suposta preguiça de um técnico contratado para um conserto em sua casa e que não foi realizado. “Ela é baiana e se sentiu no direito de dizer que os baianos são preguiçosos”. O enunciado teve tanto nos jornais como no twitter uma recepção enorme de repúdio (a grande maioria), mas também de apoio, mesmo por parte de alguns baianos. Outro exemplo de enunciado estudado por Alan, afora as piadas, veio da prefeitura de Salvador cujo slogan era “Salvador: cidade sede do trabalho”. Para o autor da dissertação, a afirmação de uma característica associada ao baiano, nesse caso a relação com o trabalho, implica, entre outros sentidos, a leitura de um discurso que objetiva contrariar o estereótipo associado à população da cidade, que é o da preguiça. Além de considerar em suas conclusões que nem sempre o texto humorístico é visto como tal e que a piada de resistência não se sustentaria, Alan sintetizou algumas de suas ideias em paráfrases como “a preguiça baiana seria o simulacro da lentidão”. “Em comédia a gente vê o baiano lento; a preguiça seria a forma pela qual também está caracterizada essa lentidão”.
Publicação Dissertação: “Estereótipos em piadas sobre baiano” Autor: Alan Lobo de Souza Orientador: Sírio Possenti Unidade: Instituto de Estudos da Linguagem (IEL)
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Vida Painel da semana Teses da semana Livro da semana Destaques do Portal da Unicamp
aa c dêi m ca
Painel da semana Raízes e troncos em exposição - Encontrados em queimadas, desmatamentos e até em tempestades, troncos de madeiras como o cedro, sassafrás, eucalipto, ficus, aroeira, jacarandá, araucária e jabuticabeira, se transformam em obras de arte nas mãos da escultora gaúcha Leani Inês Ruschel, pós-graduada em Educação pela Faculdade de Educação (FE) da Unicamp. Até 17 de junho, suas obras poderão ser visitadas pelo público em geral, no Espaço Cultural Casa do Lago (Rua Érico Veríssimo 1011), no campus da Unicamp. Em suas criações, Ruschel cria o universo destruição/reconstrução chamando a atenção para o cuidado que se deve ter com o planeta. As visitas de “Artentando Raízes e Troncos” podem ser feitas de segunda a sextafeira, das 8h30 às 17h30. Mais informações: telefone 19-3521-7017. Entrada livre. Primeiros socorros - Nos dias 18 e 25 de junho, às 12h30, no complexo de salas de aula da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, acontece o curso teórico e prático em primeiros socorros para leigos. O curso é gratuito e tem a duração de 4 horas. São 100 vagas cada um dos dias do curso. Ele será ministrado pelos alunos do segundo ano de medicina com a supervisão da equipe da Disciplina de Cirurgia do Trauma da Unicamp e profissionais da Renovias, Rota das Bandeiras e CCR AutoBAn. As inscrições devem ser realizadas no site http://pt.surveymonkey.com/s/primeirossocorros2013. O endereço da FCM é rua Tessália Vieira de Camargo, 126, Cidade Universitária “Zeferino Vaz”, em Barão Geraldo, Campinas. Mais informações: 193521-8257. Encontro de grupos de pesquisa - No dia 20 de junho, às 10 horas, no auditório do Instituto de Geociências (IG), acontece o 1º Encontro dos Grupos de Pesquisa GAPI – Grupo de Análise de Políticas de Inovação (Departamento de Política Científica e Tecnológica do Instituto de Geociências (IG); CTeME – Conhecimento, Tecnologia e Mercado, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH); GEICT – Grupo de Estudos Interdisciplinares da Ciência e Tecnologia, do Departamento de Política Científica e Tecnológica do IG, e ICTS – Informação, Ciência, Tecnologia e Sociedade, do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor). O objetivo é aproximar e estabelecer uma maior comunicação entre os grupos. Mais detalhes no site do evento http://www.ige.unicamp.br/gapi/ ou telefone 19-3521-5124.
Eventos futuros Fórum de Esporte e Saúde - Com o tema Saúde Mental e Direitos Humanos, no dia 25 de junho, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp, acontece mais uma edição do Fórum Permanente de Esporte e Saúde. O evento é organizado pelo Grupo Interfaces do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas (FCM). Inscrições, programação e outras informações no link http://foruns.bc.unicamp.br/foruns/projetocotuca/forum/ htmls_descricoes_eventos/saude64.html. O evento será transmitido ao vivo pela RTV-Unicamp. Prêmio Embaixador da Epilepsia no Brasil - O médico neurologista da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp,
Li Li Min, receberá, em Montreal, o prêmio de Embaixador da Epilepsia no Brasil. O prêmio é concedido anualmente pelo International Bureau for Epilepsy e pela Liga Internacional contra a Epilepsia a 12 indivíduos que promovem a causa da epilepsia em nível pessoal, nacional e internacional. Concorreram ao prêmio cerca de 100 candidatos. A entrega acontece no dia 23 de junho, durante o 30º Congresso Internacional de Epilepsia, em Montreal, no Canadá. Fórum de Desafios do Magistério - Com o tema “Linguagens e letramentos”, no dia 26 de junho, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp, acontece mais uma edição do Fórum Permanente de Desafios do Magistério. O evento propõe uma reflexão sobre as diferenças nas formas de linguagem, para além da oralidade e da escrita convencionais e majoritárias, e destaca possibilidades no campo do letramento, de modo a pontuar a pluralidade que a leitura, escrita e outras manifestações linguísticas (de fora e dentro dos espaços escolares) impõem às práticas pedagógicas e seus atores. No Fórum haverá lançamento de publicações. O fórum será transmitido ao vivo pela TV Unicamp. Programação, inscrições e outras informações podem ser obtidas na página do evento http://foruns.bc.unicamp.br/ foruns/index.php?idArea=7 Combate às drogas - O Centro de Saúde da Comunidade da Unicamp (Cecom) e a Coordenação do Programa de Prevenção ao Uso de Substâncias Psicoativas Lícitas e Ilícitas “Viva Mais” organizam, dia 26 de junho, evento relativo ao Dia Internacional de Combate às Drogas. Na ocasião, a professora Renata Azevedo, da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), profere palestra sobre o assunto. Pessoas que tiveram problemas com drogas darão depoimentos, às 12 horas, no Auditório I da Agência para a Formação Profissional da Unicamp. Folders de conscientização também serão distribuídos às unidades/ orgãos da Unicamp. Mais informações: 19-3521-9001. Fórum de Ensino Superior - No dia 27 de junho, às 9 horas, acontece mais uma edição do Fórum Permanente de Ensino Superior. “Acesso ao ensino superior no Brasil: equidade e desigualdade social” é o tema a ser tratado, no auditório do Centro de Convenções da Unicamp. O Fórum, que será transmitido (ao vivo) pela RTV Unicamp, é organizado pelo professor Renato Pedrosa. Inscrições, programação e outras informações na página eletrônica http://foruns.bc.unicamp.br/ foruns/projetocotuca/forum/htmls_descricoes_eventos/superior11.html ou telefone 19-3521-5039. Palestra com Ortwin Renn - O Programa de Doutorado em Ambiente e Sociedade do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam) e o Projeto Crescimento, vulnerabilidade e adaptação urbana: dimensões sociais e ecológicas das mudanças climáticas no litoral de São Paulo organizam, dia 27 de junho, às 14h30, no auditório do Nepam, a palestra “Complexidade, incerteza e ambiguidade em governança de risco: aplicação às mudanças climáticas”. Ela será proferida pelo professor Ortwin Renn, do Stuttgart Research Center for Interdisciplinary Risk and Innovation Studies da Stuttgart University (Alemanha). Renn é especialista em governança do risco. Mais informações pelo e-mail gabrieladigiulio@yahoo.com.br China & Brasil - Livro será lançado no dia 27 de junho, no andar térreo da Livraria Martins Fontes Paulista, às 18h30, em São Paulo-SP. Este é o primeiro livro publicado por um centro de estudos acadêmico sobre as relações Brasil-China, um testemunho do alto desempenho alcançado, em poucos anos, pelo Centro de Estudos Avançados da Unicamp (CEAv). Inteiramente resultante de pesquisas acadêmicas, China & Brasil, desafios e oportunidades reúne pesquisadores de três continentes, abordando temas atuais numa perspectiva multidisciplinar e academicamente rigorosa. Entre eles destacam-se as relações políticas e comerciais bilaterais, os temas socioambientais e o desafio das reformas do ensino superior na China. É também o testemunho da vocação internacional da Unicamp. Sem a experiência internacional de seus membros, sua inserção em redes de estudo e pesquisa que se destacam globalmente por sua excelência, sem a presença frequente de estudiosos de outros países nos Grupos de Estudo que são a marca do modelo institucional do Centro de Estudos Avançados, este livro, e os projetos que o tornaram possível não passariam de boas intenções. Exposições do Cis-Guanabara - O Centro Cultural de Inclusão e Integração Social (Cis-Guanabara), órgão da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários (Preac), sedia, até 27 de junho, as exposições Ação e Reação, de David Milne Watson; Em nome do Pai, de Tácito Carvalho e Silva, e Ide – Escola de Arte. Elas podem ser visitadas de segunda a sexta-feira, das 9 às 17 horas, na rua Mário Siqueira 829, no bairro do Botafogo, em Campinas. Entrada livre com estacionamento gratuito. Mais informações: 19-3233-7801.
Teses da semana Computação - “Uma arquitetura para gerência de mobilidade cognitiva em redes sem fio heterogêneas” (doutorado). Candidato: Jorge Lima de Oliveira Filho. Orientador: professor Edmundo Roberto Mauro Madeira. Dia 21 de junho, às 13h30, no auditório IC 2. Engenharia Elétrica e de Computação - “Redes orientadas a conteúdo: uma abordagem no nível de enlace” (mestrado). Candidata: Lisiane Maria Bannwart Ambiel. Orientador: professor
Maurício Ferreira Magalhães. Dia 19 de junho, às 10 horas, na CPG/FEEC. “Estudo comparativo de métodos de localização para robôs móveis baseados em mapa” (mestrado). Candidato: Diego Pereira Rodrigues. Orientador: professor Eleri Cardozo. Dia 20 de junho, às 14 horas, na FEEC. “Otimização do dimensionamento e roteamento de navios de linha regular com viagens fretadas” (doutorado). Candidato: Rodrigo Moretti Branchini. Orientador: professor Vinícius Amaral Armentano. Dia 21 de junho, às 14 horas, na FEEC. Engenharia Química - “Gestão de malhas de controle no processo de fabricação de papel – estudo de caso” (mestrado). Candidato: Alessandro Rodrigues Frias. Orientador: professor Flávio Vasconcelos da Silva. Dia 20 de junho, às 14 horas, na sala de aula PG05 da FEQ. “Estudo sobre o uso do resíduo da etapa de deceragem de óleo de farelo de arroz para a produção de ácidos graxos e álcoois graxos” (mestrado). Candidata: Kelly Lendini Troni. Orientadora: professora Roberta Ceriani. Dia 20 de junho, às 14h30, na sala de defesa de teses da FEQ. Física - “Nanoagregados metálicos: produção e propriedades magnéticas” (doutorado). Candidato: Artur Domingues Tavares de Sá. Orientador: professor Varlei Rodrigues. Dia 21 de junho, às 14 horas, no auditório da Pós-graduação do IFGW. Geociências - “Gestão de pesquisa, desenvolvimento e inovação (pd&i) no setor elétrico brasileiro” (doutorado). Candidata: Denile Cominato Boer. Orientador: professor Sérgio Luiz Monteiro Salles Filho. Dia 17 de junho, às 9 horas, no auditório do IG. Humanas - “O tema da identidade pessoal no livro 1 do Tratado de Hume” (mestrado). Candidato: Antonio Cesar da Silva Leme. Orientador: professor José Oscar de Almeida Marques. Dia 20 de junho, às 9h30, na sala de defesa de teses do prédio da Pósgraduação do IFCH. Linguagem - “Ressignificação da detective fiction em Los Detectives Salvajes, de Roberto Bolaño” (mestrado). Candidata: Bruna Tella Guerra. Orientador: professor Francisco Foot Hardman. Dia 20 de junho, às 10 horas, na sala de defesa de teses do IEL. Matemática, Estatística e Computação Científica - “Fibrações de Lefschetz” (mestrado). Candidato: Brian Callander. Orientadora: professora Elizabeth Terezinha Gasparim. Dia 18 de junho, às 14 horas, na sala 121 do Imecc. “Identidades polinomiais graduadas em álgebras t-primas” (mestrado). Candidato: Bruno Tobias. Orientador: professor Plamen Emilov Kochloukov. Dia 21 de junho, às 10 horas, na sala 121 do Imecc. Odontologia - “A influência da ciclagem mecânica sobre o desajuste marginal, tensão e torque de afrouxamento no sistema implantossuportado” (mestrado). Candidata: Isabella da Silva Vieira Marques. Orientador: professor Marcelo Ferraz Mesquita. Dia 17 de junho, às 14 horas, na sala da Congregação da FOP. “Análise fractográfica através de microscopia eletrônica de varredura (mev) de placa 2,0 mm com sistema de travamento de parafusos em fraturas de corpo mandibular simuladas” (mestrado). Candidata: Raquel Correia de Medeiros. Orientador: professor Roger Willian Fernandes Moreira. Dia 18 de junho, às 14: horas, na sala da Congregação da FOP. “Influência da inclinação e tipo de conexão de implante na distribuição de tensão para o conceito all-on four em mandíbula” (doutorado). Candidata: Brunna Moreira de Farias Pereira. Orientador: professor Mauro Antonio de Arruda Nóbilo. Dia 19 de junho, às 14 horas, na sala da Congregação da FOP. “Influência da nitretação da superfície de titânio sobre a formação e desenvolvimento de biofilmes multiespécies” (mestrado). Candidata: Indira Moraes Gomes Cavalcanti. Orientadora: professora Altair Antoninha Del Bel Cury. Dia 21 de junho, às 8h30, na sala da Congregação da FOP. “Evolução de indicadores pós-implantação de equipes de saúde bucal na estratégia saúde da família na região de Campo Limpo, zona sul de São Paulo, no período de 2009 a 2011” (mestrado profissional). Candidata: Danielle da Costa Palácio. Orientador: professor Antonio Carlos Pereira. Dia 21 de junho, às 13h30, na sala da Congregação da FOP. “Efeito da ciclagem mecânica e da técnica de fundição das infraestruturas sobre o desajuste marginal, tensão, e torque de afrouxamento em próteses múltiplas implantossuportadas” (mestrado). Candidata: Claúdia Lopes Brilhante Bhering. Orientador: professor Marcelo Ferraz Mesquita. Dia 21 de junho, às 14 horas, no anfiteatro 4 da FOP. “Associações entre variáveis sociodemográficas e comportamentais de crianças com e sem necessidade de tratamento participantes de um programa de atenção odontológica” (mestrado profissional). Candidata: Cristina Martins Lisboa. Orientador: professor Fabio Luiz Mialhe. Dia 21 de junho, às 14 horas, no anfiteatro 1 da FOP.
Livro
da semana
Alguns aspectos da teoria da poesia concreta
Sinopse: A presente obra consiste numa leitura atenta e minuciosa dos textos básicos da teoria da poesia concreta, visando compreender a articulação do seu movimento, suas principais postulações e sua força argumentativa, bem como as contradições, as mudanças de rumo e as soluções teóricas encontradas ao longo das décadas de 1950 e 1960. A poesia concreta é referência obrigatória para qualquer reflexão séria sobre a produção e a crítica de literatura brasileira dos últimos 50 anos. Núcleo gerador de uma grande produção crítica e teórica, foco de polêmicas apaixonadas, a poesia concreta é objeto aqui de um estudo rigoroso, que busca estabelecer as linhas gerais de sua articulação enquanto projeto de intervenção literária, bem como situá-la no quadro mais amplo das transformações por que passou a cultura brasileira nas décadas de 1950 e 1960. Autor: Paulo Franchetti é professor titular de teoria literária do Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp. Publicou, entre outros, Nostalgia, exílio e melancolia — Leituras de Camilo Pessanha (Edusp, 2001), Estudos de literatura brasileira e portuguesa (Ateliê, 2007), O essencial sobre Camilo Pessanha (INCM, 2008) e Haikai, antologia e história (Editora da Unicamp, 4a ed., 2012). ISBN: 978-85-268-0988-8 Ficha técnica: 4a edição ampliada, 2012; 200 páginas; formato: 14 x 21 cm; Áreas de interesse: Literatura Preço: R$ 42,00
Destaque do Portal
No topo, entre as mais jovens Quacquarelli Symonds (QS), que produz o ranking Top Universities, divulgou levantamento no último dia 11 que destaca novamente a Unicamp entre as 50 melhores universidades do mundo com menos de 50 anos. Em relação ao último ranking, a Universidade avançou seis posições e ocupa a 17ª colocação. A Unicamp é a única instituição brasileira listada neste levantamento. A Universidade também foi relacionada entre as 50 melhores com menos de 50 anos no ranking divulgado em 2012 pelo Times Higher Education (THE), outro importante instituto de avaliação de ensino superior. No levantamento da THE, a pesquisa científica possui maior peso em relação a outros critérios. Já o ranking da QS, instituição sediada no Reino Unido, leva em conta a reputação de uma universidade no meio acadêmico mundial. Em suas avaliações, é considerado o desempenho das instituições em diferentes indicadores, como número de alunos, demanda em processos seletivos, número de artigos publicados, número de teses produzidas, satisfação de estudantes, prêmios recebidos por seus pesquisadores ou exalunos, prestação de serviços e transferência de tecnologia (patentes e licenciamentos). Outro ranking, divulgado em maio último pela QS, destaca a Unicamp entre as três melhores universidades da América Latina.
Foto: Antoninho Perri
Vista aérea da Unicamp: Universidade avança seis posições e passa a ocupar a 17ª colocação
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Campinas, 17 a 23 de junho de 2013
Foto: Antoninho Perri
CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br
professor José Joaquín Lunazzi, do Laboratório de Óptica do Departamento de Física da Matéria Condensada, do Instituto de Física “Gleb Wataghin” (IFGW) da Unicamp, é um entusiasta das imagens tridimensionais. Desde a década de 60, quando ainda muito jovem, vem se dedicando a elas. Em 1969, na cidade de La Plata, província de Buenos Aires, distante 60 km da capital argentina, ele conseguiu reproduzir, pela primeira vez na América Latina, imagens em três dimensões utilizando holografia. A holografia corresponde a um processo fotográfico que, por meio de raios laser, permite obter imagem passível de ser visualizada em três dimensões sem necessidade de acessórios. Era uma época em que as imagens holográficas despertavam particular interesse e muita curiosidade, embora poucos centros dispusessem de laser, indispensável para obtê-las. A imagem produzida pelo processo holográfico pode ser vista em dimensões 3D quando exposta em ambiente não muito iluminado. Em 1974, o professor Lunazzi foi convidado para ministrar curso de um mês sobre holografia na Unicamp, que então recentemente criada e em fase de crescimento, e procurava incorporar conhecimentos novos. No ano seguinte, ao terminar o doutorado, recebe convite da Universidade para compor o quadro de docentes do Instituto de Física. A correspondência esclarecia que já tinha sido montado um laboratório que permitiria o desenvolvimento do seu trabalho. O convite mencionava o salário, altamente estimulante para quem vivia em um país em forte crise econômica, e era acompanhado por um contrato já previamente assinado por Zeferino Vaz, reitor pró-tempore, na época. Ao chegar, o docente dedicou-se a estudos e publicações que envolviam a utilização de imagens tridimensionais na detecção de pequenas deformações em superfícies ou objetos, que constituía uma ferramenta de grande utilidade para a engenharia mecânica. Paralelamente, dedicava-se à produção de imagens 3D.
RESGATE HISTÓRICO
Em breve resgate histórico, Lunazzi lembra que as imagens mais antigas de que se têm notícia, elaboradas pelo homem, datam de 35 mil anos e foram descobertas por acaso em 1994, na França, naquela que passou então a ser denominada Caverna de Chauvet, recentemente mostrada no filme em 3D “A Caverna dos Sonhos Esquecidos”. Em alguns desenhos de animais nela representados, o próprio relevo das rochas é utilizado na composição das imagens com a clara intenção de sugerir a dimensão espacial. Constitui a mais antiga tentativa de representação da arte tridimensional que se conhece. O professor lembra a passagem pelas esculturas gregas e renascentistas até que se chegasse ao advento da fotografia, descoberta na França na década de 1830. A partir da fotografia desencadeou-se muito rapidamente, quatro ou cinco anos depois, o desenvolvimento das imagens 3D, decorrente da constatação de que as imagens registradas por cada um dos olhos da mesma pessoa apresentam diferenças, efeito que artistas como pintores e escultores já conheciam. Nessa época, a tridimensionalidade era obtida com a utilização de duas fotos, cada uma correspondendo à visão de um olho, que justapostas e olhadas através de aparelhos ou lentes, levavam ao efeito desejado. Existem hoje publicações em que essas fotos, que isoladamente registam as imagens captadas por cada olho, são juntadas lateralmente e quando vistas através de um sistema de lentes adequado permitem a sensação de profundidade. No Brasil isso já era feito por volta de 1855 como mostram fotos de Dom Pedro II e dos interiores do Palácio Real. Já no começo do século XX a imagem 3D passou a ser mais sofisticada. Deu origem nos anos 50 a uma onda de filmes, muito ao gosto do público, que ressurgiu no século XXI apoiada em recursos do cinema digital. A imagem holográfica, obtida através da utilização do laser, mas que não exigia óculos especiais para ser visualizada em 3D, chegou ao Brasil em 1974, conta Lunazzi, que a apresentou em curso na Unicamp. A partir daí ele desenvolveu novas modalidades da técnica e também recriou no formato digital as técnicas tradicionais de fotografias e filmes 3D. Obteve, então, imagens a partir de uma variação muito grande de temas, como os rostos de pessoas famosas e conhecidas, os reproduzidos a partir de obras de arte como o da Pietà, de Michelângelo, todas expostas em sua sala de trabalho.
José Joaquín Lunazzi, físico e docente, em laboratório do IFGW, onde está desde 1974: missão
Da holografia
às imagens 3D Docente do IFGW divulga a física para estudantes por meio de imagens Foto: Divulgação
Crianças veem fotos e vídeos 3D: apresentação de holografias e exposições didáticas sobre processos de formação de imagens
GUINADA
Em 1984, retornando de uma exposição de holografia realizada em Frankfurt, enquanto mostrava para sua filha um catálogo que trouxera e que reproduzia hologramas obtidos com luz branca, a menina insistiu que fossem olhados com óculos adequados, o que para ele não fazia sentido. Mas o fez. Nesse processo deparou com uma foto que, se girada 90 graus e associada à imagem da posição inicial, permitia chegar à imagem 3D através da observação com óculos adequados. A partir daí ele estabeleceu um novo princípio para a produção de imagens como as dos hologramas com a utilização da luz branca, empregando uma rede de difração, que decompõe essa luz nas várias colorações que a constituem. A difração ocorre quando a luz atinge superfícies formadas por micro sulcos, que a distribuem, levando ao holograma, ou seja, à reprodução dos raios. A tela difrativa utilizada nos processos utilizados por Lunazzi é constituída por esses sulcos. É o mesmo efeito que se observa na superfície de um CD ou DVD por incidência dos raios luminosos. Desde essa descoberta, ele passou a trabalhar apenas com a obtenção de imagens em 3D, que efetivamente era do que mais gostava. Dedicou-se, em colaboração com artistas plásticos da Unicamp, a realizar trabalhos de arte utilizando a holografia. “É a arte, a imaginação e a criação humanas que impulsio-
nam a ciência. É a arte e o sonho humanos que podem levar o cientista a fazer algo de novo”, diz o professor. Ele criou diversas aplicações para suas telas e realizou trabalhos de arte em holografia expostos em galerias e museus. Depois avançou, desenvolvendo um protótipo básico do cinema holográfico. Chegou à imagem televisiva em três dimensões, que pode ser vista sem utilização de óculos e que permite ao espectador movimentação da cabeça, diferentemente dos sistemas existentes que exigem posição fixa de quem assiste para que a imagem não se quebre. A evolução da tecnologia e o advento da imagem digital o levaram ao desenvolvimento de uma proposta que permite utilizá-la para chegar aos mesmos efeitos. Ele defende que, embora não seja mais realizada, a holografia mostrou onde se pode chegar com as imagens, apontando o caminho a ser seguido pelos sistemas digitais. O docente resume sua exposição: “Viemos da imagem 3D com a utilização de óculos, chegamos ao sistema 3D sem óculos, embora com limitações, mas precisamos evoluir para um holograma obtido através da imagem eletrônica. A holografia que surgiu na década de 60 como um achado muito interessante acabou por falta de mercado. Como acabou o cinema 3D que se manteve dos anos 50 e 70 e que renasce agora na era digital, mas que ainda está à procura do seu espaço”.
ENSINO
Lunazzi considera-se praticante do que se denomina slow science, algo como “ciência lenta”, desenvolvendo um trabalho para pensar, que pode levar ao novo e que não tem necessariamente um objetivo final prefixado. Ele considera que a atividade científica acadêmica é muito direcionada devido à correria para publicar, para apresentar produção, o que em geral leva ao que já é estabelecido. Lembra que poderia ter se aposentado há onze anos, mas continuou na ativa, para trabalhar no que acha que deve fazer dentro do que mais gosta. “Publico pouco, o que me leva a ter problemas de reconhecimento e apoio, mas tenho consciência da importância do que estou fazendo quando ministro disciplinas para estudantes de física que se interessam pelo magistério e quando atendo grupo de alunos de escolas públicas que nos visitam, cujas perguntas e questionamentos me obrigam a repensar e, não raro, me impulsionam para novas procuras”, enfatiza ele. Com efeito, o professor José Joaquín Lunazzi é responsável por disciplinas de livre escolha dos graduandos em física com vistas à complementação de créditos, que interessam particularmente aos que pretendem o magistério, como Instrumentação de Ensino e Tópicos de Ensino de Física, nas quais os alunos realizam e aplicam experimentos didáticos. Durante as visitas previamente agendadas de alunos secundaristas interessados em conhecer seu laboratório, ele realiza exposições didáticas sobre processos de formação de imagens e apresenta holografias. Para ele, trata-se de oportunidade única de centenas de estudantes entrarem em contato com experimentos relacionados à óptica das imagens e inteirarem-se do seu desenvolvimento até os dias de hoje.
Para saber mais As atividades desenvolvidas pelo docente podem ser acessadas no site http://www.ifi.unicamp.br/~lunazzi/ e os contatos realizados através do endereço lunazzi@ifi.unicamp.br.
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Campinas, 17 a 23 de junho de 2013
Nos folguedos, a fé na arte Fotos: Reprodução / Divulgação
PATRÍCIA LAURETTI patricia.lauretti@reitoria.unicamp.br
primeiro contato de Amilton Damas de Oliveira com a gravura foi em uma oficina cultural oferecida pela prefeitura de Jacareí, interior de São Paulo, em meados dos anos de 1990. Bem antes, ele vivenciou outras experiências: da violência e da religiosidade. Recém-nascido, com três dias de vida, Amilton foi sequestrado por uma mulher que o tirou do colo da mãe. Ela procurou uma vidente, cuja “receita” para ter a criança de volta era que a porta da casa não fosse aberta para ninguém até um determinado horário do dia seguinte. E conta Amilton que assim foi feito. Ele foi resgatado pela polícia. Se a história parece ficção, ela vem contada em prosa e verso num cordel, feito por um amigo da família, e que acabou estampado em uma das páginas da dissertação de mestrado de Amilton, defendida no programa de Artes Visuais do Instituto de Artes (IA) da Unicamp. Não por coincidência, a xilogravura costuma ilustrar os folhetos da literatura de cordel. Não por coincidência, a pesquisa de Amilton é sobre a xilogravura. O cruzamento da fé com a arte integra a sua vida e também permeia o trabalho científico “Festas populares paulistas: impressões xilográficas”. Arquiteto por formação, Amilton registrou tradições do catolicismo popular nas matrizes da xilogravura. As gravações possibilitaram uma investigação que prioriza o uso das cores e a técnica da matriz perdida, ou seja, na mesma matriz os desenhos são modificados para receber novas camadas de tinta. A gravação vai sendo trabalhada desta maneira. Primeiro nas cores mais claras e, por último, as mais escuras, até o preto. A matriz é “perdida” porque o desenho vai sendo alterado a cada gravação. A técnica ele aprimorou com o tempo. A primeira gravura feita na oficina cultural foi por linoleogravura, semelhante à “xilo” mas sem produzir texturas ou relevo, ou seja, a impressão a partir de uma matriz uniforme. “Caipira subindo pro céu” já trazia as referências importantes para a história de Amilton. Tratava de gente simples e de sua relação com o divino. Desde pequeno, o autor frequenta as festas do catolicismo popular. Foi por sete anos tropeiro de uma companhia de reis em sua cidade, acompanhava e ainda hoje está por perto, quando é época de Moçambique, Folia de Reis, Dança São Gonçalo e Cavalhada.
C ATOLICISMO
POPULAR
Terça-feira, feriado de Carnaval de 2011. Com tempo fechado, nublado, sigo pela estrada de terra e lama pisoteada por rebanhos de gados. No percurso quase inacessível e inexistente tamanho lamaçal, surge a impressão tensa de que alguma coisa caminha junto no ar. É algo que observa e envolve minha mente, como se estivesse bem próximo, como se essa coisa estivesse a ponto de golpear-me com um só bote. Estradas, caminhos revelados, ir ao encontro de homens e suas histórias e com eles falar sobre a Cavalhada. O trecho acima, da dissertação de mestrado de Amilton, narra a sua chegada na zona rural de Igaratá (SP), onde vive o chefe da cavalaria do Jogo da Cavalhada, uma das festas do catolicismo popular que ele retrata em xilogravura e que é tradição na cidade. A partir de encontros assim, entre 2008 a 2011, o pesquisador fez várias séries de desenhos que compuseram o processo de criação das gravuras de matrizes perdidas. Além da Cavalhada e da Folia de Reis, ele retratou o Moçambique de São José dos Campos e o grupo de folguedo Dança de São Gonçalo da cidade de Santa Isabel, próximo a Jacareí. A Dança de São Gonçalo é realizada por violeiros, conhecidos como folgazões, que fazem evoluções em torno de um altar ou oratório. “Nas três primeiras voltas, cantam-se 66 versos, aproximadamente, com duração de uma hora e dez minutos. Na última volta, a de despedida do santo, cantam-se cerca de 126 versos, com a duração de uma hora e quarenta minutos”, descreve o autor.
PLANEJAMENTO Além da memória e dos desenhos em cadernos, blocos e folhas avulsas, Amilton registrou as imagens em fotografias. Para entalhar as matrizes, ele utilizou uma prancha de madeira da dimensão de uma porta. O processo da matriz perdida é também chamado de subtrativo. “Cada gravação recebe uma cor diferente e volto a entalhar na mesma matriz. Gravo partes que eu quero – ‘estico’ a tinta com rolo de borracha numa chapa, faço a impressão e retiro o papel”. A pesquisa originou mais de 50 gravuras que têm cores predominantes: o amarelo claro, o vermelho, o verde, o azul e o preto. As cenas mostram violeiros, personagens tocando instrumentos, leilões, bandeiras. Com a técnica da matriz perdida, Amilton precisa fazer um planejamento minucioso de como serão as impressões. “A matriz perdida demanda um planejamento para cada impressão”, observa. Amilton ressalta que a pesquisa com as cores foi favorecida pelo tamanho das matrizes. “Em tamanho maior a gravura expande as cores. Em tamanho menor normalmente as nuances estagnam”. Este resultado deixou o artista e pesquisador satisfeito. Para ele, as cores levam para a grande gravura as impressões e emoção de quem estava por lá, bem perto da festa.
No Moçambique crianças carregam a bandeira. A apresentação de dança é organizada por três personagens: o mestre, o contramestre e o capitão, que se alternam nas tarefas de dirigir e fiscalizar o conjunto. Também ocorre a coroação do rei e da rainha do Moçambique em ritual de louvação. Na dissertação, Amilton escreve: “No Moçambique, a bandeira é sagrada ao santo protetor, Santo Benedito, e Nossa Senhora do Rosário tem lugar de destaque. A família Gusmão conta que a tradição vem do Sr. Antonio Gusmão, casado com Maria Helena, com quem teve doze filhos – Antonia, Clementina, Donizete, Isabel, José Aparecido, João, Luiza, Neuza, Norberto, Nelson, Justino, Rosa–, setenta e três netos e trinta e quatro Bisnetos”.
Publicação Dissertação: “Festas populares paulistas: impressões xilográficas” Autor: Amilton Damas de Oliveira Orientadora: Lúcia Eustáchio Fonseca Ribeiro Unidade: Instituto de Artes (IA)
Distribuídas nesta página, algumas das obras de Amilton Damas de Oliveira: impressões de quem esteve na festa
O arquiteto e gravurista Amilton Damas de Oliveira: registrando tradições do catolicismo popular nas matrizes da xilogravura