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Foto: Miguel Chikaoka/ Arquivo Edgard Leuenroth (AEL-Unicamp)/ Fundo Voz da Unidade

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Campinas, 7 a 13 de abril de 2014 - ANO XXVIII - Nº 593 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

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MALA DIRETA POSTAL BÁSICA

TERRA DE NINGUÉM 9

Pesquisa de mestrado de Vitor Bukvar Fernandes, orientada pelo professor Bastiaan Philip Reydon e apresentada no Instituto de Economia (IE), aponta as causas e a origem do caos da regulação fundiária no país, problema que se agravou depois do golpe de 64.

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Cidades ignoram riscos de mudanças climáticas Prevendo a produção de soja com um mês de antecedência Grupo desenvolve sistema de reconhecimento de face

Meninas mimetizam mães e usam sapatos inadequados Estudo reconstitui trilhas de Moacir Santos para o cinema

Efeitos do aquecimento são profundos e vão se agravar Pesquisa mapeia cérebro de fetos de 15 a 21 semanas Gratidão é capaz de reduzir impaciência, aponta estudo

TELESCÓPIO

Cruz lembra ação repressiva do Exército em conflito de terra ocorrido em Augustinópolis, Tocantins, em setembro de 1979

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Campinas, 7 a 13 de abril de 2014

TELESCÓPIO

CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

Foto: Divulgação

Impacto da mudança climática é profundo e vai aumentar

Oceano confirmado em lua de Saturno

Os efeitos da mudança climática já estão se fazendo sentir nos ecossistemas de todo o mundo, diz relatório do Painel Intergovernamental para Mudança Climática (IPCC) da ONU, divulgado em 30 de março em Yokohama, no Japão. “Ninguém neste planeta deixará de ser afetado pelos impactos da mudança climática”, disse o presidente do IPCC, Rajendra Pachauri, na abertura do evento em que o relatório foi apresentado. O efeito geral previsto da mudança climática – com um aumento da temperatura global média que pode vir a superar os 3º C até 2100, e uma elevação do nível dos oceanos que pode se aproximar de 1 metro – é amplamente negativo. “Se as temperaturas subirem 2º C, haverá mais impactos sobre os ecossistemas, maiores níveis de eventos climáticos extremos e problemas para a produtividade agrícola e o abastecimento de água”, disse a pesquisadora Rachel Warren, que coordenou o capítulo do relatório sobre riscos emergentes e vulnerabilidades. “Se as temperaturas forem além dos 2º C, corremos o risco de a cobertura de gelo da Groenlândia derreter, além de outras mudanças de larga escala. Acima de 4º C, haverá um grande impacto na agricultura, nos recursos hídricos e nos ecossistemas”. Ela acrescentou que “pode-se dizer que, para manter as elevações da temperatura global em 2º C, temos de reduzir as emissões [de gases causadores do efeito estufa] de modo amplo e rápido, mas mesmo com 2º C ainda haverá impactos aos quais não poderemos nos adaptar”. As populações mais pobres do mundo são as que mais sofrerão, diz o relatório, e a mudança climática pode vir a neutralizar os esforços que vêm sendo feitos de combate à pobreza em várias partes do globo. Mesmo países ricos assistirão ao crescimento de “bolsões de pobreza” em seus territórios, causados por catástrofes climáticas.

Dados da sonda Cassini, da Nasa, confirmam que Encélado – uma lua congelada de apenas 500 quilômetros de diâmetro, em órbita do planeta Saturno – tem um oceano sob seu polo sul, informa uma equipe formada por cientistas italianos e americanos na edição da semana passada da revista Science. Em 2005, imagens produzidas pela Cassini revelaram que fissuras na superfície de Encélado, perto do polo, emitiam plumas de vapor e cristais de gelo, o que levou à especulação de que haveria um reservatório de água sob a carapaça gelada. Em 2008, foram detectados traços de moléculas orgânicas, como metano e CO,² nas plumas, o que produziu especulações sobre a existência de um oceano subterrâneo repleto de ingredientes fundamentais para a vida. Agora, medições do campo gravitacional da lua mostram que, sob o polo sul, há uma massa de material mais denso que o gelo da superfície. “O único candidato que faz sentido é água”, disse, por meio de nota, o pesquisador David Stevenson, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, um dos autores do artigo na Science. O oceano estaria a cerca de 50 km de profundidade, e ainda não se sabe se é ele que gera as plumas. Pesquisadores supõem que o gelo no interior da lua é aquecido pela energia das deformações que Encélado sofre, por conta da atração gravitacional de Saturno, e derrete. Esse material derretido pode alimentar tanto as plumas quanto o oceano.

Caça de baleias pelo Japão é ilegal, decide Haia A Corte Internacional de Justiça, baseada em Haia, na Holanda, decidiu que a caça de baleias promovida pelo Japão é ilegal e viola o tratado internacional que regula a prática. Embora os países-membros do tratado tenham acertado uma moratória na matança de baleias, em vigor desde 1985, o acordo prevê uma exceção que autoriza a caça dos animais para fins científicos. O Japão vem usando esse artigo para legitimar a captura e morte dos mamíferos marinhos, mas uma análise de DNA divulgada em 2010 mostrou que carne de baleia comercializada ilegalmente para consumo humano vinha de animais capturados por japoneses para “estudo científico”. Numa ação movida pela Austrália, a Corte de Haia decidiu que a matança promovida pelo Japão não atende ao requisito de caça para fins científicos. Embora o país tenha apresentado um programa de pesquisa com baleias, o JARPA II, os juízes dizem que há sérias dúvidas sobre se o programa, da forma como é descrito e implementado, realmente atende a objetivos científicos. “A Corte, portanto, ordena que o Japão revogue qualquer autorização em vigor para matar, capturar ou tratar baleias no âmbito do JARPA II, e se abstenha de liberar quaisquer novas permissões sob esse programa”, diz a decisão.

Imagem de Encélado, lua de Saturno que tem oceano sob o polo sul, mostrando as fissuras na superfície

Mapeando o cérebro de fetos e de camundongos A revista Nature de 3 de abril traz artigo que apresenta um mapa detalhado, incluindo informações sobre a atividade genética, do cérebro humano em estágio pré-natal, construído a partir de cérebros de fetos de 15 a 21 semanas. Produzido por uma grande equipe de cientistas vinculados a instituições baseadas nos Estados Unidos, o trabalho tem por objetivo “criar recursos para o estudo do desenvolvimento pré-natal do cérebro humano, e das raízes primeiras de distúrbios do desenvolvimento neurológico e psiquiátricos”. A mesma edição da revista apresenta um artigo complementar que traz um atlas de conectividade do cérebro do camundongo, o primeiro mapa completo das conexões entre neurônios de um cérebro de mamífero. De acordo com nota divulgada pela revista, o trabalho “oferece novos insights sobre as formas de comunicação entre as regiões do cérebro”, e pode ajudar na investigação das redes neurais de seres humanos.

Bebês escolhem sílabas universais Pesquisadores dos Estados Unidos usaram espectroscopia de infravermelho a fim de acompanhar o fluxo de sangue no cérebro de bebês recém-nascidos, com até 5 dias de idade, para ver como eles reagiam ao som de sílabas que são mais ou menos facilmente encontradas na linguagem falada – como, por exemplo, “blif ”, que é uma sílaba muito mais comum nas várias lín-

guas faladas no mundo do que “dbif ” – e constataram que as respostas cerebrais às sílabas comuns refletem o grau de preferência dos adultos por esse tipo de som. Como a pesquisa foi realizada antes que os bebês tivessem tempo de aprender uma língua ou, acreditam os autores, de absorver as preferências culturais dos pais, o resultado “sugere que seres humanos possuem inclinações linguísticas primitivas, independentes da experiência, sobre a estrutura silábica que molda a percepção e aquisição da linguagem”. O trabalho está publicado no periódico PNAS.

Gratidão reduz impaciência Pessoas levadas a relembrar situações onde sentiram gratidão foram mais capazes de aguardar longos períodos, de até três meses, para receber um pagamento, abrindo mão de valores menores que seriam pagos de imediato, relata estudo realizado por pesquisadores dos Estados Unidos e aceito para publicação no periódico Psychological Science. De acordo com nota divulgada pela Northwestern University, o estudo foi realizado dividindo um grupo de voluntários em três turmas e pedindo aos membros de cada turma que escrevessem sobre experiências que os haviam deixado felizes, gratos ou que não os haviam afetado. Depois, eles tiveram a opção de receber uma pequena recompensa imediata, de cerca de US$ 50, ou esperar até três meses por um pagamento maior, de mais de US$ 80. Os membros das turmas “feliz” e “neutra” revelaram forte preferência pelo pagamento imediato, diz a nota. Já os da turma “grata” mostraram-se dispostos a esperar

mais pela quantia maior, exigindo um pagamento imediato de US$ 63 para abrir mão dos US$ 85 prometidos para o fim do trimestre. “Felizes” e “neutros”, por sua vez, revelaram-se dispostos a abrir mão dos US$ 85 futuros em troca de apenas US$ 55 na hora.

Japão confirma fraude em artigo de células-tronco Investigação conduzida pelo prestigioso Instituto Riken de pesquisa científica do Japão concluiu que os artigos sobre produção de células-tronco publicados na revista Nature em janeiro, assinados pela cientista Haruko Obokata, são produto de “má conduta científica”. Obokata surpreendeu a comunidade científica internacional ao anunciar uma técnica para transformar células comuns em células-tronco por meio de um simples banho ácido. “Manipulação foi usada para fazer os resultados parecerem melhores”, diz o relatório. O presidente do Riken, o químico ganhador do Nobel Ryoji Noyori, disse que vai recomendar a retratação de um dos artigos, e uma revisão nos processos internos do instituto. O comitê responsável pela da investigação lançou críticas sobre todos os envolvidos com o trabalho de Obokata: “Mesmo os que não participaram da fraude na pesquisa carregam uma pesada responsabilidade, pela negligência administrativa que permitiu que a fraude ocorresse”. Em comunicado à imprensa, a pesquisadora disse que recorrerá das conclusões da investigação.

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Campinas, 7 a 13 de abril de 2014 MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br

despeito das crescentes evidências científicas sobre os impactos que podem advir das mudanças climáticas globais, o tema não faz parte da preocupação mais imediata dos governos municipais no Brasil. As ações nessa área normalmente surgem mescladas às respostas governamentais a problemas urbanos que possuem alguma interface com a questão climática. A conclusão faz parte da tese da cientista social Fabiana Barbi, desenvolvida no âmbito do programa de doutorado em Ambiente e Sociedade do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam) da Unicamp. A autora do estudo teve como orientadora e professora Leila da Costa Ferreira e como coorientador o professor Carlos Joly. Para entender como os governos locais têm respondido aos riscos relacionados às mudanças climáticas globais, a pesquisadora analisou as políticas públicas voltadas ao tema formuladas pelos nove municípios que compõem a Região Metropolitana da Baixada Santista, sendo as de Santos com maior profundidade. De acordo com Fabiana, a pesquisa trabalhou com o conceito de mudanças climáticas adotado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC, na sigla em inglês), órgão vinculado à Organização das Nações Unidas (ONU). “Nesse caso, consideramos as mudanças climáticas causadas ou não pela ação do homem, visto que em muitos casos é difícil determinar se um evento de chuva extrema, por exemplo, tem algum componente antropogênico”, explica. O que foi possível perceber ao longo da investigação, conforme a pesquisadora, é que de maneira geral os municípios conhecem os riscos relacionados às mudanças climáticas, mas não estão se preparando para enfrentá-los de maneira adequada. “Nem mesmo Santos, que tem uma Defesa Civil bem estruturada, dispõe de uma política pública mais efetiva nesse sentido. Essa situação é preocupante, pois os cenários projetados para a cidade, mesmo os mais conservadores, apontam para a possibilidade de impactos importantes para o cotidiano da população”, observa. Por ser um município costeiro, prossegue a autora da tese, a situação de Santos é ainda mais séria que a de outras cidades que não apresentam essa caraterística. Isso por causa do risco do aumento do nível das águas do oceano. “No cenário mais conservador, essa elevação seria de meio metro, o que já inundaria parte da região conhecida como Ponta da Praia, que está urbanizada e densamente ocupada. Se a elevação do oceano for de um metro, a situação se agravará ainda mais. Somente uma parte do centro e os morros não seriam atingidos. Imagine o que isso significaria para o dia a dia dos moradores?”, questiona. Apesar disso, Santos não possui programas efetivos voltados à prevenção ou mitigação dos problemas que podem ocorrer devido às mudanças climáticas. “O município não dispõe de política e nem de setor específico para tratar desse tema. Nós percebemos que o assunto é tratado por alguns órgãos ou secretarias, mas de maneira indireta, normalmente associado a algum problema urbano mais imediato. Não se tem uma estratégia para enfrentar os riscos relacionadas às mudanças climáticas no médio e longo prazos. Nas demais cidades da Baixada Santista a situação não é diferente. Vale lembrar que, no caso da elevação das águas do oceano, o fenômeno ocorre de forma lenta e gradual, o que dá tempo para a definição de estratégias de enfrentamento dos problemas”, pondera Fabiana. Um aspecto que chama a atenção em relação à inércia governamental, segundo a orientadora da tese, é que o Brasil dispõe de mecanismos capazes de balizar medidas preventivas e de adaptabilidade. “A política climática nacional, aprovada em 2009, é muito boa. Da mesma forma, temos cinco municípios e onze estados que elaboraram legislações igualmente importantes. Ocorre, porém, que as propostas não são implementadas e, consequente, as eventuais metas não são atingidas”, lamenta a professora Leila. Na opinião dela, tem faltado aos gestores públicos vontade política de levar as políticas climáticas adiante. “Isso se deve, muito provavelmente, por causa da relação que nós temos tido com esse tema. Frequentemente, as pessoas tendem a achar que o assunto mudanças climáticas não lhes diz respeito e que as possíveis consequências do fenômeno não afetarão o seu cotidiano. Isso é um equívoco. O IPCC tem chamado a atenção dos países para os riscos dessas mudanças para as populações. Além do mais, também tem alertado que as nações mais pobres são as que mais sofrerão com os efeitos da alteração do clima”, diz a docente. Um dos grandes nós a serem resolvidos no plano local, como lembra Fabiana, é relativo à mobilidade urbana. “Isso tem sido um enorme desafio para muitas cidades, notadamente São Paulo. As emissões de gases de efeito estufar (GEEs) por parte dos automóveis crescem a cada dia. Existe um estudo que aponta que no período de dez anos, entre 2001 e 2011, a frota de carros duplicou e a de motos quadruplicou nas 12 maiores capitais brasileiras. Vale ressaltar que as motocicletas poluem mais que os carros. Ou seja, este é um ponto que precisa ser urgentemente atacado, pois vamos ter que pagar essa conta mais tarde. O momento de agir é agora”, adverte a autora da tese.

Risco ignorado Estudo aponta que possíveis impactos das mudanças climáticas globais não fazem parte da preocupação dos municípios brasileiros Fotos: Divulgação

Vista geral da Zona Noroeste de Santos; no destaque, rua da região que sofre com problemas de alagamentos frequentes

Na mesma linha, a professora Leila observa que a questão climática não deve ser tratada somente por um ministério ou uma secretaria municipal ou estadual específicos. O tema, afirma ela, deve ter necessariamente uma abordagem interdisciplinar. “Trata-se de um assunto que perpassa diversas áreas, como habitação, saúde, trabalho, educação, transporte etc. O ideal é que a política pública do setor seja desenhada de forma a envolver os diferentes setores e atores. Em outras palavras, não é uma questão somente da alçada do poder público. Também é da iniciativa privada, das universidades e da sociedade civil em geral. Outro ponto fundamental é que as ações têm que ter prosseguimento independente de quem esteja momentaneamente no poder. As constantes sucessões no governo, tão necessárias à democracia, não devem afetar a continuidade dos programas”, defende a docente. Ainda segundo a professora Leila, a tese de Fabiana tem uma contribuição importante a dar nesse sentido. “A pesquisa empregou uma metodologia fundada no conceito da interdisciplinaridade. No trabalho, Fabiana aborda aspectos relacionados tanto à dimensão humana quanto à ecológica, para ficar em apenas dois exemplos. E nem poderia ser diferente, visto que os problemas associados às mudanças climáticas são complexos e exigem, portanto, um tratamento qualificado. Justamente por causa desse cuidado foi que os membros da banca examinadora foram unânimes em indicar o estudo para publicação”, informa. Questionada sobre experiências internacionais que poderiam servir de exemplo ao Brasil na área de política climática, a autora da tese cita dois exemplos, um vindo de Freiburg, na Alemanha, e outro de Melbourne, na Austrália. “A primeira cidade oferece um valioso exemplo de mitigação, uma vez que a sua política energética está baseada em fontes renováveis. Na segunda, o destaque fica por conta das iniciativas voltadas

à adaptabilidade da cidade às consequências das alterações no clima. Melbourne está investindo muito na coleta de água de chuva, que pode ajudar nos períodos de inundações e também nos momentos de escassez hídrica”. Em relação a essas iniciativas, Fabiana diz que é importante chamar a atenção para o fato de que as ações de adaptabilidade sempre são mais caras que as de previsibilidade. “Em termos mais populares, no que toca às mudanças climáticas também vale o célebre conselho de que é melhor prevenir que remediar”, pontua a pesquisadora, que contou com bolsa concedida pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Fora do escopo do trabalho de Fabiana, mas dentro do tema de políticas públicas em meio ambiente, a professora Leila informa que tem trabalhado num novo projeto de pesquisa individual, mas que deve se tornar temático brevemente, cujo tema é “Mudanças Climáticas Globais – As políticas ambientais na China com referência ao Brasil”. O estudo não pretende promover, como alerta a docente, uma análise comparativa entre os dois países, pois isso não faria sentido, dada as enormes diferenças entre eles. “Entretanto, é importante tomar conhecimento sobre o que se passa lá e que aprendizados podemos tirar da experiência chinesa. Não custa lembrar que a perspectiva ambiental é essencialmente global e local”, esclarece. Fotos: Antoninho Perri

Publicação Tese: “Governando as mudanças climáticas no nível local: riscos e respostas políticas” Autora: Fabiana Barbi Orientadora: Leila da Costa Ferreira Coorientador: Carlos Joly Unidade: Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam) Financiamento: Fapesp

A professora Leila da Costa Ferreira, orientadora do trabalho: Apesar de o país dispor de boas legislações, falta vontade política aos governantes para executar as políticas climáticas

Fabiana Barbi, autora da tese: As ações normalmente surgem mescladas às respostas governamentais a problemas urbanos mais imediatos


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Campinas, 7 a 13 de abril de 2014

Técnica prevê produção de soja com até um mês de antecedência

Foto: Antoninho Perri

Desenvolvido na Feagri, modelo usa dados de satélite disponíveis gratuitamente CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

soja é a cultura agrícola que mais cresceu no Brasil nos últimos 30 anos, e hoje responde, sozinha, por 49% de toda a área plantada em grãos no país, de acordo com dados do Ministério da Agricultura (Mapa). Além disso, a exportação do chamado complexo soja – grão, óleo, farelo – é a principal fonte de dólares do país, com negócios de mais de US$ 20 bilhões ao ano. O Mapa estima que, em 2019, a produção brasileira representará 73% do comércio mundial de óleo de soja. Numa cultura tão relevante para a economia nacional e mundial, a capacidade de prever a produção de uma safra representa uma informação importante para os agentes que atuam no mercado do produto, sempre aberto à especulação. Em sua tese de doutorado, a pesquisadora Gleyce Figueiredo, da Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Unicamp, apresenta um modelo que permite estimar a produção futura de soja com um mês de antecedência, usando dados de satélite disponíveis gratuitamente. “Já existem modelos de previsão que pegam dados do solo, informações do clima, informações sobre a variedade que está sendo plantada, para fazer a previsão”, disse Gleyce ao Jornal da Unicamp. “Mas usar esse tipo de modelo para fazer uma estimativa para todo o Brasil é muito complicado. O solo muda de um lugar para o outro, por exemplo, e nossa rede de estações meteorológicas não é muito densa”. Para contornar o problema, a pesquisadora e seu orientador, o professor Jansle Vieira Rocha, decidiram criar um modelo que usasse apenas informações espectrais – da fração infravermelha da luz solar refletida para o espaço pela vegetação – captadas em órbita por instrumentos a bordo de satélites. “A vegetação reflete mais luz nas faixas do infravermelho próximo. Nos canais de luz visível, do azul, verde e, principalmente do vermelho ela absorve bastante luz, então é mais difícil trabalhar”, explicou a pesquisadora. “Quando se destaca essa diferença entre a absorção no vermelho e a maior reflexão no

infravermelho, por meio dos chamados ‘índices de vegetação’, se torna mais fácil essa separação e se consegue enxergar melhor o comportamento da vegetação”. Na elaboração do modelo, foram usados dados do instrumento MODIS – sigla em inglês para Espectro-Radiômetro de Resolução Moderada – lançado a bordo do satélite Terra, da Nasa, em 1999. Em 2002, outro satélite equipado com um MODIS, chamado Aqua, também lançado pela agência espacial americana, entrou em órbita. Ambos os MODIS produzem continuamente imagens de toda a superfície terrestre, em 36 faixas do espectro eletromagnético. O Índice de Vegetação Realçado (EVI, na sigla em inglês) foi desenvolvido pela equipe MODIS para reduzir os efeitos de atmosfera e de fundo de dossel que contaminavam outro índice de vegetação comumente utilizado para estudar vegetação, o Índice de Vegetação por Diferença Normalizada (NDVI, na sigla em inglês). Além da utilização das bandas do vermelho e infravermelho próximo foi adicionada a faixa do azul para fazer essa correção. O mapa da vegetação gerado a partir do índice é elaborado a cada 16 dias. “Primeiro, fazemos a análise estatística utilizando todos os pixels da imagem da área em estudo”, explicou a pesquisadora. “Fiz a análise estatística pixel a pixel, para verificar se, para cada um deles, era possível correlacionar com a produtividade. Tentei filtrar o máximo possível, para manter aqueles pixels que realmente seriam bons para fazer a estimativa”. Os pixels são os pequenos quadrados que formam a imagem digital. No caso das fotos do MODIS, cada um deles corresponde a uma área de 6,25 hectares. Devido ao uso de imagens a cada 16 dias, o trabalho envolveu a análise do perfil espectral da soja – o modo como índice de vegetação varia ao longo da vida da planta –, a partir de imagens de um mesmo local, feitas em diferentes momentos. “São imagens que vêm desde o começo e vão até o final da safra. É como se conseguíssemos enxergar realmente a vida da planta, no computador. Desde o crescimento, atingindo o máximo vigor vegetativo, entrando em senescência e finalmente chegando a colheita, justamente por essa variação de perfil espectral”.

Lavoura de soja, que responde por 49% de toda a área plantada em grãos no país: movimentando mais de US$ 20 bilhões ao ano

“Trabalhei com dados de 2000 a 2011, então apliquei a técnica para esses 11 anos”. Em seu trabalho, a pesquisadora usou os dados do EVI para “prever” produtividade da safra de soja de partes do Estado do Paraná, e comparou o resultado das previsões geradas pelo modelo com os valores oficiais registrados para esses anos. “Fiz testes estimando as safras que a gente já tem, mas a intenção é aplicar para as safras futuras”, disse ela. “A importância de o modelo ser espectral é que a gente não coloca informação externa, a não ser o EVI e a produtividade histórica. Outros fatores como clima, solo, variedade agrícola e etc. não entram no modelo. Eu tenho um solo aqui no Estado de São Paulo, que é diferente do solo do Estado do Paraná. Mesmo dentro do próprio Estado há diferenças. Então haveria, aí, uma limitação no modelo. A gente já está pensando em acrescentar dados meteorológicos no modelo, mas vindos também de satélite”, explicou a pesquisadora. Usando os 11 anos de dados históricos de produtividade e os 11 anos de dados de EVI, Gleyce gerou mapas de correlação. “Fazendo os mapas de correlação, verifiquei qual é o período em que essas duas informações, o EVI e a produtividade, são mais correlacionáveis. E esse período é justamente a época em que a planta está em maior vigor vegetativo: quando ela está no pico do seu ciclo”, disse. Foto: Antonio Scarpinetti

A pesquisadora Gleyce Figueiredo: momento da melhor previsão variou de município para município

VARIAÇÕES

O momento da melhor previsão variou de município para município, contou a pesquisadora, mas o melhor resultado veio com um mês de antecedência em relação à safra. “Então eu tenho um mês, pelo menos, para preparar o mercado, diminuindo a especulação sobre o preço da soja e a gerando informação para planejamento de logística”, disse ela, acrescentando que essa é uma antecedência “bem significativa para o mercado”. “Outro foco da minha tese foi fazer também essa estimativa por mês”, acrescentou Gleyce. “Geralmente, o que se encontra é a estimativa final. Então, achamos interessante estudar o desenvolvimento da estimativa, o quanto isso vai mudando ao longo da safra, até chegar no valor bem próximo do dado oficial, e aí depois esse valor começa a se afastar”. “Fazendo isso mensalmente, a gente consegue verificar que no início do desenvolvimento da planta a produtividade é bem baixa. Quando a planta alcança os meses de pico vegetativo é onde encontramos os meses com maior produtividade”. “A ideia é reduzir a especulação e principalmente dar suporte a órgãos oficiais”, contou ela. “Uma vez que estes se baseiam em pesquisas de campo para estimar a produtividade, o que traz subjetividade e influencia na agilidade do sistema brasileiro de previsão de safras e monitoramento agrícola”. Gleyce acrescenta que seu modelo pode ser implementado por qualquer pessoa: “Esse é um dos nossos principais focos: a gente prefere trabalhar com imagem gratuita. Os dados do MODIS podem ser adquiridos gratuitamente na base de dados da Nasa, e a produtividade histórica é encontrada no órgão responsável de cada país”. A pesquisadora pretende prosseguir refinando o modelo, acrescentando cada vez mais dados na alimentação do sistema. “Informação de temperatura de superfície, meteorológica, do ciclo do carbono, que tem ligação com a produtividade também. Mas mantendo o foco no espectral, usando só informação de satélite”, disse ela. “Isto aqui foi só o começo. Acho que a gente pode caminhar para conseguir algo muito melhor”. Uma próxima etapa envolve a aplicação do modelo na previsão real de safras futuras. “Vamos colocar nas safras adiante”, disse a autora.

Publicação Tese: “Soybean Yield Estimates Based On Temporally Stable Pixels Using EVI MODIS DATA” Autora: Gleyce Figueiredo Orientador: Jansle Vieira Rocha Unidade: Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri)


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Campinas, 7 a 13 de abril de 2014

Grupo do IC cria sistema para reconhecimento facial Fotos: Antonio Scarpinetti

Metodologia, desenvolvida em colaboração com Universidade de Harvard, está entre as mais precisas do mundo

APRENDIZADO

EM PROFUNDIDADE

SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br

uanto maior a convivência e a familiaridade com determinados indivíduos, mais o cérebro humano ‘aprende’ a reconhecer suas faces. Tende ser assim para pessoas famosas, de uma mesma família, no trabalho, etc. A partir deste princípio, um grupo de pesquisadores do Instituto de Computação (IC) da Unicamp, em colaboração com estudiosos da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, formulou um sistema computacional para o reconhecimento de faces. A metodologia está entre as mais precisas do mundo, de acordo com os cientistas envolvidos. O sistema poderia ser empregado em diversas situações, como nas áreas de segurança, entretenimento e utilidades. Graças à capacidade de mapear características peculiares da face de cada pessoa, seria possível reconhecer com mais precisão suspeitos em aeroportos; identificar vândalos em estádios de futebol; substituir, facilmente, senhas ou impressões digitais em transações financeiras; ou mesmo conceber interfaces mais naturais e intuitivas para games, eletrônicos e eletrodomésticos. Outra possível aplicação seria o de redes sociais. Neste ambiente, em que uma imagem postada com várias pessoas, o sistema poderia, por exemplo, reconhecer aquelas pertencentes ao círculo de amizades do perfil. “A metodologia proposta consegue trabalhar muito bem em cenários nos quais outras técnicas, às vezes, não funcionariam satisfatoriamente. O sistema é capaz de reconhecer faces em ambientes não controlados, independentemente de algumas condições de iluminação, distância, expressões e poses dos indivíduos”, sustenta o pesquisador Giovani Chiachia, que formulou o método durante seu estudo de doutorado, defendido junto ao Programa de Pós-Graduação do IC. Para chegar ao sistema final, ele desenvolveu três novos algoritmos. Segundo o pesquisador da Unicamp, o sistema é capaz de trabalhar em cenários não controlados porque emprega técnicas de visão computacional e aprendizado de máquina no estado da arte. “São poucos, mas já existem similares como este no mundo. No Brasil, até onde eu saiba, é uma novidade”, garante o estudioso, que é graduado em sistemas de informação pela Universidade Estadual Paulista (Unesp).

“O Giovani propôs um método em que ele treinou neurônios artificiais num nível mais profundo da hierarquia, que é uma rede neural artificial, para que eles sejam capazes de responder a estímulos advindos da face de pessoas específicas”, explica o docente.

Giovani Chiachia, autor da tese: “O sistema é capaz de reconhecer faces em ambientes não controlados”

A pesquisa, com período sanduíche na Universidade de Harvard, contou com as participações dos docentes do IC, Alexandre Xavier Falcão, como orientador; e Anderson de Rezende Rocha, como coorientador. Nos Estados Unidos, Giovani Chiachia foi supervisionado por David Cox, docente de Biologia Molecular e Celular do Centro de Ciência do Cérebro, de Harvard. Da mesma instituição, também colaborou o pesquisador Nicolas Pinto. O profissional em sistemas de informação situa que tecnologias para reconhecimento facial automático são investigadas há mais de 30 anos. Apesar de ser um dos problemas mais explorados em visão computacional, identificar pessoas a partir de suas faces, de forma natural e em cenários não controlados, ainda continua sendo um grande desafio. Por isso, admite Giovani Chiachia, os sistemas mais usados atualmente são aqueles que requerem cenários controlados, em que só é possível reconhecer indivíduos mediante condições específicas de luz, distância, expressão e pose da face. Bastante utilizados no país para emissão de passaportes ou controle de acesso em empresas, estas técnicas pressupõem a colaboração por parte do indivíduo que está sendo reconhecido. “A motivação para construção deste sistema foi utilizar o conceito de familiaridade que o cérebro humano emprega para o reconhecimento de faces. Pela modelagem que fizemos, inspirados neste conceito, e pelas técnicas computacionais que empregamos, o método dá conta de atuar em cenários não colaborativos, em que as pessoas são reconhecidas de forma natural, sem serem importunadas”, garante, acrescentando: “A noção de familiaridade no reconhecimento de faces humanas pode ser traduzida da seguinte maneira: se a pessoa tem, por exemplo, um nariz um pouco diferente ou um formato de rosto peculiar - alguma característica que a distinga das demais -, o sistema vai tentar enfatizar isso através da análise de um conjunto de imagens dessa pessoa. Ele faz um mapeamento e detém estas características muito próprias do indivíduo.”

PRÊMIO INTERNACIONAL O pesquisador do IC informa que, durante o desenvolvimento do sistema, uma das versões concebidas rendeu ao grupo da Unicamp a primeira colocação em uma competição internacional ocorrida em junho do ano passado na cidade espanhola de Madri. A disputa foi realizada como parte da 6ª Conferência Internacional em Biometria, evento organizado pelo Conselho de Biometria do Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE) e pelo Comitê Técnico de Biometria da Associação Internacional de Reconhecimento de Padrões (IAPR). “O prêmio corrobora a precisão do sistema. Durante a competição, os organizadores forneciam um conjunto de imagens de pessoas e diziam: ‘queremos que vocês criem um sistema que aprenda a reconhecer estes indivíduos. Só que depois de desenvolvido o sistema, ele foi testado em outras imagens as quais não tivemos acesso. Participaram da competição vários grupos internacionais”, comemora.

FAMILIARIDADE Os docentes Alexandre Falcão e Anderson Rocha salientam que uma característica importante do sistema, que aumenta sua robustez e precisão, é o conceito de “familiaridade” com a face. “Isso é algo sabidamente empregado por seres humanos para reconhecer seus pares com facilidade e exatidão. Não existem muitos grupos no mundo que estão trabalhando com esta questão e que têm resultados expressivos como os que o Giovani demonstrou”, sustenta Alexandre Falcão. Anderson Rocha acrescenta que o sistema proposto baseia-se também em técnicas de redes neurais artificias, investigadas por Giovani Chiachia em Harvard. As redes neurais artificiais buscam aproximar o funcionamento dos sistemas computacionais ao do cérebro humano, com o objetivo de reproduzir as habilidades humanas.

Embora as redes neurais artificiais sejam investigadas há muito tempo, um conceito emergente nessa área de pesquisa é o de “Aprendizado em profundidade” ou Deep Learning, na tradução para o inglês. Empregado no método, o “Aprendizado em profundidade” está relacionado, conforme Giovani Chiachia, a um conjunto de métodos capazes de ‘aprender’ de forma hierárquica os diversos passos necessários para extração de conceitos a partir de dados complexos. Estes dados podem ser imagens de face com as quais o sistema concebido é capaz de lidar, por exemplo. “Ao contrário do que se poderia imaginar, tais métodos são compostos por operações simples e biologicamente plausíveis que são criteriosamente empregadas na elaboração de grandes redes neurais artificiais. Estas redes neurais têm a característica de operar diretamente sobre os dados brutos, como os pixels de uma imagem, por exemplo e, a partir deles, ser capaz de produzir conceitos com alto grau de complexidade nas camadas mais ‘profundas’”, esclarece. Chiachia afirma que a combinação bem feita de tais operações pode ser um passo rumo ao algoritmo fundamental empregado pelo córtex cerebral no processamento de dados sensoriais. “Isto, de fato, tem despertado o interesse da comunidade científica e de grandes companhias, sobretudo pelo fato de que resultados muitos expressivos foram alcançados, recentemente, em problemas difíceis de diferentes domínios. Dentre esses domínios está o de visão computacional, na qual se encaixa o assunto tratado na minha tese”, relaciona.

Publicações Giovani Chiachia, Alexandre X. Falcão, and Anderson Rocha. Person-specific Face Representation for Recognition. In IEEE/IAPR Intl. Joint Conference on Biometrics, Washington DC, 2011. Giovani Chiachia, Nicolas Pinto, William R. Schwartz, Anderson Rocha, Alexandre X. Falcão, and David Cox. Person-Specific Subspace Analysis for Unconstrained Familiar Face Identification. In British Machine Vision Conference, Surrey, 2012. Manuel Gunther, Artur CostaPazo, Changxing Ding, Elhocine Boutellaa, and Giovani Chiachia et al. The 2013 Face Recognition Evaluation in Mobile Environment. In IEEE/IAPR Intl. Conference on Biometrics, Madrid, 2013. Giovani Chiachia, Alexandre X. Falcão, Nicolas Pinto, Anderson Rocha, and David Cox. Learning Person-Specific Face Representations. IEEE Trans. on Information Forensics and Security, (submitted), 2014.

O professor Anderson Rocha, coorientador: sistema baseado em técnicas de redes neurais artificiais

O professor Alexandre Falcão, orientador do estudo: poucos grupos com resultados expressivos

Tese: “Aprendendo representações específicas para a face de cada pessoa” Autor: Giovani Chiachia Orientador: Alexandre Xavier Falcão Coorientador: Anderson de Rezende Rocha Unidade: Instituto de Computação (IC) Financiamento: Fapesp


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Técnica potencializa extração de compostos de duas plantas Engenheira de alimentos testa processo em folhas de pitanga e alecrim-pimenta Fotos: Antoninho Perri

CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br

erde-se no tempo a utilização das plantas como os primeiros recursos terapêuticos utilizados pelo homem. No Brasil este conhecimento empírico nos foi legado pelos índios. Por meio da ciência se chegou aos fitoterápicos, medicamentos obtidos a partir de plantas medicinais com o emprego exclusivo de matérias-primas ativas vegetais. Para tanto, há necessidade de obter os extratos naturais e estudar as propriedades dos compostos bioativos que os constituem. Estes compostos estão presentes naturalmente nas plantas e constituem o seu mecanismo de defesa contra as adversidades do meio ambiente. São eles também os responsáveis por suas propriedades terapêuticas. É o caso da pitanga, utilizada pelos índios pelas suas propriedades anti-inflamatórias. Não há família brasileira que não conheça os atributos medicinais de infusões, chás, sucos, alimentos, provenientes de produtos naturais. Hoje são recorrentes nos meios de comunicação as pesquisas que vinculam dietas à prevenção ou mesmo à cura de doenças, e são inumeráveis os sites que apresentam produtos naturais saudáveis. O estudo de plantas medicinais como fonte de medicamentos é advogado pela OMS e no Brasil, desde 2006, têm sido implementadas políticas para garantir acesso seguro e uso racional dessas plantas e de fitoterápicos. Fruto dessas iniciativas e de estudos desenvolvidos é a criação mais recente da Relação Nacional de Plantas Medicinais de Interesse para o SUS (Renisus), com vistas principalmente à utilização por pessoas de baixa renda. Diante desse contexto, a engenheira de alimentos e atual doutoranda Tábata Tayara Garmus Diniz selecionou duas plantas que constam da Renisus e são de uso popular consagrado pelas propriedades terapêuticas - a pitanga (Eugenia uniflora L.) e o alecrimpimenta (Lippia sidoides Cham), com o objetivo de estudar a composição dos extratos provenientes dessas duas matrizes vegetais e obtidos através de extração sequencial, em leito fixo – situação em que o solvente escoa através do leito de partículas estacionário formado pelas folhas secas e trituradas, empregando como solventes CO² supercrítico, etanol e água. As folhas de pitangueira são conhecidas por suas inúmeras atividades terapêuticas e usadas na medicina popular no tratamento de febre, doenças estomacais, hipertensão, obesidade, reumatismo, bronquite e doenças cardiovasculares. Hoje se sabe de sua ação calmante, anti-inflamatória, diurética e antioxidante. A medicina popular consagrou a utilização do alecrim-pimenta principalmente como antisséptico e antimicrobiano. Destaque-se que atualmente existe um grande interesse em formulações que incorporam extratos oriundos de fontes naturais para a obtenção de alimentos funcionais, de cosméticos ou produtos medicinais que contenham substâncias biologicamente ativas – antioxidantes, óleos essenciais, carotenoides, compostos fenólicos, flavonoides, entres outros. Assumem particular importância os compostos fenólicos e os flavonoides, cujas ações antioxidantes, eliminando radiais livres, os tornam potenciais protetores contra cânceres e doenças do coração. Parte do trabalho desenvolvido na pesquisa, orientada pelo professor Fernando Antonio Cabral e coorientada pela professora Losiane C. Paviani, ambos do Departamento de Engenharia de Alimentos da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, foi apresentado no artigo “Extraction of phenolic compounds from pitanta (Eugenia uniflora L.) leaves by sequential extraction in fixed bed extractor using supercritical CO² , ethanol e water as solvents” publicado no periódico The Journal of Supercritical Fluids.

Tábata Tayara Garmus, autora do estudo: método mostrou-se eficiente na extração de compostos (no destaque) bioativos das matrizes vegetais

TENDÊNCIAS

A busca por extratos naturais com potenciais ativos de grau alimentício é uma tendência na indústria de alimentos. A extração é um passo muito importante no isolamento, identificação e utilização de compostos presentes nesses extratos e não existe um método de extração padrão. Como consequência, têm atraído particular interesse pesquisas voltadas para um aperfeiçoamento das técnicas de extração e na busca por novas fontes de extratos naturais e seus constituintes. Nos últimos anos houve o crescimento no consumo de produtos enriquecidos com antioxidantes naturais, como vitaminas e compostos fenólicos, ou dos vegetais e seus extratos, que os contenham em abundância como chás e frutas. Essa tendência é resultado da preocupação crescente do consumidor com a saúde. Para Tábata, “embora haja evidências científicas dos efeitos benéficos dos compostos fenólicos, há uma clara necessidade de se intensificar a pesquisa nessa área, bem como esclarecer os consumidores de sua importância”.

MÉTODO

O mestrado de Tábata centrou-se principalmente no desenvolvimento de um método para extrair de maneira mais eficiente fenóis e flavonoides, que constituem os principais compostos bioativos responsáveis pelas propriedades das duas plantas selecionadas. Como não existe um método único que sirva a extrações desses e de outros compostos bioativos que possa ser utilizado em todas as plantas, é necessário pesquisar o melhor processo para cada caso. Nesses processos, a extração com etanol é uma das mais utilizadas, embora exija depois a separação do solvente para obtenção do extrato seco. Um dois maiores problemas da utilização desse e de outros solventes orgânicos é o fato de ser praticamente impossível a remoção de todo solvente residual sem um grande dispêndio de energia e envolvimento de custos, além do risco do solvente promover a formação de compostos secundários indesejáveis. Constitui exemplo da aplicação prática do etanol um medicamento fitoterápico desenvolvido por uma universidade brasileira que nada mais é do que um extrato etanólico da folha de alecrim-pimenta utilizado como antisséptico e antimicrobiano nos casos de ferimento.

Também muito empregada, a extração aquosa é realizada principalmente através dos processos de hidrodestilação ou destilação por arraste de vapor. A desvantagem dessas técnicas é que elas não podem ser usadas quando existem compostos passíveis de degradação a temperaturas próximas de 100º C. A busca por extratos de melhor qualidade e livres de traços de solventes levaram a pesquisa de processos alternativos de extração. O CO² supercrítico, de uso mais recente como solvente, apresenta a vantagem de uma substância não tóxica, inodora, de fácil obtenção e eliminação do extrato. No estado supercrítico, o CO² assume propriedades tanto de gases como de líquidos e possui maior capacidade como solvente. Esse estado é delimitado pelo ponto crítico, caracterizado por certa temperatura e pressão (críticas) cujo valor é diferente para cada solvente. Uma substância está no seu estado supercrítico quando os valores de sua temperatura e pressão excederem a temperatura e pressão do ponto crítico. Para o CO² , a temperatura crítica é de 31º C, relativamente baixa e, portanto de fácil operacionalização. Para a obtenção de extratos naturais a partir de folhas de pitangueira (Eugenia uniflora L.) e de alecrim-pimenta (Lippia sidoides Cham.), Tábata combinou três processos de extração. Os extratos foram obtidos por extração sequencial, em leito fixo em três etapas, ou seja, três solventes distintos passaram através do mesmo leito de partículas formado pelas folhas secas e trituradas, de cada matriz vegetal, a 60º C e 400 bar. A primeira etapa foi a extração com dióxido de carbono supercrítico, seguida pela extração com etanol e depois pela extração com água. Todos os extratos foram avaliados quanto ao teor de fenóis e flavonoides totais. Para avaliar as vantagens e desvantagens da técnica proposta e poder inclusive comparar seus resultados com os obtidos em etapa única, a pesquisadora obteve a partir das matrizes vegetais extratos em mais duas situações: 1) extratos, em etapa única, utilizando etanol e água em leito fixo, a 60º C e 400 bar, sem a utilização inicial da extração com CO² supercrítico; 2) extratos etanólicos e aquosos, obtidos pelos métodos convencionais, ou seja, à baixa pressão (0,93 bar) e mantida a temperatura de 60º C. Ela mediu então o rendimento global de extração, con-

centração e rendimento de fenóis e flavonoides totais de todos os diferentes extratos obtidos.

RESULTADOS Ao se propor realizar a extração em três etapas sequenciais Tábata, alicerçada em resultados colhidos em uma revisão bibliográfica e face às diferentes características dos solventes utilizados, esperava que na etapa inicial com CO² supercrítico ocorresse a retirada dos compostos que não eram do seu interesse, restando na planta aqueles que pretendia estudar e que seriam extraídos com mais facilidade nas etapas posteriores (etanólica e aquosa). A literatura apontava nessa direção e a escolha das folhas de pitangueira permitiria estabelecer comparações com estudos já realizados. O alecrim-pimenta foi utilizado para testar a reprodutibilidade e extensão do método. O estudo mostrou que o processo de extração sequencial, em três etapas, foi o mais eficaz quando se deseja obter extratos com alto rendimento global de extração e de fenóis e flavonoides totais. As extrações etanólicas e aquosas antecedidas pela extração supercrítica foram as que apresentaram maior concentração de fenóis e flavonoides quando comparadas com as extrações sem a prévia extração supercrítica, principalmente em relação às folhas de pitanga. De certa forma, é como a extração supercrítica abrisse os canais para a ação do etanol e da água. No geral, a extração sequencial em três etapas, nas condições estudadas de temperatura e pressão, mostrou-se eficiente na extração de compostos bioativos para as duas matrizes vegetais.

Publicação Dissertação: “Obtenção de extratos de folhas de pitanga e de alecrimpimenta por extração sequencial em leito fixo usando CO² supercrítico, etanol e água como solventes” Autora: Tábata Tayara Garmus Diniz Orientador: Fernando Antonio Cabral Coorientadora: Losiane C. Paviani Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)


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Campinas, 7 a 13 de abril de 2014

Pesquisa alerta para uso de sapatos infantis inadequados Fotos: Antonio Scarpinetti

Dissertação aponta que problema afeta desenvolvimento motor e construção da feminilidade ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br

ichele é uma mulher que sempre prezou pela boa aparência. Ela não hesita ao escolher um sapato menor que o seu número, se for para ficar bonita. Ocorre que ela tem uma filha que é sua cópia fiel. Aos seis anos de idade, já usa sandalinhas de salto e se envaidece de parecer mocinha. Esse panorama já se constitui um fenômeno mundial. E essa postura ingênua pode ocultar uma questão maior, que é a antecipação de fases na infância e na sensualização. Foi o que concluiu a fisioterapeuta Renata Augusto Martins em sua dissertação de mestrado apresentada à Faculdade de Ciências Médicas (FCM). “As crianças e adultos não sabem o que podem estar suscitando com isso”, adverte. O uso de calçados inadequados não contribui para o desenvolvimento motor e nem para a construção da feminilidade. Além do mais, antecipação de fases na infância pode ter consequências perversas, afirma ela. “As crianças hoje gostam muito de se fantasiar para se transformar. Saem assim pelas ruas. Só que uma coisa é brincar de ser princesa. A outra é crescer princesa na rua. Não está havendo momento lúdico em suas vidas e, o que é pior, estão passando por isso e as famílias nem percebem”, verifica. A fisioterapeuta estudou o uso de calçados por meninas na faixa etária de um a sete anos, para compreender se eles prejudicam a marcha. Durante esta fase do desenvolvimento motor e da consciência corporal, a marcha independente é o ponto alto. O tipo de calçado que acompanha a criança durante esse aprendizado pode influenciar o desempenho de um caminhar seguro, alterando a largura, o tempo e o impacto durante cada passo. Renata notou que as meninas, foco deste estudo, têm a seu favor o crescimento. Seus músculos e ossos acomodarão os pés e todo resto do corpo quando estiverem em pé ou andando. Por outro lado, na idade adulta, poderão arcar com danos pelo uso de sapatos inadequados, hábito originado na infância. Poderão ter deformidades como as joanetes (geradas pela mudança na angulação dos ossos que atinge o dedão do pé, entortando) e o neuroma de Morton (lesão no nervo entre os dedos, que causa espessamento e dor). Esses e outros comprometimentos dos pés se dão numa proporção de 9:1 nas mulheres em relação aos homens, conforme a literatura. “Escolhi esse assunto pela dificuldade de optar por modelos de sapato para minha filha, quando pequena, pois, se estava ruim para mim, que tinha senso crítico, imagine para ela e para outras mães que nunca pensaram nisso”, reflete. “Vejo que o sapato ideal é o tênis e, tanto quanto possível, as crianças deveriam andar mais descalças.”

A pesquisadora também adentrou a questão do consumismo. Sondou como ele é incutido nas crianças. Percebeu que, para elas, consumir é prazeroso. Está comprovado, inclusive, a liberação de endorfina no organismo, um hormônio que cria essa sensação. Há anos, observa-se uma vasta oferta de sapatos com saltinho e de plástico, em geral com personagens infantis. Isso acaba envolvendo muito a criança. Agora, é certo que existe um consumo necessário. Só que, na maioria das vezes, vem repleto de mensagens subliminares que vão além dos danos ortopédicos, com forte apelo para a sensualização precoce.

CONEXÕES

Renata entrevistou 12 mães. Queria conhecer a percepção delas. Verificou que se assustavam quando perguntava se elas achavam que o caminhar com o salto interferia no estilo de vida da criança. [A mestranda viu nas lojas saltos com mais de 5 cm de altura.] As mães disseram que nunca tinham pensado nisso. Algumas se chocaram. Outras falaram de uma novela em que as meninas usavam roupas que pediam um saltinho, incentivando-as a terem um igual. Isso vai levar a um batom e a um esmalte. Uma coisa puxa a outra. Mesmo sabendo dos sapatos inadequados, as mães não conseguiam ignorá-los. Daí a relação direta entre o consumo e a criança, denotando que a infância está mudando. Há elementos sugerindo que ela é pretérita, fruto de uma criação sociocultural. A infância está mudando de fato, sustenta Roberto Teixeira Mendes, docente do Departamento de Pediatria da FCM e orientador do estudo, porque boa parte do que se vivia na adolescência está “descendo” para essa fase, vindo a erotização precoce, que é uma demanda adulta. A infância que era um período “protegido”, para que a criança se desenvolvesse, tem sofrido uma redução em sua duração e uma transformação em seu conteúdo, comprometendo o período de latência, no qual as funções cognitivas superiores e os valores ético-morais começam a se constituir na forma adulta. “Não pensamos nisso no começo. Depois vimos que o fenômeno do uso dos calçados do tipo adulto por meninas coincide com os estudos sobre a infância contemporânea ou pós-moderna”, verifica Teixeira. A adolescência parece expandir para baixo, antecipando-se à puberdade, e para cima,

A fisioterapeuta Renata Augusto Martins, autora do estudo, e o professor Roberto Teixeira Mendes, orientador: mães são reféns do consumo

base que no mínimo isso também se passava com elas, e fomos estudar outras questões que envolviam a escolha.” Renata buscou normas da ABNT para a confecção de calçados para meninas. Achou normas mais ou menos estabelecidas para adultos no Brasil e no exterior. Foram encontrados apenas estudos de adequação. A despeito de haver selos de qualidade para calçados de crianças, a estudiosa, ao fazer contato com as sociedades que os conferiam, relatou que elas não souberam informar o parâmetro para atribuí-lo. O maior risco de usar sapato com salto é o entorse, que pode levar a lesões simples e também de ligamentos, que exigem intervenção cirúrgica. Quem tem pé pequeno e usa salto alto, diminui a base de sustentação do corpo.

IMPLICAÇÕES

Em nome da beleza, a dor Na cultura chinesa, em nome da beleza, os adultos tinham o hábito de enfaixar os pés das crianças desde os três anos. Dobravam os dedos das meninas na direção da sola do pé. Deformavam o pé até que ficasse do tamanho de uma caixinha de cigarro, os chamados Pés de Lótus. A menina era transformada desde a infância, pois não era possível transformar o pé de uma mulher adulta. Isso porque é preciso ter os ossos em desenvolvimento para deformá-los. Parece um exagero. Na verdade, é o mesmo fenômeno: as crianças usam o sapato que não serve para sua idade. Algumas modelos decepam o dedo mínimo para que o pé caiba num sapato de bico fino. A jornalista americana Glória Steinem refere-se ao assunto no livro Memórias da Transgressão: Momentos da História da Mulher do Século XX (1997), com a seguinte pergunta: se o sapato não serve, nós devemos mudar o pé?

sobrepondo-se à idade adulta, criando a adultescência, com o adiamento prolongado do comportamento adulto, como que desmanchando limites antes melhor definidos. Renata percebeu uma questão muito cruel: a nova postura é fomentada pelos próprios pais ou os responsáveis pelo marketing de produtos para crianças (os fabricantes, os veiculadores e todo o staff ), que dão suporte ao consumo e às ideias. Tudo isso deveria dizer respeito à preservação da infância, opina. Mas a preocupação ortopédica não é maior que a apreensão com a atitude da criança. Em uma festa, ela tira o sapato quando está apertado, para brincar. Naquele momento ela é criança. Paradoxalmente, outras querem continuar arrumadinhas.

NORMAS

Teixeira e Renata viram que seria difícil avaliar a alteração da marcha com sapatos inadequados, mesmo para adultos, visto que os equipamentos para analisar esse parâmetro eram pouco acessíveis há cerca de dez anos, quando ambos começaram o levantamento bibliográfico e a discussão do assunto. Eles envolviam esteiras e requeriam um laboratório de marcha, no qual se filma a pessoa andando com e sem sapato. Seria ainda possível associá-la ao uso de uma palmilha, que estudaria a mudança das pressões no pé, conforme o salto ou o tipo de sapato. Isso pode ser feito hoje, não à época. Como foi superada tal barreira metodológica, já que a Unicamp não tinha esses meios de análise para crianças? Para driblar o empecilho, a mestranda partiu do seguinte consenso: sapatos de salto não são adequados para a marcha porque qualquer pessoa que colocá-los vai andar diferente – passos mais curtos e menos equilíbrio. Ela então decidiu fazer um trabalho que considerasse isso um elemento dado, embora não estudado em crianças. “Tomamos por

Uma das perguntas que Renata fez às mães foi se elas já tinham comprado um sapato que machucava o pé? A resposta foi sim. O que elas fizeram com ele? Deram a uma outra pessoa ou usaram pouco. O que elas faziam quando o sapato machucava o pé das filhas? Comentaram que “o pé cresce tão rapidamente que, se tiver que ficar comprando muitos sapatos, assim não vai dar...” São atitudes impensáveis, critica a mestranda. Mas, no momento seguinte, depois de as mães terem dado seu testemunho, “a ficha caía” e elas desabafavam: “nossa, eu falei isso?” Era constrangedor. Teixeira constata que as mães são reféns de uma demanda das filhas e do consumo. Na literatura, estudos de Linda O’Keefe (1996) mostraram que 88% das mulheres usavam sapato um número menor que o ideal. O autor descreveu o fascínio delas pelos saltos altos: “[...] as mulheres podem ‘enfiar’ uns chinelos, ‘calçar’ uns tênis ou ‘por’ uns sapatos mais confortáveis, mas ‘vestem-se’ de saltos altos.” Outra questão estudada foi a da identidade representada pelo uso de certos calçados com estilos de vida e status social, fato registrado na história dos calçados pelo menos desde o Antigo Egito. Usar este ou aquele calçado, associado a roupas e posturas, indica o pertencimento a grupos e identidade com ícones da cultura. Exemplo disso é o roubo de tênis por adolescentes que indica a luta por serem semelhantes a quem o possuía. Se a menina não é a Cinderela, ao menos tem um sapatinho transparente, de plástico que seja. Na identificação com grupos e personagens, o calçado então parece ser o elemento icônico. Há pouco, lembra Renata, a menina brincava de usar a sandália da mãe. Agora, ela e suas amigas vão à escola de salto e com maquiagem. Fogem dos seus mundos e invadem a vida adulta. O psicanalista Donald Winnicott disse que a brincadeira é a forma de a criança entender o mundo e se entender nele, e de aprender a se relacionar com o outro. “Boa parte das crianças que não brinca terá menor capacidade de reflexão e de interação com as complexas realidades do mundo adulto”, frisa Teixeira. Na sua visão, parte da violência entre os jovens tem a ver com o fato de não haver mais tempo para as brincadeiras coletivas, porque quem brinca desde criança continua brincando quando adulto, sendo criativo e tolerante. Quem nunca brincou quando criança, tornase um adulto intolerante. “O sapato é um elemento como outros, como as telas de computador e dos celulares. Crianças muito pequenas reconhecem esses aparatos que, para elas, têm outro uso. Acabam não brincando, nem interagindo. O sapato segue a mesma linha”, garante o pediatra.

Publicação Dissertação: “Pressão de consumo e escolha das mães: o caso dos sapatos para meninas de 1 a 7 anos” Autora: Renata Augusto Martins Orientador: Roberto Teixeira Mendes Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)


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Ruídos em aula afetam

e incomodam estudantes Amostragem indica que mais de 70% estão insatisfeitos com barulhos provocados pelos próprios colegas

Foto: Divulgação

SILVIO ANUNCIAÇÃO silviojp@reitoria.unicamp.br

ma pesquisa da Unicamp envolvendo cerca de 700 estudantes entre 6 e 14 anos, de escolas municipais, estaduais e particulares de Campinas, demostrou que mais de 70% deles estão insatisfeitos com o nível de ruído em sala de aula. A investigação constatou ainda que, para 99,2% destas crianças e adolescentes, as maiores fontes de barulho na escola são os próprios colegas. O diagnóstico integra pós-doutoramento desenvolvido pela fonoaudióloga Keila Alessandra Baraldi Knobel junto ao Centro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação (Cepre) “Prof. Dr. Gabriel Porto” da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp. O trabalho obteve financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e foi supervisionado pela docente da FCM Maria Cecília Marconi Pinheiro Lima. “Realizei um levantamento, conversando individualmente com todos estes estudantes, para traçar um perfil sobre suas preferências e seus hábitos auditivos dentro e fora da escola. Concluímos que, embora a acústica da sala de aula agrave o ruído, o grande problema é o barulho produzido pelos próprios alunos. E o surpreendente foi que, quando questionados sobre os responsáveis pelos ruídos, a resposta era sempre ‘os muleque’, indicando que a maioria desses jovens não tem consciência sobre seu papel na produção da poluição sonora”, aponta Keila Knobel. No momento, ela dá sequência aos estudos, com outro pós-doutoramento, também supervisionado por Maria Cecília Marconi. O objetivo é desenvolver um programa para a diminuição do ruído e a prevenção da perda auditiva em crianças e adolescentes. “Trata-se de uma intervenção, levando em conta a gravidade do problema. Em curto prazo, o ruído na sala de aula afeta o aprendizado e a qualidade de vida destes estudantes, com relatos de cansaço, estresse, dor de cabeça e dor de ouvido. Já em longo prazo, o barulho intenso e constante pode causar a perda auditiva irreversível”, alerta. Embora o barulho na escola não atinja níveis tão intensos, Keila Knobel explica que a somatória de ruídos ao longo dos anos pode provocar a perda auditiva. Ela cita estudos americanos indicando que 12% das crianças daquele país têm algum tipo de perda auditiva ocasionada pelo som intenso. Há também, de acordo com a estudiosa da Unicamp, relatos científicos apontando um aumento da perda auditiva de crianças e adolescentes em outros países. “Quando o indivíduo recebe um som muito intenso, as células ciliadas localizadas no ouvido se quebram ou entortam, ao invés de apenas se movimentarem. Estas células ciliadas, que são milhares, podem até se recuperar depois que se quebram ou entortam. Numa festa muito barulhenta, por exemplo, a pessoa sai com o ouvido meio tapado, com um zumbido. Isso é sinal de que as células entortaram”, explica. Neste caso, de acordo com a fonoaudióloga, a tendência é que o distúrbio se normalize nas 12 horas seguintes. “Agora, se isso for acontecendo repetidamente, as células serão mortas. Uma vez mortas, elas não se recuperam. Não existe cirurgia, transplante, nada, por enquanto, infelizmente. O que temos é a prevenção ou o aparelho auditivo”, completa.

DETALHES

E INTERVENÇÃO

Ainda conforme dados do pós-doutoramento concluído por Keila Knobel, quando questionados sobre suas participações na geração do ruído em sala de aula, ape-

Sala de aula em escola visitada pelas pesquisadoras: investigação abrangeu cerca de 700 estudantes entre 6 e 14 anos Foto: Antonio Scarpinetti

A fonoaudióloga Keila Alessandra Baraldi Knobel: “A maioria dos jovens não tem consciência sobre seu papel na produção da poluição sonora”

nas 22,1% dos alunos admitiram também fazer barulho. Outros 34,8% disseram fazer barulho às vezes, justificando suas razões: “quando outras crianças conversam, eu fico com vontade de conversar”, “eu converso, mas só depois que acabo minha lição”, “eu converso, mas eu falo baixo, os outros falam alto”, “eu converso, mas eu paro quando a professora pede.” Cerca de 60% dos participantes da pesquisa afirmaram que o ruído na escola “atrapalha a fazer a lição”, pois interfere na atenção e concentração. 10,3% relataram que o barulho “atrapalha a entender a professora”; 6,2% disseram ficar com dor de cabeça e 6,5%, com dor de ouvido. Foram entrevistados 670 estudantes, do 2º ao 9º ano do ensino fundamental de

Publicações Artigos KNOBEL, K. A. B.; LIMA, M. C. P. M. Knowledge, habits, preferences and protective behavior in relation to loud sound exposures among Brazilian children. Int J Audiol, v. 51, n. S-12, p. S-19, 2012. KNOBEL, K. A. B.; LIMA, M. C. P. M. Effectiveness of the Brazilian version of the Dangerous Decibels® educational program. Int J Audiol, in press.

escolas públicas e particulares de Campinas. A pesquisadora também ouviu 126 professores sobre percepções e incômodos em relação ao ruído no ambiente escolar. Ao classificarem o nível de ruído na escola, os professores apontaram a biblioteca como o lugar mais silencioso, e a sala de aula como o mais ruidoso. “O ideal numa sala de aula é que o barulho máximo chegue até 65 decibels (dBs), mas constatamos que ele atinge 80 dBs. Neste caso, ainda não tem risco de perda de audição, mas já tem problema suficiente para aprendizagem e para afetar a audição em longo prazo.” Os resultados apontados na pesquisa, concluída no ano passado, convenceram Keila Knobel da necessidade de uma in-

Pós-doutorado “Perda auditiva induzida por níveis de pressão sonora elevada em crianças: percepção de risco em escolares” “Implantação e avaliação de um programa de educação ambiental com foco na promoção da saúde auditiva e não auditiva e na diminuição da poluição sonora” Autora: Keila Alessandra Baraldi Knobel Supervisora: Maria Cecília Marconi Pinheiro Lima Unidade: Cepre Financiamento: Fapesp e Capes

tervenção, fruto do seu atual pós-doutoramento financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (Capes). “Utilizo todos os dados e conhecimentos dos anos anteriores como fundamento para este projeto. Na verdade, é uma continuidade, um aprofundamento. Consiste numa intervenção em 220 crianças e adolescentes por meio da adaptação de um programa de prevenção da perda auditiva chamado ‘Dangerous Decibels’, que na tradução significa decibels perigosos. Aliado a esta adaptação, nós elaboramos também um programa próprio para o controle de ruído na escola”, situa. Uma das propostas, conforme a fonoaudióloga, é a montagem de aulas em que as crianças e adolescentes aprendem conceitos sobre os sons, vibrações, perda auditiva e o quê fazer para se protegerem. A intenção, de acordo com ela, é que alunos e professores discutam a questão do ruído na escola e que eles próprios elaborem um plano de ação a ser seguido por todos. “Dentro ou fora do ambiente escolar, a orientação para as crianças, e que também serve para os adultos, é abaixar o som. Se não der para abaixar, se afaste. E se não der pra fazer nenhum dos dois, coloque protetor auditivo”, recomenda. A pesquisadora da Unicamp esclarece que, como as células ciliadas são muitas, o processo de perda da audição ocorre lentamente. “Às vezes, o som muito intenso numa única exposição faz com que o indivíduo perca até 30% das células ciliadas. Mas isso dá alterações mínimas num exame audiométrico, por exemplo, e quando a pessoa se dá conta, pode ser tarde demais”, expõe.

CULTURA

DO BARULHO

A sociedade atual vive uma “cultura do barulho” na opinião de Keila Knobel. “Para a festa estar ‘divertida’, a música tem de estar alta. Se você está se divertindo, grite. Quando você vai ao circo, os palhaços falam: ‘quem está gostando, dá um grito’, ‘quem gritar mais alto vai ganhar um pirulito’. Eles fazem isso, como se fosse uma manifestação da diversão”, exemplifica. “Portanto, a cultura do som intenso vem dos pais, é uma questão de educação. É um ‘aprendizado’ que vem vindo. Mesmo na escola - onde a acústica pode não ser muito boa, onde as salas estão instaladas próximas ao pátio ou a uma rua mais barulhenta -, a queixa principal está relacionada ao ruído produzido dentro da sala. Isso nos faz pensar na relação entre aluno e professor, na falta de respeito dos alunos para com os professores e nas dificuldades destes em controlarem os alunos e despertarem o interesse pelo conhecimento”, reconhece. A legitimação do barulho torna as crianças constantemente expostas a sons intensos, critica a estudiosa. O maior problema relatado pelas crianças fora do ambiente escolar são os fogos de artifício, acrescenta Keila Knobel. “É muito preocupante porque elas vivenciam isso. As crianças falam: ‘eu já soltei com o meu pai’. Neste caso pode acontecer um trauma acústico. Um barulho de rojão chega a mais de 120 dBs. Surpreende que a maior parte das exposições ocorre em ambientes onde os pais estão, como soltar fogos, ouvir música alta em casa ou no carro, festas e eventos. Assim, os pais estão cada vez mais incutindo nessas crianças a cultura do som alto”, condena. A saída, conforme a pesquisadora, é a educação. “O diagnóstico da minha pesquisa não retrata apenas as escolas de Campinas. É um cenário que se repete, com diferenças para mais ou menos em todo país e no Exterior. Nos EUA, por exemplo, as queixas são as mesmas. Se a questão da poluição sonora for encarada como ambiental - e é -, torna-se possível mudar”, acredita. “Quantos de nós já não encara como normal separar lixo orgânico de inorgânico? Muita gente já adotou isso em casa, muitas escolas, inclusive. No momento em que as pessoas entenderem a questão auditiva, assumindo a sua própria responsabilidade de abaixar o som, de falar mais baixo, de colocar o celular no silencioso, de não arrastar a cadeira, esse cenário pode mudar. São diversas atitudes de educação, de gentileza, de respeito ao outro, que podem diminuir muito o ruído nas escolas, nos escritórios, nos restaurantes...”, ensina.


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Campinas, 7 a 13 de abril de 2014 Foto: Antônio Gaudério/Folha Imagem

Dissertação revela caos na regulação fundiária no país

Área desmatada na Amazônia: para pesquisador, a degradação ambiental, entre outras distorções, está na gênese da concentração fundiária

LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

m raríssimo esforço no combate aos problemas fundiários no Brasil, o Instituto de Terras do Pará (Iterpa) desencadeou um processo de mapeamento das terras públicas e de combate à grilagem que culminou no cancelamento de mais de 10 mil títulos de terras, referentes a uma área de 500 milhões de hectares. O dado correspondente ao período 2007-2010 é ainda mais assombroso quando comparado com o próprio território do Pará, 125 milhões de hectares, quatro vezes menor. Existe também a estimativa de que 30 milhões de hectares estejam nas mãos de grileiros, que utilizam esses documentos falsos, muitos deles forjados em cartórios de registros de imóveis, para se apossar de terras públicas. O estudo do caso do Pará recheou de números a pesquisa de mestrado de Vitor Bukvar Fernandes, cujo objetivo é demonstrar que o Estado brasileiro não tem controle sobre suas terras (devolutas), desconhecendo inclusive a extensão e localização das mesmas; e que o fenômeno jurídico da posse, especialmente sobre estas áreas não demarcadas, amplifica o caos em matéria de regulação fundiária ao permitir a privatização de patrimônios públicos. A dissertação “Passado não resolvido: a histórica falta de regulação na ocupação de terras no Brasil após 1964” foi orientada pelo professor Bastiaan Philip Reydon e apresentada em fevereiro no Instituto de Economia (IE) da Unicamp. “O trabalho aborda um padrão de apropriação de terras que se repete desde a descoberta do Brasil e que considero perverso por se sustentar em uma estrutura agrária altamente concentrada, mantendo-se até hoje em essência”, afirma Vitor Fernandes. “Em minha opinião, este padrão de expansão com a apropriação territorial na fronteira está diretamente ligado a mazelas como base fundiária concentrada, degradação ambiental (sobretudo desmatamentos), grilagem de terras, conflitos violentos e trabalho escravo no campo. E agora, como no passado, temos os indígenas entrando em choque com esta frente de expansão que ameaça as reservas na Amazônia.” Para definir seu projeto de pesquisa, o economista se inspirou na tese de doutorado de uma historiadora, Lígia Osório Silva, autora do livro “Terras devolutas e latifúndio”, em que ela resgata a história da apropriação territorial da chegada dos portugueses até 1930. “Gostei do tema e me apropriei da ideia central da autora no intuito de mostrar que aquele padrão se mantém, pois sempre houve uma distância muito grande entre a letra da lei e a forma como se dá a apropria-

ção efetivamente. Meu recorte para o período anterior e posterior a 1964 se deve ao fato de que o golpe militar abortou todos os esforços de intelectuais e de movimentos populares para resolver a questão agrária.” Vitor Fernandes recorda que a sesmaria – instituição jurídica portuguesa trazida para normatizar a distribuição de terras brasileiras – foi dominante até meados do século 19. Tratava-se de uma concessão mediante a contrapartida de que áreas mínimas fossem destinadas à produção, sob o risco de retomada da terra. “Era este o sentido das sesmarias em Portugal, mas não funcionou assim no Brasil, que sempre praticou uma agricultura itinerante e que deixa para trás a terra desgastada. Era informalmente aceito que o beneficiário utilizaria apenas parte da extensa área concedida, até desgastá-la e passar a outra parte, sucessivamente. Como sempre houve necessidade de expansão da fronteira interna, a demarcação de terras devolutas não era politicamente interessante.” Segundo o autor da dissertação, o golpe de misericórdia contra o sistema de sesmarias se deu com a primeira Lei de Terras, em 1850. A proposta era que o Estado assumisse o controle de suas terras e os interessados passassem a comprar os títulos, proibindo-se o apossamento. “Na prática, porém, os posseiros continuaram invadindo e se apossando das terras públicas que o governo não conseguia demarcar, para depois regularizá-las, transformando-as em patrimônio privado. Não falo necessariamente do grande posseiro, mas como o apossamento se dá principalmente pela força, o pequeno pode ser expulso pelo primeiro, e não o contrário. Tivemos a Independência, a Proclamação da República, a Constituição, e este padrão se mantém em essência.” Fernandes ressalta que, talvez excetuando a Holanda, o Brasil é o único país a possuir uma instituição de tipo paraestatal como os cartórios de registro de terras, que mesmo sendo idôneos em maioria, contribuem para o caos na regulação fundiária abrindo margem para a grilagem. “Os Estados Unidos, por exemplo, adotam uma legislação agrária denominada Homestead Act, assinada por Abraham Lincoln em 1862 dentro do esforço para ocupar o oeste americano. Em troca de uma quantia simbólica, os aventureiros recebiam lotes de terras federais [65 hectares] que já ficavam demarcados; não havia esta flexibilidade do Brasil, que até hoje não controla a maior parte das terras devolutas.” O registro de entrada no Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), conforme o economista, indica a localização e dimensão da terra, mas menos de 5% das propriedades estão georreferenciadas. “É preciso considerar ainda as propriedades que contam com ‘vários andares’, ou seja, vários registros de terras no mesmo lugar (ou com intersecções entre elas). Pouco se repara no detalhe de que o Brasil é um dos últimos países onde a fronteira interna continua em expansão; e que a permanência deste padrão de apropriação territorial depende exatamente da existência de terras reservas, como vemos no oeste do Pará. Os grandes proprietários vão se apropriando e reconcentrando a base fundiária, enquanto os pequenos acabam expulsos para as franjas.”

Vitor Bukvar Fernandes, autor da dissertação: “Os grandes proprietários vão se apropriando e reconcentrando a base fundiária, enquanto os pequenos acabam expulsos para as franjas”

EXPECTATIVA ABORTADA

Vitor Fernandes vê a década de 1950 até 1964 como o momento de maior expectativa de mudanças na estrutura agrária, devido à efervescência dos movimentos sociais (Ligas Camponesas obviamente incluídas) e de intelectuais como Caio Prado Junior, Alberto Passos Guimarães e Ignácio Rangel na discussão das reformas de base. “Na época, a maioria da população já morava nas cidades, mas ainda existia margem para uma distribuição de terras. Apesar de especificidades apontadas por cada autor, prevalecia o consenso de que a concentração da base fundiária era arcaica, um problema a ser resolvido. Mas o movimento foi abortado pelo golpe.” Na opinião do pesquisador, contribuiu decisivamente para a manutenção do padrão fundiário o peso político exercido nos anos 80 e 90 pela UDR [União Democrática Ruralista], representante de uma oligarquia rural que, por sua vez, foi um dos pilares de sustentação dos governos militares. “Um fato irônico é que o Estatuto da Terra foi promulgado em 1964 e, lendo a lei, notamos uma regulação bastante progressista, com figuras até então inexistentes como da desapropriação por interesse social e da necessidade de cobrança do Imposto Territorial Rural.” Fernandes acrescenta que igualmente irônico foi o fato de que a aprovação do Estatuto da Terra com uma redação tão progressista se deu por influência direta dos EUA. “Logo depois da revolução cubana criaram a Aliança para o Progresso, por temor de um possível levante comunista caso não se promovesse alguma distribuição de terras dentro dos países da América Latina. Para o Brasil interessado em recursos que financiassem seus projetos de desenvolvimento, a solução veio no jeito malandro de fazer passar o estatuto, mas postergando a sua aplicação, que nunca ocorreu a pretexto da necessidade de aprovação de dispositivos específicos.” Estratégia semelhante, conforme observa o economista, foi empregada na Constituição de 88, que em relação ao campo resultou em texto bem mais retrógrado que do Estatuto da Terra. “José Gomes da Silva, que participou da elaboração das questões agrárias no anteprojeto da Constituição de 88, possui dois livros – ‘Caindo por terra’ e ‘Buraco negro’ – mostrando que todos os assuntos problemáticos, que criavam impasse, foram jogados no buraco negro e abafados. E, tanto nos governos neoliberais como nos mandatos de Lula, persistiu o total descontrole sobre as terras devolutas, não se registrando o menor esforço para arrecadá-las.”

Foto: Antonio Scarpinetti

Estudo do Instituto de Economia analisa ocupação de terras no Brasil após 1964

O pesquisador informa que uma breve exceção se deu no Pará, na gestão da petista Ana Júlia Carepa (2007-2010), e justifica a escolha deste estudo de caso por se tratar de um Estado territorialmente extenso e que experimenta a expansão da fronteira interna há 40 anos. “Nesta fronteira, os problemas gerados pela falta de regulação e pela apropriação de terras devolutas através do apossamento se tornam exponenciais. De fato, o Pará é o Estado que registra mais mortes em conflitos fundiários, mais trabalho escravo e um dos mais altos índices de desmatamento. Ao mesmo tempo, como o Brasil é o país dos paradoxos, o governo paraense fez um esforço político que resultou em 500 milhões de hectares de títulos cancelados, na demarcação de terras indígenas e na regularização de propriedades de pequenos posseiros. Não se deu sequência a este esforço a partir de 2010, mas ele trouxe uma luz, mostrou o melhor caminho.” Na visão de Vitor Fernandes, o melhor caminho é a reorganização institucional para que os órgãos que lidam com as questões da terra – Incra, ministérios, Funai, Institutos da Terra, municípios, cartórios – se comuniquem. Nesse sentido, ele revela que já trabalha como assistente de pesquisa do professor Bastiaan Reydon, seu orientador, que vem articulando esforços em busca de melhorias na governança fundiária, tanto em projetos com o Banco Mundial quanto em iniciativas recentes ao lado do Ministério do Desenvolvimento Agrário. “O primeiro passo é consolidar um cadastro único [cada órgão possui o seu] para que uma instituição não invada a área da outra, com a sobreposição de responsabilidades e interesses. A assimetria de poder, diante dos que se opõem a mudanças na estrutura fundiária, ainda é enorme. E hoje, com a modernização da agricultura, o latifundiário não é mais o coronel, é quem tem escritório na Paulista e atua em nome de um grupo que mistura terra com capital financeiro, gerando outro tipo de embate.”

Publicação Dissertação: “Passado não resolvido: a histórica falta de regulação na ocupação de terras no Brasil após 1964” Autor: Vitor Bukvar Fernandes Orientador: Bastiaan Philip Reydon Unidade: Instituto de Economia (IE)


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Campinas, 7 a 13 de abril de 2014

PAINEL DA SEMANA  Método lógico para redação científica - O Espaço da Escrita, projeto estratégico da Coordenadoria Geral da Universidade (CGU), organiza o curso “Método Lógico para Redação Científica”, no dia 7 de abril, das 8h30 às 17 horas, no auditório 05 da Faculdade de Ciências Médicas (FCM). O evento corresponde a um treinamento básico de 8 horas/aula para docentes, pesquisadores e alunos de pósgraduação da Unicamp. O curso será ministrado pelo professor Gilson Luiz Volpato (Unesp/Botucatu) e está organizado para interessados que queiram aprender ou aperfeiçoar a escrita de textos acadêmicos desde a perspectiva da ciência empírica. Site do evento: http://www.cgu.unicamp. br/espaco_da_escrita/workshop_escrita_metodo_logico_campinas.php  Nuvem computacional em ambiente acadêmico - Encontro que objetiva propiciar uma troca de experiências entre instituições de ensino superior que estejam conduzindo projetos de implantação de computação em nuvem será realizado no dia 7 de abril, às 8h45, no Centro de Convenções da Unicamp. Inscrições e outras informações no link http://www.ctic.unicamp.br/nuvem_computacional  Fórum discute violência contra a mulher - A Unicamp promove no dia 9 de abril, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp, o I Fórum sobre violência contra a mulher: Múltiplos Olhares, trazendo à tona um importante debate sobre as diversas formas de agressão a que as mulheres estão sujeitas na sociedade brasileira. Entre os temas discutidos estarão violência física, psicológica, sexual e obstétrica e ações de enfretamento ao problema. O Fórum é uma realização do Fórum Pensamento Estratégico (PENSES) e da Coordenadoria Geral da Universidade Estadual de Campinas, com o apoio da Faculdade de Enfermagem da Unicamp, do Fórum pela Humanização do Parto e Nascimento em Campinas e do SOS Ação Mulher e Família. Inscrições e outras informações no site www.gr.unicamp.br/penses/forum_mulheres.  Dez anos do Programa de Doutorado em Ambiente e Sociedade - O Núcleo de Estudos em Pesquisas Ambientais (Nepam) e o Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) comemoram, dias 9 e 10 de abril, os dez anos do Programa de Doutorado em Ambiente e Sociedade. No dia 9, às 14 horas, na Sala Nova York da Fundação de Desenvolvimento da Unicamp (Funcamp), acontece a mesa-redonda “Ambiente e Sociedade: a visão interdisciplinar das mudanças ambientais globais” com a participação de Reynaldo Victoria, coordenador do Programa Fapesp de Pesquisas em Mudanças Climáticas; Álvaro Penteado Crósta, coordenador Geral da Unicamp; Carlos Alberto Sampaio, vice-coordenador da Área de Ciências Ambientais da Capes; Fátima Évora, coordenadora de Pós-graduação do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, e Carlos Alfredo Joly, coordenador em Ambiente e Sociedade. Às 16 horas, o professor Steven Yearley (University of Edinburgh) profere a palestra “Formalisation and Separation: struggles to summarise Science for climate policy. No dia 10, às 9 horas, no auditório “Daniel Hogan” do Nepam, haverá uma mesa-redonda com egressos do doutorado em ambiente e sociedade e exposição de vídeos e fotos do Nepam. Interessados no evento podem preencher a ficha de participação no endereço eletrônico: https://docs.google.com/forms/d/1nrQzZ3YkwzG m9GJCcTt8lPgK1yslO7hBp8sSkkmXvz8/viewform  International Workshop Unicamp Heriot Watt University - A Vice-Reitoria Executiva de Relações Internacionais (Vreri) e a Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP) organizam, de 9 a 11 de abril, no auditório da Faculdade de Engenharia Química (FEQ), o International Workshop Unicamp Heriot-Watt University. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas no link http://www.prp.rei.unicamp.br/bioenergia/ index.php/en/. O evento será transmitido pela Internet. Mais detalhes: 19-3521-17145.

 Palestra com Heitor Gurgulino - A Vice-reitoria Executiva de Relações Internacionais (Vreri) organiza uma palestra magna sobre internacionalização com o professor Heitor Gurgulino, presidente da Academia Mundial de Arte e Ciência (WAAS). O evento ocorre no dia 9 de abril, às 9h30, no auditório da Faculdade de Engenharia Química (FEQ). A palestra será transmitida, ao vivo, pela RTV Unicamp. Mais detalhes: telefone 19-3521-7145 ou e-mail amanda.fernandes@reitoria.unicamp.br  Música no Campus em Piracicaba - Evento será realizado na Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP), dia 9 de abril, às 12 horas. Atrações: Açaí Jazz Band e o grupo Moringa de Sinhá. O Música no Campus é organizado pelo Gabinete do Reitor e pelo Centro de Integração, Documentação e Difusão Cultural (CIDDIC). Mais informações podem ser obtidas pelo telefone 19-3521-5231 ou e-mail maria. luiza@reitoria.unicamp.br  Ditadura e direitos humanos: os desafios da universidade - Fórum que discutirá o tema está marcado para ocorrer em 10 de abril, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp. O evento é organizado pelos professores Pedro Paulo Abreu Funari, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) e Rita Juliana Soares Poloni, do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam). Programação, inscrições e outras informações no site http://www.foruns. unicamp.br/foruns/projetocotuca/forum/htmls_descricoes_eventos/ educacaomagis01.html. Veja outros fóruns programados para este ano http://www.foruns.unicamp.br/foruns/programacao2014.jpg  JELT - A 2ª Jornada de Ensino de Língua e Tecnologia (JELT), organizada pelo Departamento de Linguística Aplicada do Centro de Ensino de Línguas (CEL) da Unicamp, será realizada no dia 11 de abril. Nesta edição, o evento, que é voltado para graduandos, pós-graduandos, docentes, pesquisadores e demais profissionais das áreas de linguística, linguística aplicada, educação, tecnologia e campos afins, terá como tema “Políticas e linguísticas, ensino de línguas e tecnologia em tempos de globalização e internacionalização”. Mais informações no site http://www.cel.unicamp.br/ ou telefone 19-3521-1967.  Neurociências na educação inclusiva - O I Encontro sobre Neurociências na Educação Inclusiva - 360 graus será realizado no dia 11 de abril, das 9 às 17 horas, no Salão Nobre da Faculdade de Ciências Médicas (FCM). Os primeiros 50 inscritos receberão o livro Tecla Sapiens - Neurociência para Todos, publicação organizada pelo professor Li Li Min, a ser autografada em uma sessão de lançamento durante o evento. As inscrições podem ser feitas no site http://gigsunicamp.wix.com/neuroedu#!get_involved/c8k2. Educadores, professores, profissionais da saúde e áreas afins, estudantes acadêmicos e de pós-graduação, aprimorandos e pesquisadores são o público-alvo. Mais informações podem ser obtidas pelo e-mail gigs.unicamp@gmail. com ou telefone 19- 3521-7292.  Unicamp entrega “Honoris Causa” e “Professor Emérito” - No dia 11 de abril, às 10 horas, na Sala do Conselho Universitário (Consu), a professora Maria Estela Bresciani, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), receberá o título de Professora Emérita da Unicamp. O mesmo título será entregue pela Universidade ao professor Antonio Carlos Boschiero, do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, dia 30 de abril, às 10 horas, no mesmo local. O título de Professor Emérito é conferido a professores que se distinguiram no exercício da atividade acadêmica nos seus relevantes serviços à ciência e à instituição. O título de “Doutor Honoris Causa” será recebido pelo professor Ettore Finazzi Agrò, do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Unicamp (Universidade de La Sapienza di Roma). A solenidade está marcada para o dia 14 de abril, às 15 horas, na Sala do Consu. A titulação, que é a distinção máxima prevista no estatuto da Unicamp, nasceu com o intuito de distinguir personalidades eminentes que, pelo vulto da obra realizada, enriquecem a vida cultural e social. É uma forma de homenagem por meio da qual se exprime gratidão a alguém e se procede ao reconhecimento público pelo seu valioso contributo no exercício de uma determinada profissão, no serviço prestado à comunidade ou na defesa de uma causa importante. Concedem-se doutoramentos honorários àquelas pessoas que tenham se destacado especialmente por trabalho humanitário ou científico.

EVENTOS FUTUROS  IV Seminário de Educação Matemática - Evento acontece de 14 a 16 de abril, no Centro de Convenções da Unicamp e na FE-Unicamp. Esta edição aborda o tema “Aprender Matemática e Conquistar Autonomia”. A organização é do Laboratório de Psicologia Genética (LPG/FE-Unicamp). Programação, inscrições e outras informações no site http://www.proepreemacao.com.br/?p=795  Auxílio a eventos - A Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP) está disponibilizando auxílio financeiro para a realização de eventos científicos, esportivos e artísticos que ocorram dentro dos campi da Universidade. As inscrições para o edital podem ser realizadas no período de 15 de abril a 15 de maio de 2014. O edital é direcionado para eventos a serem realizados até 30 de setembro de 2014. Consulte o edital http://www. prp.gr.unicamp.br/faepex/editais/2014/2014_Edital_Congressos.pdf  Inscrições para a ONHB - Professores de História e alunos do oitavo ano do ensino fundamental até o terceiro ano do ensino médio podem se inscrever para mais uma edição da Olimpíada Nacional

DESTAQUE ator Rodrigo Matheus, com sólida carreira circense, é o novo artista residente da Unicamp. Ele assinou o seu contrato pelo Programa do Artista Residente, no último dia 27, na presença do reitor José Tadeu Jorge. Rodrigo Matheus é formado em artes circenses pelo Circo Escola Picadeiro (São Paulo) e pelo Fool Time Circus Arts (Inglaterra). Ele permanecerá na Universidade até junho deste ano. O novo artista residente informou que o resultado final do projeto de trabalho será a montagem de um espetáculo. “Provavelmente será uma versão da história do Simbad, O Navegante, extraída da tradução direta do árabe ou então uma adaptação de Fantasio, escrito por Alfred de Musset. A ideia é criar um espetáculo com os candidatos aprovados pelo projeto. A apresentação pretende ser visual, mas usando muitas técnicas circenses e as suas possibilidades metafóricas”, adiantou o artista, que fundou e dirige há 25 anos a companhia Circo Mínimo. Para complementar o trabalho de montagem do espetáculo, Rodrigo Matheus ministrará aulas e oficinas de técnicas circenses aplicadas à cena teatral, exercícios, exibição de vídeos, debates, palestras e aulas teóricas relacionadas ao tema. Desde 2000, o artista dirige espetáculos pelo país, mesclando técnicas circenses em contextos teatrais. É também professor convidado do Circus Space, de Londres; Circus Oz, National Institute of Circus Arts (Nica) e Flying Fruit Flys, da Austrália; do Ballet da Cidade de São Paulo; e da Escola Livre de Teatro de Santo André.

em História do Brasil (ONHB). O prazo vai até 20 de abril. Leia mais: http://www.unicamp.br/unicamp/noticias/2014/03/07/abertas-inscricoes-para-6a-onhb  VII Encontro de Educação Musical da Unicamp - Evento terá como tema “Música na Escola: um mundo de possibilidades” e acontece no dia 22 de abril, às 8h40, no Instituto de Artes (IA) da Unicamp. No programa, workshops, oficinas, mesas redondas, comunicações orais e apresentações artísticas. Como convidados participam Enny Parejo, Marisol Ponte-green, Vasti Attique, Uirá Kuhlmann , entre outros. O evento prossegue até o dia 25 com organização da professora Adriana do Nascimento Araújo Mendes. Mais detalhes no link http://www.iar.unicamp.br/educacaomusical/  Palestra do SAE - O Setor de Orientação Educacional do Serviço de Apoio ao Estudante (SAE) organiza palestra no dia 24 de abril com a professora Paula Fernandes, da Faculdade de Educação Física (FEF) da Unicamp. Às 12h15, na sala CB02 do Ciclo Básico, ela fala sobre “A ansiedade está dentro de você - Saiba como funciona!”. Mais detalhes pelo telefone 19-3521-6539.

TESES DA SEMANA  Biologia - “Análise metaproteogenômica de comunidades bacterianas enriquecidas visando a bioprospecção de enzimas de interesse biotecnológico” (mestrado). Candidata: Fernanda Buchli. Orientador: professor Fabio Marcio Squina. Dia 2 de abril de 2014, às 9 horas, na sala de defesa de teses do 1o. andar do prédio da CPG do IB. “Atividade biológica do composto trans-[Ru(NO)Cl(cyclam)](PF6)2 na proliferação/migração de células endoteliais e na adesão plaquetária” (mestrado). Candidata: Amanda Alvim Negreti. Orientadora: professora Marta Helena Krieger. Dia 4 de abril de 2014, às 9 horas, na sala de defesa de teses da CPG do IB.  Computação - “Prática de ensino e planejamento didático: um modelo reflexivo para o crescimento profissional” (doutorado). Candidato: Alessandro Arpetti. Orientadora: professora Maria Cecília Calani Baranauskas. Dia 4 de abril de 2014, às 11 horas, na sala de videoconferência da FE. “Paralelização de laços na nuvem usando OpenMP e MapReduce” (mestrado). Candidato: Rodolfo Guilherme Wottrich. Orientador: professor Guido Costa Souza de Araújo. Dia 9 de abril de 2014, às 14 horas, no auditório do IC. “Computação quântica e teoria da computação” (mestrado). Candidato: Alex Bredariol Grilo. Orientador: professor Arnaldo Vieira Moura. Dia 11 de abril de 2014, às 14 horas, no auditório do IC.  Educação - “Cenários do ensino de matemática em escolas rurais da cidade de Tanabi, SP” (mestrado). Candidata: Luzia de Fatima Barbosa Fernandes. Orientadora: professora Maria Ângela Miorim. Dia 2 de abril de 2014, às 9h30, na FE.  Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo - “Aplicação de coagulante à base de pó de sementes de moringa oleifera confinado em sachês no tratamento de água” (doutorado). Candidata: Camila Clemente Arantes. Orientador: professor José Euclides Stipp Paterniani. Dia 31 de março de 2014, às 9 horas, na sala de defesa de teses da CPG da FEC. “Distribuição ótima de estações de monitoramento de qualidade em redes de distribuição de água” (de mestrado). Candidato: Roberto Suse. Orientador: professor Edevar Luvizotto Junior. Dia 31 de março de 2014, às 9 horas, na sala CA-22 da FEC. “Sistema combinado tratando efluente com características sanitárias: microfauna aeróbia e redução de toxidade” (mestrado). Candidato: Guilherme Augusto da Silva. Orientador: professor Edson Aparecido Abdul Nour. Dia 4 de abril de 2014, às 14 horas, na sala CA-22 da CPG da FEC. “Análise do comportamento de estacas escavadas instrumentadas com três diâmetros diferentes” (mestrado). Candidata: Nurian Bibiana Munevar Perez. Orientador: professor Paulo José Rocha de Albuquerque. Dia 11 de abril de 2014, às 9 horas, na sala CA-22 da CPG da FEC.  Engenharia Elétrica e de Computação - “Estudo e implementação de redes neurais e algoritmos genéticos para resolução da cinemática inversa de um manipulador robótico com 5 graus de liberdade” (mestrado). Candidato: Francisco Erivaldo Fernandes Junior. Orientador: professor Marconi Kolm Madrid. Dia 11 de abril de 2014, às 10 horas, na sala PE-11 da FEEC.  Engenharia de Alimentos - “Quebra de emulsões modelo visando a produção de biocombustíveis” (mestrado). Candidato: Guilherme de Figueiredo Furtado. Orientadora: professora Rosiane Lopes da Cunha. Dia 9 de abril de 2014, às 9 horas, no Departamento de Engenharia de Alimentos da FEA. “Purificação de Biodiesel B5 com bauxita termoativada” (mestrado). Candidato: Willian Richter. Orientador: professor Daniel Barrera-Arellano. Dia 11 de abril de 2014, às 14h30 no anfiteatro II da FEA.  Engenharia Mecânica - “Projeto e simulação numérica de uma turbina hidrocinética de eixo vertical” (mestrado). Candidato: Tiago Peres Batalha. Orientador: professor Kamal Abdel Radi Ismail. Dia 7 de abril de 2014, às 9 horas, na sala JD02 das FEM.  Engenharia Química - “Influência da secagem no teor de cumarina de folhas de guaco (Mikania Laevigata Schultz BIP. Ex Baker)” (mestrado). Candidato: Mateus Guimarães da Silva. Orientadora: pro-

fessora Maria Aparecida Silva. Dia 31 de março de 2014, às 14 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ. “Efeito da adição de monoésteres de sorbitana e de estearina da manteiga de cacau como modificação de chocolate” (doutorado). Candidata: Monise Helen Masuchi. Orientador: professor Theo Guenter Kieckbusch. Dia 11 de abril de 2014, às 9 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ.  Estudos da Linguagem - “Marcadores discursivos e sequências textuais: uma análise das ações de textualização em programas midiáticos” (mestrado). Candidata: Rafaela Defendi Mariano. Orientadora: professora Anna Christina Bentes da Silva. Dia 3 de abril de 2014, às 14 horas, na sala de defesa de teses do IEL. “Política e Latinitas: o Brutus de Cícero e os fins da eloquência romana” (mestrado). Candidata: Mariana Pini Fernandes. Orientador: professor Marcos Aurélio Pereira. Dia 10 de abril de 2014, às 10 horas, na sala de defesa de teses do IEL.  Geociências - “Análise tafonomica e paleoecológica das estruturas associadas a comunidades microbianas holocênicas e permianas” (mestrado). Candidata: Flávia Caleffo. Orientador: professor Frésia Soledad Ricardi Torres Branco. Dia 31 de março de 2014, às 14 horas, no auditório do IG. “Práticas da pesquisa colaborativa: contribuições na formação inicial de professores e no ensino de geografia” (mestrado). Candidata: Vanessa Lessio Diniz. Orientador: professor Mauricio Compiani. Dia 7 de abril de 2014, às 14 horas, na sala B do DGRN do IG. “Metatexitos e diatexitos do complexo Xingu na região de Canaã dos Carajás: implicações para a evolução mesoarqueana do domínio Carajás” (mestrado). Candidato: Marco Antonio Delinardo da Silva. Orientadora: professora Lena Virginia Soares Monteiro. Dia 11 de abril de 2014, às 14 horas, no auditório do IG.  Matemática, Estatística e Computação Científica “Números primos e criptografia” (mestrado profissional). Candidato: André Vinicius Spina. Orientador: professor Ricardo Miranda Martins. Dia 31 de março de 2014, às 10: horas, na sala 253 do Imecc. “Classificação das afinizações minimais irregulares de tipo D” (doutorado). Candidata: Fernanda de Andrade Pereira. Orientador: professor Adriano Adrega de Moura. Dia 7 de abril de 2014, às 10 horas, na sala 253 do Imecc. “Assimilação contínua de dados para o modelo Navier-Stokes-Alpha” (doutorado). Candidata: Débora Aparecida Francisco Albanez. Orientador: professor Milton da Costa Lopes Filho. Dia 10 de abril de 2014, às 14 horas, na sala 253 do Imecc.  Odontologia - “Avaliação da influência do grau de rotação do aparelho e do grau de rotação do crânio na espessura da cortical óssea em imagens de tomografia computadorizada de feixe cônico” (doutorado). Candidata: Monikelly do Carmos Nascimento Marchini. Orientadora: professora Solange Maria de Almeida Boscolo. Dia 31 de março de 2014, às 14 horas, na sala de seminários da Radiologia da FOP. “Força máxima da língua em pacientes com bruxismo” (mestrado). Candidata: Lis Meirelles. Orientadora: professora Renata Cunha Matheus Rodrigues Garcia. Dia 4 de abril de 2014, às 9 horas, no anfiteatro 4 da FOP. “Avaliação da percepção dos profissionais inseridos na estratégia saúde da família, em relação à intersetorialidade no município de Piracicaba” (mestrado profissional). Candidata: Darlene Glória de Ávila Ferreira. Orientadora: professora Dagmar de Paula Queluz. Dia 4 de abril de 2014, às 14 horas, na sala de seminários II da Odonto Social da FOP. “Análise fotoelástica da distribuição de tensões em implantes dentais sob carga axial e não axial comparando-se implantes cônicos e cilindricos e a topografia das roscas” (mestrado). Candidato: Milton Cristian Rodrigues Cougo. Orientadora: professora Luciana Asprino. Dia 4 de abril de 2014, às 14 horas, na sala da Congregação da FOP. “Validação de método subjetivo para avaliação da qualidade da função mastigatória de adolescentes brasileiros” (mestrado). Candidata: Maribel Hilasaca Mamani. Orientadora: professora Paula Midori Castelo Ferua. Dia 11 de abril de 2014, às 13h30, na sala da Congregação da FOP. “Efeito do estresse crônico variado em músculo masseter submetido à hipofunção mastigatória” (doutorado). Candidata: Yamba Carla Lara Pereira. Orientador: professor Pedro Duarte Novaes. Dia 11 de abril de 2014, às 14 horas, na sala de seminários do departamento de Histologia da FOP.  Química - “Nanocompósitos de elastômeros termoplásticos com nanopartículas de prata e de sílica: síntese e modificação superficial das nanopartículas” (doutorado). Candidato: Marcelo Alexandre de Farias. Orientadora: professora Maria do Carmo Gonçalves. Dia 10 de abril de 2014, às 13h30, no miniauditório do IQ. “Validação de método subjetivo para avaliação da qualidade da função mastigatória de adolescentes brasileiros” (mestrado). Candidata: Maribel Hilasaca Mamani. Orientadora: professora Paula Midori Castelo Ferua. Dia 11 de abril de 2014, às 13h30, na sala da Congregação da FOP. “Efeito do estresse crônico variado em músculo masseter submetido à hipofunção mastigatória” (doutorado). Candidata: Yamba Carla Lara Pereira. Orientador: professor Pedro Duarte Novaes. Dia 11 de abril de 2014, às 14 horas, na sala de seminários do departamento de Histologia da FOP. “Petróleo: micro-organismos, fração polar, petroleômica e razão isotópica” (doutorado). Candidato: Célio Fernando Figueiredo Angolini. Orientadora: professora Anita Jocelyne Marsaioli. Dia 11 de abril de 2014, às 9 horas, no miniauditório do IQ.

DO PORTAL

Rodrigo Matheus é o novo

artista residente da Unicamp “Eu já estou trabalhando há duas semanas na Universidade e o material humano é bárbaro. A infraestrutura é muito boa também. A expectativa, portanto, é a melhor possível”, afirmou Rodrigo Matheus durante a solenidade realizada no gabinete da reitoria. O reitor José Tadeu Jorge deu as boasvindas ao artista e ressaltou que o “ambiente fecundo da Universidade certamente estimulará a criatividade do projeto”. “É uma grande satisfação recebê-lo aqui. As experiências que o Programa do Artista Residente da Unicamp têm nos proporcionado vai sempre muito além do planejamento e das expectativas iniciais. Tenho certeza que não será diferente com você”, falou. O projeto para o Programa do Artista Residente da Unicamp deste ano é uma iniciativa interdisciplinar, proposta pelos docentes Mario Alberto Santana, do Instituto de Artes (IA), e Marco Antonio Coelho Bortoleto, da Faculdade de Educação Física (FEF). Além dos dois professores, a cerimônia de assinatura do contrato de trabalho

Foto: Antoninho Perri

O ator Rodrigo Matheus (esq.) e o reitor José Tadeu Jorge assinam o contrato: projeto prevê montagem de espetáculo

também contou com a presença de Osvaldir Pereira Taranto, coordenador da Comissão do Programa; Paulo Ferreira de Araújo, diretor da FEF; Esdras Rodrigues Silva, diretor

do IA; Odilon José Roble, coordenador de Extensão da FEF e José Guilherme Pereira Bergamasco, docente do IA que irá participar do projeto. (Silvio Anunciação)


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Campinas, 7 a 13 de abril de 2014 MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br

professora Inés Joekes, falecida em outubro de 2013, era conhecida, entre outros aspectos, pelo seu inabalável compromisso com o ensino e a pesquisa. Vinculada ao Departamento de Físico-Química do Instituto de Química (IQ) da Unicamp, ela deixou um importante legado com suas investigações, principalmente em temas como cabelo, crisotila, heterocoagulação, química do cimento, catalisadores suportados e biocatalisadores suportados. Entretanto, a docente tinha outros interesses fora do campo da química, alguns deles desconhecidos até por quem convivia com ela. A cientista tinha o hábito, por exemplo, de colecionar conchas marinhas. O acervo reunido por ela ao longo de diversos anos é tão representativo em termos de quantidade e qualidade, que está sendo entregue pela família de Inés Joekes aos cuidados do professor Flávio Dias Passos, do Departamento de Biologia Animal do Instituto de Biologia (IB), que utilizará parte dele em suas aulas na graduação. Passos tomou conhecimento da coleção de conchas por meio de um amigo em comum com Inés Joekes. No começo, admite o malacólogo (especialista em moluscos), ele imaginou que fosse mais um ajuntamento de peças sem grande valor, como muitos que já lhe foram apresentados. “De toda forma, resolvi olhar o acervo em respeito à história da professora Inés. E o que vi me impressionou bastante. Além de ser uma coleção grande, ela é composta por algumas peças muito interessantes e bonitas. Outro aspecto que me chamou a atenção foi a forma como a professora Inés cuidava das peças. Ela mandou construir um armário com gavetas em seu apartamento no Cambuí para poder acomodar melhor as conchas. Nem aqui na Unicamp tenho uma estrutura igual”, revela. Mesmo sendo leiga em biologia animal, continua o professor Passos, Inés Joekes fez um excelente trabalho de organização dos exemplares. Eles foram separados por espécies e etiquetados, com os respectivos nomes científicos. “Ela certamente recorria a catálogos para poder identificar cada espécie”, infere. A dedicação da ex-professora do IQ à coleção, entende o malacólogo, é reveladora da personalidade dela. “Nas conversas que tive com pessoas que conheciam a professora Inés, todos me disseram que ela era uma docente à moda antiga, na melhor concepção do termo. Ela tinha uma visão multidisciplinar da ciência. Justamente por isso, costumava estimulava seus alunos a se dedicarem a outras áreas além da química, como biologia, filosofia e artes”. Um dos sonhos de Inés Joekes, conforme Passos, era um dia poder expor a sua coleção de conchas. “Felizmente, eu terei como concretizar o sonho dela. Minha ideia é inicialmente separar e selecionar as peças, o que representará um trabalho hercúleo. Depois, vou utilizar parte da coleção como material didático em minhas aulas na graduação, o que certamente a professora Inés aprovaria, visto que ela adorava ensinar. Esse tipo de recurso é muito importante, porque as aulas teóricas costumam ser um pouco maçantes para os alunos. Entretanto, quando têm a oportunidade de manipular uma concha, eles fixam com maior clareza tudo o que foi dito anteriormente, como as características de cada espécie de molusco”, explica. As peças que não forem usadas como material didático terão outros dois destinos, segundo Passos. Algumas deverão compor a mostra do Museu de Zoologia do IB, enquanto outras serão oferecidas a malacólogos de outras instituições de ensino do país. “Como muitas delas são repetidas, é justo que possamos compartilhá-las com quem ainda não as têm”, justifica o docente do IB. De acordo com ele, a coleção reunida por Inés Joekes é composta, em sua maioria, por espécies brasileiras, coletadas em diversos pontos do país. “Há também exemplares de outros países, mas eles são em minoria. Ao todo, imagino que ela tenha colecionado um bom número de espécies nacionais”. Um aspecto importante relacionado à coleção da professora Inés Joekes, observa Passos, é que ela não comprava conchas para não estimular esse tipo de comércio. O malacólogo ressalta que a compra ou mesmo a coleta aleatória e indiscriminada de conchas não deve ser estimulada, porque essa atitude contribui para a degradação da natureza. Quando um molusco morre, prossegue o especialista, a sua concha continua fazendo parte do ambiente. Conforme se decompõe ao longo do tempo, o carbonato de cálcio pas-

O tesouro didático

de Inés Joekes

Falecida em 2013, professora do IQ deixa coleção de conchas marinhas que será usada em sala de aula por docente do IB Fotos: Antoninho Perri

O professor Flávio Dias Passos, a quem o acervo foi entregue, e o armário onde Inés Joekes guardava a coleção em seu apartamento no Cambuí: “Vou utilizar parte da coleção como material didático em minhas aulas na graduação, o que certamente a professora Inés aprovaria, visto que ela adorava ensinar”

Alguns dos exemplares coletados ao longo dos anos pela docente do IQ (destaque): ela não comprava peças para não estimular esse tipo de comércio

sa a ser disponibilizado e utilizado por outros animais, podendo, por exemplo, se constituir em novas conchas. Passos costuma juntar as conchas que não utiliza ou que estão danificadas para devolvê-las ao mar na primeira oportunidade. “Faço isso mesmo com um pequeno número de exemplares”, garante.

MOLUSCOS BRASILEIROS

De acordo com o professor Passos, o Brasil conta com cerca de 2 mil espécies de moluscos, o que faz da coleção nacional uma das mais ricas do mundo. O estudo desses animais é importante por variados motivos, como esclarece do docente do IB. “Esses animais fazem parte de uma cadeia alimentar relevante. Eles são predadores ou presas de outras espécies. Contribuem, portanto, para a manutenção do equilíbrio do bioma em que vivem. Além disso, alguns deles funcionam como eficientes in-

dicadores ambientais. Ou seja, a presença ou a ausência deles indica que o ambiente está ou não bem conservado. Por último, também têm uma elevada importância comercial. Como sabemos, moluscos comestíveis como ostras, mexilhões, escargots e vieiras encontram alto valor no mercado”, detalha. Justamente por causa dessa imensa variedade, entende o professor Passos, é que a malacologia constitui um amplo campo para o desenvolvimento de pesquisas. “Vale lembrar que, ao falarmos de moluscos, não estamos nos referindo somente ao ambiente marinho. Esses animais ocorrem também em rios e no ambiente terrestre. No Brasil, ainda há muitas espécies desconhecidas. À medida que compreendermos mais sobre a biologia desses animais, mais entendemos a respeito do nosso ambiente”, pormenoriza o malacólogo.

INÉS JOEKES Inés Joekes era natural de Buenos Aires, Argentina. Era bacharel em FísicoQuímica pela Universidad Nacional de Córdoba (1976), tinha mestrado em Química (Físico-Química) pela Universidade de São Paulo (1980) e doutorado em Química pela Unicamp (1983). Desenvolvia suas atividades de ensino e pesquisa no Departamento de Físico-Química do Instituto de Química (IQ) da Unicamp. Por dois mandatos, foi diretora do Serviço de Apoio ao Estudante (SAE) da Universidade. Também foi chefe do seu Departamento e representante docente no Conselho Universitário (Consu) em várias ocasiões. Atuava como professora titular MS-6. Quando da sua morte, estava orientando três alunos de mestrado, quatro de doutorado e dois de iniciação científica.


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Campinas, 7 a 13 de abril de 2014

Nas trilhas de UM GÊNIO PATRÍCIA LAURETTI patricia.lauretti@reitoria.unicamp.br

inícius de Moraes, um de seus parceiros, lhe pediu a bênção no samba famoso que só homenageia os grandes: “A bênção, maestro Moacir Santos/ Não és um só, és tantos, como o meu Brasil de todos os santos”. Mas, embora tantos, e respeitado, o “Ouro Negro”, como era chamado, Moacir Santos demorou a ocupar o lugar que era apenas seu, no panteão dos mestres da música brasileira. Em 1967, quando deixou o trabalho de tantos anos na Rádio Nacional do Rio de Janeiro, foi para a Califórnia. Permaneceu e lá morreu, em 2006, uma centelha menos ignorado no Brasil, graças à iniciativa dos músicos Mário Adnet e Zé Nogueira, que transcreverem seus arranjos originais cinco anos antes, e lançaram o álbum duplo Ouro Negro, com as participações de Milton Nascimento, João Donato, Gilberto Gil, Djavan, Ed Motta e do próprio Santos. Deu-se então um processo de redescoberta da obra de Moacir Santos, e se ainda hoje o maestro permanece desconhecido do grande público, pelo menos no circuito artístico e musical existem grupos e festivais em sua homenagem. Seus arranjos e composições são cultuados. “Foi o responsável pela renovação da linguagem da harmonia no país”, lemos nas páginas especializadas. O professor de Paulo Moura, Oscar Castro-Neves, Baden Powell, Maurício Einhorn, Sérgio Mendes, João Donato, Roberto Menescal, Dori Caymmi e Airto Moreira, entre outros, subiu aos céus pelas mãos dos artistas. Saravá! Foi antes de lançar Coisas, seu primeiro álbum solo, que Moacir Santos ingressou no universo audiovisual, repetindo a história de uma geração de compositores anterior à sua, e que, do rádio, fez suas incursões no cinema e na TV. Radamés Gnatalli e Guerra-Peixe haviam trabalhado nas companhias cinematográficas Atlântida e Vera Cruz. Santos encontrou um cinema diferente dos seus antecessores, mais independente e com menos recursos. Ainda assim manteve sua marca de sofisticação, equilibrando o erudito com o popular na medida certa. As trilhas musicais feitas por ele para cinco filmes, realizados no período entre 1963 e 1966, formam o recorte da dissertação de mestrado “A trilha musical como gênese do processo criativo na obra de Moacir Santos”. Seu autor, Lucas Zangirolami Bonetti, procurou aprofundarse neste período da carreira do maestro, que era apenas citado em suas biografias. “Sua música autoral tem muitos traços destas trilhas, importantíssimas para a consolidação do trabalho de Santos como compositor, inclusive”, assinalou Lucas. O pesquisador afirma que, juntamente com o álbum de 1965, as trilhas foram os primeiros trabalhos autorais lançados pelo compositor.

“Moacir vai trabalhar com o cinema autoral, mas ainda tem essa tradição arraigada dos compositores que o precederam. Suas trilhas refletem um pouco isso. Às vezes, conseguimos ver um número maior de sopros e de escrita coral, que não eram tão comuns nessa década”, complementa o autor da dissertação. Mais sofisticação, apesar de menos dinheiro. Santos escreve partituras para formações de cinco ou até 15 músicos ou mais. Isso se deve, de acordo com o mestrando, ao fato de as produções às quais o maestro foi convidado investirem maiores quantias. É o caso do filme Seara Vermelha (1964), de Alberto d’Aversa, grande produção audiovisual brasileira, com uma verba alta para os padrões da época. Segundo a pesquisa, o filme custou mais de 60 milhões de cruzeiros, e foi considerado um dos mais caros realizados até aquele momento. “Isso acabou refletindo na trilha musical, que apresenta vigoroso uso orquestral com composições feitas especialmente para a produção”, ressalta Lucas. Outros filmes que compõem o trabalho científico e que tiveram um bom investimento na parte musical, apresentando formações instrumentais grandes e/ ou médias ou orquestrais, foram: O Beijo (1964), de Flávio Tambellini; e Ganga Zumba (1964), de Carlos Diegues. Além destes, Lucas pesquisou O Santo Módico (1964), de Sacha Gordine e Robert Mazoyer; A Grande Cidade (1966), de Carlos Diegues; e Os Fuzis (1964), de Ruy Guerra.

Cenas de “Ganga Zumba” (alto) e “Seara Vermelha”, filmes com trilhas compostas por Moacir Santos: fundindo o simples e o complexo

Fotos: Reprodução

O maestro, arranjador e compositor Moacir Santos: produção cultuada entre os pares

“O foco da primeira parte do trabalho foi a análise individual de todas as trilhas, que foram transcritas em partituras. Também foram recortados trechos de filmes com o objetivo de avaliar cena a cena a articulação dramático-narrativa da música”. No segundo momento da dissertação, Lucas verificou nas trilhas o que resultou em composições posteriores e aparecem em discos autorais de Moacir Santos. Tanto no álbum Coisas, como nos outros trabalhos, o pesquisador encontrou às vezes melodias inteiras, ideias de instrumentação, frases, ideias melódicas ou até composições prontas que estavam nos filmes. Em A Grande Cidade, de Carlos Diegues, Santos não atua como compositor, mas como diretor musical e tem a responsabilidade de escolher o material musical. Utiliza então Ernesto Nazareth, Villa-Lobos, e uma compilação de outros artistas. No exercício desta outra função, Santos faz uso da música de maneira rebuscada e semelhante às suas composições, como avalia Lucas. “E isso se deu pela refinada escolha de materiais que dialogam com a ação fílmica, e que dão unidade à obra”, acrescenta. O pesquisador ressalta mais uma qualidade do maestro: Santos realizava uma pesquisa aprofundada sobre a temática do filme, o que fazia parecer que cada produção havia sido realizada por um composiFoto: Antoninho Perri

AUDIOVISUAL O cinema brasileiro na década de 1960 experimentava as primeiras tentativas de gravação com equipamentos novos e gravadores portáteis. “Nesse período, ainda foi muito comum o uso de gravações préexistentes, tanto de música erudita como de música popular contemporânea. Havia menos verba para contratar um compositor, um grupo, uma orquestra”, afirma Lucas. Porém, as trilhas de Santos ainda refletem o período mais abastado, que se aproxima das formações orquestrais. Na década anterior, os maestros tinham mais autonomia para escrever as músicas nas companhias cinematográficas. “Havia uma tradição sinfônica, romântica, do século 19, com aquela música orquestral que dialogava um pouco mais com o cinema hollywoodiano”. Mesmo tendo formação tradicional, ressalva o pesquisador, Moacir Santos conseguia fundir a escrita formal com a música popular, especialmente de temática afro-brasileira, folclórica, ou processos composicionais que remetem a gêneros nordestinos.

tor diferente. “Em Seara Vermelha, que trata de retirantes nordestinos, é uma música mais sinfônica, mas que trabalha com todos esses processos e conceitos da música modal. Em Ganga Zumba, em que a temática é a fuga de escravos de uma fazenda para Palmares, o trabalho é feito com instrumentos típicos como atabaques, executando diversas rítmicas que dialogam com o candomblé”. Em Os Fuzis, que trata da seca e da fome no Nordeste, Santos suprime partes da música e utiliza o silêncio para obter o significado narrativo/dramático que ele pretendia. O tema principal, Bluishmen, surge na segunda faixa do álbum The Maestro, o primeiro lançado nos Estados Unidos, em 1972, pelo selo Blue Note. “Na trilha do filme, a música é tocada por um instrumento solo quase que sem tempo, uma melodia bastante lírica. No álbum de 1972 se transforma em uma composição que reúne quase uma big band”, salienta Lucas.

ESPECIAL A música de Moacir Santos equilibra a simplicidade e o requinte composicional, complementa Lucas. “Apesar de não ser um acadêmico, o maestro era um pesquisador informal que dedicou sua vida ao estudo da música”. A carreira do compositor reflete o investimento. Saiu do interior de Pernambuco, alcançando uma posição de destaque na Rádio Nacional do Rio de Janeiro, uma das mais notórias do país. Do rádio para a TV Record e, depois, a carreira internacional. O pesquisador enfatiza a forte expressão jazzística na obra do compositor, que se revela na improvisação e instrumentação, especialmente de sopros (metais como saxofone, trompete, trombone, flauta e clarinete). Todo o trabalho que também aparece nas trilhas para o cinema. “Uma das ideias para desenvolver essa pesquisa foi exatamente retomar o trabalho do Moacir como compositor de audiovisual, já que as publicações que falavam sobre ele ainda não traziam nenhum aprofundamento sobre este período. O trabalho recupera esses filmes para o universo da pesquisa e disponibiliza as partituras que não existiam. É uma ideia que pode ramificar em diversas outras pesquisas. Esperamos que isso aconteça”.

Publicação Dissertação: “A trilha musical como gênese do processo criativo na obra de Moacir Santos” Autor: Lucas Zangirolami Bonetti Orientador: Claudiney Rodrigues Carrasco Unidade: Instituto de Artes (IA) Lucas Zangirolami Bonetti, autor do estudo: trilhas transcritas em partituras


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