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Campinas, 5 a 11 de agosto de 2013 - ANO XXVII - Nº 569 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
IMPRESSO ESPECIAL
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CORREIOS
FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT Foto: Divulgação
Modernista, mas racista e reacionário
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TELESCÓPIO Hemisfério sul paga a conta do degelo Japão começa a testar células-tronco em humano
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Pobreza é mais nociva que cocaína para bebês
O livro Tietê, Tejo, Sena: a obra de Paulo Prado, de Carlos Berriel (IEL/Unicamp), revela como a Semana de Arte Moderna de 1922 serviu aos interesses de uma “oligarquia racista, reacionária e ao mesmo tempo modernista”. Para Berriel, cuja obra reconstitui a trajetória intelectual e dimensiona a influência do pensamento do cafeicultor e historiador Paulo Prado, precisa ser revisto o lugar do modernismo paulista no cânone da literatura brasileira.
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O cafeicultor e historiador Paulo Prado, mecenas da Semana de 22, na sede do jornal O século, em Lisboa, em foto de 1934: modernismo sofreu influência da visão colonialista de intelectuais portugueses
‘Qualificação’ não garante emprego, aponta estudo
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Comportamento de autista é avaliado por meio de imagens
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Pressão e metas deixam bancários mais doentes
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Campinas, 5 a 11 de agosto de 2013
TELESCÓPIO
CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br
Degelo custará mais caro para o hemisfério sul Muitos países vêm encarando o degelo da região ártica do planeta, causado pela mudança climática, como uma oportunidade: não só a chamada Passagem de Noroeste, uma rota marítima ligando a Ásia à América do Norte, agora passa cada vez mais tempo aberta, facilitando e barateando o transporte de carga, como já surgem disputas de soberania envolvendo os recursos naturais que poderão vir a ser explorados na região, como o petróleo. Em 2007, um submarino russo plantou uma bandeira do país no leito oceânico por baixo do Polo Norte, e o governo canadense não viu graça nenhuma na proeza. O degelo pode ter consequências trágicas para a fauna local, e a exploração de petróleo nas águas do Ártico traz o risco de vazamentos e outras catástrofes ecológicas. Mas, a despeito dos alertas de ambientalistas, a visão predominante ainda parece ser a de que as oportunidades superam, em muito, os perigos. Um comentário publicado na revista Nature de 25 de julho, no entanto, busca lançar uma dose de sobriedade em toda a euforia: de acordo com seus autores – pesquisadores da Universidade Erasmus, da Holanda, e de Cambridge, no Reino Unido – o custo do degelo pode superar os US$ 60 trilhões. Pondo o valor em perspectiva, os autores lembram que o PIB global em 2012 ficou em US$ 70 trilhões. “Muito do custo recairá sobre países em desenvolvimento, que enfrentarão eventos climáticos extremos, saúde pior e perda na produção agrícola, à medida que o aquecimento do Ártico afeta o clima”, escrevem os autores. “Todas as nações serão afetadas, não apenas as do norte”. De acordo com Gail Whiteman (Universidade Erasmus), Chris Hope e Peter Wadhams (Cambridge), o principal motor da mudança climática global causada pelo degelo do Ártico será a liberação do metano – um poderoso gás causador do efeito estufa – aprisionado no fundo do oceano. “Um reservatório de metano de 50 bilhões de toneladas (...) existe na Plataforma Ártica da Sibéria Oriental”, diz o artigo. Esse gás “provavelmente será liberado à medida que o leito do mar se aquece, seja constantemente, ao longo de 50 anos, ou de modo repentino”. Para simular os custos gerados por essa emissão de metano, os
autores usaram o modelo de computador PAGE09, uma versão atualizada do sistema utilizado na elaboração do Relatório Stern sobre mudança climática, encomendado pelo governo britânico e publicado em 2006. De acordo com as simulações, 80% dos prejuízos ocorrerão na África, Ásia e América do Sul. “O metano extra amplia as enchentes em áreas de baixa elevação, ondas extremas de calor, secas e tempestades”, diz o artigo. Se o custo ambiental do degelo será pago por países do hemisfério sul, as nações que se preparam para aproveitar a nova fronteira econômica também se deparam com desafios potencialmente desastrosos nas esferas diplomática e militar. Em artigo de opinião publicado no jornal The New York Times em março deste ano, um oceanógrafo da Universidade da Califórnia, Santa Bárbara, Paul Arthur Beekman, advertia para a necessidade de se evitar uma “Guerra Fria no Ártico”. “Diversos países, junto com corporações como Exxon Mobil e Duth Shell, preparamse para explorar as enormes reservas de óleo e gás natural da região. (...) Alguns Estados aumentaram sua presença de pessoal e equipamento militar” na área.
Artigo associa aquecimento global a clima de guerra Crime e guerra, aliás, são duas consequências mensuráveis do aquecimento global, afirma artigo publicado na edição de 2 de agosto da revista Science. Uma equipe de pesquisadores liderada por Solomon Hsiang, de Princeton e Berkeley, analisa dados de dezenas de estudos sobre violência humana e condições climáticas, tratando de conflitos que datam de até 12.000 anos atrás. “Encontramos forte evidência causal ligando eventos climáticos a conflitos humanos ao longo de uma ampla escala de tempo e espaço, e em todas as regiões do globo”, escrevem os autores, acrescentando que “a magnitude da influência do clima é substancial”. Especificamente, aumentos na temperatura e na frequência de chuvas tendem a elevar tanto os índices de violência interpessoal quanto os de conflitos entre grupos.
Extrapolando os resultados do levantamento histórico e arqueológico para o período atual, os autores preveem que a elevação da violência será um “impacto grande e fundamental da mudança climática antropogênica” até 2050. O trabalho reconhece que as sociedades contemporâneas talvez sejam menos dependentes do clima que as do passado, e que a mudança climática atual poderá se mostrar lenta o bastante para permitir meios pacíficos de adaptação, mas faz ressalvas: “Se choques climáticos mais lentos têm efeitos menores, ou se o mundo se tornou menos sensível ao clima, isso infelizmente não fica óbvio nos dados. Mudanças climáticas graduais parecem afetar os conflitos de modo adverso, e a maioria dos estudos que revisamos usa um período de amostragem que se estende ao século 21”.
peram que o uso de material extraído dos pacientes resolva o problema de rejeição do corpo às novas células. O processo todo será lento: a produção das células iPS e sua conversão em enxertos para a retina deve consumir 10 meses, e o acompanhamento dos pacientes deve se estender por um período de três anos. O estudo clínico é apenas um piloto, diferente de um teste clínico formal: mesmo se bem-sucedido, o trabalho japonês não abrirá o caminho para a adoção da técnica em larga escala. Ele pode, no entanto, lançar as bases para um teste clínico amplo que leve as iPS ao repertório geral da medicina.
Geleiras mais finas e falta de água no Chile e Argentina
Uma série de estudos realizada ao longo de mais de duas décadas na cidade de Filadélfia, nos Estados Unidos, concluiu que a pobreza é mais prejudicial para a saúde dos bebês do que o fato de a mãe consumir crack durante a gestação. A principal autora dos trabalhos, Hallam Hurt, apresentou um resumo de suas descobertas no Children’s Hospital da Filadélfia no mês de junho, mas seus resultados vêm sendo publicados na literatura científica há tempos. Um artigo, Children With In Utero Cocaine Exposure Do Not Differ From Control Subjects on Intelligence Testing (“Crianças Expostas à Cocaína no Útero Não Diferem de Controles em Testes de Inteligência”), publicado no JAMA Pedriatics (então Archives of Pediatrics and Adolescent Medicine), data de 1997. Hurt começou a trabalhar com o tema em 1989, época em que, de acordo com as estatísticas, um em cada seis nascidos vivos nos hospitais da Filadélfia era filho de mãe que havia testado positivo para cocaína. A mídia criou, então, o mito dos “crack babies” – “filhos do crack” – crianças condenadas à deficiência mental. Mas, de acordo com reportagem do jornal Philadelphia Inquirer sobre o trabalho de Hurt, os “filhos do crack” não se saíram pior que controles do mesmo extrato social em testes de inteligência. Só que os dois grupos se saíam pior que a média da população da mesma idade, o que levou à conclusão de que as condições sociais são mais importantes para o desenvolvimento infantil. Isso não significa, no entanto, que a cocaína seja inofensiva para a gestação. Como disse a pesquisadora ao Inquirer, a droga pode causar aumento na pressão arterial da gestante, precipitar um parto prematuro e trazer, ainda, outras complicações. Além disso, o uso de drogas pelos pais pode produzir um ambiente doméstico ruim para a criança. Entre os dados levantados pela equipe de Hurt, aos 7 anos 81% das crianças pesquisadas já tinham visto alguém ser preso; 74% tinham ouvido tiros; 35% tinham visto alguém ser baleado; 19% tinham visto um cadáver na rua.
Artigo publicado no site Scientific Reports, do grupo Nature, no início de julho, sugere que as geleiras do norte da Patagônia ficaram mais finas há cerca de 19 mil anos, quando os ventos da região migraram para o sul. O mesmo pode ocorrer no futuro próximo, por conta do aquecimento global. A perda de gelo na região poderá causar escassez de água no Chile e na Argentina.
Japão lança estudo de células-tronco em humanos O Centro Riken de Biologia do Japão começou a recrutar, em 1° de agosto, pacientes para o primeiro estudo clínico, em todo o mundo, de células-tronco de pluripotência induzida (iPS) em seres humanos. A equipe da oftalmologista Masayo Takahashi vai estudar a eficácia e a segurança do uso dessas células na regeneração do dano causado pela degeneração macular na retina dos pacientes. Células iPS são células-troco produzidas a partir da manipulação de células comuns do corpo. No caso do estudo japonês, as iPS serão criadas a partir de células extraídas dos próprios pacientes e, então, convertidas em células da retina que serão montadas em enxertos com poucos milímetros. Os pesquisadores es-
Pobreza é pior que cocaína para a saúde dos bebês
Nasa/Divulgação
Cadáveres sobre leitos de flores perfumadas
Imagem da Nasa mostra a média de cobertura mínima de gelo sobre o Ártico no período de 2003 a 2005
Arqueólogos israelenses publicaram, no início de julho, artigo na PNAS descrevendo o que parece ser, até agora, o mais antigo uso de flores para manifestar sentimentos entre seres humanos: túmulos revestidos de plantas de 11.000 a 13.000 anos atrás, encontrados no norte de Israel. De acordo com a equipe chefiada por Dani Nadel, da Universidade de Haifa, os corpos sepultados na Caverna Raquefet, em Monte Carmel, foram depositados sobre leitos coloridos de flores perfumadas, como menta e lavanda.
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Campinas, 5 a 11 de agosto de 2013
Estudo coloca em xeque
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tese da ‘qualificação’
como garantia de emprego Foto: Antoninho Perri
Pesquisador acompanhou a trajetória de grupo de jovens atendidos em programa público ALESSANDRO SILVA alessandro.silva@reitoria.unicamp.br
os anos 90, com a explosão da violência no país, sobretudo envolvendo segmentos mais jovens e pobres, nasceu a ideia de que a qualificação profissional levaria essa população ao emprego e, consequentemente, para longe das estatísticas policiais. Desde então, diversos programas governamentais foram desenvolvidos nessa área em todo Brasil, para qualificar a juventude a enfrentar os desafios do primeiro emprego e da inserção no mercado. Para entender a realidade desses brasileiros, uma pesquisa acompanhou percursos de formação e de trabalho, durante oito anos, e constatou que a questão é muito mais complexa do que imaginavam os formuladores de políticas públicas há duas décadas. “O problema do desemprego, principalmente do jovem, não se explica por si só como um problema de escolaridade”, afirma o pesquisador José Humberto da Silva, autor da tese de doutorado “Juventude Trabalhadora Brasileira: percursos laborais, trabalhos precários e futuros (in) certos”, apresentada na Faculdade de Educação (FE) da Unicamp, sob a orientação da professora Liliana Rolfsen Petrilli Segnini. O objetivo da pesquisa era analisar as trajetórias de formação e de trabalho dos jovens egressos de programas sociais, destacadamente de um projeto de qualificação profissional mantido pelo governo federal, dentro de uma política para a juventude. “No mundo, o segmento jovem é o mais escolarizado e desempregado”, diz o autor, professor da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Para se ter uma ideia do problema, do total de 7,8 milhões de trabalhadores desocupados no final da década de 90, no Brasil, 4,7 milhões eram jovens, o equivalente a 60%, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD). Silva começou a acompanhar um grupo de nove jovens com mais de 17 anos, todos da periferia de Salvador e atendidos por um programa federal de qualificação profissional (Consórcio Social da Juventude), mantido em parceria com uma entidade não-governamental. Esse programa, desenvolvido a partir de 2004 em quase todas as capitais brasileiras, qualificou aproximadamente 70 mil jovens no Brasil e inseriu, de acordo com o autor da tese, 22 mil brasileiros no mercado de trabalho. O consórcio foi realizado com foco nos seguintes eixos: fomento à geração de postos de trabalho formais e formas alternativas geradoras de renda; preparação para o primeiro emprego; articulação com a sociedade civil. Os jovens foram entrevistados, num primeiro momento (2005 a 2006), para o mestrado que Silva realizou também na Uneb, com o objetivo de analisar em que medida os cursos de qualificação contribuíram para a inserção dos jovens no mercado de trabalho. Depois, a partir de 2008, já no doutorado realizado na Unicamp, o mesmo grupo de jovens possibilitou ao pesquisador reconstruir seus percursos de trabalhos, suas novas estratégias de acesso e permanência em empregos, sobretudo no campo da formação.
Estudantes em escola pública de Campinas: indicadores revelam que jovens são o grupo mais escolarizado e mais desempregado entre as demais faixas etárias
Por meio da história desses jovens, os “caminhos” percorridos foram estudados em um contexto de indicadores sociais e econômicos. Conforme o autor, a opção metodológica da pesquisa, baseada em estudo microssociológico, foi realizada por entender que essa ferramenta pode revelar aspectos encontrados em escala maior na sociedade. Dessa forma, foram reunidos métodos, técnicas e instrumentos de pesquisa quantitativa e qualitativa.
CONSTATAÇÃO O país cresceu, a economia melhorou, empregos foram gerados, mas isso não foi suficiente para resolver o problema do desemprego para a juventude trabalhadora brasileira, na faixa etária de 15 a 29 anos. “Embora tenha ocorrido uma significativa elevação do ritmo de crescimento do país e uma geração de novos empregos para toda a população economicamente ativa, especialmente nos anos de 2004 a 2008, os jovens continuam sendo, no Brasil, o grupo mais escolarizado e mais desempregado entre os demais grupos etários”, escreveu o autor da tese. De fato, as narrativas coletadas humanizam os números citados. Em comum, as famílias desses jovens pobres realizaram fortes investimentos na preparação dos filhos, acreditando que o estudo garantiria a eles uma vida melhor, com mais oportunidades, em uma tentativa de “dar aos filhos o que não tiveram”. “Desde muito cedo, por meio dos discursos capturados, a educação [dos filhos] foi o principal investimento da família”, afirma o pesquisador. Três dos nove jovens, por exemplo, estudaram em escolas particulares. Mas por que é importante conhecer o percurso de trabalho da juventude? “Sobretudo para pensar as políticas de emprego e de formação”, explica Silva. “Existe ainda uma tendência nas políticas atuais de pensar a juventude e o processo de inserção deles no mercado de trabalho por via apenas de um processo de construção de políticas de qualificação, ou seja, vamos qualificar o jovem para inseri-lo.”
Segundo o pesquisador, o problema do desemprego no Brasil, principalmente em relação à juventude, ganhou atenção na década de 80, como um problema social grave, visto que estava associado à questão da violência juvenil. “Nos anos 90, ocorreram fortes investimentos para essa juventude, com programas voltados para a qualificação, na intenção de que isso pudesse inserir esses jovens e livrar a sociedade dos males que esse segmento poderia provocar. No final dos anos 90, porém, os dados indicavam que a causa do desemprego não encontrava na insuficiência de escolaridade a sua única explicação.” Conforme as entrevistas, ao terminarem a educação básica, os jovens percebem que a qualificação obtida na escola ainda não é suficiente para o “emprego digno ou bom emprego” e seguem para os cursos de qualificação, de olho no “emprego estável e protegido”. A formação, de acordo com o estudo, é vista como um “passaporte” para o mundo dos empregos. Tanto, que um dos jovens passou por mais de dez diferentes cursos de qualificação em sua trajetória, alguns realizados ao mesmo tempo, como reflexo do discurso dominante de que a qualificação, por si, garante emprego. A intenção é ser superselecionável. “Eu ainda não tenho dinheiro pra pagar uma faculdade, por enquanto vou fazer um curso de inglês, é o que posso. Mas eu vou trabalhar muito, muito mesmo, e vou conseguir realizar o meu sonho – que é fazer Ciências Sociais – e no futuro vou ter um bom emprego”, disse uma das jovens entrevistadas na pesquisa, em 2010. “O emprego digno ou protegido, o emprego decente, não se constituiu”, explica o professor, apesar dos investimentos realizados pelos jovens e por suas famílias. Os nove entrevistados, acompanhados por anos, não permaneceram nos empregos que encontraram, mas continuaram a busca acreditando que unicamente a qualificação faria a diferença. No momento em que o estudo de doutorado foi encerrado, o grupo repetia o comportamento no ensino superior, ao dar prosseguimento ao estudo com a esperança de mudar de vida.
“Na Europa, o processo de passagem do sistema de qualificação para a inserção é complexo, temos jovens superpreparados e sem emprego. No Brasil, é um grande avanço a existência de programas articulados, entretanto os avanços ainda são pífios e não estão dando conta das reais causas do desemprego juvenil”, avalia Silva, ao comentar sobre a eficácia da atual política dos programas de qualificação profissional no país. O estudo conclui que fica explícito, nesse processo de formação de jovens para o mercado de trabalho, que não há uma “relação direta, única, de causa e efeito, na relação falta de qualificação e desemprego”. Quem determina a tão disseminada empregabilidade, termo que o autor problematiza no seu estudo, é o desempenho da economia, escreveu o autor da pesquisa, citando o economista Marcio Pochmann. O autor também esclarece que não pretende negar a importância da qualificação, mas refletir sobre a complexidade da questão e os efeitos limitados das políticas públicas atuais. No caso dos jovens entrevistados, o que era para ser “passageira”, uma solução transitória, acabou virando um trabalho “interino-permanente”. “A grande transformação que se verifica nos últimos anos reside no fato de que tanto os empregos precários como, as novas formas de subemprego, assumem, cada vez menos, uma ponte que conduz à estabilidade do emprego. Para muitos jovens, eles deixaram de ser um acontecimento biográfico pontual para se caracterizar num modo de vida”, escreveu o autor do estudo.
Publicação Tese: “Juventude trabalhadora: percursos laborais, trabalhos precários e futuros (in) certos” Autor: José Humberto da Silva Orientadora: Liliana Rolfsen Petrilli Segnini Unidade: Faculdade de Educação (FE) Financiamento: CNPq
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As potencialidades do
ginseng brasileiro MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br
esquisa desenvolvida para a dissertação de mestrado da engenheira de alimentos Renata Vardanega resultou no depósito de pedido de patente de um processo de obtenção de um extrato a partir de raízes de ginseng brasileiro (Pfaffia glomerata). O extrato contém saponinas, compostos que são do interesse das indústrias alimentícia, farmacêutica, cosmética e petroquímica, visto que apresentam atividades surfactantes e medicinais. O trabalho foi defendido recentemente na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, sob a orientação da professora Maria Angela Almeida Meireles. O método empregado para a obtenção do extrato, explica a autora do estudo, é mais simples e rápido que os processos convencionais, além de apresentar rendimentos muito superiores aos destes. “Nós utilizamos solventes considerados seguros e em menor quantidade. Além disso, obtivemos rendimentos bem superiores aos dos métodos já conhecidos. Conseguimos extrair cerca de 60% de extrato bruto em relação à matéria-prima. Outros processos alcançam um rendimento que varia de 2% a 40%”, compara Renata. Em relação ao composto de interesse medicinal, a betaecdisona, a engenheira de alimentos conseguiu recuperar até 14%, enquanto outros processos de extração atingem um percentual de no máximo 5%. “Já quanto à atividade surfactante, chegamos a um índice de emulsificação de até 58%, cujo valor é similar ao surfactante sintético Dodecil sulfato de sódio (SDS), um dos mais utilizados atualmente, contra os 20% obtidos para extratos contendo saponinas provenientes de outras plantas”, confronta. Uma das novidades da técnica empregada foi o uso do ultrassom, que contribuiu para ampliar as taxas de recuperação dos compostos. A utilização do ultrassom para essa finalidade, conforme a autora da dissertação, já era conhecida, mas o equipamento ainda não tinha sido aplicado para obtenção de extratos de ginseng brasileiro, somente para outras plantas. “Ou seja, nós tivemos que começar do zero, pois não sabíamos se a técnica poderia nos proporcionar bons resultados”, comenta Renata. Ela conta que decidiu pesquisar as propriedades do ginseng porque na literatura já havia a descrição de que a planta, que é nativa do país, contém saponinas. O primeiro interesse da pesquisadora foi explorar as atividades surfactantes desses compostos para possível aplicação na indústria alimentícia. Dito de modo simplificado, o surfactante é uma substância que possibilita a interação entre compostos imiscíveis para a formação de emulsões, como a mistura entre água e óleo. “Nosso grupo da FEA é o primeiro no país a desenvolver esse tipo de estudo com o ginseng brasileiro. Nesse caso, nós extraímos o extrato da raiz da planta. Entretanto, pretendemos desenvolver novas pesquisas para explorar a planta integralmente, das raízes às partes aéreas”, adianta Renata. “As partes aéreas geralmente são abandonadas no campo quando a colheita é feita, porém poderiam ser utilizadas para algum fim”, acrescenta Diego Tresinari dos Santos, coinventor e coorientador da dissertação de mestrado. O extrato obtido, reforça Renata, possui tanto saponinas que apresentam atividades surfactantes quanto medicinais. Entre as próximas providências a serem tomadas, segundo ela, estão a separação e a consequente caracterização desses
Pesquisa da FEA investiga o uso de compostos da planta pelas indústrias alimentícia, farmacêutica, cosmética e petroquímica Fotos: Divulgação
Na sequência, plantação de ginseng, raízes moídas e o extrato da planta: pesquisas renderam patente
compostos. “Precisamos conhecer melhor as propriedades destes compostos para saber a quais necessidades dos segmentos alimentício, farmacêutico, cosmético e petroquímico eles se adaptam melhor”, esclarece. Parte dessas tarefas já está sendo cumprida pela própria engenheira de alimentos, que agora cursa o doutorado na FEA. Outras questões, como a viabilidade econômica do processo, o aproveitamento dos resíduos gerados pela extração dos compostos para diferentes fins e a avaliação do potencial de aplicação dos extratos obtidos, estão sendo alvo de estudos de outros pesquisadores que integram o Laboratório de Tecnologia Supercrítica: Extração, Fracionamento e Identificação de Extratos Vegetais (LASEFI), coordenado pela professora Maria Angela Almeida Meireles. O objetivo é o aproveitamento integral do ginseng, utilizando processos sustentáveis, de modo a fechar uma cadeia. No caso dos resíduos das extrações, os pesquisadores pretendem utilizá-los como fontes de energia. “Nós fizemos testes preliminares e constatamos que isso é viável energeticamente devido ao seu alto poder calorífico. Adicionalmente, também foi avaliado um cenário em que segmentos das partes aéreas eram utilizados para o mesmo fim, similarmente ao que algumas usinas de açúcar e álcool começam a fazer, no Brasil, com a palha da cana-de-açúcar deixada no Foto: Antoninho Perri
campo. Em ambas as situações, toda a quantidade necessária de eletricidade e vapor para a produção dos extratos, via métodos desenvolvidos no LASEFI, seria suprida pela combustão de tais biomassas”, detalha Diego. “No entanto, precisamos avançar mais nos estudos para verificar a viabilidade econômica dessa rota. O que se vislumbra no momento é submeter os resíduos a altas temperaturas, de forma a quebrar as moléculas e obter açúcares que podem ser destinados à fermentação do etanol, por exemplo. Esta rota resultaria em produtos de valor agregado maior que a anterior, tendo-se coprodução de extrato com propriedades medicinais e surfactantes e etanol, criandose, assim, a biorrefinaria do ginseng Brasileiro”, diz Renata. “Com o resíduo sólido da etapa de hidrólise ainda poderiam ser produzidos nanocristais de celulose, que podem ser utilizados como material de reforço em matrizes poliméricas, e por fim energia a partir do resíduo sólido gerado a partir deste último processamento”, complementa Diego. Na opinião da autora da dissertação, embora o processo de extração desenvolvido experimentalmente ainda dependa de alguns aperfeiçoamentos, ele tem condições de ganhar escala e ser transferido para a iniciativa privada. “O método é relativamente simples. Isso sem falar que ele apresenta rendimentos significativamente maiores que as técnicas convencionais. Nossa expectativa é de que, em breve, ele possa fazer parte das etapas de produção da indústria”, antevê Renata, que destacou a importância do trabalho realizado pela Agência de Inovação Inova Unicamp no esforço para a proteção intelectual do trabalho. “A Inova tem uma atuação muito importante, pois ela contribui para que nossas pesquisas sejam transformadas em processos e produtos de importância para o país e a sua população”, considera a autora do trabalho, que contou com bolsa concedida pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Já o projeto no qual o trabalho dela está inserido tem financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Publicações
Renata Vardanega, autora da dissertação: “Extraímos o extrato da raiz do ginseng, mas pretendemos desenvolver novas pesquisas para explorar a planta integralmente”
Patente: Processo de Obtenção de um Extrato a Partir de Pfaffia glomerata. 2013, Brasil. Patente: Privilégio de Inovação. Número do registro: BR1020130128961, data de depósito: 24/05/2013, título: “Processo de Obtenção de um Extrato a Partir de Pfaffia glomerata”, Instituição de registro: INPI - Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Tese: “Obtenção de saponinas de raízes de ginseng brasileiro (Pfaffia glomerata) por extração dinâmica a baixa pressão assistida por ultrassom” Autora: Renata Vardanega Orientadora: Maria Angela de Almeida Meireles Coorientador: Diego Tresinari dos Santos Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) Financiamento: Capes e Fapesp
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Campinas, 5 a 11 de agosto de 2013
café pequeno Foto: Antonio Scarpinetti
Livro de Carlos Berriel sobre o ideário e a trajetória de Paulo Prado revela as digitais do baronato cafeicultor de SP na origem do modernismo CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br
O professor Carlos Berriel, autor de Tietê, Tejo, Sena: a obra de Paulo Prado: “O meu trabalho avalia o modernismo do ponto de vista da sua gênese enquanto consciência de classe social”
emana de Arte Moderna de 1922 foi, no plano ideológico, a iniciativa de uma “oligarquia racista, reacionária e ao mesmo tempo modernista”, para servir aos interesses de classe da elite cafeicultora e a um projeto de hegemonia paulista, que via o Brasil como uma colônia a ser explorada pela metrópole de Piratininga. Mesmo autores como Mário de Andrade foram próximos a esse projeto, cuja justificativa é construída no livro Retrato do Brasil, de Paulo Prado, cafeicultor, historiador e grande mecenas da Semana de 22. Isso é o que afirma o professor do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp Carlos Berriel, autor de Tietê, Tejo, Sena: a obra de Paulo Prado, livro sobre a trajetória e a obra de Prado. Publicado originalmente em 2000, o livro, nascido de uma tese de doutorado defendida em 1994, foi relançado neste ano, em edição revista e ampliada, pela Editora Unicamp. Em entrevista ao Jornal da Unicamp, Berriel falou não apenas sobre a trajetória intelectual de Paulo Prado e a influência de seu pensamento, mas também sobre a necessidade de se rever o lugar do modernismo paulista no cânone da literatura brasileira. A festa de lançamento do livro, em Campinas, acontece no próximo dia 15, no Empório do Nono, em Barão Geraldo, a partir de 18 horas. Abaixo, os principais trechos da entrevista, na qual o autor defende também a ideia de que o modernismo paulista sofreu influências inclusive da visão colonialista desenvolvida por intelectuais portugueses no fim do século 19. Jornal da Unicamp – O senso comum sobre a Semana de Arte Moderna de 22 diz que os artistas de vanguarda engabelaram a elite do café, fazendo os barões pagarem por um espetáculo que eles não entendiam e que, no fundo, os afrontava. Seu livro indica que não foi bem isso... No fim, quem estava usando quem? Os artistas usaram os cafeicultores, ou vice-versa? Carlos Berriel – Acho que o enfoque correto não é esse. O modernismo paulista é a estética da elite do café, é praticamente a sua visão de mundo. Não se trata de dois partidos que, com consciência limitada, andaram juntos durante um tempo. Isso não é verdade. A tese que defendo, nesse livro, é muito mais ampla: o meu trabalho avalia o modernismo do ponto de vista da sua gênese enquanto consciência de classe social, enquanto projeto político. É um estudo de consciência de classe. A classe de origem do modernismo paulista é a do baronato cafeicultor. JU – Mas tem a questão do Oswald de Andrade, que depois virou comunista... Berriel – Oswald de Andrade se separa do núcleo duro do modernismo, do grupo do café, de 28 para 29. Aliás, ele não se separou, ele foi expulso desse grupo porque, como editor da Revista de Antropofagia, permitiu que fosse publicado um artigo tratando, de forma muito desrespeitosa, o Retrato do Brasil, o livro de Paulo Prado que tinha acabado de sair. E Oswald tem uma origem de classe um pouco diferente. Embora o lado materno seja sim, da aristocracia do café, o pai era um empresário moderno, que foi quem instalou o sistema de bonde em São Paulo e quem urbanizou o que hoje são os Jardins. Mas mesmo sendo membro do Partido Comunista, Oswald manteve sua teoria da An-
tropofagia, que é modernista. Mas nós não podemos falar do modernismo como uma coisa unívoca – cada caso é um caso, cada obra existe em si mesma e tem sua razão própria. No fundo, cada autor e dada obra possuem um percurso diferente. E também é importante considerar que existe o modernismo paulista, e existem as letras modernas, que não são a mesma coisa. O modernismo é moderno, mas nem todos os modernos são modernistas. Há a tendência, de uma historiografia marcada pelo próprio modernismo, de trazer para as águas do modernismo autores e obras que não têm nada a ver com esse movimento, como por exemplo Graciliano Ramos, José Lins do Rêgo e outros. Então, existem as letras modernas em Minas, no Rio de Janeiro, no Nordeste, etc., e existe o modernismo paulista, que são coisas diferentes. Essa distinção é essencial, e sua ausência é muito danosa para a compreensão da época. JU – Em uma das notas de seu livro aparece José Lins do Rêgo, reclamando dos modernistas paulistas. Berriel – Ele dizia: nós do Nordeste não temos nada a ver com isso. E ele é super hostil ao movimento. Graciliano Ramos não chega a escrever sobre isso, mas pelo depoimento de pessoas que foram muito próximas a ele sabemos que a sua opinião de que o modernismo paulista era a pior possível. Acho que é fundamental tomar autor por autor e ler o que cada um escreveu, e não o que nós achamos que eles disseram. Meu livro busca manter a disciplina de ler exatamente o que o autor disse, exatamente o que ele está dizendo. Procurei evitar – e espero ter conseguido – acrescentar qualquer coisa minha, a favor ou contra. Procurei manter uma disciplina de objetividade diante do que o texto efetiva-
mente diz. Quis apenas colocar o discurso em pé: ele disse isso. Quais os pressupostos? São esses aqui, conforme está na obra. Foi uma coisa muito difícil, mas não se pode fugir dessa prática. JU – Algo que chama muito a atenção na obra de Paulo Prado é a questão do racismo, ou racialismo, que em certos pontos me fez lembrar das polêmicas recentes em torno da obra de Monteiro Lobato. Essa questão de raça era uma coisa muito forte na cultura paulista daquela época? Berriel – As teorias raciais eram uma coisa muito forte da época, e não apenas no Brasil. O final do Império, a libertação dos escravos, ainda era uma coisa recente... No Brasil temos a tradição de que classe social é raça, que vem do problema da escravidão. E é algo de que não se livra do dia para a noite. E já que estamos falando da elite rural, eles eram ex-escravocratas, e o fato de alguns serem abolicionistas não implicava necessariamente que não fossem racistas. Isso é uma coisa muito presente na cultura brasileira, e aquele foi um período no qual o Brasil ia buscar as suas teorias, os seus arcabouços teóricos, no exterior. Foi comum, nessa época, ir buscar as teorias raciais e trazê-las para cá – teorias que depois deram no que deram. Para sermos justos com esses autores, precisamos lembrar que nem Paulo Prado, nem Monteiro Lobato ou qualquer outra pessoa, sabia que daí viriam os campos de concentração, por exemplo. Eles não sabiam nem tinham como saber. Então, não podem ser responsabilizados por uma coisa que ainda viria a ocorrer. Porém, eles beberam da mesma fonte teórica do racismo “científico”, e isso precisa ser levado em consideração.
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Campinas, 5Campinas, a 11 de agosto de 2d 5 a 11
Da ficção historiográfica ao p vem de Antero de Quental, que vem de Oliveira Martins – este aliás é a grande referência dele, sob vários aspectos. Ao mesmo tempo em que Paulo Prado (Continuação da página 5) descobre Oliveira Martins, com quem ele convive em Paris na casa do tio, Eduardo Prado, acontece o chamado Ultimatum inglês, em JU – Qual o propósito de se trazer essas 1889. Na época, Angola e Moçambique forideias ao Brasil? mavam um território contínuo de possessão Berriel – Há um sentido muito prático: o portuguesa. Quando é descoberto ouro no que é que está em jogo no Brasil? Aqui se Transvaal, no meio do caminho entre Angola constituiu, desde a proclamação da Repúblie Moçambique, a Inglaterra ordena que Porca – principalmente na chamada República tugal se retire, e é obedecida: Portugal entreVelha –, a hegemonia de um setor econômiga o território. co sobre o conjunto do país. Ou seja, a oligarquia do café, que monopolizava o Estado Aquilo foi uma crise tremenda em Portuatravés da política do café-com-leite, transgal, e foi, por coincidência, o momento em formou o Brasil em um sistema caudatário de que Paulo Prado chegava a Paris para morar São Paulo, através do chamado Convênio de com o tio na casa frequentada por Oliveira Taubaté, de 1906, que instituiu no país um Martins, pelo Eça de Queirós e muitos ousistema semicolonial, em que São Paulo age tros. No mesmo mês, acontecem várias coicomo metrópole e o resto do Brasil submetesas: a queda do império no Brasil, o rei de se como colônia. Portugal morre, vem o Ultimatum, Paulo PraO sistema funcionava da seguinte forma: do está chegando a Paris e há a coroação do São Paulo poderia produzir quanto café quinovo rei de Portugal, que assume um país sesse, pois o Estado brasileiro compraria, desmoralizado. O novo rei, íntimo da Geraatravés de um empréstimo internacional a ção de 70, chama Oliveira Martins para reser pago com as finanças de toda a nação. organizar as colônias, a política colonial. E Na prática significa que todos os Estados é esse historiador e essa preocupação que compravam o café paulista – e não o rececaptam o interesse de Paulo Prado: uma tebiam – cotado em libras esterlinas. Mais taroria sobre colônias. O modernismo paulista de ele poderia ser exportado ou não. Poderia começa a nascer a partir de uma teoria do reser queimado ou jogado no mar, tanto fazia. ordenamento das colônias de Portugal. Na lógica econômica, trata-se de um sistema colonial interno, com um sangramento da JU – E a ideia da raça heroica portuguesa, economia de todos os Estados brasileiros, com as duas mestiçagens no Brasil? que repassam seus recurBerriel – Paulo Prado sos para a oligarquia do observa que São Paulo é café – que em decorrência o único local que não foi enriqueceu extraordinariafundado no litoral, mas no mente, e se imaginou uma planalto, “protegido” do locomotiva puxando 20 vacontato exterior pela Serra gões vazios. Esse sistema do Mar. E quem funda São durou um terço de século, Paulo são os portugueses e quando acabou por dede antes de 1580, a dita creto de Vargas, em 1932, raça heroica. Daí por dianSão Paulo promoveu uma te São Paulo fica inacessível guerra civil pelo retorno de aos portugueses da decaseus privilégios. O moderdência pós 1580. Ao resto nismo, a Semana de 22, é a do Brasil, sem a barreira da manifestação, no plano artístico, da mentalidade do Serra do Mar, os portugueConvênio de Taubaté – e ses apodrecidos chegaram mesmo Oswald denunciou também. E acabam sendo isso. A política do café e maioria. Então, no Brasil o movimento modernista forma-se um amálgama veem São Paulo como uma racial com o elemento apoentidade capaz de sintetidrecido do português pósPrograma de jantar em homenagem a zar o país como um todo, 1580, com a depravação do Paulo Prado, na Villa Fortunata, de dar ao Brasil uma lógica escravo negro e a lascívia do São Paulo, em abril de 1927 histórica que lhe falta e um índio. Isso então gera o braprojeto realista. sileiro, que não serve para JU – Mas parece que, em vez de ser uma nada. É um horror. E é o que explica, na teoria síntese, São Paulo se define em oposição ao dele, por que o Brasil é a calamidade que é. país como um todo. São Paulo, ao contrário, vai ser o resultaBerriel – É o que está na obra de Paulo Prado de outra mescla racial, em que não comdo. Toda essa absurda ficção historiográfica, parece o negro. E o índio, em São Paulo, que não tem pé nem cabeça, que instala os inexplicavelmente não é lascivo. O índio que bandeirantes como construtores do Brasil, por se mistura ao português heroico, gerando o exemplo, faz parte de um discurso que preside paulista, é alguém que tem o perfeito domío ano de 1922. Isso está na lógica fundante do nio da natureza e do território. PossibilitanMuseu do Ipiranga, também de 1922. Paulo do, portanto, o surgimento do bandeirante, Prado é o maior produtor e exportador de café que é o português que mantém o espírito das do mundo, e ao mesmo tempo a consciência navegações (agora terrestres ou fluviais), e mais lúcida e ousada da oligarquia. E ele é o que ao mesmo tempo tem o domínio do amgrande organizador da Semana de Arte Mobiente natural, trazido pelo índio. derna, e sabemos disso pelo depoimento do
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CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br
Oswald, do Mário, de Menotti del Picchia, da Tarsila do Amaral: ele é o cara. JU – E qual a teoria dele sobre São Paulo e o Brasil? Berriel – É uma teoria de que existiriam no Brasil duas mestiçagens distintas. Ele elimina a ideia de raça pura, o que não existe mesmo, ele não cai nessa. Então, no Brasil existiriam duas mestiçagens, ligadas à história de Portugal. Aliás, quando se diz que o modernismo foi uma ruptura com a herança portuguesa, na verdade é o oposto: acho que nada, na cultura brasileira, foi mais ligado a Portugal do que o modernismo. JU – Qual é essa influência portuguesa? Berriel – Há uma teoria, que vem da chamada Geração de 70 – o grupo do historiador Oliveira Martins, de Eça de Queirós, de Ramalho Ortigão – de que Portugal contou com uma raça heroica que promoveu as navegações, os descobrimentos, e essa raça heroica vai até 1580, que é quando Portugal cai sob o domínio espanhol. Queda da qual não se recuperará jamais, e a partir dela a raça portuguesa entra em decomposição, em decadência. Então é uma teoria também de base racial, segundo a qual há uma raça portuguesa que degenera, de modo que o português depois de 1580 é um decadente, degenerado e inútil. Paulo Prado absorve essa teoria, que
Paulo Prado (centro) ladeado por intelectuais da Semana de Arte Moderna
Essa construção, bastante – digamos – poética e livre de Paulo Prado, serve como diagnóstico que é lido com respeito por muita gente, lido como verdade. Paulo Prado chega a dizer que o paulista já é uma raça. Então, temos no Brasil uma raça superior e uma raça inferior. E o Estado brasileiro deveria seguir essa lógica. Esse paulista é o único capaz de produzir uma arte autêntica – a modernista –, enquanto o brasileiro rasteja no romantismo, no parnasianismo, etc. JU – Essa ideia de excepcionalismo paulista é algo que se vê ainda hoje, não? É uma ideia que nasce com Paulo Prado, ou ele foi apenas um vetor? Berriel – Essa ilusão, essa ideologia, vinha sendo constituída em simultaneidade com o crescimento da importância do café na economia brasileira. Paulo Prado transforma essas ideias num movimento artístico, com a Semana de 22. Quando o café se torna importante, o Brasil já é um sistema político organizado na Corte, no Rio de Janeiro. São Paulo tem uma luta contínua – política, econômica e cultural – para romper com a síntese cultural e política consubstanciada no Rio de Janeiro. O modernismo é, digamos assim, um sistema cultural em formação que se dispõe contra o sistema cultural dominante até então. Consubstanciado no Rio de Janeiro, na Academia Brasileira de Letras, na Corte, na capital do Império e da República. O modernismo, quando desautoriza esse sistema, joga no ridículo toda a literatura anterior. Na verdade o que temos é uma disputa de hegemonias. O modernismo luta pela transferência da hegemonia política, cultural e econômica do Rio para São Paulo. É um movimento indissociável da política, portanto, e a desautorização das formas estéticas e literárias dominantes é a outra face da desautorização do sistema político brasileiro, em que todas as províncias possuíam direitos equivalentes.
Dizer que a poesia de Olavo Bilac ou de Coelho Neto não tem qualidade é uma estupidez, como Mário reconhecerá mais tarde. Eliminar, ridicularizar o simbolismo, ou o parnasianismo, como eles fizeram, na verdade é um momento da disputa pela hegemonia política. A ação iconoclasta dos modernistas buscava cortar os vínculos nacionais com a sua própria tradição, já acumulada. O Brasil não deveria mais se reconhecer pela tradição cultural já constituída, mas seria necessário refundar o país a partir da experiência exclusivamente paulista. Este é o sentido mais profundo da Semana. JU – Retrato do Brasil faz um diagnóstico dos problemas brasileiros que parece muito atual: corrupção, incompetência, ineficiência... Paulo Prado acertou o problema, mas errou a causa?
Bilhete autografado de Eça de Queiroz para Eduardo Prado: intelectuais portugueses influenciaram cafeicultores
À esq., Barão de Iguape, fundador do clã Prado e bisavô de Paulo Prado; acima, o clã em torno da matriarca, Viridiana Prado. O primeiro à esq. é o conselheiro Antonio Prado. Eduardo Prado é o último à direita, em cima
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2013 de agosto de 2013
paulista como ‘raça superior’ Berriel – Parece que esse livro, de repente, ficou muito atual. Esse rol de queixas, muito justas aliás, você vai encontrar em todos os lugares e em todas as épocas, e não só no Brasil. A questão é: se o projeto político modernista tivesse sido vitorioso, os problemas seriam resolvidos? Esse projeto, segundo o que sugere o Retrato do Brasil, passaria pelo fim da igualdade jurídica entre os Estados, e mesmo entre os cidadãos. Um Estado baseado no privilégio racial é eficiente e competente? Seria a solução para os problemas elencados? Aventou-se o controle da movimentação dos indivíduos, sendo cogitado inclusive o uso de passaportes internos. Os nordestinos não poderiam vir para São Paulo livremente, por exemplo. Isso, no fundo, é o apartheid como o que se implantou na África do Sul. E no fundo, isso não é o sonho inconfessado da direita brasileira? Mas o apartheid resolveu algum problema de corrupção no mundo? O Convênio de Taubaté não seria a mãe de todas as corrupções brasileiras? JU – Essas questões parecem fazer parte de uma pauta conservadora... Berriel – Toda vez que a direita paulista se sente um pouco acuada, bate sempre na mesma tecla: a revolução de 32. O que foi a revolução de 32? Havia o Convênio de Taubaté. O país faliu por causa do crack da bolsa de Nova York em 29. São Paulo continua a cobrar este Convênio, sendo que o Brasil produzia café que não tinha mais consumidor. Mesmo com o sistema internacional falido, a oligarquia cafeicultora quer que o Estado brasileiro mantenha a compra do café, com ou sem comprador internacional. Getúlio anuncia que em 32 não vai mais manter o acordo e dissolve o Convênio de Taubaté. E aí a oligarquia de São Paulo se levanta pelo respeito “à Constituição”. Que Constituição? Agora, tem todo o discurso ideológico: São Paulo se levanta contra a ditadura de Vargas. Mário de Andrade, Paulo Prado e Alcântara Machado fundam a Revista Nova, que incita à luta armada contra Vargas. Por quê? Porque de repente “os paulistas”, isto é, os barões do café, se tomaram de amores pela Constituição? Não. Foi pelo Convênio de Taubaté. Estava esfacelado o projeto de São Paulo metrópole de um Brasil colônia. O país estava se desmantelando por causa de uma oligarquia racista, reacionária e – não há como negar - modernista. JU – Mesmo levando em conta as particularidades de cada autor, pode-se dizer que, de modo geral, o modernismo paulista abraça essa visão de São Paulo grande, bandeirante, condutora da nação? Berriel – Sim. Mário de Andrade mesmo escreve uma carta a Manuel Bandeira em 1932 onde diz: “eu não sou mais brasileiro, sou paulista”. Mas, em 1942, Mário fez uma grande autocrítica e denuncia os salões da aristocracia como corruptora do movimento. Muito corajoso e lúcido. JU – Mas isso é curioso, porque a esquerda brasileira abraçou os modernistas. Ou não? Berriel – Em grande parte, sim. Isso mostra que a esquerda precisa construir sua própria interpretação do Brasil, e não aceitar uma interpretação do país que vem do núcleo da reação. Esse é um dos problemas da esquerda brasileira: ela precisa interpretar o Brasil não só no plano econômico, ou através da história dos partidos políticos, mas precisa entrar na representação simbólica da identidade nacional. A esquerda brasileira raramente considera relevante a vida literária e artística, e acaba, por decorrência, endossando concepções da direita que nasceram na literatura e nas artes. O importante não é tanto ler os comentadores – como eu mesmo –, mas ler os próprios autores. Foi o que procurei fazer aqui: estudei o modernismo sem considerar os intérpretes do modernismo, mesmo tendo-os lido. Para que pudesse chegar ao texto. Porque senão eu seria atravancado por essa coisa que o modernismo virou no beabá das escolas, aquelas frases, como “a Semana de Arte Moderna ocorre no ano em que se fundou o Partido Comunista no Brasil”. É verdade. E não tem nada a ver uma coisa com a outra. Eu poderia dizer, da mesma forma, que a Semana de Arte Moderna ocorreu no mesmo mês em que Mussolini tomou o poder na Itália. É verdade? É. Você tira o que quiser daí, inclusive significados vazios. E perde o país. JU – E as consequências reais do modernismo paulista para a literatura brasileira: foi tudo isso mesmo que se vende? Ou o pessoal que estava começando a escrever no Nordeste teria feito a mesma coisa sem a Semana? Berriel – Não teria feito a menor diferença. Para os escritores do Nordeste não faria
a menor diferença ter ou não ter existido a Semana. Por outro lado, por exemplo, Carlos Drummond de Andrade: mineiro, vem de outra tradição, ele foi sim influenciado pelo Mário de Andrade. Manuel Bandeira, não, Manuel Bandeira já estava pronto. Na Semana de Arte Moderna ele já era um poeta consagrado, toda a herança dele vem do simbolismo, de outros autores. Mas há alguma influência, sim, principalmente do Mário de Andrade, que é um grande escritor, um dos maiores do Brasil. Quando a gente vai direto aos autores, aos textos, não a interpretações prévias, mas deixa o autor falar, podemos chegar a coisas surpreendentes. Acho que esse é um programa extremamente interessante, que pode reabrir o cânone literário brasileiro. Reabrir, estudar de novo essas coisas, porque não está funcionando mais a ideia da centralidade da Semana de 22. Há muito tempo não está funcionando mais. JU – A ideia de que a literatura brasileira estava engessada em beletrismo vazio e aí os modernistas chegaram chutando a porta é um mito? Berriel – Isso é um mito. E Lima Barreto, e Euclides da Cunha? É muito fácil ridicularizar um escritor, assim como é fácil improvisar um poeta futurista: junta-se um pouco de aeroplano, um torpedo, acrescenta-se uma xícara de onomatopeia de máquina, vruum, zazzz... e você tem um poeta futurista, quentinho. Mas esse é um procedimento ilegítimo, pois desse modo não se quer compreender um problema literário, mas descartá-lo, simplesmente. Agora, tome a poesia de verdade, a literatura que existia na época: não é de se jogar fora, não. Por causa, inclusive, desse domínio do modernismo, muita obra interessante, escritores interessantes, caíram no esquecimento. Eu cito, por exemplo, o Visconde de Taunay, um escritor lidíssimo no Brasil, com uma obra muito interessante, que publicou quase 30 livros, dos quais hoje só são conhecidos dois ou três. E os livros dele não são republicados desde 22. Ele tem um romance que foi um grande best-seller – o que não diz muita coisa, mas diz alguma coisa – chamado Ouro Sobre Azul, que foi o livro mais vendido no fim do século 19. E é um livro de qualidade. E o último romance dele, No Declínio, é um romance de inspiração simbolista extremamente interessante. O modernismo criou uma espécie de buraco negro que escondeu boa parte da literatura brasileira, e que precisa ser redescoberta. JU – Ligando um pouco o livro com sua área de pesquisa atual, a questão das utopias. Paulo Prado tinha a visão de uma utopia paulista? Berriel – O Paulo Prado é muito pouco “poético”, ele é muito duro. O livro dele é um ensaio sobre a tristeza brasileira. Você tem ali uma visão racista, uma visão de degradação radical do brasileiro. Ele se utiliza, para construir a sua ideia do Brasil, dos inquéritos da inquisição. Confissões extraídas na tortura, esse é o material que ele usa para dizer o que é o Brasil. Pode ser, talvez, uma distopia. É um mundo muito feio, o que ele monta. JU – Mas as ideias dele ainda são influentes. Berriel – Sim, e volta e meia ressurgem. Em 1964 foi assim. Você tem agora essas manifestações na Avenida Paulista, aqueles grupos mais de direita tiram do baú algumas bandeiras que foram do modernismo, impregnadas de naftalina, e as usam para combater um governo, como o da Dilma, que se assemelha muito ao de Vargas: nacionalismo econômico, ampliação do mercado interno através da distribuição de renda, empresas estatais, Estado forte. E aí você tem manifestações que tiram do baú da oligarquia as ditas velhas tradições paulistas. Mas é preciso distinguir a ideologia da oligarquia do café dos reais interesses do homem comum de São Paulo. JU – Isso é o modernismo? Berriel – Isso é o modernismo paulista de Paulo Prado. Cada autor deverá ser estudado em si mesmo, e as similitudes e diferenças com o pensamento de Paulo Prado naturalmente aparecerão. Só temos a ganhar com isso.
Fotos: Divulgação
O Colosso de Rhodes, charge sobre o Ultimato inglês: cenário geopolítico conturbado
Na Villa Fortunata: Mário de Andrade (primeiro à esq., no alto) e outros modernistas em 1922
Serviço Título: Tietê, Tejo, Sena: a obra de Paulo Prado Autor: Carlos Berriel Editora: Unicamp Páginas: 312 Preço: R$ 46,00
No alto, Paulo Prado com Blaise Cendars e Marinette Prado no Rio, em 1926; em sua casa (foto do centro); e, acima, com Otávio Tarquínio de Sousa, José Lins do Rego (à dir.), José Américo de Almeida e Gilberto Freyre (à esq.)
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Campinas, 5 a 11 de agosto de 2013 MARIA ALICE DA CRUZ halice@unicamp.br
obra do artista plástico Bernardo Caro ainda circula pelo Brasil, e a responsável por isso é Sandra Caro Flório, uma de suas filhas. Desde a morte do artista, em 2007, ela recebe convites para expor as obras de seu mestre. Sim, mestre, porque de tanto dar cor ao tecido branco das telas que encontrava pela casa, Sandra tornou-se aluna do pai, no final da década de 1970, no curso de graduação em artes plásticas da PUC-Campinas. O melhor dos mestres, porém, continha-se em dar nota 10 em suas avaliações, conforme brinca Sandra. Pai, pai, aluna, aluna. Era assim que funcionava com Bernardo no espaço de aula. Em casa, Sandra fazia questão de acompanhar seus passos de perto, daí ter se tornado, naturalmente, a curadora de suas exposições. Emociona-se a cada convite, pois assumiu o compromisso de nunca deixar morrer a memória de Bernardo Caro, que, em Campinas, participou da criação de dois cursos de artes, o da PUC e o da Unicamp. Além de ser um dos representantes do movimento dos anos 60 Vanguarda, vale lembrar. “É uma honra ser curadora e um orgulho ver a procura pelas obras de meu pai.” O primeiro convite foi feito em 2008, quando a Galeria B do Centro de Convivência Cultural foi reinaugurada com o nome de Galeria Bernardo Caro. Os cuidados de Sandra nos preparativos para a mostra, além da emoção ao comentar algumas das telas durante a montagem, ficaram gravados na memória de quem esteve com ela algumas horas antes do evento. Além do mais, não se esquece da dedicação de seu filho, Adriano Caro Florio, na época com 11 anos, participando da produção dos convites e também da montagem. Desde então, Sandra experimenta na pele e na alma a missão “árdua” e ao mesmo tempo prazerosa de um curador. “Foi nesse momento que começou a aflorar em mim a vontade de voltar para a arte.” Logo em seguida, surgiu convite para outra retrospectiva do trabalho do pai no Colégio Sagrado Coração de Jesus. E hoje a agenda já virou de 2013 para 2014. Sandra lida com uma quantidade enorme de telas, grandes e pequenas, devidamente acondicionadas em dois ateliês, um deles nas dependências da casa de Terezinha Dora Gagliardi Caro, viúva do mestre e mãe da aluna. A proposta da artista é reunir todas as obras em um mesmo ambiente. Cada mostra exige um conjunto diferente de obras, como, por exemplo, a destinada à Comunidade Espanhola de São Paulo, que busca telas que retratem a união entre a tradição da pintura espanhola e a temática brasileira. Filho de imigrantes andaluzes, da cidade Villanueva del Trabuco, Caro retratou bem esta temática.
De aluna-artista
a curadora Sandra Caro Flório é responsável pelo acervo das obras do pai, Bernardo Caro, que também foi seu professor A cada exposição, Sandra também cumpre o desejo de catalogar todas as obras de Caro. “Agora posso dizer que estou conseguindo catalogar o acervo de meu pai. Para ter ideia, ele tinha quadro isolado na DGA (Diretoria Geral de Administração da Unicamp). Até que comentei com uma pessoa de lá que o quadro era dele e ela decidiu me devolver.”
ESPAÇO DE ARTE
Na Unicamp também delicia-se desse reencontro com a arte, proporcionado pelo pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários da Unicamp, João Frederico da Costa Azevedo Meyer, quando este assumiu a direção da Coordenadoria de Desenvolvimento Cultural (CDC) da Unicamp. “Ele disse que precisava de um funcionário em artes plásticas para assumir a curadoria do Espaço das Artes, mas eu relutava. Até que decidi aceitar e hoje me realizo porque o encontro com os artistas é indescritível para quem cresceu nesse meio”, declara. Sandra cursou ensino fundamental e médio no Colégio Ave Maria. Iniciou sua carreira profissional como professora de artes na escola de educação infantil Jardim Encantado das Artes, mantida pela PUC-Campinas. Período no qual se realizou profissionalmente até se tornar especialista da Acrilex e começar a dar aulas de pintura no Palácio das Lonas, loja do pai e de seu tio. Lá, atuou por cinco anos. Apesar das saudades declaradas da época de sala de aula, um dos momentos mais importantes de sua vida profissional corresponde ao período de 1988 a 2013. Em 1988, o maestro Benito Juarez, na época regente da Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas e professor do curso de música da Unicamp, convidou-a para o Nidic da Unicamp, hoje Ciddic, onde assumiu a produção de material de divulgação das atividades artístico-culturais da Universidade por meio da criação de panfletos e cartazes. Mais uma vez, viria atuar perto de seu maior ídolo, Bernardo Caro. Mas assim como na PUC, pelo fato de o Nidic estar, na época, instalado no mesmo prédio do Instituto de Artes, o acordo se repetiu: pai, pai, funcionária, funcionária.
A conduta de Bernardo teve efeito positivo na trajetória de Sandra na Unicamp, pois hoje se orgulha de ter conquistado muitos amigos do meio artístico e de outras áreas por ser simplesmente a Sandra, companheira de trabalho, amiga para momentos bons e ruins. Até hoje, algumas pessoas, segundo ela, se espantam ao saber que é filha de Bernardo. “Hoje, quando essas pessoas me reencontram e me abraçam, sei que fui eu mesma”. Por muito tempo, Sandra foi a divulgadora do Núcleo de Integração e Difusão Cultural (Nidic), atual Ciddic, mas em momento de crise no quadro de funcionários, Juarez pediu socorro na área administrativa. Chamado ao qual Sandra não hesitou em atender. Acabou descobrindo que, além de artista, era uma competente administradora. Mas a amizade com os músicos da orquestra sempre foi mantida, tanto na gestão de Benito quanto na de Paulo Justi, falecido em 2010. Embora no quadro de servidores administrativos, Sandra sempre TENHA trabalhado com artistas. Após dez anos no Nidic, foi atuar na Coordenadoria de Desenvolvimento Cultural (CDC) com o professor do Departamento de Artes Plásticas Carlos Fernandes. A missão se ampliou na gestão da professora Maria Irma Hadler Coudry (Maza), em que foi convidada a ajudar na coordenação como assistente técnica de direção. A curadoria é uma forma de Sandra aconchegar-se à arte, mas sempre tem vontade de pintar nem que seja para si, então se realiza colorindo telas brancas, como nos velhos tempos. Hoje em dia, assume o sobrenome Caro e muitos perguntam por que não revelava isso. Talvez pela cobrança aplicada às pessoas que seguem a mesma carreira do pai ou da mãe. “Quem sabia achava que eu tinha de pintar igual, e a cobrança me deixava desesperada. Talvez por isso eu tenha migrado para a área administrativa. Mas sempre vem vontade de pintar. Aí me realizo”, declara. Uma resposta prazerosa recebida com a curadoria do Espaço de Arte da CDC é a receptividade positiva da comunidade universitária e externa à arte. Prova disso é a demanda de unidades para receberem exposições itinerantes. Ela acentua que no início, a CDC sondou algumas unidades, que aceitaram
prontamente, mas muitas delas procuram a coordenadoria para também recebê-las. “É uma realização ver as artes plásticas tomando seu lugar na Universidade.” Com essa iniciativa, espaço de eventos como o da Agência de Formação Profissional da Unicamp (AFPU), localizado na Diretoria Geral de Administração (DGA), está sempre decorado. Assim como o Centro de Saúde da Comunidade (Cecom), a Faculdade de Ciências Aplicadas e a Escola de Extensão (Extecamp). As crianças também passam a fazer parte desse movimento, pois há a proposta de alguns artistas desenvolverem atividades no espaço de educação infantil da Unicamp. Além disso, elas também visitarão o espaço de arte. A ideia, segundo Sandra, é ampliar para outras escolas. O projeto itinerante, segundo Sandra, pode ultrapassar os alambrados, pois há propostas de órgãos oficiais de Campinas. “Temos de ter uma seleção, pois o espaço da CDC é limitado”. O sonho é envolver mais pessoas, como artistas escondidos, funcionários artistas e fotógrafos. Sandra faz questão de ressaltar a participação importante da equipe do CDC, principalmente o colega no Espaço de Arte Fábio Cerqueira. Também destaca a iniciativa da coordenadora da CDC, Margareth do Carmo Vieira Junqueira, que torna possível todas essas realizações. Também menciona a colaboração de Davi William Amâncio no Projeto Moldura Musical, com apoio do Grupo Gestor de Benefícios Sociais (GGBS), em que músicos da Universidade fizeram apresentações durante as exposições na CDC. O coração de pai e de artista orientou Bernardo a deixar pronto o material necessário para fazer dele e de sua obra algo memorável. Um roteiro esboçado por ele e deixado na cabeceira da cama deve nortear a elaboração e produção de um livro sobre as obras que foram doadas por ele. No papel, o nome da obra e o nome do presenteado. O compromisso com tantos projetos precisa da compreensão de toda a família. “Eles colaboram, pois sabem que assim estou realizada. Não quero deixar esquecido o nome de alguém que tanto contribuiu para a cultura brasileira.” Foto: Antonio Scarpinetti
A artista plástica e funcionária da Unicamp Sandra Caro Flório, diante da exposição Balé Tiádico, de alunos do IA, na CDC: “O encontro com os artistas é indescritível para quem cresceu nesse meio”
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Campinas, 5 a 11 de agosto de 2013
Imagens avaliam comportamento
pró-social de jovens com autismo
Foto: Antoninho Perri
Estudo, inédito no país, analisa alterações anatômicas e funcionais em pacientes LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br
efeito da ativação cerebral no autismo, quando o paciente está sendo observado ou não, é o foco da pesquisa de pósdoutorado que a neuropediatra Alessandra Pereira está desenvolvendo junto à Faculdade de Ciências Médicas (FCM), sob a orientação do professor Fernando Cendes. Segundo a autora, estudos comportamentais anteriores indicam que a “reputação social” está prejudicada no autismo e que esses indivíduos não são influenciados pela presença de um observador. Eles falham na capacidade de levar em consideração o que os outros pensam deles e fornecem dados adicionais para um sistema neural especializado, mediando os efeitos da reputação social e empatia. “Este é o primeiro projeto brasileiro em neuroimagem, buscando uma correlação com iniciativas semelhantes na Europa, Estados Unidos e Canadá. O objetivo é avaliar o comportamento pró-social de adolescentes e adultos jovens com síndrome de Asperger (autismo de alto funcionamento)”, informa Alessandra Pereira. “Estamos realizando estudos de ressonância magnética estrutural e funcional no Laboratório de Neuroimagem do Hospital de Clínicas. Este procedimento permite avaliar as alterações anatômicas e funcionais em pacientes com Asperger, em comparação com um grupo controle, seguindo um paradigma de comportamento pró-social.” Com mestrado em pediatria e doutorado em medicina pela PUC do Rio Grande do Sul, e trabalhando na interface entre epilepsia e autismo, a pesquisadora está há um ano e meio em Campinas e já conta com uma rede oferecida pelos professores Fernando Cendes e Paulo Dalgalarrondo, pelo psicólogo Luiz Fernando Pegoraro e pelo físico Brunno Campose, da Unicamp; e por Jean-Claude Dreher, do Instituto de Ciências Cognitivas de Lyon (França). “Montamos esta rede porque no Brasil, infelizmente, não existe um centro de pesquisa completamente voltado ao autismo, embora alguns grupos já caminhem nessa direção”. Alessandra Pereira explica que o autismo é um transtorno invasivo do desenvolvimento, com um quadro composto basicamente de uma tríade: deficits qualitativos na interação social e na comunicação verbal e não verbal; padrões de comportamento repetitivo e estereotipado; e repertório restrito de interesses e atividades. “Nas últimas décadas, o autismo tem sido o mais estudado dos transtornos neuropsiquiátricos, em função de um aumento logarítmico da incidência e do impacto que provoca no meio familiar e social. Hoje, o índice é de 1 para 80 nascidos.” De acordo com a neuropediatra, ainda não se sabe exatamente a causa deste aumento, que pode ser genética ou devida a mudanças no estilo de vida e uso de medicações. “Devemos considerar ainda o surgimento de outros critérios diagnósticos, com novas ferramentas que levaram à melhor descrição e compreensão do transtorno – e a neuroimagem foi uma delas. Esta melhor compreensão gerou uma modificação no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), da Associação Americana de Psiquiatria: autismo e síndrome de Asperger, antes tidos como quadros separados, agora ficam dentro do quadro maior do transtorno do espectro autista.” A pessoa com síndrome de Asperger, de acordo com Alessandra Pereira, apresenta as mesmas características de trans-
A neuropediatra Alessandra Pereira, autora do estudo: “O autismo tem sido o mais estudado dos transtornos neuropsiquiátricos”
torno do espectro autista, como isolamento social e comportamento estereotipado ou repetitivo. “A diferença é que ele não sofre do deficit cognitivo que atinge 70% dos indivíduos com autismo clássico; ao contrário, possui inteligência normal ou acima da média. Por outro lado, esse indivíduo apresenta seus rituais e isolamento social. A dificuldade de interagir com o meio faz com que não entenda o sarcasmo, as piadas e outras sutilezas; as coisas precisam ser preto no branco e é muito importante que tenha uma rotina.”
NEUROIMAGEM A autora do estudo lembra que a neuroimagem estrutural já havia fornecido algumas pistas específicas sobre o autismo, principalmente no sistema límbico, relacionadas ao volume cerebral. “Surgiram evidências de que essas crianças possuem um perímetro cefálico maior do que as outras da mesma idade, desproporcional para o peso e altura. E que esse aumento significativo de volume ocorre entre 2 e 4 anos de idade, exatamente o período em que os sintomas do transtorno se tornam mais evidentes. Entretanto, tal aumento não persiste ao longo do desenvolvimento da criança, resultando em um volume normal na vida adulta.” A hipótese, diz Alessandra, é de que existe um momento durante o desenvolvimento da criança em que algo acontece e provoca esse desequilíbrio. “Além do aumento em si, provavelmente temos também uma alteração de função em termos de conectividade. A partir daí surgiram todos os estudos que chamamos de funcionais, incluindo o PET (tomografia por emissão de pósitrons), o Spect (tomografia computadorizada por emissão de fóton único) e a ressonância funcional.” No Laboratório de Neuroimagem do HC, os voluntários passam primeiramente por uma avaliação neuropsicológica, para medição do QI; depois por uma entrevista diagnóstica de autismo (ADI, na sigla em inglês), com o recurso de uma escala padronizada mundialmente; e então pela ressonância funcional. “É essencial que o paciente seja colaborativo. A maioria dos estudos com ressonância funcional é feita através de
tarefas de reconhecimento de face (um marcador para autismo), do contato visual (o olhar apenas na periferia do rosto e não diretamente nos olhos) e do registro de emoções frente a fotografias de celebridades e de pessoas do próprio convívio.”
A
TAREFA
A pesquisadora soma ainda os estudos funcionais em repouso, em que o paciente é solicitado a deitar na máquina de ressonância, fechar os olhos e procurar não pensar em nada por alguns minutos. “Provavelmente, seu cérebro vai entrar num estado basal, mas algo estará acontecendo: pesquisas já mostraram que a rede em repouso do autista funciona de forma diferente. Estamos realizando tanto a avaliação em repouso como a funcional, a partir de uma tarefa desenvolvida em parceria com o professor Jean-Claude Dreher, de Lyon, onde passei todo o mês de maio último. Este grupo francês estuda a tomada de decisões e sistemas de recompensa no cérebro.” A tarefa, explica Alessandra Pereira, consiste em apresentar ao indivíduo deitado na máquina duas instituições às quais doar dinheiro: uma de caráter altamente positivo, como por exemplo, a AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente), e outra de caráter negativo, mas que oferece a chance de lucro com as doações. “Os pacientes precisam entender que existe esta valência positiva e negativa e, durante a tarefa, devem optar por doar dinheiro às instituições. Há situações em que vão doar e perder dinheiro, e outras em que vão lucrar. Temos, portanto, questões de julgamento moral, de tomada de decisão e de reputação.” A neuropediatra afirma que estudos de tomadas de decisão e recompensa anteriores mostram que as pessoas “normais” tendem a ser mais generosas quando estão sendo observadas, pois se preocupam com o que os outros vão pensar. “A reputação social, para essas pessoas, é um elemento motivador. Já os indivíduos que estão dentro do espectro autista falham nesse sentido. Uma das explicações para o autismo é a chamada falha na teoria da mente: a incapacidade deste indivíduo de levar em consideração o que os outros pensam ou vão pensar sobre ele.”
CIRCUITO
NEURONAL
A questão, conforme salienta a autora do trabalho, é que não se sabe qual circuito neuronal está envolvido nesta situação, havendo a hipótese de que a reação do autista tenha a ver com a região temporal e suas conexões com as demais regiões do cérebro. “É exatamente isso o que pretendemos avaliar: o comportamento prósocial desses indivíduos com autismo e o circuito neuronal utilizado por aqueles que apresentam melhor capacidade de interação social, visto que há níveis diferentes dentro do próprio espectro. Em termos de imagens, já temos dados expressivos, apontando uma diferença significativa entre o grupo controle e o grupo com autismo em termos de áreas ativadas durante as tarefas, principalmente na situação público versus privado.” A pesquisadora lembra que a ideia inicial era formar um grupo de 20 pessoas com síndrome de Asperger e um grupo controle com 20 indivíduos, mas até o momento foram consolidados dois grupos de 11 indivíduos cada. “Apesar do interesse de muitos pais em participar do projeto, surgem obstáculos como a dificuldade de deslocamento até Campinas e outros relacionados ao próprio exame, que é realmente cansativo, com quatro rodadas de 64 perguntas, além de exigir pouca movimentação do paciente dentro da máquina. Isso faz com que vários candidatos sejam excluídos.” Na opinião de Alessandra Pereira, sua pesquisa pode trazer uma melhor compreensão não só do transtorno, mas também da circuitaria utilizada pelas pessoas com autismo, visando inclusive à aplicação e ao desenvolvimento de terapias realmente sensoriais, voltadas diretamente a esses mecanismos – e, ainda que não necessariamente, também a tratamentos medicamentosos mais específicos. “A intenção é que nos próximos meses possamos completar os grupos e começar a divulgar resultados em congressos e publicar artigos. Acho que o estudo pode nos ajudar a lidar com a realidade dos brasileiros com autismo, que é bem diferente da vivida por americanos, europeus ou japoneses.”
10 Vida Painel da semana Teses da semana Livro da semana Destaques do Portal da Unicamp
Campinas, 5 a 11 de agosto de 2013
aa c dêi m ca
Painel da semana Encontro de alunos PAD/PED - O VIII Encontro de Alunos PAD/PED ocorre no dia 5 de agosto, das 14 às 17 horas, no Centro de Convenções da Unicamp. A meta é preparar os alunos de graduação e de pós-graduação para o exercício de atividades no segundo semestre de 2013. O evento é organizado pelas Pró-reitorias de Graduação (PRG), de Pós-Graduação (PRPG) e pelo Espaço de Apoio ao Ensino e Aprendizagem (EA)². Mais detalhes no site http://ea2teste.basico.unicamp.br/ea2/index.php?option=com_icagenda&view=list&layout=even t&id=28&Itemid=117 ou e-mail ea2@reitoria.unicamp.br Sipat IQ - Entre 5 e 9 de agosto, a Comissão de Segurança e Ética Ambiental, a Cipa Setorial e a Empresa Júnior AllQuímica Consultoria Jr oferecem 2ª Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho do Instituto de Química (IQ). As palestras serão realizadas das 8 às 11 e das 14h20 às 16h30, no auditório do IQ. Mais informações no link http://iisipatiqmunicamp.wix.com/sipat ou telefone 19-3521-3121. Fotos do Espelho - A cantora, regente e poetisa Ana Salvagni, ganhadora da categoria Música Regional do Prêmio Brasil Instrumental 2010, lança Fotos do Espelho, seu segundo livro de poemas, no Almanaque Café, dia 5 de agosto, a partir das 19 horas. “Fotos do Espelho tem uma estreita relação com a época em que eu estava para completar 40 anos - um pouco antes e um pouco depois - e resolvi parar um pouco para olhar para mim”, declara a autora, formada pelo Instituto de Artes da Unicamp. Leia mais no link http:// www.unicamp.br/unicamp/noticias/2013/07/30/ana-salvagni-lanca-olivro-fotos-do-espelho-no-almanaque-dia-5
Cristianismo primitivo na Universidade - No dia 6 de agosto, como parte do projeto ‘Fóruns Permanentes: Arte, Cultura e Educação’ acontece o seminário ‘Cristianismo Primitivo na Universidade: Perspectivas e Debates’, no auditório do Centro de Convenções da Unicamp, das 9 às 17 horas. O evento é organizado pelos professores Pedro Paulo Funari e Jonas Machado (IFCH). Acesse a programação completa no site http://www.unicamp.br/unicamp/eventos/2013/07/16/(http://foruns.bc.unicamp.br/foruns/projetocotuca/ forum/htmls_descricoes_eventos/arte53.html. Inscrições e outras informações no link http://foruns.bc.unicamp.br/ Carlos Berriel comenta Decameron - No dia 6 de agosto, o professor Carlos Eduardo Berriel, do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), comenta o filme Decameron, dirigido por Pier Paolo Pasolini, que se baseia na obra do poeta e crítico literário, Giovanni Boccaccio. O evento acontece às 17 horas, no miniauditório do Centro Cultural do IEL. Mais informações: telefone 19-9730-1820 ou email odoricano@ig.com.br Ética na pesquisa em Educação - No dia 7 de agosto, às 14 horas, no Salão Nobre da Faculdade de Educação (FE), acontece um seminário que visa discutir ética na pesquisa em educação. Mais detalhes podem ser obtidos no link http://www.fe.unicamp.br/ TEMPORARIOS/cartaz-dialogos-etica.pdf, telefone 19-3521-5556 ou e-mail eventofe@unicamp.br Olimpíada Nacional em História do Brasil - Até 9 de agosto, estudantes regularmente matriculados no 8º e 9º anos do ensino fundamental e demais séries do ensino médio, de escolas públicas e privadas de todo o Brasil, poderão se inscrever na 5ª Olimpíada Nacional em História do Brasil (ONHB), uma iniciativa da Unicamp. Alunos do Ensino de Jovens e Adultos (EJA) também podem participar. A primeira fase terá início em 19 de agosto, data em que se comemora o Dia do Historiador. Leia mais em http://www.unicamp.br/ unicamp/noticias/2013/05/02/5a-olimpiada-nacional-em-historia-dobrasil-recebe-inscricoes
Eventos futuros Jovem Cientista - O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) realiza, na Unicamp, uma solenidade para entrega de seus prêmios, em especial o XXVII Prêmio Jovem Cientista, cujo tema é “Água - desafios da sociedade”. Participam da cerimônia dirigentes do CNPQ, da Universidade e autoridades da região, além de docentes e estudantes de graduação e de pósgraduação. A solenidade está marcada para o dia 12 de agosto, às 15 horas, no auditório da Diretoria Geral da Administração (DGA). Para mais detalhes acesse o link http://www.unicamp.br/unicamp/ noticias/2013/07/02/cnpq-lancara-seus-premios-na-unicamp A formação de elites na Argentina - A Faculdade de Educação (FE) promove, dia 15 de agosto, a palestra “La formación de elites en Argentina: Bachillerato Internacional, distinción y consagración académica”. Ela será ministrada pela professora Sandra Ziegler, da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), da Argentina. A palestra terá início às 14h30 na Sala da Congregação. A participação é gratuita e não há necessidade de inscrição prévia. A organização é do Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Públicas e Educação (GPPE). Mais informações: 19-3521-5565.
Teses da semana Computação - “Especificação e implementação do banco de dados do projeto e-phenology” (mestrado). Candidata: Greice Cristina Mariano. Orientador: professor Ricardo da Silva Torres. Dia 9 de agosto, às 14 horas, no auditório IC 2. Economia - “Crescimento econômico e geração de emprego: o caso da Libéria” (mestrado). Candidato: C. Kelvin Marvie II. Orientador: professor Carlos Salas Paez. Dia 5 de agosto, às 14h30, na sala 23 do Pavilhão da Pós-graduação do IE. Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo - “Convergências das políticas de planejamento urbano e saúde na construção de espaços urbanos saudáveis” (mestrado). Candidata: Jussara Conceição Guarnieri. Orientador: professor Lauro Luiz Francisco Filho. Dia 6 de agosto, às 14 horas, na sala CA22 da CPG/FEC. “Modelo em escala reduzida ao ar livre como ferramenta de validação de simulação computacional de barreiras acústicas” (doutorado). Candidata: Aline Lisot. Orientadora: professora Stelamaris Rolla Bertoli. Dia 9 de agosto, às 9h30, na sala de defesa de teses da CPG/FEC. “Análise de modelo reduzido de estrutura em casca de forma livre de planta hexagonal apoiada nos vértices sob ação do vento” (mestrado). Candidata: Maya Sian Caycedo Garcia. Orientador: professor Isaías Vizotto. Dia 8 de agosto, às 9 horas, na sala CA-22 da CPG/FEC. Engenharia Elétrica e de Computação - “Método da barreira modificada via reescalonamento não linear aplicado ao fluxo de potência reativa ótimo” (doutorado). Candidata: Iara da Cunha Ribeiro da Silva. Orientador: professor Anésio do Santos Júnior. Dia 5 de agosto, às 9 horas, na sala PE 12 da CPG/FEEC. “Separação de eventos sísmicos por métodos de decomposição de sinais” (mestrado). Candidato: Ricardo Antonio Zanetti. Orientador: professor João Marcos Travassos Romano. Dia 5 de agosto, às 14 horas, na sala PE-12 da CPG/FEEC. “A autoria de hipertexto apoiada em tecnologia: um processo para a retextualização digital e uma ferramenta para criação iterativa” (mestrado). Candidato: Antônio Robson de Paula. Orientador: professor Ivan Luiz Marques Ricarte. Dia 9 de agosto às 9 horas, na sala de defesa de teses da CPG da FEEC. Engenharia Mecânica - “Simulação de sistema de refrigeração por absorção acionado por gases quentes de exaustão provenientes de um reformador de etanol para produção de hidrogênio” (mestrado). Candidato: Vicente Moreira Rodrigues. Orientador: professor José Ricardo Figueiredo. Dia 8 de agosto, às 9 horas, na sala JD2 da FEM. Geociências - “Geocronologia u-pb e re-os aplicada à evolução metalogenética do cinturão sul do cobre da província mineral de Carajás” (doutorado). Candidata: Carolina Penteado Natividade Moreto. Orientador: professor Lena Virginia Soares Monteiro. Dia 5 de agosto, às 14 horas, no auditório do IG. “Transformações no médio e baixo curso do Rio do Peixe: análise comparativa entre a expedição realizada 1905/1906 pela comissão geográfica e geológica do Estado de São Paulo” (mestrado). Candidato: Fred Teixeira Trivellato. Orientador: professor Archimedes Perez Filho. Dia 7 de agosto, às 9 horas, no auditório do IG.
“As desigualdades socioespaciais urbanas numa metrópole interiorana: uma análise da região metropolitana de Campinas (SP) a partir de indicadores de exclusão/inclusão social” (doutorado). Candidato: Ederson do Nascimento. Orientador: professor Lindon Fonseca Matias. Dia 8 de agosto, às 9 horas, no auditório do IG. Linguagem - “Que diz o desenho? Um estudo de caso sobre a função do desenho na clínica com criança” (mestrado). Candidata: Camila Ribeiro Lage. Orientadora: professora Maria Fausta Cajahyba Pereira de Castro. Dia 8 de agosto, às 9 horas, na sala de defesa de teses do IEL. “Propostas para o século XXI: o conto popular em Italo Calvino” (doutorado). Candidata: Eva Aparecida de Oliveira. Orientadora: professora Maria Betânia Amoroso. Dia 9 de agosto, às 13 horas, na sala de defesa de teses do IEL. Odontologia - “Sistema de espectroscopia de fluorescência na avaliação de margens cirúrgicas de carcinomas de células escamosas da cavidade oral nos momentos in vivo e ex vivo” (doutorado). Candidata: Ana Lucia Noronha Francisco. Orientador: professor Luiz Paulo Kowalski. Dia 6 de agosto, às 9 horas, no anfiteatro 4 da FOP. “Indução do estímulo nociceptivo na região da atm: mínima concentração efetiva de piperina em condições de normalidade, inflamação local prévia e estresse” (doutorado). Candidata: Ana Paula Varela Brown Martins. Orientadora: professora Celia Mariza Rizzatti Barbosa. Dia 7 de agosto, às 14 horas, no anfiteatro 1 da FOP. “Análise clínico-laboratorial em pacientes submetidos à quimioterapia” (doutorado). Candidata: Lara Maria Alencar Ramos Innocentini. Orientador: professor Marcio Ajudarte Lopes. Dia 9 de agosto, às 13h30, na sala da Congregação da FOP. Medicina - “A serina IKK epsilon é essencial para ação e sinalização de insulina e leptina no hipotálamo de camundongos obesos” (mestrado). Candidata: Laís Weissmann. Orientadora: professora Patrícia de Oliveira Prada. Dia 6 de agosto, às 9 horas, na sala amarela da Pós-graduação da FCM. “Tradução, adaptação cultural e confiabilidade do questionário ROWE para avaliação dos resultados funcionais em indivíduos normais e atletas arremessadores com lesões capsulo-labrais do ombro” (mestrado). Candidato: Freddy Beretta Marcondes. Orientador: professor Maurício Etchebehere. Dia 6 de agosto, às 14 horas, no anfiteatro da Comissão de Pós-graduação da FCM. “Dor no joelho de bailarinas clássicas adolescentes” (mestrado). Candidata: Paula Fiquetti Silveira. Orientador: professor Sergio Rocha Piedade. Dia 9 de agosto, às 15 horas, no anfiteatro da Comissão de Pós-graduação da FCM. Química - “Caracterização de resíduos lignocelulósicos por espectroscopia NIR aliada a quimiometria para a obtenção de insumos químicos” (doutorado). Candidato: Magale Karine Diel Rambo. Orientadora: professora Márcia Miguel da Castro Ferreira. Dia 6 de agosto, às 14 horas, no miniauditório do IQ. “Desenvolvimento de tecnologia Depot para entrega modificada de fármacos encapsulados em nanopartículas lipídicas sólidas e carreadores lipídicos nanoestruturados” (mestrado). Candidata: Letícia Paifer Marques. Orientador: professor Francisco Benedito Teixeira Pessine. Dia 9 de agosto, às 14 horas, no miniauditório do IQ.
Destaque do Portal
Prêmio Nobel de Química
abre 3º Congresso sobre Proteômica ma palestra do ganhador do Nobel de Química de 2002, o suíço Kurt Wüthrich, abriu na noite do último dia 28 o 3º Congresso Internacional sobre Proteômica Analítica (3rd ICAP), que ocorre pela primeira vez no Brasil. Wüthrich falou a uma plateia constituída por docentes, pesquisadores e estudantes sobre o tema “Ressonância Magnética Nuclear: uma ferramenta analítica em genômica estrutural”. Organizado por um comitê constituído por docentes do Instituto de Química (IQ) da Unicamp, o 3rd ICAP prosseguiu até o dia 31, na cidade de São Pedro, a 100 quilômetros de Campinas. De acordo com o professor Marco Aurélio Zezzi Arruda, presidente do congresso, o evento contou com 110 inscritos vindos de diversos países do mundo, entre eles Espanha, Austrália, Rússia, Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos. “São especialistas de diversas áreas, como medicina, biologia, química etc. Esta interação é muito importante, pois estamos caminhando cada vez mais para pesquisas com abordagens interdisciplinares. O fato de o Brasil sediar o congresso também merece destaque. Embora estejamos iniciando na área da proteômica, já contamos com grupos de pesquisa muito bons”, considera. O diretor do IQ, Watson Loh, tem opinião semelhante. Segundo ele, o Brasil é um país que tem atraído a atenção de pesquisadores estrangeiros, em razão da qualidade da ciência praticada por aqui. “Este diálogo é fundamental para nós, pois internacionalização é a palavra de ordem. O congresso é uma grande oportunidade de promover a aproximação entre especialistas de diferentes áreas, vindos de diversas partes do mundo. Além disso, é uma grande honra para o IQ ter contribuído para a realização do evento”. Presidente da Sociedade Brasileira de Proteômica (BrProt), Gilberto Domont também ressaltou a importância do 3rd ICAP para o desenvolvimento da ciência e para o fortalecimento dessa área do conhecimento no Brasil.
Fotos: Antoninho Perri
O suíço Kurt Wüthrich, prêmio Nobel de 2002, durante a palestra de abertura
“Ciência é troca. Para o Brasil, essa troca é ainda mais relevante, pois os países desenvolvidos já estão surfando na terceira onda da proteômica, enquanto nós ainda estamos na segunda. Entretanto, temos bons grupos de pesquisas com capacidade de fazer essa área do conhecimento avançar no país”, entende. O 3rd ICAP contou com diversas atividades, como exposição de pôsteres, apresentações orais, minicursos e palestras. O evento encerrou-se com a conferência “Especiação e metalômica – métodos eficazes no estudo de regulação de metaloproteínas em pesquisas biomédicas”, ministrada por Joseph Caruso, da Universidade de Cincinnati (EUA). (Manuel Alves Filho)
O diretor do IQ, Watson Loh: Brasil tem atraído a atenção de pesquisadores estrangeiros
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Campinas, 5 a 11 de agosto de 2013 SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br
aumento da hostilidade nas condições de trabalho tem provocado piora na saúde física e mental dos bancários do país. A revelação faz parte de pesquisa de mestrado da Unicamp concluída em fevereiro último pela economista e ex-bancária Taíse Cristina Gehm. No estudo, ela aponta que diversas transformações nas instituições financeiras, sobretudo entre os anos de 1990 e 2000, contribuíram para o aprofundamento da pressão nas relações de trabalho entre os profissionais. “Essa pressão no trabalho, resultado de constantes cobranças sobre vendas e metas, tem se tornado uma fonte de adoecimento dos bancários. As principais doenças estão relacionadas às LERs/ Dorts [Lesões por Esforço Repetitivo/ Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho] e doenças psíquicas”, aponta a pesquisadora, que trabalhou no extinto banco Nossa Caixa entre 2006 e 2007. As causas predominantes do estresse no trabalho dos profissionais estão relacionadas com as alterações nas estratégias das instituições, iniciadas a partir da década de 1990. Taíse Gehm cita o aprofundamento do processo de automação; a externalização das atividades, como a terceirização e a introdução dos chamados correspondentes bancários; e o estabelecimento de metas sobre vendas. “O fim da inflação, a partir da década de 1990, provocou mudança na estrutura dos bancos. Com a estabilização da moeda, as instituições buscaram outras formas de rendimentos, adotando novas estratégias, que alteraram a própria natureza do que é ser bancário. A busca pela lucratividade e a redução de custos têm resultado em piores condições de trabalho, como maior pressão sobre os bancários e um ambiente de insegurança”, contextualiza a economista graduada pela Unicamp. A pesquisa de Taíse Gehm foi conduzida junto ao Programa de Pós-Graduação do Instituto de Economia (IE), sob orientação do docente José Dari Krein. Ela realizou entrevistas qualitativas com bancários tendo como referência o Banco do Brasil (BB) e o processo de incorporação do Banco Nossa Caixa em 2009. O estudo foi financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Conforme a estudiosa, foram entrevistados trabalhadores do BB, dentre eles, bancários provenientes da Nossa Caixa. Ela informa que a investigação também se apoiou em levantamento do perfil dos profissionais dos bancos públicos, realizado a partir da Relação Anual de Informações Sociais e dos Relatórios Anuais do Banco do Brasil. “A finalidade do estudo de campo foi captar a percepção dos bancários sobre as alterações ocorridas, e também entender o impacto disso na vida deles, com destaque para a saúde física e mental. O objetivo das entrevistas foi também identificar o sentimento dos bancários frente a essa incorporação”, justifica. Na dissertação, são citados dados do Relatório Anual do Banco do Brasil, que demostram aumento de 42% nas taxas de lesões entre 2008 e 2011. Ao mesmo tempo, a taxa de dias perdidos apresentou pouca variação. Isso acontece, segundo a pesquisadora, porque os bancários doentes sentem-se pressionados a não faltarem e não se afastarem. “Há forte cobrança de toda a equipe para que a produtividade seja mantida. A política adotada no BB faz com que a falta de um funcionário prejudique a equipe inteira. E quando um profissional se ausenta, o banco não envia outro funcionário para suprir a falta do funcionário doente”, critica.
MUDANÇA NO PERFIL Com as transformações no sistema das instituições financeiras, os bancários passaram de intermediários de transações para vendedores de produtos e serviços, afirma a economista da Unicamp. De acordo com ela, essa mudança no perfil dos trabalhadores tem implicado em cobranças diárias sobre o cumprimento de metas relacionadas a vendas de produtos e serviços. “Um grande elemento das metas são as vendas, não que elas tenham um peso maior nos pontos da agência. Só que as vendas são importantes para o reconhecimento do funcionário, pois ele acaba tendo um melhor relacionamento. As entrevistas fortemente indicaram que as vendas são um componente para a progressão do funcionário no Banco do Brasil”, detalha.
Pressão afeta saúde
de bancários, aponta estudo Alterações nas estratégias das instituições financeiras estão entre as causas predominantes do estresse Foto: Antoninho Perri
“Atualmente, os bancários estão sendo chamados de ‘bancários vendedores’. São pressionados e cobrados a oferecer e vender produtos que, muitas vezes, consideram dispensáveis aos clientes. A principal questão é a venda, mas eles precisam dar conta dos trabalhos burocráticos e administrativos. Muitos profissionais se sentem frustrados”, completa Taíse Gehm. A economista lembra que o fim dos ganhos com a inflação e o crescimento da renda da população impulsionaram os bancos a buscarem outras estratégias para elevar suas receitas. Entre elas, destacam-se a cobrança de tarifas e a venda de produtos e serviços, como seguros, consórcios, cartão de crédito, empréstimos, financiamentos e previdência privada. Outro elemento que gera hostilidade nas relações de trabalho é o sistema de Participação nos Lucros e Resultados (PLR). Isso porque a PLR possui dois componentes: uma remuneração fixa e outra variável, relacionada diretamente com o cumprimento de metas. “A PLR é definida por agência e não por funcionário. Se a agência bate a meta, vai ter uma PLR maior. Caso contrário, vai receber uma PLR menor. E o funcionário tem que se engajar para conseguir a pontuação. Isso é uma faca de dois gumes, porque ao mesmo tempo em que é coletivo, causa cobranças de colega a colega”, expõe.
AUTOMAÇÃO O uso crescente da tecnologia gerou aumento de produtividade e consequências negativas ao trabalho dos bancários. A
pesquisadora da Unicamp considera que o avanço tecnológico e a racionalização produtiva estão associados ao movimento intenso de reestruturação bancária. Ela exemplifica citando o sistema de comunicação eletrônica de dados, que substitui o atendimento tradicional nas agências bancárias. O objetivo, esclarece a investigadora, foi sedimentar uma estrutura administrativa mais enxuta, resultando em desemprego e pressões nas condições de trabalho. “A automação reduz o tempo morto do trabalho, tornando a atividade mais intensa. A finalidade é o aumento da produtividade. Um bancário disse, por exemplo, que se sente no big brother porque o seu chefe não precisa estar perto dele, controlando. Ele faz isso online, pelo sistema do computador”, relata.
TERCEIRIZAÇÃO E
CORRESPONDENTES Na busca por redução de custos, as instituições financeiras promoveram uma série de terceirizações. Houve também a possibilidade de realização de atividades fora das agências, com os serviços dos correspondentes bancários, exercidos por lotéricas, Correios e comércio. “Essas medidas situam-se na lógica de busca por maiores lucros e aumento da competitividade. Como atividades terceirizadas no Banco do Brasil destacam-se a retaguarda e compensação, segurança, limpeza, digitação e o setor jurídico. Alguns bancos também terceirizam atividades de telemarketing”, exemplifica a ex-bancária.
Taíse Gehm observa que os entrevistados são contra a terceirização de atividades típicas do bancário. Muitos concordam, no entanto, que a terceirização de segmentos como limpeza, telefonia e segurança é benéfica para o banco. Isso pode refletir uma questão de identidade dos próprios bancários, analisa. “Muitos acreditam que para algumas ocupações a terceirização é positiva, possivelmente como afirmação do status das ocupações dos bancários. O posicionamento deles acaba sendo uma maneira de se diferenciarem dos trabalhadores que exercem atividades não bancárias”. Alguns profissionais também são favoráveis aos correspondentes externos, menciona a pesquisadora da Unicamp. “Este tipo de atividades tira os clientes do banco, diminuindo filas e a quantidade de trabalho. Mas tem a questão da insegurança que estes correspondentes geram. Pelo que eu percebi nas entrevistas, os caixas se sentem bastante afetados pelos correspondentes bancários. Eles enxergam, no futuro, a própria extinção dos seus cargos”, pondera.
Publicação Dissertação: “As transformações no sistema bancário e a hostilidade nas condições de trabalho: um olhar a partir do Banco do Brasil” Autora: Taíse Cristina Gehm Orientador: José Dari Krein Unidade: Instituto de Economia (IE) Financiamento: Capes
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Campinas, 5 a 11 de agosto de 2013
Airto Moreira
D` a b a t e r i a
A q u e ixa d a d e bu r ro a faixa número cinco do cultuado álbum Bitches Brew, de Miles Davis, a cuíca, que é originalmente oriunda do samba, aparece ao lado do trompete e de outros instrumentos. O disco está entre os que inauguraram o jazz fusion, ou a mistura do jazz com elementos do rock que surgiu na década de 1970. Aclamado, Bitches Brew projetou o nome do catarinense Airto Moreira para o mundo. Era ele quem tocava a cuíca. O instrumentista que trabalhava no Brasil com Hermeto Pascoal havia se mudado para os Estados Unidos para construir uma carreira ao lado da cantora Flora Purim, sua companheira. Airto não voltou mais, a não ser para visitar amigos e parentes e fazer apresentações. Para Guilherme Marques, também baterista e mestrando no programa de Música do Instituto de Artes (IA) da Unicamp, o artista é a peça-chave que conecta duas gerações de bateristas brasileiros: aquela ligada à bossa nova e ao sambajazz, e a que se configurou a partir da música instrumental brasileira. Guilherme aponta em sua dissertação uma série de procedimentos musicais desenvolvidos pelo músico entre 1964 e 1975, que comprovam sua hipótese. “Os parâmetros que ele utiliza nesse período, e que o identificam, já existiam para a geração anterior, mas não da forma como ele manipulava. E o surgimento do trabalho dele faz com os elementos apareçam para a geração seguinte”, assinala o autor. O período de mais de uma década foi dividido em três fases: os anos de 1964 e 1966 identificados com o sambajazz de Airto, 1966 e 1968 como a fase em que o baterista integrou o Quarteto Novo, com Hermeto Pascoal, e participou dos festivais da canção da TV Record, e entre 1969 e 1975 nos Estados Unidos, fase em que o uso da percussão se intensificou “de maneira brutal”, como diz o mestrando. Na pesquisa, Guilherme transformou a improvisação em partituras em 75 transcrições de músicas completas ou apenas trechos de vários discos analisados. Também estudou 115 páginas de entrevistas que ele fez não só com o próprio Airto, em uma de suas passagens pelo Brasil, mas com outros bateristas que trabalharam com ele, ou no mesmo período, que são Robertinho Silva, Pascoal Meirelles, Nene e Tutty Moreno. “Airto fez muitos trabalhos comerciais, mas no meu mestrado estou preocupado com os quais ele era protagonista, entre eles os cinco discos com o Sambalanço Trio, um com o Sambrasa Trio, um com o Sansa Trio e um do Quarteto Novo”. Os seis primeiros discos solo lançados nos Estados Unidos e outros três importantes na carreira do baterista, entre os quais Bitches Brew, também fazem parte da análise. Airto Moreira era o talentoso baterista que havia se destacado no inicio dos anos de 1960 com grupos de sambajazz. Integrou o Quarteto Novo em 1966 e passou a se apresentar nos festivais de música da TV Record, que na época revelava os grandes nomes da Música Popular Brasileira. Em 1966, ano em venceu a canção “Disparada”, de Geraldo Vandré e Théo de Barros, Airto tocava um instrumento para lá de esquisito que fazia um efeito sonoro sensacional. Até então ninguém conhecia a queixada de burro, mas a partir daí ela se popularizou na percussão.
A originalidade do baterista tocou os norte-americanos que viam Airto como um músico exótico. “O modo como ele tocava percussão e bateria, lhe deu condições pra lançar carreira solo nos Estados Unidos. O mercado nutria por ele grande admiração em razão de ele tocar instrumentos até então desconhecidos, de um jeito diferente, em um contexto que sequer podiam imaginar”, avalia Guilherme. O pesquisador acredita que dessa forma Airto abriu as portas para muitos músicos brasileiros como, por exemplo, Hermeto, que colaborou nos dois primeiros discos solo do instrumentista. De acordo com Guilherme, muitas pessoas se aproximaram até mesmo da música brasileira por causa de Airto Moreira. “Ele dá outra dimensão para a percussão na música brasileira. É por isso que considero importante acessar esses músicos enquanto estão ativos. As próximas gerações que não terão contato com eles não vão identificar o processo de desenvolvimento da música que eles impuseram. A pesquisa é fundamental como forma de resgate e construção”.
O baterista catarinense Airto Moreira durante apresentação: fazendo a ponte entre gerações distintas
Foto: Reprodução
PATRÍCIA LAURETTI patricia.lauretti@reitoria.unicamp.br
PROCEDIMENTOS
O que levou Guilherme a afirmação que Airto seria um elo entre duas gerações de bateristas foi uma série de cinco procedimentos musicais que o pesquisador descreve na dissertação. O primeiro é o que ele chama de “uso melódico” do chimbal no pé esquerdo. O chimbal é constituído por dois pratos de bateria, dispostos face a face e que pode ter o som acionado por um pedal. “É uma peça que era usada de maneira mais elementar, para o acompanhamento dos cantores e solistas. Airto começa a trabalhar de forma mais livre e interativa, por isso eu chamo de melódica. O chimbal interage muito mais, e além de acompanhar, ele propõe temas para os solistas”, explica. O segundo procedimento é a adaptação de ritmos nordestinos para a bateria. “Os ritmos ligados ao forró, como baião, coco, xaxado, passam a ser utilizados em um contexto de improvisação”. O terceiro é a modificação das métricas para ímpares em vez de pares. “É o que a gente chama de fórmula de compasso, a métrica básica é o compasso binário, 2 por 4, 4 por 4, que é natural para quem ouve. A partir do Quarteto Novo, começam a aparecer ritmos brasileiros tocados em compassos ímpares, 3 por 4, 5 por 4. Era um dado absolutamente novo”, esclarece Guilherme. A forma e o conteúdo dos solos de bateria constituem o penúltimo mecanismo identificado por Guilherme. “Airto trabalha com os solos dentro das formas das músicas. Até então os solos eram desconectados dessa estrutura e tinham a função de ‘chamar’ os outros instrumentos para retomar o tema principal. Havia uma estrutura já desenhada”. A ênfase da dissertação é o trabalho de Airto na bateria, mas a feição percussionista não ficou de fora, sobretudo porque, desde que se mudou para os Estados Unidos, o instrumentista Fotos: Antonio Scarpinetti / Divulgação
O músico Guilherme Marques, na Unicamp e com Airto Moreira: entrevistas e transcrições de músicas
Publicações “Misturada – uma análise do solo de bateria de Airto Moreira”. XXII Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós Graduação em Música (ANPPOM) – 2012 (João Pessoa) “Uso ‘melódico’ do chimbal na performance de Airto Moreira da música Deixa”. XXIII Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós Graduação em Música (ANPPOM) – 2013 (Natal). Dissertação: “Airto Moreira: do sambajazz à música dos anos 70 (1964-1975)” Autor: Guilherme Marques Orientador: Fernando Hashimoto Unidade: Instituto de Artes (IA)
foi ampliando esta marca. Por isso a última discussão é como o uso da percussão modifica e altera o jeito do instrumentista tocar bateria. “Ele passa a tocar de maneira muito mais simples para dar espaço para a percussão. Existe um dado técnico que é a sobreposição de camadas de instrumentos que são gravados separadamente. Ele usa efeitos de preenchimento e coloridos sonoros utilizando uma gama gigante de apetrechos como congas, caxixi, pandeiro, chocalho e berimbau”. Na conversa que teve com Airto, Guilherme também aprendeu que nem sempre o que o pesquisador imagina corresponde ao que houve. No álbum Fingers (1973), por exemplo, a bateria da música “Paraná” é tocada de maneira que Guilherme não pode reconhecer como sendo do estilo do instrumentista. O autor da dissertação desconfiava que não fosse Airto tocando, o que se confirmou. Entretanto Guilherme não imaginava que o artista não gostava do efeito. “A bateria tem um estilo americanizado que, de acordo com o que Airto me disse na entrevista, era o jeito que o mercado aceitava. Eu não achava que ele não gostasse daquilo”. O trabalho na percussão desenvolvido nos Estados Unidos foi reconhecido, segundo Guilherme, pelos críticos de uma conceituada publicação que é a revista norte-americana Downbeat. A revista criou a categoria “percussão” em sua premiação tradicional dos melhores do ano, em 1973. Airto foi o escolhido pelo público e crítica até 1983, quando outro brasileiro venceu – Naná Vasconcelos. “A conclusão que se delineou com a pesquisa é a de que Airto é um ponto de contato forte entre as gerações de bateristas, mas é um evolucionário e não um revolucionário, no sentido que ele não abandona nada daquilo que existia antes, ou seja, não nega o que os outros bateristas tocavam antes dele, mas propõe novos usos para o que já estava ali de forma mais elementar”, comenta Guilherme.