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Campinas, 13 a 19 de outubro de 2014 - ANO XXVIII - Nº 610 - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

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Arte: Luis Paulo Silva

O pesquisador Tiago Novaes Angelo, da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC), desenvolveu um software voltado para a democracia representativa. A ferramenta reúne, extrai e sintetiza as opiniões de uma determinada população sobre políticas públicas, condensando-as em forma de grafos e enfatizando os conceitos mais relevantes. O trabalho foi orientado pelo professor Ricardo Ribeiro Gudwin.

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Novas frentes contra a esquistossomose Dissertação defende cidade mais compacta

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A penúria dos bancários norte-americanos Para a certificação de rebanhos de ovinos Pesquisadora analisa águas termais de Poços

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Artes marciais evitam quedas de idosos A eficácia de exercícios aeróbios para epilepsia A percepção harmônica no mundo infantil


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Campinas, 13 a 19 de outubro de 2014

Grupo caracteriza quimicamente transmissor da esquistossomose

Fotos: Antonio Scarpinetti

Pesquisadores abrem frentes de combate à doença, que é considerada negligenciada PATRÍCIA LAURETTI patricia.lauretti@reitoria.unicamp.br

esde a década de 1970, o tratamento para a esquistossomose, uma das doenças que mais atingem a população de regiões tropicais e sem acesso a saneamento básico, é feito, no Brasil, com dois fármacos: oxaminiquina e praziquantel. Como a produção de oxaminiquina foi descontinuada já há alguns anos, hoje o praziquantel é o único remédio disponível para o tratamento. É um medicamento eficaz contra todas as espécies de Schistosoma que parasitam humanos. O problema é com relação às suas formas jovens. Nesse caso a eficácia não é tão boa e, além disso, o uso recorrente do praziquantel nas principais áreas endêmicas da doença acabou deixando o Schistosoma mansoni mais tolerante ou resistente em diferentes regiões geográficas. O cenário abre caminhos para novos desafios em pesquisas sobre o parasita. A esquistossomose é uma doença negligenciada, ou seja, faz parte de um grupo de enfermidades que é alvo de pouca, ou quase nenhuma, inovação tecnológica e científica. Uma possibilidade de estudos é conhecer biomarcadores que podem ser utilizados para diagnóstico e para o tratamento da doença. As últimas pesquisas desenvolvidas no Laboratório Innovare de Biomarcadores e no Laboratório de Helmintologia do Departamento de Biologia Animal, vinculados à Faculdade de Ciências Médicas (FCM) e ao Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, contribuem para revolucionar este quadro. É o caso de três estudos que foram publicados como artigos científicos e integram a tese de doutorado da pesquisadora Mônica Siqueira Ferreira. Com a orientação do professor do curso de Farmácia da Unicamp, Ro-

drigo Ramos Catharino, e da professora do IB, Silmara Marques Allegretti, Mônica e a equipe do Laboratório Innovare conseguiram caracterizar quimicamente o verme adulto do S. mansoni e seus diferentes estágios de desenvolvimento, tendo como objetivo desenvolver um potencial método de diagnóstico da esquistossomose. Participaram também os pesquisadores Diogo Noin de Oliveira e Cibele Zanardi Esteves, que trabalham com elucidação estrutural de biomarcadores; além da doutoranda Rosimeire Nunes de Oliveira, que atua na área de desenvolvimento de fármacos para o tratamento da esquistossomose a partir de compostos e óleos essenciais obtidos de espécies vegetais. As pesquisas também analisaram a urina de animais infectados com diferentes linhagens de S. mansoni na tentativa de encontrar os biomarcadores que pudessem estar envolvidos nos mecanismos de ação do praziquantel. Todos os testes foram feitos utilizando equipamentos de Espectrometria de Massas, como MALDI-MSI (Matrix-Assisted Laser Desorption/Ionization-Mass Spectrometry Imaging) e ESI-MS (Electrospray Mass Spectrometry). São equipamentos e técnicas capazes de mostrar quimicamente como é o parasita, molécula por molécula. Normalmente, para correlacionar uma molécula de interesse com uma região específica no corpo de um verme, seria necessário extrair e processar um pedaço do parasita. O problema nesse caso é que o método inviabiliza a localização espacial das moléculas e o pesquisador não tem a noção de todo do corpo do Schistosoma mansoni. A caracterização do parasita com MALDI-MSI pode permitir o desenvolvimento de novos fármacos com diferentes estratégias de combate. “Com as várias descobertas no decorrer da tese demos início a uma nova plataforma de trabalho que denominamos ‘Parasitômica’.

As pesquisadoras Mônica Siqueira Ferreira (à dir.), autora da tese, e Cibele Zanardi Esteves: em busca de biomarcadores

Imagem do parasita: caracterização bioquímica ajuda a entender a ação de fármacos em diferentes linhagens

Ela permite não só a caracterização do organismo em estudo, mas também a detecção de fármacos ou metabólitos destes ao longo do corpo do parasita.”, acrescentou o professor Rodrigo.

NEGLIGENCIADA

A esquistossomose está relacionada a condições de clima e de saneamento básico. É um problema de saúde pública. A transmissão é feita quando os ovos do verme adulto são eliminados pelas fezes do homem infectado. Na água eclodem formas ciliadas chamadas de miracídios que infectarão caramujos de água doce da espécie Biomphalaria sp. Estes servem como hospedeiros intermediários. Quando abandonam o caramujo, os miracídios nadam livremente na forma de cercárias que penetram pela pele do homem. O contato humano com águas infectadas é a maneira pela qual a pessoa adquire a doença. O doente, com o passar dos anos, pode ter problemas sérios, desde a impossibilidade do fígado para processar algumas substâncias, em consequência das reações inflamatórias, até a desnutrição e, em casos graves, pode evoluir para um quadro de cirrose, aumento do baço, hemorragias provocadas por rompimento de veias do esôfago, e ascite ou barriga d’água. “Existem etapas no ciclo do parasita em humanos nas quais o medicamento não funciona. Nestes casos, o parasita pode permanecer vivo e continuar provocando lesões no organismo” afirmou o docente. Um dos caminhos para entender a ação de fármacos em diferentes linhagens é a sua caracterização bioquímica. Pensando desta forma, Mônica conseguiu diferenciar bioquimicamente duas linhagens do Schistosoma mansoni: uma de Belo Horizonte, capital mineira, e a outra proveniente do município sergipano de Ilha das Flores. “Em relação à linhagem isolada de SE, ainda não se conhece a patogenicidade e como esta se comporta frente ao praziquantel. Diferentemente, a linhagem isolada de Belo Horizonte já foi estudada e observa-se que é uma das mais patogênicas em relação a outras linhagens estudadas nos municípios de Campinas e a de São José dos Campos. Por enquanto conseguimos identificar que as linhagens são quimicamente diferentes e isso pode estar relacionado com a patogenicidade”, ressaltou Mônica. Determinando a patogenicidade abre-se caminho para o desenvolvimento de medicamentos adequados a cada linhagem. “Também observamos que o macho e a fêmea respondem de maneiras diferentes aos tratamentos. Desta forma, a caracterização

bioquímica do Schistosoma mansoni pode evidenciar moléculas-alvos, que permitiriam a eliminação do verme, uma vez que machos e fêmeas ‘não sobrevivem um sem o outro’”, afirma a pesquisadora. Com relação ao diagnóstico, a inovação proposta na tese é a identificação de biomarcadores do verme na urina em vez do exame de fezes tradicional, no qual procura-se identificar os ovos do parasita. O Schistosoma deixa “rastros” na urina, como compostos lipídicos. “A dificuldade do diagnóstico pelo exame de fezes é que o verme não libera constantemente os ovos, por isso às vezes temos um resultado falso negativo”, comenta Mônica. Agora os pesquisadores pretendem expandir os avanços do trabalho com a realização de testes de laboratório com diferentes linhagens de Schistosoma mansoni e outros parasitas que infectam humanos. “Esperase que os resultados obtidos possam contribuir diretamente para o desenvolvimento de novas tecnologias empregadas no controle da esquistossomose em países pobres e em desenvolvimento que ainda sofrem com elevados números de casos de portadores de doenças tropicais tidas como negligenciadas”, complementou o orientador da tese.

Publicação Artigos “Screening the life cycle of Schistosoma mansoni using high-resolution mass spectrometry” - Mônica Siqueira Ferreira, Diogo Noin de Oliveira, Rosimeire Nunes de Oliveira, Silmara Marques Allegretti, Rodrigo Ramos Catharino “Mass spectrometry imaging: a new vision in differentiating Schistosoma mansoni strains” - Mônica Siqueira Ferreira, Diogo Noin de Oliveira, Rosimeire Nunes de Oliveira, Silmara Marques Allegretti, Aníbal Eugênio Vercesic, Rodrigo Ramos Catharino

Tese: “Estudos lipidômicos aplicados à esquistossomose” Autora: Mônica Siqueira Ferreira Orientador: Rodrigo Ramos Catharino Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM) Financiamento: Fapesp e Capes

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COMPACIDADE Estudo sugere que municípios mais compactos favorecem as interações humanas Fotos: Google Street View/Divulgação

CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br

egundo a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, da ONU, o progressivo aumento das populações urbanas leva à necessidade de um modelo de desenvolvimento capaz de atender às demandas por novos serviços, habitações e infraestrutura de forma a preservar o equilíbrio econômico, social e ambiental. Na América Latina estima-se que, até 2030, entre 80% a 90% da população esteja nas cidades. Tanto nela como no Brasil vem ocorrendo um intenso processo de urbanização nos últimos 60 anos. Este cenário impõe a urgência de compreender como os modelos de urbanização podem interferir positiva ou negativamente no desenvolvimento sustentável. Dissertação de mestrado desenvolvida junto à Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp pelo arquiteto e urbanista Rodrigo Argenton Freire, orientada pelo professor Evandro Ziggiatti Monteiro, busca entender a forma urbana da RMC por níveis de compacidade, defendida por especialistas e estudiosos, segundo os quais as cidades compactas propiciam sustentabilidade urbana e aumentam as interações humanas. Realizado sob esta perspectiva, o estudo analisa como a forma urbana pode interferir nessas duas questões e contribuir para futuras ações de planejamento e desenho urbano. Segundo o pesquisador, o processo de desenvolvimento urbano compacto, que é associado à sustentabilidade, tem como aspectos principais o uso eficiente do solo e a vitalidade urbana permanente, características que são relacionadas à densidade e à diversidade do território ocupado. Embora não exista uma forma urbana intimamente relacionada ao seu desenvolvimento sustentável, é consenso que as formas urbanas com maiores densidades e diversificação de atividades apresentam melhores resultados em termos de sustentabilidade ambiental, econômica e social. O trabalho buscou então evidenciar a relação existente entre as dimensões de compacidade, através da densidade populacional e diversidade – social e de usos – e a forma urbana de três municípios da RMC, não compactos - Campinas, Hortolândia e Valinhos, partindo do pressuposto de que seria possível encontrar, mesmo neles, unidades que apresentassem maior potencial para adquirir características de cidades compactas. Apesar de restritas a pequenas áreas, estas expectativas efetivamente se confirmaram, embora as possibilidades de transformações estejam atreladas às posições geográficas e aos fatores socioeconômicos que envolvem os municípios. Ao alertar ainda para o fato de o espaço urbano, em constante transformação, ser afetado tanto pelos fenômenos locais quanto globais e que cada lugar é ao mesmo tempo universal e único, o autor cita Tolstoi: “cada lugar é, à sua maneira, o mundo”. Com o objetivo principal de relacionar a forma urbana dos três municípios estudados e suas dimensões de compacidade, o autor procura: identificar os parâmetros que orientam a construção do conceito de cidades compactas; agrupar os recortes espaciais realizados nos três municípios através das semelhanças de densidade e diversidade social; localizar características morfológicas e níveis

Na foto, exemplo de alta densidade e alta diversidade, segundo conceito do pesquisador: favorecendo a vida nos bairros

Exemplo de alta densidade e baixa diversidade: de acordo com o autor da pesquisa, solução ignora as funções cotidianas do homem urbano

de compacidade; e discutir as probabilidades de transformações em termos do modelo de cidades compactas. No trabalho foram utilizadas principalmente ferramentas de mapeamento georreferenciado com dados do censo de 2010 do IBGE. A constatação maior foi a de que, devido à legislação urbana e aos projetos entregues pelo mercado imobiliário, Campinas, Hortolândia e Valinhos se afastam do modelo de cidades compactas, pois seus processos urbanos impossibilitam desenvolvimentos mais sustentáveis. Mesmo assim, alguns locais específicos apresentam potenciais para adaptação à compactação desde que impulsionada por uma legislação urbana adequada. Em vista disso, a pesquisa procura contribuir para uma leitura das especificidades de cada local em relação às possibilidades dessa transformação.

CRITÉRIOS

Em razão da conurbação de cidades da RMC, com dinâmicas interdependentes, foram selecionados para estudo municípios contíguos: Campinas, o maior da RMC, e outros dois, conurbados com Campinas, que coincidentemente situam-se no eixo da rodovia Anhanguera mas apresentam características socioeconômicas diferentes: Hortolândia, com população de menor poder aquisitivo e Valinhos, ocupada por muitos condomínios fechados. Embora nem sempre o conceito de cidade compacta esteja muito claro, nem mesmo na literatura específica, o pesquisador se ateve àquele que se estriba particularmente na densidade populacional e na diversidade socioeconômica que, por sua vez, se caracteriza pela variedade de usos urbanos como tipos de residências, comercio, serviços, etc. O arquiteto lembra que na visão do urbanismo contemporâneo não faz mais sentido segregar as atividades de uma cidade, mas defende-se a aproximação de todos os seus equipamentos das residências, com vistas a simplificar desFoto: Antonio Scarpinetti

O arquiteto e urbanista Rodrigo Argenton Freire: uso eficiente do solo e vitalidade urbana permanente

locamentos e concentrar os serviços públicos. Diz que, para tanto “é preciso, antes das edificações, resolver a cidade, porque se ela não favorecer a sustentabilidade muito dificilmente a residência vai impactá-la de forma positiva. A ideia do estudo foi verificar como casar essas duas vertentes”. Partindo da constatação de que as cidades têm áreas de especificidades diversas, a primeira providência do pesquisador foi caracterizar os níveis de densidade e diversidade social nas diferentes áreas dos três municípios. Através do georreferencimento – ferramenta computacional que permite a tabulação de dados e sua localização em mapas – áreas das diferentes regiões de cada cidade foram identificadas em mapas de localização. Eles mostram a posição das varias regiões através de características relacionadas à forma, como áreas com predominância de prédios, de casas, de condomínios, ou preferencialmente ocupadas por indústrias, comércio e serviços. Por sua vez, a diversidade social foi determinada com a utilização de uma ferramenta da ecologia que permite identificar quão diverso é um ecossistema. No caso, o recurso utilizado permitiu caracterizar a diversidade social através de informações como faixa etária, gênero, renda, quantidade de moradores por residência, etc. Para a determinação da diversidade de uso, diante da ausência de dados oficiais, o pesquisador realizou estudo de campo. A partir de todos os elementos colhidos, ele selecionou e concentrou o estudo em três grupos com características extremas: áreas altamente densas e altamente diversas; altamente densas mas de baixa diversidade; e de baixa densidade e baixa diversidade. Estes recortes mostraram que as áreas de baixa diversidade social e baixa densidade são normalmente ocupadas por condomínios fechados; nas áreas de alta densidade e verticalizadas, mas de baixa diversidade prevalecem as classes médias mais altas; e nos bairros densos e socialmente diversos predominam as classes medias mais baixas.

CONSTATAÇÕES

A partir da leitura dos diferentes locais o autor identificou qual a potencialidade de cada recorte, de cada grupo, para transformarse em cidade compacta. Assim, por exemplo, as áreas altamente densas e altamente diversas, em que prevalecem populações com condições econômicas menores, são mais facilmente passiveis de transformações, mesmo que ainda com baixa diversidade de usos. Mesmo possuindo muitas residências, várias delas acumulam dupla função – uso misto – já que também são utilizadas para comércio ou serviços, cujos acessos são facilitados pelas vias de circulação e pelas pequenas distâncias a serem percorridas. Por outro lado, as extensas áreas fechadas dos condomínios, que não raro se sucedem, endurecem as possibilidades de mudanças, pois dificultam inclusive a circulação de veículos. O engessamento também ocorre nos espaços que priorizam a verticalização sem considerar o uso misto, pois a valorização

dos espaços expulsa os comércios e serviços menores e privilegia apenas a presença de atividades mais específicas como agências bancárias e grandes supermercados. Se várias áreas das cidades estudadas configuram situações que não são passiveis de alterações, existem bairros em que mudanças na legislação, implementadas por políticas públicas, poderiam adquirir paulatinamente as características de compacidade urbana. Segundo o pesquisador, o modelo de cidades compactas, que garanta a sustentabilidade, vem sendo descaracterizado pelas politicas públicas. Ele menciona o caso de Campinas em que a revisão do Plano Diretor do município busca um modelo de cidade compacta. Mas aponta que esse discurso tem sido usado para defender a alta densidade através da verticalização sem critérios, que configura prédios monofuncionais, residenciais ou comerciais, que, além de impedirem o convívio social impossibilitam que os moradores utilizem o entorno para suas necessidades mais imediatas. Para ele, “o trabalho teve como motivação básica questionar o que tem sido feito nos municípios e abrir caminho para a discussão de algumas soluções para o futuro com vistas à configuração de cidades compactas. A maioria das politicas urbanas está hoje voltada para a distribuição mais equilibrada das populações das cidades e o uso misto que garanta a instalação de todos os aparatos necessários para atender às necessidades dos moradores”. No trabalho ele indica algumas soluções, mas a ideia é continuá-lo no doutorado de forma que críticas e problemas já sobejamente conhecidos deem lugar a sugestões rumo às soluções. Ao final do estudo Rodrigo conclui que o modelo de cidades compactas aproxima os diferentes grupos sociais – jovens, idosos, famílias inteiras, pessoas solteiras, favorece sua interação e possibilita uma distribuição igualitária dos recursos urbanos ao minimizar distâncias, diminuir deslocamentos e os custos de implantação e manutenção da infraestrutura. Mas sua implementação depende de processos de regulamentação que garantam mudanças significativas no modo em que as cidades são formadas, no estímulo ao uso misto do solo, na produção de novas formas de habitá-la e, também, na revisão pelos arquitetos e urbanistas dos seus próprios trabalhos, que há anos reproduzem soluções ultrapassadas.

Publicação Dissertação: “Densidade e diversidade: as dimensões de compacidade urbana” Autor: Rodrigo Argenton Freire Orientador: Evandro Ziggiatti Monteiro Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)


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Campinas, 13 a 19 de outubro de 2014

Pesquisa mostra desarticulação de bancários nos Estados Unidos Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Americano compara situação da categoria no Brasil com a de seu país CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

s bancários dos Estados Unidos são uma das categorias menos sindicalizadas, e mais mal pagas, do país, com um terço dos trabalhadores recebendo algum tipo de auxílio do poder público. “Basicamente, nós damos subsídios às grandes empresas, como Walmart, McDonald’s, e também aos bancos, para pagar salários baixos e com poucos benefícios”, disse ao Jornal da Unicamp o pesquisador americano Steven Strong, que defendeu, no Instituto de Economia (IE) da Unicamp, a dissertação de mestrado “Why US Financial Workers are Unorganized: The19th century origins of a current problem” (“Por que os trabalhadores do setor financeiro nos EUA são desorganizados: as origens de um problema atual no século 19”). Na introdução de seu trabalho, Strong delineia um contraste entre a situação do bancário no Brasil e em seu país, a começar pelo vocabulário: a existência de uma palavra que distingue o funcionário do banco de seu dono “chamou minha atenção”, escreve ele. “No Brasil, a palavra ‘bancário’ carrega o respeito conquistado por um sindicato com uma longa história de vitórias”, diz a dissertação, que mais à frente acrescenta: “O trabalhador do setor financeiro nos Estados Unidos, em contraste com sua contraparte no Brasil, é talvez um dos mais negligenciados em termos de literatura acadêmica e preocupação do movimento trabalhista. O movimento trabalhista dos EUA organizou apenas 1% do setor”. Strong nota que as entidades de classe dos bancários brasileiros vêm tentando ajudar na organização dos colegas americanos. “A questão dos bancários nos EUA torna-se bem importante, para os brasileiros, com a entrada de capital americano no setor financeiro no Brasil”, disse ele. Tanto a Contraf (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro) quanto a CUT já atuaram nesse sentido. “A Contraf facilitou um acordou entre o Banco do Brasil, nos EUA, e a CWA que vai ficar como modelo”, completou. A CWA, ou Communications Workers of America, é um sindicato que congrega trabalhadores de várias áreas, incluindo tecnologia da informação e mídia. “Líderes sindicais dos EUA visitaram a Contraf no Brasil, e a Contraf apoia, com fundos, as iniciativas para organizar os bancários nos EUA. A CWA e Contraf têm uma publicação em inglês e português que circula entre os bancários nos dois países”, disse, dando exemplos da cooperação internacional entre sindicalistas do setor.

PATRÕES E EMPREGADOS

A desorganização dos bancários nos Estados Unidos, mostra o pesquisador em seu levantamento histórico, tem raízes profundas na história do país e na forma como o setor financeiro se organizou lá. Diferentemente de países como a Inglaterra ou mesmo o Brasil, que contam com uma tradição histórica de grandes instituições bancárias de alcance nacional, nos EUA os bancos nasceram pequenos e com alcance geográfico limitado. Isso levou a uma aproximação entre “banqueiro” e “bancário”, tanto do ponto de vista do trabalhador – que se via com possibilidades reais de subir na empresa, ou mesmo de vir a suceder o patrão – quanto no imaginário do movimento trabalhista, para quem o setor financeiro como um todo era visto como um adversário, sem distinção entre patrão e empregado. Mesmo quando os bancos passaram a assumir um caráter mais corporativo, a mobilidade interna, ou ao menos a impressão de mobilidade, se manteve, diz a dissertação, citando o trabalho do historiador Clark Davis, que enfatiza a importância, para os bancos americanos do início do século 20, de cultivar o “funcionário de carreira” como um modo de atrair e preservar depositantes.

Greve dos bancários no Brasil, na semana passada: para pesquisador, “brasileiros têm longo histórico de vitórias”

Foto: Antoninho Perri

O pesquisador americano Steven Strong: “Sem um movimento de auto-organização dos bancários, vai ser preciso um forte investimento das centrais sindicais”

“Os fatores que aponto no meu trabalho ajudam a entender porque não foi maior a auto-organização dos bancários nos EUA, como aconteceu na Inglaterra e outros países, e porque o próprio movimento sindical não deu mais atenção à organização dos bancários como uma categoria chave”, disse o pesquisador. “Dependendo da época em que estudamos a questão, diferentes fatores ganham destaque. Mas o grande problema, na maioria das épocas, é a falta de uma perspectiva classista em relação ao setor financeiro, que reconheça a distinção entre banqueiro e bancário, e a possibilidade de ação do bancário na luta da classe trabalhadora, contra o banqueiro”.

COMUNISTAS

A contratação de mulheres para realizar serviços bancários, a partir da Segunda Guerra Mundial – o que, na época, foi visto por muitos como uma desvalorização da carreira – e a crescente organização racional e mecanização do trabalho acabaram corroendo a ideia de que bancário e banqueiro estariam unidos numa causa comum, ou de que as perspectivas individuais e individualistas de ganho por ascensão na carreira seriam sempre melhores do que as conquistas possíveis por meio de ação coletiva por meio do sindicato, escreve o pesquisador. “Mas no momento em que o sindicalismo do setor financeiro foi mais forte, organizado pelo UOPWA (United Office and Professional Workers of America, ou Trabalhadores de Escritório e Profissionais Unidos da Améri-

ca), os próprios sindicatos e centrais sindicais dos EUA destruíram esse movimento, supostamente porque o sindicato tinha sido dominado pelos comunistas”, disse Strong. A dissertação relata como uma tentativa fracassada de greve em Wall Street, em 1948, desarticulou a organização trabalhista no setor financeiro. “O sentimento anticomunistas dos trabalhadores de Wall Street levou-os a rejeitar a UOPWA-CIO, que tinha mais experiência em organizar trabalhadores de escritório, e dispunha de recursos para grandes campanhas”, diz a dissertação. Atualmente, “sem um movimento de auto-organização dos bancários, vai ser preciso um forte investimento das centrais sindicais, e vários sindicatos, para mudar a realidade desse setor”, disse Strong. “Hoje, os bancários nos EUA são 90% mulheres, a maioria não brancas, e o movimento sindical dos EUA está ignorando esses trabalhadores, o que está ligado, como é o caso em vários setores, a um forte legado de racismo e de machismo dentro a liderança sindical”.

REVOLUÇÃO A sindicalização ampla dos bancários americanos poderia beneficiar a população dos Estados Unidos de várias formas, acredita Strong. Uma elevação dos salários reduziria a necessidade de subsídios estatais para ajudar os trabalhadores mal pagos. “Também tem a questão de ‘accountability’, e a proteção de ‘whistleblowers’”, disse ele.

“Accountability” é uma expressão que costuma ser traduzida como “prestação de contas” ou “transparência”, e inclui alocação devida das responsabilidades no caso de malfeitos. Já “whistleblower”, literalmente “soprador de apito”, é o nome dado a funcionários que denunciam práticas ilegais ou antiéticas de suas empresas. O mais famoso “whistleblower” da atualidade é Edward Snowden, que revelou ao público segredos da Agência de Segurança Nacional (NSA) dos Estados Unidos, para a qual prestava serviços. “Há muitas práticas sujas dentro do setor financeiro”, lembrou Strong. “Mas os trabalhadores precisam de organização e de direitos para se sentirem seguros e reclamar das injustiças. Isso pode beneficiar os consumidores, e talvez controle alguns dos aspectos que criaram a última crise financeira nos EUA”. O pesquisador acredita, no entanto, que os Estados Unidos precisam desenvolver um movimento de esquerda revolucionária para que os trabalhadores possam realmente se organizar. “A sindicalização dos trabalhadores é tão baixa nos EUA, e especialmente no setor financeiro, que só o aprofundamento da crise global, e o crescimento de uma esquerda revolucionária, vai mudar essa realidade”. Ele diz que os capitalistas do setor financeiro “são tão reacionários e contra sindicalização” que só uma ameaça viável de expropriação e nacionalização iria forçá-los a ceder um pouco aos sindicatos. “É o mesmo com a questão de se criar um partido dos trabalhadores nos EUA, e mudar as leis para facilitar sindicalização”. Strong acredita que uma revolução socialista nos Estados Unidos traria resultados diversos dos produzidos pelo chamado “socialismo real” do século 20. “O povo dos EUA já fez uma revolução para libertar-se do imperialismo, uma outra para quebrar o poder dos latifundiários”, enumera, referindo-se à Guerra de Independência e à Guerra Civil. “Só falta a terceira, para acabar com o poder dos capitalistas, a revolução socialista”. Ele diz que, sendo os EUA um país desenvolvido com uma história bem diferente de outros onde já houve revoluções socialistas, “a sociedade resultante será bem diferente que qualquer outra experiência histórica”. “Para mim, não tem nada que pareça mais desejável, para melhorar a vida da maioria das pessoas dos EUA e do mundo, do que essa terceira revolução americana.

Publicação Dissertação: “Why US Financial Workers are Unorganized: The19th century origins of a current problem” Autor: Steven Strong Orientador: Carlos Salas Paéz Unidade: Instituto de Economia (IE)


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LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

m conjunto de modelos para identificação de três raças de ovinos, baseados em técnicas de mineração de dados que selecionam marcadores moleculares, é o resultado da dissertação de mestrado de Fábio Danilo Vieira, analista da Embrapa Informática Agropecuária. Os modelos poderão ser utilizados para certificação de raças já depositadas nos bancos de germoplasma e de novos animais a serem inclusos, além de subsidiar as associações de criadores interessadas em certificar seus rebanhos e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) no controle de animais registrados. Sendo possível estender a metodologia para qualquer espécie de animal de produção (bovinos, suínos, aves), já se trabalha na geração de um produto, na forma de uma ferramenta de genotipagem de baixo custo. A dissertação foi orientada pelo professor Stanley Robson de Medeiros Oliveira, coorientada pelo pesquisador Samuel Rezende Paiva e apresentada na Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri). Utilizando três técnicas diferentes de mineração de dados, Fábio Vieira selecionou os principais marcadores moleculares SNP (Single Nucleotide Polymorphism) nas raças Crioula, Morada Nova e Santa Inês. “A partir da intersecção desses três modelos, dentre 49 mil marcadores SNP, chegamos a um subconjunto de apenas 15, capazes de identificar as raças estudadas com acurácia acima de 80% nas predições”, afirma o autor da pesquisa. O analista explica que em técnicas de mineração são utilizados algoritmos para buscar, num volume muito grande de dados, padrões que permitam chegar a um conhecimento específico. No caso, ele recorreu ao banco do Consórcio Internacional de Ovinos, que traz dados de 72 animais das três raças brasileiras do estudo, com um total de 49.034 marcadores SNP para cada ovino. “Para dar um exemplo, em doenças como o câncer, vamos coletar o sangue, sequenciar o DNA e identificar o gene modificado no grupo de doentes. Este marcador possui seus valores, os alelos, que são únicos. O valor específico ‘A’ é encontrado apenas na raça Santa Inês, enquanto a Morada Nova e a Crioula se diferenciam por causa do SNP ‘B’ ou ‘C’.” Segundo Fábio Vieira, os ovinos destas três raças descendem de animais trazidos durante o período colonial e, em quase cinco séculos, foram submetidos a cruzamentos indiscriminados com raças exóticas – e sua importância está justamente nas características adaptativas às diversas condições ambientais brasileiras. “São raças locais, resistentes a parasitas e adaptados ao clima, relevo e vegetação. Para evitar a perda deste material genético, a Embrapa decidiu incluir as três raças no Programa de Pesquisa em Recursos Genéticos, armazenando amostras como de pele, sangue e sêmen em seus bancos de germoplasma.”

MELHORAMENTO GENÉTICO

O autor acrescenta que sua pesquisa também pode contribuir para apontar características interessantes para as raças mais produtivas em carne e leite, mas que não são tão resistentes a condições adversas. “As amostras guardadas servirão a futuros estudos de

Modelos podem subsidiar

certificação de ovinos

Três raças são identificadas com base em técnicas de mineração de dados Fotos: Divulgação

Ovinos das raças Morada Nova (acima) e Santa Inês: população no mundo gira em torno de um bilhão de cabeças

melhoramento genético, sendo que a carne ovina vem conquistando maior aceitação no mercado brasileiro. Em 2010, nosso rebanho totalizava cerca de 17 milhões de cabeças, ocupando o décimo sétimo lugar entre os países com os maiores rebanhos do mundo. Apesar do número bem menor de cabeças, o rebanho brasileiro cresceu 15,4% entre 2004 e 2010, frente à média mundial de 1,04%.” De acordo com o analista, os estudos de melhoramento genético ainda ocorrem de maneira isolada e os especialistas reclamam da falta de investimentos quando há muito campo para explorar. “A tendência deste mercado, até 2020, é de crescer mais do que o de suínos e de aves em termos percentuais. Seria formidável se esses animais tivessem as mesmas qualidades de um Santa Inês, que é resistente ao estresse térmico e a vá-

rias doenças, vive com facilidade em terrenos acidentados e suporta dias sem se alimentar. Além disso, a metodologia poderia ajudar em pesquisas sobre outros fenótipos, por exemplo, visando aumentar a produção de leite e a qualidade e maciez da carne.” Fábio Vieira observa ainda que as raças estudadas possuem sub-raças e um Crioula supostamente puro pode já ter cruzado com outros animais e perdido algumas de suas características, como de resistência ao ambiente. “Em um leilão, a raça pura não pode ser comprovada visualmente, mas este método com 15 SNPs permite analisar se os marcadores específicos estão ativados. Existe também um aspecto social na conservação desses animais, visto que são muito importantes para a subsistência dos pequenos agricultores que levam a vida no sertão.”

MICROARRANJO

DE MARCADORES

Ao buscar pesquisas correlatadas na literatura, o autor da dissertação observou que este é o primeiro trabalho utilizando as três técnicas (Lasso, Random Forest e Boosting) simultaneamente e fazendo a intersecção de resultados, em torno de dados de marcadores SNP de ovinos ou de outros organismos. “Os marcadores selecionados através desses modelos poderão gerar uma ferramenta de genotipagem de baixa densidade, como um microarranjo de SNP, para auxiliar na identificação racial dos ovinos. O importante é que, quanto menor o número de marcadores montados no arranjo, menor o custo da construção e do produto final.” Este microarranjo, conforme detalha o analista, consiste em um arranjo de estruturas microscópicas denominadas sondas, que são ligadas quimicamente a uma lâmina de vidro por robôs altamente precisos. Nas sondas são preparadas as regiões dos marcadores que se busca nas amostras, com seus respectivos alelos: na amostra da raça X, um corante vai indicar se o animal analisado possui o SNP com o alelo respectivo. “Supondo que o custo para o robô desenhar a área do SNP com 15 marcadores seja de um real cada, o preço da ferramenta seria de 15 reais. Seria inviável fazer o mesmo com 49 mil marcadores moleculares.” Fábio Vieira adianta que seu coorientador já deve estar desenvolvendo esta ferramenta, que seria de grande utilidade para zootecnistas, Ministério da Agricultura, pequenos produtores rurais e associações de criadores. “Considero a dissertação importante não só por comprovar que a combinação dessas técnicas é adequada e produz os melhores resultados com poucos marcadores, mas também por sugerir uma ferramenta para a sua aplicação, não se limitando à publicação. Esperamos que a pesquisa produza um impacto positivo no estado da arte para modelos com ovinos, abrindo caminho para a modelagem de outros fenótipos de interesse econômico da ovinocultura.”

Publicação Dissertação: “Modelos baseados em técnicas de mineração de dados para suporte à certificação racial de ovinos” Autor: Fábio Danilo Vieira Orientador: Stanley Robson de Medeiros Oliveira Coorientador: Samuel Rezende Paiva Unidade: Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) Foto: Antoninho Perri

Rebanhos no Brasil e no mundo Na dissertação de mestrado intitulada “Modelos baseados em técnicas de mineração de dados para suporte à certificação racial de ovinos”, o autor Fábio Danilo Vieira inclui dados gerais sobre rebanhos de ovinos no Brasil e no mundo, informando que os maiores estão distribuídos pelos países da Ásia, África e Oceania. A China se destaca por possuir o maior número de animais (perto de 140 milhões de 2008 a 2011, segundo a FAO), vindo em seguida Austrália (80 milhões), Índia (70 milhões), Irã (50 milhões), Sudão (50 milhões) e Nova Zelândia (30 milhões). Estimase que a população de ovinos no mundo seja em torno de um bilhão de cabeças. A ovinocultura é explorada de modos diversos nas regiões geográficas do Brasil. No Sul, a criação é composta de animais lanados, devido às temperaturas baixas na região, e da qual se obtém lã e carne. No Nordeste estão as raças deslanadas e grande parte da produção é destinada à subsistência, produzindo carne, leite e derivados. Já no Sudeste, os rebanhos são destinados a cortes especiais, com maior valor agregado. Em geral, as raças naturalizadas no país são compostas de animais de pequeno porte e, até os dias atuais, passaram por raros

processos de seleção artificial e melhoramento genético, sendo pouco especializadas na produção intensiva de leite e carne. Abaixo, as raças estudadas na dissertação:

Santa Inês Originária do cruzamento da raça Bergamácia (lanada) com a Morada Nova (deslanada) e outros animais crioulos do Nordeste. Deu-se preferência pela sua criação nesta região devido à ausência de lã, maior porte e também por se adaptar à vegetação arbustiva. A raça Santa Inês é destinada principalmente à produção de carne, sendo que seus animais são de maior porte e pelagem nas cores branca, vermelha, preta e chitada. Além disso, as ovelhas possuem uma excelente capacidade leiteira para criar os cordeiros e, em determinadas condições, podem ser férteis durante todo o ano.

Morada Nova Resultado do cruzamento de ovinos Bordaleiros trazidos de Portugal com ovinos deslanados vindos da África na época do tráfico de escravos. Os animais constituem uma das principais raças nativas de ovinos deslanados do Nordeste brasileiro. Contudo, os

rebanhos vêm sofrendo uma redução de tamanho nos últimos anos, pois grande parte dos criadores está preferindo a criação de outras raças, como a Dorper e, principalmente, a Santa Inês. Há, também, muitos cruzamentos indiscriminados com outras raças exóticas, comprometendo ainda mais a preservação dessa importante raça e seu genótipo. A criação de Morada Nova está voltada essencialmente para produção de carne e pele (muito valorizada no mercado internacional). Além disso, estão presentes em muitas das pequenas propriedades, constituindo uma importante fonte de alimentação da população rural.

Crioula Lanada, talvez seja a raça naturalizada brasileira que mais se assemelhe com as raças dos países ibéricos. Os ovinos foram trazidos da Espanha e de Portugal pelos colonizadores, podendo ser encontrados no Sul do Brasil e também em quase todos os países sul-americanos. É provável que os ovinos dessa raça sejam originários da Churra espanhola. Fornece uma lã que, apesar de possuir uma qualidade inferior à de raças especializadas, é bastante utilizada em artesanato.

Fábio Danilo Vieira, autor da dissertação: “A metodologia poderia ajudar em pesquisas sobre outros fenótipos”


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Campinas, 13 a 19 de outubro de 2014

Construtoras ignoram ventilação natural em moradias populares Pesquisa feita por arquiteta demonstra que microclima local não é levado em conta Foto: Antoninho Perri

LUIZ SUGIMOTO sugimoto@reitoria.unicamp.br

ventilação natural é uma estratégia que deveria ser priorizada nos projetos habitacionais de um país de clima quente como o Brasil, principalmente naqueles destinados à população de baixa renda. Entretanto, o conforto térmico nas moradias populares é um aspecto desprezado por empreiteiras e projetistas, segundo resultados da pesquisa de doutorado da arquiteta Juliana Magna da Silva Costa Morais. A tese intitulada “Ventilação natural em edifícios multifamiliares do programa Minha Casa Minha Vida”, orientada pela professora Lucila Chebel Labaki, foi defendida na Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC). Juliana Morais desejava desenvolver um estudo sobre ventilação natural, área de atuação de sua orientadora, quando o governo federal lançou o programa Minha Casa Minha Vida (MCMV) em 2009. “Em 2010, com várias obras já erguidas em Campinas, decidimos conferir este aspecto em um programa cujo apelo está na quantidade de construções, mas no qual a qualidade é duvidosa. A ventilação natural é problemática nestas edificações, que ocupam grandes áreas suburbanas, onde a construtora busca sempre construir a maior quantidade de blocos por gleba. Com isso, o projetista desconsidera fatores importantes, como a melhor posição do bloco em relação ao vento dominante.” A autora da tese observa que esta decisão sobre o ângulo de implantação vai acompanhar toda a vida útil do edifício e que em condomínios verticais construídos para as classes mais altas o aproveitamento da ventilação natural é um fator sempre considerado. “Estudamos três tipologias diferentes localizadas no município e, além de apresentar os resultados, procuramos alertar os projetistas sobre pequenas decisões que podem influenciar no conforto térmico dos moradores. Sugerimos recomendações pontuais para incentivar projetos de habitações populares mais adequados sob este ponto de vista.” Juliana Morais, que atualmente coordena o curso de arquitetura e urbanismo da Faculdade de Ciências Sociais e Aplicadas (Facisa), de Campina Grande (PB), explica que as tipologias escolhidas são recorrentes em programas como o MCMV. “São o que chamamos de projetos ‘carimbo’, utilizados pelas grandes construtoras no Brasil inteiro, seja no Nordeste ou na Amazônia, sem levar em conta o microclima local. A tipologia 1 refere-se à famosa planta em forma de H, que remonta à década de 1960, quando foram lançados os conjuntos do BNH [Banco Nacional da Habitação]; um conjunto como este foi entregue à população de Campinas em 2011.” Foto: Divulgação

Juliana Magna da Silva Costa Morais: “O projetista desconsidera fatores importantes, como a melhor posição do bloco em relação ao vento dominante”

Conjunto habitacional em Campinas: segundo a autora da tese, construtoras buscam sempre construir a maior quantidade de blocos por gleba

A tipologia 2, conforme acrescenta a professora, é de uma planta praticamente quadrada, característica arquitetônica que busca ventilar e iluminar a cozinha e o banheiro através da área de serviço. “Resolvemos investigar se esse tipo de solução, que é adotada por muitos arquitetos no Nordeste, realmente funciona em termos de ventilação natural. Já a tipologia 3, que seguramente existe em todo o país, é a marca de uma grande empreiteira, que ao invés de quatro, reúne oito apartamentos por pavimento, o que dá ao prédio uma geometria retangular bastante longilínea.”

SIMULANDO VENTOS Para desenvolver sua pesquisa Juliana recorreu à simulação computacional, por meio de uma ferramenta internacionalmente reconhecida – CFD (Computer Fluid Dynamics) – que simula o comportamento de fluidos. “A primeira etapa da simulação exigiu a construção de protótipos virtuais dos três tipos de edifícios, com um software conhecido por nós arquitetos, o Autocad. Consideramos todas as janelas e portas internas dos apartamentos abertas (a porta de entrada geralmente fica fechada), a fim de verificar a potencialidade máxima de ventilação.” A autora da tese informa que a etapa seguinte foi a de alimentar o simulador com dados sobre as direções e as velocidades médias dos ventos em Campinas, coletados pelo IAC (Instituto Agronômico de Campinas) na estação meteorológica da fazenda Santa Elisa. “Os dados são referentes ao período de 2001 a 2010. Na simulação estudamos três diferentes ângulos de incidência do vento: a 0º (transversal), ou vento Norte, que ocorre na cidade durante três meses do ano; a 135º (diagonal), o vento Sudeste, predominante durante nove meses; e a 90º (longitudinal), o vento Leste. Assim, o projetista, de qualquer região do país, tem uma visão de três formas de ataque do vento ao edifício.” Os três tipos de edifícios possuem cinco pavimentos e Juliana Morais investigou a ventilação em todos os ambientes dos apartamentos do primeiro, terceiro e quinto andares. “Na simulação fizemos um corte a 1,5 metro em relação ao piso do apartamento, o que equivale à zona mediana de respiração. Obtivemos resultados quantitativos (velocidades médias do vento em cada ambiente interno) e qualitativos

(imagens de vetores do fluxo de ar externo e interno aos edifícios). A análise qualitativa permitiu enxergar como o vento, a partir das janelas abertas, percorre os ambientes até sair dos apartamentos.” Segundo a professora, na análise quantitativa, relacionada à velocidade média nos ambientes internos, julgou-se que o ponto mediano adotado na análise qualitativa talvez não representasse um dado real, visto que o vento poderia passar ao lado, tangenciando este ponto. “Descobrimos um poderoso recurso no simulador, chamado Isoclip, que foi de extremo valor para a tese: a ferramenta permitiu obter a velocidade média do vento em todos os ambientes dos apartamentos: sala, dois quartos, cozinha e banheiro; e tudo isso por três alturas, por três tipologias e por três direções. Ficamos abarrotados de dados.” Juliana Morais lembra, entretanto, que desde o início planejou transformar a tese de doutorado em uma leitura saborosa e prática, a fim de que todo projetista compreendesse facilmente seus resultados. “Era necessário compilar todos aqueles dados de maneira inteligente e visual. Para isso, contei com a ajuda imprescindível da arquiteta Cristina Cândido, que faz pósdoutorado na área de ventilação natural no exterior. Trocando ideias por e-mail, chegamos a uma escala cromática para as velocidades médias obtidas nos ambientes dos apartamentos.” A arquiteta explica que, por essa escala de cores, ventos entrando pela janela de zero a 0,2 metro por segundo resultam em ventilação imperceptível, em mero movimento de ar; de 0,2m a 0,4m, ventilação perceptível, mas insuficiente para mover qualquer carga térmica; de 0,4m a 0,8m, ventilação natural adequada, capaz de mover carga de temperatura acumulada e promover maior conforto térmico; e acima de 0,8m por segundo, ventilação a ser controlada, por gerar incômodos como de espalhar papéis. “Atribuindo cores às quatro faixas, produzi quadros-resumos de ventilação natural para fácil compreensão pelo projetista, sem que ele precise ler a tese toda.”

RESULTADOS

E RECOMENDAÇÕES

De acordo com Juliana, a simulação apontou que a melhor direção do vento é a oblíqua (135º), ou seja, que o bloco de

apartamentos deve ser posicionado na diagonal em relação ao vento dominante (Sudeste), o que vale para as três tipologias de edifícios. “As reentrâncias contribuem muito para a ventilação natural. E, das três tipologias, a planta em forma de H teve resultados ‘menos piores’ (para me abster de dizer que é a melhor) porque a abertura da sala fica localizada na grande reentrância, promovendo acentuada diferença de pressão na fachada do edifício para que a ventilação ocorra de maneira mais efetiva.” A pesquisadora acrescenta que em relação à planta quadrada (tipologia 2), ficou comprovado que a solução de ventilar banheiro e cozinha por meio de abertura na área de serviço não é eficiente e, portanto, deve ser evitada pelos projetistas. Mas o pior resultado, segundo ela, foi da planta retangular (tipologia 3). “É o edifício que apresenta maior fachada monolítica, sem reentrâncias. Nos quatro apartamentos centrais, praticamente inexiste ventilação cruzada, apenas unilateral: o vento entra e sai pelas mesmas aberturas e, sem diferença de pressão, há apenas circulação de ar. As condições melhoram nos apartamentos das pontas do bloco, mas ainda assim a tipologia é sofrível.” A tese de doutorado de Juliana Morais também traz recomendações simples para melhorar o conforto térmico dos moradores de baixa renda. “Já se esqueceram da antiga bandeira de porta (abertura no alto), que permitiria o cruzamento de vento quando a pessoa se fecha no quarto para dormir. A veneziana na porta de entrada também melhoraria a ventilação no interior do apartamento, sem perda de privacidade. Tanto esses pormenores, como a decisão sobre a posição do edifício no terreno, não implicaria em maior custo da obra, apenas em maior consciência do projetista e do construtor.”

Publicação Tese: “Ventilação natural em edifícios multifamiliares do programa Minha Casa Minha Vida” Autora: Juliana Magna da Silva Costa Morais Orientadora: Lucila Chebel Labaki Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)


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Campinas, 13 a 19 de outubro de 2014 CARLOS ORSI carlos.orsi@reitoria.unicamp.br

uitos analistas viram as manifestações que levaram milhares de brasileiros às ruas em junho de 2013 como sinal de uma crise de representatividade: parcela importante dos cidadãos não se sentiria mais devidamente representada pelos políticos eleitos. Medidas como reforma política e uma Assembleia Constituinte foram sugeridas para mitigar o problema, mas talvez a adoção de novas ferramentas tecnológicas também possa ajudar – ou, ao menos, é o que sugere a dissertação de mestrado “Extrator de Conhecimento Coletivo: uma ferramenta para Democracia Participativa”, defendida por Tiago Novaes Angelo na Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Unicamp. Juntando conceitos de uma área da matemática conhecida como Teoria dos Grafos, e da filosofia do pensador francês da cultura virtual Pierre Lévy, Angelo construiu um software para reunir, extrair e sintetizar o conhecimento a respeito de questões de política pública contido nas opiniões da população afetada por essas políticas. O programa reúne textos curtos de opinião produzidos pela população consultada e os condensa na forma de grafos – um tipo de diagrama construído matematicamente, no caso a partir da frequência com que as palavras são usadas e das relações entre elas – onde os conceitos mais importantes da opinião coletiva emergem em destaque. “Quem sabe o que fazer, dentro de uma certa realidade, é quem vive naquela realidade”, disse o pesquisador. “Por isso, não é a mera opinião deles: é uma opinião contextualizada por quem vive aquela realidade. É um conhecimento que eu ou você não temos”.

PEDRA NO CAMINHO

Grafos são diagramas formados por pontos, chamados de “nós” ou “vértices”, unidos por linhas, chamadas “arestas”. Esses diagramas podem ser usados para representar e estudar vários tipos de relação que podem ser interpretadas como redes de elementos individuais – por exemplo, o sistema Immersion (https://immersion.media.mit.edu/), do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) cria grafos a partir de uma lista de endereços de e-mail, onde cada nó representa um contato presente na lista, e as arestas mostram como esses contatos se comunicam entre si. Num grafo, o tamanho de cada nó pode refletir sua importância – no caso do Immersion, se aquele contato é um grande emissor ou receptor de mensagens – e as arestas podem receber pesos, refletindo a intensidade da conexão (ainda nesse exemplo, se os dois contatos se comunicam com frequência), ou mesmo direção, sendo então representadas como setas. No sistema criado por Angelo, os nós são as palavras presentes nos textos opinativos redigidos pela população, e as arestas têm tanto peso quanto direção. “Imagine, por exemplo, que a população de um bair-

Um software voltado para a democracia participativa Programa desenvolvido na FEEC reúne conceitos da matemática e da filosofia ro é chamada a opinar sobre a educação das crianças dali”, disse ele. “Se um grande número de pessoas achar que a escola deve ser privatizada, digamos, as palavras ‘escola’ e ‘privatizar’ vão aparecer em destaque, e fortemente ligadas”. Um teste para exemplificar o sistema, apresentado na dissertação, envolveu a análise do poema “No Meio do Caminho”, de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987). O grafo resultante trouxe, em destaque, três palavras – “pedra”, “caminho” e “meio” – fortemente ligadas entre si, com pesos altos nas arestas que as conectam umas às outras. “Se eu tiver que pegar a frase que representa esse poema, seria esta aqui, que representa o pensamento maior: ‘no meio do caminho tinha uma pedra’”, disse o pesquisador. “E é interessante, veja: os nós, as palavras que de fato sobraram, são essas, e os pesos se concentram mesmo em pedra, meio, caminho. O programa mapeia o texto original, e me dá ‘no meio do caminho tinha uma pedra’ como ideia principal”. Entre as dificuldades de implementação estão o problema dos sinônimos – se muitas palavras diferentes são usadas para dizer as mesmas coisas, a rede fica dispersa e é mais difícil extrair conhecimento dela – e das dificuldades ortográficas. Na versão testada na dissertação, houve um processo de correção ortográfica antes de os textos darem entrada no software.

DEMOCRACIA

Angelo afirma que, mesmo destacando algumas palavras e descartando outras, o sistema ainda é capaz de preservar alguma informação referente ao contexto em que o texto

original foi elaborado. “Aí entra um pouco da maravilha da rede complexa. Ela tem essa coisa, digamos assim meio mágica, chamada de métricas de rede complexa, que é você conseguir através de cálculos sobre a rede localizar onde a informação está concentrada sem perder o contexto”. Isso se dá graças aos pesos e ao direcionamento das arestas. “O software distingue entre ‘João matou Maria’ e ‘Maria matou João’”, exemplifica. O pesquisador também faz uma distinção entre seu software e outros sistemas de inteligência artificial já em uso, como programas que geram textos jornalísticos a partir do input de dados brutos, como estatísticas e resultados esportivos: em 2011, a empresa Narrative Science ficou famosa quando um de seus robôs virtuais produziu uma notícia sobre o resultado de um jogo de beisebol considerada mais informativa que a escrita por um jornalista esportivo humano. “Se a gente produz algo assim, teríamos que ter um padrão, um relatório baseado nos dados de uma planilha. São eles que levam a um padrão de resposta”, disse ele. “A ideia aqui é não ter um padrão de resposta. O conhecimento vem do coletivo. Ele não vem de uma máquina, de um terceiro. É uma técnica de inteligência artificial, mas a inteligência não está na técnica em si, está nas pessoas que estão falando. A frase tem que vir mesmo das pessoas, não do programa”. “Como a gente trabalhou com democracia, é muito perigoso fazer um programa que fale pelas pessoas”, disse. “O programa vai tentar combinar as opiniões e fazer emergir o conhecimento coletivo. E não que o conhecimento seja construído por uma máquina. Queremos fugir um pouco da ideia de uma

máquina que construa isso, porque foge da ideia de democracia que queremos – democracia vem do povo. O instrumento tem que ser um mediador, ele não tem que ter fins próprios, ele é um mediador entre o coletivo e a deliberação política”.

REPRESENTAÇÃO A ideia do sistema, disse ele, não é substituir a democracia representativa, mas subsidiá-la com mecanismos de democracia participativa. “As pessoas escreveriam sobre alguma coisa e o programa geraria uma tabela de ideias, e essa tabela de ideias poderia servir de base para os representantes eleitos tomarem as decisões políticas”, exemplificou. “Eles podem usar o material gerado como motivo para fazer um plebiscito, transformar as ideias num projeto de lei e colocar para votação. Num mundo ideal, que as pessoas que tenham consciência sobre alguma coisa, digam alguma coisa, forme-se uma tábua de ideias e aquelas ideias cheguem aos representantes”. Angelo reconhece que qualquer tentativa de levar o sistema para o mundo real terá de lidar com dois tipos de fraude, a tecnológica, pela violação do sistema em si, e a manipulação por lobbies – com grupos organizados combinando como farão suas apresentações ao sistema, garantindo que certas palavras e ideias tenham destaque especial. “A fraude é uma questão de segurança, senhas, criptografia”, disse ele. “Uma possibilidade é experimentar algumas ferramentas, entre elas, o uso de assinatura virtual para poder submeter um relato ao sistema”. Já a questão do lobby pode ser contornada, diz ele, com a universalização do sistema. “O lobby é tão mais eficiente quanto menos plural for a população”, pondera. “Como é hoje em dia? Hoje em dia a internet já atinge 50% das pessoas no Brasil. Os smartphones logo vão estar na mão de todo mundo. E a ideia é ter, de fato, a opinião de todo mundo. Por isso que a gente precisa de um sistema de computador”, explica. “Por que a democracia direta não dá certo atualmente? Ou não deu certo no século 18, quando as ideias de democracia ressurgiram? Porque não existia uma forma de ouvir 10 mil pessoas ao mesmo tempo. Aí formavam-se lobbies: um grupinho de cinco, vinte pessoas vinha e impunha a sua posição. Mas gente tem a esperança, é claro, de que num futuro muito próximo a internet atinja de fato todo mundo”, disse.

FUTURO O pesquisador trabalha numa ampliação do sistema para sua tese de doutorado. Ele procura formar uma equipe para pôr no ar um site de webdemocracia, onde o software possa ser testado online e em tempo real. “Esse programa vai receber relatos, e mostrar os resultados. E vamos montar equipes para trabalhar com módulos específicos, por exemplo, um módulo de sinônimos, que é uma coisa complexa de se fazer”. O site deve estar funcionando no início do ano que vem. Foto: Antoninho Perri

Publicação Dissertação: “Extrator de Conhecimento Coletivo: uma ferramenta para Democracia Participativa” Autor: Tiago Novaes Angelo Orientador: Ricardo Ribeiro Gudwin Coorientador: Cesar José Bonjuani Pagan Unidade: Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC)

Tiago Novaes Angelo, autor da dissertação: “Quem sabe o que fazer, dentro de uma certa realidade, é quem vive naquela realidade”


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Campinas, 13 a 19 de outubro de 2014

Judô e aikido ajudam a evitar quedas de idosos Foto: IJF/G. Sabau

Pesquisa da FOP aponta que artes marciais favorecem a recuperação do tônus muscular e ainda ensinam praticantes a cair

Competição internacional de judô: de acordo com o autor da pesquisa, “combinação entre ganho de saúde e integração social proporcionada pela prática das artes marciais é importantíssima para a ampliação da qualidade de vida”

MANUEL ALVES FILHO manuel@reitoria.unicamp.br

prática de atividades físicas é recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como fator fundamental para a manutenção da saúde e melhoria da qualidade de vida em todas as idades. No caso dos idosos, esse cuidado é ainda mais importante, pois contribui para aumentar o tônus muscular, perdido gradualmente por causa do processo de envelhecimento. Pesquisa desenvolvida pelo professor Eduardo Hebling, do Departamento de Odontologia Social da Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP), unidade de ensino e pesquisa vinculada à Unicamp, concluiu que os praticantes seniores de artes marciais apresentam menores riscos de queda, uma das principais causas de invalidez e morte em pessoas acima dos 65 anos. “Isso acontece porque esse tipo de treinamento favorece a recuperação do tônus muscular e ainda ensina o idoso a cair”, explica o docente. O estudo conduzido por Hebling foi de caráter qualitativo e se concentrou em duas artes marciais, uma competitiva (judô) e outra não competitiva (aikido). A aderência, ou seja, a manutenção da atividade física por longo prazo, foi avaliada nesses grupos. Foram entrevistados 12 adeptos de cada arte marcial, frequentadores de academias da cidade de São Paulo. “No caso do aikido, os entrevistados o praticavam, em média, há 37 anos. No do judô, há 51 anos”, informa o pesquisador. Um dado curioso é que todos os entrevistados eram homens. A explicação, conforme o autor da pesquisa, é que o judô foi introduzido no Brasil na década de 1940 e o aikido, na de 1970. “Naqueles períodos, a sociedade via esse tipo de atividade como algo exclusivo do universo masculino. Por isso é mais difícil encontrar mulheres idosas que pratiquem essas artes marciais”. O principal objetivo da pesquisa, continua Hebling, foi identificar as razões que fizeram com que os idosos permanecessem praticando essas atividades físicas por tanto tempo. Entre as respostas dadas pelos entrevistados, destaque para os benefícios que os exercícios trazem para a saúde, mas também para a questão do favorecimento à socialização. “As duas artes marciais consideradas no estudo são originárias de países orientais, onde a figura do idoso é reverenciada. Nesses países, o velho não é visto como um fardo, mas sim como uma reserva de conhecimento que precisa ser valorizada. Dessa forma, esses praticantes de judô e aikido disseram que se sentem respeitados no ambiente do esporte. Além disso, eles também revelaram que não abandonam a atividade porque se veem na obrigação de repassar o conhecimento adquirido ao longo de décadas às novas gerações”, relata o docente da FOP. A combinação entre ganho de saúde e integração social proporcionada pela prática das artes marciais é importantíssima para a ampliação da qualidade de vida dos idosos, de acordo com Hebling. Os exercícios físicos presentes nessas atividades contribuem para aumentar o tônus muscular, que é perdido progressivamente conforme a idade avança.

Tal perda, observa o docente, interfere no equilíbrio da pessoa e faz com que ela sinta uma sensação de fraqueza. Esses fatores, somados a outros, favorecem a ocorrência de quedas, que por sua vez trazem consequências graves aos idosos. Dados do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), órgão do Ministério da Saúde, estimam que de cada três indivíduos com mais de 65 anos, um é vítima de queda. Além disso, de cada 20 pessoas que sofrem quedas, uma é alvo de fratura que requer internação. Ademais, 40% dos que têm 80 anos ou mais caem ao menos uma vez a cada ano. “As consequências dessas quedas são variadas, sendo que boa parte delas é muito séria. Infelizmente, muitos casos evoluem para a invalidez e até mesmo a morte das vítimas. Um bom modo de prevenir esses casos, que trazem sofrimento ao paciente e grande custo social ao país, é estimular a prática de atividades físicas pela população em geral e pelos idosos em particular”, afirma Hebling. Quanto à integração social propiciada pela prática das artes marciais, acrescenta o pesquisador, ela também é importante, pois ajuda na preservação da saúde mental. “Diversas pesquisas indicam que pessoas que mantêm fortes vínculos familiares e de amizade são mais felizes e por isso adoecem menos. No caso dos idosos, esse aspecto é

ainda mais significativo, pois nesse período da vida as pessoas frequentemente se queixam da falta de atenção e afeto”, diz o autor da pesquisa. Outro ponto positivo a ser destacado, segundo Hebling, é o benefício que as atividades físicas trazem para a saúde de modo geral. Pesquisas científicas também comprovam que o sedentarismo é uma das principais causas da obesidade, fator que está associado a uma série de doenças, como a hipertensão, o diabetes e enfermidades cardiovasculares. “Nos Estados Unidos, para ficar em um único exemplo, 12% das mortes são atribuídas à falta de exercícios físicos. Acredito que esse índice possa ser projetado para o resto do mundo, com algumas raras exceções”, infere o docente da FOP. A expectativa de Hebling é de que os resultados de sua pesquisa contribuam para a formulação de políticas públicas que estimulem a população a praticar regularmente atividades físicas, notadamente o segmento acima dos 65 anos. Segundo o pesquisador, ações desse tipo são indispensáveis à preservação da saúde e da qualidade de vida da população brasileira, que vem passando por um rápido processo de envelhecimento. “Nos países desenvolvidos, esse envelhecimento populacional ocorreu de forma lenta. Nas nações em desenvolvimento, como o Brasil, o processo

está sendo mais acelerado. Entretanto, ainda não temos políticas públicas que foquem o bem-estar de nossos cidadãos no futuro muito próximo. Ou seja, se quisermos ter idosos saudáveis e com boa qualidade de vida daqui a 15 ou 20 anos, o momento de estabelecer as condições para que isso aconteça é agora”, defende Hebling.

PREVENÇÃO De acordo com o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), órgão do Ministério da Saúde, pesquisas científicas demonstram que exercícios com duração de dez semanas a nove meses já são suficientes para reduzir em 10% a probabilidade de queda entre os idosos. Além disso, treinamentos específicos para equilíbrio diminuem em até 25% o número de quedas. Já a prática do tai chi chuan, outra modalidade de arte marcial, reduz a possibilidade desse tipo de acidente em 37%. Entre os fatores intrínsecos relacionados às quedas de idosos, conforme o Into, estão: perda da força muscular, osteoporose, anormalidades para caminhar, arritmia cardíaca, alteração da pressão arterial, depressão, senilidade, artrose e alterações neurológicas. Já entre os fatores extrínsecos surgem a deficiência de iluminação de ambientes, cômodos mal projetados, disposição inadequada de móveis e uso inapropriado de tapetes. Foto: César Maia

O professor Eduardo Hebling: “As consequências das quedas são variadas, sendo que boa parte delas é muito séria. Infelizmente, muitos casos evoluem para a invalidez e até mesmo a morte das vítimas”


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Campinas, 13 a 19 de outubro de 2014

Exercícios melhoram qualidade de vida de paciente com epilepsia Fotos: Divulgação/Antonio Scarpinetti

Atividades físicas aeróbias podem ser complementares ao tratamento medicamentoso ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br

acientes com epilepsia de lobo temporal, submetidos a exercícios físicos aeróbios, conseguiram melhorar a sua qualidade de vida e a sua capacidade cardiopulmonar. Foi o que apontou estudo de mestrado desenvolvido pela pesquisadora Nathália Volpato. O trabalho, apresentado à Faculdade de Ciências Médicas (FCM), incluiu um programa de atividades com duração de quatro meses, indicando que este tipo de exercício pode atuar como uma espécie de complemento ao tratamento medicamentoso tradicional. “Os exercícios proporcionaram bem-estar e sugeriram ainda uma melhora da autoestima de seus portadores, que se sentiram mais confiantes para sair, se divertir e se sociabilizar”, constatou a autora da dissertação. “Reconhecemos que o tratamento da doença deva ir além dos tratamentos convencionais, medicamentosos e cirúrgicos, e medidas alternativas devem ser incorporadas para a melhora do bem-estar emocional desses pacientes”, pontuou. A epilepsia de lobo temporal é uma estrutura central responsável pela regulação da memória e da emoção, localizada na parte lateral do cérebro. Segundo a pesquisadora, pessoas com esse tipo de epilepsia – o grupo mais comum de epilepsias em pacientes adultos – que julgam que a doença está controlada conseguem ter uma melhor qualidade de vida, a despeito dos episódios das crises, em comparação às que não têm essa sensação. Sessenta e cinco por cento dos 79 pacientes recrutados na pesquisa apresentavam de uma a cinco crises por mês e, apesar delas, 77% julgavam ter sua epilepsia controlada. Orientado pelo neurologista e docente da FCM Fernando Cendes, o estudo também indicou que os pacientes que têm vida ativa, que praticam atividade física de lazer, que usufruem de uma vida social, que trabalham e que desempenham tarefas domésticas apresentam maior qualidade de vida em relação aos sedentários. Nathália apurou que as pessoas com epilepsia possuem uma menor capacidade física, muito provavelmente porque são mais inativas que a população em geral.

INTERVENÇÃO A pesquisa aconteceu no Ambulatório de Epilepsia do Hospital de Clínicas (HC) com 79 voluntários (com idade entre 40 e 60 anos), sendo dez deles selecionados para participar do programa de exercício físico. O grupo seguiu um roteiro de exercícios duas vezes por semana até chegar a uma hora de caminhada em intensidade aeróbia (numa faixa de 60% a 75% da frequência cardíaca com a máxima do indivíduo). Nathália analisou, além da qualidade de vida através de questionários, a capacidade cardiopulmonar desses pacientes por meio do teste cardiopulmonar de esforço máximo, realizado em esteira na Disciplina de Cardiologia do HC. Tal teste mostra a capacidade física máxima que o paciente é capaz de atingir em relação à parte cardiológica e à parte pulmonar. “O objetivo da pesquisa foi verificar se melhoraria a qualidade de vida e a saúde geral dos pacientes, pois existem estudos sinalizando que o portador de epilepsia apresenta maior risco de apresentar comorbidades como diabetes, sedentarismo, hipertensão”, ressaltou.

A pesquisadora Nathália Volpato, autora da pesquisa, durante teste (acima) e no HC (destaque): exercícios proporcionaram bem-estar e melhora da autoestima

Os resultados foram ainda medidos por meio de um questionário de qualidade de vida antes (quando eram sedentários) e depois da intervenção (quando passaram a se exercitar), que comprovaram ser estatisticamente significativos. Os achados revelaram que 43 pacientes avaliados praticavam educação física na infância, mas que esse número diminuiu para 29 na adolescência. Vinte e dois acreditavam que a atividade física precipitava as crises epiléticas: 12 deles relataram ter crise durante alguma atividade física. As medicações mais frequentemente usadas pelos voluntários foram a carbamazepina e o clobazam. Os pacientes que trabalhavam demonstraram uma melhor qualidade de vida, a qual se relaciona com fatores como a saúde, o bem-estar físico, funcional, emocional e mental, bem como terem ligação com a família, trabalho, amigos, entre outros aspectos do cotidiano. De acordo com a mestranda, não existem praticamente estudos abordando a importância do exercício físico em modelos humanos. São mais comuns comparativos com os hábitos de atividade física em relação à população em geral. Na literatura, são mencionados apenas quatro

Publicação Dissertação: “Avaliação do impacto de um programa de exercício físico planejado na frequência de crises, saúde e qualidade de vida em pacientes com epilepsia de lobo temporal” Autora: Nathália Volpato Orientador: Fernando Cendes Unidade: Faculdade de Ciências Médicas (FCM) Financiamento: Fapesp

estudos, todos conduzidos fora do Brasil. Nenhum trabalho havia relatado no país os benefícios das pessoas que fizeram exercício físico específico de caminhada em intensidade individualizada.

ENTRAVES A epilepsia é hoje encarada como um quadro crônico, ainda que o paciente apresente poucos episódios. Logo, o sentimento deles com relação à epilepsia é de que essa síndrome nunca vai acabar. Vivem com medo constante, preocupação de saírem, de manifestarem o problema e de se machucarem. Quando a crise de epilepsia de lobo temporal ocorre, alguns sinais exteriores podem ser bem reconhecidos pelas pessoas que os presenciam. As crises normalmente têm curta duração: de 30 segundos a poucos minutos e, sendo superiores a cinco minutos, é necessário pronto atendimento médico. Após a crise, comentou Nathália, os sintomas não desaparecem rapidamente. Devido à perda de consciência, a pessoa continuará confusa e com dificuldade de se expressar por alguns minutos, enquanto tenta entender o que houve. É comum não se lembrar de nada. Os pacientes com epilepsia têm uma série de problemas, e a enfermidade é altamente estigmatizada. Muito disso, a autora da dissertação atribui às informações pouco elucidativas sobre o que é a epilepsia. “Por essa razão, esses pacientes costumam ter vergonha e são alvos de preconceito”, frisou. Nathália contou que, mesmo atualmente, o tratamento medicamentoso continua produzindo muitos efeitos colaterais, por ser indicado em geral para abaixar a atividade cerebral, a fim de não levar à epilepsia – que é a descarga elétrica excessiva e anormal que interrompe transitoriamente a função cerebral normal.

Nos pacientes estudados, essa eletricidade excessiva começa no lobo temporal mas, como estão sob efeito de medicamentos, geralmente têm apenas epilepsia parcial. Não estando na vigência de medicação, esse desbalanço da atividade cerebral pode se generalizar para o cérebro como um todo. “Então é preciso ingerir fármacos para diminuir tal atividade, mantendo-a normal. Só que os medicamentos, muitas vezes, os deixam sonolentos, desanimados, dentre outros efeitos colaterais, como ganho de peso e perda óssea”, salientou. É certo que pacientes com epilepsia lidam com diversos comprometimentos e com risco elevado de apresentar depressão, transtornos de humor, psicose, surtos de ansiedade e até mesmo comprometimento de cognição, com maiores risco de morte súbita, devido a fatores fisiológicos da doença e a fatores externos e sociais, descreveu Nathália. Conforme a literatura, o estudo da neuropsiquiatria da epilepsia de lobo temporal pode auxiliar na elaboração de programas que visem uma melhor qualidade de vida dos pacientes mediante o adequado diagnóstico e tratamento dos transtornos mentais associados a esta síndrome epilética. E as caminhadas podem se impor como uma importante possibilidade de amenizar o quadro. A epilepsia como um todo atinge de 1% a 2% da população mundial, chegando a atingir cerca de 60 milhões de pessoas, apontam dados recentes da Organização Mundial da Saúde. No doutorado, Nathália pretende conhecer os mecanismos do exercício físico que levam à melhoria da qualidade de vida – o que acontece no cérebro do paciente ao começar a praticar exercício físico. De acordo com ela, o exercício físico moderado pode trazer benefícios para várias doenças crônicas, principalmente as relacionadas ao coração, comentou.


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Campinas, 13 a 19 de outubro de 2014

PAINEL DA SEMANA  Encontro PAD/PED - A Pró-reitoria de Graduação (PRG), a Pró-reitoria de Pós-Graduação (PRPG) e o Espaço de Apoio ao Ensino e Aprendizagem (EA)² realizam o X Encontro de Aperfeiçoamento aos alunos do Programa de Apoio Didático (PAD) e aos do Programa de Estágio Docente (PED). Será no dia 13 de outubro, às 13h30, no Centro de Convenções da Unicamp. Para os estudantes de Limeira (FT e FCA) e Piracicaba (FOP) haverá transmissão on-line com controle de presença. Estes alunos devem entrar em contato com suas secretarias para obter informações sobre o local da transmissão. No Centro de Convenções, o controle de frequência será registrado por meio do cartão de Identidade Estudantil. Mais informações: ea2@reitoria.unicamp.br

 Semana Nacional de Ciência e Tecnologia - A Unicamp e a Prefeitura de Campinas juntamente com o Conselho Municipal de Ciência, Tecnologia e Inovação (CMCTI), que reúne as principais entidades do setor, estão à frente da organização da 2ª Semana Municipal de Ciência e Tecnologia, que irá ocorrer de 13 a 19 de outubro como parte das ações da 11ª Edição da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT 2014). Com o tema “Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento Social”, a coordenação nacional da SNCT é de responsabilidade do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). A proposta é estimular as instituições a abordarem a ciência e a tecnologia na dimensão social, como instrumento de inclusão, transformação social e desenvolvimento humano. Em Campinas, as instituições e empresas envolvidas participarão de atividades centralizadas em uma mostra, a ser realizada no Museu Exploratório de Ciências da Unicamp, além de palestras e visitas de escolas que serão realizadas em alguns institutos (IMA, CTI, CPqD e CNPEM). Ao todo, o evento contará com 5 tendas instaladas ao redor do Museu, com diversas atividades simultâneas, que irão ocorrer de segunda a sexta, de 13 a 17 de outubro, das 8h30 às 17 horas. Mais informações: http://www. semanact.mc.unicamp.br/  Volta da Unicamp - Estão abertas as inscrições para a V Volta da Unicamp, evento programado para ocorrer no dia 19 de outubro, às 8 horas, com largada na Rua Érico Veríssimo, em frente à Faculdade de Educação Física (FEF). Elas podem ser feitas até 14 de outubro, na página eletrônica http://www.ggbs.gr.unicamp.br/voltadaunicamp. O evento é limitado à participação de 2.000 atletas, sendo 1.500 corredores de 5 e 10 km e 500 caminhantes de 5km. 16 anos é a idade mínima permitida para a participação da caminhada. Para a corrida, 18. Outras informações podem ser obtidas pelo e-mail voltadaunicamp@reitoria.unicamp.br  Lousa digital em sala de aula - O Laboratório de Novas Tecnologias Educacionais (LANTEC) da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp realiza, dia 14 de outubro, às 11 horas, na Sala da Congregação da FE, workshop sobre o uso da lousa digital em atividades didáticas em sala de aula. Do evento participam: Veruska Silveira e Ronaldo Carvalho, da Sapienti Tecnologia Educacional. O workshop é gratuito. As inscrições devem ser feitas no link http://www.fe.unicamp.br/dform/ gera.php?form=lousadigital. Mais deta-lhes: telefone 19-3521-5564 ou e-mail eventofe@unicamp.br  Construindo vidas despatologizadas - As sociedades ocidentais vivem um processo de patologização em que a diversidade e as diferenças que caracterizam e enriquecem a humanidade estão sendo consideradas como problemas. Questões de diferentes ordens são transformadas em doenças, transtornos ou distúrbios, que passam a ocupar o lugar nos debates de problemas políticos, sociais, culturais e

DESTAQUE

afetivos que afligem a vida das pessoas. Discutir os efeitos dessa patologização ou medicalização da vida contemporânea é um dos objetivos do Fórum Construindo Vidas Despatologizadas, que será realizado na Unicamp entre 14 e 17 de outubro, e reunirá médicos, psicólogos e educadores, entre outros profissionais do Brasil e do exterior. Mais detalhes no link http://www.gr.unicamp.br/penses/forum_vidas_despatologizadas/  Atividade física e esporte na promoção da saúde - No dia 15 de outubro, às 9 horas, no auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), acontece o Fórum de atividade física e esporte na promoção da saúde. O objetivo do evento é analisar o impacto da incorporação do hábito de “se mexer” no âmbito de empresas públicas e privadas reforçando políticas de atividade física para os trabalhadores. A organização é do Programa Mexa-se Cecom GGBS. Mais informações no site http://mexase.cecom.unicamp.br/?p=141 ou telefone 19-3521-8999.  Fórum de ginástica geral - O VII Fórum Internacional de Ginástica Geral acontece de 15 a 18 de outubro, no Sesc-Campinas. O evento é organizado pela Faculdade de Educação Física (FEF) e pelo Serviço Social do Comércio (Sesc). A abertura será às 19 horas, no Sesc-Campinas. O Fórum objetiva criar um espaço de informação, capacitação e discussão sobre a Ginástica, divulgar pesquisas e trabalhos realizados na área e abrir possibilidades de disseminação dessa prática no âmbito escolar e comunitário. Inscrições, programação e outras informações, na página eletrônica http://www.sescsp.org.br/ programacao/seminario/3153_VII+FORUM+INTERNACIONAL+DE+G INASTICA+GERAL#/content=apresentacao_mais_mais. Na Unicamp, o responsável pelo evento é o professor Marco Bortoletto (FEF). O Sesc-Campinas fica na rua D. José I, 270, no bairro do Bonfim. Outros detalhes: telefone 19-3521-6618 ou e-mail bortoleto@fef.unicamp.br  Redação científica internacional - O Espaço da Escrita, projeto estratégico da Coordenadoria Geral da Unicamp (CGU), oferece um curso avançado de redação científica internacional, dias 16 e 17 de outubro, das 8 às 18 horas, na Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM). O evento corresponde a um treinamento avançado de 20 horas/aula para acadêmicos que já participaram dos workshops de “Método Lógico para Redação Científica”, ministrados pelo professor Gilson Luiz Volpato (Unesp/Botucatu), realizados entre 2012 e 2014 na Unicamp. Todos participantes deverão ter um manuscrito completo e inédito, com resultados finais ou parciais de pesquisa empírica. Vagas limitadas a docentes, pesquisadores de carreira e alunos de doutorado selecionados. O evento é fechado a 70 participantes. Mais informações: telefone 19-3521-6649 ou e-mail escrita@reitoria.unicamp.br  Envelhecimento - Em comemoração ao mês da pessoa idosa, o Grupo de Pesquisa do Laboratório de Fisiologia do Exercício (Fisex) da Faculdade de Educação Física (FEF) da Unicamp, em conjunto

com o Programa de Pós-graduação em Gerontologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), realiza, dias 16 e 17 de outubro, o seminário “Envelhecimento III - Dia da pessoa idosa”. A abertura do evento ocorre às 9 horas, no Centro de Convenções da Unicamp. O seminário é gratuito e as inscrições podem ser feitas no local. Grupos de idosos interessados em participar devem confirmar presença até 13 de outubro. O seminário é apoiado pelo Fapex, Grupo Gestor de Benefícios Sociais (GGBS) e pelo Programa de Pós-graduação em Gerontologia da FCM. Confira o programa completo no link http://www.fef.unicamp. br/fef/envelhecimento. Mais informações podem ser obtidas pelo e-mail fisex@fef.unicamp.br ou telefone 19-3521-7493.  Queimadas urbanas - Palestra será ministrada pelo professor Edson Delattre, do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, dia 16 de outubro, às 14h30, no auditório da Biblioteca Central “Cesar Lattes” (BC-CL). O evento faz parte do Programa de Prevenção contra o Desperdício nos Restaurantes Universitários da Unicamp. Interessados em participar podem se inscrever pelo e-mail isabelvi@unicamp.br. Outros detalhes: 19-3521-6434.

TESES DA SEMANA  Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo - “Processo oxidativo avançado na desinfecção de esgoto tratado: helmintos, protozoários e bactérias” (doutorado). Candidata: Regiane Aparecida Guadagnini Fagnani. Orientador: professor José Roberto Guimarães. Dia 17 de outubro de 2015, às 8 horas, na sala de defesa 1 da CPG da FEC.  Engenharia Elétrica e de Computação - “Filtragem de Kalman aplicada à computação digital com abordagem de espaço de estado variante no tempo” (doutorado). Candidato: Paulo David Battaglin. Orientador: professor Gilmar Barreto. Dia 15 de outubro de 2014, às 9 horas, na sala PE11 da CPG da FEEC.  Física - “Monocamadas sp(2) corrugadas e suas aplicações” (doutorado). Candidato: Luis Henrique de Lima. Orientador: professor Abner de Siervo. Dia 13 de outubro de 2014, às 14 horas, no auditório da Pósgraduação do IFGW.  Odontologia - “Estimativa de idade através de medidas em dentes e ossos do carpo: precisão em uma amostra do sudeste brasileiro” (mestrado). Candidato: Marcelo Afonso Machado. Orientador: professor Eduardo Daruge Junior. Dia 14 de outubro de 2014, às 9 horas, na sala da Congregação da FOP.

DO PORTAL

Unicamp e Universidade de Delft promovem curso ma parceria entre a Unicamp, através da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários (Preac), e a Universidade de Delft, Holanda, abrirá a oportunidade para estudantes com bacharelado e pós-graduação, além de interessados, realizarem o curso de extensão que, em português, está sendo chamado Tecnologia para Produtos com Base Biológica (Technology for Biobased Products). Começará no dia 27 deste mês. As inscrições já estão abertas. Saiba mais em www.edx.org. O curso é ministrado por meio de blocos temáticos. Os alunos assistirão a vídeos, lerão textos, responderão a questões. Promovido pela Universidade de Delft, ele também contará com a participação de professores da Unicamp, que produzirão conteúdos a serem posteriormente disponibilizados na plataforma EdX, de ensino a distância. Trata-se de um curso gratuito com sete semanas de duração e que aborda produtos biorrenováveis: combustíveis e químicos (materiais), conforme Ernest-JAN, gerente desse projeto pela Universidade de Delft. “Ensinamos aos participantes como essa produção funciona, desde a matéria-prima, todos os processos de engenharia até o produto final.” Segundo Gláucia Lorenzetti, que atua como assessora da Preac em convênios de educação a distância com instituições estrangeiras, esta é a segunda parceria nessa área envolvendo a Preac. A primeira aconteceu há poucos dias com o Coursera, uma plataforma educacional aberta, firmada com a Unicamp e a USP. O pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários João Frederico Meyer lembra que a Universidade de Delft tem expertise em muitos outros cursos e que essa plataforma EdX, por sua vez, tem uma ampla gama de cursos. A ideia, diz, é expandir a participação da Unicamp em novas iniciativas. João Frederico afirma que o interesse imediato na Universidade de Delft está na opção pelo que é biorrenovável. “Essa universidade é referência na área e está construindo uma história de convênios com a Unicamp. Estamos trabalhando com um segundo termo aditivo. O primeiro passo para participar dessa plataforma é através da Universidade de Delft”, expõe o pró-reitor.

Foto: Antonio Scarpinetti

Gláucia Lorenzetti, assessora da Preac, e Ernest-JAN, da Universidade de Delft: curso terá blocos temáticos

Delft é a primeira universidade de tecnologia da Holanda, criada em 1842. Possui praticamente todas as áreas de engenharia e é uma das três universidades de tecnologia do país. Atualmente, essa universidade está muito focada em ensino a distância e acaba de criar um departamento, o Delft X, que não tem propriamente um espaço físico, mas que oferece este tipo de curso. “Essa linha deve crescer muito e a Delft planeja estar lá na frente, desenvolvendo e descobrindo qual é a melhor forma de conseguir isso”, revela Ernest. Essa concepção de curso, observa, costuma reunir grande contingente de pessoas. Para se ter uma ideia, no ano passado, foi feito um curso sobre energia solar que atraiu perto de 57 mil alunos. A plataforma EdX é muito conhecida e tem muitos parceiros de peso, como o Massachussets

Institute of Technology (MIT) e a Universidade de Harvard, que fundaram a EdX. De acordo com Gláucia, essa grande quantidade de alunos se justifica pelo fato desta modalidade do curso estar em franca ascensão, que são os MOOCs (Massive Open Online Courses – cursos massivos abertos a distância). É uma categoria que tem alcançado bastante aceitação. “São milhares de pessoas participando. Esta é uma das características desses cursos”, elogia. “Os alunos vão para a plataforma, acessada pela Internet, buscar informações. Ela própria faz uma grande divulgação de todo o material de que dispõe”, salienta Ernest. Lá, são encontradas todas as universidades parceiras e é possível selecionar assuntos como por exemplo “direito”. Ao colocar em busca essa palavra-chave, a plataforma fornece todos os cursos que serão ministrados

sobre esse tema e outros do interesse do aluno. Para o pró-reitor João Frederico, a Unicamp faz gosto nessa parceria, sobretudo pelo desenvolvimento que a Universidade de Delft mostra na parte de energia renovável (eólica, solar, biorrenovável). “Esse é o nosso grande interesse, em tecnologia, que nós temos e que eles têm. Então existe um amplo campo para ser explorado”, dimensiona. O Brasil, e a Unicamp em particular, tem uma vasta experiência no que é biorrenovável e que não é simplesmente de extração. É nisso que a Universidade de Delft está trabalhando, mas também na área de tecnologias. “Já temos um acordo com eles, o que explica a presença do professor Luis Cortez [vicereitor executivo em Relações Institucionais e Internacionais] nos contatos iniciais”, afirma o pró-reitor. (Isabel Gardenal)


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Pesquisa avalia a qualidade das águas termais de Poços Estudo feito na estância turística conclui que parâmetros atendem à legislação Foto: Prefeitura Municipal de Poços de Caldas

CARMO GALLO NETTO carmo@reitoria.unicamp.br

em constituindo preocupação do Departamento de Meio Ambiente (DMA) e do Departamento Municipal de Águas e Esgoto (DMAE) de Poços de Caldas, de parte da população da cidade e de turistas usuários dos seus fontanários de águas termais sulfurosas a definição de parâmetros sobre seus usos corretos e sua qualidade, diante da inexistência de informações que atendam a essas necessidades. Estas foram as motivações da bióloga Adriana Moreira de Carvalho, mestra em saneamento e meio ambiente pela Unicamp e funcionaria do DMAE, ao desenvolver a pesquisa em que avaliou a qualidade das águas termais sulfurosas do Fontanário Pedro Botelho, localizado nas Thermas Antônio Carlos, e do Fontanário dos Macacos, situado no Balneário Mario Mourão no município de Poços de Caldas, que se encontra no sulsudeste de MG, na divisa com o Estado de São Paulo. O trabalho deu origem à dissertação de mestrado desenvolvida na Área de Saneamento Básico e Meio Ambiente da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp, e foi orientado pelo professor Alexandre Nunes Ponezi. A história da cidade mineira de Poços de Caldas está atrelada à descoberta das primeiras fontes e nascentes no século 18. Suas águas raras e com poder de cura foram responsáveis pela prosperidade da cidade que a partir de 1886 passou a ter uma casa de banho, destinada ao tratamento de doenças cutâneas, que utilizava a água sulfurosa e termal da Fonte dos Macacos. A cidade teve seu auge no início da década de 40, na época dos cassinos. A proibição do jogo em 1946 e a descoberta dos antibióticos tiveram grande impacto sobre o turismo da cidade, pois o termalismo deixou de ser a maneira mais eficaz de tratar as doenças para os quais era indicado. A recuperação do município ocorreu com a mudança de foco do turismo, que além dos benefícios terapêuticos das águas passou a utilizar as fontes como locais de relaxamento e encontrou na cidade outros pontos de atração. As águas termais são subterrâneas e estão enriquecidas com minerais resultantes da lixiviação das rochas e do solo, que lhe conferem peculiaridades distintas das águas comuns, e emergem à superfície na forma de fontes em temperaturas superiores às daquelas. Possuem composições distintas que dependem do local onde surgem, do tipo de rocha, clima, relevo e de outros fatores. São consideradas termais sulfurosas devido à temperatura maior do que a das águas naturais e ao teor elevado de substâncias como o enxofre. As águas termais sulfurosas de Poços de Caldas são referência desde o século 19 na prática de banhos de imersão, nebulização, hidropinia (ingestão) e fisioterapia, empregos que se estendem até hoje em seus balneários. A população da cidade as utiliza inclusive para ingestão sem nenhuma cautela, ignorando a ausência de um controle sistemático sobre suas qualidades bacteriológicas, microbiológicas e químicas. Por essa razão, o trabalho preocupou-se principalmente quanto à ingestão dessas águas, consideradas medicinais e medicamentosas e que, portanto, deve necessariamente ser orientada por especialistas quanto ao seu uso oral. Nesse contexto, Adriana realizou uma avaliação microbiológica, bacteriológica, físico-química, da composição química e de radionuclídeos dessas águas que poderá vir a ser utilizada como instrumento de gestão pelos órgãos competentes, auxiliando inclusive programas que venham a ser aplicados em relação à proteção quanto à suas contaminações antrópicas, garantindo-lhes qualidades e quantidades para as demais gerações. Sua dificuldade maior, enfrentada ainda durante a fase de definição dos parâmetros a serem analisados, resultou da constatação de que não existia legislação específica para as águas sulfurosas, que obedeciam às normas vigentes para as águas minerais, apesar de suas especificidades. Este fato a levou a se orientar no que dispõe o Laboratório de Águas Minerais (Lamin), órgão do Governo

Fonte na região central de Poços de Caldas: águas termais subterrâneas estão enriquecidas com minerais provenientes da lixiviação das rochas e do solo

Federal, com sede em Belo Horizonte, credenciado para análises das águas minerais e que também se atém às águas sulfurosas, embora não tivesse deixado de se basear em pesquisas existentes no Brasil e até no exterior. A partir destes estudos prévios, a pesquisadora decidiu realizar avaliações: bacteriológica – em que analisou basicamente os coliformes termotolerantes, os estreptococos fecais e salmonelas; microbiológica - em que se deteve fundamentalmente nas algas; físico-química – em que considerou cor, acidez, dureza, pH, turbidez, condutividade, concentração de íons, dentre outros; e de radionuclídeos, particularmente os de interesses radiológicos.

RESULTADOS

Os resultados das análises quantitativas mostraram, com base nas recomendações previstas para as águas potáveis consideradas próprias para ingestão, que as concentrações de íons fluoreto e íons sódio estão muito acima do indicado e superam em cerca de 30% o tolerável e permitido. As alterações das concentrações de fluoreto são resultados da sua incorporação natural nas águas e decorrem da lixiviação das rochas fluoritas, abundantes na região. Sabe-se que fluoreto em excesso leva à fluorose, que pode provocar o escurecimento e enfraquecimento dos dentes e também afetar o esqueleto ósseo humano. O excesso de íons de sódio agrava a hipertensão ou pode levar a ela, causa maior das doenças circulatórias e do coração nas sociedades contemporâneas.

As consequências maléficas desses íons podem ocorrer em função da ingestão das águas mas não comprometem suas utilizações tópicas. O mesmo se pode dizer em relação aos íons derivados do enxofre como os sulfetos e sulfatos, também predominantes nelas. A propósito, a pesquisadora explica que o efeito tópico, ou seja, os benefícios terapêuticos, decorrem da presença nessas águas de íons como fluoreto e sulfeto e de outros presentes em menores quantidades: “Assim é que a concentração excessiva de fluoreto, embora as torne impróprias para ingestão, não caracteriza uma contaminação anômala e garante o seu efeito bactericida e encontrase dentro dos padrões exigidos para que elas sejam consideradas terapêuticas. Por sua vez, é a concentração do gás sulfeto que determina suas classificações como sulfurosas e lhes conferem as propriedades daí decorrentes”. Corroborando alguns desses efeitos maléficos Adriana conta que uma profissional da área odontológica diagnosticou a presença de casos de fluorose dentária em alguns pacientes, o que a levou a incluir o tema em sua pesquisa de mestrado com vistas a determinar se o problema pode ser creditado ao uso indevido e constante das águas termais sulfurosas, pois não existem controles a respeito ou pesquisas realizadas junto à população da cidade. As pesquisas levaram a autora a concluir que as águas de Poços de Caldas atendem às legislações vigentes do ponto de vista dos parâmetros pesquisados para fins terapêuticos, embora não possam ser ingeridas sem orientação médica, pois são consideradas águas medicinais e não alimentares. Foto: Isaías Teixeira da Silva

Em vista disso, ela considera fundamental a realização de um amplo trabalho de conscientização da população da cidade e dos que a frequentam e a manutenção de um controle constante dessas águas ao longo do tempo com a criação de um banco de dados. E justifica: “São águas importantes, diferenciadas entre si, pois cada uma possui sua peculiaridade”. Ela defende o resgate dos benefícios dessas águas que deixaram de ser pesquisadas e foram esquecidas e relegadas com o desenvolvimento de medicamentos que possibilitaram efeitos de cura mais rápidos. Mesmo assim, segundo ela, as Thermas são ainda muito procuradas, principalmente por pessoas mais velhas, pelo efeito relaxante dos banhos e principalmente para tratamento de problemas dermatológicos, respiratórios e de estresse físico.

ORIGENS

Há mais de 50 milhões de anos ocorreu na região de Poços de Caldas um evento denominado vulcanismo, do que resultou a abertura de imensas fraturas no solo, de profundidade variável, mas que chegam a três mil metros. Nessas fraturas mais profundas, face ao alto índice pluviométrico, as águas vêm se acumulando há cerca de 30 mil anos. Encontrando temperaturas altas nas fraturas as águas provocam a lixiviação das rochas e se carregam de íons. Impulsionadas por pressão, atingem a superfície em temperaturas em torno de 45 graus Celsius, carregando todas as substâncias que as diferenciam das águas comuns e responsáveis pelas suas propriedades medicinais. Em decorrência desse mecanismo e em vista do crescimento da cidade sobre as fontes, essas águas correm o risco de contaminação nos pontos de surgência e de recarga em decorrência de interferências antrópicas tais como esgotos, acumulação de lixo, presença de postos de gasolina, pavimentação do solo. Essas contaminações inviabilizariam seu uso termal. Cabe ao poder publico, através de políticas adequadas, evitar a ocorrência desse dano ao meio ambiente. Esse é outro alerta suscitado pelo trabalho.

Publicação Dissertação: “Avaliação da qualidade das águas termais sulfurosas distribuídas nas fontes da cidade de Poços de Caldas – MG” Autora: Adriana Moreira de Carvalho Orientador: Alexandre Nunes Ponezi Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) A bióloga Adriana Moreira de Carvalho: águas não devem ser ingeridas sem orientação médica


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Fotos: Reprodução

Crianças durante aula do Projeto Guri: diferentes habilidades na percepção harmônica

Quanto mais cedo, melhor ISABEL GARDENAL bel@unicamp.br

esquisa de doutorado da área de música do Instituto de Artes (IA) apontou que crianças ainda pequenas, com idade entre seis e nove anos, já são sensíveis à tonalidade e a elementos da harmonia (acordes), possuindo diferentes habilidades na percepção harmônica. O estudo – de autoria da pesquisadora Elizabeth Carrascosa Martínez, orientado pela professora Beatriz Senoi Ilari e coorientado pelo professor Claudiney Carrasco – sugeriu que a sensibilidade é maior quando se trata de canções familiares, antes de as crianças conseguirem generalizar o conhecimento para as canções não familiares. Neste caso, elas são capazes de perceber as mudanças de acordes em progressões harmônicas sem melodia, para depois captarem alterações em estímulos onde há melodia. O objeto de análise foi o Projeto Guri, um programa socioeducativo de ensino coletivo de música, e aconteceu no âmbito da Associação Amigos do Projeto Guri (AAPG). Foram avaliados 74 alunos especificamente do polo de Sorocaba, interior de São Paulo. Segundo a autora, além das características cognitivas ligadas à idade, fatores como complexidade do estímulo e características rítmicas também podem influir na percepção harmônica das crianças, uma das habilidades musicais que mais demora a ser desenvolvida, por ser uma das mais complexas e sofisticadas. Entendida neste estudo como o conhecimento implícito da estrutura da harmonia da música ocidental, a percepção harmônica compreende o conhecimento da probabilidade de sucessão dos acordes em sequências e cadências, conforme as normas que regem a harmonia. “Componente essencial da música tonal ocidental, a harmonia é um dos mais importantes elementos da linguagem musical e inclui conceitos como as relações entre as notas e acordes dentro de uma tonalidade, perceber desvios e mudanças de acordes e funções harmônicas em progressões simples”, descreve. Na amostra, o desenvolvimento se relacionou mais à maturação e à exposição cumulativa à música da cultura dos avaliados. Também o contexto familiar enriquecedor influiu no desempenho, do mesmo modo que o apoio da família e o contexto sociocultural mostraram ser de elevado valor. Há evidências ainda de que o treino pode facilitar ou acelerar o processo. A doutoranda lamenta que a percepção harmônica não faça parte dos currículos de música dos seis aos nove anos em muitas escolas, por julgarem-na difícil. “O ideal é que os currículos de música incluam tais conteúdos e que os educadores trabalhem atividades de percepção dos elementos da harmonia em suas aulas, de modo lúdico e manipulativo”, ressalta. A metodologia de ensino coletivo, preferida pela maioria dos pais, alunos e educadores deste estudo, pode conferir vantagens à percepção harmônica, desde que se realize um treino específico, pelo fato de as crianças adentrarem, desde o início, uma dimensão musical polifônica. “A execução de peças a diferentes vozes permite uma maior vivência dos elementos da harmonia

e é relevante para a educação musical no ensino coletivo de instrumentos”, acredita. As pesquisas nessa área ainda são incipientes no Brasil, uma vez que o acesso ao ensino regular de educação musical é limitado para grande parte das crianças. Na pesquisa, 82,4% dos participantes não tinham aulas de música na escola. Os testes de percepção harmônica foram iguais para todas crianças que aprendem com ensino coletivo de instrumentos, embora não se tenha comprovado que o tempo de estudo de música nesse projeto influísse no desempenho das tarefas de percepção harmônica. O objetivo de Elizabeth foi descrever, por um lado – mediante um teste de percepção harmônica – como se desenvolve o senso de tonalidade e a percepção de crianças de classe média-baixa que fazem iniciação musical e ensino coletivo de instrumento, em relação a duas tarefas: com uma canção conhecida e com canções desconhecidas. Por outro lado, o estudo procurou medir o desenvolvimento da percepção harmônica dessas crianças num estudo de corte transversal. As variáveis foram idade, sexo, tempo de estudo de música, tipo de instrumento estudado, tipo de metodologia de ensino usada e o contexto socioeconômico e cultural familiar dos participantes.

METODOLOGIA Para a coleta dos dados, além do teste de percepção harmônica, foram feitas entrevistas com pais e responsáveis, com as crianças e com os seus educadores; e observação das aulas dos educadores no Projeto Guri. Foto: Divulgação

A pesquisadora Elizabeth Carrascosa Martínez: avaliação de 74 alunos

O desenvolvimento da percepção harmônica na amostra foi medido comparando-se os resultados do teste de percepção harmônica, aplicado em um grupo na faixa etária de seis a sete anos e em outro de oito a nove anos. Eles foram submetidos a uma única sessão de testes com duração de 25 minutos, no início do segundo semestre de 2012. A primeira tarefa consistiu em detectar mudanças na última nota/acorde da canção folclórica brasileira Cai, cai, balão, em relação à versão original. A canção foi apresentada nas modalidades melodia, melodia acompanhada e harmonia. Cada uma delas foi mostrada no teste com quatro finais diferentes: padrão, fora da tonalidade, fora da harmonia e padrão invertido. A segunda tarefa procurou detectar mudanças de acordes no acompanhamento de uma canção não conhecida, tocada na modalidade de melodia acompanhada e na modalidade de harmonia.

RESULTADOS Houve diferenças significativas nos resultados dos dois grupos etários, embora tivessem conhecimento de progressões harmônicas adequadas – ou seja, acordes que se seguem uns aos outros – e conhecimento das notas que pertencem à tonalidade. Os participantes do grupo B, de maior idade, obtiveram escores mais altos que os escores do grupo A. Tanto as crianças de seis anos como as de nove anos da amostra perceberam diferenças nos elementos da harmonia e da tonalidade no contexto de uma canção familiar. As meninas tiveram, comumente, melhor desempenho na tarefa que os meninos. Nas entrevistas, a maior parte dos pais (72%) declarou gostar muito de escutar música e mais da metade (75%) escutava música diariamente; 88,9% dos pais declararam ser importante encorajar os filhos a gostar de música; a maioria dos pais (82%) disse preferir que os filhos estudassem música em grupo. A maioria das crianças (82,4%) não tinha aulas de música na escola. Declararam que preferiam aprender música em grupo (79,7%) e somente 14,9% preferiam aulas individuais de música, sendo a sociabilidade ou relacionamento com os colegas (37,3%) o motivo de preferirem aprender música em grupo, seguido dos benefícios para a aprendizagem (33,9%).

Um celeiro de músicos-mirins O projeto Guri foi criado em 1995 pela Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo e desenvolvido por duas organizações sociais de cultura: a Santa Marcelina Cultura e a Associação Amigos do Projeto Guri (AAPG). É considerado o maior projeto sociocultural do Brasil, atendendo anualmente, somente na AAPG, a cerca de 50 mil crianças, na faixa etária de seis a 18 anos, em 410 polos de 320 municípios do Estado, incluindo as unidades da Fundação CASA.

Crianças, adolescentes e jovens da comunidade local, com idade entre seis e 18 anos, chegam ao projeto através de cursos livres de iniciação musical, canto coral, cordas, sopros e percussão. As aulas são gratuitas e ocorrem duas a três vezes por semana nos períodos de contraturno escolar, com carga horária de duas a seis horas semanais. O público-alvo tem que estar regularmente matriculado na rede pública de ensino.

Valores altos na variável “contexto familiar”, que incluía aspectos como formação escolar dos pais, renda familiar e envolvimento da família em atividades musicais, entre outros, identificados como um contexto familiar enriquecedor, tiveram um melhor desempenho na primeira tarefa.

CARREIRA Ter participado desde 1992 como musicista da “La artística” da cidade de Buñol, Valencia (Espanha), uma banda de prestígio internacional, marcou a vida e a carreira de Elizabeth. Nesta etapa, teve a oportunidade de experimentar os benefícios da prática coletiva de música nos ensaios e concertos da banda. Também ter mudado para o Brasil em 2009, para integrar o Projeto Guri – do qual foi, primeiro, coordenadora da área de sopro-madeira e, depois, assessora pedagógica – possibilitou-lhe continuar o trabalho como educadora musical e aprofundar os conhecimentos sobre o ensino coletivo de instrumentos, no âmbito da atenção a crianças em situação de risco de exclusão social. “Só uma prática educacional musical de qualidade pode levar a transformações sociais, pois, sem a dimensão estética, o desenvolvimento de habilidades artísticas e a aquisição de novos conhecimentos, não há transformação”, defende Elizabeth. A pesquisadora tem visto um interesse crescente pela música comunitária e pelo ensino coletivo de instrumentos nos últimos anos. Contudo, na literatura, não encontrou pesquisa sobre o ensino coletivo de instrumentos que avalie a fundo o desenvolvimento das habilidades musicais nos participantes deste tipo de prática pedagógica, especialmente quanto à percepção auditiva. Ainda que alguns trabalhos já tenham analisado a percepção harmônica em crianças de quatro e de cinco anos canadenses, norte-americanas e argentinas, nenhum estudo abordou as características das crianças brasileiras. Por isso, é fundamental continuar fazendo investigações deste tipo, incentiva a pesquisadora, que tentem explicar o desenvolvimento com relação a circunstâncias sociais e contextos culturais específicos no país. Os estudos sobre o tema em geral advêm de investigações estrangeiras. “Procuramos ajudar na compreensão de alguns aspectos que podem colaborar para uma instrução adequada, sem renunciar a aspectos da harmonia musical nestas idades”, afirma Elizabeth, que é professoraassociada na Universitat de València. “Que este estudo sirva de marco para trabalhos longitudinais acerca da percepção em geral e a percepção harmônica em particular de crianças brasileiras.”

Publicação Tese: “O projeto Guri e a percepção harmônica em crianças de 6 a 9 anos: um estudo sobre a aquisição do conhecimento da tonalidade e da harmonia no contexto do ensino coletivo de instrumentos em São Paulo” Autora: Elizabeth Carrascosa Martínez Orientador: Beatriz Senoi Ilari Coorientador: Claudiney Rodrigues Carrasco Unidade: Instituto de Artes (IA)


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