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Campinas, 29 de setembro a 5 de outubro de 2014 - ANO XXVIII - Nº 608 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
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CORREIOS
FECHAMENTO AUTORIZADO PODE SER ABERTO PELA ECT
Foto: National Anthropological Archives, Washington-DC
‘Aventureiras’(e pioneiras) da
ciência
Tese da historiadora Mariana Moraes de Oliveira Sombrio revela detalhes da participação pioneira de mulheres em expedições científicas no Brasil, entre as décadas de 1930 e 1950. A autora do estudo levantou as fichas de 38 cientistas, estrangeiras em sua maioria, que conduziam suas pesquisas muitas vezes em ambientes inexplorados e marcados predominantemente pela presença masculina. Desenvolvida no Instituto de Geociências, a pesquisa foi orientada pela professora Maria Margaret Lopes.
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A arqueóloga norte-americana Betty Meggers com o marido, Clifford Evans, em expedição à região do Baixo Amazonas, entre 1948 e 1949
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Desigualdade agrava problemas urbanos A membrana que inativa bactérias
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Zoneamento preserva cobertura florestal no AC Ivan Lins, do sucesso à guinada na carreira
Água surgiu antes que o sistema solar Por que conversamos ao redor da fogueira Cientistas precisam ser menos ‘frios’, diz pesquisa
TELESCÓPIO
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Campinas, 29 de setembro a 5 de outubro de 2014
TELESCÓPIO
CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br
Água antes do sistema solar A água que veio a encher os oceanos da Terra já existia na matéria primordial que vagava pelo espaço e que deu origem ao sistema solar, e é mais antiga que os planetas ou que o próprio Sol, diz artigo publicado na revista Science. Os autores, ligados a instituições dos Estados Unidos e Inglaterra, usaram a taxa de deutério – um isótopo mais pesado do hidrogênio – na água encontrada no sistema solar para distinguir entre duas hipóteses: se o gelo de onde essa água veio já existia originalmente no meio interestelar, a partir do qual o Sol e os planetas se formaram, ou se foi produzido como parte do processo de criação do sistema. O modelo gerado mostrou que os processos que teriam ocorrido durante a formação do Sol e dos planetas não são capazes de explicar a relação deutério/ hidrogênio na água que hoje é detectada, sob forma líquida ou congelada, na Terra e em outros corpos do sistema, o que sugere que a substância já existia antes do início do processo. “A descoberta implica que, se a formação do sistema solar foi típica, há gelo interestelar em abundância para todos os sistemas planetários nascentes”, escrevem os autores.
Água fora do sistema solar Pesquisadores dos Estados Unidos, Chile, Suíça e Reino Unido anunciam, na revista Nature, a detecção de água na atmosfera de um planeta localizado a mais 100 anosluz da Terra, na constelação do Cisne. Esse planeta é semelhante a Netuno. De acordo com nota distribuída pelo periódico, tratase do menor exoplaneta onde já houve descoberta de água, até agora.
Chamado HAT-P-11b, o planeta tem cerca de 4 vezes o tamanho da Terra, e 25 vezes a massa terrestre. Os autores realizaram observações com o Telescópio Espacial Hubble, com o Telescópio Espacial Spitzer, que faz imagens em infravermelho, e com o Observatório Espacial Kepler, que faz buscas por planetas localizados fora do sistema solar. De acordo com texto de opinião assinado pela astrônoma Eliza Kempton, que acompanha o artigo sobre a descoberta, as observações que levaram à detecção da água em HAT-P-11b “permitem que os pesquisadores de exoplanetas respirem aliviados”, já que indicam que pequenos planetas não têm cobertura densa de nuvens, o que dificultaria as observações a serem feitas pelo Telescópio Espacial James Webb, que deve suceder o Hubble.
Moléculas no espaço Moléculas orgânicas de cadeia ramificada foram descobertas no espaço, próximo ao centro da Via Láctea, informa artigo publicado na revista Science. Embora outros tipos de material orgânico já tivessem sido detectados flutuando no cosmo, a descoberta de moléculas ramificadas é importante porque estruturas fundamentais para a vida, como os aminoácidos, são desse tipo. Há tempos que cientistas sabem que meteoritos podem trazer aminoácidos do espaço para a Terra, ou levá-los à superfície de outros planetas. Mas as moléculas detectadas no espaço, em regiões de formação de estrelas, até agora vinham se resumindo a estruturas de cadeia simples – fileiras mais ou menos retas de átomos de carbono. A descoberta de uma molécula ramificada fortalece a hipótese de que os aminoácidos encontrados em meteoritos possam ter se originado no espaço.
Imagem: NASA/JPL-Caltech/R. Hurt (SSC-Caltech)/ESO/J. Emerson/ VISTA/Cambridge Astronomical Survey Unit
Os planetas se formaram na presença abundante de água herdada da nuvem molecular original, diz artigo na Science
Conversa ao redor da fogueira O domínio do fogo abriu espaço para novos tipos de interação social, permitindo que os membros de comunidades pré-históricas contassem histórias e conversassem sobre assuntos não relacionados às necessidades imediatas do grupo, sugere estudo feito por uma antropóloga americana entre bosquímanos do Kalahari, na África, e publicado no periódico PNAS. “Muita atenção tem sido dada ao controle do fogo na evolução humana e ao impacto do cozimento de alimentos na anatomia e nos arranjos sociais e residenciais. No entanto, pouco se sabe sobre o que aconteceu quando a luz do fogo ampliou a duração do dia, criando tempo para atividades sociais que não entravam em conflito com o tempo produtivo para as atividades de subsistência”, escreve a autora, Polly Wiessner, da Universidade de Utah. Em seu trabalho, Wiessner comparou 174 conversas diurnas e noturnas entre os bosquímanos, uma população de caçadores-coletores do sul da África. “Conversas diurnas concentram-se em assuntos econômicos e fofocas”, escreve a autora. “As atividades noturnas afastam-se das tensões do cotidiano e envolvem música, dança, cerimônias religiosas e histórias fascinantes”, de uma forma que é importante para a preservação das instituições e da cultura. Além de analisar os hábitos dos bosquímanos, o artigo traz uma provocação para as sociedades industrializadas: “Fica aberta a questão de o que acontece quando o tempo economicamente improdutivo, à luz da fogueira, se transforma em tempo produtivo, sob luz artificial”.
EUA e Índia em órbita de Marte O satélite Maven, da Nasa, entrou em órbita de Marte na última semana, após uma viagem de dez meses. Depois de um período de adaptação e de testes previsto para durar seis semanas, a sonda deverá iniciar o mais completo estudo da alta atmosfera marciana já realizado. A missão primária da Maven inclui cinco “mergulhos” na atmosfera, nos quais o ponto da órbita do satélite mais próximo da superfície será rebaixado em 25 quilômetros, para permitir um estudo detalhado das camadas atmosféricas marcianas. Também na semana passada, a sonda indiana Mars Observer entrou, com sucesso, na órbita do planeta vermelho. O satélite da Índia tem como principais objetivos testar e demonstrar a capacidade tecnológica do país para levar a cabo uma missão dessa envergadura, mas também realizará levantamentos científicos da superfície marciana.
Mais simpatia na ciência
vistos como uma categoria “competente”, mas de “pouco calor humano”. O estudo, publicado no periódico PNAS, pediu que voluntários classificassem 42 profissões tidas como as mais comuns nos Estados Unidos em duas dimensões: de competência e de calor humano. Com alta classificação nos dois critérios ficaram médicos, enfermeiros e professores; com baixa avaliação ficaram categorias como prostitutas e lixeiros. Cientistas, advogados e engenheiros ficaram num grupo à parte, considerado altamente competente, mas também de grande frieza. “As pessoas envolvidas na divulgação da ciência precisam saber dessa reação”, disse a principal autora do trabalho, Susan Fiske, em nota distribuída pela universidade. “Desse ponto de vista, cientistas não são encarados como muito acolhedores. Suas intenções não são sempre tidas como confiáveis e eles podem, até, ser alvo de ressentimento”. Ainda de acordo com ela, “as pessoas não são estúpidas, e o problema do público com a ciência não é, necessariamente, de ignorância (...) a comunicação científica precisa passar calor humano e confiabilidade, além de competência e expertise”.
Poeira de estrelas A confirmação da existência de ondas gravitacionais deixadas pelo Big Bang, anunciada em março deste ano e saudada como a maior descoberta científica do século 21, pode não ter passado de um engano causado por poeira espacial. Essa explicação frustrante para o efeito detectado pelo observatório Bicep2, baseado no Polo Sul, ganhou força na última semana, quando dados do telescópio espacial Planck, da Agência Espacial Europeia, mostraram que os fenômenos interpretados como sinal das ondas poderiam ter sido causados por partículas flutuando no espaço. Um cosmologista do University College London disse ao jornal britânico The Guardian que, com os novos resultados, “os ventos sopram contra Bicep. O resultado deles não está totalmente morto, mas pode-se dizer que a análise original que fizeram se mostrou insuficiente” para sustentar a alegação sobre ondas gravitacionais. Os resultados originais do Bicep2 já vinham sendo alvo de críticas há algum tempo. Se confirmados, eles seriam evidência em favor da hipótese da inflação cósmica – a ideia de que o universo passou por uma fase acelerada de expansão em seus primórdios.
EUA oferecem US$ 20 milhões para caça a bactérias O governo dos Estados Unidos anunciou, em meados de setembro, uma série de iniciativas para combater a disseminação de bactérias resistentes a antibióticos. As ações têm uma dimensão regulatória, como maior controle sobre o uso de antibióticos; administrativa, com a criação de uma força-tarefa especial no âmbito federal e o estabelecimento de metas a serem cumpridas até 2020; e incluem ainda a criação de um prêmio de US$ 20 milhões para incentivar a produção de testes capazes de diagnosticar rapidamente infecções por bactérias resistentes, já no local onde o paciente está sendo tratado.
Levantamento feito por pesquisadores da Universidade Princeton mostrou que, para o público americano, os cientistas são
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Campinas, 29 de setembro a 5 de outubro de 2014 Fotos: Antonio Scarpinetti
À espera do direito à cidade
Segundo o estudo, avanços recentes como a redução do desemprego e o aumento da renda de parte da população não foram suficientes para alterar a realidade urbana brasileira
Estudo aponta que políticas de desenvolvimento urbano não alteraram o contexto dos municípios brasileiros MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br
s avanços proporcionados pelas políticas públicas voltadas ao desenvolvimento urbano no Brasil, executadas no período de 1988 a 2013, não foram suficientes para alterar de forma significativa o contexto das cidades brasileiras. A conclusão faz parte da dissertação de mestrado do economista Raphael Brito Faustino, defendida no Instituto de Economia (IE) da Unicamp, sob a orientação do professor Marcelo Weishaupt Proni. De acordo com o autor, os programas levados a cabo nos 25 anos considerados no estudo refletem em boa medida a forma como o capitalismo foi estruturado no país. “As desigualdades que verificamos no campo social também foram reproduzidas em relação às cidades”, afirma o pesquisador. Raphael Faustino explica que o período tomado para análise concentrou alguns marcos importantes em relação às políticas brasileiras de desenvolvimento urbano. O primeiro deles foi a promulgação da Constituição de 1988. Pela primeira vez, a Carta contemplou artigos que trataram expressamente da política urbana, além das políticas setoriais. “A questão do saneamento e da mobilidade aparecem em vários capítulos e artigos, algo que não havia ocorrido anteriormente. Além disso, a Constituição também classificou de forma inédita o tema da habitação como um direito social, o que conferiu uma nova dimensão aos programas para o setor”, elenca o economista. Outra medida relevante adotada no período foi a aprovação, em 2001, do Estatuto da Cidade, um conjunto de normas voltadas à regulação do “uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental”, como está definido em seu parágrafo único. O terceiro marco destacado pelo autor da dissertação foi a criação, em 2003, do Ministério das Cidades. “No conjunto, esses três acontecimentos proporcionaram avanços quanto à aprovação de marcos regulatórios, estruturação institucional e até mesmo ampliação de recursos para a execução de programas. Ocorre, porém, que essas iniciativas não foram suficientes para mudar o padrão de desenvolvimento urbano de nossas cidades”, reforça. De acordo com Raphael Faustino, o Estatuto da Cidade foi sancionado com o objetivo de regulamentar os artigos constitucionais. A sua análise pelo Congresso refletiu os embates de forças presentes no Legislativo. A matéria foi aprovada rapidamente pelo Senado, mas tramitou por mais de uma década na Câmara dos Deputados. “Ao mesmo tempo em que existiam segmentos progressistas que defendiam que o Estatuto deveria garantir a ampliação de direitos à sociedade, outra frente, comprometida com o capital imobiliário, trabalhava em sentido contrário. A versão final da legislação espelha esse embate. Embora tenha sido o avanço regulatório mais importante após a Constituição, o Estatuto também apresentou algumas limitações”, analisa. O economista cita o fato de a legislação ter sido criada para orientar as políticas locais. Desse modo, o Estatuto definiu instrumentos importantes como as operações urbanas e o IPTU progressivo, entre outros mecanismos que seriam regulamentados no plano municipal. “Ocorre que a implementação das medidas ficou muito dependente das forças políticas e sociais de cada cidade. Assim, mesmo tendo sido considerado uma lei de excelência, o Estatuto não foi aplicado da mesma forma nos diferentes municípios. Isso criou, obviamente, uma grande assimetria entre as cidades brasileiras”, diz.
Não por outra razão, prossegue Raphael Faustino, decorridos 13 anos da sua criação o Estatuto ainda é questionado quanto à sua eficácia. “Alguns dos profissionais que discutem as políticas urbanas consideram que a legislação não foi incorporada pela grande maioria dos municípios, o que limita os programas de desenvolvimento urbano. Uma forte evidência disso é que o cenário de crise urbana tem se aprofundado nos últimos anos”, pontua. Uma consequência dessa crise, conforme o autor da dissertação, foram as manifestações populares de junho de 2013, ocasião em que os moradores de várias cidades foram às ruas. No início, o alvo das manifestações foram as deficiências na área da mobilidade urbana. Posteriormente, outras reivindicações foram assimiladas pelo movimento, que também passou a exigir mais investimentos em educação, saúde e habitação, além do fim da corrupção. A insatisfação popular, ratifica o economista, também é um claro sinal de que as políticas públicas de desenvolvimento urbano definidas nas últimas décadas não conseguiram romper com o padrão de intervenção do Estado e nem tampouco assegurar aos cidadãos o direito à cidade, como consignado no Estatuto da Cidade. “Temos um modelo de política muito vinculado aos interesses do capital privado. O Minha Casa, Minha Vida é um exemplo disso. Embora esteja espalhado por todo o país e possa ser considerado o maior programa da história na área da moradia, tanto em número de unidades quanto nos recursos financeiros envolvidos, levando em consideração que existe há apenas cinco anos, ele está diretamente ligado aos interesses do capital vinculado à construção civil. Em outras palavras, esse capital está na base da estruturação do programa”, adverte. Na mesma linha, Raphael Faustino chama a atenção para o problema da crise hídrica que afeta diversos Estados, São Paulo de maneira mais pronunciada. Tal cenário, a seu juízo, está associado à forma como as companhias de saneamento são geridas, fundadas em um modelo desenhado ainda no período da ditadura militar. “As políticas de saneamento são muito dependentes dessas empresas, cuja estrutura varia muito de um Estado para o outro. Além disso, a avaliação dos resultados apresentados por elas se baseia muito mais no desempenho econômico-financeiro
que se reflete na Bolsa de Valores e nos dividendos que distribuem, do que na capacidade que têm de realizar obras de saneamento ou expandir a cobertura dos serviços”, critica. Outro nó ainda não superado, aponta o autor da dissertação, é o da terra urbana. Os instrumentos previstos no Estatuto da Cidade, destinados à construção de cidades menos desiguais, têm sido constantemente desconsiderados pelos gestores públicos, quando não pelo Judiciário. Um desses mecanismos possibilita, por exemplo, o adensamento de regiões centrais que sofreram processos de esvaziamento. Entretanto, em vez de estimularem a ocupação de um espaço já dotado de infraestrutura urbana, as políticas públicas têm privilegiado a construção de núcleos habitacionais na periferia das cidades, em áreas frequentemente desprovidas de serviços como saúde, educação e transporte. Em momento algum, afirma o economista, as políticas de desenvolvimento urbano romperam com os proprietários de terras ou com os rentistas. “A decisão tem sido pela construção de mais unidades habitacionais, postura que está aliada aos interesses de especuladores. Em nenhum momento tem se questionado o fato de o país ter mais imóveis vazios que o total do seu déficit habitacional. Ou seja, se é preciso ter uma política de construção de unidades habitacionais, também é necessário ter outra voltada ao aluguel social, de modo a estimular a ocupação dessas unidades ociosas. Isso contribuiria para reduzir o número de deslocamentos da população, bem como reduziria os investimentos para levar serviços e infraestrutura para pontos distantes dos municípios”, pondera o autor da dissertação. Um olhar mais atento para toda essa problemática, observa Raphael Faustino, já seria suficiente para revelar que as políticas de desenvolvimento urbano se sobrepõem às ações setoriais nas áreas de mobilidade, saneamento, habitação etc. “Todos os problemas urbanos estão inseridos em algo maior, que é a dificuldade de superação do subdesenvolvimento brasileiro. Esses entraves estão diretamente relacionados com a forma como o capitalismo brasileiro se estruturou. Assim, se a questão da desigualdade se reflete na renda, ela se reflete também nas cidades. Os avanços que registramos nos últimos dez anos, como a redução do desemprego e o aumento da renda de parte da população, não foram suficientes para alterar a realidade urbana brasileira. O modelo econômico nacional, marcado pela desigualdade, não tem permitido a execução das mudanças estruturais que garantiriam a superação das nossas desigualdades no que diz respeito às cidades”, avalia. Instigado a fazer uma análise em perspectiva sobre o tema, tendo como pano de fundo o atual processo eleitoral, o pesquisador diz que nada indica que o padrão em vigor deverá mudar nos próximos anos, a despeito de quem vença a corrida presidencial. “A política urbana já teve mais destaque no debate eleitoral em outros pleitos. Ademais, quando o assunto é abordado pelos atuais candidatos, as manifestações são no sentido de se manter o que aí está. Todos prometem, por exemplo, que vão preservar ou ampliar o Minha Casa, Minha Vida. Não há questionamentos ao modelo. Ninguém tem discutido possíveis mudanças estruturais. Nenhum dos presidenciáveis fala sobre o papel das companhias estaduais de saneamento ou sobre um novo arranjo que solucione os problemas regulatórios. Infelizmente, tudo indica que não teremos mudança de padrão. Uma ou outra prioridade pode ser alterada, mas o modelo em vigor não deverá ser substancialmente modificado”, antevê.
Publicação
O economista Raphael Brito Faustino, autor da dissertação: “Os problemas urbanos estão inseridos em algo maior, que é a dificuldade de superação do subdesenvolvimento brasileiro”
Dissertação: “Avanços e limites das políticas de desenvolvimento urbano no Brasil (1988-2013)” Autor: Raphael Brito Faustino Orientador: Marcelo Weishaupt Proni Unidade: Instituto de Economia (IE)
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Campinas, 29 de setembro a 5 de outubro de 2014
Zoneamento ecológico-econômico
faz cair taxa de desmatamento no AC Fotos: Divulgação
Regras de conservação e uso sustentável ajudam a preservar cobertura florestal LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br
Estado do Acre possui praticamente a metade de seu território (45,66% da superfície de 164.000 km²) destinada a unidades de conservação de proteção integral (9,52%), unidades de uso sustentável (21,58%) e terras indígenas (14,55%) – isso equivale a quatro vezes mais do que a média nacional de áreas protegidas e ao dobro da média da região Norte. Tese de doutorado apresentada no Instituto de Geociências (IG) atribui esta configuração peculiar do Estado acriano à aplicação de um conjunto de instrumentos de ordenamento territorial organizado segundo regras de conservação e uso sustentável; e que tem permitido a expansão de atividades econômicas e de infraestrutura, mantendo a cobertura florestal. “Dinâmica espacial do desmatamento no Estado do Acre entre 1999 e 2010: o papel do zoneamento ecológico-econômico” é o título da tese do geógrafo Marco Aurélio Rodrigues, orientada pelo professor Marcos César Ferreira. “A escolha do Acre para esta pesquisa vem de um período em que lá morei (de 1998 a 2003), trabalhando em programas de conservação socioambiental, junto a populações ribeirinhas, agricultores familiares, extrativistas e indígenas. Esta experiência já tinha dado origem ao meu mestrado, sob a orientação do professor Daniel Hogan”, afirma o pesquisador, que é professor substituto na UFMG e tem participado de projetos socioambientais e de educação na Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica. Marco Aurélio Rodrigues explica que o zoneamento ecológico-econômico (ZEE), cujos resultados ele buscou em seu estudo sobre o Acre, é uma política pública espacial que na visão de alguns serve de instrumento para o ordenamento territorial e o desenvolvimento regional; mas que na opinião de outros é a própria política de ordenamento territorial. “Ter 45% do seu território já com destinação legal para unidades de conservação e terras indígenas é um diferencial na gestão econômica e ambiental deste Estado em relação ao restante da Amazônia brasileira.” Na opinião do geógrafo, os resultados no Acre demonstram que o ZEE deve ser utilizado como instrumento político-jurídico e não somente como ferramenta técnica da administração pública, seja federal, estadual ou municipal. “É assim que o ZEE Acre vem sendo utilizado na sua dinâmica de implementação: tendo força de lei, ou seja, com a sua aplicação respaldada juridicamente, ao passo que no campo político tornou-se instrumento para a participação social, bem como para discussões e negociações do governo estadual junto à sociedade civil organizada.” O autor pautou sua tese nas hipóteses de que o zoneamento ecológico-econômico e o estabelecimento e expansão de áreas naturais protegidas contribuíram para a diminuição das taxas de desmatamento no Acre no período de 1999 a 2010; que embora a ênfase no ZEE esteja no aspecto político, ele é um importante instrumento público para a gestão territorial e ambiental; que a pavimentação das rodovias BR-364 e BR-317 propiciou a formação de eixos de integração e corredores rodoviários com Peru e Bolívia, mas que nesses eixos se concentra a maior parcela de desmatamento do Estado. Os principais resultados apresentados por Rodrigues foram a elaboração de um material cartográfico (por temas) contendo a análise espacial do desmatamento, a avaliação das mudanças socioeconômicas e uma análise do papel do ZEE no período da pesquisa. “Até 1998, o Acre foi governado por uma coalizão de partidos de direita. Em 1999, partidos de esquerda coligados na chamada ‘Frente Popular’ venceram as eleições e vêm administrando o Estado desde então. Naquele mesmo ano se iniciou a elaboração do ZEE e começaram as mudanças nas formas de gestão, com maior valorização das questões voltadas à floresta, implantação de programas socioambientais e as melhorias nas
Indígenas em área demarcada: diferencial em relação ao restante da Amazônia brasileira
UNIDADES FUNDIÁRIAS
BR-317, que liga o Acre ao Pacífico: formação de eixos de integração e de corredores rodoviários, embora a maior parcela de desmatamento do Estado ocorra às margens da rodovia
O geógrafo Marco Aurélio Rodrigues: elaboração de material cartográfico
condições socioeconômicas do Acre. Criouse assim uma gestão pública continuada, que chega a quinze anos em 2014.” O pesquisador recorda que em 1999 o Estado saiu da condição de inadimplência e iniciou um ciclo de captação de recursos e empréstimos para projetos e programas estruturais, inclusive para o ZEE. “O zoneamento passou a ser um instrumento estratégico de planejamento regional e gestão territorial, envolvendo estudos sobre meio ambiente, recursos naturais e relações entre a sociedade e a natureza. Os estudos servem como subsídio para negociações democráticas entre os órgãos governamentais, o setor privado e a sociedade civil sobre um conjunto de políticas públicas voltadas para a busca de um desenvolvimento menos impactante.”
HIPÓTESES CONFIRMADAS
Marco Aurélio Rodrigues confirmou uma diminuição do desmatamento no Acre em comparação com a década anterior à do estudo, mas também registrou uma dinâmica preocupante. “Há uma dinâmica de aumento e diminuição do desmatamento: entre 2001 e 2004, registraram-se as maiores taxas de desmatamento, e de 2007 a 2010, as menores taxas. É possível correlacionar o desmatamento no Acre e na Amazônia a fatores externos como os programas de desenvolvimento nacional (Avança Brasil e Programa de Aceleração do Crescimento), que têm financiado
a pavimentação de rodovias, construção de hidrelétricas e expansão das fronteiras agrícolas e da pecuária.” O geógrafo afirma que o ordenamento territorial se deu de forma mais rápida e consolidada nas áreas destinadas à criação de unidades de conservação e terras indígenas. “Entre 1999 e 2010, a área total das unidades de conservação aumentou em 112,7% e hoje ocupa 31,1% do território do Estado, enquanto as terras indígenas representam 14,5% – até 2010, o Acre tinha 45,66% de sua superfície destinada a áreas protegidas. Os resultados diretos do ZEE do Acre foram a elaboração e implantação da lei estadual de recursos hídricos, da lei estadual de florestas, a aprovação do programa de empréstimo junto ao BID e investimentos de programas do BNDES, BIRD, Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Integração Nacional e Ministério da Educação, entre outros. Rodrigues adverte, por outro lado, que a confirmação de que as maiores taxas de desmatamento no Estado estão nos eixos de integração da BR-364 e da BR-317 (87%) é um problema crucial a ser monitorado. “Se foi observado um avanço no aspecto socioeconômico (produto interno bruto, índice de desenvolvimento humano, geração de trabalho e renda), persiste um contingente grande de pessoas vivendo na pobreza e extrema pobreza, bem como as diferenças significativas entre as regiões do Estado, sobretudo entre a área rural e urbana.” De acordo com o pesquisador, o uso e a ocupação desordenados e modelos desenvolvimentistas predatórios configuraram-se como principais vetores para o desmatamento das áreas adjacentes às estradas e BRs. “Nesses dois eixos rodoviários foram se instalando os 22 municípios do estado, sendo que os mais próximos da capital Rio Branco tiveram os maiores índices de desmatamento, variando de 31,59% em Acrelândia a 9,31% em Xapuri. Os municípios com as menores taxas de desmatamento são, em sua maioria, onde a forma de transporte e de conexões é o rio: as taxas variam de 6,6% em Rodrigues Alves a 0,94% em Santa Rosa do Purus.”
O autor da pesquisa aponta os assentamentos de reforma agrária como a unidade fundiária com maior percentual de desmatamento e as terras indígenas como a unidade com o menor índice (0,5%). Seguindo o padrão de ocupação do território acriano, os assentamentos geram 28,54% do desmatamento no Estado, seguidos por áreas particulares (7,12%), áreas arrecadadas (6,83%), áreas discriminadas (6,18%), áreas sem estudo discriminatório (2,73%), unidades de conservação (1,57%) e terras indígenas (0,49%). “O desmatamento nos assentamentos tem relação direta com os modelos e formas de assentamentos implantados, a falta de assistência técnica e extensão rural eficientes, falta de acesso a crédito, dificuldade de acesso a tecnologias produtivas e falta de logística de escoamento da produção.” Em suas considerações finais, o geógrafo coloca aspectos do ordenamento do território do Acre que devem ser revistos, a exemplo dos projetos de assentamento, devido a fortes sinais de expansão da pecuária extensiva, vistos também em pequenas propriedades rurais. “A criação de animais, principalmente de gado bovino, é o maior indutor do desmatamento nessas áreas. A forma mais eficiente de conter o processo é oferecer ao assentado e ao pequeno proprietário assistência técnica, insumos e tecnologias mais modernas para a produção pecuária. Vale ressaltar, também, os fatores culturais difíceis de ser mudados, relacionados à dinâmica de corte, queima e rotação de áreas para a agricultura de subsistência.” Marco Aurélio Rodrigues reitera a importância de se monitorar a dinâmica de desmatamento nos eixos das rodovias, diante da migração de pessoas e também da instalação de uma rede de comércio em suas margens. “A taxa de desmatamento no Acre caiu de 441 km²/ano em 1999 para 167 km2 em 2009, subindo para 259 km²/ ano em 2010. Mas a pavimentação da BR364 e da BR-317 (Interoceânica), conectando o Acre com os portos do Pacífico, pode promover a abertura de novas frentes de desmatamento, especialmente em função do aumento da atividade pecuária para exportação e da ação de madeireiros peruanos agindo de forma ilegal na região de fronteira com o Peru.”
Publicação Tese: “Dinâmica espacial do desmatamento no Estado do Acre entre 1999 e 2010: o papel do zoneamento ecológico-econômico” Autor: Marco Aurélio Rodrigues Orientador: Marcos César Ferreira Unidade: Instituto de Geociências (IG)
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Campinas, 29 de setembro a 5 de outubro de 2014
Estudo aponta estresse oxidativo em pacientes com câncer de pele Tese sugere ainda que a idade e o F2 isoprostano podem ser marcadores de risco ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br
ntre os cânceres de pele, o tipo não melanoma é o mais frequente, mas também o que causa menos mortalidade no Brasil, por apresentar hoje altos percentuais de cura, quando detectado precocemente. Surge em geral em pessoas com idade superior a 40 anos e é relativamente raro em crianças e em pessoas de pele negra. As pessoas de pele clara, sensíveis à ação dos raios solares ou com doenças cutâneas prévias, são os alvos preferenciais da enfermidade. Estudo de doutorado produzido na Faculdade de Ciências Médicas (FCM), e orientado pela professora Patrícia Moriel, trouxe novas revelações: as pacientes com diagnóstico prévio de câncer de pele não melanoma (CPNM) já submetidas à retirada da lesão mostraram elevado estresse oxidativo (desequilíbrio entre a produção de radicais livres no organismo e a produção de substâncias antioxidantes, a favor dos radicais livres), quando comparadas a pacientes saudáveis. Todos os parâmetros de estresse oxidativo avaliados apresentaram concentrações mais elevadas nesses pacientes, mas com aumento significativo somente quanto às concentrações de isoprostano (p=0,007). No trabalho, as concentrações dos biomarcadores de estresse oxidativo, exceto o nitrito, foram reduzidas no grupo de estudo, após suplementação com antioxidantes como vitaminas C, E e mineral zinco, especialmente F2 isoprostano. A tese ainda sugeriu que a idade e o F2 isoprostano podem ser marcadores de risco para o câncer de pele não melanoma.
De acordo com Betânia de Jesus e Silva de Almendra Freitas, autora do estudo, “a cada ano a mais para o fator ‘idade’ aumenta em 12% a chance de câncer e cada unidade a mais na medida do marcador aumenta em 4% a chance de câncer”. Ocorre que o isoprostano revelou-se o mais sensível marcador a detectar elevação do estresse oxidativo em pessoas previamente diagnosticadas com câncer de pele não melanoma em relação às pessoas saudáveis. O trabalho de Betânia buscou sistematizar o uso do biomarcador de estresse oxidativo isoprostano para diagnosticar sujeitos de risco, a fim de desenvolver câncer de pele não melanoma, sobretudo quando apresentam antecedentes familiares para esse tipo de câncer. Segundo a pesquisadora, foi inovador encontrar o F2 isoprostano como marcador de risco para o câncer de pele não melanoma. Isso porque a importância desse achado abre possibilidade de empregá-lo no diagnóstico precoce desse câncer, permitindo a adoção de estratégias preventivas para impedir ou retardar a sua instalação. O biomarcador isoprostano, ressalta ela, é um importante marcador do status pró-oxidante envolvido na patogenia de diversas doenças, inclusive do câncer de pele. Esse mesmo marcador reveste-se de valor na investigação da eficácia da terapia antioxidante – na prevenção e no controle de patologias – em condições nas quais o estresse oxidativo tem papel fisiopatológico. “Constatamos redução, sem diferença significativa, nas concentrações plasmáticas de F2 isoprostano após suplementação de antioxidantes”, recordou. Esses achados foram obtidos a partir de uma comparação do estresse oxidativo entre pessoas que apresentaram CPNM e pessoas que não o apresentaram e ainda avaliação do efeito da suplementação de antioxidantes vitaminas C e E e mineral zinco nas pessoas que mostraram a doença. A casuística envolveu 81 sujeitos, avaliados em Teresina, Estado de Piauí, sendo os portadores de câncer de pele não melanoma atendidos no Hospital “Getúlio Vargas” de janeiro a dezembro de 2012. Foto: Divulgação
Betânia de Jesus e Silva de Almendra Freitas, autora da tese: casuística envolveu 81 sujeitos
Foto: Antonio Scarpinetti
A exposição ao sol está entre as principais causas do câncer de pele não melanoma
Antioxidantes protegem células No organismo, as células estão constantemente sujeitas a danos tóxicos pela formação de radicais livres que provêm da oxidação da membrana celular, responsáveis pelo surgimento de várias enfermidades e degenerações. O antioxidante promove a proteção celular contra os efeitos danosos dos radicais livres, sendo que alguns nutrientes – presentes ou adicionados aos alimentos – possuem propriedade antioxidante. Já os antioxidantes são moléculas aptas a retardar ou a impedir o dano oxidativo, processo causado pelos radicais livres – substâncias que podem levar à disfunção das células e ao aparecimento de problemas como doenças
cardíacas, diabetes e câncer. A função dos antioxidantes é bloquear as reações de oxidação e oferecer proteção às membranas e a outras partes das células. Os radicais livres são moléculas oxidantes muito reativas que agridem outras moléculas, modificando as estruturas químicas. Eles são produzidos como parte do metabolismo natural e são introduzidos no organismo por meio de fontes externas como exposição ao sol ou poluição. Outros meios incluem estresse, ingestão de bebidas alcoólicas, alimentos insalubres e cigarro. Os antioxidantes atuam combatendo estes radicais livres e são essenciais para o funcionamento adequado do sistema imunológico.
MUDANÇAS
Para melhorar a detecção desse câncer, opinou ela, a população precisa estar consciente da necessidade de monitorar manchas e sinais na pele, e procurar os serviços médicos precocemente, quando aparecerem prováveis sinais de malignidade. Além disso, apontou, devem ser incorporadas à rotina dessas pessoas medidas preventivas como se proteger da exposição solar entre 10 e 16 horas, usar bloqueador solar, evitar o tabagismo e adotar uma alimentação rica em nutrientes antioxidantes. “Tem mais: requer notificação compulsória dos casos de câncer de pele não melanoma, a fim de permitir o conhecimento de seus fatores de risco e dados epidemiológicos de sua incidência; permitir a precocidade e adequação do acesso aos serviços médicos para realizar biópsias e diagnóstico preciso; e dar acesso à população aos avanços tecnológicos aplicados ao seu controle e tratamento”, sintetiza. Para Betânia, este estudo representa um passo além na tentativa de esclarecer os efeitos benéficos da suplementação com antioxidantes, possibilitando o estabelecimento de diretrizes terapêuticas e preventivas direcionadas à população vulnerável aos danos oxidativos na pele.
A doutoranda procurou avaliar o efeito da suplementação de antioxidantes sobre os parâmetros de estresse oxidativo das pessoas que tiveram a doença. “Decidi estudar esse tema porque a minha cidade possui fortes índices de fotoexposição durante todo o ano, com alta frequência de fumantes e de pessoas que não usam bloqueadores solares”, contou. Na cidade natal de Betânia, foram constatadas condições que favorecem a incidência desse câncer, associadas ao fato de que os hábitos alimentares refletem baixo consumo de frutas, verduras e cereais integrais, considerados alimentos protetores do câncer. Já no Brasil, estima-se que haja até o final de 2014 aproximadamente 182 mil casos novos de câncer de pele. Somente o CPNM representa cerca de 25% dos cânceres registrados no país. No mundo, há cerca de um milhão de casos novos anualmente. A pesquisadora acredita que a sua tese deve servir como um alerta para esse tipo de câncer, uma vez que existe um consenso de que o mundo está vivendo uma epidemia de câncer de pele. Isso inclusive vem despertando o interesse da comunidade científica e de gestores de saúde para consolidar estratégias preventivas aptas a romper com a cadeia multifatorial responsável pela vulnerabilidade da pele aos danos oxidativos. “Recursos e esforços devem ser mobilizados para frear a cadeia de fatores responsável pela fragilidade da pele frente ao estresse oxidativo.” As estratégias preventivas para o câncer de pele não melanoma, comentou, pressupõem uma abordagem simples e de baixo custo que “deve envolver sobretudo educação em saúde para conscientizar a população a se proteger dos danos oxidativos e monitorar lesões cutâneas, buscando identificar precocemente sinais ou manchas sugestivas de malignidade.”
Publicação Tese: “Possíveis marcadores de estresse oxidativo no câncer de pele não melanoma: efeito da suplementação de antioxidantes em indivíduos que tiveram câncer de pele não melanoma” Autora: Betânia de Jesus e Silva de Almendra Freitas Orientadora: Patrícia Moriel Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM)
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Campinas, 29 de setembr
As ‘aventureiras’ que desb Estudo preenche lacuna sobre a participação feminina em expedições científicas LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br
participação das mulheres em expedições científicas no Brasil, nos meados do século passado, foi muito maior do que imaginamos. Esta ideia, embora recorrente na literatura sobre gênero e ciências e sobre história das mulheres, carecia de mais registros dessas “aventureiras”, carência que a historiadora Mariana Moraes de Oliveira Sombrio espera ajudar a suprir com sua tese de doutorado. “Em busca pelo campo: ciências, coleções, gênero e outras histórias sobre mulheres viajantes no Brasil em meados do século XX” é o título da pesquisa que ela desenvolveu sob a orientação da professora Maria Margaret Lopes, junto ao Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT), do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp. Mariana Sombrio vem pesquisando as mulheres cientistas desde a iniciação científica, a partir de um projeto coordenado por sua orientadora no âmbito do Pagu – Núcleo de Estudos de Gênero. “O projeto da professora Margaret Lopes visava estudar Bertha Lutz, que ficou conhecida na história brasileira por sua militância feminista, mas que era também cientista, faceta pouco abordada – ela tinha os diplomas de botânica e de zoóloga, trabalhando com ciências naturais. No mestrado abordei sua atuação como botânica no Museu Nacional do Rio de Janeiro, seu trabalho no Conselho de Fiscalização de Expedições Artísticas e Científicas do Brasil (CFE) e também a colaboração com seu pai, Adolfo Lutz, na organização de coleções herpetológicas [de sapos e suas classificações].” A historiadora conta que Bertha Lutz (1894-1976) foi uma das primeiras mulheres brasileiras a ingressar oficialmente em uma instituição científica, aprovada em concurso público para o cargo de “secretário” do Museu Nacional, em 1919. Com o passar dos anos, deixou esse cargo para assumir o de naturalista, consolidando uma carreira estável e bem-sucedida. Como representante do Museu no Conselho de Fiscalização de Expedições, Bertha Lutz participou do processo de construção da nascente política científica nacional, fiscalizando e licenciando expedições científicas realizadas em território brasileiro. Foi pesquisando a documentação do CFE, referente ao período de 1933 a 1968, que Mariana Sombrio levantou as fichas de 38 mulheres que solicitaram licenças para expedições, antevendo nesses registros o mote para o seu doutorado: entender as condições, fatores e estratégias com que elas se inseriram nas práticas de campo. “A maioria era de estrangeiras, como americanas do Instituto Smithsonian e da Universidade de Columbia, bem como da Europa, poucas latino-americanas e também brasileiras autônomas (aquelas vinculadas a instituições como Butantan e Manguinhos não precisavam da autorização).” A autora da tese recorda que o Conselho de Fiscalização de Expedições foi criado por Vargas em 1933, no contexto nacionalista de se proteger os bens da nação, como por exemplo, os patrimônios natural e histórico. “Como antes não havia nenhuma legislação que controlasse a entrada de estrangeiros no país, este Conselho passou a registrar e avaliar os pedidos de licença para expedições,
Publicação Tese: “Em busca pelo campo: ciências, coleções, gênero e outras histórias sobre mulheres viajantes no Brasil em meados do século XX” Autora: Mariana Moraes de Oliveira Sombrio Orientadora: Maria Margaret Lopes Unidade: Instituto de Geociências (IG)
sob a exigência de que os cientistas deixassem duplicatas das amostras que coletassem – plantas, animais, peças de artesanato indígena – para instituições nacionais.” Segundo a historiadora, as expedicionárias das décadas de 1930 a 1950 conviveram em ambientes majoritariamente masculinos, mas várias delas produziram pesquisas consistentes e estabeleceram relações com a comunidade científica, numa atuação que ia muito além do papel de assistentes, geralmente reservado a elas. “Para saber mais sobre as 38 mulheres, tive que recorrer a outras fontes, sendo que de algumas nada encontrei: desapareceram, ou por que não firmaram carreiras sólidas, ou por que eram apenas viajantes e não publicaram artigos. Por isso, acabei valorizando as mulheres que mantiveram relações estreitas com instituições científicas brasileiras e tiveram uma produção significativa.” Mariana identificou um grupo formado por antropólogas em sua maioria, mas também por botânicas, zoólogas, geólogas, astrônomas, linguistas e arqueólogas atuando em pesquisas de campo no país. “Encontrei cientistas brasileiras autônomas como Maria Alice Fonseca de Moura, etnóloga que fazia pesquisa de antropologia física para seu doutorado e pediu licença para visitar tribos no Mato Grosso. Seu objetivo era produzir moldes de gesso de mãos, pés e face dos indígenas. Vale lembrar que a antropologia surgiu como se fosse um ramo da medicina, comparando características físicas entre etnias, antes de se tornar uma disciplina com viés mais sociocultural.” Três cientistas estrangeiras mereceram cada qual um capítulo da tese, por terem feito do Brasil seus campos privilegiados de pesquisa: Wanda Hanke, austríaca com formação em medicina, direito e filosofia, que decidiu realizar o sonho da etnologia aos 40 anos de idade, estudando indígenas do Brasil, Paraguai, Bolívia e Argentina, até morrer na cidade de Benjamin Constant (AM); a zoóloga americana Doris Cochram, que veio sozinha para estudar sapos, mas com a ajuda preciosa de Bertha Lutz; e Betty Meggers, arqueóloga também americana que, invertendo os papéis, conquistou fama com uma produção que superou a do marido também arqueólogo. Publicamos um resumo das trajetórias dessas três mulheres nestas páginas.
A brasileira Bertha Lutz: naturalista desempenhou papel pioneiro na inserção das mulheres na ciência no país
O CASAMENTO
E O SOBRENOME
Em relação às trajetórias das cientistas expedicionárias, Mariana Sombrio identificou particularidades como a influência do casamento, que em sua opinião fazia muita diferença, para o bem e para o mal. “Algumas que se casavam com cientistas continuavam pesquisando e acompanhando o marido nas expedições, tornando-se suas principais colaboradoras; para outras, a carreira acabava, pois precisavam cuidar da casa e dos filhos. Por outro lado, Doris Cochran e as brasileiras Bertha Lutz e Heloísa Alberto Torres nunca se casaram, o que é uma característica de algumas das mulheres que se destacam no meio científico – mas isso não era regra, visto que Wanda Hanke, viúva, deixou um filho na Áustria e Betty Meggers também era casada.”
A pesquisadora observa que as expedicionárias eram em maioria brancas e de classe média – o que indica um recorte de classe e de raça dentro das instituições de pesquisa – e, também, que havia outros impedimentos além do matrimônio. “Enquanto aos homens era facilitado viajar para o curso superior na Europa, para as mulheres era difícil ingressar mesmo nas faculdades daqui. A educação feminina no Brasil só passou a ser mais valorizada a partir da década de 30, com a criação de universidades e faculdades de filosofia, ciências, letras e profissionalização do magistério. É também nos anos 30 que as salas de aula mistas tornam-se mais comuns.” Outra particularidade realçada pela historiadora diz respeito à mudança de sobrenome no casamento, que podia fazer
Betty Meggers, que fez seu nome O terceiro capítulo da tese de Mariana Sombrio é sobre Betty Meggers (1921-2012), uma arqueóloga que conquistou fama e veio ao Brasil pela primeira vez em 1948, trabalhando por um ano na Amazônia, ao lado do marido e também arqueólogo Clifford Evans – ambos desenvolvendo suas teses de doutorado pela Universidade de Columbia. “É um caso bastante peculiar porque Betty se sobrepôs ao renome de Evans nas ciências, não por ser mulher, mas porque sua pesquisa foi mais ampla e suas teorias mais impactantes. O caso é oposto ao de outro requerente de uma licença para expedição, Claude Lévi-Strauss, que contou o tempo todo com a colaboração da mulher, Dina, que praticamente desapareceu da literatura decorrente da expedição ao Brasil frente à notoriedade adquirida pelo marido: mereceu menção apenas em nota de rodapé do livro ‘Tristes Trópicos’.” A historiadora conta que Betty Meggers, ao contrário, nunca adotou o sobrenome do cônjuge e também não trabalhava apenas com ele, publicando e colaborando com outros cientistas, além de realizar pesquisas independentes, coletando principalmente cacos de cerâmica. “Essa postura foi determinante para seu sucesso na carreira. Mais do que a tradicional assistente esposa, ela era indiscutivelmente a cientista da expedição, tornando-se conhecida nos círculos científicos por seu nome próprio. Era participante ativa nas escavações. Pioneira no campo da arqueologia, suas contribuições abriram caminho para o de-
A norte-americana Betty Meggers: pesquisas arqueológicas na Amazônia se tornaram referência
senvolvimento de muitas pesquisas sobre culturas pré-históricas na América do Sul.” Segundo Mariana, o livro mais notável de Betty Meggers, “Amazônia: A Ilusão de um Paraíso”, provém de suas pesquisas no Brasil e se tornou referência para pesquisadores das áreas de arqueologia e antropologia, sendo também citado em alguns estudos sobre problemas ambientais da Amazônia – a apresentação das edições brasileira e mexicana foi escrita por Darcy Ribeiro. “Além das informações sobre arqueologia amazônica que se mantêm preservadas, a leitura da narrativa de Betty Meggers é muito
prazerosa. Algumas vezes, seus relatos diários eram complementados por pequenos comentários nas últimas linhas ou no pé das páginas de seu marido, Clifford Evans, mas quem relatava a expedição era mesmo ela.” A autora da tese explica que o casal passou a maior tempo recolhendo cacos de cerâmica, ossos e outros artefatos arqueológicos, buscando pesquisar e elucidar a história de habitação dos povos indígenas na região do Baixo Amazonas. “Os trabalhos de campo e as coleções foram e continuam sendo aspectos essenciais de disciplinas como a arqueologia, que se conformaram transformando, teórica e concretamente, espaços, cacos e ossos em áreas e objetos científicos. Foi a partir da análise, descrição e catalogação dos artefatos que Betty Meggers construiu suas teorias sobre a adaptação do homem aos trópicos.” Chamou a atenção de Mariana Sombrio os muitos nomes de brasileiros que aparecem nas narrativas da expedicionária americana, desvelando toda a estrutura de trabalho coletivo em torno dos pesquisadores. “São inúmeros os anônimos que contribuíram com as escavações, viagens, carregando os artefatos, indicando-lhes locais de trabalho e fornecendo condições para que a viagem acontecesse. Para historiadores sociais e antropólogos, conhecer o cotidiano desses processos e o envolvimento dos pesquisadores com a sociedade é algo de muito valor. É a história da construção de teorias científicas em sua forma primeira, com a participação social inclusa.”
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bravaram o país pela ciência Fotos: Reprodução
de campo das americanas Doris Cochram e Betty Meggers, que localizou no Instituto Smithsonian (onde fez doutorado sanduíche), e com as cartas de Wanda Hanke, depositadas no Museu Paranaense. “A suposta fragilidade das mulheres para suportar expedições é alvo de tratados desde o século 19. Mas as dificuldades ou rejeições por estarem no campo não ficam explícitas nos documentos; nenhuma delas se lamenta pela condição de mulher. Há apenas comentários breves, como de Betty Meggers sobre a surpresa dos mateiros que a viam a cavalo nas fazendas do Marajó, acampando e caçando para comer; ou de Wanda Hanke sobre agressões, uma delas física, quando trabalhou no Parque Nacional do Paraguai.” Em suas considerações finais, Mariana Sombrio retoma o argumento de que mais mulheres do que imaginamos participavam destas atividades de campo, embora a historiografia tradicional da ciência pouco trate delas, ressaltando grandes figuras masculinas como Carlos Chagas ou Adolfo Lutz. “Até hoje a ciência é uma prática elitista. É preciso relativizar a ideia romântica das expedições científicas como de aventureiros se embrenhando e enfrentando os perigos da selva, que ainda influencia o imaginário popular sobre o que é fazer ciências e contribui inclusive para reforçar um caráter masculinizante para essas práticas. É uma atividade como outras, dependente de muitas pessoas; e quando se olha para os documentos, elas aparecem.” Foto: Antoninho Perri
com que a mulher que publicasse artigos científicos deixasse de ser encontrada. “Maria Alice Fonseca de Moura, ao pedir autorização para a expedição ao Mato Grosso, assinou todo o dossiê com esse nome. Quando voltou, assinou um único documento com um sobrenome diferente: Pessoa. Demorei a perceber por que não encontrava artigos ou referências a ela: Maria Alice viajou com um auxiliar, Arnaldo Salazar Pessoa, com quem certamente se casou, passando a adotar seu sobrenome. Ao notar essa mudança consegui encontrar trabalhos que ela realizou após retornar da expedição.”
DIÁRIOS
SEM LAMENTAÇÕES
Uma preocupação da autora da tese foi resgatar aspectos do dia a dia das cientistas e, para isso, trabalhou com os diários
Mariana Moraes de Oliveira Sombrio, autora do estudo: “Acabei valorizando as mulheres que mantiveram relações estreitas com instituições científicas brasileiras e tiveram uma produção significativa”
Doris Cochram, a ‘frog lady’ Foto: Smithsonian Institution Archives
A zoóloga Doris Cochram: cientista americana nomeou seis novos gêneros e aproximadamente 100 novas espécies
De acordo com Mariana Sombrio, o arquivo pessoal de Doris Cochram (1898-1968), guardado no Instituto Smithsonian, em Washington, reúne uma série de correspondências, artigos, manuscritos, desenhos, fotos e inúmeros outros documentos que ajudam a reconstruir sua história. Há um livro não publicado, datilografado, escrito a partir do diário de campo onde registrou as atividades e impressões de sua primeira expedição ao Brasil, em 1935. “É possível perceber que a viagem ao Brasil era um desejo longamente cultivado e permeado pelo imaginário do encontro da pesquisadora com uma natureza exótica e cheia de mistérios a serem revelados. Palavras de admiração sobre as paisagens naturais e espécimes, tão diferentes dos que ela conhecia na América do Norte, são comuns em seu diário.” Doris Cochram veio sozinha, mas tendo um contato importante no país, o que na opinião da autora da tese fazia muita diferença. “Ela conseguiu facilmente a licença do Conselho de Fiscalização e foi recebida no porto por Bertha Lutz, que ainda encontrou um lugar para que morasse e a acompanhou em algumas viagens. Na falta da anfitriã, acompanhava Doris um assistente de campo chamado Joaquim Venâncio, negro e iletrado, que foi fundamental para as pesquisas tanto de Adolfo Lutz como de Bertha, já que era
quem de fato ia coletar os sapos que depois a cientista catalogava e estudava.” Mariana Sombrio informa que Doris Cochran era especialista em herpetologia, tendo como suas principais áreas de interesse os répteis e anfíbios da América Central e do Sul. Ela fez duas viagens de campo ao Brasil, em 1935 e 1962, e visitou também outros países da América Latina, como Haiti e Colômbia. Essas expedições renderam trabalhos importantes para a área, incluindo as publicações: “The Frogs of Southeastern Brazil” (Os sapos da região Sudeste do Brasil, 1955) e “The Herpetology of Hispaniola” (1941). No decorrer de suas pesquisas, ela nomeou aproximadamente 100 novas espécies e seis novos gêneros. Além dos textos científicos, Doris Cochram publicou um grande número de artigos populares e livros sobre herpetologia, sendo o mais importante “Living Amphibians of the World” (1961), que foi traduzido para seis línguas. “Ela também concedia frequentemente entrevistas a rádios e falava publicamente sobre répteis e anfíbios em clubes nos Estados Unidos. As muitas reportagens publicadas sobre a cientista apontam sua fama e o reconhecimento que recebia da comunidade científica americana. A quantidade de artigos de divulgação publicados e guardados em seu arquivo pessoal é impressionante.”
Wanda Hanke, a ‘meio maluca’ A viajante e pesquisadora austríaca Wanda Hanke (1893-1958) passou os últimos 25 anos de sua vida se dedicando ao estudo de grupos indígenas da América do Sul. Para a historiadora Mariana Sombrio, é o exemplo da expedicionária que não tinha dinheiro, nem vínculo com instituições, nem marido para acompanhá-la. Em ofício que data de julho de 1933, a cientista pede não apenas a licença, mas o custeio pelo governo brasileiro da expedição a regiões desconhecidas dos rios Xingu, Tapajós e afluentes, com o propósito de pesquisas “psycho-ethno-sociológicas”, linguísticas, astronômicas, meteorológicas e cartográficas. O primeiro parecer do Conselho de Fiscalização de Expedições foi favorável, mas o pedido de licença acabou recusado por conta de um documento confidencial do governo, baseado em informações do Consulado de Viena que colocavam em dúvida a idoneidade de Wanda Hanke: ela foi internada por dois anos em um sanatório especial para perder o vício da morfina; e, segundo sua neta, sofria de depressão e já havia tentado suicídio. “A alegação de problemas psiquiátricos era absolutamente incomum para se negar uma licença. Mas Wanda veio mesmo assim. E na tese observo que o governo brasileiro, se não apoiava, também não conseguia exercer uma fiscalização tão efetiva sobre as atividades dos estrangeiros no país”, diz Mariana.
Foto: Acervo do Museu Paranaense
Wanda Hanke, austríaca com formação em medicina, direito e filosofia: vendendo coleções para bancar as expedições
Viajando sozinha, a pesquisadora austríaca contratava mateiros para ajudar no transporte de equipamentos e na coleta de utensílios de uso cotidiano dos indígenas ou mesmo peças arqueológicas. “Também tirava muitas fotografias e vendia suas coleções para financiar as expedições – tradição que vinha do século 19, mas já condenada pelo governo brasileiro, que buscava cercear o co-
mércio ilegal de artefatos indígenas e espécimes biológicos. Ela acabou estabelecendo um vínculo estreito com o Museu Paranaense, de Curitiba, parceria decorrente de um problema com as duplicatas coletadas pelos expedicionários: o Conselho de Fiscalização alegava que iria distribuí-las para instituições brasileiras, mas na prática ficavam quase sempre no Museu Nacional (RJ).”
Mariana Sombrio afirma que Wanda Hanke ocupou uma posição marginal no campo antropológico de sua época, o que atribui ao fato de ter se inserido na comunidade científica como “coletora de campo”, assim como à sua visão eurocêntrica, aos conflitos institucionais e à falta de um treinamento oficial em antropologia. “Mesmo que sua produção científica não tenha sido tão impactante nos debates antropológicos de então, as compilações de dados, registros de línguas, as coleções, o acervo iconográfico e as peças que entregou a diversos museus constituem hoje uma importante fonte sobre a história dos povos indígenas da América do Sul.” Até encontrar as cartas de Wanda Hanke no Museu Paranaense, em Curitiba, a historiadora pensou que seria impossível resgatar aspectos da trajetória de uma cientista desvinculada de qualquer instituição e que ainda era tida como “meio maluca”. “Suas cartas e narrativas deixam transparecer uma personalidade forte, determinada e cheia de si. Os esforços que empregou para realizar sua pesquisa etnológica, assim como os resultados que obteve, são bastante impressionantes, ainda mais estando sozinha, fora da lei, defendendo causas e sofrendo violências. E, afinal, todas as mulheres que viajassem sozinhas fazendo pesquisa pelo interior do Brasil, naquela época, corriam o risco de ser consideradas ‘meio malucas’.”
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Campinas, 29 de setembro a 5 de outubro de 2014
Membrana filtrante inativa bactérias presentes na água CAROLINA OCTAVIANO Especial para o JU
esquisadores do Instituto de Química (IQ) da Unicamp desenvolveram um processo para obtenção de membranas que podem ser empregadas em ultrafiltração, purificação e desinfecção de água, servindo como uma das etapas para torná-la própria para consumo. A tecnologia desenvolvida propõe um novo material filtrante, com alta capacidade antibacteriana, que demostrou, por meio de testes, ser capaz de inibir 100% das células bacterianas viáveis. “A tecnologia pode ser utilizada no tratamento de água, mas tem diversas outras aplicações”, afirma a professora Maria do Carmo Gonçalves, que atua na área de blendas, compósitos e nanocompósitos poliméricos e foi uma das responsáveis pela invenção, com o professor Oswaldo Luiz Alves, e com as pesquisadoras Ana Carolina Mazarin de Moraes, Andréia Fonseca de Faria e Patricia Fernanda Andrade – todos do Laboratório de Química do Estado Sólido (LQES). Intitulada “Membranas poliméricas porosas antibacterianas”, a tecnologia demorou cerca de um ano e meio para ser desenvolvida, já foi patenteada e está disponível para licenciamento de empresas interessadas junto à Agência de Inovação Inova Unicamp. Segundo os autores da pesquisa, a tecnologia é de interesse para diversos setores industriais – tais como farmacêutico, alimentos, saneamento e higiene – mas não descartam a área de saúde pública, uma vez que hospitais sofrem significativas perdas anuais devido à contaminação de produtos e de superfícies por microrganismos patogênicos. Na opinião de Alves, empresas que tenham interesse em aspectos ligados a materiais com propriedades antibacterianas podem se beneficiar do licenciamento dessa tecnologia, reconhecendo que ainda há uma
Patenteada e disponível para licenciamento, tecnologia tem várias aplicações
lacuna no mercado a ser preenchida. “As membranas podem ser empregadas na indústria de alimentos, como na de vinho e de derivados do leite, por exemplo. Temos um mercado muito promissor, pois o país ainda importa tanto o material filtrante quanto os módulos de filtração”, aponta Maria do Carmo. Alves acrescenta que o material também tem grande potencial para ser utilizado no setor de embalagens, no qual a questão da assepsia é importante. Foto: Antoninho Perri
Da dir. para a esq., os professores Oswaldo Luiz Alves e Maria do Carmo Gonçalves, e as pesquisadoras Ana Carolina Mazarin de Moraes e Patricia Fernanda Andrade: bactericida de ação prolongada
BIODEGRADÁVEL
O material proposto pelos pesquisadores do IQ é uma membrana de material biodegradável contendo óxido de grafeno decorado com nanopartículas de prata. Os responsáveis pela tecnologia realizaram testes com três concentrações diferentes de carga de óxido de grafeno e nanopartículas de prata e todas apresentaram inibição de 100% das células viáveis das bactérias Escherichia coli e Staphylococcus aureus, após duas horas de contato com a membrana desenvolvida. Como os dois microrganismos podem ser considerados indicadores de qualidade de água, a tecnologia demonstrou um excelente potencial para redução das cargas microbianas em soluções aquosas. Ana Carolina elenca pelo menos três importantes diferenciais presentes na tecnologia. Segundo ela, o primeiro deles é a utilização de acetato de celulose, que é um polímero biodegradável derivado de materiais celulósicos abundantes na natureza e fabricado em grandes quantidades, levando em consideração o atual cenário no qual os descartes de produtos que agridem menos o meio ambiente, ganham cada vez mais espaço no mercado. Outro diferencial importante é que a liberação de nanopartículas de prata, suportadas em óxido de grafeno, pode ser controlada, prolongando a ação bactericida da membrana e inibindo a formação de biofilme. “Isso favorece que tais membranas também possam ser utilizadas em processos de osmose reversa, na purificação do ar e como material de revestimento de embalagens”. Por fim, a professora aponta que a tecnologia pode ser facilmente escalonada. Por se tratar de uma tecnologia promissora, Alves revela que novas pesquisas com a tecnologia estão sendo desenvolvidas. “A pesquisa continua no sentido de buscar novas aplicações para o material”, revela o docente. Interessados no licenciamento da tecnologia devem entrar em contato com o Setor de Parcerias da Agência de Inovação Inova Unicamp, pelo endereço parcerias@inova. unicamp.br ou pelos telefones (19) 35212552 ou 3521-2607.
O devir do desenho no debate artístico brasileiro ANDRÉ TAVARES andretavarestap@gmail.com
mbígua a situação do desenho como objeto de arte no Brasil. Parece ser, entre nós, um gênero particularmente incômodo e cuja fruição é limitada pelo número de instituições efetivamente dedicadas à sua exibição. Há pouco, vimos o belo projeto do Gabinete do Desenho do Museu da Cidade de São Paulo ser desmantelado como coleção e ter peças do seu acervo transferidas ao Parque do Ibirapuera. Em verdade, era um dos únicos casos em nosso país em que um amplo acervo – de excelente qualidade – estaria constantemente exposto, permitindo, assim, uma compreensão ampla dessa prática ou meio de expressão bem como das suas qualidades marcantes, seja como processo imediato de notação e invenção artística, seja como obra finalizada. Há um prazer intrínseco na observação do desenho, que creio derivar da constatação simples de que “todos”, em algum momento, desenham, sejam bonecos de palito, notações rápidas ou, mesmo, estudos de modelo vivo acadêmicos ou projetos de arquitetura. Observar o desenho, portanto, seria reconhecer os elementos-chave da linguagem visual. Seria de desejar que todos os nossos grandes museus, coleções privadas e bibliotecas mantivessem seus gabinetes de desenho e investissem na divulgação e apresentação constante desse material, pois o desenho, inúmeras vezes, pode alterar a compreensão que temos de um determinado artista. A exposição e o livro que se dedicam, neste momento, a Manoel de Araújo Porto-Alegre (Instituto Moreira Salles/ Manoel de Araújo Porto-
Alegre, singular e plural, por Julia Kovenski e Letícia C. Squeff) é um exemplo: os desenhos de Porto-Alegre revelam um lado completamente novo desse historiador/crítico/artista que nos obriga a redimensionar os limites de sua atuação e, mais relevante, nos faz pensar em como se deu sua educação visual. Como, através da cópia ou da invenção, um desenhista se apropria de elementos externos, de códigos artísticos, soluções formais e modela seus gestos no caminho do efeito que deseja imprimir ao resultado final. Nesse sentido, a iniciativa dos Cadernos de Desenho publicados pela Editora da Unicamp, sob a coordenação de Lygia Eluf, vem prestar um múltiplo serviço, se podemos dizer assim, ao debate sobre o tema. Em primeiro lugar, porque o “devir” do desenho, a garantia do seu futuro e a permanência no repertório visual – seu tempo de permanência na berlinda das artes – é menor entre nós. A depender dos esforços de exibição, um desenho pode desaparecer por 50, 100 anos em uma mapoteca ou reserva e jamais ser considerado entre as obras que compõem o “arco” de imagens oficiais de um artista. Coleções menosprezadas, tais como as de desenhos anatômicos, botânicos, exercícios de notação topográfica e mesmo as coleções efetivas de artistas, são um manancial amplo, mas pouco valorizado no Brasil. Os catálogos e livros são uma maneira de reconsiderar esses objetos e criar um lugar para sua apreciação e circulação no país. O sétimo volume da coleção, dedicado a Iberê Camargo, é, de certa forma, uma demonstração do que tentamos analisar acima. A seleção revela os desenhos associados à sua formação – mas já cheios do sentido dramático que caracterizaria o trabalho desse gravador e pintor – e conclui com os esboços para as últimas obras do artista, particularmente a série dos Ciclistas e as demais
pinturas dos anos 1990. O texto de Eduardo Kickhöfel trata de criar as balizas para que compreendamos a articulação da formação de Iberê Camargo a uma grande tradição histórico-artística, propondo a compreensão da obra desse artista à luz da tradição humanística do Renascimento. Sob esse ponto de vista, seria curioso publicar, também, uma coleção dedicada a cópias dos assim chamados “grandes mestres” pelos artistas do século XX brasileiro: Iberê, por exemplo, é o autor de uma bela cópia de A família de Lot deixando Sodoma, de P. Paul Rubens. Seria revelador para a compreensão dos limites entre tradição e vanguarda, ainda um tema no estudo da arte no Brasil do século XX. O que nos marca, finalmente, é o sentimento trágico da seleção de desenhos. Artista único, Iberê Camargo cultivou a literatura, expressando-se em breves contos, em esboços de memórias ou no registro textual cuidadoso dos procedimentos artísticos por ele desenvolvidos, particularmente no campo da gravura. Sua biografia trágica, incluindo o assassinato de um engenheiro, em 1990, a prisão e todo o processo que se seguiu, parece ter deixado marcas em sua obra. Assim, não é sem compaixão que abrimos as páginas deste Caderno de Desenho e passamos os olhos sobre os desenhos que resultaram na série dos “idiotas”. Dos guaches, aguadas e nanquins sobe a consciência da precariedade da condição humana e a força de um artista que não temeu sondar seu espírito em busca de uma saída. André Tavares é desenhista, mestre em história da arte e doutor em história pelo IFCH-Unicamp. É também doutor em artes pela Universidade Federal de São Paulo, onde é professor no curso de História da Arte da Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (EFLCH-Unifesp).
SERVIÇO Livro: Cadernos de Desenho – Iberê Camargo Organizadora: Lygia Eluf Texto: Eduardo Kickhöfel Coedição: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo Preço: R$ 70,00
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Arquiteta desenvolve metodologia para implantação de loteamentos Estudo propõe abordagem multidisciplinar na elaboração de diretrizes, normas e projetos CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br
a conversa com a arquiteta e urbanista Fernanda Nascimento Corghi, emerge sobremaneira o entusiástico interesse pelos problemas decorrentes da implantação de loteamentos urbanos. Nesse envolvimento ela foi muito mais além dos estudos acadêmicos e frequentou durante dez anos áreas urbanas e periurbanas de Bauru, onde se graduou pela Unesp, e realizou estágios voluntários nos mais diferentes órgãos da prefeitura da cidade com vistas a conciliar o conhecimento teórico com a realidade prática para tentar entender porque, apesar das legislações, inclusive, e dos planos diretores existentes perpetuam-se problemas provocados pelas implantações de loteamentos urbanos e demais empreendimentos urbanísticos aprovados pelo poder público. Desde a iniciação científica na graduação e durante o mestrado e o doutorado, realizados na Unicamp, ela se vinha dando conta de que não faltavam leis e estudos científicos para coibir problemas decorrentes de adensamentos urbanos. O que se fazia necessário era unir áreas científicas diversas e a prática da produção de loteamentos para implementá-las na administração pública. Para tanto, havia necessidade de projetos acadêmicos que se destinassem de fato a contribuir para a alteração da realidade e deixassem de constituir produções pouco vinculadas ao cotidiano das secretarias públicas e órgãos responsáveis pelos licenciamentos de loteamentos e planejamento das cidades, o que as tornavam facilmente esquecidas nas prateleiras das bibliotecas. Mas, mais que isso, ela foi levada a descobrir que as práticas acadêmicas e profissionais não consolidam diretrizes e respostas que saíam da sua exclusiva área de contribuição. A partir da constatação de que as questões envolvendo loteamentos abrangem repertórios de várias áreas do saber e que estas careciam de integração, ela passou a defender uma participação multidisciplinar na elaboração de diretrizes, normas e projetos urbanos que visem a uma ocupação do solo mais adequada tanto para o meio ambiente quanto para a comunidade residente. Consolidou essa concepção através de uma proposta de metodologia para implantação de loteamentos urbanos e da inclusão de diretrizes urbanísticas populares para processos de licenciamentos de pequenos e médios loteamentos. Isso significa incluir a participação pública na definição de diretrizes urbanísticas e dotá-la de respaldo técnico e científico para garantir a proteção de áreas de reconhecida fragilidade ambiental, como Áreas de Preservação Permanente (APP), e a efetivação de áreas institucionais em locais que de fato sejam de interesse público, visando à prevenção de ônus sociais e impactos ambientais futuros derivados destes empreendimentos. O loteamento urbano se desenvolve numa gleba em que, ao longo da abertura de novas vias, o solo é subdividido em lotes a serem ocupados por edificações; em que devem ser previstas também áreas destinadas a receber equipamentos urbanos e comunitários, que atendem as atividades relacionadas à educação, cultura, saúde, lazer e similares; além de áreas livres de uso público, de acordo com taxas estabelecidas pelo poder municipal e estadual, na ausência daquele.
Segundo Fernanda, as prefeituras normalmente não lidam de maneira preventiva com as implicações de suas ações. Impactos sociais e ambientais poderiam ser prevenidos por meio da aprovação de loteamentos que de fato tivessem por diretrizes a incorporação das necessidades do local, pois se sabe que o posicionamento de ruas causa erosão, dificulta a subida de ônibus e inclusive o trânsito de moradores. Ignora-se que os projetos em si indicam que tipo de sociedade está se formando. E talvez resida aí o maior alerta dirigido aos poderes públicos, às comunidades e aos profissionais do urbanismo.
PROJETOS ADEQUADOS
Como qualquer loteamento gera impactos ambientais e sociais, o seu projeto deve levar em conta aspectos físicos decorrentes da modelagem terrestre e do substrato físico de origem – campo vastamente percorrido pelos estudos geocientíficos; aspectos sociais referentes ao uso das áreas do loteamento e de seu entorno; e a adequação das áreas institucionais aos fins a que se destinam. Para tanto há necessidade de se conhecer a lógica hidrológica e geomorfológica da bacia hidrográfica onde ele se localiza e a especificidade dos elementos urbanos, visando sua melhor inserção na gleba. Estas questões podem ser consideradas no processo de expedição de diretrizes urbanísticas e ambientais do loteamento ou ignoradas, tanto com vistas a maximizar os lucros de investidores ou por desconhecimento do próprio poder público, que direciona esta ocupação e fornece as diretrizes para que ela se estabeleça. Assim é que, muitas vezes, as áreas destinadas obrigatoriamente à preservação do verde e à instalação de equipamentos comunitários como escolas,
creches, postos de saúde são fracionadas ou direcionadas para os piores locais, inviabilizando seus usos. Para a pesquisadora, o conhecimento específico da hidrologia e da geomorfologia da bacia hidrográfica, se compatibilizado a uma dimensão territorial de fato mais utilizada pelos planejadores e executores de empreendimentos urbanos, como uma abordagem que adotasse a escala das encostas das bacias, possibilitaria que conhecimentos específicos fossem incorporados com maior precisão aos projetos urbanos, ampliando a chance de melhor adequá-los à superfície topográfica e prevenindo impactos decorrentes de rupturas no sistema natural. São recorrentes os problemas oriundos de ocupação de áreas de risco, os efeitos de terraplanagens associados à concentração de fluxo de água pelas ruas e galerias de drenagem que aceleram processos de erosão. O solo carreado assoreia sistemas de drenagem e as enchentes se configuram como um dos efeitos cumulativos decorrentes desse padrão de ocupação. Os impactos sociais são sentidos pela destruição de obras civis e riscos de vida humana. Com o objetivo de subsidiar e garantir que as diretrizes exigidas pelo poder público se efetivem, Fernanda Nascimento Corghi apresenta tese em que propõe critérios físicos e sociais condizentes com o substrato físico envolvido e com os avanços sociais da política urbana como requisitos urbanísticos para projetos de loteamentos. O trabalho “Diretrizes para implantação de loteamentos urbanos: aspectos físicos, legais e sociais”, apresentado à Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp, foi orientado pelo professor Diógenes Cortijo Costa. Foto: Alvaro Kassab
Loteamento na região de Campinas: segundo a tese, impactos sociais e ambientais poderiam ser prevenidos se fossem incorporadas, nas diretrizes, as características do local
Nele são correlacionados arranjos da forma urbana física, como ruas, quadras, lotes, etc. com os apontamentos da cartografia geocientífica preventiva de impactos ambientais. Utilizando como estudo de caso uma bacia hidrográfica do município de Bauru, a pesquisadora analisou a possibilidade de inclusão da cartografia geotécnica de prevenção à erosão como instrumento norteador da implantação de loteamentos menos impactantes.
PROPOSTA Diante da constatação de que a confecção da cartografia geocientífica é realizada em pequenas e médias escalas e que a utilizada nos Planos Diretores e empreendimentos urbanísticos é necessariamente a grande escala, a autora concebe uma proposta metodológica a partir da adoção de uma unidade física condizente com os planejamentos urbanos e geocientíficos. No estudo a pesquisadora correlaciona elementos do sistema natural – físico, e antrópico – urbano, chamando essa correlação de unidade geourbanística. Ela acredita que a utilização dessa unidade como suporte à criação de cenários de impacto permita definir requisitos urbanísticos para loteamentos, evitando também a destinação de áreas públicas em locais com maior fragilidade a impactos na bacia hidrográfica. Partindo do pressuposto de que o aparelho burocrático institucional tende a negligenciar questões sociais e físicas, o objetivo específico do trabalho foi o de propor novas maneiras de inseri-las no arcabouço legal já nas etapas preliminares do processo de abertura de um loteamento. Fernanda consolidou os avanços decorrentes de seus estudos propondo alterações na legislação de parcelamento do solo (Lei Federal 6.766/79), com o propósito de torná-la mais explícita em relação aos maiores avanços da política urbana, incorporando-lhe uma nova conceituação para gleba e maior participação pública direta tendo em vista o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo.
O TRABALHO
Foto: Antoninho Perri
Publicação Tese: “Diretrizes para implantação de loteamentos urbanos: aspectos físicos, legais e sociais” Autora: Fernanda Nascimento Corghi Orientador: Diógenes Cortijo Costa Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) A arquiteta Fernanda Nascimento Corghi: defendendo a participação pública na definição de diretrizes urbanísticas
Ao longo de três extensos capítulos da tese, a autora aborda particularmente os impactos ambientais, sobretudo quanto à erosão – suas causas, tipificações, medidas preventivas e corretivas, e quanto às enchentes no meio urbano; analisa as soluções advindas das geociências através das cartas temáticas e das leis que regem o solo urbano municipal; discute os loteamentos em relação aos aspectos sociais, físicos e legais; defende a necessidade de visão integrada entre aspectos ambientais e sociais, de modo a facilitar o trânsito de moradores por vias traçadas com inclinações adequadas e a aproximação entre moradia, trabalho, lazer e centros de suporte da vida cotidiana, evitando o uso do carro. Os conhecimentos advindos dessas várias áreas de estudo foram empregados pela pesquisadora no desenvolvimento de uma metodologia destinada a implantação de loteamentos urbanos, que foi aplicada no estudo de caso da Bacia hidrográfica do Córrego da Água Comprida, com 4,5 km de extensão, uma das dez bacias hidrográficas localizadas na área urbana do município de Bauru. Para a pesquisadora, a metodologia desenvolvida permite que os loteamentos urbanos possam atender critérios físicos e ambientais através do estabelecimento de uma parceria entre várias áreas do saber. Isso quanto ao meio físico. Ela incorpora um maior envolvimento social e político nas modificações propostas para a legislação. E enfatiza: “Procuro mostrar o que deve ser feito para que as diferentes áreas envolvidas trabalhem junto”. Para a arquiteta, ficou claro a necessidade de um trabalho multidisciplinar com a participação concomitante de profissionais de várias áreas de maneira a integrar os diferentes conhecimentos específicos numa mesma escala, que deve ser a da encosta, aos conhecimentos populares no estabelecimento de diretrizes urbanísticas para loteamentos urbanos.
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PAINEL DA SEMANA Workshop com arqueólogos - O Laboratório de Arqueologia Pública Paulo Duarte (LAP) do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (Nepam) da Unicamp recebe, dias 29 de setembro e 10 de outubro, os arqueólogos Neil Silberman e Angela Labrador. Eles ministrarão um workshop sobre abordagem de valorização do patrimônio para o desenvolvimento sustentável. Inscrições e outras informações no site http://www.lapvirtual.org/ ou e-mail eventos.lapunicamp@gmail.com. Jornada de Psicanálise - O Grupo de Estudos de Psicanálise (GEPSI) da Unicamp realiza, de 29 de setembro a 1 de outubro, no Anfiteatro 1 da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), a I Jornada de Psicanálise com o tema “ A violência, o indivíduo e a sociedade”. Serão três noites de palestras e debates, sempre às 18h15, com especialistas no assunto. O evento é organizado pelos coordenadores do GEPSI e pelo professor Mário Eduardo Costa Pereira. A proposta da jornada é a de levantar a discussão sobre a violência no Brasil e seus impactos no indivíduo, na sociedade e consequentemente no sistema de saúde. Em 29 de setembro, primeiro
dia de evento, a professora Taniele Rui, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), fala sobre “Violência na atualidade”. No dia 30, o professor Mário Pereira, da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), aborda: “Intervenção psicanalítica para a vítima da violência”. “Perversão, perversidade e violência: visão psicanalítica” é o tema que será tratado pelo professor Roosevelt Cassorla (FCM), em 1º de outubro. Mais informações podem ser obtidas pelo e-mail jornadagepsi@gmail.com Juventude e educação - A Faculdade de Educação (FE), por meio do Laboratório de Estudos sobre Violência, Imaginário e Juventude (Violar), encerra, dia 29 de setembro, às 14 horas, no Salão Nobre da FE, a programação do III Seminário Violar com a mesa-redonda “Educação e criação de novas possibilidades de vida: diálogos com a Arte”. Mais informações podem ser obtidas na página eletrônica: http://www.fe.unicamp.br/semviolar/ Fórum de Sociedade e Desenvolvimento - No dia 30 de setembro, às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp, acontece mais uma edição do Fórum Permanente Sociedade e Desenvolvimento com o tema “Depois de junho de 2013: qualidade da democracia, debilidades institucionais e as novas formas de ativismo político no Brasil”. O evento, que será transmitido pela TV Unicamp, está sob a responsabilidade da professora Fabíola Brigante Del Porto, do Centro de Estudos de Opinião Política (Cesop) da Unicamp. Inscrições e outras informações no link http://www.foruns.unicamp.br/foruns/projetocotuca/ forum/htmls_descricoes_eventos/soc_e_desenv01.html Fórum de Vida e Saúde - O I Seminário da Unicamp sobre longevidade e qualidade de vida 2014 acontece na próxima edição do Fórum Permanente de Vida e Saúde, dia 1 de outubro, das 9 às 17 horas, no Centro de Convenções da Unicamp. O objetivo é fomentar os diálogos relacionados à longevidade e qualidade de vida do idoso como evento de lançamento do Programa UniversIDADE, que contemplará atividades nas áreas de Arte e Cultura; Esporte e Lazer; Saúde Física e Mental; Sócio Cultural e Geração de Renda, voltadas a pessoas com idade a partir dos 50 anos. Inscrições, programação e outras informações, na página eletrônica http://www.foruns.unicamp. br/foruns/projetocotuca/forum/htmls_descricoes_eventos/saude78. html. O encontro será transmitido pela TV Unicamp. Mais detalhes: 19-19-3521-4759. Pós-graduação em tecnologia da FT - O Programa de Pós-graduação em Tecnologia da Faculdade de Tecnologia (FT) da Unicamp abre inscrições ao processo seletivo dos cursos de mestrado e doutorado em outubro. O Programa contempla a transmissão de conhecimentos nas áreas tecnológicas aliadas a uma sistemática reflexão interdisciplinar e propõe-se a incorporar candidatos com diferentes origens acadêmicas. O Programa possui 3 áreas de concentração: (i) Ciência do Materiais, (ii) Sistemas de Informação e Comunicação e (iii) Ambiente. Mais informações no site http://www.ft.unicamp. br/posgraduacao/processoseletivo ou telefone 19 -2113-3401. Fórum Educação e Desafios do Magistério - Nos dias 1 e 2 de outubro, no Centro de Convenções da Unicamp, acontece o Fórum Educação e Desafios do Magistério “Educação infantil e
DESTAQUE
anos iniciais do ensino fundamental: aproximações e interlocuções entre múltiplos olhares”. O evento, cuja abertura ocorre às 9 horas, é organizado pelo Grupo GEPEDISC-Culturas Infantias da Faculdade de Educação (FE) e pela Faculdade de Educação Física (FEF). Inscrições, programação e outras informações no link http://www.fef. unicamp.br/fef/forumeducacaoinfantil Unicamp Ventures - Evento que está em sua nona edição acontece no dia 3 de outubro, das 14 às 18 horas, no auditório 2, no Centro de Convenções da Unicamp. É voltado para empreendedores, investidores, alunos, executivos e interessados no tema empreendedorismo. O Unicamp Ventures surgiu no ano de 2006 e é organizado pelo Grupo Unicamp Ventures com o apoio da Agência de Inovação Inova Unicamp, órgão da reitoria responsável pela proteção e transferência da tecnologia gerada na Unicamp e pelos projetos de cooperação entre a Universidade e empresas. O objetivo do evento é consolidar e ampliar a rede de empreendedores oriundos da Universidade. Mais informações: telefone 19 3521-2623 ou e-mail carolina. octaviano@inova.unicamp.br Prêmio Paepe - A Diretoria Geral de Recursos Humanos (DGRH) da Unicamp recebe, até 3 de outubro, as inscrições de projetos para o Prêmio PAEPE 2014. Confira as regras e novidades no link http://www.dgrh.unicamp.br/premiopaepe/
TESES DA SEMANA
Economia - “Redes, tecnologia e meio ambiente” (mestrado). Candidata: Josilene Andrade Ramos. Orientador: professor José Maria Ferreira Jardim da Silveira. Dia 2 de outubro, às 16 horas, no sala 23 do pavilhão da Pós-graduação do IE. Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo - “Avaliação técnica e econômica de edifícios residenciais com sistemas construtivos alternativos” (doutorado). Candidato: João Carlos Rocha Braz. Orientador: professor Vladmir Antonio Paulon. Dia 2 de outubro, às 9 horas, na sala CA22 da FEC. Engenharia Mecânica - “Explorando o comportamento de materiais metálicos através de estudos cristalográficos in situ” (mestrado). Candidato: Guilherme Abreu Faria. Orientador: professor Antonio José Ramirez Londono. Dia 30 de setembro, às 14 horas, no auditório KD da FEM. Engenharia Química - “Oxidação de compostos orgânicos voláteis em fase gasosa por fotocatálise heterogênea com TiO2 e TiO2/Pd” (mestrado). Candidata: Tânia Miyoko Fujimoto. Orientador: professor Edson Tomaz. Dia 29 de setembro, às 14 horas, na sala de defesa de Teses do bloco D da FEQ.
“Simulação do processo de destilação extrativa usando líquidos iônicos e o modelo de não equilíbrio na desidratação do etanol” (doutorado). Candidato: Moisés Alves. Orientadora: professora Maria Regina Wolf Maciel. Dia 2 de outubro, às 14 horas, na sala de aula PG05 do bloco D da FEQ. “Aplicação da teoria do caos em um leito fluidizado utilizando-se partículas A, B e D da classificação Geldart” (mestrado). Candidato: Wesley Heleno Prieto. Orientador: professor Marco Aurelio Cremasco. Dia 2 de outubro, às 14 horas, na sala de defesa de teses do bloco D da FEQ. “Pré-tratamento de bagaço de cana com Co2 supercrítico” (mestrado). Candidato: Alan de Siqueira Butzke. Orientadora: professora Maria Aparecida Silva. Dia 3 de outubro, às 14h30, na sala de defesa de Teses do bloco D da FEQ. Física - “Análise temporal de correlatos hemodinâmicos associados à atividade epileptiforme através da técnica de EEG-RMf simultâneos” (doutorado). Candidato: Guilherme Côco Beltramini. Orientador: professor Roberto José Maria Covolan. Dia 3 de outubro, às 14 horas, no auditório da Pós-graduação do IFGW. Linguagem - “Gêneros poéticos na comédia de Plauto: Traços de uma poética plautina imanente” (doutorado). Candidata: Lilian Nunes da Costa. Orientadora: professora Isabella Tardin Cardoso. Dia 30 de setembro, às 14h30, na sala de defesa de teses do IEL. Medicina - “Solução salina hipertonica é uma ferramenta útil para a identificação microbiológica em culturas das vias aeríferas na Fibrose Cística?” (mestrado). Candidata: Adriana Carolina Marques Ferreira. Orientador: professor Jose Dirceu Ribeiro. Dia 29 de setembro, às 9 horas, na sala 5 do CIPED. “Avaliação do efeito do flavonóide kaempferol e do hormônio prolactina no processo de diferenciação de células tronco mesenquimais obtidas de tecido adiposo em células beta pancreáticas” (mestrado). Candidato: Raphael Fontoura de Oliveira. Orientadora: professora Angela Cristina Malheiros Luzo. Dia 29 de setembro, às 9 horas, na sala de aula Verde da Comissão de Pós-graduação da FCM. Odontologia - “Avaliação da atividade farmacológica de extrato bruto diclorometano das folhas de piper umbellatum microencapsulado e livre padronizado em 4-nerolidicatecol” (mestrado). Candidata: Leilane Hespporte Iwamoto. Orientador: professor Rodney Alexandre Ferreira Rodrigues. Dia 29 de setembro, às 9 horas, na sala de seminários da Morfologia da FOP. “Avaliação do desempenho de duas escalas de classificação de risco familiar e sua aplicação na atenção à saúde bucal” (mestrado). Candidato: Vinício Felipe Brasil Rocha. Orientadora: professora Glaucia Maria Bovi Ambrosano. Dia 29 de setembro, às 13h30, na sala de seminários 2 da Odontologia Social da FOP. Química - “Hsp90 humana: interação com a co-chaperona Tom70 e efeito do celastrol na estrutura e função” (doutorado). Candidata: Letícia Maria Zanphorlin Muramaki. Orientador: professor Carlos Henrique Inacio Ramos. Dia 2 de outubro, às 14 horas, no miniauditório do IQ.
DO PORTAL
Unicamp passa a oferecer
cursos na plataforma Coursera Unicamp e a USP passaram, no último dia 17, a integrar o Coursera, uma plataforma educacional aberta, com a proposta de oferecer os primeiros cursos em língua portuguesa. A parceria foi lançada na Casa do Saber em São Paulo, com a presença do pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários da Unicamp, João Frederico Meyer; do pró-reitor de Pesquisa da USP, José Krieger; da co-fundadora e presidente do Coursera, Daphne Koller; e do presidente da Fundação Lemann, Jorge Paulo Lemann. A plataforma reúne universidades e instituições de excelência de todo mundo para oferecer cursos on-line abertos e gratuitos, conhecidos como MOOCs (Massive Open Online Course), sobre uma ampla gama de disciplinas. A parceria com duas das mais importantes universidades brasileiras significou uma nova oportunidade para estudantes de língua portuguesa, que não contavam com esse idioma na plataforma até o momento. “Com esta iniciativa, damos um passo significativo para a democratização do aprendizado, ampliando as possibilidades de acesso ao volume significativo de conhecimento gerado na Unicamp,” pontuou o coordenador-geral da Unicamp, Alvaro Penteado Crósta, em mensagem gravada especialmente para o encontro. Segundo a presidente do Coursera, o número de estudantes brasileiros atraídos pela plataforma já ultrapassou a casa dos 300 mil, o que faz do Brasil o 5º país com mais acessos à ferramenta, mesmo sem cursos em português. “A participação da Unicamp e da USP significará atingir um número ainda maior de estudantes com conteúdo de alta qualidade”, afirmou Koller. A plataforma permitirá às duas universidades alcançar um número maior de estudantes do que sua capacidade física suporta, além de atingir interessados de regiões que teriam dificuldade de acessar aulas presenciais. Os presentes ressaltaram os cursos na plataforma como uma quebra no paradig-
Foto: Antonio Scarpinetti
O pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários da Unicamp, João Frederico Meyer: “Nós podemos investir numa aprendizagem em que o aluno controla o seu tempo”
ma da educação tradicional. “Nesse novo paradigma, nós podemos investir numa aprendizagem em que o aluno controla o seu tempo, sabendo quando estará pronto para fazer a prova”, destaca Meyer, “O aluno passa a ser sujeito do aprendizado em ambiente criado pelo professor”. O Coursera combina os princípios da aprendizagem tradicional, com vídeo aulas, conteúdo interativo e a interação com uma comunidade global, oferecendo aos estudantes uma experiência de aprendizagem online completa. Além disso, a plataforma conta com uma série de mecanismos de feedback que possibilita às instituições que oferecem os cursos ter clareza das estratégias de ensino que estão sendo efetivas para a aprendizagem. Um exemplo são as questões que devem ser respondidas após cada segmento curto dos cursos. Outra estratégia que, além de possibilitar a formulação de questões dissertativas, enriquece o aprendizado pelo intercambio direto entre os estudantes, é a avaliação pelos pares. Por meio dessa estratégia, os estudantes voluntariamente corrigem as respostas dissertativas uns dos outros, apontando onde é preciso desenvolver melhor o conteúdo. Na Unicamp, os cursos serão realizados pela Rádio e TV Unicamp, com supervisão do professor Samuel Rocha de Oliveira, seu diretor. Os primeiros cursos desenvolvidos têm como foco: empreendedorismo, processamento digital de sinais e português para estrangeiros. Além das duas universidades, o encontro selou a parceria do Coursera com a Fundação Lemann, para a ampliação do número de cursos em outros idiomas com legendas em português, e com o portal R7, para divulgação do projeto. Os professores da Unicamp que estiverem interessados em participar dessa iniciativa devem procurar Glaucia Lorenzetti, na Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários. (Gabriela Villen)
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Estudo da FEA demonstra que fruta tem alto rendimento em polpa
Tese atesta viabilidade industrial da mangaba Fotos: Reprodução
ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br
m 2012, as exportações brasileiras de frutas frescas totalizaram US$ 619 milhões, representando um volume de 693 mil toneladas. Um dos destinos? O mercado de sucos prontos que, apesar de estar em constante ascensão no Brasil, ainda traz limitação de sabores nos supermercados. A alimentação saudável e a inserção da mulher no mercado de trabalho são apontados como os principais fatores que justificam este crescimento. Na União Europeia, o mercado de sucos de frutas e néctares registra retração desde 2009, devido à precariedade da situação econômica na zona do euro, com a inflação e o desemprego. A mangaba (Hancornia speciosa Gomes) é um fruto do Cerrado brasileiro com características sensoriais excelentes, mas ainda o seu consumo é pouco difundido no país. A comercialização aos poucos está se despontando, porém com base na informalidade – em geral à margem das rodovias brasileiras e em feiras livres. Mas vem uma reação: os extrativistas do Cerrado começam a se organizar em cooperativas, pois lá quase toda a produção (segundo o IBGE, 722 mil toneladas em 2010) ainda provém do extrativismo. Um estudo de doutorado da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) revelou que essa fruta tem características muito atrativas para o setor agroindustrial. Primeiro porque apresentou alto rendimento em polpa (77%) e segundo pela boa estabilidade física, principalmente quando o assunto é o néctar. A bebida não tem separação de fases, o que é comum nos néctares de outras frutas, que até informam o consumidor na embalagem com o termo “agite antes de beber”. “É uma boa opção para aumentar o período em que a fruta permanece adequada para consumo”, constatou a engenheira de alimentos Danielle Godinho de Araújo Perfeito, autora da tese, orientada pelo docente da FEA Flávio Luís Schmidt. Segundo a pesquisadora, quando o fruto está perto do seu máximo desenvolvimento, desprende-se da árvore e completa o amadurecimento no chão (frutos “de caída”), entre 12 e 24 horas. São os frutos mais valorizados. “Mas é preciso muita experiência para saber a hora exata da colheita.” Por ser tão perecível, a mangaba é destinada, em geral, à indústria, normalmente sendo usada, além de no preparo de sucos, também de sorvetes, doces e bebidas. Quando madura, precisa ser consumida rapidamente, uma vez que isso pode ser um empecilho a sua comercialização. Por isso, a maior parte da colheita é feita no pé, e o fruto pode ser consumido em dois a quatro dias.
PECULIARIDADES A pesquisadora investigou a mangaba (palavra de origem indígena que significa “coisa boa de comer”, também conhecida como mangabiba, mangaíba, fruta-de-doente) –, originária de regiões de vegetação aberta como o Cerrado e a Caatinga, muito apreciada pelo seu aroma e sabor, associado ao elevado valor nutritivo. Tem cor amarelada, formato arredondado e chega a medir 6 cm. A mangabeira é uma planta arbórea de porte médio que atinge de cinco a dez metros de altura. O Cerrado abrange uma área de 204 milhões de hectares, distribuídos especialmente nos Estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Bahia, Piauí, Maranhão e Distrito Federal. Lá ocorre uma florada pequena em junho e outra grande em novembro, mas apenas uma safra de frutos por ano, no período de outubro a dezembro. A doutoranda conta que começou a desenhar a sua pesquisa ao observar que a mangaba era muito comum na sua região – em Goiânia – e que eram escassos os estudos de tecnologias adequadas ao processamento das espécies nativas na região.
SE é o maior produtor
Mangabeira: típica do Cerrado, árvore atinge de cinco a dez metros de altura Fotos: Divulgação
A engenheira de alimentos Danielle Godinho de Araújo Perfeito: caracterização física e química da fruta
Nas décadas de 1980 e 1990, vários Estados apareciam na lista do IBGE como produtores de mangaba, como Pernambuco, Piauí, Pará, Mato Grosso, Ceará, Goiás, Mato Grosso do Sul, Maranhão e Rio de Janeiro, porém não houve mais registros nos anos seguintes. Atribui-se esse fenômeno ao pouco uso da fruta na maioria desses Estados e ao desaparecimento de áreas naturais de ocorrência onde se praticava o extrativismo. Em Sergipe, maior produtor de mangaba do país, a coleta da mangaba é realizada tradicionalmente por mulheres, que se revezam entre essa atividade e a pesca do siri, ostra, sururu. A fruta, em muitos casos, significa a sobrevivência de centenas de famílias. Hoje, o projeto Catadoras de Mangaba, viabilizado pela Petrobras, está percorrendo longos caminhos, por entre areias escaldantes, e atravessando mais cercas para ganhar acesso às mangabeiras e aos seus frutos.
tiveram boa aceitação e, dentre os consumidores, 63% opinaram positivamente quanto à intenção de compra, algo significativo.
VIABILIDADE
Amostra de polpa usada nos experimentos: 77% de aproveitamento
Em sua opinião, conhecer as propriedades químicas e tecnológicas da mangaba ajuda a fornecer uma ferramenta para a criação de novos produtos, favorecendo o desenvolvimento sustentável, “visto que compreende não somente a conservação do meio ambiente, mas também a melhoria dos aspectos sociais e econômicos da população local”. Estudos sobre as características físicas e químicas dos frutos da mangabeira do Cerrado, além do processamento, são alternativas para garantir a disponibilidade do fruto na entressafra e difundir o consumo. “Os frutos da mangabeira possuem grande potencial de mercado, uma vez que a sua oferta não consegue atender a demanda encontrada”, garantiu. Sua polpa pode ser consumida in natura e ainda ser empregada para industrialização de doces, geleias, compotas, vinho, vinagre, entre outros produtos. O setor frutícola do Brasil, comentou a doutoranda, é um dos poucos com área disponível e diversidade de frutas para atender ao crescimento da demanda externa por frutas e derivados.
PROCESSO Após lavagem, a mangaba segue direto para despolpamento. Como os frutos maduros apresentam casca muito fina e a polpa mole, o processo de despolpa é feito
pela maceração do fruto e o seu peneiramento. Ao néctar, além do conteúdo necessário do fruto, são adicionados água e açúcares para sua formulação, bem como ácidos e vitaminas. A tese de Danielle envolveu a caracterização física e química da mangaba in natura e a avaliação de diferentes processos de extração da polpa. Ela também buscou caracterizar a polpa, elaborar um néctar de mangaba e testar sua estabilidade física. A pesquisadora quantificou compostos fenólicos e determinou atividade antioxidante in vitro dos frutos, polpa e néctar de mangaba. Outra tarefa que lhe coube foi avaliar sensorialmente bebidas à base de mangaba em diferentes potenciais mercados consumidores e analisar a viabilidade econômica de uma unidade processadora de néctares de frutos nativos do Cerrado. O estudo das características dos frutos em três diferentes estágios de maturação (verde, semimaduro e maduro) revelou que as mangabas do Cerrado apresentaram uma ligeira mudança de coloração no estágio maduro, o que possibilitou a verificação da maturidade com maior exatidão pelos parâmetros de textura e teor de sólidos solúveis. Danielle propôs uma maneira diferente de incorporação da polpa de mangaba em bebidas (na forma de esferas em suspensão). Essas bebidas, com “bolinhas” de polpa de mangaba espalhadas pelo líquido,
Na tese, a doutoranda fez um estudo de uma Unidade Produtora de Néctar de Frutos do Cerrado e, pela análise de fluxo de caixa, essa unidade sinalizou viabilidade econômica com taxa interna de retorno (TIR) de 39,54% para um projeto sem financiamento e de 83,02% para um projeto com financiamento. Nos dois estudos, os valores da TIR foram superiores às taxas de juros vigentes para implantação de projetos agroindustriais, o que torna o projeto bastante convidativo. Na avaliação do tempo decorrido entre o investimento inicial e o momento no qual o lucro líquido acumulado se iguala ao valor desse investimento (o payback), o projeto com financiamento foi mais vantajoso com payback de dois anos e quatro meses. O estudo provou que a instalação da Unidade Produtora de Néctar é promissora e que pode fortalecer a economia local, gerar empregos diretos e indiretos, e aumentar a arrecadação e a sustentabilidade ambiental. A pesquisa da doutoranda foi realizada entre 2010 e 2012, empregando frutos da safra de 2010 oriundos do Cerrado goiano, em sua maioria doados pela Estação Experimental da Universidade Estadual de Goiás, na Unidade Universitária de Ipameri.
Publicação Tese: “Processamento da polpa de mangaba (Hancornia speciosa Gomes)” Autora: Danielle Godinho de Araújo Perfeito Orientador: Flávio Luís Schmidt Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)
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Campinas, 29 de setembro a 5 de outubro de 2014
Comecar de novo
Tese mostra como, no auge do sucesso, Ivan Lins se reinventou e redirecionou sua carreira Foto: Divulgação
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PATRÍCIA LAURETTI patricia.lauretti@reitoria.unicamp.br
a história da música popular brasileira, alguns artistas, mesmo consagrados pelo público e crítica, não receberam até hoje a devida atenção da academia ou da literatura especializada. É o caso de Ivan Lins, um músico pouco estudado, que agora é personagem central de tese de doutorado na Unicamp. A autora do estudo, Thais Lima Nicodemo, revisitou 15 anos da carreira do compositor para tentar entender como Ivan Lins conseguiu estabelecer seu lugar na MPB, e o que a trajetória dele representou no cenário cultural, social e político dos anos de 1970 e meados de 1980, período de recorte temporal da tese. “Meu trabalho teve três frentes: a canção popular brasileira, sua relação com a sociedade no período da ditadura militar e as transformações da indústria da cultura. O objetivo era entender um panorama mais amplo de um momento de mudanças muito intensas no país”, explica. É uma constatação de Thais a de que Ivan Lins não tem espaço proporcional ao que representa na produção da MPB. “Escolhi estudá-lo na tentativa de fazer jus à ausência dele da historiografia e, principalmente, porque o considero um artista muito emblemático desse momento do Brasil, marcado pela intensificação da industrialização e urbanização da sociedade, dentro do processo de globalização da economia e de internacionalização da cultura”. Para a autora, o compositor processou muito bem esta época, que exigiu do artista uma adaptação a novas formas de atuação frente a uma nova dinâmica organizacional da indústria cultural. Thais também tem uma história pessoal com Ivan Lins. É pianista, como ele, e aos 13 anos dedilhou no instrumento as primeiras notas de “Daquilo que eu sei”. A pesquisadora já havia se encantado com outras canções como “Bandeira do Divino” e “Somos todos iguais nessa noite”. Desde os 10 anos frequenta os shows do compositor, que sempre a recebeu no camarim. Desde então, ela o considera uma espécie de padrinho. “Ele sempre me deu muita atenção, me ouviu tocar, incentivou, deu conselhos, participou da minha evolução pessoal. Durante a pesquisa dialogamos muitas vezes”. Para compor sua tese, Thais procurou periódicos da época. Fez uma extensa investigação em jornais e revistas. “Selecionei tanto entrevistas como matérias e críticas sobre Ivan Lins. Foi um material com o qual dialoguei o tempo inteiro para entender não apenas a recepção da obra dele, mas também como funcionava o processo de legitimação do artista até se tornar um nome consagrado”. Mas o material primeiro, sempre foi a música. Thais partiu das gravações e transcreveu muita coisa, observando, também, a relação entre música e letra. Nesse aspecto, uma ressalva. Ivan Lins escreve poucas letras, relembra a autora da pesquisa. A maior parte das palavras cantadas por ele é do parceiro Vítor Martins, paulista de Ituverava. “Independentemente de fazer a música ou não, Ivan Lins é um cancionista. Ele dá muita atenção à palavra. E a maneira como amarra a música com o texto é sempre muito cuidadosa. Todo artesanato musical dele é bastante meticuloso”. Nem todos que acompanham a carreira de Ivan Lins sabem, mas quando ele começou, no final dos anos 1960, foi como compositor ligado ao soul. Foi inclusive um dos grandes expoentes do estilo, muito explorado neste período pelos brasileiros. “Tanto a parte performática quanto a maneira de cantar, rouca e gritada, faziam sucesso no país. Ivan Lins fazia uma praia mais rhythm and blues que tinha a ver com Elton John, Stevie Wonder e Jimmy Webb” comenta Thais. Basta acessar o áudio de seu primeiro LP, “Agora” (1970), e perceber a diferença com o artista que se conhece hoje. O Ivan Lins soul fez tanto sucesso em 1970 que ultrapassou em vendas Roberto Carlos. Thais tem os dados do Ibope que comprovam o feito. “As gravadoras estavam buscando ampliar o público jovem e o estilo que Ivan Lins fazia ia muito de encontro a
este interesse”. O começo de sua carreira se dá pela atuação em festivais universitários, como integrante do MAU – Movimento Artístico Universitário, do qual também faziam parte Gonzaguinha, Aldir Blanc, César Costa Filho, entre outros. “Eram artistas jovens, universitários que começaram a fazer música quando os mais conhecidos como Caetano, Chico e Gil estavam exilados. Havia certa retração no cenário da MPB, pós-AI-5, e eles se apresentavam como um novo movimento, depois da Bossa Nova e da Tropicália”. No V Festival Internacional da Canção de 1970, Ivan Lins levou o segundo lugar com a música “O amor é o meu país”. Foi quando a Rede Globo o chamou junto a seus colegas do MAU para fazer o programa Som Livre Exportação. Ivan Lins e Elis Regina se tornaram apresentadores ao longo da exibição, que ocorreu entre 1970 e 1971. Na mesma época o compositor começou a fazer trilhas de novelas para a emissora e, sendo cada vez mais popular, começaram as críticas, e divergências, especialmente entre setores da imprensa, do público e até entre parceiros do MAU.
GUINADA As críticas reverberaram e Ivan Lins teve consciência que era hora de mudar. “Ele passa da ascensão ao declínio, entre 1970 e 1972. Havia um olhar bastante contraditório entre o que era fazer algo artístico e o que era fazer algo comercial, e o incômodo ficou mais latente, acredito que também por causa do grande sucesso comercial e do lugar que Ivan Lins ocupou na Globo, e a relação da empresa com a ditadura e o governo militar”. O compositor reage às críticas, salienta Thais, e muda o jeito de cantar distanciando-se do soul. Neste momento a autora da tese percebe uma intenção bastante clara de Ivan Lins de ser um artista de prestígio no meio da MPB. “A dinâmica que baliza a MPB nos anos 1960 é uma coisa, na década de 1970 é outra”, observa. Os artistas de uma segunda geração precisavam se estabelecer de maneira diferente, uma vez que grandes gravadoras já haviam consolidado sua atuação no país, sobretudo a partir do governo militar, que promoveu o mercado cultural; as em-
Ivan Lins com Elis Regina no programa Som Livre Exportação, no início dos anos 70, e com a autora da tese: compositor adaptou-se às mudanças da indústria cultural
presas passaram a trabalhar com elencos fixos de nomes consagrados nos festivais dos anos 1960. Os artistas que apareciam depois como Ivan Lins e João Bosco, entre outros, já tinham de lidar de outra forma para conseguir um espaço no mercado. Aí entra, como diz a autora, o “jogar o jogo”, que o compositor estudado soube muito bem fazer. “Na visão do artista ele está em busca da verdade dele, mas sua atuação também mostra uma dinâmica do mercado, uma nova organização das indústrias que exige do artista uma postura diferente, muito mais profissionalismo, em meio a um espaço cada vez mais racionalizado”. Com o título “Modo Livre”, o compositor dá início a uma reviravolta na carreira. O disco foi um fracasso de vendas, como assinala Thais. No entanto foi nesta fase que Ivan Lins conheceu Vítor Martins, seu principal parceiro. Daí começa outro Ivan Lins, em meados dos anos 1970. “Ele grava pela RCA Victor e muda completamente, passando a fazer uma canção crítica, que fala sobre o contexto opressivo”, detalha a pesquisadora. Vem o reconhecimento, mas ainda não o sucesso. “Ele ficou muito taxado pelo soul e pela relação com a Globo e, nesse momento, tenta mudar sua imagem pública”. Outra guinada na carreira foi a ida do compositor para a EMI Odeon “que já tinha um filão de MPB, com um catálogo reconhecido”. Esse é o momento de consagração de Ivan Lins segundo a autora. “Primeiramente, ele grava o disco ‘Somos todos iguais nessa noite’, bem sucedido comercialmente, mas ele ‘estoura’ mesmo é com ‘A noite’. São as canções do período da abertura política, que dialogam com essa temática. Entre 77 e 80 ele realmente se legitima como artista da MPB”. Nesse momento, de acordo com Thais, Ivan Lins usa muitos ritmos brasileiros e se aprofunda na pesquisa de estilos nacionais. Foto: Antonio Scarpinetti
“A música internacional ocupa um espaço muito significativo no país e existe essa ideia de resgate de um caráter nacional, da autenticidade e preservação da música nacional”. É a fase de “Bandeira do Divino”, quando o carioca da Tijuca se rende ao interior do Brasil e ao Nordeste, acrescentando à sua música o baião, o xote, o repente e outros elementos da cultura popular, como a folia de reis.
DA RAIZ AO ESTRANGEIRO Uma nova década, a de 1980, marca mais uma mudança. Com o fim do AI-5 e com a Lei da Anistia, a MPB passa a diluir seu sentido crítico e se abre ainda mais para o universo da cultura pop. Ivan olha para o mercado internacional e estabelece uma relação com o produtor musical estadunidense Quincy Jones. Artistas renomados como George Benson começam a gravar Ivan Lins. O álbum “Give me the Night”, por exemplo, tem “Dinorah” e “Love Dance”. O mercado internacional, especialmente norte-americano, pede mais e, em 1984, os instrumentistas de jazz Lee Ritenour e Dave Grusin gravam com Ivan Lins, que excursiona com os músicos pelos EUA. Lembrando que Sarah Vaughan gravou “Madalena”, ainda em 1972. “Acho que o que chama a atenção dos jazzistas são os elementos das composições dele, as harmonias bastante complexas, uma linguagem bem jazzística, mas com o tempero da música brasileira”, reflete Thais. O recorte que Thais faz na tese termina em 1985 com a participação do compositor no primeiro festival Rock in Rio, muito bem recebida pelo extenso público, e a gravação do LP Ivan Lins, pela Som Livre, que foi seu primeiro disco de ouro. O artista muda sua imagem. “Ele tira a barba, muda o visual, vira meio sex symbol, e também consegue reconhecimento”. Estratégias de um artista de caminhos inusitados, envolvido em uma trama de tensões e contradições diante da reorganização do mercado cultural. “É um artista complexo que vivenciou esse momento de massificação, de globalização da cultura, e conseguiu acompanhar as mudanças e encontrar um espaço de atuação. Um personagem emblemático para o entendimento de novas formas de atuação dentro de uma busca por um espaço em um meio de difícil inserção”.
Publicação Tese: “Começar de Novo: a trajetória musical de Ivan Lins de 1970 a 1985” Autora: Thais Lima Nicodemo Orientador: Antonio Rafael Carvalho dos Santos Unidade: Instituto de Artes (IA) Thais Lima Nicodemo, autora da pesquisa: “Todo artesanato musical de Ivan Lins é bastante meticuloso”