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Foto: Antoninho Perri

Um ‘segredo’ em veneno de formiga 4

Pesquisadores do IQ descobrem que veneno de espécie de formiga lava-pés contém todas as quatro configurações espaciais de alcaloide, e não apenas duas, como a literatura científica registrava.

Jornal daUnicamp www.unicamp.br/ju

Campinas, 2 a 8 de setembro de 2013 - ANO XXVII - Nº 573 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

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FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT Foto: Sérgio Lima / Folha Press

Entre o vácuo e o ceticismo O deputado federal Natan Donadon, sem partido, mesmo condenado pela Justiça e cumprindo pena no presídio da Papuda (DF), comemora sua “absolvição” após votação no plenário da Câmara dos Deputados, no último dia 28

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Livro organizado pelos cientistas políticos Rachel Meneguello (Unicamp) e José Alvaro Moisés (USP) traça um perfil sobre a confiança no regime democrático brasileiro. Em entrevista ao Jornal da Unicamp, Rachel Meneguello afirma que “a desconfiança política é um fenômeno associado à percepção da ausência de representação”.

Células-troncos geram miniatura do cérebro Pós inédita no país vai ter arte não-europeia

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A sustentabilidade e o setor financeiro A carga física na lavoura de café

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Multimorbidade atinge mulheres com mais de 50 As ciências sociais e a literatura negra


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Campinas, 2 a 8 de setembro de 2013

TELESCÓPIO

CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

Ação humana força animais a ficarem mais espertos Alguns mamíferos vêm ficando mais espertos para sobreviver num mundo dominado pela espécie humana, sugere estudo realizado por pesquisadoras dos Estados Unidos e publicado no periódico Proceedings of the Royal Society B. Emilie Snell-Rood e Naomi Wick mediram os crânios de exemplares de dez espécies, como ratos e morcegos, em esqueletos coletados ao longo dos últimos 100 anos em Minnesota. O resultado foi de que, em seis espécies – duas urbanas e quatro rurais – a capacidade craniana, o volume que acomoda o cérebro, aumentou no período. As autoras usam capacidade craniana como um modo indireto de medir a “plasticidade comportamental” – a capacidade do animal de adaptar seu comportamento a situações novas. A tese original das autoras era de que os animais urbanos teriam um ganho de capacidade craniana maior que os rurais ao longo do período analisado, mas isso só se confirmou em duas das dez espécies estudadas. Mesmo assim, as autoras concluem que o aumento deve ter sido estimulado pelas pressões evolutivas do ambiente urbano, criado pelo homem. No caso do aumento da capacidade dos animais rurais, as pesquisadoras ponderam que a paisagem rural de Minnesota também foi amplamente modificada pela ação humana nos últimos cem anos, com a destruição de florestas pela atividade madeireira e a conversão de matas nativas em terra agrícola. O aumento pronunciado na capacidade craniana de mamíferos urbanos, em comparação com os rurais, aconteceu em espécies com alta taxa de fecundidade, diz o artigo, que cita uma série de estudos anteriores “consistentes com a ideia de que espécies capazes de grande reprodução podem mostrar uma resposta evolucionária mais pronunciada em ambientes urbanos”.

Buraco negro no centro da Via-Láctea joga comida fora No centro de nossa galáxia, a Via-Láctea, reside um buraco negro com massa quatro milhões de vezes maior que a do Sol. Conhecido como Sagitário-A*, ele cresce devorando gás das estrelas apinhadas a seu redor – mas, de acordo com uma série de observações, faz isso de modo muito ineficiente. Um efeito colateral da atividade alimentar dos buracos negros gigantes, que habitam o coração de galáxias, é a emissão de raios-X. Mas a radiação produzida por Sagitário-A* é muito menor – cem milhões de vezes menor – que a esperada. Em artigo publicado na edição de 30 de agosto da revista Science, um grupo internacional de pesquisadores, encabeçado por Q.D. Wang, da Universidade de Cambridge, usa dados levantados pelo observatório orbital Chandra de raios-X para oferecer uma explicação: de acordo com eles, a maior parte do gás que gira ao redor do abismo espacial nunca chega a cair nele e, em vez disso, é ejetada, num processo que se vale da própria energia que o buraco negro transmite às partículas. Com isso, apenas 1% da massa inicialmente atraída realmente chega ao interior de Sagitário-A*.

diz que cerca de 50% dos artigos científicos publicados em periódicos com revisão pelos pares tornam-se disponíveis gratuitamente até dois anos após sua aparição original. Esse resultado representa mais que o dobro das estimativas anteriores da proporção da literatura científica em livre acesso, que geravam números da ordem de pouco mais de 20%. De acordo com o trabalho do ScienceMetrix, já estão disponíveis gratuitamente a maior parte dos artigos que tratam de ciência pura, pesquisa biomédica, biologia, matemática e estatística. O campo no qual o acesso livre é mais restrito é o das humanidades e ciências sociais, e no das ciências aplicadas, como engenharia. O setor no qual há menos abertura é o das artes visuais (apenas 13% de artigos disponíveis gratuitamente), seguido pelo de comunicação e estudos textuais (21%). O relatório aponta ainda que o crescimento mais intenso tem ocorrido nas publicações do chamado “padrão ouro”, onde o artigo se torna disponível no ato da publicação, geralmente financiada pela mesma instituição que custeou a pesquisa. O crescimento no chamado “padrão verde”, quando o trabalho é liberado após um intervalo de embargo, e os custos de publicação cabem à editora do periódico, tem sido menor. Os autores especulam que o descompasso detectado pode ser um efeito artificial, causado pelos longos períodos de embargo. O trabalho canadense foi criticado por outros estudiosos da área, ouvidos pela revista Science. Autor de um artigo sobre o assunto publicado no periódico de livre acesso PLoS, que encontrou uma taxa de livre acesso de 20%, Bo-Christer Björk disse que a metodologia usada não lhe permite considerar a taxa de 50% “convincente”.

O verdadeiro valor do dinheiro Dinheiro é o que permite que pessoas que não se conhecem cooperem entre si dentro de grupos humanos muito grandes, diz artigo publicado no periódico PNAS. Assinado por pesquisadores dos Estados Unidos, Suíça e Itália, o trabalho tem como título Money and trust among strangers (“Dinheiro e confiança entre desconhecidos”).

Os autores especulam que, se a cooperação nas sociedades humanas evoluiu com base na interação de pessoas que viviam em pequenos grupos e se encontravam cara a cara, “há uma questão aberta sobre o quê permitiu que os humanos obtivessem sucesso em tarefas de cooperação envolvendo milhões de indivíduos”. Para explorar o problema, os autores criaram um experimento no qual alguns participantes eram “produtores” e outros “consumidores”. A cada rodada, o produtor poderia optar por dar um presente ao consumidor, ou não fazer nada. Os papéis eram trocados aleatoriamente a cada nova interação, o que em tese deveria estimular doações, já que os papéis de produtor e consumidor poderiam inverter-se a qualquer momento. Num dado momento do experimento, os pesquisadores incluíram uma “pedrinha”, que o consumidor poderia usar para “comprar” o presente. O resultado encontrado foi de que a troca espontânea de presentes tendia a diminuir à medida que o tamanho do grupo de voluntários aumentava – o máximo testado foi de 32 – mas que a opção de “comércio” era estável mesmo em grupos grandes. “Nossa pesquisa sugere que regras de cooperação voluntária são difíceis de usar numa sociedade de desconhecidos, a menos que mediadas por uma instituição”, escrevem os autores. “No experimento, a troca monetária (...) deu sustentação a um nível de cooperação estável em grupos grandes e pequenos. Pedrinhas sem valor intrínseco agiram como catalisadores de cooperação”.

Pesquisadores criam miniaturas do cérebro humano com células-tronco Pesquisadores da Áustria e do Reino Unido anunciaram, na edição de 29 de agosto da revista Nature, a produção de culturas de células organizadas em três dimensões que recapitulam os estágios do desenvolvimento do cérebro humano. Criados a partir de células-tronco de pluripotência induzida – fabricadas sem o uso de embriões – os chamados “organoides cerebrais” são descritos, num comentário publicado na mesma edição da revista, como “miniaturas, do tamanho de ervilhas, do tecido do cérebro humano em desenvolvimento”.

O autor do comentário, Oliver Brüstle, da Universidade de Bonn, na Alemanha, acredita que “para as perguntas certas, os organoides cerebrais poderão fornecer um modelo reducionista com o qual estudar o mecanismo do desenvolvimento inicial do cérebro humano, nas condições controladas de uma placa de laboratório”. Os autores do estudo, encabeçado por Madeline Lancaster, da Academia Austríaca de Ciências, usaram, para criar as célulastronco que deram origem aos organoides, células da pele de um portador de microcefalia genética, uma doença que faz com que o cérebro tenha um tamanho significativamente menor que o normal. Quando os cientistas compararam os organoides desse paciente com outros criados a partir da pele de pessoas saudáveis, viram algumas diferenças no processo de formação dos neurônios.

Cientistas dos EUA tendem a exagerar resultados, diz estudo Uma análise estatística de mais de 1.100 pesquisas sobre genética, hereditariedade e psiquiatria indica que os estudos realizados nos Estados Unidos, ou que têm coautores americanos, tendem a informa efeitos mais contundentes do que os esperados pela média dos trabalhos que investigam os mesmos assuntos, o que sugere que a taxa de sucessos na literatura produzida pelos americanos pode ser exagerada. Esse “efeito USA” é mais marcante nos estudos que envolvem parâmetros comportamentais – isto é, onde o resultado não depende apenas de quantidades que podem ser medidas diretamente, como a concentração de moléculas numa amostra de sangue, mas também da observação e avaliação do estado do paciente ou voluntário pelo pesquisador. “Os resultados são melhor explicados como efeito da interação entre a força das expectativas do pesquisador e o grau de suavidade do campo (isto é, baixo consenso metodológico e alta complexidade do tema)”, escrevem os autores da análise, Daniele Fanellia e John Ioannidis, publicada no periódico PNAS. Eles sugerem ainda que o efeito é especialmente pronunciado nos Estados Unidos por conta da pressão exercida pelo sistema de “publique ou pereça” que vigora no país. Foto: Madaline A. Lancaster/ Divulgação

Mais de 50% dos artigos científicos já são gratuitos Relatório elaborado pelo grupo canadense Science-Metrix a pedido da Direção Geral de Pesquisa e Inovação da Comissão Europeia, órgão executivo da União Europeia,

Corte transversal de um organoide, mostrando o desenvolvimento de diferentes regiões do cérebro

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Campinas, 2 a 8 de setembro de 2013 CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

ara quem sofre com a dor da picada e as reações alérgicas talvez não faça muita diferença, mas no veneno das formigas Solenopsis saevissima, saevissima uma das espécies popularmente conhecidas como lavapés, escondem-se sutilezas tão importantes quanto inimagináveis, reveladas em uma tese de doutorado defendida no Instituto de Química (IQ) da Unicamp. Quem só conhece a química do Ensino Médio deve se lembrar de que as moléculas eram descritas por fórmulas que nada mais são do que listas abreviadas de átomos – como H2O, que diz que a água é formada por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio. Fórmulas assim, no entanto, contam apenas uma parte da história: as moléculas, afinal, existem num espaço de três dimensões, não na superfície plana da folha de papel, e a posição de seus constituintes – a estrutura tridimensional, ou configuração absoluta – muitas vezes faz diferença. “É como as mãos de uma pessoa”, exemplificou Anita Jocelyne Marsaioli, professora titular do IQ. “Uma é a imagem especular, o reflexo no espelho, da outra. Por isso mesmo, não são idênticas. Dá para perceber isso quando tentamos sobrepô-las”. A professora oferece um exemplo ainda mais visual: olhando a palma da mão esquerda, vê-se que, para ir da ponta do polegar à do dedo indicador e à do dedo médio, é preciso fazer um deslocamento no sentido horário; já no caso da palma da mão direita, o movimento tem de ocorrer no sentido anti-horário. Os elementos – polegar, indicador, médio, anular – estão em posições relativas iguais, mas a orientação no espaço muda. “A configuração relativa dos dedos é a mesma, mas a absoluta difere”, explicou ela. Em sua tese de doutorado, orientada pela professora Anita, Adriana Pianaro demonstrou que o veneno da formiga S. saevissima contém todas as quatro configurações espaciais possíveis do alcaloide 2-metil-6undecilpiperidina, em vez de apenas duas, como registrava a literatura científica até então. A descoberta só foi possível graças a uma nova metodologia de análise dos venenos, também desenvolvida por Adriana e descrita em artigo publicado no periódico Tetrahedron: Asymmetry, em 2012. A criação do processo rendeu à brasileira um convite para trabalhar nos Estados Unidos. Como relatou o professor José Roberto Trigo, do Departamento de Biologia Animal do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, as lava-pés são uma praga no sul dos EUA, principalmente nos Estados mais quentes, como Flórida, Texas e Arizona. “No Brasil ela é nativa, e é controlada por inimigos naturais e competidores. Lá, ela não tem os inimigos naturais, e compete com as formigas norte-americanas, muitas vezes com sucesso, e acaba eliminando as formigas de lá. Além de a Solenopsis ser extremamente agressiva, predando até mesmo filhotes de pequenos pássaros, pequenos lagartos”. Os americanos, que chamam as lava-pés de fire ants (“formigas de fogo”), vinham buscando um modo de fazer o controle biológico da praga. “Os pesquisadores dos EUA conheceram o nosso trabalho com as formigas lavapés e ficaram interessados em que eu fosse até o laboratório deles sintetizar os alcaloides, mas não aceitei o convite, porque estava iniciando um pós-doutorado em outro grupo de pesquisa”, disse Adriana.

Descoberto ‘segredo’ em

veneno de formiga Pesquisa revela que são 4 as configurações de alcaloide em espécie de lava-pés, em vez de duas, como registrado até então Fotos: Antoninho Perri

Estrutura da molécula: estudos apontam que alcaloides de veneno são abundantes

APLICABILIDADE Há estudos que apontam possíveis usos tecnológicos e médicos de alcaloides do veneno das formigas Solenopsis. Entre as aplicações, algumas já patenteadas, há usos como inseticida, antibiótico, na eliminação de fungos e, também, na quimioterapia. Um artigo publicado em 2007 por pesquisadores americanos mostra que um alcaloide de Solenopsis é capaz de inibir a angiogênese – a formação de novos vasos sanguíneos a partir de vasos preexistentes. Essa seria uma propriedade útil no controle de tumores. Em meados de julho, o serviço de transferência de tecnologia da Universidade Emory (EUA) publicou uma nota em seu website dando conta da realização de testes de derivados do veneno de formiga, in vitro, contra melanomas e angiossarcomas (um tipo de câncer que atinge o revestimento dos vasos sanguíneos). Além de determinar que todas as quatro formas tridimensionais do alcaloide existem no veneno da S. saevissima, a pesquisadora descobriu também que a proporção da mistura das diferentes formas varia, dentro de um mesmo formigueiro, de acordo com o tamanho do inseto. “Observei que existe uma diferença no veneno das operárias de tamanhos diferentes no mesmo ninho de S. saevissima. E elas têm tamanhos diferentes não por causa da ida-

A professora Anita Jocelyne Marsaioli (à dir.), orientadora, Adriana Pianaro (à esq.), autora da tese, e Francisca Diana da Silva Araújo: nova metodologia de análise dos venenos desencadeou descoberta

de”, explicou, mas porque a cada tamanho adulto corresponde um tipo de trabalho dentro do ninho. O veneno das rainhas também diferia do das operárias, o que sugere que a composição está, de algum modo, relacionada à função do inseto dentro da sociedade do formigueiro. “Conforme aumenta o tamanho da operária, a composição química do veneno fica mais próxima da composição química do veneno das rainhas”, disse a pesquisadora. Foram analisados venenos de operárias e rainhas de formigas lava-pés da região sudeste do Brasil, especificamente de cinco ninhos do distrito de Pedro do Rio (Petrópolis-RJ), e de três ninhos de Ubatuba (SP). “Tudo indica que o veneno é importante na comunicação química interna dos indivíduos de um mesmo ninho”, disse Adriana. “O ninho é formado majoritariamente de fêmeas – operárias e rainhas – e a importância da presença do veneno nas rainhas ainda não foi determinada”, já que essa casta de formigas normalmente não tem de lidar com invasores. É possível que o veneno das rainhas ajude a proteger os ovos, principalmente, de infestação por fungos. O biólogo Eduardo Fox, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que também estuda as lava-pés e colaborou no trabalho de Adriana, disse ao Jornal da Unicamp que se sabe “quase nada” sobre a biologia do veneno nas rainhas. “Penso que, além de agir como fungicida ou bactericida sobre os ovos, o veneno deve possuir um papel importante na identificação de casta e espécie”, disse ele. “Os alcaloides de veneno são muito abundantes e podem ser espalhados no ambiente, logo imagino que sejam importantes para a comunicação. Além dos alcaloides, existem proteínas fixadoras de odor presentes no veneno destas formigas, que devem passar mensagens para as demais”. Fox acredita ser possível que existam compostos no veneno das rainhas que passam mensagens que modulam a organização social da colônia. “Este é um dos principais temas do meu próximo projeto de pos-doutoramento”. Diferenças na estrutura tridimensionais das moléculas, e nas concentrações das diferentes estruturas, podem parecer meros detalhes, mas não é assim: em sua tese, Adriana cita o caso, já conhecido pela ciência, da mariposa do bicho-da-seda, que produz um feromônio sexual. Os machos, no entanto, respondem a apenas

uma das quatro formas possíveis da molécula. “Uma única mudança (...) diminuiu sua atividade biológica bilhões de vezes”, diz o texto do trabalho. Seres humanos também podem ser sensíveis à mudança na geometria das moléculas. “Um exemplo clássico para nós, seres humanos, é a distinção olfativa de aromas e perfumes”, disse ela. “Sem saber, nós conseguimos diferenciar a configuração absoluta do composto orgânico denominado limoneno, que é um dos componentes principais do aroma das cascas das laranjas e dos limões”. Uma das estruturas tridimensionais do limoneno dá o cheiro característico da casca do limão e outra, o aroma da casca da laranja. Na questão do controle da praga de formigas lava-pés no sul dos Estados Unidos, o trabalho de Adriana mostra que identificar e separar as diferentes espécies de Solenopsis presentes no país pode ser ainda mais difícil do que o esperado. “Os biólogos não conseguem diferenciar estas formigas facilmente por estudos taxonômicos, por isso estão muito interessados na composição dos alcaloides e hidrocarbonetos cuticulares, para conseguir distinguir as espécies mais rapidamente por quimiotaxonomia”, disse ela. Esses hidrocarbonetos são moléculas que existem na superfície externa (cutícula) – na “pele” – das formigas. O estudo feito pela pesquisadora brasileira mostrou que a composição do veneno muda não apenas entre indivíduos de um mesmo ninho, mas também entre diferentes ninhos de uma mesma espécie. “Por isso, os alcaloides não poderão ajudar na diferenciação das espécies”. As moléculas que Adriana estudou pertencem à família dos alcaloides, que contém diversas substâncias tóxicas, como o ópio e a nicotina, mas alcaloides provavelmente não são os principais culpados pelos efeitos da picada da Solenopsis nas pessoas. “Alguns estudos revelaram que são as proteínas do veneno das formigas lava-pés que são as grandes responsáveis pelas reações alérgicas nos seres humanos. Até agora, nenhum estudo indica que os alcaloides são responsáveis”, disse a pesquisadora. O trabalho de Adriana teve como foco a padronização da metodologia para a análise da 2-metil-6-undecilpiperidina no veneno da S. saevissima, mas há ainda outros alcaloides no veneno dessa espécie – bem como no de outras espécies de Solenopsis. Uma pesquisadora de pós-doutorado do IQ, Francisca Diana da Silva Araújo, também vinculada ao laboratório de Anita Marsaioli, vem estudando a configuração de dois alcaloides, diferentes dos pesquisados por Adriana, em várias espécies de lava-pés encontradas em diversas regiões do Brasil. Para Adriana, as descobertas sobre os venenos dos insetos sociais lembram um ensinamento da sabedoria popular. “No interior do Paraná, onde nasci e fui criada, as pessoas sempre diziam que tomar uma picada de abelha e formiga era remédio, como uma vacina. Pelo jeito, isto está sendo comprovado, quimicamente, como um fato verdadeiro”, disse ela.

Publicação Tese: “Ecologia química de melipona quadrifasciata lepeletier, mcaptotrigona aff. depilis moure e solenopsis saevissima smith” Autora: Adriana Pianaro Orientadora: Anita Jocelyne Marsaioli Unidade: Instituto de Química (IQ)


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Campinas, 2 a 8 de setembro de 2013

Como crescer (e financiar) sem destruir?

Tese demonstra que apenas a autorregulação não é capaz de mover o capital do setor financeiro na direção da sustentabilidade ambiental Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil

LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

dilema enfrentado pela economia capitalista de continuar crescendo infinitamente, quando os recursos naturais são finitos, é a questão abordada por Maria de Fátima Cavalcante Tosini, analista do Banco Central do Brasil (BCB), em tese de doutorado defendida na Unicamp. O estudo intitulado “A sustentabilidade ambiental no setor financeiro: da autorregulação à regulação” teve a orientação do professor Bastiaan Philip Reydon, do Instituto de Economia (IE). “O uso mais eficiente dos recursos naturais e de processos produtivos menos danosos ao meio ambiente exige mudanças profundas na economia, o que requer grande volume de recursos financeiros. Contudo, o sistema financeiro, que deveria ser o fornecedor desses recursos, está em profunda crise. E os Estados, alguns falidos, não possuem condições de financiar a transição para uma economia ambientalmente sustentável”, observa Fátima Tosini na tese. Segundo a pesquisadora, a problemática ambiental foi incorporada às teorias econômicas de forma ampla nos últimos 40 anos. Os pontos de partida foram o relatório do Clube de Roma (“Limites do Crescimento”) publicado em 1972 e a realização, no mesmo ano, da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente em Estocolmo. “A reflexão sobre como conciliar o crescimento econômico com a preservação de recursos naturais levou à construção do conceito de ‘desenvolvimento sustentável’ nos anos 1970”. Citando Ademar Romeiro, a autora da tese explica que para ser sustentável o desenvolvimento deve ser economicamente sustentado (ou eficiente), socialmente desejado (ou includente) e ecologicamente prudente (ou equilibrado). “Segundo o relatório do Unep [United Nations Environment Programme] de 2011, a escala de financiamento necessária para a transição até uma economia verde é de U$ 1,3 trilhão por ano, o equivalente a 2% do PIB mundial. Estima-se que 80% deste capital viriam das instituições financeiras privadas – mas como levá-las a financiar a transição?” A analista comenta que nessas quatro décadas em que os mecanismos de mercado foram hegemônicos, os problemas ambientais cresceram continuamente e as crises financeiras são cada vez mais frequentes. “Na primeira parte da tese, faço uma abordagem teórica para mostrar que o uso exclusivo de mecanismos de mercado não é capaz de direcionar o capital financeiro para investimentos seguros, incluindo atividades e projetos ambientalmente sustentáveis. O sistema financeiro não consegue se autorregular.” A pergunta que Fátima Tosini colocou para si mesma é se cabe ao Estado regular os aspectos ambientais no sistema financeiro para que este se torne, efetivamente, o intermediador dos recursos. “Uma dificuldade para a abordagem teórica é que a literatura trata desses temas separadamente. O único autor que analisa questões ambientais, sociais e financeiras de forma conjunta é Karl Polanyi, mas em linguagem própria da época, a década de 1940, quando o problema ambiental não tinha essa dimensão de agora.” A pesquisadora explica que Polanyi considerava o meio ambiente como natureza, os aspectos sociais como relativos ao mercado de trabalho e o setor financeiro com foco em seu produto, o dinheiro. “Mesmo assim, ele foi um visionário. Enxergou com muita antecedência que natureza, trabalho e dinheiro eram essenciais para

Reunião de indígenas mundurukus com representantes do governo federal, em Brasília, para discutir a suspensão de empreendimentos energéticos na Amazônia

o funcionamento da economia capitalista, e que esses três elementos não poderiam ser mercantilizados, ou seja, regidos pelos mecanismos de mercado, o que levaria ao caos. E que o Estado deveria regular.” A “teoria do duplo movimento”, acrescenta a economista do BCB, ajudou-a a entender como os aspectos ambientais foram inseridos no setor financeiro, por meio da autorregulação. “De um lado, a sociedade se movimenta exercendo pressão para proteger seus valores, direitos e a natureza; e do outro, o mercado faz um contramovimento, instituindo a autorregulação, na tentativa de manter os elementos essenciais da economia e reger natureza, trabalho e dinheiro sem a presença do Estado.” Na opinião de Fátima Tosini, a teoria de Polanyi é confirmada pelos movimentos sociais em defesa do meio ambiente a partir da década de 70, que coincidem com o contra-movimento do mercado em busca da autorregulação. “O sistema financeiro passou a estabelecer critérios para a concessão de crédito, movimento que cresceu muito a partir de 2003, com a adoção dos ‘Princípios do Equador’ pelos maiores bancos do mundo. Esse acordo estabeleceu como padrão global que os projetos financiados sejam desenvolvidos de forma social e ambientalmente responsável.” Este padrão foi adotado em vários países e a pesquisadora atenta que o Brasil, especificamente, vivia um momento de grande avanço dos bancos estrangeiros, que para cá trouxeram os mesmos princípios, induzindo os nacionais a seguir seus passos. “A adesão de grandes conglomerados financeiros como Banco do Brasil, Itaú e Caixa foi significativo para a introdução da autorregulação no nosso sistema. Vale ressaltar que não se trata de crédito comum e sim de ‘project finance’, inicialmente de 50 milhões de dólares e depois reduzido para 10 milhões”.

PESQUISA DE FÔLEGO Para chegar à conclusão de que a autorregulação, por si só, não é capaz de mover o capital do setor financeiro na direção da sustentabilidade ambiental, a economista

realizou pesquisa de fôlego tanto no âmbito nacional como internacional. No Brasil foram colhidas informações de 16 instituições financeiras, com pesquisa de campo em nove delas: Bradesco, Itaú Unibanco, Santander, Citibank, Rabobank, BNDES, Caixa, Banco do Brasil e a Agência de Fomento de Desenvolvimento Paulista (Desenvolve SP). A autora coordenou essa pesquisa nacional como funcionária do Departamento de Normas do BCB, no âmbito de um projeto corporativo denominado “Responsabilidade socioambiental do sistema financeiro”, que incluiu um workshop. “Se por um lado, a pesquisa identificou falhas e ausência de padrão mínimo nas práticas socioambientais dos bancos, por outro, o workshop possibilitou que instituições financeiras de diversos segmentos e associações fossem ouvidas. Uma das questões discutidas foi se o Banco Central não deveria, em sua competência de regulador, criar normas estabelecendo um padrão mínimo de práticas socioambientais para as instituições do Sistema Financeiro Nacional”, informa Fátima Tosini. No plano internacional a pesquisa consistiu de visitas, entrevistas e análises de informações sobre práticas ambientais disponibilizadas por dez bancos e uma cooperativa de crédito de seis países. A pesquisa de campo, entrevistando 15 organizações, se deu no mercado de Londres. Eram dois os objetivos da autora: avaliar se a autorregulação conseguiu induzir o sistema financeiro a se tornar intermediador de recursos; e fazer uma comparação com países que adotaram a regulação – como Coreia do Sul, China, Indonésia, Nigéria e Bangladesh, participantes de um fórum em Pequim. “As pesquisas indicam que os países mais bem-sucedidos são aqueles que têm os aspectos ambientais regulados pelo Estado, com a adoção de políticas de comando e controle – ‘isso pode, isso não pode’ – e de incentivos econômicos. Conclui-se que é preciso regular não apenas o sistema financeiro; é preciso uma regulação coerente com a do setor produtivo. Cria-se assim um ambiente institucional

favorável, no qual a autorregulação, que teve um papel importante no processo de conscientização da problemática ambiental, torna-se um complemento importante”, diz a pesquisadora.

AS

CONTRADIÇÕES

Outra observação da economista é que o setor financeiro possui uma lógica e uma dinâmica próprias, em busca de alta liquidez e no curto prazo, ao passo que as práticas ambientalmente sustentáveis são intensivas em capital financeiro, com resultados de longo prazo e com grande grau de incerteza. “Por isso, se o Estado não regular as práticas no setor e não criar incentivos econômicos para reduzir essa incerteza, não há como mover o capital rumo à sustentabilidade; ele só vai se for induzido.” Fátima Tosini aponta ainda as contradições existentes dentro do próprio Estado, como a de estabelecer uma política de redução da emissão de gases de efeito estufa e, ao mesmo tempo, criar incentivos enormes para a exploração de petróleo e gás, vilões das mudanças climáticas. “É o caso do Brasil, onde há regulação do setor financeiro e do setor produtivo, mas uma regulação esquizofrênica. A usina de Belo Monte é mais um exemplo dessa esquizofrenia, com o governo atraindo investimentos de porte do setor financeiro na construção, apesar dos esperados impactos ambientais. Isso acontece também em países adiantados em relação a incentivos para uma matriz energética mais sustentável e que, no entanto, subsidiam o petróleo.”

Publicação Tese: “A sustentabilidade ambiental no setor financeiro: da autorregulação à regulação” Autora: Maria de Fátima Cavalcante Tosini Orientador: Bastiaan Philip Reydon Unidade: Instituto de Economia (IE)


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Campinas, 2 a 8 de setembro de 2013

Tese avalia a carga física de trabalho na lavoura de café

Foto: Antoninho Perri

Estudo da Feagri faz um raio-X das atividades desempenhadas pelos trabalhadores do setor MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br

brasileiro consome, em média, 83 litros de café ao ano, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic). Cada vez que leva uma xícara à boca, no entanto, o consumidor dificilmente se lembra de que na base da cadeia cafeeira existe um batalhão formado por milhões de trabalhadores rurais, que cumprem tarefas frequentemente fatigantes e, não raro, causadoras de doenças ocupacionais. Ao contrário da maioria dos apreciadores da bebida, o fisioterapeuta e educador físico Marco Antônio Gomes Barbosa sempre esteve atento às atividades desempenhadas por esses agricultores. Tanto é assim que ele investigou as características da carga física de trabalho na lavoura café, sob a perspectiva da ergonomia, em sua tese de doutorado, defendida recentemente na Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Unicamp. A pesquisa de Barbosa foi desenvolvida com a participação de 12 trabalhadores vinculados à Associação dos Agricultores Familiares de Santo Antônio do Amparo, cidade localizada no Sul de Minas Gerais, região responsável pela produção de alguns dos melhores cafés do Brasil. Os agricultores, que atuam em sete propriedades produtoras de café, foram avaliados durante a realização de diferentes tarefas, como adubação a lanço e foliar, desbrota, aplicação de herbicida e colheita, entre outras. “Procuramos avaliar tanto a postura quanto as ações operacionais dos trabalhadores”, explica o autor da tese, que contou com a orientação do professor Roberto Funes Abrahão e coorientação do professor Mauro José Andrade Tereso. Segundo o professor Mauro Tereso, o estudo fez uso de diferentes metodologias, que se complementaram. Os cafeicultores tiveram, por exemplo, a frequência cardíaca aferida durante o expediente de trabalho. Além disso, as atividades foram filmadas e depois analisadas por um software denominado CAPTIV L3000, que gerou dados estatísticos e historiogramas, além de ter permitido uma descrição pormenorizada das tarefas executadas. Ao final do dia, os trabalhadores também receberam diagramas, nos quais apontavam quais regiões do corpo apresentavam dores ou desconfortos.

“Nós ainda perguntamos a esses trabalhadores que percepção eles tinham acerca do grau do esforço despendido [leve, médio ou severo]”, acrescenta o autor da tese. O uso das metodologias, entende Barbosa, enriqueceu muito o trabalho e gerou uma massa de dados relevante, que permitiu fazer uma espécie de raio-X das atividades desempenhadas pelos trabalhadores rurais. Um dado importante relacionado ao estudo é que as tarefas foram cumpridas em duas condições: em terreno plano e em terreno inclinado. A hipótese adotada pelo pesquisador e orientadores era de que haveria diferença na resposta fisiológica entre uma situação e outra. Para surpresa deles, no entanto, não foram registradas diferenças estatísticas significativas. Depois de analisarem detidamente os dados, os cientistas concluíram que as alterações não foram importantes por causa da estratégia de trabalho adotada pelos cafeicultores. Conforme o professor Mauro Tereso, os pés de café são plantados em curva de nível. Dessa forma, na maior parte do tempo, os trabalhadores atuam em terreno plano. “Somente depois de fazer a colheita ou adubação numa rua, por exemplo, é que eles sobem para outra, onde vão permanecer por mais um longo período atuando em nível. Isso significa que esses trabalhadores utilizam o conhecimento adquirido ao longo de anos de prática para criar estratégias que ajudam a preservar o seu corpo e energia”, afirma o docente. Barbosa aponta outro tipo de manobra empregada pelos cafeicultores familiares para evitar o esgotamento físico. No caso de adubação a lanço, eles deixam uma quantidade de adubo em cada rua de café. Somente depois é que passam lançando o produto no solo. “Esse cuidado prévio faz com que o trabalhador carregue menos peso durante as tarefas, o que reflete positivamente na sua produtividade e também no gasto energético”, diz. O autor da tese revela esperar que seu estudo possa contribuir futuramente para que a atividade dos trabalhadores na cafeicultura ganhe em qualidade. Isso pode se dar de algumas maneiras, como esclarece o professor Mauro Tereso. Uma delas é o que os especialistas chamam de devolutiva. Em outras palavras, sempre que possível os integrantes dos Fotos: Antonio Scarpinetti

O professor Mauro Tereso, coorientador da pesquisa: lavradores criam estratégias que ajudam a preservar o corpo e a energia

Marco Antônio Barbosa, autor do trabalho: expectativa de que o estudo contribua para que a atividade dos trabalhadores na cafeicultura ganhe em qualidade

Trabalhador na lavoura de café, na região de Campinas: estudo analisou lavradores em diferentes tarefas, entre as quais colheita, adubação, desbrota e aplicação de herbicida

grupos liderados pelos professores Mauro Tereso e Roberto Abrahão compartilham os resultados das pesquisas com as pessoas que colaboraram com elas. O objetivo é fazer com que o conhecimento gerado pelos estudos possam ser apropriados e utilizados, em alguma medida, por esses colaboradores. Em novembro, Barbosa fará a apresentação da sua tese na Associação dos Agricultores Familiares de Santo Antônio do Amparo. “Queremos que os principais dados apurados cheguem de forma clara ao conhecimento dos trabalhadores rurais daquela região. Espero que a iniciativa possa contribuir para a melhoria das condições de trabalho deles”, imagina o autor da tese.

CONCEITOS

ERGONÔMICOS

Segundo o professor Mauro Tereso, a pesquisa também pode colaborar ao oferecer elementos para que projetistas concebam ferramentas e equipamentos dotados de conceitos ergonômicos. “Esse aspecto é muito importante. Está comprovado que os projetos que contam com a participação de um ergonomista apresentam melhores resultados, visto que a possibilidade de erro é menor e a necessidade de promover eventuais correções, também”, pontua o docente da Feagri. Por último, mas não menos importante, a tese de Barbosa também pode fornecer subsídios para a definição de políticas públicas que concorram para oferecer melhores condições de trabalho no campo, na cafeicultura em particular. Embora a questão da epidemiologia não tenha feito parte da pesquisa, o professor Mauro Tereso lembra que o trabalho na agricultura é um dos que acarretam, no Brasil, um elevado índice de doenças ocupacionais. “Lembrando que as informações sobre esse setor não são as mais precisas, pois no país ainda há um enorme contingente de trabalhadores rurais sem carteira de trabalho assinada. Com isso, a notificação sobre doenças ocupacionais ou mesmo acidentes de trabalho fica aquém do que realmente acontece”.

O trabalho desenvolvido por Barbosa foi indicado pela Pró-Reitoria de Pesquisa da Universidade Federal de Lavras (UFLA), onde ele é docente, para representar a instituição no prêmio Péter Murányi, que é gerido pela fundação de mesmo nome. Concedido anualmente, o objetivo da premiação é distinguir, em sistema de rodízio, iniciativas inovadoras nas áreas de educação, saúde, alimentação e desenvolvimento científico & tecnológico. A edição de 2014 contemplará um projeto ou pesquisa na área da Saúde. Para Barbosa, somente o fato de a tese ter sido indicada pela UFLA para concorrer ao Péter Murányi já representa um importante reconhecimento ao trabalho. “Fico muito satisfeito, pois sempre tive uma atenção especial em relação aos trabalhadores na lavoura do café. Numa reunião que tive com representantes dessa categoria, um deles me disse algo que me deixou muito satisfeito. Segundo ele, normalmente os cientistas vão para a plantação e enxergam o café, mas eu fui para o campo e enxerguei os trabalhadores”, conta. Além disso, a tese de Barbosa também despertou o interesse de pesquisadores do Centro de Estudo de Café da própria UFLA, que deverá aproveitar os dados gerados em novas investigações. De acordo com o professor Mauro Tereso, o projeto de pesquisa desenvolvido na Feagri foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Já Barbosa contou bolsa concedida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão vinculado ao Ministério da Educação.

Publicação Tese: “Caracterização da carga física de trabalho na cafeicultura do Sul de Minas Gerais” Autor: Marco Antônio Barbosa Orientador: Roberto Funes Abrahão Coorientador: Mauro Tereso Unidade: Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri)


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Campinas, 2 a 8 de

Brasil vive crise d política, diz Rach

Livro coorganizado pela cientista política da Unicamp ajuda a entender antecedent A desconfiança política é um fenômeno associado à percepção da ausência de representação, de distância da política, de resposta ineficaz das instituições às demandas básicas da população, constituindo uma lacuna entre os cidadãos e o sistema, uma incongruência forte entre cidadãos e Estado.” A avaliação é da cientista política Rachel Meneguello, docente do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, coordenadora do Centro de Estudos de Opinião Pública (Cesop) e coorganizadora do livro “A Desconfiança Política e os seus Impactos na Qualidade da Democracia”, que acaba de ser lançado pela Editora da Universidade de São Paulo (Edusp). Baseado em uma pesquisa realizada no Brasil sobre desconfiança dos brasileiros nas instituições democráticas, em 2006, com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), o livro reúne textos de oito pesquisadores que escrevem sobre democracia, representatividade, “cidadão crítico”, além da percepção dos brasileiros a respeito da Justiça, polícia e dos serviços públicos. Se tivesse saído antes das manifestações de rua ocorridas neste ano, teria ajudado a entender um pouco melhor, quase como uma previsão, as origens dos múltiplos protestos que tomaram conta do país. A crise de confiança política não é de hoje, muito menos é uma exclusividade do Brasil; é mesmo uma questão central para as sociedades democráticas, como destaca a autora, que assina o livro com o professor José Álvaro Moisés, da Universidade de São Paulo (USP), diretor científico do Núcleo de Políticas Públicas (Nupps) da instituição. “Estamos em uma fase de mudança que resulta em uma grande crise de desengajamento cívico; estamos desengajados civicamente”, afirma Meneguello. Leia a entrevista: ALESSANDRO SILVA alessandro.silva@reitoria.unicamp.br

Jornal da Unicamp – Como nasceu a ideia do livro? Rachel Meneguello – O livro é fruto de um projeto temático da Fapesp, que eu e o professor José Álvaro Moisés [coordenador] desenvolvemos, com a participação do Nupps [Núcleo de Políticas Públicas, da USP) e do Cesop [Centro de Estudos de Opinião Pública, da Unicamp]. Em 2006, fizemos uma pesquisa nacional com dois mil entrevistados e um dos principais temas foi investigar do que se tratava democracia para as pessoas, e quais seriam as bases da confiança política para constituição da legitimidade do sistema político. Nós sabemos que o apoio à democracia é um fenômeno crescente no Brasil, na América Latina, e em vários outros países de democratização recente. Ao mesmo tempo, as pessoas são muito insatisfeitas com o funcionamento do regime, com a forma como funcionam as instituições, com os serviços em geral do Estado. Assim, no projeto, buscamos, por um lado, entender a natureza das relações que explicariam os determinantes da avaliação predominantemente negativa das instituições encontrada no cenário brasileiro e, por outro, compreender as associações da atitude de desconfiança com um conjunto de outras atitudes, opiniões e comportamentos do público relacionados ao regime democrático. JU – E o que, de fato, encontraram na pesquisa? Rachel Meneguello – Para os vários temas analisados e associados com o debate sobre a democratização, encontramos que as atitudes de confiança ou desconfiança política não constituem isoladamente explicações suficientes. Seus determinantes

recorrem a múltiplos fatores, como as dimensões socioeconômicas e demográficas, a avaliação do desempenho da economia, da política e de governos específicos, assim como os fatores associados com a cultura política. Esse conjunto de relações explicativas responde à própria natureza do fenômeno estudado: a desconfiança política é estrutural e afeta a grande maioria das instituições. Além disso, ela não é um fenômeno transitório, associado a uma situação específica, como denúncias de escândalos ou crises políticas. A desconfiança é um fenômeno persistente da relação entre os cidadãos brasileiros e as instituições, tal como já mostravam as pesquisas conduzidas ao longo das últimas duas décadas. [No livro, os autores analisam questões como o fenômeno da adesão ao regime democrático e da legitimidade política; as relações entre corrupção e democracia; o papel da mídia e a confiança política; confiança, cidadania, participação e envolvimento político; confiança na justiça e na polícia e, finalmente, a avaliação do desempenho de ações estatais observadas através dos serviços públicos]. Com relação ao sistema representativo, encontramos que, apesar das inquestionáveis conquistas de procedimentos e mecanismos democráticos e do crescente apoio à democracia no país, esse contexto não foi capaz de desfazer a percepção negativa que se tem do Congresso e das instituições representativas. Foi esse cenário que vimos em junho, nas manifestações de rua no Brasil, quando grupos de manifestantes excluíam os partidos como sujeitos legítimos dos protestos. Mas a crítica aos políticos e ao sistema representativo não é de hoje. Se você toma pesquisas de décadas anteriores, a percepção negativa da política institucional já estava presente. Queríamos saber até

A democracia é um regime que requer altos níveis de confiança pública nos mecanismos institucionais de formação de governos

que ponto isso poderia estar se transformando no curso da consolidação democrática, e observamos que esse processo não alterou a percepção que se tem da política institucional. O livro apresenta reflexões que se utilizam de dados de 2006, mas que dão uma ideia de quais são as bases potencialmente explicativas do que hoje estamos vendo no país. No caso dos serviços públicos, em um dos capítulos, aponta-se que os indivíduos mais escolarizados e com maior estímulo para busca de informações políticas são os mais críticos às ações estatais. JU – Como é possível definir o que é confiança e desconfiança no contexto da democracia? Rachel Meneguello – A confiabilidade no funcionamento do sistema é fundamental para a credibilidade na democracia. É um fenômeno necessário para que você apoie a maneira como as coisas vêm funcionando. A confiança é uma dimensão que regula a relação entre pessoas, amigos, parentes, e refere-se às expectativas que as pessoas têm a respeito do comportamento dos outros com quem convivem. É preciso confiar nas pessoas para que seu cotidiano tenha parâmetros estáveis de funcionamento e é preciso confiar nas instituições para que o cotidiano tenha bases suficientes para que o sistema seja apoiado. A democracia precisa desse comprometimento do cidadão que, por sua vez, constitui-se com a crença de que o papel dos intermediários, ou instituições, é desempenhado adequadamente. Assim, é com essa expectativa que as pessoas deveriam procurar a justiça, a polícia, deveriam votar e procurar seus representantes. JU – E quando falamos de perceber o funcionamento das instituições, estamos tratando de um processo de múltiplas influências, não só apenas da mídia? Rachel Meneguello – No processo de formação de opinião, o papel da mídia é fundamental, mas não é o único. A mídia tem sido vista como responsável por alimentar o cinismo e a desconfiança entre os cidadãos ou, por outro lado, como fonte de informações capaz de estimular o seu engajamento político. Os estudos no âmbito do projeto, nessa direção, apontam que as mensagens da mídia interagem com outras dimensões, como o apoio aos governos e o grau de sofisticação política das pessoas. Há ainda a experiência dos indivíduos com as próprias instituições, como ocorre no caso dos serviços públicos e da justiça.

JU – No cenário brasileiro, há confiança ou desconfiança nas instituições? Rachel Meneguello – Desconfiança. Esse é o problema. A democracia é um regime que requer altos níveis de confiança pública nos mecanismos institucionais de formação de governos, em razão da delegação de soberania e de poder que os cidadãos fazem aos seus representantes eleitos. Mas essa desconfiança não é acompanhada pela opinião de que é possível o país viver sem Congresso e sem partidos; a grande maioria das pessoas afirma a importância da presença das instituições representativas e esse é o ponto interessante. Nos mais de 25 anos de democracia constituiu-se um significativo apoio normativo à democracia e às instituições representativas. Os dados obtidos mostram que os cidadãos brasileiros apoiam a presença dos partidos, apoiam a existência do Congresso, mas estão completamente insatisfeitos e desconfiados. São as instituições que acolhem as mais negativas avaliações sobre seu desempenho: apenas 19% do total de entrevistados avaliam positivamente os partidos, e 28% avaliam positivamente o Congresso, contra, por exemplo, a instituição da Igreja, com uma avaliação de mais de 87%. Constituiu-se ao longo desse período uma importante defasagem entre a percepção da necessidade das instituições e a avaliação de sua atuação e desempenho. JU – Existe ume relação entre confiança política e participação, mobilização? Rachel Meneguello – Esse cenário é mais complexo, porque as dimensões da participação e mobilização estão ligadas à capacidade de engajamento das pessoas. Isso tem relação direta com os graus de associativismo, que por um lado, encontra hoje baixos níveis no Brasil e no mundo em suas formas mais convencionais, como a participação em sindicatos e associações.


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setembro de 2013

de confiança hel Meneguello

tes que desencadearam as manifestações de rua ocorridas no país Foto: Antoninho Perri

Se as novas tecnologias e redes sociais agilizam mobilizações e ações políticas, falta-lhes capacidade de integrar e agregar demandas

A cientista política Rachel Meneguello: “A desconfiança política é estrutural e afeta a grande maioria das instituições”

Por outro lado, há uma capacidade inovadora nas novas formas de mobilização viabilizadas pelas novas tecnologias. De toda forma, no caso das recentes mobilizações que testemunhamos, entendo que traduzem, em parte, um contexto de forte desengajamento cívico, que resulta da incapacidade dos partidos, dos políticos e das instituições de intermediar o descontentamento e a crítica. Cabe apontar que esse é um fenômeno amplo, encontrado nos vários países, e relacionado à forma do governo representativo. A desconfiança, o desengajamento cívico e o distanciamento com a política estão interligados. Um não causa o outro, mas estão conectados.

JU – E qual o risco disso? Rachel Meneguello – Se esse cenário adquire patamares altos, condiciona-se a legitimidade democrática. A legitimidade democrática deve ser entendida como um tipo ideal relacionado às crenças dos cidadãos de que a política democrática e as instituições sobre as quais ela se estabelece são a forma mais apropriada para estruturar-se o sistema político. Dessa forma, ela precisa de bases de sustentação. Mas isso não significa que o regime está em risco de ruptura, não há indicadores que apontem esse cenário. O que está em risco é a qualidade da democracia. No caso do sistema representativo,

Os cidadãos apoiam a presença dos partidos, apoiam a existência do Congresso, mas estão completamente insatisfeitos e desconfiados

PREFERÊNCIA POR REGIME POLÍTICO NO BRASIL 1989 - 2006(%) 1989

1990

1993

Democracia

43,6

54,7

57,9

Ditadura

19,4

16,7

13,7

Indiferença

21,3

17,1

Não respondeu ou não sabe

15,7

11,5

Fonte: “A Desconfiança Política e os seus Impactos na Qualidade da Democracia”, Edusp (pág. 65)

1997

2006

56,1

71,4

12,3

14,2

13,7

16,9

6,9

14,7

14,7

7,6

se não houver confiança das pessoas nos partidos, o risco de cair em sistemas populistas é grande. O populismo é uma vertente que não interessa ao funcionamento democrático. Ele prescinde da relação formal com os cidadãos. A liderança personalista que se sustenta sem partidos é um risco. JU – Por que é tão importante ter as pessoas confiando nas instituições? Rachel Meneguello – As instituições políticas são os intermediários entre os cidadãos e o Estado, elas conferem as garantias de direitos e procedimentos e é a percepção de que de fato elas se desempenham nessa direção é o que garante o compromisso de cooperação dos cidadãos com o regime. Se as novas tecnologias e redes sociais agilizam mobilizações e ações políticas, falta-lhes capacidade de integrar e agregar demandas de forma a canalizá-las para o sistema político. São as instituições que têm essa função. JU – O livro aborda a questão do “cidadão crítico”, um interessante personagem para as sociedades democráticas. Como podemos defini-lo? Rachel Meneguello – São cidadãos que acreditam na democracia, mas são altamente críticos sobre o seu funcionamento. Não entendem que os partidos os estejam representando adequadamente, não entendem que o governo responda adequadamente às demandas, não entendem que o cotidiano e o bem-estar estejam sendo devidamente providos pelo Estado, e etc. Entendem que há lacunas importantes para esse grau de congruência entre cidadãos e Estado. JU – Esse cidadão crítico é o mesmo que foi para as ruas brasileiras em junho? Rachel Meneguello – Não creio que seja possível juntar todos os manifestantes em um único conceito. Com toda certeza, boa parte deles era esse cidadão crítico. Mas entendo que o que observamos ali foi um quadro de insatisfação generalizada baseado em múltiplas demandas expressa a partir de formas distintas de organização. Ainda é preciso maior clareza sobre as mobilizações. JU – Podemos dizer que o desafio para as sociedades democráticas é aprender a conviver com esse cidadão crítico? Rachel Meneguello – A democracia representativa é um sistema que originalmente distancia o indivíduo da política, porque ele confere a sua soberania de escolha e decisão ao representante eleito. A cobrança pelo desempenho de seus agentes e mecanismos é consequência das suas bases de funcionamento. Esse movimento crítico pela qualidade da democracia é parte integrante do funcionamento democrático.

Destaque “CONFIANÇA em linguagem comum designa segurança de procedimentos diante de diferentes circunstâncias que afetam a vida das pessoas. Ela se refere às expectativas que as pessoas alimentam a respeito do comportamento dos outros com quem convivem e interagem; e diz respeito à ação desses outros quanto aos seus interesses, aspirações ou preferências. Nas ciências sociais, o interesse pelo conceito está associado à preocupação com os processos informais por meio dos quais as pessoas enfrentam incertezas e as imprevisibilidades que decorrem da crescente complexificação da vida, no contexto de um mundo crescentemente globalizado, interdependente e fortemente condicionado por avanços tecnológicos que afetaram profundamente a comunicação social [...]” José Álvaro Moisés e Rachel Meneguello

SERVIÇO Livro: “A Desconfiança Política e os seus Impactos na Qualidade da Democracia” Autores: José Álvaro Moisés e Rachel Meneguello (orgs) Editora: Edusp Preço: R$ 56,00 Saiba mais: www.edusp.com.br


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Campinas, 2 a 8 de setembro de 2013

Marçal, um ‘mestre’ na

‘fábrica de engenheiros’ Fotos: Antoninho Perri

Funcionário da Unicamp há 42 anos, técnico participa de aulas práticas em laboratório MARIA ALICE DA CRUZ halice@unicamp.br

evoto de Santo Reis, José Reinaldo Marçal ingressou na Unicamp em 6 de janeiro de 1972, dia em que a Igreja católica dedica aos três reis magos. Inseriu-se no mundo do trabalho cedo, aos 14 anos, na Faculdade de Engenharia Civil, em Limeira. Ainda lembra do dia em que Evangelina Mauro, coordenadora dos patrulheiros em Limeira, selecionou cinco adolescentes para trabalhar na FEC. “O campus era muito pequeno. Tinha poucos funcionários. Nada a ver com o que se tornou a Engenharia Civil hoje”, recorda. Dos cinco, apenas ele permanece no quadro de servidores da Universidade. Hoje, completa 42 anos no quadro de funcionários da Universidade e nem pensa em aposentadoria. “Não quero ficar dormindo no sofá.” Em poucos meses de trabalho, trocou as tarefas administrativas na Biblioteca da FEC pelo trabalho no Laboratório de Materiais da faculdade, a convite dos professores Vitor Antonio Ducatti e Gilson Battiston Fernandes. “No meu primeiro dia de trabalho no laboratório, o professor Ducatti me pediu para realizar um ensaio de flow, que consiste em medir a consistência da argamassa, e logo em seguida moldar alguns corpos de prova. Já me assustei porque nunca tinha visto e nem imaginava como fazer, mas ele me explicou e eu concluí o ensaio mais ou menos.” Foi assim que começou a fazer corpos de prova de concreto, participar das aulas práticas no laboratório e trabalhar nas pesquisas ligadas ao laboratório, como mestrados e doutorados. “E a fabricar engenheiros”, como ele mesmo brinca.

CONTRIBUIÇÃO SOCIAL Quando vê o nome de alguns alunos em grandes projetos de construção civil, Marçal sente que, de fato, é um prazer saber que fez parte na vida destes engenheiros e arquitetos. Para quem nem tinha ideia do que era ser técnico de laboratório, e até se escondeu dos alunos na primeira aula prática, porque morria de vergonha de estar de frente de muita gente, ver seu nome nos agradecimentos em pesquisas realizadas no laboratório, como os testes para a linha amarela do metrô de São Paulo, é como ver somados quilômetros infinitos de uma trajetória de 42 anos. “Pode ser que alguns não reconheçam, mas sempre que vejo o resultado absoluto de uma pesquisa iniciada na FEC e que passou por testes no laboratório, penso que tem um pouquinho de meus dias naquela obra. Ajudamos na formação de pessoas que vão trabalhar na sociedade. Esta, a meu ver, é nossa contribuição social.” Hoje, Marçal agradece ao professor Walter Savassi, então chefe do departamento, por impedir de desistir da carreira técnica, quando ele, ainda garoto e novato, quebrou uma ferramenta importante para a rotina do laboratório. “Eu tinha medo de um dos professores e queria desistir de trabalhar no laboratório, sentia vergonha em revelar isso ao professor Walter Savassi. Quando resolvi confessar que eu tinha medo do professor Gilson, o professor Savassi riu muito e disse que o homem a quem eu temia era o docente mais legal da faculdade”, recorda. O técnico lembra também de agradecer aos docentes Vitor Antonio Ducatti e Gilson Battiston Fernandes.

José Reinaldo Marçal em dois momentos: quando a FEC se transferiu de Limeira para Campinas, nos anos 80 (ao lado), e hoje

Na cabeça dos alunos, fica a pergunta sobre o nível de conhecimento de Marçal e seus amigos da área técnica do laboratório. Certa vez, Marçal foi questionado pela professora Gladis Camarini sobre quem o ensinou tantas coisas e como aprendeu a trabalhar no laboratório. A resposta rápida e certeira foi: “Com a força de vontade. Com dedicação. Não tinha quem ajudasse. Peguei o ritmo.” E, hoje em dia, o ritmo é exigido cada vez maior, pois a jovem, chamada Gladis Camatini, graduou-se como engenheira, mestre, doutora e tornou-se professora e coordenadora no Laboratório de Materiais. Confiante no trabalho que acompanhou sua trajetória acadêmica, Gladis deixa claro ao “subordinado” que ele só vai aposentar quando ela deixar o laboratório. Grato a todos que o deram oportunidade, ele faz questão de ressaltar seu crescimento no setor durante sua gestão. Foi ela quem o encaminhou para realizar estágio na Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP) e no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) de São Paulo quando era auxiliar de laboratório. Com a certificação dos estágios, ele pôde ser reconhecido como técnico na carreira de profissionais da Universidade. “É chefe, mas faz muitos anos que trabalhamos juntos e temos espaço para dialogar. Fiz testes para o mestrado e o doutorado dela inteiros.” Sem vaidade, acredita que o apoio de funcionários deve aparecer também em discursos de agradecimento pela conquista de prêmios. Quando os técnicos deixaram de ser lembrados na lista de colaboradores de uma pesquisa que conquistou um Prêmio Capes, Gladis não hesitou em enviar e-mail para a Universidade toda, evidenciando a importância da participação dos técnicos no trabalho. “Isso é gratificante. Mostra o apreço que ela tem por nós. Ela sempre nos respeitou, e isso se mantém.” A responsabilidade dos técnicos do Laboratório de Materiais de Construção e Arquitetura e de Estruturas da Engenharia Civil é muito importante para a formação dos alunos de graduação e pós-graduação. Por saber dos tantos anos de experiência, os professores precisam apenas informar o en-

saio a ser feito para que Marçal e os outros técnicos ligados ao laboratório preparem as aulas práticas e executem com eficiência. Quando olha a Estação do Metrô, lembra das visitas para conhecer o espaço para o qual fariam os ensaios sob a orientação dos professores que assinam o projeto. “Toda a instrumentação para medir a resistência do concreto foi feita aqui. Essa é a responsabilidade social de um técnico ao fazer a medição certa para garantir segurança à vida do usuário. Se a pessoa calcula um pilar de concreto errado, quem assinou tem de assumir. As peças de concreto utilizadas para a construção do metrô foram testadas aqui no nosso laboratório.”

RECONHECIMENTO Assim como a professora Gladis, todos os ex-alunos que hoje são professores na FEC passaram pelas aulas práticas ministradas no laboratório por Marçal. O professor do laboratório Armando Lopes é um deles. “Passamos muito tempo aqui e vivemos como uma família. Tem um aluno na graduação que eu preparei aulas para o pai dele assistir quando era graduando. É triste admitir, mas quando entrei aqui ele nem tinha nascido”, brinca. As manifestações de carinho e reconhecimento estão nas palavras de alguns docentes com os quais Marçal convive. “Dia des-

ses, um professor chegou e me viu dando explicações a um grupo de alunos. Ele não resistiu e recomendou: ‘Gente, preste atenção no que Marçal vai falar, pois, há 35 anos, ele deu uma aula para mim e hoje sou professor de engenharia.” Se alguém acha normal sentir adoração por esposa, filhos, mãe, pai, Marçal mostra que algumas coisas na vida também podem escrever uma história de amor. “Tenho carinho pela Universidade. Tenho adoração por Limeira.” E ai de quem ouse falar mal desses dois lugares. “Eu defendo, claro. Como a pessoa pode depreciar a cidade onde vive e seu local de trabalho, onde ganha o pão? Onde passa a maior parte do dia? Tem de abençoar e não maldizer.” O técnico, natural do Estado do Paraná, adotou Limeira há 50 anos. “Não tenho razão para sair de lá. Minha família toda está lá. Agora ganhei mais dois filhos – meu genro e minha nora. Além do mais, desde que a Engenharia Civil migrou para o campus de Barão Geraldo, temos transporte fretado, o que evita problemas com trânsito. É uma tranquilidade.” Marçal não tem os olhos fechados para a situação política e social da cidade, mas a relação forte do menino – conduzido pela mão de dona Evangelina, ainda trajado de farda e quepe – com a história promissora da Faculdade de Engenharia Civil o faz permanecer lá, apesar da distância percorrida diariamente até a Unicamp e de volta para a casa.


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Campinas, 2 a 8 de setembro de 2013

IFCH cria 1º programa no país de

história da arte não-europeia

Unicamp contará com professores estrangeiros para orientar alunos de pós-graduação na área Obras de arte africanas doadas por Rogério Cerqueira Leite: coleção do físico será a base do programa

Unicamp passará a oferecer uma pós-graduação em história da arte não-europeia, o primeiro curso do tipo no Brasil, a partir de 2014. A seleção de estudantes deve começar já neste semestre, disse ao Jornal da Unicamp a professora Claudia Valladão Mattos, do Instituto de Artes (IA) e do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH). O estudo da história da arte produzida fora da tradição europeia é uma tendência que vem se consolidando em várias partes do mundo, explica Claudia. “Nos últimos dez anos, mais ou menos, os cursos de história da arte no exterior passaram a expandir seus currículos e a contratar professores que trabalham fora da tradição europeia. Isso cada vez mais acontece nos grandes centros”. O programa de história da arte da Unicamp, estabelecido há duas décadas, trabalha, tradicionalmente, com duas linhas de pesquisa: Estudos da Tradição Clássica e Arte Moderna e Contemporânea. A pesquisadora diz que o Brasil está numa posição especial para ampliar esse leque: “Este é um país onde existe um legado cultural que vai muito além do desenvolvimento de uma arte europeia transplantada para o Brasil”. O novo programa tratará de Arte Pré-Colombiana e Ameríndia, Arte Africana, Teoria da Arte e Arte Japonesa. A Arte Africana tratará não apenas da arte afrobrasileira, mas também e principalmente da produção tradicional e contemporânea daquele continente. “Já existe uma grande coleção de obras afro-brasileiras no Museu Afro-brasileiro no Ibirapuera em São Paulo. Uma coleção excepcional”, disse a professora. “Mas não existem coleções públicas de arte africana no Brasil. E para entender a arte afro-brasileira, é muito importante a gente começar a pesquisar e entender o que de fato é essa produção na África. Quais são os grupos, quais as manifestações artísticas, e desenvolver isso”. A parte do programa de história da arte não-europeia dedicada à História da Arte Pré-Colombiana e à História da Arte Africana terá como base material inicial a coleção doada à Unicamp pelo físico Rogério César de Cerqueira Leite, composta por cerca de 500 peças africanas e 200 pré-colombianas. A arte japonesa foi incluída por conta da importância da cultura japonesa dentro do Estado de São Paulo. “Como professora de História da Arte, sempre recebo essa demanda”, explica a pesquisadora. “Os alunos gostariam de saber mais sobre arte japonesa. No Instituto de Artes, por exemplo, temos uma proporção significativa de estudantes de origem asiática. Esse foi um dos motivos para a gente desenvolver essa terceira linha.” Já a Teoria da Arte entra no cardápio para garantir o vínculo entre as diversas linhas. “A ideia da Teoria da Arte é justamente pensar como lidar com esse novo campo, como trabalhar com arte não-europeia dentro do campo de uma história da arte crítica”, disse Cláudia. “Porque a história da arte, enquanto disciplina, desenvolveu-se vinculada à tradição clássica, e àquilo que se costuma chamar de arte elevada, digna de figurar em museus.” Apontando para os catálogos da coleção de Cerqueira Leite, ela acrescenta que “tudo isso aqui não era arte. Não era considerado arte no século 19, quando a disciplina se desenvolveu”. Atualmente, ocorre um debate global sobre o campo, para “desenvolver novos métodos para abordar obras que estejam fora da tradição clássica”, nas palavras da professora. “Esse debate é muito importante para que a gente não divida em dois o programa e a formação dos nossos alunos, entre os que estudam a arte europeia e os que trabalham com essas novos objetos. Então, para manter o programa coeso e para que todos os alunos aproveitem integralmente do programa que oferecemos,

Fotos: Reprodução

CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

teremos o curso de teoria. Este será o lugar de integração e de debate sobre uma nova história da arte crítica”. Como há poucos especialistas na história das tradições artísticas não-europeias no Brasil, o novo programa da Unicamp trará à universidade, numa parceria com o Instituto Getty de Los Angeles, professores estrangeiros para lecionar nos dois primeiros anos de funcionamento da nova linha. “Fui, por três meses, pesquisadora convidada do Instituto Getty de Los Angeles. Enquanto estava lá, conversei com pessoas da fundação sobre o nosso programa de pós e sobre a coleção Cerqueira Leite, mostrei as obras que vinham para a Unicamp. O Getty já sentia falta da presença do Brasil no contexto das reuniões internacionais de história da arte, e mostraram grande interesse em trabalhar com o Brasil e com a Unicamp”. Com isso, Claudia e outros professores da Unicamp prepararam um projeto, que foi aprovado, pelo qual o Getty financiará a vinda de especialistas internacionais para iniciar o novo programa de história da arte não-europeia no Brasil. A pesquisadora disse que a vinda da coleção de objetos africanos e pré-colombianos para a universidade foi “crítica” para desencadear o projeto. “Infelizmente, até agora, objetos assim são pouco estudados, no Brasil, no contexto da história da arte. É óbvio que essa produção é estudada, mas em geral por antropólogos ou por historiadores que não têm o treino no campo da historia da arte, não usam métodos de historia da arte”.

De acordo com ela, a doação da coleção foi “o grande momento, o grande argumento” a favor da expansão do campo de História da Arte na Unicamp para além da tradição europeia. Essa expansão, disse Claudia, é “uma necessidade em termos de desenvolvimento da disciplina, pois no mundo inteiro isso está acontecendo. Porém, para além da necessidade de colocarmos o Brasil em sintonia com a comunidade científica internacional, sabemos que o país oferece um enorme potencial para pesquisas do gênero, devido à sua história e à enorme diversidade cultural que dela resultou. Esse potencial precisa ser contemplado”. “O grande diferencial, no programa de história da arte da Unicamp, sempre foi o desenvolvimento de pesquisas centradas na materialidade das obras”, disse Claudia. “Em geral não se estuda só o contexto em que a obra foi feita, mas a primeira tarefa é entender a forma, a textura, a materialidade, e o modo como os diferentes contextos são incorporados e organizados em um objeto”. O programa de História da Arte, em sua origem, aproveitou muito de uma parceria com o Museu de Arte de São Paulo (MASP), e com o tempo passou a colaborar com outras instituições também. “A gente estimula o aluno a escolher uma obra ou um conjunto de obras que tenha uma documentação e que ele possa investigar pessoalmente em sua materialidade”. A professora explica essa abordagem: “Um instrumento fundamental da história da arte é a descrição minuciosa da obra, Foto: Antoninho Perri

A professora Claudia Valladão Mattos, do IA e do IFCH: “Sabemos que o país oferece um enorme potencial para pesquisas do gênero”

para não perder de vista o objeto, que é o foco do trabalho”, disse. “A partir desse foco na materialidade da obra, pode-se ir além e se investigar, por exemplo, a história do objeto dentro de determinadas coleções, se perguntar por que aquela obra específica, com determinadas características formais e materiais pôde se tornar objeto de interesse para o colecionador, para o crítico ou para o público, etc. A partir desses questionamentos se pode visualizar a rede na qual essa obra se inseriu num determinado momento histórico”. Mas o foco, insiste ela, é sempre na obra, ou em um grupo de obras. E isso vale tanto para a arte europeia, quanto para a não-europeia, claro. “Essa é a perspectiva que predomina no programa. Portanto, o que fazer para ampliar o espectro de objetos com que trabalhar, se não havia grandes coleções de arte não europeia à disposição? Agora que temos as obras, o trabalho tornou-se viável.” A verba para a vinda dos professores estrangeiros em 2014 e 2015 já está garantida. O primeiro será o professor Adam Sellen, da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), que dará um curso de introdução à arte e cultura maia. “A gente espera que ele vá fazer o curso praticamente dentro da coleção. Ele é um pesquisador que trabalha frequentemente junto a museus e coleções”, disse a professora. O destino exato das peças da coleção Cerqueira Leite dentro da Unicamp ainda não está definido – talvez um novo museu seja construído para recebê-las, ou talvez elas sejam instaladas em um instituto de pesquisa – mas, de acordo com a pesquisadora, o doador já se prontificou a abrir a coleção para os estudantes, caso o espaço para as peças não esteja pronto até o início das aulas, em março do ano que vem. Claudia espera que, caso o destino final das peças doadas seja um museu, que o programa de pós-graduação trabalhe em proximidade com a nova instituição. “Que a gente possa colaborar, que o museu se envolva de alguma forma com o programa, para que a gente tenha um bom trânsito entre a coleção e o grupo de pesquisa, que é fundamental para manter a coleção viva e a pesquisa andando bem”. Estudantes poderiam, por exemplo, participar da curadoria de mostras específicas, ligadas a seus interesses de pesquisa. “Infelizmente ainda existe na universidade uma tendência a ver o campo das artes como mera atividade de extensão universitária, não de pesquisa, e acho muito importante que se reafirme o seu caráter de pesquisa. Se tivermos um museu, que ele acolha a pesquisa em arte e história da arte”. Esse novo programa de pós-graduação está sendo montado por cinco professores que serão os orientadores principais – com os professores estrangeiros como coorientadores – dos alunos matriculados. “Temos a esperança de que, com o apoio internacional e o caráter inovador, consigamos, no futuro, pelo menos um novo professor especialista”, disse Cláudia. “No momento não há professores de história da arte na Unicamp capazes de assumir a área de arte não-europeia. Um dos problemas fundamentais é que o Brasil ainda não formou, de fato, gente para isso, e são muito poucos os historiadores da arte brasileiros que se dedicam a estudar arte não-europeia”. Além dela, fazem parte do núcleo inicial Luciano Miggliacio, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP; Marcos Tognon, Pedro Paulo Funari e Omar Thomaz, da Unicamp.


10 Vida Painel da semana Teses da semana Livro da semana Destaques do Portal da Unicamp

Campinas, 2 a 8 de setembro de 2013

aa c dêi m ca

Painel da semana  Estruturação de Sistemas Lipídicos - Nos dias 2 e 3 de setembro, no Centro de Convenções da Unicamp, acontece o 3º Seminário sobre Estruturação de Sistemas Lipídicos. A abertura do evento será às 9h25. Entre os palestrantes estarão os professores K. Sato (Hiroshima, Japão), considerado a maior autoridade no mundo em polimorfismo de lipídios e o professor G. Mazzanti (Dalhousie, Canadá), especialista em cristalização. A organização é da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp, em conjunto com pesquisadores da FEQ, FEA, IFGW, do Cereal-Chocolate (Ital) e FCF-USP. O patrocínio é da Fapesp. Interessados em participar podem fazer inscrições pelo e-mail workshopchoco@feq.unicamp. br. Outras informações: 19-3701-6656.  ArteUniverCidade - É o titulo que sintetiza a proposta de um grande evento que o Instituto de Artes (IA) da Unicamp vai promover conjuntamente com USP e Unesp no Memorial da América Latina, em São Paulo, de 3 a 6 de setembro. O evento nasce da ideia original de dar visibilidade à produção artística dos alunos da Unicamp, levando-a do campus para a cidade, além de promover a troca de experiências e informações com alunos das outras duas universidades públicas paulistas. Leia mais: http://www.unicamp.br/ unicamp/noticias/2013/08/09/arteunivercidade-festa-com-alunosda-unicamp-usp-e-unesp  Oficina de Artes Visuais - O Centro Cultural de Inclusão e Integração Social (CIS-Guanabara) organiza nos dias 3, 10, 17 e 24 de setembro, das 14 às 17 horas, no Projeto “Terças com Arte”, uma oficina de artes visuais com a artista plástica Elizabeth Piva. A oficina será gratuita e os materiais serão fornecidos pelo CIS-Guanabara. O Centro Cultural fica na rua Mário Siqueira 829, no bairro do Botafogo, em Campinas. Estacionamento gratuito no local. Mais informações no site www.cisguanabara.unicamp.br  Defesa do consumidor - A Unicamp sedia em 4 de setembro, às 9 horas, no auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), o XI Seminário Internacional Proteste de Defesa do Con-

sumidor. O evento é promovido pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em Alimentação (NEPA) da Unicamp e pela Proteste Associação de Consumidores. Interessados em participar do seminário podem fazer inscrição pelo e-mail seminario@proteste.org.br.  A lei do acesso à informação e a cidadania brasileira - avanços e perspectivas - Tema será debatido em fórum organizado pela Coordenadoria Geral da Unicamp (CGU) e pela Ouvidoria da Unicamp, dia 5 de setembro, às 9 horas, no auditório do Centro de Convenções. Inscrições e outras informações no site do evento http://foruns.bc.unicamp.br/foruns/projetocotuca/forum/htmls_descricoes_eventos/mas02.html ou telefone 19-3521-5039.  Memorial Paulo Freire: Diálogo com a Educação - Fórum Permanente de Arte, Cultura e Educação acontece no dia 6 de setembro, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp. Inscrições, programação e outras informações na página eletrônica http://foruns.bc.unicamp.br/foruns/projetocotuca/forum/htmls_descricoes_eventos/arte56.html

Eventos futuros  (Con)Viver com Arte(Manhas) - Nos dias 9 e 10 de setembro o Labeurb realiza o evento (Con)Viver com Arte(Manhas), que busca celebrar as atividades realizadas no Projeto Barracão e debater seus resultados e desdobramentos. As incrições podem ser feitas no endereço http://www.labeurb.unicamp.br/barracao/. O Projeto ofereceu oficinas de cinema, artesanato, informática básica, edição de áudio e vídeo, desenho digital, leitura, contação de histórias, teatro infantil, fotografia e escrita. Mais de duzentos moradores da região dos DICs em Campinas, entre crianças, adolescentes e mulheres, participaram deste trabalho. A mesa de abertura ocorre às 9 horas, no auditório do Labeurb/Unicamp. Outras informações: telefone 19-35217945 ou e-mail publabe@unicamp.br  Encontro Regional Sudeste de História Oral - Com a temática “Educação das Sensibilidades: violência, desafios contemporâneos”, no dia 10 de setembro, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp, o Centro de Memória Unicamp (CMU) e a Associação Brasileira de História Oral (ABHO) organizam o X Encontro Regional Sudeste de História Oral. Mais informações no site do evento http://www.sudeste2013.historiaoral.org.br/, telefone 19-3521-5250 ou e-mail remaia@unicamp.br  Energia, biocombustíveis e sustentabilidade - O ‘XI Workshop Internacional Brasil/Japão: Energia, Biocombustíveis de Desenvolvimento Sustentável’ ocorre das 8 às 18 horas, dia 11 de setembro, na sede do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), em Caraguatatuba-SP. A organização é do IFSP, do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe) e da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp. Mais informações: 19-3521-1718.  Inovação do empreendedorismo no Brasil - No dia 12 de setembro, às 9 horas, no auditório da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA), acontece mais uma edição do Fórum Permanente de Empreendedorismo e Inovação com o tema Perspectivas e inovação do empreendedorismo no Brasil. Inscrições, programação e outras informações no http://foruns.bc.unicamp.br/foruns/ projetocotuca/forum/htmls_descricoes_eventos/evento46.html ou telefone 19-3521-5039.  Ciência & Arte nas Férias - A Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP) recebe, a partir de 19 de agosto, as inscrições para a edição de 2014 do Programa Ciência & Arte nas Férias. O Programa visa proporcionar aos alunos do ensino médio da rede pública, a oportunidade de participarem no desenvolvimento de projetos de pesquisa em laboratórios da Unicamp, durante o período de férias escolares. O Ciência & Arte ocorrerá de 8 de janeiro a 7 de fevereiro de 2014, sob a supervisão de professores e pesquisadores da Unicamp. Docentes ou pesquisadores da Unicamp devem encaminhar um único projeto à Pró-Reitoria de Pesquisa, através do

preenchimento do formulário eletrônico http://www.prp.gr.unicamp. br/faepex/pesquisa/auxCAF/loginFSP_CAF.php. Uma versão impressa (e assinada) também deve ser entregue ao Faepex, até 13 de setembro. O projeto envolve (no mínimo) dois bolsistas e só poderá ser submetido por docentes ou pesquisadores da Universidade. Eventualmente e mediante justificativa à coordenação do Programa, um laboratório poderá acolher até quatro alunos. No entanto, o montante de recursos destinado será o mesmo. Outras informações podem ser obtidas pelos telefones 19-3521-2973, 3521-4614 ou e-mail ciencianasferias@unicamp.br  Vamos conversar sobre epilepsia - Coordenado pelo neurologista Li Li Min, o evento “Vamos Conversar Sobre Epilepsia” acontece em 14 de setembro, às 8h30, no Anfiteatro 1 do conjunto de salas de aula da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. As inscrições podem ser feitas no Laboratório de Neuroimagem, localizado no Setor de Ressonância Magnética do Hospital de Clínicas (HC) ou pelo e-mail sonianevesromeu@gmail.com. A inscrição, cujo valor é de 25 reais, será aceita mediante envio da cópia do comprovante de depósito em nome de Assistência à Saúde de Pacientes com Epilepsia Banco Santander; Agência 0207; Conta corrente: 13.010204-6. Toda a arrecadação será revertida para ações sociais da Assistência à Saúde de Pacientes com Epilepsia (Aspe). Os 50 primeiros inscritos ganharão o livro GIS – Grupo de Interação Social. Li Li Min recebeu, em junho, em Montreal, o prêmio de Embaixador da Epilepsia no Brasil. O prêmio é concedido anualmente pelo International Bureau for Epilepsy e pela Liga Internacional contra a Epilepsia a 12 indivíduos que promovem, de forma notável, a causa da epilepsia em nível pessoal, nacional e internacional. As vagas para o “Vamos Conversar Sobre Epilepsia” são limitadas.

Livro

da semana

Almanaque

Histórias de ciência e poesia

Teses da semana  Engenharia Mecânica - “Desenvolvimento de correlações entre microestruturas de solidificação e resistências ao desgaste e à corrosão” (doutorado). Candidata: Emmanuelle Sá Freitas Feitosa. Orientador: professor Amauri Garcia. Dia 5 de setembro, às 9h30, na sala JE-2 da FEM.  Linguagem - “Os sentidos da pobreza: estado, mercado e ciência em palavras e fotografias” (doutorado). Candidato: Thiago Manchini de Campos. Orientadora: professora Carolina Maria Rodriguez Zuccolillo. Dia 3 de setembro, às 14 horas, na sala de defesa de teses do IEL. “As denominações do imigrante nas políticas de imigração no Estado de São Paulo: a produção da diferença” (doutorado). Candidata: Julie Kellen de Campos Borges. Orientadora: professora Carolina Maria Rodríguez Zuccolillo. Dia 4 de setembro de 2013, às 10 horas, na sala de videoconferência do Centro Cultural do IEL.  Matemática, Estatística e Computação Científica - “O Teorema de Comparação de Sturm e aplicações” (doutorado). Candidato: Yen Chi Lun. Orientador: professor Dimitar Kolev Dimitrov. Dia 5 de setembro de 2013, ás 14 horas, na sala 253 do IMECC. “Modelagem matemática do aumento de densidade de vegetação na amazônia e dinâmica populacional com competição intra e interespecífica” (mestrado). Candidato: Carlos Frank Lima dos Santos. Orientador: professor João Frederico da Costa Azevedo Meyer. Dia 5 de setembro, às 14 horas, na sala 221 do Imecc.  Química - “Imobilização de TiO2 p-25 em esferas de quitosana para uso em fotocatálise heterogênea” (mestrado). Candidata: Carolina Ferreira Torres. Orientador: professor Wilson de Figueiredo Jardim. Dia 2 de setembro, às 14 horas, no miniauditório do IQ. “Desenvolvimento e caracterização de formulações de fármacos pouco solúveis em água empregando espectroscopia de imagem e quimiometria” (doutorado). Candidata: Márcia Cristina Breitkreitz. Orientador: professor Ronei Jesus Poppi. Dia 6 de setembro, às 14 horas, no miniauditório do IQ.

Sinopse: Os cientistas nomeiam, organizam e classificam o mundo. E do mesmo modo os poetas — cada um com seus próprios truques — ensaiam o anúncio de uma dada verdade, não desprovida de beleza. Por isso as histórias deste Almanaque têm a ver com o amor, as bicicletas, os telescópios, os números, o café ou o cinema. E por suas páginas desfilam tanto Copérnico, Darwin ou Mendeleiev, quanto Leonardo da Vinci, Santos Dumont ou Sofia Kovalevskaya, muito bem acompanhados por Pablo Neruda, Fernando Pessoa e outros poetas. Ocorre que poesia e ciência são dois modos complementares de interrogar o universo. Autor: Juan Nepote Tradução: Márcia Aguiar Coelho Ficha técnica: 1a edição, 2012; 392 páginas; Formato: 14 x 21 cm; ISBN: 978-85-268-0996-3 Coleção Meio de Cultura Área de interesse: Divulgação Cultural e Científica Preço: R$ 54,00

Destaque do Portal

Reitor implanta câmara para aprovar convênios em um mês reitor da Unicamp, professor José Tadeu Jorge, assinou resolução determinando a criação da Câmara para Análise e Aprovação de Convênios e Contratos, com o objetivo de reduzir para apenas 30 dias o tempo de trâmite destes processos, o que costuma demorar a média de seis a oito meses. A decisão datada de 16 de agosto foi publicada no Diário Oficial do Estado de São Paulo do último dia 21. A Câmara ficará subordinada diretamente ao gabinete do reitor. “A questão dos convênios e contratos sempre representou uma dificuldade em relação à agilização da tramitação, que precisa ser segura do ponto de vista jurídico e institucional. Em geral, tratamos de convênios de pesquisa que não podem demorar meses e meses para serem assinados. Com a rápida evolução do conhecimento que vemos hoje, tanta demora pode fazer com que o plano de pesquisa deixe de ter atualidade, perdendo um pouco o sentido”, observa Tadeu Jorge. Segundo o reitor, um estudo elaborado para verificar as causas da demora apontou a existência na Unicamp de uma tramitação linear dos convênios e contratos, etapa por etapa, com o envolvimento de inúmeros atores e instâncias. “A partir da unidade ou órgão, um processo passa por instâncias como as Comissões Centrais das Pró-Reitorias, Procuradoria Geral, Agência de Inovação e Diretorias de Administração e de Recursos Humanos. E, a cada etapa, dúvidas podem ser levantadas, sendo comum retornar a outras instâncias.”

O professor José Tadeu Jorge informa que, identificada a causa, decidiu-se por uma mudança radial na tramitação, com a criação de uma única instância para analisar convênios e contratos. “A ideia é reunir os vários atores na Câmara, ao mesmo tempo e no mesmo local. Após o parecer da Procuradoria Geral, o convênio é submetido aos olhares de todos e, em caso de dúvida, o presidente vai se encarregar de dirimi-la para a reunião seguinte.” A Câmara para Análise e Aprovação de Convênios e Contratos se reunirá quinzenalmente, sendo composta por 15 representantes: os pró-reitores de Pesquisa, Graduação, Pós-Graduação e Extensão e Assuntos Comunitários; representantes das Comissões Centrais das Pró-Reitorias (CCP, CCG, CCPG e Conex); Procuradoria Geral (PG); Diretoria Geral de Recursos Humanos (DGRH); Diretoria Geral da Administração (DGA); Inova – Agência de Inovação da Unicamp; Vice-Reitoria Executiva de Relações Institucionais e Internacionais (Vreri); e Coordenadoria de Centros e Núcleos Interdisciplinares de Pesquisa (Cocen). Para presidir a Câmara, o reitor nomeou a professora Rosângela Ballini, do Instituto de Economia (IE). A expectativa é de que os trabalhos tenham início em 15 dias, depois da indicação dos demais representantes por suas respectivas instâncias. Na Universidade tramitam entre 700 e 800 convênios e contratos por ano. (Luiz Sugimoto)

Foto: Antonio Scarpinetti

O reitor José Tadeu Jorge: “A ideia é reunir os vários atores na Câmara, ao mesmo tempo e no mesmo local”


Campinas, 2 a 8 de setembro de 2013 CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br

editoria do periódico Menopause: The Journal of The North American Menopause Society – considerada a melhor publicação de estudos da menopausa do mundo – ao enviar aos autores a comunicação de que o artigo que lhe fora submetido, “Envelhecimento, obesidade e multimorbidade em mulheres de 50 anos ou mais: um estudo de base populacional”, estaria na seção Publish Ahead of Print do website – em que os trabalhos são disponibilizados antes do impresso – enfatiza que “o artigo apresenta informações que merecem grande exposição não apenas na comunidade científica, mas também, entre a população leiga”. Encoraja sua divulgação junto à imprensa brasileira e revela-se ansiosa por receber as matérias tão logo publicadas, para mantê-las em seus arquivos. Em edição subsequente, a revista publicaria um estudo, realizado pelo mesmo grupo, sobre os “Fatores associados à autopercepção da saúde em mulheres brasileiras com 50 anos ou mais: estudo populacional”. As duas publicações originam-se de um estudo populacional financiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) intitulado “Condições de saúde em mulheres com 50 anos ou mais, em Campinas SP”. A pesquisa, desenvolvida junto ao Caism/Unicamp (Hospital da Mulher Dr. José Aristodemo Pinotti) por uma equipe do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, serve de base para o doutorado da ginecologista Vanessa de S. Santos Machado, que organizou o questionário aplicado e realiza a análise dos dados com a orientação do professor Aarão Mendes Pinto Neto. Conta com a coorientação da pós-doutoranda Ana Lúcia Ribeiro Valadares e a participação de Lúcia Costa Paiva, responsável pelo grupo de climatério, ambas ginecologistas. Mais três trabalhos resultantes da pesquisa aguardam publicação e o professor Aarão estima que resultem dela ainda de 12 a 15 artigos. Ao considerar a importância de avaliar as condições de saúde nas mulheres acima de 50 anos, o professor Aarão lembra que estudos anteriores sobre climatério e menopausa realizados pelo grupo mostraram que são muitas as mulheres que não chegam aos 50 anos de forma saudável e apresentam várias doenças associadas. Com efeito, muitas delas revelamse obesas, hipertensas, diabéticas e com outros males que interferem em sua qualidade de vida presente e futura, quadro preocupante quando se sabe que a população de idosos no Brasil está em crescimento. A expectativa de vida das mulheres atingiu 77,3 anos enquanto a dos homens é de 69,7 anos. Por viverem mais, elas estão mais sujeitas às doenças crônicas comumente associadas ao envelhecimento e à multimorbidade, assim nomeada a presença de duas ou mais doenças crônicas no mesmo indivíduo. Daí, diz o médico, “a importância de estudar em que condições essas mulheres estão envelhecendo em nossa população, porque o maior número de doenças leva ao uso de mais medicamentos, amplia a utilização e os gastos dos serviços de saúde, além de comprometer a qualidade de vida”.

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Multimorbidade

prevalece em mulheres com mais de 50 anos

Estudos desenvolvidos na FCM sobre doenças na menopausa foram feitos em Campinas Fotos: Antonio Scarpinetti

Dados indicam que 130 mil mulheres compõem a população feminina acima de 50 anos na cidade de Campinas: problema de saúde pública

OBJETIVOS

Em decorrência de menopausa em torno dos 50 anos, e diante da atual perspectiva de vida, a mulher vive cerca de 30 anos pós-menopausa e, quanto mais envelhece, mais atenção demanda. Trata-se de um problema sério revelado pelos dados obtidos que, segundo a professora Lúcia, devem servir de alerta para os gestores dos serviços de saúde pública e para os profissionais médicos, particularmente os ginecologistas que atendem a esse contingente idoso peculiar, porque, como se sabe, as mulheres vivem em média sete anos mais que os homens. O professor Aarão destaca entre os objetivos do trabalho o de chamar a atenção dos ginecologistas para o fato de a mulher poder apresentar, além das doenças nas mamas e no aparelho genital, outros males sistêmicos comuns aos dois sexos e morrer em decorrência deles e não daqueles tipicamente femininos. Ele chama a atenção para o fato de as doenças cardiovasculares constituírem principal causa de morte e por isso prega como medidas o controle da pressão arterial, do peso, estímulo à alimentação saudável, prática de atividade física frequente, campanhas antitabagismo, etc. Além da atenção com a osteoporose, que afeta grande parte das mulheres acima de 50 anos, ele alerta para a necessidade de considerar os fatores de risco que podem levar ao câncer ou a acidentes que possam decorrer de deficiências visual e auditiva. Julga que o trabalho fornece subsídios para as políticas públicas de saúde e pode servir de alerta à classe médica, em especial aos ginecologistas, e à conscientização das populações. Os pesquisadores responsáveis pelo estudo têm uma meta mais audaciosa: consideram que o ideal seria implantar medidas que permitam empurrar as doenças, já que inevitáveis, para o final da vida, de forma a garanti-la mais longa e de melhor qualidade, evitando a morte lenta. Para que isso ocorra, entendem que as ações públicas de prevenção são as melhores, apoiadas por campanhas contra o tabagismo, de combate à obesidade, de orientação para alimentação saudável e de incentivo às atividades físicas. O ideal a ser perseguido é uma vida longa e boa, acometida pelas doenças no seu final, quando se está prestes a deitar e morrer. É o que se chama compressão da morbidade.

PESQUISA POPULACIONAL A pesquisadora Ana Lúcia destaca o caráter populacional do estudo, baseado em uma amostra estatística de 622 mulheres de 50 anos ou mais, entrevistadas em suas casas, que compõem um grupo representativo do universo constituído por 130 mil mulheres que compõem a população feminina acima de 50 anos da cidade de Campinas. O questionário utilizado na pesquisa e organizado por Vanessa consta de 87 perguntas, divididas em cinco grupos, que avaliam a condição socioeconômica, hábitos de saúde, percepção da mulher em relação à própria saúde, capacidade fun-

Da esq. para a dir., Lúcia Costa Paiva, Ana Lúcia Ribeiro Valadares e Vanessa de S. Santos Machado: artigos e questionário

O professor Aarão Mendes Pinto Neto, coordenador das pesquisas: medidas preventivas são fundamentais

cional e doenças crônicas propriamente ditas, entre as quais, hipertensão, infarto do miocárdio, derrame, diabetes, artrose, osteoporose, catarata, glaucoma, incontinência urinária, câncer, problemas pulmonares, particularmente enfisema, que são as mais prevalentes nessa população. O doutorado de Vanessa, realizado por meio do programa de pós-graduação da FCM, deve ser concluído este ano. Ela esclarece que, com o estudo populacional, procurou-se avaliar as doenças relacionadas ao envelhecimento em mulheres residentes em Campinas. A cidade foi dividida em setores, devidamente mapeados, de acordo com o censo de 2000, sendo selecionadas, por sorteio, áreas aleatórias em que foram localizadas as mulheres objeto do estudo, de forma a contemplar todos os extratos sociais. O trabalho de aplicação dos questionários foi coordenado pelo Cemicamp (Centro de Pesquisas das Doenças Materno-Infantis de Campinas), que utilizou assistentes de pesquisa devidamente orientadas e treinadas.

RESULTADOS

O aumento da prevalência das multimorbidades – duas ou mais doenças – nas mulheres acima de 50 anos pode ser explicado pela maior vulnerabilidade e maior tempo de exposição aos fatores de risco para doenças crônicas. Outro

importante fator associado às morbidades no envelhecimento é o excesso de peso na juventude ou na maturidade, cuja incidência vem aumentando nos últimos anos. Mesmo o excesso de peso que se inicia na juventude está relacionado ao aumento da prevalência de numerosas doenças como câncer, diabetes, hipertensão, osteoartrite e males cardiovasculares. Cerca de 63% das entrevistadas apresentavam sobrepeso ou obesidade e 13% relataram sobrepeso ou obesidade entre os 20 e 30 anos, o que faz Ana Lúcia afirmar que estes são os fatores mais significativos em relação à presença de multimorbidades. Vanessa acrescenta que, quando se considera o Índice de Massa Corpórea (IMC), observa-se que cada unidade além do recomendado na mulher de mais de 50 anos aumenta o risco de duas ou mais doenças crônicas em 3%, o que a leva a concluir que “o envelhecimento é inevitável, mas envelhecer com o peso adequado diminui a chance de doenças”. Os dados mostram que apenas 15% das entrevistadas não referiram doenças, 26% mencionaram uma e 58% duas ou mais (multimorbidades). Foram referidas pelas entrevistadas, indicadas em porcentagens aproximadas, hipertensão (56%), osteoartrite (34%), catarata (25%), diabetes (23%). Osteoporose (21%), glaucoma (10%), bronquite (9%), incontinência urinária (9%%), câncer (7,0%), infarto do miocárdio (5%), derrame cerebral (3%) e enfisema pulmonar (2%). Notou-se, ainda, que cada ano a mais na idade aumentou a chance da presença de duas ou mais doenças em 3%, o mesmo índice observado para o aumento de cada unidade do IMC. Outros fatores associados à presença ou não de multimorbidade revelados pelo estudo foram o tabagismo, a disponibilidade de seguro médico – que facilita o acesso ao controle da saúde e a diagnósticos, e a ocorrência do período de pós-menopausa – em consequência da deficiência hormonal nas condições de saúde.


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Campinas, 2 a 8 de setembro de 2013

Capas de publicações estudadas na pesquisa: negro como autor e não apenas personagem

LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

ensar a forma como escritores negros brasileiros conquistaram espaço no sistema literário e ganharam a atenção da sociedade nas décadas de 1960 e 70, e buscar contrapontos e semelhanças com os chamados escritores periféricos que entraram em cena a partir dos 90 e 2000. Esta era a ideia original de Mário Augusto Medeiros da Silva para a tese de doutorado em sociologia que defendeu junto ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), orientado pela professora Elide Rugai Bastos. “A questão é que a pesquisa foi se ampliando e passei a focar também o papel das ciências sociais nos movimentos negros, uma relação que considero muito interessante, mas pouco discutida nesta área acadêmica. A tese procura dar uma contribuição nesse sentido. É uma relação que vai se construindo e gerando bons frutos até o golpe de 64, que atingiu tanto os sociólogos quanto os intelectuais negros, sendo retomada posteriormente”, diz Mário Medeiros. A tese analisa a produção literária de escritores autoidentificados negros ou periféricos, como Carolina Maria de Jesus (1914-1977), Paulo Lins, Reginaldo Ferreira da Silva (Ferréz) e o coletivo de autores Quilombhoje. E a pesquisa, afinal, acabou recebendo o Prêmio CES para Jovens Cientistas Sociais de Língua Portuguesa, instituído pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, além de menção honrosa da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs).

LITERATURA NEGRA

Mário Medeiros afirma que a literatura negra possui uma longa história que vem da virada do século 19 para o século 20, construída por escritores e intelectuais que se afirmam produtores de uma literatura na qual o negro é o autor da prosa e da poesia e não meramente personagem. “João da Cruz e Souza, por exemplo, foi alçado a ícone dos escritores negros por contribuir para a formação deste universo de literatura negra. Lima Barreto é outro ícone e persiste a controvérsia se Machado de Assis teria perfil para completar o triângulo de referência. Lino Guedes foi um dos poucos que publicaram livros não como edições de autor, mas por meio de editora.” Segundo o pesquisador, a literatura negra está estreitamente ligada às associações e imprensa negras, que procuram discutir a discriminação, o preconceito e as formas de superação para colocar o negro como sujeito da história. “A imprensa negra paulista aparece no final do século 19, ganhando força na década de 1910 e mais força ainda até o golpe de 64. Toda associação negra tinha seu jornal e todo jornal tinha uma seção de contos e poemas – espaço ocupado por autores como Oswaldo de Camargo, que se mantém ativo desde a década de 50.” Medeiros também estudou o coletivo Quilombhoje, cuja origem está em encontros de escritores como Oswaldo de Camargo e Luiz Silva (Cuti). “Em 1978, eles e outros companheiros criaram a série Cadernos Negros, que Foto: Antoninho Perri

Mário Augusto Medeiros da Silva, autor da tese: mudando o foco da pesquisa

Negra,periférica e fundamental até hoje publica contos em um ano e poemas no outro. A mineira Conceição Evaristo é uma escritora contemporânea que passou a circular internacionalmente a partir da publicação. O Quilombhoje, que ficou responsável pela série, foi fundado em 1982, promovendo eventos em que esses autores refletiam sobre o que escreviam e para quem escreviam. Tudo isso ocorria no período de ressurgimento do denominado Movimento Negro Brasileiro.”

LITERATURA PERIFÉRICA

Em relação à literatura periférica, já chamada de “marginal”, o autor da tese recorda que o rótulo foi criado por um escritor da periferia de São Paulo, Reginaldo Ferreira da Silva, o Ferréz. “Depois de lançar Capão Pecado (2000), ele era perguntado como foi possível ambientar um romance em Capão Redondo, lugar tão estigmatizado por negatividades. Ferréz foi colaborador da revista Caros Amigos e ali publicou três edições de antologias de literatura periférica, convidando escritores como Sérgio Vaz, fundador da Cooperifa [Cooperativa de Literatura Periférica] na zona sul de São Paulo.” Foi por volta de 2006, quando buscava o tema de doutorado, que Mário Medeiros começou a atentar para escritores periféricos

como Ferréz e Paulo Lins – este que dez anos antes havia publicado Cidade de Deus. “Em minhas leituras, percebi certa relação entre a forma como ambos surgiram no sistema editorial e os escritores de décadas passadas. Particularmente entre Paulo Lins e Carolina Maria de Jesus, que se tornou célebre em 1960 com Quarto de Despejo: os dois têm origem na favela, são negros e seus livros foram muito destacados pela grande imprensa e pela crítica.”

AS CIÊNCIAS SOCIAIS

Medeiros procura mostrar na tese que foram os cientistas sociais, como Roger Bastide e Florestan Fernandes, que primeiramente se dedicaram a estudar as associações e a literatura negras. “Bastide circulou pelas associações, tornando-se amigo de intelectuais, jornalistas e escritores negros. Foi quem garantiu o acesso a este universo para a Pesquisa Unesco, em São Paulo, sobre relações raciais, importantíssima para as ciências sociais no Brasil e que resultou no livro Brancos e negros em São Paulo.” O pesquisador acrescenta que Roger Bastide foi professor e mentor das pesquisas de Florestan Fernandes, autor de outro livro fundamental para a sociologia brasilei-

Do quarto de despejo à casa de alvenaria Carolina Maria de Jesus nasceu em Sacramento, interior de Minas Gerais, em 1914. De família muito pobre, era órfã de pai (ou não o conheceu) e, trabalhando na lavoura e estudando apenas até o 2º ano, percebeu que seu futuro seria continuar labutando a terra ou virar empregada doméstica. Partiu para a região de Ribeirão Preto no desejo – ela conta em suas memórias – de chegar a São Paulo e ser alguém. Lá chegou no final dos 1930, vagando por pensões durante alguns anos, até se tornar uma das primeiras moradoras de favela, a do Canindé, na cidade que começava a enfrentar os problemas da metropolização. A vida de Carolina virou de ponta-cabeça quando o repórter Audálio Dantas foi escalado pela Folha da Noite para cobrir um protesto na favela do Canindé, por causa de um playground instalado pela prefeitura onde adultos se divertiam com os brinquedos das crianças. Na aglomeração se destacava uma mulher negra, alta e de lenço na cabeça, que ameaçava registrar os nomes dos grandalhões em seu diário. Uma favelada negra que escrevia um diário. Aguçado o faro de repórter, Dantas seguiu Carolina até o barraco onde se deparou com latas guardando cadernos e folhas avulsas que ela separava como catadora de papel, a fim de registrar os acontecimentos de todo santo dia. Carolina, que não escondia o desejo de ter seus diários e poemas publicados, autorizou o repórter a levar e analisar o material. E ele viu o ineditismo daqueles textos, sobre a vida de uma mulher pobre, negra, mãe solteira de três filhos com pais diferentes – e seu olhar sobre o cotidiano de uma favela, novidade ruim na São Paulo dos anos 50.

Foto: Reprodução

Carolina Maria de Jesus: de protesto na favela ao reconhecimento público

A seleção feita por Audálio Dantas resultou em Quarto de despejo – Diário de uma favelada, lançado pela Francisco Alves em 1960. O livro causou forte impacto na metrópole brasileira que mais crescia – a “locomotiva que move o país” – e que acabara de comemorar o 4º Centenário. Na construção do Parque Ibirapuera, Niemayer tinha projetado uma espiral em direção ao infinito, apontando o futuro brilhante e grandioso da cidade. Quarto de despejo chegou a vender mais que Jorge Amado, foi traduzido para 13 idiomas (japonês, esloveno e russo, inclusive) e Carolina de Jesus passou a ser convidada para debates sobre o livro e a favelização. E, incitada a escrever um segundo livro, ela deixou a favela para produzir Casa de alvenaria, também um diário, retratando aquele momento conturbado da sua vida, em que saiu do anonimato para o estrelato de um dia para o outro. Faleceu em condições precárias, em 1977.

ra, A integração do negro na sociedade de classes (1965). “Esta obra traz entrevistas com intelectuais dessas associações, que participaram de jornais nas décadas de 20 e de 30 e fundaram a Frente Negra Brasileira. Eles colocaram temas como o mito da democracia racial, o preconceito e a discriminação para Florestan, reconhecendo o sociólogo como uma espécie de embaixador dos negros junto ao restante da sociedade.”

DEBAIXO DA DITADURA

Mário Medeiros observa que parece que nada mais aconteceu no período entre o golpe de 64 e o ano de 1978, quando foi fundado o Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial (MNUCDR, hoje apenas MNU). “A tese procura mostrar que as coisas foram acontecendo, sim, com o aparecimento de outras associações e intelectuais negros. O movimento negro não ressurge do nada, havia projetos em andamento, tanto no campo da política como da literatura, que vão permitir a criação do MNU. E só assim é possível explicar a publicação de Cadernos Negros, numa colaboração entre os ativistas antigos e os novos.” O autor da pesquisa explica que esses novos sujeitos são pessoas das universidades que buscam contato com ativistas do passado, inclusive do Partido Comunista e de grupos clandestinos de esquerda, para se alimentar desses debates, além de se informar sobre as lutas de libertação africanas, o ativismo negro estadunidense e se posicionar contra a ditadura.

PERIFÉRICOS NA ACADEMIA

Quanto aos novos ativistas, Medeiros atenta que Luiz Silva, o Cuti, aliou sua atuação no Quilombhoje à academia, tendo mestrado e doutorado no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp. E que Paulo Lins foi assistente de Alba Zaluar, antropóloga do IFCH, que realizava uma pesquisa na Cidade de Deus sobre criminalidade nas classes populares. “Ela precisava de estudantes para realizar entrevistas na comunidade e Lins foi selecionado. Percebendo nele um talento, a professora mostrou poesias do assistente a Roberto Schwarz, também da Unicamp, crítico literário e sociólogo de formação. Foram dois cientistas sociais que incentivaram Paulo Lins a escrever Cidade de Deus, que seria transformado em sucesso das telas.” No caso da literatura periférica, o pesquisador comenta que , quando se iniciou o movimento, bem como os saraus na periferia – e que depois explodiriam por toda São Paulo –, chamaram a atenção de uma antropóloga da USP, Érica Peçanha do Nascimento, que desenvolveu uma dissertação de mestrado pioneira intitulada “Quando escritores da periferia entram em cena”, em meados dos 2000. “Novamente é uma cientista social que vai se interessar por essa manifestação cultural e que vai reabrir o debate dentro da academia, atraindo o interesse das pessoas em geral.”

Publicação Tese: “A descoberta do insólito: literatura negra e literatura periférica no Brasil (1960-2000)” Autor: Mário Augusto Medeiros da Silva Orientadora: Elide Rugai Bastos Unidade: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH)


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