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Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

Método detecta compostos que causam odor na carne de porco Mais “limpa”, rápida e precisa, técnica analisa causas do mau cheiro, sobretudo no toucinho SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br

m método “limpo” desenvolvido na Unicamp permite analisar de forma mais rápida e precisa a presença de compostos responsáveis pelo mau cheiro na carne suína, sobretudo no toucinho. A química Soraia Cristina Gonzaga Neves Braga explica que os odores, denominados cientificamente como off-flavours, são percebidos no momento do aquecimento da carne. “Em quantidades elevadas estes compostos causam um odor desagradável para o consumidor no momento em que ele vai aquecer a carne. O nosso objetivo foi determinar isso de uma forma mais simples e eficiente, uma vez que os métodos convencionais são complexos e demorados”, compara. O trabalho conduzido por Soraia Braga integrou dissertação de mestrado defendida em julho do ano passado junto ao Instituto de Química (IQ) da Unicamp. A pesquisadora foi orientada pelo docente Fábio Augusto, que atua no Departamento de Química Analítica do IQ. Ela obteve financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). A carne de porco é a proteína mais consumida no mundo. Estima-se, conforme relatório da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Adipecs), que a produção mundial gire em torno de 115 milhões de toneladas por ano. Estudos recentes vêm demonstrando os benefícios do alimento, graças à implementação de novas técnicas de manejo e nutrição que permitiram diminuição dos níveis de gordura e controle de doenças transmissíveis nos animais. Dados obtidos pela estudiosa da Unicamp demonstram que o Brasil figura, atualmente, como o quarto maior produtor e exportador da commodity. “Há tendência de aumento neste consumo, só que o odor desagradável acaba sendo um problema”, dimensiona Soraia Braga. Ela esclarece que o mau cheiro é causado pelo excesso de dois compostos presentes na carne: o escatol e a androstenona. Relatos científicos associam estes compostos às atividades hormonais dos suínos. Por isso, sua presença é significativa em porcos machos não castrados, animais mais indicados para obtenção de alimento de boa qualidade, com menor índice de gordura. Além disso, a utilização de machos inteiros para a produção de carne é vantajosa devido aos baixos custos de produção e bem-estar do animal. “Tanto o escatol como a androstenona ficam mais concentrados em partes com maior índice de gordura. Consequentemente, o mau cheiro é mais sentido no toucinho, que é constituído pela gordura subcutânea do porco”, exemplifica a química, que desenvolve, no momento, pesquisa de doutorado no IQ. Para evitar o excesso destes compostos na carne, os produtores utilizam a castração físi-

ca, realizada, muitas vezes, sem anestesia. O procedimento gera sofrimento, além de ser prejudicial à qualidade da carne devido ao estresse provocado. A estudiosa da Unicamp informa sobre a existência de novas técnicas que empregam a imunocastração, um tipo de castração química. A vantagem é a não utilização de métodos cirúrgicos, que geram dor aguda. O procedimento, porém, é mais caro e não impede o ganho de peso dos suínos.

COMPOSTOS

Hormônio esteroide produzido nos testículos dos animais sexualmente maduros, a androstenona circula na corrente sanguínea e se acumula nas glândulas salivares e tecido adiposo. Já o escatol, derivado de um aminoácido, é produzido no intestino e absorvido pela corrente sanguínea. Uma parte é eliminada na urina. A outra, também é acumulada no tecido adiposo. Nem todos os porcos machos inteiros apresentam excesso de escatol e androstenona. Isso demonstra, conforme Soraia Braga, a importância do método para identificar a presença de tais compostos. “Sabendo se a quantidade está acima dos níveis permitidos, medidas podem ser tomadas, como retirada daquela carne do mercado”, justifica.

TÉCNICAS

O método desenvolvido no Instituto de Química combinou duas técnicas que permi-

A química Soraia Braga, autora da dissertação: “O odor desagradável acaba sendo um problema”

Fotos: Antonio Scarpinetti

Carne suína em supermercado: métodos convencionais de detecção são mais complexos e demorados

tem detectar a presença da androstenona e quantificar o escatol. “A forma convencional envolve várias etapas, que demandam tempo e alto consumo de solventes orgânicos. Por serem tóxicos, estes solventes apresentam complicações no descarte, além de riscos na manipulação. O nosso método é limpo, ou seja, livre de solventes orgânicos”, considera. A técnica de microestração em fase sólida, também conhecida pela sigla SPME (Solid Phase Micro Extration), é uma alternativa aos métodos convencionais. Menos dispendiosa, a SPME permite em apenas uma etapa a extração dos compostos. O processo consiste na utilização de um bastão de fibra ótica de sílica fundida, recoberto por um filme polimérico, que é utilizado como solvente. Os compostos da amostra ficam retidos neste filme. O método foi proposto no início dos anos de 1990 pelo cientista Janusz Pawliszyn, professor da Universidade de Waterloo, no Canadá. Soraia Braga explica que, apesar das vantagens, a SPME não é uma técnica tão seletiva. Por isso, no caso das amostras de toucinho, houve também a extração de outros compostos, além do escatol e da androstenona. Para refinar as análises, obtendo somente os compostos responsáveis pelo odor desagradável na carne suína, Soraia Braga associou outra técnica. Trata-se da Cromatografia Gasosa e Bidimensional Compreensiva, conhecida pela sigla GCxGC (do in-

glês Comprehensive Two-Dimensional Gas Chromatography). Este processo possui um poder de separação maior que a cromatografia gasosa convencional. “Estas duas técnicas associadas foram empregadas com êxito para determinar e quantificar os compostos presentes numa matriz do toucinho de porco. O nosso objetivo foi propor isso como alternativa aos demais métodos já utilizados”, situa a pesquisadora da Universidade. A CGxCG foi descrita em 1991 pelos cientistas John Phillips e Zaiyou Liu no The Journal of Chromatography A. No Brasil, o docente Fábio Augusto, orientador do estudo, foi pioneiro na introdução da técnica. Ele coordena na Unicamp duas linhas de pesquisa sobre o tema: técnicas cromatográficas multidimensionais e materiais, dispositivos e métodos de extração e microextração. Conforme a química da Unicamp, os métodos convencionais não utilizam a associação entre a SPME e a Cromatografia Gasosa e Bidimensional Compreensiva. “A literatura científica relata que a GCxGC não é necessária para determinar compostos alvos, como seria o caso do escatol e da androstenona no toucinho de porco. Ela seria melhor na determinação de perfis complexos em derivados do petróleo e óleos essenciais, por exemplo. Mas conseguimos, utilizando estas duas técnicas, determinar, com êxito, o escatol e a androstenona no toucinho de porco”, revela.

Publicações Artigos Braga, S. C. G. N.; Hantao, L. W.; Bogus Jr, S.; Augusto, F.. Determination of Boar Taint compounds on pork fat using Hs-SPME combined to GC GC-QMS. In: Colacro XIV, 2012, Florianópolis. Resumos Colacro XIV, 2012. v. 01. Braga, S. C. G. N.; Bogus Jr, S.; Hantao, L. W.; Fidélis, C. H.; Augusto, F.. Aspectos experimentais na determinação de androstenona e escatol em toucinho de porco por HS-SPME-GC-FID. In: 34ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química, 2011, Florianópolis. Resumos 34ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química, 2011. Braga, S. C. G. N.; Hantao, L. W. ; Bogus Jr, S.; Augusto, F.. Desenvolvimento de um método para quantificação de offflavours em toucinho de porco por HSSPME-GCxGC-qMS. In: 16º Encontro nacional de Química Analítica, 2011, Campos do Jordão. Resumos, 2011. Dissertação: “Determinação de offflavours em carne e gordura suína por GC x GC combinada a SPME” Autora: Soraia Cristina Gonzaga Neves Braga Orientador: Fábio Augusto Unidade: Instituto de Química (IQ) Financiamento: Capes

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A integração da AS é possível? Livro de doutorando do IG aponta fatores que podem favorecer ou inviabilizar diálogo regional países centrais e exponencial aumento da demanda por commodities.” Vitor de Pieri avalia que os vetores convergentes para a integração sul-americana estão todos atrelados aos recursos naturais, classificados como ativos estratégicos comuns. “Esse termo surgiu em reunião dos ministros de Defesa dos países da região em 2008, em meio às discussões sobre a formação do Conselho de Defesa Sul-Americano no âmbito da Unasul. Ativos estratégicos são as fontes de recursos naturais transfronteiriças, como por exemplo, a Amazônia, que transcende o território brasileiro e se estende por mais oito países; o Atlântico Sul, com as reservas do pré-sal e o conflito em torno das Malvinas; e as reservas de petróleo da Venezuela, já constatadas como as maiores do mundo.” Os dados coletados pelo autor mostram que a América do Sul concentra 40% da biodiversidade do planeta, considerando os aquíferos (reservas sub-superficiais de água) que ocupam enorme extensão da região, bem como as geleiras continentais entre a Argentina e o Chile, que também representam reservas de água doce. “Uma tabela sobre a oferta sul-americana de recursos naturais estratégicos traz minuciosos percentuais como de água, floresta, pesca, petróleo e minerais, nos níveis dos territórios nacional, continental, regional e mundial. Os recursos naturais surgem como vetor convergente de integração regional, através do Conselho de Defesa Sul-Americano, braço importante da Unasul.” Na opinião de Pieri, alguns números chamam a atenção, como os referentes aos minerais, além da água e da biodiversidade. “A Bolívia possui 49% da reserva mundial de lítio, matéria-prima estratégica, utilizada na produção de baterias, enquanto o Brasil detém 96% do nióbio, que é fundamental na tecnologia da informação. Outra tabela interessante é sobre terras aptas para a agricultura: 33% do território argentino, que é o sexto do mundo, pode ser cultivado sem necessidade de qualquer preparo; o Brasil tem 9% do território nas mesmas condições, área maior do que de países como a França e Itália juntos.”

LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

itor Stuart Gabriel de Pieri espera defender o doutorado pelo Instituto de Geociências (IG) até o final do ano, orientado pela professora Claudete Vitte. Mas o tema de sua pesquisa já embasou o livro Seguridad y Defensa em Sudamérica: entre la cooperación y el conflito lançado pela Eudeba, da Universidade de Buenos Aires, uma das principais editoras em língua espanhola do mundo. O livro aparece dentre os destaques na 39° Feira do Livro de Buenos Aires. Nele, o autor procura levantar, sistematizar e analisar os diferentes vetores que, por um lado, contribuem para a convergência de agendas entre os países da América do Sul, e por outro, impossibilitam um diálogo regional amplo no âmbito político, econômico, social, cultural e ambiental. “A ideia do livro surgiu de alguns dados levantados na época em que atuei como pesquisador do Gabinete Estratégico Militar do Estado Maior Conjunto das Forças Armadas Argentinas. São questões que estão por trás de acordos como Mercosul [Mercado Comum do Sul], Alba [Aliança Bolivariana para as Américas] e CAN [Comunidade Andina de Nações]. A tendência é que esses acordos acabem tendo menos relevância do que a Unasul [União das Nações Sul-Americanas], que possui uma perspectiva acima de tudo política e em escala subcontinental de integração”, explica Vitor de Pieri. O levantamento é minucioso, trazendo dados e análises sobre o que o pesquisador denomina conflitos “intermésticos” (interestatais e domésticos) envolvendo temas como delimitações fronteiriças – um dos vetores de fragmentação na política de integração da América do Sul – e sobre uma política conjunta de defesa dos recursos naturais – vista como vetor convergente. “As estratégias de defesa e segurança regional são primordiais para um subcontinente caracterizado por importantes reservas de recursos naturais e um enorme potencial de produção de alimentos, frente a um mundo marcado por crises nos

Região de Esseguibo

Venezuela Pecuaristas e Agricultores

ana me Gui esa ina r u anc S r F G. Região do Triângulo

Colômbia

do Novo Rio

Equador

Amazônia Legal

Região do Rio Manon

Perú

Região da Bacia de Arica

Bolívia Fazendeiros

Região do Andino Central

Oceano Pacífico

Paraguai

Brasiguaios

Chile

Itaipú Binacional

Uruguai

LEGENDA

Argentina

Vitor Stuart Gabriel de Pieri, autor do livro: “As estratégias de defesa e segurança regional são primordiais”

CONFLITOS “INTERMÉSTICOS”

Se acordos como a Unasul parecem plausíveis no papel, Vitor de Pieri aponta os vetores divergentes que dificultam esta integração na prática. Ele mapeou os principais conflitos “intermésticos” na região, desde a Guerra do Pacífico no final do século 19 até a desavença entre Venezuela e Colômbia em 2010: são conflitos por demarcação de fronteiras, ambientais, energéticos, agrários e geopolíticos. “Aponto os Estados envolvidos, o período de máxima tensão, nível atual de tensão e o grau de instabilidade (se há declaração formal de guerra, disputa sob arbitragem internacional ou ruptura de relações diplomáticas).” As instabilidades políticas em países como Venezuela e Bolívia são exemplos de conflitos domésticos mencionados pelo autor do trabalho, que procurou apontar as principais motivações e atores. “Não se sabe o que vai ser dos venezuelanos com a morte de Hugo Chávez e sua sucessão por Nicolás Maduro. Temos também a ‘guerra civil’ colombiana; a oposição acirrada da Igreja, meios de comunicação e ruralistas a Cristina Kirchner na Argentina, etc. Esses conflitos geram instabilidades no campo econômico, afastando investidores da região e criando desequilíbrios nas contas nacionais desses países.” Os conflitos identificados como interestatais, segundo Vitor de Pieri, são reflexos de conflitos clássicos como a Guerra do Pacífico (ou Guerra do Salitre), causada por questões fronteiriças e que confrontou o Chile contra uma força conjunta de Bolívia e Peru, entre 1879 e 1883. A vitória foi do Chile, que anexou áreas ricas em recursos naturais dos dois países rivais, sendo que a Bolívia ficou sem saída para o Pacífico e o Peru sofreu com perda de território marítimo para o Chile. “Persistem até hoje diversos problemas no âmbito diplomático entre esses três países, inclusive com cortes de relações diplomáticas em diversos momentos da história contemporânea.”

RECURSOS NATURAIS EM JOGO O pesquisador acrescentou em seu levantamento os recursos naturais em jogo nesses conflitos, como o petróleo na Guerra do Chaco, ocorrida de 1932 a 1935 entre Paraguai e Bolívia, resultando em dezenas de milhares de mortos por conta das eventuais reservas naquela região. “Também verifiquei o envolvimento direto ou indireto de terceiros atores (internacionais) e, no caso do Chaco, havia o interesse da americana Standard Oil e da holandesa Dutch Shell pelo território. No começo dos anos 2000, tivemos a criação do Plano Colômbia de combate ao narcotráfico, uma cooperação militar sob a influência direta dos Estados Unidos.” Vitor de Pieri afirma que outro conflito demonstrando a fragilidade nas relações entre os países da América do Sul é a crise das “papeleras” (indústrias de papel e celulose), entre Argentina e Uruguai, que vem desde 2003. Tudo começou com um protesto de cunho ambiental, por cidadãos argentinos, contra a construção pelo Uruguai de duas usinas de celulose na fronteira traçada pelo rio La Plata: eles passaram a bloquear o acesso às pontes que ligam a cidade uruguaia de Fray Bentos à argentina Gualeguaychú, prejudicando a circulação de turistas e de mercadorias entre os dois países. “O que era um conflito local, tornou-se nacional e depois mundial, indo parar na Corte Internacional de Haia.” O Brasil não ficou livre de conflitos no período abordado pelo autor do livro, que começa registrando a disputa pelo Acre com a Bolívia entre 1899 e 1903, envolvendo revolta armada de colonos brasileiros que ocuparam o território até então pertencente ao país vizinho, declaração formal de guerra e muita diplomacia – motivo: a abundância de seringueiras em pleno ciclo da borracha. O levantamento inclui os atritos com Argentina e Paraguai em torno da Usina de Itaipu, entre fazendeiros paraguaios e brasiguaios, e o recente massacre de Albina, em dezembro de 2009, quando garimpeiros brasileiros foram atacados com facões e pedras por quilombolas da pequena cidade do Suriname.

PENDÊNCIAS DIVERSAS A conclusão de Vitor de Pieri é que a integração está complicada do ponto de vista geopolítico e geoeconômico, mas vem se criando um diálogo do ponto de vista geoestratégico, especialmente a partir do debate sobre os ativos estratégicos comuns. “Ainda não podemos pensar em colocar os presidentes da Bolívia e do Chile lado a lado, imaginando que se tornem amigos imediatamente, pois há muitas pendências a serem resolvidas. Mas espero que este livro, ao sistematizar os obstáculos existentes para a integração entre os países, contribua de alguma forma com os estudos relacionados à segurança e defesa regionais. Não se pode dizer que está tudo bem na América do Sul.”

Grupo prepara outro livro

Brasil

Nacionalização das Reservas de Gás Natural

Foto: Antonio Scarpinetti

Oceano Atlântico

O doutorando Vitor de Pieri faz parte do grupo de pesquisa “Geografia das Relações Internacionais: Estado, Economia Território e Integração Regional”, coordenado pela professora Claudete de Castro Silva Vitte. Ao abordar em suas pesquisas os fenômenos geoeconômicos e geopolíticos na América Latina, o grupo pretende contribuir na discussão sobre as principais transformações do papel do Estado e das atividades econômicas,

com suas consequências territoriais e sociais. Pretende, também, discutir os diversos processos de integração em curso no subcontinente, observando os principais atores (governos, empresas, sociedade civil, organizações internacionais). O grupo está elaborando o livro América do Sul: Estado, Economia, Território e Integração Regional, com previsão de lançamento para setembro deste ano pela Cenegri Edições.

Rio Uruguai

Conflitos por Demarcação de Fronteiras Conflitos Ambientais Conflitos de Controle Fronteriço Conflitos Energéticos

Serviço

Conflitos Agrários

Conflitos Geopolíticos

Org.: Prof. Dr. Wanderley Messias da Costa Cartografia: George Marcel Rosa Apoio: Viviam Merola 2007

Obra: Seguridad y Defensa em Sudamérica: entre la cooperación y el conflito Autor: Vitor Stuart Gabriel de Pieri Editora: Eudeba


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Nas bancas

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Jovens cegos são alvo de bullying em aulas de educação física, aponta tese Fotos: Antonio Scarpinetti

Alunos de escolas públicas têm participação limitada e ficam isolados em atividades RAQUEL DO CARMO SANTOS kel@unicamp.br

professora de educação física Maria Luiza Tanure Alves não esperava encontrar relatos de bullying tão impressionantes tendo como vítimas adolescentes cegos que frequentavam as aulas de educação física nos ensinos fundamental e médio em São Paulo. “As brincadeiras e zombarias envolvendo as características físicas são frequentes. São comuns, também, exemplo, frases do tipo ‘que horas são?’ ou ‘está vendo tal coisa?’. Enfim, não tinha conhecimento de que este tipo de aluno sofria tanto com os comentários dos colegas na escola”, destaca Maria Luiza. Ela fez entrevistas com oito alunos deficientes visuais provenientes de diferentes escolas da capital paulista com o objetivo de analisar o processo de inclusão destes estudantes na escola pública e acabou descobrindo que o bullying também é um aspecto que merece atenção. Os voluntários do estudo tinham entre 13 e 18 anos. Todos desenvolviam alguma atividade na Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual - Laramara, em São Paulo, entidade voltada para o apoio ao desenvolvimento humano e inclusão dos deficientes e seus familiares. Na escola regular, no entanto, a história era diferente. A pesquisa mostrou que esses alunos não se sentiam incluídos durante as aulas de edu-

Aula de educação física em escola pública: para autora do estudo, atuação de professores merece ser analisada

cação física, pois tinham participação limitada nas atividades e se mantinham isolados do grupo. “A realidade vivenciada por eles é muito difícil. Se sentem isolados e são mantidos sentados nos cantos das quadras sem qualquer tipo de atividade ou interação com os colegas. Teve um caso de aluna que permaneceu em um canto de uma quadra descoberta até acabar o período da aula, aproximadamente 50 minutos”, relata. A pesquisa de doutorado foi defendida na Faculdade de Educação Física (FEF) e teve a orientação do professor Edison Duarte. Segundo apurou Luiza Tanure, os professores de educação física têm papel fundamental no processo de inclusão dos alunos com deficiência, principalmente em se tratando de uma das disciplinas com maior possibilidade de interação, como é o caso da educação física, pela própria natureza da prática. É

preciso, explica ela, que o professor tenha uma formação qualificada para que seja atuante no processo de interação social do aluno cego nas aulas. “Tanto a participação como a interação são aspectos indissolúveis e essenciais. Percebi que existe um círculo vicioso no sistema, uma vez que os alunos não são chamados a participar das aulas e, por conseguinte, não conseguem interagir com a turma. O professor acaba excluindo o aluno do processo quando não oferece a oportunidade de participação no contexto da aula”, esclarece. Na percepção dos deficientes, o professor é quem teria a voz ativa e poderia de alguma forma envolvê-los no processo para estimular a interação com os colegas. A professora defende que a inclusão se refere à educação de qualidade para alunos com deficiência no sistema regular de ensino. O estudo desenvolvido na FEF aponta,

justamente, a concepção e a percepção de inclusão que o aluno com deficiência visual tem nas aulas de educação física. Por isso, as questões do bullying e do papel fundamental do professor chamaram tanta a atenção da pesquisadora no trabalho. “Não tinha ideia de que a atuação do professor precisava de uma análise e uma mudança radical de mentalidade”, avalia. O fato de colocar o aluno em sala de aula não é o suficiente para que o mesmo se sinta incluído no contexto escolar. Outra questão demonstrada na pesquisa e que merece destaque na opinião de Luiza Tanure seria em relação à aceitação por parte dos colegas. Este aspecto também é fator fundamental para a exclusão do aluno com deficiência visual da escola. Neste caso, Maria Luiza acredita que deveria ocorrer o envolvimento dos pais, pois muitas das situações se referem à educação recebida em casa. “Durante a pesquisa foi observado que alguns fatores familiares interferem na questão da aceitação das diferenças em sala de aula. O professor tem dificuldades para realizar uma intervenção mais pontual neste aspecto”, analisa. Na opinião da pesquisadora, que durante sete anos atuou como professora em escolas públicas, as políticas públicas devem ter como foco a preparação profissional contínua e de qualidade, mas também um trabalho social com mudança de valores para a aceitação da deficiência.

Publicação Tese: “O aluno com deficiência visual nas aulas de Educação Física: análise do processo inclusivo” Autora: Maria Luiza Tanure Alves Orientador: Edison Duarte Unidade: Faculdade de Educação Física (FEF)

Método avalia desgaste de sinalização ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br

O pesquisador da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) Fernando Augusto Baptistini Pestana validou um método visual com potencial de aplicação ao sistema viário para avaliar desgaste da sinalização urbana. Testado por usuários do sistema e técnicos, mostrou-se factível e com ganhos na predição do momento em que deve haver repintura. O estudo foi feito na cidade de Sumaré. A metodologia consistiu em aplicar faixas de pintura de três tipos de tintas em nove pontos, escolhidos conforme as variações nas características das vias e fluxo de tráfego. Foram colhidas imagens das faixas e elaborado um banco de dados. Essas imagens foram submetidas ao critério testado – uma adaptação do Design Manual for Roads and Bridges –, procedimento usado no Reino Unido. Foram classificadas visualmente de 0 a 5, onde 0 significava ausência total de sinalização e 5 sinalização

nova. Os resultados foram comparados. O método buscou apresentar um padrão visual que definisse o momento da repintura, trazendo uma ferramenta para balizamento, já que não há norma da ABNT que contemple parâmetros a essa definição. A avaliação da sinalização em geral é feita visualmente, tornando-a muito subjetiva aos critérios do observador. Em outros países, há grande variação de quesitos e cada organismo de trânsito tem um método no momento da repintura. Alguns baseiam-se na visibilidade noturna (retrorrefletividade), outros na diurna (percentual de pintura remanescente sobre o pavimento) e outros ainda em ambos. Pestana pretendia oferecer uma ferramenta aos municípios de fácil análise do estado da sinalização. As avaliações foram feitas de 2004 a 2006 e adentraram 2011. Em função dessas informações, o autor da tese propôs esse método para um caso real de controle de durabilidade da sinalização urbana em diferentes lugares da cidade, mormente os que se mostraram mais frágeis.

Faixa de pedestres: validado, método visual tem potencial de aplicação ao sistema viário

Orientado pelo professor da FEC Cássio Eduardo de Paiva, escolheu Sumaré por se enquadrar bem nas condições de entorno para o qual havia sido planejado o estudo e por ter atuado naquela Prefeitura até 2004, o que facilitou algumas necessidades do experimento de campo, como o procedimento de bloqueio momentâneo do trânsito. O pesquisador viu claramente variações na durabilidade da sinalização e que elas decorreram das características físicas das vias (locais em aclive, declive, plano, tangente, curva) e do fluxo de tráfego (locais com aceleração, desaceleração, frenagem, tráfego de veículos leves ou pesados). Notou ainda que as tintas tinham diferente durabilidade e que determinadas condições físicas contribuíram para o seu desgaste mais prematuro. “Em trechos contendo curva e aclive, a sinalização desgastou mais rapidamente do que em trechos planos e reto”, conta ele.

INVESTIGAÇÃO

De acordo com Pestana, a pesquisa foi motivada pela observação de que os municípios brasileiros, a priori os de pequeno e de médio porte, não possuíam equipe técnica especializada e nem ferramentas para realizar o correto gerenciamento da sinalização horizontal urbana. Trata-se de uma situação indesejável no mundo todo, já que esse tipo de sinalização se presta justamente a orientar os usuários das vias (motoristas, motociclistas, ciclistas e pedestres) a terem comportamentos que aumentem a sua segurança pessoal e a fluidez do trânsito, ordenando o fluxo de tráfego. Geralmente, é de se esperar que a sinalização esteja sempre em boas condições, e ela é pintada com determinadas cores para fazer uma advertência. Ocorre que a sua duração está muito sujeita à intensidade do tráfego, e a sua visibilidade pode ser prejudicada por situações como pista molhada ou muito suja. Por isso, reflete ele, é preciso que haja re-

aplicação da pintura nos locais aos primeiros “sintomas” de desgaste. O ideal é que a marcação seja feita com tinta refletiva para ajudar os condutores na visualização à noite. Pestana pondera que a manutenção preditiva é o ideal (previsão de quanto tempo a sinalização duraria sob ação do tráfego), mas isso ainda não é possível de ser previsto com o método proposto. “Mostramos um parâmetro para identificar o momento da repintura e os elementos que podem afetar a durabilidade da pintura.” Por outro lado, o estudo sugeriu uma preocupação dos órgãos de transporte de Sumaré para obter materiais de sinalização com uma maior vida útil, apesar da carência de estudos que avaliam a durabilidade de sinalização quando submetida a vários tipos de solicitação do tráfego urbano. Num trajeto, há uma série de obstáculos resultantes da sinalização horizontal aplicada àquele meio urbano. É o caso de uma sinalização inadequada e que gera gastos desnecessários quando se usam materiais mal-especificados. Pestana aconselha que se busquem materiais de maior durabilidade para locais de maiores desgastes e materiais de menor custo (e de menor durabilidade) para locais de menores desgastes. “Lamentavelmente ainda falta estrutura e conhecimento técnico sobre o dimensionamento da sinalização horizontal em meio urbano.”

Publicação Tese: “Avaliação visual do desgaste da sinalização horizontal urbana em um município de médio porte” Autor: Fernando Augusto Baptistini Pestana Orientador: Cássio Eduardo Lima de Paiva Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)


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Assoreamento é ameaça

para navegação e geração de energia Estudos na Usina de Barra Bonita dimensionam impactos e propõem alternativas Foto: AES/Tietê/Divulgação

SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br

assoreamento, fenômeno que reduz a profundidade dos rios, avança de forma crescente no trecho de remanso do reservatório pertencente à Usina Hidrelétrica do município de Barra Bonita (SP). Pesquisas da Unicamp traçaram um cenário preocupante por conta da sedimentação gradativa no local. Além do prejuízo para a geração de energia, há risco de paralisação no transporte de cargas no trecho que integra traçado da mais importante hidrovia do país, a Tietê-Paraná. Em menos de cinco anos, alguns pontos ficaram 12 metros mais rasos, conforme levantamentos batimétricos realizados na região. “É preocupante, pois são duas áreas de interesse para a nação: transporte, principalmente, escoamento de grãos, e geração de energia”, dimensiona o engenheiro civil e eletricista Tiago Zenker Gireli, docente da Faculdade de Engenharia Civil Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp. Sem obras para impedir o processo de assoreamento, a previsão nos próximos anos é de que a capacidade de geração de energia para o país seja afetada. O docente informa que, atualmente, os reservatórios do Tietê respondem por parcela considerável da demanda de energia hidrelétrica da região sudeste do Brasil. A diminuição da capacidade de geração de energia pode ocorrer caso a prioridade do reservatório de Barra Bonita seja a navegação. Conforme Tiago Gireli, a hidrovia exige certa profundidade, restringindo, deste modo, a utilização da água para a hidrelétrica, que é afetada ainda mais pela sedimentação no trecho. No plano hidroviário a situação também é crítica: já não é possível navegar utilizando a profundidade normal das embarcações, que é de 2,9 metros. “Neste trecho a hidrovia só funciona, de forma plena, seis meses por ano e a tendência é que isso piore com o aumento do assoreamento”, alerta o docente. “Recentemente, pudemos acompanhar pela imprensa a situação caótica no porto de Santos por conta da safra de soja. Apenas um comboio utilizando a hidrovia Tietê-Paraná seria capaz de transportar o que 180 caminhões carregam juntos”, compara Tiago Gireli, que chefia o Departamento de Recursos Hídricos da FEC. Barra Bonita é a primeira de uma cascata de usinas subsequentes, distribuídas ao longo da hidrovia Tietê-Paraná. A usina represa as águas do rio Tietê, um dos afluentes da bacia do rio Paraná que abastece o reservatório da Itaipu Binacional. A hidrovia abrange, por sua vez, 220 municípios em cinco Estados, sendo responsável pelo escoamento anual de aproximadamente 3 milhões de toneladas de grãos.

LINHAS DE PESQUISAS

Os trabalhos na região vêm sendo desenvolvidos desde 2010 no âmbito de duas linhas de pesquisas multidisciplinares: modelagem física e matemática de obras fluviais e marítimas; e sistema de avaliação de perdas energéticas em hidroelétricas causadas por transporte hidroviário. “Buscamos, com estas pesquisas, criar soluções que otimizem os dois usos, tanto para a geração de energia, como para o transporte. Impactar a geração de energia é prejudicial para o país, ainda mais num momento de estímulo ao crescimento econômico. Por outro lado, existe a necessidade de corrigir a nossa matriz de transporte, com estímulo às ferrovias e hidrovias”, delineia Tiago Gireli.

Vista aérea da barragem e da eclusa da Usina de Barra Bonita: em menos de cinco anos, alguns pontos ficaram 12 metros mais rasos

possível conciliar os dois principais usos do reservatório, que se tornaram conflitantes. “É um conflito localizado porque o assoreamento diminui a profundidade para navegação. Por outro lado, estes sedimentos também atrapalham a geração de energia. E se uso da barragem está mais voltado à hidrelétrica, como acontece hoje, há prejuízos para a hidrovia por conta da diminuição do nível de água”, expõe.

CENÁRIO

Os estudos traçaram um cenário, estimando o volume, a taxa anual de assoreamento e a evolução espacial dos depósitos. Para simular este cenário, elaborou-se um modelo computacional baseado em dados fornecidos pelo Departamento Hidroviário do Estado de São Paulo e pela AES Tietê, concessionária que administra a Usina. O modelo de computador foi desenvolvido pela engenheira agrícola Maria Clara Albuquerque Moreira, que defendeu, no final de 2012, dissertação de mestrado junto ao programa de pós-graduação da FEC. O estudo foi orientado por Tiago Gireli. “O doutorado da Maria Clara começou em seguida. É uma continuidade. No mestrado focamos o modelo para entender o comportamento. Agora, estamos refinando este modelo e, a partir disso, vamos propor obras fluviais que possam melhorar este problema”, explica o orientador.

MULTIDISCIPLINARIDADE

Ele acrescenta que participam das linhas de pesquisas, os docentes da FEC Paulo Sérgio Franco Barbosa e Alberto Luiz Francato, além dos pós-doutorandos João Eduardo Gonçalves Lopes e Tatiana Belanga Chicareli. Joao Lopes já atuou como engenheiro na Companhia Energética de São Paulo (Cesp), e a economista Tatiana Chicareli

é doutora pelo Instituto de Economia (IE) da Unicamp. Outros dois pesquisadores também integram a equipe: os engenheiros civis Oswaldo Buzolin Junior e Victor de Barros Deantoni, doutorando e mestrando da FEC, respectivamente. “O propósito final destas pesquisas é criar ferramentas que auxiliem os gestores públicos nas suas tomadas de decisões. Há especialistas das áreas de energia, hidráulica, hidrodinâmica e economia. Tentamos abarcar diferentes campos para gerar uma solução integrada e aplicável”, fundamenta.

CONTAMINAÇÃO

O reservatório de Barra Bonita recebe a água e consequente contaminação que desce pelo rio Tietê, explica o engenheiro Tiago Gireli. “Quando este fluxo de água chega ao reservatório, a sua velocidade diminui. Isso acontece porque o local foi transformado num lago por conta da barragem. Portanto, toda a carga de sedimentos vindos do Tietê que o rio consegue trazer acaba parando ali. É o processo que chamamos de assoreamento”, esclarece. Ainda de acordo com ele, há planos para obras de dragagem no trecho mais crítico, situado na área de remanso, onde a velocidade da água é baixa. As escavações e remoções dos sedimentos esbarram, no entanto, em vários complicadores ambientais e operacionais. Estas dificuldades explicam, conforme Tiago Gireli, o porquê da obra ainda não ter saído do papel. “A dragagem prevista tem um problema ambiental porque não é um simples processo de remoção. Há muitos elementos tóxicos neste sedimento: metais pesados, elementos carcinogênicos etc. Portanto, se o processo de dragagem misturar estes elementos novamente na água, haveria grave prejuízo ambiental. Seria necessário remover e lançar num aterro sanitário”, revela. Foto: Antoninho Perri

USOS CONFLITANTES

Ele reconhece que há investimentos efetivos na hidrovia, mas ainda existem gargalos. “O objetivo é entender para propor obras a fim de colaborar para uma utilização mais eficiente, tanto na geração de energia como no transporte hidroviário”. Atualmente, devido ao processo de assoreamento, não é

O professor e engenheiro Tiago Zenker Gireli, coordenador das pesquisas: “A situação é preocupante”

ALTERNATIVAS

Resultados parciais dos estudos conduzidos na Unicamp já indicam algumas alternativas ao processo de dragagem. O docente aponta que poderiam ser empregados, por exemplo, diques e espigões. Ele explica que os diques são obras longitudinais utilizadas, neste caso, para estreitar o canal, aumentando a sua profundidade. Deste modo, a possibilidade de acumulação de sedimentos seria menor. Já os espigões são estruturas dispostas transversalmente no canal para proteger a margem contra as correntes. Quando associado ao dique, este tipo de estrutura potencializa o efeito de estreitamento do canal e, ao mesmo tempo, retém parte dos sedimentos ao lado do curso, facilitando a sua retirada. “Favorece a manutenção com um custo menor do que a dragagem. Basta uma retroescavadeira convencional para remover este sedimento, sem a necessidade de embarcações e obras complexas que a dragagem exigiria. Além disso, haveria um ganho na geração de energia ao aumentar o volume de água, que antes era ocupado pelos sedimentos”, compara. Parte da investigação sobre Barra Bonita foi desenvolvida no âmbito de programa de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) custeado pela AES Tietê. Os estudos também contam com financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Publicações FRANCATO, A. L.; GIRELI, T. Z.; LOPES, J. E. G.; BARBOSA, P. C. F.; PÓVOA; M. J.; LOPES, W. P.; MOREIRA, M. C. A. Avaliação de impactos na produção de energia hidroelétrica com as previsões de crescimento na demanda por transporte hidroviário. IN: XXI Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica, Florianópolis, 2011. MOREIRA, M. C. A.; ABUD, R. B. S.; GIRELI, T. Z.; FRANCATO, A. L.; LOPES, W. P. Estudo gráfico do assoreamento do reservatório de Barra Bonita: geração e sobreposição de levantamentos batimétricos. In: XXV Congresso Latinoamericano de Hidráulica de San Jose, Costa Rica, 2012. Tese: “Avaliação da influência da barragem de Barra Bonita (SP) na morfodinâmica do rio Tietê e seus impactos à navegação” Autora: Maria Clara Albuquerque Moreira Orientador: Tiago Zenker Gireli Financiamento: AES Tietê e Capes Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)


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Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

Software determina número mínimo de detectores a ser utilizado em uma área industrial

Controlando o vazamento de gases Foto: Antoninho Perri

CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br

êm sido recorrentes as notícias de acidentes de vazamentos de gases em processos industriais, alguns profundamente trágicos em relação às perdas de vidas e às consequências ecológicas. Em uma década, dois foram particularmente alarmantes. Em março de 2001, ocorreram explosões na P-36, operada pela Petrobrás na Bacia de Campos, a 130 km do estado do Rio de Janeiro, que levaram ao afundamento da plataforma. Relatório da Agência Nacional do Petróleo (ANP) aponta, entre as principais causas do acidente, que deixou 11 mortos, a ausência de dispositivos de detecção e contenção de gases em uma área negligenciada como de risco. Em abril de 2010, no golfo do México, a 17 km da costa da Lousiana, EUA, uma plataforma operada pela British Petroleum pegou fogo após explosão. Em decorrência, o sistema automático de controle da válvula instalada no fundo do mar falhou e permitiu o vazamento, a muito custo controlado, desencadeando um dos mais trágicos desastres ecológicos de que se tem notícia. Estes dois exemplos mostram a importância de desenvolvimento de controles eficazes nos sistemas produtivos que envolvem risco. É nesse contexto que se situa o trabalho desenvolvido pelo engenheiro químico e professor da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp, Sávio S. V. Vianna, que desenvolveu a ferramenta denominada OPTIMI, um software que permite determinar o número mínimo de detectores de gases que deve ser utilizado em uma área industrial e em que locais devem ser colocados para garantir 100% de cobertura em relação à detecção de vazamentos. O docente explica que todas as unidades de processos precisam manter detectores de gases. Até algumas décadas, a localização desses instrumentos era feita de forma empírica e baseada em experiências de campo. Com o desenvolvimento, em décadas mais recentes, da modelagem computacional de escoamento de gases, consegue-se obter uma descrição melhor de como se distribui espacialmente a nuvem gasosa, o que facilita a decisão sobre a alocação dos detectores. Apesar dessa evolução, as decisões de onde colocar os detectores de gases resultam ainda de experiências de campo e de decisões pessoais dos técnicos e engenheiros. Com isso, não se tem garantia de que os detectores estejam em número e posições mais adequados e nem de que oferecem garantia de 100% de cobertura. Outro problema é o da falha espúria, assim chamada quando o detector dispara mesmo na ausência de gases. Dispositivos em excesso facilitam essa ocorrência e desacreditam o sistema diante do número de alarmes falsos, que não são mais levados a sério pelos operadores, que chegam até a desligar detectores. Esse quadro motivou o pesquisador na procura de um modelo de cunho matemático, utilizando um algoritmo específico, que permitisse determinar o número de detectores efetivamente necessários e sua melhor localização para atingir uma forma ótima, de maneira a garantir uma cobertura de 100% de uma determinada área industrial. A ideia, então, foi juntar as possibilidades oferecidas pela técnica Computational Fluid Dynamics (CFD), já muito bem desenvolvida, que faz exclusivamente a simulação da dispersão da nuvem de gás, com a otimização por ele pretendida de desenvolver um novo software que permita determinar o número ideal e a localizações ótimas de detectores. O estudo visou desenvolver um programa para juntar o melhor de dois mundos em uma nova ferramenta, que não tinha ainda sido desenvolvida em qualquer lugar do mundo, com as características a que ele se propôs. A ferramenta combina os resultados da simulação tridimensional da dispersão de gases com técnicas de otimização. Fornece a localização espacial de detectores de gás combinado com o modelo 3D da planta do processo. O programa está customizado para resolução de problemas de cobertura de conjuntos e já foi testado no Brasil e na Europa. Em vista dessa inovação, o docente está trabalhando junto com a Agência de Inovação

O professor Sávio Vianna, coordenador das pesquisas: ferramenta simula vários cenários para dispersão de gases decorrentes de vazamentos

Divulgação

Ilustração mostra o arquivo de saída do OPTIMI. A região quadricular representa a área analisada e suas respectivas subáreas. A localização dos detectores de gás está apresentada nos pequenos quadrados escuros

Inova Unicamp em um processo de patente para a nova metodologia. Nesse processo, ele se deu conta de que havia inovação tanto no algoritmo utilizado na ferramenta quanto na metodologia em si, mesmo porque não existe ninguém trabalhando nessa direção tanto no país como fora dele. Por ocasião de um congresso internacional em Roma, o pesquisador teve oportunidade de entrar em contato com um grupo norueguês que desenvolve um software de dispersão de vazamento de gases e interessado em comprar a ferramenta de otimização, para ampliar o atendimento a seus clientes. A empresa não dispõe de um link que permita utilizar as informações correspondentes à dispersão gasosa para determinar a posição dos detectores de gases. A constatação de que se tratam de duas tecnologias inovadoras o leva a afirmar que “nesse campo, a Unicamp está desenvolvendo uma tecnologia de ponta”. O trabalho proporcionou o desenvolvimento de um software que combina fluidodinâmica computacional e programação matemática para otimização e localização de detectores de gás. O programa ainda combina os resultados com arquivos CAD (Computer Aid Design) para melhor visualização.

A FERRAMENTA

O software OPTIMI permite, portanto, determinar qual o número mínimo de detectores necessários e como devem ser dispostos para 100% de cobertura em um determinado espaço na forma tridimensional. Para tanto, a ferramenta utiliza os resultados da mais avançada tecnologia que simula vários cenários para dispersão de gases decorrentes de vazamentos, com a elaboração de mapas dos possíveis tamanhos de nuvens inflamáveis que possam se formar, levando em consideração velocidade e direção dos ventos, temperatura ambiente, direção e localização do vazamento. Uma vez informado do tamanho da região do espaço em estudo – como, por exemplo, o ocupado pela área de craqueamento em uma refinaria – o programa divide esse espaço em áreas menores, as subáreas (em forma de cubos), determinadas em função do tamanho

Figura apresenta a simulação fluidodinâmica computacional (CFD) do vazamento de gás na área de processo. Os resultados da dispersão de gases são usados no OPTIMI para solução do problema de otimização de cobertura da área analisada

da menor nuvem de gás formado. Cada um dos cubos é candidato a receber um detector. O sistema determina quais deles deve efetivamente recebê-los. Se houver necessidade, ele permite também o favorecimento de subáreas, que devem ser priorizados com peso maior, como aquelas em que se localizam mais válvulas, mais tomadas de instrumentos. A ferramenta ainda permite mostrar a posição dos detectores na planta industrial tridimensional. Segundo o docente, trata-se de uma informação importante porque possibilita que técnicos de manutenção e operação possam antecipadamente avaliar a praticidade do projeto, evitando que detectores sejam colocados em locais de acesso problemáticos ou complicados. Incorporadas as alterações necessárias, a nova distribuição dos dispositivos é então implementada, ainda na fase de projeto, de modo a que a nova distribuição garanta ainda 100% de cobertura. Essa etapa final do projeto, que antecede a sua execução, em que se realizam os chamados “testes de sanidade”, mostra que o software permite a contribuição prática de técnicos e engenheiros para a escolha da melhor solução final. O professor lembra que o programa pode resolver problemas de otimização discreta, que são os que envolvem valores precisos, caso do número e distribuição de antenas de celulares, de viaturas policiais em uma cidade. Vianna lembra que a ideia do estudo veiolhe em 2002, quando se discutia o problema de cobertura dos celulares, já que demandam soluções análogas. O docente conta que, quando ainda por ocasião do final doutorado em engenharia mecânica na Universidade de Cambridge, Inglaterra, conseguiu verba extra da Capes para trabalhar com o desenvolvimento de software para otimização de detectores de gases, retomando um estudo que embrionariamente já havia começado ainda por ocasião do mestrado na Coppe-URFJ, utilizando duas dimensões, embora já soubesse da possibilidade de ampliá-lo para três dimensões. Ao vir para a Unicamp, no início do ano passado, continuou as pesquisas nessa área

utilizando verba do Faepex (Fundo de Apoio ao Ensino, à Pesquisa e à Extensão), mantido pela Unicamp, que tem por finalidade prover recursos para incentivo e apoio a projetos e atividades de ensino, pesquisa e extensão que contribuam para o enriquecimento da vida acadêmica. Os recursos utilizados pelo pesquisador vieram através de uma das linhas de pesquisas oferecidas pelo Fundo, que oferece, entre outros, auxílios à Pesquisa Para Docentes em Início de Carreira (PAPDIC).

DERIVAÇÕES

O engenheiro químico Caio Biondi, graduado na Faculdade de Engenharia Química da Unicamp, resolveu investir um tempo adicional no mestrado na Unicamp atraído pela sua projeção nacional e internacional e por desejar trabalhar em um centro de pesquisas. Depois de cursar as matérias teóricas nos seis primeiros meses, passou a trabalhar, em 2013, com o professor Sávio Vianna com o objetivo de expandir o uso da ferramenta por ele desenvolvida com vistas à sua otimização em processos químicos. Neste caso ele se propôs a fazer a customização do método, ou seja, o desenvolvimento de um software específico que permita estabelecer as melhores condições de operação de uma planta da indústria química. Para tanto, está desenvolvendo a modelagem matemática para problemas contínuos. Como modelo inicial ele começou a estudar uma refinaria de petróleo, do qual se extraem varias frações, inclusive de gasolinas, que têm um preço de produção e um preço de venda. O software em desenvolvimento deve ter condições de determinar que quantidades dessas frações possíveis devem ser produzidas ao menor custo e com a máxima rentabilidade, que é uma das funções da engenharia química. O professor Vianna lembra que softwares com essa finalidade já existem no mercado, mas são extremamente caros, o que justifica o desenvolvimento de uma tecnologia brasileira, principalmente para atender empresas de menor porte. Ademais, o estudo contribui para a formação de recursos humanos para atuar no país.


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Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

Salto do mínimo atenua desigualdade e beneficia trabalhador de menor renda Pesquisa analisa impactos da recuperação do salário ao longo de mandatos de Lula PATRÍCIA LAURETTI patricia.lauretti@reitoria.unicamp.br

palavra “desconcentração”, quando relacionada à renda na economia brasileira, soaria no mínimo improvável até bem pouco tempo. Pois é justamente a palavra mais usada pela pesquisadora Jacqueline Aslan Souen, autora da dissertação de mestrado “A política do salário mínimo no governo Lula”, apresentada ao Instituto de Economia (IE), sob orientação do professor Anselmo Luis dos Santos, do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit/ Unicamp). Com o objetivo de analisar os impactos da trajetória de recuperação do salário mínimo na renda do trabalho durante quase a totalidade dos dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) na Presidência da República, Jacqueline tabulou os microdados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), de 2004 e 2009, e concluiu que os trabalhadores com menor renda, sobretudo no Nordeste do país, foram os maiores beneficiados com a política de valorização do salário mínimo. A base de dados de 2003 foi descartada devido a uma mudança metodológica da PNAD que tornou incompatível a análise comparativa com os dados de 2009, a última base disponível do período Lula. Não há base da PNAD referente ao ano de 2010, pois foi ano do Censo. Os trabalhadores do Nordeste, com a menor renda média do país – abaixo de dois salários mínimos, em 2004 –, tiveram um crescimento real de seus rendimentos médios da ordem de 29,3%. Comparativamente, no Sudeste, onde a renda média individual equivalia praticamente ao dobro de um salário mínimo em 2004, a variação também foi positiva, no entanto chegou a pouco mais que a metade: 15,3%, mostrando diminuição da dispersão dos salários. O “coeficiente de Gini” – medida comumente utilizada para calcular a desigualdade de distribuição da renda do trabalho – também caiu no Brasil, ilustrando em uma curva descendente a mudança desde 2004. “Vários fatores colaboraram para o bom rendimento da renda média do trabalhador neste período, entre eles o crescimento eco-

nômico, a queda do desemprego, o aumento do piso das categorias. Nesse contexto, a política de recuperação do salário mínimo contribuiu para a desconcentração da renda no mercado de trabalho”, observa Jacqueline. A pesquisadora considera que o processo de transformação política e da economia se deu a partir de 2004, com um governo mais afinado com as demandas sociais, e mais disposto às negociações. A retomada do crescimento da economia, inicialmente puxada pelo aumento das exportações, e que estimulou o reaquecimento da demanda interna, foi realimentada, posteriormente, pelos estímulos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), além da queda de juros e ampliação do crédito ao consumidor. Outro fator preponderante do período foi a adoção de um critério de reajuste do salário mínimo baseado na inflação de 12 meses mais a variação do PIB de dois anos anteriores. “Houve bastante pressão social e mobilização dos trabalhadores para que finalmente se estabelecesse um critério de reajuste. O projeto foi para o Congresso em 2007 e passou a ser lei em 2011. As negociações deixaram de ser pontuais, ampliando a segurança da política de valorização”, salienta. Com dados do Ipeadata, considerando valores reais de dezembro de 2010, entre 2002 e 2010 o salário mínimo teve valorização real de aproximadamente 56%. Em 2002, segundo dados da pesquisa, a média anual do mínimo girou em torno de R$ 337,00. Em 2010, saltou para R$ 525,00. Entre 2004 e 2009, o país cresceu cerca de 4% ao ano, com inflação medida pelo INPC de cerca de 5% ao ano. A trajetória de recuperação do salário começou já em 1995, com a estabilização monetária promovida pelo governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. Não houve, no entanto, redução da desigualdade de renda em função do tímido crescimento da economia, conforme os estudos de Jacqueline. “A comparação com o governo de FHC não é meu foco, mas se entre 2004 e 2009 houve aumento de 18,7% na renda média do trabalhador, no período FHC houve redução de 16%”. O salário mínimo foi instituído por Getúlio Vargas e teve o primeiro valor fixado em 1940 por meio de decreto presidencial. O maior período de valorização abrangeu os anos que antecederam a ditadura militar.

Fotos: Antonio Scarpinetti

De acordo com a pesquisa, trabalhadores domésticos tiveram até 30,8% de aumento na renda média

Entretanto, a partir de 1963, até 1993, incluindo o período do chamado “milagre econômico brasileiro”, houve achatamento do piso mínimo. “Na fase de maior crescimento do país, durante o governo militar, apesar do desempenho favorável da economia, a política de arrocho dos salários e do salário mínimo contribuiu para o aumento da desigualdade na distribuição pessoal da renda do trabalho, bem como para a redução da participação dos salários na renda nacional”, ressalta a autora. A pesquisa de Jacqueline avaliou a recuperação da renda média por faixa salarial, mas também por posição na ocupação. E, neste caso, também foram aqueles em situação mais precária os grandes beneficiados. É o caso, por exemplo, dos trabalhadores domésticos com e sem carteira assinada, que tiveram até 30,8% de aumento na renda média. “Cheguei à conclusão de que os maiores aumentos dos rendimentos médios ocorreram nas menores faixas de renda e nas ‘piores’ ocupações. O objetivo era mostrar que os trabalhadores nas faixas de renda muito atreladas ao salário mínimo e nas ocupações mais precárias foram os que mais se favoreceram”.

LIMITES

Jacqueline Aslan Souen: “A recuperação do mínimo contribuiu para a desconcentração da renda no mercado de trabalho”

Renda média e massa salarial dos ocupados de quinze anos e mais e taxa de variação, conforme faixa de salário mínimo. Brasil, 2004 - 2009 2009 Variação 2004/2009 2004 1

A valorização do salário mínimo como estratégia para reduzir a concentração da

0,575

0,572

0,570

Massa salarial Renda média (Em R$) (Em R$)

Menos de 1 SM

2.661.322.582,69

172,89

4.082.241.220,00

235,84

53,4

36,4

1 SM a 1,25 SM

5.040.059.759,22

352,49

8.854.952.128,00

488,37

75,7

38,4

1,26 a 1,50 SM

2.227.362.990,75

456,07

4.709.705.039,00

617,41

111,4

35,4

Subtotal 1 a 1,50 SM

7.267.422.749,97

404,28

13.564.657.167,00

552,89

86,7

36,8

1,51 a 3 SM

13.742.803.748,57

669,98

21.280.433.073,00

929,87

54,8

38,8

0,535

3,01 a 5 SM

11.254.121.968,06

1246,31

14.492.288.404,00

1760,64

28,8

41,3

0,530

Acima de 5 SM

30.038.286.959,45

3685,33

33.130.893.097,00

4789,80

10,3

30,0

0,525

Total

64.963.961.008,74

-

86.550.512.961,00

-

33,2

-

Fonte: Microdados da PNAD - IBGE. Nota 1: Considerado valores reais corrigidos pelo deflator para rendimentos da PNAD (INPC-IPEADATA), referente ao mês de setembro de 2009 (mês de referência da PNAD).

Publicação Dissertação: “A política do salário mínimo no governo Lula” Autora: Jacqueline Aslan Souen Orientação: Anselmo Luis dos Santos Unidade: Instituto de Economia (IE)

Evolução do Coeficiente de Gini. Brasil, 2004 - 2009

Faixa de rendimento

Massa salarial Renda média Massa salarial Renda média (Em R$) (%) (Em R$) (%)

renda do trabalho tem seu limite bastante claro, adverte a pesquisadora. Funciona e se mantém enquanto a economia cresce com aumento da produtividade e da renda per capita. O Brasil ainda está muito longe de ter um salário mínimo com poder de compra que se equipare ao fato de a economia brasileira ser tida como a sétima do mundo. Jacqueline comparou o mínimo brasileiro com outros 24 países da América Latina, e o Brasil ficou em 16º lugar. Na relação com outros 23 países da União Européia e Estados Unidos, ficou em 20º. “Faço essa análise para mostrar que, se nos países desenvolvidos a valorização do salário mínimo é importante, que dirá em países como o nosso. Trata-se de uma política pública fundamental no Brasil, imprescindível em uma economia como a nossa”.

0,569 0,563

0,565 0,560

0,556

0,555

0,548

0,550

0,543

0,545 0,540

2004 Fonte: IPEADATA. Elaboração própria.

2005

2006

2007

2008

2009


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Deise, uma pioneira da

acessibilidade MARIA ALICE DA CRUZ halice@unicamp.br

abiana Bonilha é mestre e doutora em música pela Unicamp e hoje lidera uma equipe no Centro Nacional de Referência em Tecnologia Assistida (CTRA) do CTI Renato Archer, em Campinas. Viviane Missio, pedagoga pela mesma instituição, obteve excelente classificação em um concurso e hoje trabalha na Prefeitura de Valinhos. Marcos Valim foi o primeiro a circular pela Unicamp com um cão guia por perder a visão durante o doutorado. Com o apoio oferecido pelo Laboratório de Acessibilidade da Biblioteca Central Cesar Lattes (LAB-BCCL) e de um monitor pôde chegar ao título de doutor em química. Essas conquistas, envolvendo três pessoas cegas acima citadas, fazem brilhar os olhos de Deise Tallarico Pupo, coordenadora e uma das idealizadoras do LAB. Todos os dias ela comemora as histórias que o LAB ajudou a escrever. Enredos propiciados pela realização de um sonho seu e de outras amigas da Universidade: a biblioteca acessível. Como diz o diretor da BCCL, Luiz Vicentin, o LAB é mais um filho na vida de Deise. Mas ela faz questão de dizer que não é fruto de uma só cabeça, mas de várias. Confessa ser o lugar onde ela se realiza a partir das conquistas dos estudantes que saem de lá rumo ao mercado ou à carreira acadêmica. E onde assiste à recuperação do próprio filho, Fábio, vítima, aos 5 anos, de um acidente que lhe acarretou deficiência motora e de fala. Fábio faz parte de um grupo de quase 700 pessoas da comunidade externa à Unicamp já beneficiadas pela infraestrutura do espaço desde 2003, ano em que o LAB foi aberto para a comunidade. Sua história foi inspiração para a mãe querer modificar histórias de pessoas com as quais não tinha nenhuma relação. “Mesmo antes do acidente do Fábio, eu já pensava em acessibilidade. Eu tinha uma ligação muito forte com a questão da deficiência desde que eu tinha me casado. Parece que as coisas caem em nosso colo quando já temos uma ligação”, pontua Deise. A partir da leitura de sua própria história, ela tentou reescrever a de centenas de desconhecidos, hoje amigos. Seu outro filho, Cláudio, também foi vítima de acidente de trânsito em 1999 e faleceu em 2002. Neste momento, o projeto já estava em andamento, mas, mais uma vez, ela transformou sua dor em luta e passou a se dedicar ainda mais ao projeto e publicar artigos sobre seus resultados. Em 1992, questões pessoais que incluíam o tratamento e a reabilitação de Fábio levaram Deise a mudar-se para São Carlos, onde trabalhou, comissionada, na Universidade Federal (UFSCar). Lá também integrou uma ONG, foi diretora da escola onde Fábio estudava, além de trabalhar em uma biblioteca comunitária. Em sua volta à Unicamp, sua experiência chamou a atenção da então bibliotecária responsável pela Biblioteca do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, Maria Alice Rebello Nascimento, que a acolheu, além de encomendar um projeto de biblioteca adaptada, como faz questão de lembrar Deise. “O acidente de meu filho me levou a um aprofundamento sobre o assunto e deparei com uma fatia grande da população ainda fora dos processos. A Maria Alice soube reconhecer minha experiência. Fiquei sem lugar ao voltar, mas ela abriu as portas do IFCH para mim”, acrescenta. Começou então a redigir o projeto de uma biblioteca acessível, que pudesse atender alunos, professores e funcionários com deficiência física; mas, ao longo de sua elaboração, as pessoas com deficiência visual manifestaram-se e argumentaram para se tornarem também seu público-alvo, devido às inovações tecnológicas que já os bene-

ficiavam. Devido a mudanças administrativas, o projeto do LAB migrou para a Biblioteca Central e, aos poucos, foi atraindo um número grande de pessoas cegas, entre as quais o violonista e professor convidado do Instituto de Artes Vilson Zattera. A área de tecnologia da informação e da comunicação é responsável por atrair este público, que a cada dia pode desenvolver de forma autônoma suas pesquisas e outros trabalhos. Esta é exatamente a missão de Vilson na Unicamp, aprimorar softwares para que estudantes e docentes cegos tenham mais autonomia para escrever sua própria partitura e fazer arranjos, entre outras atividades. “Essa interface que os softwares fazem com usuários cegos ou de baixa visão é extremamente importante”, complementa Deise. Hoje, alguns usuários escaneiam o próprio material num software e levam para casa para ouvir em mp3, conforme Deise. Sem funcionários, Deise faz questão de enfatizar o envolvimento dos alunos bolsistas. Muito deles continuam se dedicando às atividades no LAB, auxiliando usuários com deficiência mesmo tendo vencido o período de bolsa. A presença dos jovens é de grande valor para o LAB, segundo Deise, por dominarem a tecnologia de ponta utilizada por alunos e professores cegos, como leitor de telas. De acordo com Deise, os jovens acabam se envolvendo com as áreas e com as pessoas da Biblioteca Central. Mesmo assim, o laboratório espera na certificação a oportunidade de aumentar seu quadro de funcionários. O LAB contou com a colaboração das pedagogas Sílvia Carvalho e Regina Govoni, do Centro de Reabilitação Gabriel Porto, agora aposentadas. Atualmente, as atividades são compartilhadas com a pedagoga Magali Arnais, vinculada ao Dedic. Hoje, muitas famílias já sabem que podem ter o LAB como ponto de apoio. Um caso emblemático da importância do envolvimento da família, para Deise, é o da estudante Franciele Cristina Penteado. De acordo com a bibliotecária, a estudante perdeu a visão da noite para o dia por problema no nervo óptico, e o apoio para concluir o ensino médio partiu dos pais. Francielle passou no vestibular para o curso de Gestão de Empreas da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA), em Limeira, em 2010. Os professores do curso encomendaram uma palestra do LAB para que pudessem ajudá-la e, a partir de então, a transcrição do material ficou a cargo da equipe de Limeira. Ao compartilhar a realização de muitas famílias, Deise hesita em pronunciar a palavra aposentadoria. Cada palavra sugere que a dedicação entre ela e o LAB é mútua. “Sinto-me realizada porque em um momento muito difícil de minha vida pessoal, que foi a perda do Cláudio, eu vim para cá trabalhar em benefício de outras pessoas”. Ao tentar traduzir as percepções sobre si mesma, sobre ajudar se ajudando, declara que a Deise mãe, além de dar atenção ao Fábio, a suas duas filhas e a sua mãe, com Mal de Alzheimer, pôde exercer sua profissão ajudando pessoas que não teriam condições de ler ou estudar sendo um degrau importante de acessibilidade e inclusão dessas pessoas na graduação e na pós da Unicamp. Além disso, teve a Unicamp como parceira no desenvolvimento de Fá-

bio, que, por acompanhá-la teve a oportunidade também de pesquisar, utilizar computadores e interagir com as pessoas que passam e atuam no LAB. Ao ver o personal Raphael de Jesus Pinto, ex-bolsista, também assistente do professor Vilson, adentrar o laboratório, Fábio faz a festa e, quando o assunto é família, participa da entrevista elogiando os músicos da família. Em 1999, a portaria 1.679 determinava acessibilidade nas universidades para que todos os alunos com deficiência tivessem as devidas condições de concluir seus cursos. Caso contrário, não seriam credenciadas pelo MEC. Assim, as universidades foram construindo rampas e projetando espaços mais acessíveis, porém, o caminho é longo. Pode-se dizer que a Unicamp é uma das pioneiras em biblioteca acessível no ensino superior, segundo Deise. Em 1999, o projeto viabilizou a compra de uma cadeira que possibilita a circulação de usuários com deficiência em andares superiores e ainda pode ser utilizada em caso de emergência, como incêndio. Mas somente em 2000 a conscientização começou a crescer. Como uma das iniciativas responsáveis por abrir os olhos da comunidade acadê-

Experiências pessoais movem ações de funcionária da Biblioteca Central Cesar Lattes mica para inclusão, Deise cita o Projeto Todos Nós e o Núcleo de Informática Aplicada à Educação (Nied). “Vejo a inclusão acontecendo a partir da participação de alunos como a Fabiana, o Vilson, a inclusão que a professora Maria Teresa Egler Mantoan nos transmitiu. Entendemos como as pessoas com deficiência precisam estar em todos os lugares. Porque são eles que fazem a diferença em nosso trabalho”, acentua Deise. A Deise que um dia passou por projeto de reciclagem pessoal, começou catalogando a Biblioteca Sérgio Buarque de Holanda (SBH), foi bibliotecária de referência, trabalhou no IFCH, chefiou a biblioteca do Instituto de Estudos de Linguagem (IEL), hoje é convidada a apresentar trabalhos em congressos. Com o envolvimento do diretor Luiz Vicentin e da coordenadora Valéria dos Santos Gouveia Martins, ela se sente privilegiada por ter passado tantos anos no LAB. “É muito gratificante ver isso acontecendo na prática. Temos de continuar. A batalha está sendo vencida aos poucos, mas são essas conquistas e o sucesso de nossos usuários que nos levam a prosseguir até às maiores vitórias: essa é a nossa maior recompensa”. Foto: Antoninho Perri

Deise Tallarico Pupo, coordenadora e uma das idealizadoras do LAB: “As pessoas com deficiência fazem a diferença em nosso trabalho”


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Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

Estudo atesta sucesso do PAAIS CLAYTON LEVY clayton@reitoria.unicamp.br

JULIANA SANGION Especial para o JU

studo realizado pela Comissão Permanente para os Vestibulares da Unicamp (Comvest) mostra que estudantes oriundos de escolas públicas, bonificados pelo Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social da Unicamp (PAAIS), apresentam desempenho igual ou superior em relação aos que entraram na Universidade sem a ajuda do programa. O estudo acompanhou a vida acadêmica de todos os ingressantes nos anos de 2005 a 2008, comparando o desempenho de todas as turmas após quatro anos na Unicamp. Criado em 2004, o PAAIS concede 30 pontos de bônus na segunda fase do vestibular aos candidatos que cursaram os ensinos fundamental e médio na rede pública. Os que se autodeclaram pretos, pardos e indígenas ganham mais 10 pontos. Em todos os anos analisados, constatou-se que a nota dos estudantes da rede pública no vestibular foi sistematicamente mais baixa que a dos demais candidatos. Após quatro anos na Unicamp, porém, deixou de haver diferença estatisticamente significativa entre as notas médias dos dois grupos. “Os resultados mostram de maneira inequívoca que o PAAIS permitiu à Universidade fazer inclusão social sem perder a qualidade dos seus alunos”, disse o reitor José Tadeu Jorge. “Fica demonstrado, estatisticamente, que os ingressantes beneficiados pelo programa se saíram muito bem durante o curso, alcançando o mesmo nível de formação dos demais

estudantes e, pelos resultados, até com algum ganho de desempenho”, completou. O estudo comparou dois indicadores: a nota no vestibular e o coeficiente de rendimento ao final do curso de graduação. Apesar de obter notas menores no vestibular, os estudantes de escolas públicas bonificados pelo PAAIS conseguiram melhorar seu desempenho, igualando as notas obtidas ao longo do curso com as dos demais estudantes. Foram analisadas as áreas de Artes, Biológicas, Exatas, Engenharias, Humanas, Medicina e Tecnológicas. A divisão possibilita que sejam comparadas as notas de estudantes de cursos afins, considerando que as áreas apresentam formas distintas de avaliação. Segundo o reitor, os dados mostraram que o aluno beneficiado pelo PAAIS tinha um potencial de aproveitamento que a Universidade conseguiu catalisar. “Eles aproveitaram a oportunidade durante o curso de tal forma que eliminaram a diferença de formação que havia no ingresso”, pondera. “Portanto, o PAAIS trouxe alunos com potencial e fez inclusão social”. No curso de medicina, por exemplo, área que registra a maior relação candidato/vaga, das quatro turmas avaliadas, 347 estudantes ingressaram pelo vestibular convencional (sem bônus) e 93 entraram pelo PAAIS. Os que entraram sem ajuda do programa alcançaram nota média de 667 no vestibular, contra 644 obtida pelos beneficiados com o bônus, o que representa uma

DESEMPENHO – ESCOLA PÚBLICA 2005 A 2008 ÁREA

BONIFICAÇÃO DO PAAIS

N

NOTA PADRONIZADA POR OPÇÃO

COEFICIENTE DE RENDIMENTO

MÉDIA*

MÉDIA**

PAAIS NÃO PAAIS % ESCOLA PÚBLICA

157 536 23%

486 519

7,8 7,8

PAAIS NÃO PAAIS % ESCOLA PÚBLICA

457 1.044 30%

497 522

7,4 7,4

ENGENHARIAS

PAAIS NÃO PAAIS % ESCOLA PÚBLICA

646 2.201 23%

553 573

6,4 6,3

EXATAS E DA TERRA

PAAIS NÃO PAAIS % ESCOLA PÚBLICA

1.043 1.676 38%

502 527

5,8 5,8

PAAIS NÃO PAAIS % ESCOLA PÚBLICA

613 1.278 32%

496 537

7,4 7,2

PAAIS NÃO PAAIS % ESCOLA PÚBLICA

93 347 21%

644 667

7,8 7,7

PAAIS NÃO PAAIS % ESCOLA PÚBLICA

671 696 49%

395 428

5,9 6,0

ARTES BIOLÓGICAS E SAÚDE

HUMANAS

MEDICINA

TECNOLÓGICAS

* As diferenças entre as médias dos grupos PAAIS e Não PAAIS são estatisticamente significativas ** Não há diferença significativa entre as médias dos grupos PAAIS e não PAAIS

Estudantes bonificados têm desempenho igual ou superior em relação aos que não tiveram ajuda do programa Foto: Antonio Scarpinetti

Candidatos fazem prova do vestibular da Unicamp: estudo acompanhou a vida acadêmica de todos os ingressantes entre os anos de 2005 e 2008

diferença estatisticamente importante. Ao final do curso, o coeficiente de rendimento dos alunos do PAAIS foi de 7,8, enquanto os demais alcançaram 7,7. “Não há diferença significativa, mas uma leve tendência de que os alunos beneficiados pelo PAAIS se saíram melhor”, analisa o reitor. “Esses resultados mostram claramente o sucesso do PAAIS em fazer inclusão mantendo a qualidade dos estudantes e, portanto, dos profissionais formados pela Unicamp”, completou. Para Tadeu Jorge, os resultados do estudo confirmam na prática os pressupostos que sustentaram a criação do PAAIS em 2004. Segundo o reitor, antes do programa, quando se aplicava o vestibular, muitos estudantes da escola pública ficavam próximos da nota de corte, mas não conseguiam ingressar por uma diferença pequena. “O nosso pressuposto era que o aluno oriundo da escola pública, que ficava próximo da nota de corte mas não conseguia passar, certamente tinha um bom potencial”, explica. “Com o bônus, passamos a incluir esse aluno, na expectativa de ser um bom estudante que não conseguiu desenvolver todo o seu potencial porque a escola pública não conseguiu fazêlo chegar ao nível adequado”. Esse quadro fica mais evidente nos cursos de alta demanda, nos quais o número de candidatos nessa situação é significativo. “Tudo indica que são bons estudantes, mas que não conseguiam entrar por mero detalhe na hora da prova. Quando aplicamos o bônus, é como se abaixássemos a linha de corte para esses estudantes, de maneira que eles consigam ingressar”.

Os resultados revelados pelo estudo servirão de subsídio para ampliar o alcance do programa. “Estamos seguros para avançar ainda mais, aumentando os bônus concedidos pelo PAAIS e fazer mais inclusão”, disse o reitor. Segundo ele, as simulações em andamento indicam que o valor da bonificação concedida aos candidatos poderia ser ampliado de forma significativa. Uma outra medida em estudo seria a aplicação do bônus já na primeira fase do vestibular, e não apenas na segunda, como ocorre atualmente. De acordo com o reitor, o tema será discutido nas diversas instâncias da Universidade. Com essas novas medidas, a expectativa é que haja um significativo aumento entre os ingressantes oriundos da rede pública, que hoje na Unicamp correspondem 33% do total. “Se, por exemplo, dobrarmos a pontuação do PAAIS, será possível chegar talvez a 40%”, diz o reitor. Somando o PAAIS a outros programas de inclusão, como o Programa de Formação Interdisciplinar Superior (ProFIS), que disponibiliza 120 vagas na graduação para os melhores alunos da rede pública, a expectativa é ampliar ainda mais essa margem. “Nossa ideia é aperfeiçoar o ProFIS também para fazer inclusão”. Segundo o reitor, outras propostas poderiam ser estudadas para complementar o PAAIS e o ProFIS, visando atingir os indicadores sugeridos para os percentuais de inclusão. Com isso, a marca de 50% de ingressantes oriundos das escolas públicas, bem como a proporção étnica referente ao estado de São Paulo, poderiam ser atingidas sem necessidade de lei ou de cotas, e sim por planejamento e iniciativas da própria Universidade.

Unicamp integra Observatório da Educação MARIA ALICE DA CRUZ halice@unicamp.br

Lançado dia 8, portal democratiza acesso a notícia e informações sobre educação

O Observatório da Educação de Campinas, lançado no último dia 8, no Teatro Iguatemi, pela Fundação de Entidades Assistenciais de Campinas (Feac), terá como um dos parceiros o Núcleo de Estudos de Políticas Públicas (Nepp) da Unicamp. Portal do programa Compromisso Campinas pela Educação (CCE), o observatório visa democratizar e ampliar o direito de acesso, on line, a informações e notícias sobre a temática educacional, de acordo com o superintendente executivo da Feac, Arnaldo Rezende. Além dos gestores educacionais, pais e alunos podem encontrar informações relevantes a partir da nova ferramenta. A iniciativa, segundo Rezende, busca chamar a atenção da sociedade civil para a causa e o tema “educação”, evidenciando dados, promovendo estudos, discussões e debates na cidade. O lançamento do novo núcleo também marcará um novo reposicionamento do CCE, que é uma célula do Movimento Nacional Todos pela Educação. Presente na cerimônia de lançamento do observatório, o reitor da Unicamp, José Tadeu Jorge, manifestou a satisfação da Universidade em participar do projeto, destacando que cabe à Universidade desenvolver conhecimento que possa se aplicar à sociedade. O Nepp, segundo o reitor, conta com uma equipe dedicada à análise de dados para formulação de políticas públicas. Uma das áreas que precisam de investimento é a qualificação na formação de professores. Para ele, a participação da sociedade é essencial para enfrentar as necessidades existentes no sistema educacional. Na opinião do reitor, para reverter o quadro numérico

Foto: Antoninho Perri

O reitor José Tadeu Jorge fala durante o lançamento do Observatório da Educação

ruim apresentado pela plataforma QEDu, é preciso não somente identificar, mas priorizar as causas que colocam a educação de Campinas em posição inferior à de algumas cidades da região. Um dos dados apresentados pelo representante do

QEDu que chamaram a atenção do reitor foi o que se refere ao rendimento dos alunos de nono ano do ensino fundamental: praticamente apenas 1 entre 10 alunos apresenta o rendimento esperado na disciplina de matemática. Também presente no evento, o prefeito de Campinas, Jonas Donizette, informou que os dados apresentados pelo QEDu foram apresentados em reuniões realizadas com gestores de escolas municipais e estaduais de Campinas. Os dados estão servindo de referência para um projeto, já iniciado, de melhoria das escolas de Campinas. A reestruturação começa com recuperação de prédios escolares e contratação de mil funcionários, a maioria encaminhada para completar o quadro de profissionais da educação infantil. Segundo Donizette, a administração tem como prioridade, neste início de gestão, a saúde e a educação. O prefeito espera ter a colaboração de professores, gestores e de toda a sociedade. Entre as prioridades na área de obras, está a construção em regiões carentes de unidades escolares. Ele enfatizou que a história conhecida por todos sobre as escolas rurais, em que as crianças precisam andar muitos quilômetros para ter aula, é realidade em algumas regiões de Campinas, principalmente na periferia. A previsão, segundo o prefeito, é que as obras sejam iniciadas em 2014. Para Luiz Norberto Paschoal, um dos idealizadores do Observatório de Campinas, a ideia nasceu da necessidade de envolver a população em projetos de qualidade da educação. “Percebi que seria difícil envolver a sociedade sem que ela tenha acesso aos números”, reflete.


10 Vida Painel da semana Teses da semana Livro da semana Destaques do Portal da Unicamp

Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

aa c dêi ma c

Painel da semana  Palestras da FCM - O Laboratório de Genética Molecular do Departamento de Genética Médica e o Programa de Pós-graduação em Fisiopatologia Médica da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp organizam palestras no dia 14 de maio, a partir das 14 horas, no Anfiteatro da pósgraduação da FCM. No evento, Jason Bobe apresenta o tema “Personal Genome Project: Creating a Global Commons of Human Data”. Misha Angrist aborda “Então veio o que eu não poderia explicar: data, expectations and personal genomes”. Mais informações: 19-3521-8242  Agrener - O IX Congresso Sobre Geração Distribuída e Energia no Meio Rural ocorre, de 15 a 17 de maio, em Itajubá-MG. Realização: Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe) da Unicamp. Submissão de artigos e outras informações no link http://www.nipeunicamp.org.br/ agrener/. Mais detalhes pelo e-mail agrener@nipeunicamp.org.br  Patologização da Educação e judicialização da vida - Dia 15 de maio, a partir das 8h30, no auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), acontece o III Encontro Patologização da Educação e Judicialização da Vida, organizado pelo Departamento de Pediatria e Conselho Regional de Psicologia de São Paulo. Consulte a programação no link http://www.fcm.unicamp.br/fcm/ sites/default/files/folder_Cida.pdf. Inscrições em www.crpsp.org.br. Mais detalhes: 19-3521-7193.  Arquitetura como fato cultural - O Centro Cultural de Inclusão e Integração Social (Cis-Guanabara) sedia em 15 de maio, às 19h30, o ciclo de debates “Arquitetura como fato cultural”. No evento, o arquiteto Ayrton Camargo e Silva fala sobre “Mobilidade Urbana, do âmbito municipal ao metropolitano”. A arquiteta Patrícia Ceroni Scarabelli aborda “A Mobilidade Urbana induzida pela ferrovia”. As palestras ocorrem na rua Mário Siqueira 829, no bairro do Botafogo, em Campinas-SP. Entrada livre. Mais informações: 19-3254-4233.

 Educação médica - No dia 16 de maio, às 8h30, no auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), acontece o seminário “Educação Médica: História e perspectiva”, com a participação de Nísia Veronica Trindade Lima, da Fundação Oswaldo Cruz/Fiocruz; João Amilcar Salgado, da UFMG; Sigisfredo Brenelli, José Antonio Rocha Gontijo e Roberto Teixeira Mendes, da FCM. Programação e inscrições gratuitas no link http://www.fcm.unicamp. br/educacaoMedica/index.php. O evento é organizado pelo Centro de Memória e Grupo de Estudos em História da Ciência da Saúde.

Correspondência, dedicatórias e outros textos

 Desafios da gestão em enfermagem - No dia 17 de maio, às 9 horas, no Auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) acontece o Fórum Permanente de Esporte e Saúde com o tema “Desafios da Gestão em Enfermagem”. O evento é organizado pelo HC, Caism e Cecom. Programação, inscrições e outras informações na página eletrônica ou pelo telefone 19-3521-5039.

da semana Sinopse: A obra poética de Camilo Pessanha circunscreve-se a 56 composições, e a sua prosa – crônicas, contos, crítica literária, ensaio, escritos sobre a civilização chinesa, textos de caráter jurídico – está coligida num só volume. Igualmente breve é a sua correspondência, agora reunida. Dela constam 19 cartas que se encontravam parcial ou integralmente inéditas, e 59 que estão disseminadas por livros esgotados e por periódicos de difícil acesso. Considerando a exiguidade da correspondência do escritor, este volume traz também todas as cartas que, neste momento, são de domínio público. Tendo em mente a relevância literária, cultural e cívica de Camilo Pessanha, esta edição revela ainda outros textos desconhecidos que, de forma direta ou indireta, a ele estão vinculados, como as dedicatórias que acompanham seus livros e as fotografias, cerca de metade das quais se encontrava inédita. Sua inclusão neste volume justifica-se por demonstrarem uma profunda capacidade introspectiva e apresentarem detalhes assinaláveis para a compreensão de sua psicologia e obra.

 Arena MTE 2013 - O desafio universitário ArenaMTE 2013 ocorre nos dias 17 e 18 de maio, sendo que no dia 17, haverá um curso de resolução de cases no Auditório da Biblioteca Central César Lattes (BC-CL) e no dia 18 ocorrerá o desafio, no Hotel Nacional Inn, em Campinas/SP. O evento é organizado pelo Mercado de Trabalho em Engenharia (http://mte.org.br/arenamte/) e visa proporcionar aos alunos a oportunidade de Networking com as empresas participantes. Interessados podem fazer inscrição no site http://www.arenamte.mte. org.br/inscricao. Mas detalhes: 19-3521-3876 ou e-mail ivan.nogueira@mte.org.br

Teses da semana  Computação - “Uma abordagem cognitiva para autoconfiguração de protocolos de comunicação” (doutorado). Candidato: Neumar Costa Malheiros. Orientador: professor Edmundo Roberto Mauro Madeira. Dia 16 de maio, às 14 horas, no auditório do IC.

Autor: Camilo Pessanha nasceu em 7 de setembro de 1867, em Coimbra, Portugal, e morreu em 1o de março de 1926, em Macau. É considerado o expoente máximo do simbolismo em língua portuguesa.

 Engenharia Elétrica e de Computação - “Estatísticas de ordem superior do desvanecimento κ-μ extremo” (mestrado). Candidato: Érick Mascagni Ferdinando. Orientador: professor Michel Daoud Yacoub. Dia 14 de maio, às 14 horas, na sala PE 12 da FEEC.

Organização, prefácio, cronologia e notas: Daniel Pires ISBN: 978-85-268-0966-6 Ficha técnica: 1a edição, 2012; 336 páginas; formato: 16 x 23 cm Coedição: Biblioteca Nacional de Portugal Área de interesse: Crítica e Teoria literária Preço: R$ 62,00

“Metodologia para avaliação de parâmetros ambientais em serviços de saúde” (doutorado). Candidato: Gustavo Alcântara Elias. Orientador: professor Saide Jorge Calil. Dia 15 de maio, às 14 horas, na sala de videoconferência da FEEC. “Análise e proposta de arquiteturas de hardware para veículos autônomos” (mestrado). Candidato: Milton Felipe Souza Santos. Orientador: professor José Raimundo de Oliveira. Dia 17 de maio, às 9 horas, na sala PE-12 da FEEC.

Livro

“Efeito de alargamento de linha espectral de laser de HeNe por onda acústica sobre interferômetro de Mach-Zehnder em fibra óptica” (doutorado). Candidato: Flavio José Galdieri. Orientador: professor Evandro Conforti. Dia 17 de maio, às 14 horas, na CPG da FEEC.

“Obtenção e caracterização de recobrimentos de quitosana/ácido hialurônico e quitosana/ alginato de sódio pela técnica layer-by-layer para aplicações antimicóticas” (mestrado). Candidato: Thiago Bezerra Taketa. Orientadora: professora Marisa Masumi Beppu. Dia 14 de maio, às 14 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ.

 Engenharia Química - “Prospecção tecnológica a médio prazo sobre pilhas a combustível e seu mercado” (mestrado). Candidata: Ana Beatriz Alves Borges. Orientador: professor Wagner dos Santos Oliveira. Dia 13 de maio, às 14 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ.

“Modelagem e simulação do processo de secagem dos frutos de aroeira-vermelha (Schinus terebinthifolius raddi)” (mestrado). Candidato: Bruno Guzzo da Silva. Orientadora: professora Ana Maria Frattini Fileti. Dia 17 de maio, às 10 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ.

“Estudo da preparação de catalisadores de N e RU suportados em carvão ativado para a hidrogenólise da sacarose” (doutorado). Candidata: Cristiane Zanutelo. Orientador: professor Antonio José Gomes Cobo. Dia 17 de maio, às 14 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ.  Linguagem - “História, política e alegoria na prosa ficcional de Dyonelio Machado” (doutorado). Candidato: Fernando Simplicio dos Santos. Orientador: professor Francisco Foot Hardman. Dia 16 de maio, às 9 horas, na sala de defesa de teses do IEL.  Instituto de Matemática, Estatística e

Computação Científica - “Modelos matemáticos para dinâmica de doenças de transmissão direta e de presa-predador considerando parâmetros interativos e t-normas” (mestrado). Candidata: Francielle Santo Pedro Simões. Orientador: professor Laecio Carvalho de Barros. Dia 17 de maio, às 10 horas, na sala 253 do Imecc.  Química - “Estruturas de associação de sais complexos de copolímeros em bloco e surfatantes, polieletrólitos e nanopartículas” (doutorado). Candidata: Letícia Vitorazi. Orientador: professor Watson Loh. Dia 17 de maio, às 14 horas, na sala IQ-14 da IQ.

Destaque do Portal

Filme produzido no IA será exibido em Cannes o dia 14 de maio, as alunas do curso de midialogia Juliana Villiotti e Ana Cecília Araki embarcam para a cidade de Cannes, no sul da França. O curta-metragem A última rosa produzido por elas como projeto final do curso do Instituto de Artes (IA) da Unicamp foi selecionado para ser exibido em um dos mais importantes festivais de cinema do mundo. “Ter sido selecionado para a mostra do Festival Internacional de Cannes já é um grande prêmio. É resultado dos trabalhos e estudos que tivemos durante os anos aqui na Unicamp. É uma grande vitória que representa todo o caminho percorrido, junto com os colegas, amigos e professores”, ressalta Juliana Villiotti, produtora e diretora de arte do filme. A última rosa conta a história de duas senhoras doentes que vivem em uma região rural. O curta participa na categoria Short Film Corner, um espaço de exibição para diretores e produtores iniciantes. A 66ª edição do Festival, que confere ao melhor longa-metragem a Palma de Ouro, acontece entre os dias 15 e 26 de maio. Ana Cecília Araki, que escreveu o roteiro e dirigiu o curta-metragem, fala sobre a inspiração para o filme. A última rosa foi inspirado livremente no conto Sarapalha, do livro Sagarana, de Guimaraes Rosa. Com personalidade própria, o curta narra a história de duas senhoras doentes que vivem numa região totalmente desolada. Diante do grave estado de saúde das duas, uma delas revela um segredo”, relata Ana Cecília. Também integram a equipe, as atrizes Stella Maris Vilela, Alexandra Sanches e Vanessa Petrongari; Gabriel Ronconi (produção); Pedro Ivo Carvalho (fotografia e câmera); Guilherme Agostini Cruz (assistente de direção e continuidade); Vanessa Cristina Petrongari (produção local); Letícia Cabral, Pedro Bortoto e Lucas Corazzini (assistentes de produção);

Foto: Divulgação

Equipe de A última rosa: filme foi feito para projeto final do curso de midialogia

Tamara Gigliotti (assistente de fotografia); Myung Hwa Baldini e Deborah Happ (arte); Pedro Bortoto e Marcelo Petrongari (assistentes de arte); Natália Pelizari (edição); Gabriel Tonelo (som); Victor Negri (edição de som, mixagem e trilha sonora); e os músicos André Batiston e Arthur Faria.

O filme A última rosa foi produzido como trabalho de conclusão de curso dos alunos da midialogia, sob a orientação do docente Adilson José Ruiz. As gravações ocorreram na Fazenda Redenção, localizada no município de São Manuel, interior do Estado de São Paulo. (Silvio Anunciação)


Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

O ‘envelope solar’

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e o planejamento urbano Estudo prega que revisão da legislação urbanística incorpore acesso ao sol e à luz Fotos: Antoninho Perri

CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br

arquiteto Denis Roberto Castro Pérez desde há muito se sente incomodado com construções sombreadas pelas edificações próximas, que as impedem de receber iluminação natural adequada e as priva dos benefícios bactericidas do sol e da possibilidade de utilizá-lo como fonte de energia. Passou então a se perguntar como resolver esse problema. A oportunidade de se dedicar à questão surgiu já no mestrado e ampliou-se no doutorado, ambos realizados na Unicamp. Moveram-no, também, as discussões sobre o modelo de bairro mais apropriado ao desenvolvimento saudável e sustentável. A partir delas surgiu o posicionamento a favor de uma cidade mais compacta, verticalizada, com densidade demográfica adequada, que possibilite o aproveitamento da infraestrutura existente, encurte o deslocamento entre moradia e trabalho e diminua a necessidade de transporte individual. Essa visão contrapõe-se ao modelo de cidades-jardim, com baixa densidade populacional, que se estendem para muito além dos muros da cidade, acessíveis apenas a segmentos sociais bem aquinhoados financeiramente e que em geral dispõem de mais de um veículo de transporte próprio. Além de tudo, estas soluções implicam na extensão da infraestrutura municipal muito além dos limites da cidade em termos de vias pavimentadas, fornecimento de água e de energia elétrica, recolhimento de esgoto. Paralela e progressivamente, ocorre a consolidação da ocupação de áreas de risco por populações carentes. Estas questões são consideradas no estudo desenvolvido pelo pesquisador no Laboratório de Investigações Urbanas da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp – que trata mais particularmente das diretrizes solares a serem adotadas para o planejamento urbano – que deu origem à tese de doutorado, orientada pelo professor Edison Fávero. O pesquisador considera que o trabalho se revela particularmente oportuno a partir da promulgação do Estatuto da Cidade (lei federal No.10 257, de 10/07/2001), em pleno vigor, que estabelece diretrizes gerais para a política urbana através de normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental. Apesar de vigorar há quase 12 anos, as sugestões urbanísticas por ele preconizadas ainda não estão sendo aplicadas, do que decorre o contínuo crescimento desordenado das cidades, com bairros ao redor dos grandes centros sofrendo pressões para mudanças de uso, de ocupação do solo e permissão para a verticalização, enquanto paralelamente as periferias crescem ilegalmente. A morfologia atual das cidades brasileiras continua sendo o reflexo do acúmulo de edificações que não obedecem a boas orientações e nem contemplam ganhos energéticos. Entre outros instrumentos, o Estatuto da Cidade prevê o estabelecimento, de for-

O arquiteto Denis Roberto Castro Pérez: para autor da pesquisa, plano diretor não contempla os anseios da população

Em primeiro plano, o bairro Nova Campinas, cujo tombamento acabou sendo cancelado por decreto municipal: impasse e polêmica

ma democrática, do planejamento municipal através de um plano diretor que discipline o parcelamento, o uso e a ocupação do solo e o zoneamento ambiental. Para controle do adensamento populacional estabelece a utilização do coeficiente de aproveitamento, que resulta da relação entre a área edificada e a área do terreno. Estão afetas ao Estatuto as cidades com mais de 20 mil habitantes, excluindo, em decorrência, da obrigatoriedade de um plano diretor cerca de 80% dos municípios brasileiros. Recomenda que o plano diretor seja revisto ao menos a cada dez anos, o que torna o trabalho particularmente significativo para Campinas, que atualmente discute a sua reformulação. O autor considera que, embora a cidade já disponha de um plano diretor, ele não exprime os anseios da população hoje, a exemplo do que deve ocorrer em muitos outros municípios.

MOTIVAÇÕES

Denis considera que urge a revisão da legislação urbanística, tanto nos planos diretores como nas leis de uso e ocupação do solo, de forma a incorporar propostas que garantam o acesso ao sol e à luz. Constata que o reduzido aproveitamento, tanto passivo como ativo, da energia solar tem levado à frequente necessidade de climatização e iluminação artificiais durante todo o ano e impedido a utilização de sistemas solares destinados tanto ao aquecimento como à produção de energia elétrica. Como se sabe, esta pode ser vendida, durante os períodos do dia em que não é utilizada, pelo consumidor à concessionária distribuidora, a exemplo do que já ocorre com sucesso em importantes cidades em todo o mundo. O objetivo da tese é o de fornecer elementos, mediante o estabelecimento de diretrizes solares, para o planejamento urbano, utilizando o chamado envelope solar como critério de adensamento e verticalização. O conceito de envelope solar surgiu, em 1980, com Knowles e Berry, e corresponde ao maior volume que uma edificação pode ocupar no terreno de forma a permitir o acesso ao sol e à luz natural na sua vizinhança imediata. Esse elemento de volume pode adotar formas as mais diversas. O estudo desenvolvido propõe a aplicação desse recurso como subsídio para a formulação de normas regulatórias de adensamento e verticalização nos processos de planejamento urbano e de projetos de construção de edifícios. O trabalho se propõe a verificar o potencial do envelope solar como possível critério para criação de diretrizes urbanísticas aplicáveis no controle da ocupação do solo, buscando maior eficiência no adensamento dos espaços urbanos.

O estudo visa resolver tanto os problemas enfrentados por bairros que sofrem pressões para mudanças no uso do solo, como atender as vicissitudes das periferias que crescem ilegalmente. Além de tudo, pretende fornecer ferramentas para o enfrentamento do abandono em que se encontram as pequenas cidades em decorrência de não disporem de legislação simples, eficaz e exequível não só devido à carência de recursos como à falta de pessoal qualificado. “Com o trabalho estamos pretendendo colaborar para a criação de legislações simples que possam ser desenvolvidas e mantidas pelos municípios de parcos recursos financeiros e humanos, de maneira a lhes garantir um desenvolvimento racional e sustentável e que atenda os interesses de suas populações”, diz ele, referindo-se aos municípios de menos de 20 mil habitantes e não contemplados pelo Estatuto.

ESTUDO DE CASO

Para o desenvolvimento do trabalho, o pesquisador adotou como estudo de caso o bairro de Nova Campinas, próximo ao centro da cidade de Campinas e vizinho do tradicional bairro do Cambuí, que se contrapõe como exemplo de ocupação desordenada e sem planejamento. A escolha deveu-se ao fato de tratar-se de uma região semelhante às existentes em tantas outras cidades, situada ao redor de um centro consolidado e verticalizado e que sofre pressões para mudança de uso, adensamento e verticalização. É caso de Nova Campinas, bairro inicialmente residencial. Tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Artístico e Cultural de Campinas (Condepacc), a pedido de moradores, teve esse tombamento posteriormente cancelado por decreto municipal por pressão de outro grupo de moradores, gerando naturalmente um grande conflito de interesses. Neste estudo de caso em que prevê adensamento, verticalização e ocupação mista do bairro, o pesquisador utilizou o software Rhinoceros, com os aplicativos Grasshopper e Diva, introduzindo os módulos construtivos dentro dos volumes dos envelopes solares gerados. Esse recurso permite o dimensionamento das áreas a serem utilizadas e o estabelecimento das taxas de ocupação, dos coeficientes de aproveitamento e das alturas das edificações. Possibilita ainda a geração de figuras representativas de cada lote e suas respectivas construções. No caso, foram mapeados cinco quarteirões do bairro e estabelecidas comparações entre o que se tem e que se poderá vir a ter.

EXPECTATIVAS

Denis espera que o estudo com base nas

diretrizes solares possa oferecer subsídios para a elaboração do novo plano diretor de Campinas, atendendo às suas necessidades específicas. Porque, constata ele, cada região apresenta características particulares em função da latitude, do que decorre diferenças na inclinação dos raios solares. Além disso, outros fatores geográficos determinam o clima e diferenças nas temperaturas médias, mínimas e máximas em cada estação. Consideradas as especificidades de cada região, ele acredita que os resultados do trabalho podem ser aplicados em bairros situados em centros urbanos já consolidados, que ainda se mantêm horizontais e oferecem possibilidade de verticalização. A ideia é contribuir para estancar o crescimento disperso das cidades, considerado nocivo por exigir extensão para as periferias das infraestruturas básicas que envolvem asfalto, saneamento básico, recolhimento de aguas pluviais, rede elétrica e linhas de transporte. Com a agravante de que esse tipo de desenvolvimento cria estruturas distantes e apartadas do centro. ”Se temos bairros próximos ao centro da cidade, como Nova Campinas, Taquaral, Ponte Preta entre outros, a exemplo de todas as cidades do país, por que não compactar?”, pergunta ele, defendendo o aproveitamento máximo da infraestrutura já existente, porque considera mais fácil redimensionar as redes de abastecimento de agua existentes, por exemplo, do que levá-las para a periferia. Em vista disso, ele defende o adensamento, a partir da verticalização dos bairros horizontais, com baixíssimas densidades populacionais, transformando-os em conglomerados com média ou até alta ocupação, dependendo da infraestrutura que possam oferecer. A cada área seria então atribuído um coeficiente de aproveitamento. Denis conclui assegurando que “o uso do envelope solar presta-se ao estabelecimento de diretrizes solares para o parcelamento do solo urbano, adensamento e verticalização de bairros, bem como para a elaboração de projetos de edifícios com garantias de direito ao acesso ao sol e à qualidade ambiental”.

Publicação Tese: “Diretrizes solares para o planejamento urbano: o envelope solar como critério para adensamento e verticalização” Autor: Denis Roberto Castro Pérez Orientador: Edison Fávero Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)


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Campinas, 13 a 19 de maio de 2013

Da juventude extravagante à

guinada LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

intenção original de Rodrigo Soares de Cerqueira para o seu doutorado era estudar obras de Joaquim Manoel de Macedo, José de Alencar e Machado de Assis visando explicar uma variação formal importante na construção dos protagonistas do romance brasileiro: em pouco mais de três décadas, esses personagens deixaram de se caracterizar pela bondade e pureza de espírito (em Macedo) e se tornaram mais calculistas (em Machado). O pano de fundo é a sociedade patriarcal do século 19 e seu conjunto de valores, tais como submissão à vontade senhorial, respeito à tradição e manutenção da ordem. Entretanto, quando começou a se aprofundar nas obras de Macedo, Rodrigo Cerqueira pediu autorização para alterar o projeto junto à Fapesp, financiadora da pesquisa, no que foi atendido. “O motivo é que já nesses romances encontrei o que esperava e um pouco mais. Percebi uma dinâmica interessante: eram personagens jovens, extravagantes, e outros mais velhos, que procuravam controlar os primeiros. O foco está na análise deste embate geracional entre os jovens que passaram a viver de forma mais livre – num contexto que ainda não se pode chamar de moderno, mas mais arejado – e os velhos, alguns orgulhosamente roceiros e seguidores dos ‘costumes antigos’.” Decidido que se ateria a Joaquim Manoel de Macedo, Cerqueira analisou detalhadamente os seis primeiros romances do escritor: A Moreninha (1844), O Moço Loiro (1845), Os Dois Amores (1848), Rosa (1849), Vicentina (1853) e A Carteira do Meu Tio (1855). A tese intitulada “Educação pela máscara: literatura e ideologia burguesa no Brasil (1844-1856)” teve a orientação do professor Francisco Foot Hardman e foi defendida em março no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL). “Outro motivo para alterar o projeto foi que, apesar de três trabalhos feitos recentemente aqui mesmo no IEL, Macedo ainda é um escritor pouco lido.” O autor da pesquisa observa que os romances são ambientados no período um pouco posterior à chegada da Corte portuguesa. “O Brasil passava por uma série de grandes transformações, como a criação da Imprensa Régia, a abertura dos portos e o contato antes inexistente com outras nações. E também por transformações na vida cotidiana do Rio de Janeiro, a mais importante delas envolvendo as mulheres, que até então não saíam de casa e se retiravam da sala quando chegavam visitas. Naquele começo de século 19, elas ganham maior liberdade de trânsito, como por exemplo, indo à sorveteria da rua do Ouvidor, comprando roupas e frequentando bailes da Corte.” Segundo Rodrigo Cerqueira, as personagens jovens dos romances de Macedo, a despeito das suas extravagâncias, são sempre honestas e sabedoras dos limites que não devem cruzar – e por isso podem ser reintegradas sem problemas à família, núcleo da sociedade. “Já o cálculo, matéria bruta das personagens machadianas, implica em certa consciência, numa ação interesseira que, por ser ambiciosa e individualizante, vai de encontro àquela visão mais comunitarista – entendendo que comunitarismo, nesse caso, é simplesmente a aplicação da vontade do senhor-proprietário como a vontade da comunidade que ele governa.” O pesquisador acredita que um diferencial do seu trabalho foi ter lido essas extravagâncias de juventude – os galanteios nos bailes, as peças pregadas nos amigos e nos mais velhos, que fazem a graça dos romances de Macedo – baseando-se em referências teóricas do crítico literário Franco Moretti. “Para Moretti, uma das maiores inovações do romance foi colocar a juventude no centro do enredo e fazer do seu percurso formativo uma maneira de se entender o funcionamento de uma nova dinâmica social. Guardadas as devidas proporções, Macedo faz o mesmo, ainda mais porque uma das funções do gênero romanesco no Brasil foi de educação moral da juventude, principalmente das moças.”

conservadora Imagens: Reprodução

Gravuras retiradas de História da vida privada no Brasil: Império, de Luiz Felipe Alencastro (org.), Companhia das Letras, 1997, vol. 2; charge publicada em 1871 em A Semana Ilustrada (acima) e passeio público: E. Rensburg, Álbum do Rio de Janeiro e seus arrebaldes, séc. XIX (à esquerda)

De acordo com o autor da tese, um exemplo de como Macedo, nos primeiros romances, concede mais espaço para esta juventude extravagante, e ao mesmo tempo para que os velhos façam seus discursos morais, está em O Moço Loiro. “O jovem protagonista é Lauro, expulso da família acusado de um roubo. Sua avó faz uma longa descrição para uma neta a respeito do primo que chama de coração de serpente. É que os elogios que faz à sua capacidade intelectual vêm acompanhados da crítica ao desrespeito dele com a autoridade, seja com os professores, seja por causa da postura irônica frente às ideias dos mais velhos. O romance parece seguir para um embate entre gerações, mas no final Lauro é perdoado porque não cometera o roubo, reintegrado à família e o romance cumpre a sua função moral.”

PROTAGONISMO MINADO O que mais chamou a atenção de Rodrigo Cerqueira, contudo, foi a mudança de dinâmica nos romances seguintes de Macedo, que deixam de ser movidos por brincadeiras como as de A Moreninha, em que jovens tomam um porre na festa e um deles se esconde embaixo da cama para ouvir a conversa das mulheres. “Com o passar dos anos, entre 1844 e 1856, a obra dele sofre uma espécie de inflexão conservadora, que chamo de ‘desfuncionalização da extravagância’. A insensatez dos jovens não é mais a característica que gera a ação, que por sua vez põe o enredo em movimento. Isso fica claro em Vicentina, romance de 1853, no qual o jovem protagonista da vez, Américo, é chamado de extravagante, se diz extravagante, mas não age de acordo.” O pesquisador avalia que a desfuncionalização da extravagância acabou por roubar o protagonismo real dos jovens e por atribuí-lo aos velhos. “Estes se tornam cada vez mais ativos nos romances, deixando menos espaço para o desenvolvimento, ainda que infantilizado, daquele ideário mais arejado que a juventude incorporava.

Foto: Divulgação

Parece-me que as transformações formais do romance se dão de acordo com a inflexão conservadora de meados do século 19, que ficou conhecida como o tempo Saquarema – grupo político conservador que se tornou hegemônico após o conturbado período regencial.” O regresso conservador que coincidiu com o período estudado na tese, acrescenta Cerqueira, acabou impactando nas convenções sociais que permeavam os romances. “A liberdade de contestação deixa de ser uma característica positiva, ainda que cheia de ressalvas, e é requalificada, submetendo-se a uma autoridade central – à visão de mundo dos personagens mais velhos. Seus livros vão perdendo a graça, com protagonistas mais sérios, autoritários e sombrios. Não por acaso, os romances considerados melhores e mais conhecidos são os primeiros.” Conforme o autor da pesquisa, o próprio Joaquim de Macedo se insere na política e vai mudando sua visão de mundo. “O último romance que analiso, A Carteira do Meu Tio, é uma sátira política que até fez sucesso e teve algumas reedições com o escritor ainda em vida. Entretanto, o que ele faz é justamente ironizar a extravagância da juventude, ponto fundamental das obras anteriores. À frente do romance está novamente um jovem, mas como um personagem cínico, uma espécie de anti-herói, que é o tempo todo ironizado e que se torna um exemplo a não ser seguido.”

O LEGADO PARA ALENCAR Rodrigo Cerqueira ressalta a importância do texto “Acumulação literária e nação periférica” (segunda parte do livro Um mestre na periferia do capitalismo), em que Roberto Schwarz reflete sobre a consolidação de um sistema literário romanesco, no qual problemas e soluções formais são pensados e legados para o escritor seguinte. “Na opinião de Schwarz, o papel que cabe a Macedo no processo de consolidação da forma do romance no Brasil é muito pequeno, para não dizer nulo: a ele teria cabido apenas fixar chavões típicos do gênero no cenário do Rio de Janeiro, de maneira artificial e acrítica.” O pesquisador considera, porém, que Macedo traz bem mais que isso, tendo reelaborado, da maneira possível em uma sociedade patriarcal, as formas que esse ideário mais moderno assumiria no imaginário da Corte, isto é, como uma transgressão um tanto juvenil. “Creio que o aspecto mais singular da tese é de dar relevo à reelaboração desse ideário, mostrando que Macedo, apesar de ser um romancista que realmente não está à altura de Alencar ou Machado, deu uma contribuição importante à literatura brasileira.” Uma ponderação final de Rodrigo Cerqueira é que, como resultado da inflexão conservadora – quando a juventude não cumpre mais a função de dinamizar o enredo –, há um impasse informal. “Como ter um romance moderno, quando o protagonismo parece passar para as personagens mais velhas, detentoras de um ideário menos arejado? Essa perspectiva não soa nada atraente para uma nação recém-emancipada e desejosa de fazer parte do concerto do mundo? Macedo não lega apenas lugares-comuns, e sim um problema a José de Alencar, que vai tentar resolver essa questão do conservadorismo com personagens velhos menos autoritários e, em certo sentido, com personagens jovens menos extravagantes e menos contestadores do senso comum.”

Publicação Tese: “Educação pela máscara: literatura e ideologia burguesa no Brasil (1844-1856)” Autor: Rodrigo Soares de Cerqueira Orientador: Francisco Foot Hardman Unidade: Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) Financiamento: Fapesp Rodrigo Soares de Cerqueira, autor da tese: “Macedo ainda é um escritor pouco lido”

Capa de A Moreninha, em edição de 1844


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