CALDEIRÃO DE SANTA CRUZ DO DESERTO: UM MASSACRE SOB O “PODER DA MEMÓRIA” NO CEARÁ IPEA - 45 ANOS: A ENCOMENDA DE LULA PARA O BRASIL DO FUTURO
Edição Nº 06 — Ano I — Revista Nordeste VinteUm – Publicação sobre economia, política e cultura — www.nordestevinteum.com.br
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R$ 9,90
Gilberto Freyre DE MENINO A HOMEM
Um anarquista construtivo passeia pela sua história DNOCS - 100 ANOS
O “Senhor das Águas” em agonia de sede
O PIAUÍ ENCHE OS OLHOS DOS VISITANTES E IN
É por isso que fizemos esse anúncio com muitas imag Pra você também se encantar com o nosso Estado log
Temos muito mais a mostrar: belezas naturais, oportunidades e desenvolvimento Mas preferimos que você confira de perto. Porque nenhuma imagem consegue ainda melhor: o calor humano da nossa gente.
NVESTIDORES
gens. go à primeira vista.
o nas mais diversas formas. transmitir uma sensação
Insigths Gilberto de Mello Freyre. (Recife, 15 de março de 1900 — Recife, 18 de julho de 1987). Sociólogo, antropólogo, escritor e pintor brasileiro. Um dos grandes nomes da história do Brasil. Visões de mundo
“O humano só pode ser compreendido pelo humano – até onde pode ser compreendido; e compreensão importa em maior ou menor sacrifício da objetividade. Pois tratando-se de passado humano, há que deixar-se espaço para a dúvida e até para o mistério” “Um dos característicos de nossa geração é repugnarmos o dramalhão. Ele se tornou ridículo para nós. A voz com que hoje enfrentamos os momentos mais difíceis, em nossa vida sentimental como na política, é a simples e quase de conversa. Se Carlayle aparecesse hoje, nós pediríamos a Carlayle o grande favor de falar um pouco mais baixo. Se Euclides da Cunha escrevesse hoje, nós pediríamos ao grande autor d’ Os Sertões o obséquio de escrever um pouco mais simples”.
“Creio que cada um deve ficar o mais possível no lugar onde nasceu. Nada de muita emenda ao soneto da vida: ou do destino, que é o mesmo”. “Deus pra mim existe porque minhas intuições reclamam que Ele exista. Fora de toda Teologia. Creio que os teólogos só têm feito atrapalhar a compreensão humana de Deus. Eu acho que os teólogos são, realmente, tecnocratas da pior espécie. Eles querem tecnocratizar o Mistério.”
“Felizmente o Brasil futuro não vai ser o que os velhos historiadores disseram e os de hoje repetem. Vai ser o que Gilberto Freyre disser. A grande vingança dos gênios é essa” Monteiro Lobato, escritor (18/04/1882 – 04/07/1948)
“Aliás, para Freyre não existem fronteiras rígidas entre a região da poesia e a região da ciência. Da ciência criadora, como ele precisa, aquela ciência como que apocalíptica e quixotesca, tantas vezes tão próxima do ridículo e do obscuro, que é a mais alta das ciências” Manuel Bandeira, poeta, crítico literário e de arte, professor de literatura e tradutor brasileiro (19/04/1886 – 13/10/1968) “O que o Brasil e os brasileiros devem a Gilberto Freyre poderia ser definido como tomada de consciência histórica. Através da interpretação gilbertiana o Brasil ‘reconhece-se’ e foi ‘reconhecido’ pelo mundo, o que é, por sua vez, um fato decisivo, uma data na história brasileira” Otto Maria Carpeaux, ensaísta, crítico literário e jornalista austríaco por nascimento e brasileiro por opção
(09/03/1900 – 03/02/1978) “Nossa arte manter-se-á fiel à realidade através do lastro tradicional, ou não se manterá de modo nenhum. E nunca será demais lembrar que foi o movimento dirigido por Gilberto Freyre, o primeiro a anunciar profeticamente esta verdade”. Ariano Suassuna, pesquisador, dramaturgo, romancista e poeta brasileiro
OPINIÃO “Dai de beber a quem tem sede”
À guisa de introdução sobre perversidades contra um Centenário
Por Juarez Leitão, do Conselho Editorial da Nordeste VinteUm (*)
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ois, então, o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas tornou-se centenário. Poucas foram as instituições oficiais que, prestando efetivos benefícios econômicos e humanos ao Nordeste, resistiram tanto à força demolidora dos inimigos de nossa região. Um século de proveitosos empreendimentos banha a história impávida desta autarquia federal, o primeiro órgão a se preocupar concretamente com os problemas do semiárido. O Dnocs das estradas e dos açudes. Dos socorros nos tempos de calamidades. Das emergências nas secas, atalhando os filetes d’água com barragens, prospectando o chão comburido em busca de mananciais subterrâneos, no cumprimento da assertiva bíblica de “dai de beber a quem tem sede.” O Nordeste, porta de entrada da colonização ibérica do Brasil, é marcado por certos maus humores do destino. Detentora do primeiro ciclo econômico, o da agricultura canavieira, a região nordestina foi perdendo espaço para outras regiões, à medida em que se desenvolviam os demais estágios da economia. Até transformar-se na predileta referência trágica da miséria nacional, objeto de romances, poemas e ensaios sociológicos, inclusive de famosa tirada demagógica do imperador Pedro II, que prometeu empenhar o último brilhante de sua coroa para que não morresse nenhum cearense de fome. O fator determinante de nossa pobreza regional foi a seca, fenômeno histórico desta banda geográfica do Brasil, responsável por grandes calamidades e pela quebra do processo dinâmico de nossa economia. Como os nossos rios não são alimentados por mananciais constantes de importância, pois a maioria dos olhos d’água desta região têm vazão insignificante, dependemos exclusivamente das precipitações pluviosas.
Com apenas duas estações, que chamamos de inverno e verão, vivemos com um olho nas nuvens e o outro no chão, no trapézio oscilante entre a vida e a morte, no líquido paradoxo das chuvas ou das lágrimas. As condições desfavoráveis da natureza devem ser corrigidas pelo homem, que pelas conquistas da inteligência tornouse o domador de seu próprio destino, no nosso caso, do destino adverso. O Dnocs, nesta longa e secular trajetória, vem cumprindo a sua parte na missão de desentortar a nossa sina, ao custo do enfrentamento das oligarquias, das omissões de lideranças, das negligências oficiais, dos interesses políticos mesquinhos, do pessimismo e do conformismo atávico, culturalmente arraigados na alma nordestina por decepções continuadas e até incentivo espiritual. A tudo, sobrevive o Dnocs, com atuação veemente e destemida afirmação laboriosa a serviço do Nordeste. Sua identificação com as esperanças e a saga nordestina é de tal ordem que a autarquia se confunde com os símbolos perenes e sagrados de nosso povo. O Dnocs é tão nosso quanto a mata caatingueira, o mandacaru, o vento Aracati, o desfile do maracatu, a faca peixeira, o doce de buriti, São Francisco de Canindé ou o Padre Cícero Romão. Agora, da plena soberania dos cem anos, em longa e lenta agonia contempla o largo vale de suas realizações. E, para que a memória não se perca nos escaninhos do desleixo, a revista Nordeste VinteUm publica neste número, um expressivo relato sobre suas obras e divulga noções do seu acervo documental. Permeado de relatos fascinantes de pessoas geradas e transformadas a partir da ingente tarefa de, sob o sol causticante, umedecer a terra e o coração dos nordestinos.
(*) JUAREZ LEITÃO, é escritor, historiador e membro da Academia Cearense de Letras
Capa: Marcos Aurelio/Ilustração
Edição Nº 06 Ano I — Novembro/Dezembro — 2009 Circulação Dezembro 2009 Revista Nordeste VinteUm Política, Economia, Cultura www.revistanordestevinteum.com.br
Seções 20. Caleidoscópio 46. Saberes & Sabores 66. Ateliê – Totonho Laprovitera
Ensaio
35. Caldeirão, entre
história e memória
O historiador Régis Lopes fala sobre como o Caldeirão de Santa Cruz do Deserto resiste ao aniquilamento nas contendas da história
Artigo 57. Cento e cinquenta anos depois Gilmar de Carvalho
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Sumário 10 Dnocs
O pioneirismo centenário de um desbravador do sertão que agoniza lenta e silenciosamente nos últimos lugares da lista de prioridades governamentais
Nordeste VinteUM
Carta do Editor
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Ipea 45 anos
O desafio de um instituto na construção da agenda desenvolvimentista de longo prazo para o Brasil
42 Gilberto Freyre
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Brasil
Em De Menino a Homem, o revolucionário da Sociologia e Antropologia e um dos maiores intérpretes do Brasil passeia em reflexões biográficas às vésperas de ser homenageado pela Flip 2010, no mês de agosto
Científica de Exploração
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Inovação Social Conheça o Prece, um modelo de aprendizagem cooperativa que leva sertanejos aos bancos das universidades
Flamínio Araripe Editor Adjunto do caderno Ciência e Tecnologia editor@editoraassare.com.br
Claudemir Luis Gazzoni
Os 150 anos da primeira expedição científica brasileira à província cearense do “Norte”
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Legitimidade pelo jeito de bem dizer exemplos do bom viver
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ove meses do ano de 2009 deixaram marcada, de Fortaleza para o Nordeste e o Brasil, uma breve e singular história de empreendedorismo sobrevivente na selva que é o mercado gráfico-editorial de nossa região. Mas, que se reafirma a cada dia. Com coragem e perseverança, mesmo que a vida venha a nos violentar. Eis a trilha do jornalismo que escolhemos para palmilhar. Pautados sempre no sentimento de insurretos exploradores a limpar a roça, tirar as coivaras, pelejar. Com a mira aprumada na infinitude dos números para edições da nossa revista. Uma obra coletiva. Gênita do arrojo de uma equipe de jornalistas imperturbável frente às inclemências do nosso clima e tempo. Que fincou reconhecença. Aquele sinal em terra, pelo qual os viajantes identificam as paragens das costas. Seja na política, economia e cultura, que constituem o tripé informativo de nosso veículo. Seja nas incursões desbravadoras pelo universo da ciência e tecnologia. Desde o início de tudo, esteiados nas evocações do pensar original de figuras como Celso Furtado, Josué de Castro, Câmara Cascudo, Padre Cícero, Graciliano Ramos e Gilberto Freyre. Gente de preeminente acuidade no olhar sobre nosso passado, presente e futuro que, não por acaso, abrilhantou o tratamento editorial dos seis temas de capa da revista. Páginas estas a não se arredar infinitésima parte que fosse do seu compromisso editorial com o resgate de questões como o desenvolvimentismo, a história dos desequilíbrios regionais, os avanços socioeconômicos e a necessidade de revisão das políticas públicas. É assim que chegamos a esta edição de número seis. Para conferir, basta correr a vista pelas próximas folhas e atestar a abrangência temática e a profundidade no trato de conteúdos como: o drama do centenário Dnocs, a pujança do Ipea ao chegar dos seus 45 anos, o poder da memória sobre o massacre de uma utopia de fraternidade no Cariri cearense, a história do pernambucano que revolucionou o estudo da Sociologia e da Antropologia no mundo e, por fim, a grata experiência de aprendizagem cooperativa que leva sertanejos aos bancos de universidades.
Política Pública
Agonia lenta e silenc
desbra do semiArido ´ Um século de existência marcado tanto pelo pioneirismo quanto pelo passado recente e atual instante de enfraquecimento político e institucional. Eis um brevíssimo e injusto resumo da trajetória do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), instrumento estratégico na execução de políticas de convivência com as secas que, lamentavelmente, acabou apropriado politicamente pelos coronéis nordestinos no século passado. Uma arrogação de posse que se perpetua em pleno século XXI. Agora, por novos “mestres de campo” e “caciques” políticos. O órgão, reconhecidamente importante para o desenvolvimento regional, agoniza lenta e silenciosamente. Chegou a ser extinto em 1999 no governo de Fernando Henrique Cardoso. Com Lula, sem renovação de quadros, ocupa um papel secundário no maior projeto hídrico do atual governo: a transposição de águas do Rio São Francisco. Por Samira de Castro redacao@nordestevinteum.com.br
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o longo de dez décadas, segundo o Governo Federal, o Dnocs investiu US$ 20 bilhões no semiárido (a preços atuais), conseguindo evitar, na devida proporção do que lhe coube, grande parte do êxodo rural nordestino. Hoje, uma nova dimensão está sendo destinada ao órgão, que caminha rumo a uma estratégia para definir seu fortalecimento, passando pela sua reestruturação institucional, pela definição de novas funções voltadas para a gestão dos recursos hídricos regionais, combate à desertificação e estudos e ações que minimizem as mudanças climáticas no semiárido brasileiro. Além de concurso público e um plano de cargos e carreiras para os servidores do órgão.
Muito se discute – na Câmara Federal, no Senado, no Ministério da Integração Nacional. Porém, nada de concreto se apresenta. Para o economista André Silva Pomponet, especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental na Secretaria do Planejamento da Bahia, quando foi concebido, o Dnocs (então Iocs) teve o mérito de despertar o Brasil para a questão das secas. “Até então, quando
ocorria alguma estiagem, a medida que se tomava era a distribuição de alimentos. Milhões de nordestinos morreram ou migraram nessas ocasiões. Depois, o problema era esquecido”, afirma. “O Nordeste era órfão de tudo”, acrescenta o engenheiro civil Cássio Borges, servidor aposentado do órgão e atual diretor técnico científico da Sociedade Amigos do Dnocs (Soad). A criação do órgão Novembro/Dezembro n 2009
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levou os governos a tentarem conter os fluxos migratórios por meio de obras de infraestrutura hídrica. “Para a atual geração de nordestinos e brasileiros, que nunca tomou conhecimento dos implacáveis flagelos das secas ocorridas no passado, tudo o que o Dnocs realizou nos seus 100 anos de existência, e se incorporou à paisagem nordestina, foi uma dádiva de Deus. Para esta geração, os 3.300 quilômetros de rios perenizados, superior à extensão do rio Danúbio, que corta a Europa de leste a oeste, já existia mesmo antes do descobrimento do Brasil”, compara Borges, que tem acompanhado o trabalho do Dnocs na região nordestina nos últimos 50 anos. Coube ao Dnocs construir o Nordeste, resume Roberto Morse
Onde construímos um açude, uma rodovia e uma rede de energia, virou uma cidade Roberto Morse, presidente da Assecas
de Souza, presidente da associação dos Servidores do órgão (Assecas). “Onde construímos um açude, uma rodovia e uma rede de energia, virou uma cidade”, comenta. Trabalho importante não apenas quando se fala em grandes reservatórios,
estradas de ferro. “Mas também o dia a dia, as pequenas ações nos recantos mais humildes do sertão, em que nós servidores ajudamos os pequenos agricultores na luta diária pela sobrevivência”, conta Morse. “Mesmo com todos os vícios políticos que sempre contaminaram o órgão, em alguma medida, as obras de infraestrutura ajudaram a conter fluxos migratórios mais intensos em direção ao litoral e contribuíram para reduzir as mortes nos períodos de secas mais rigorosas”, reconhece Pomponet. Ele ressalva que “isso não apaga, todavia, o triste passado em que o Dnocs foi usado como moeda de troca política e que muitas obras aconteceram em propriedades privadas, favorecendo os coronéis beneficiários da indústria das secas”.
Fora da Transposição, descontínuo fluxo financeiro e sucateamento Foto: Arquivo
Situação de parte do acervo do Dnocs, em más condições de conservação
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om toda a sua história, o órgão chega aos seus 100 anos desprestigiado. Oficialmente, não se fala em esvaziamento. Mas, basta lembrar que o Dnocs participa de forma acanhada do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com 14 obras estruturantes e outras por meio de fontes de seu orçamento, envolvendo recursos superiores a R$ 1,5 bilhão. E está praticamente de fora do projeto da transposição do São Francisco. “O Dnocs não tem estrutura para tocar uma obra dessa dimensão. E, talvez por uma questão política, o governo tenha preferido não envolvê-lo na discussão, já que a obra não é unanimidade entre os estados nordestinos”, afirma Pomponet.
Minguados recursos da União, um passivo institucional, sedes regionais caindo literalmente aos pedaços e nem um escritório em Brasília. O quadro é descrito pelo próprio diretor administrativo do Departamento, Albert Gradvhol, que afirma lamentar “profundamente a forma como o Dnocs tem sido tratado atualmente”.
“O Dnocs tem uma demanda de R$ 12 bilhões. E não tem sequer
uma secretaria em Brasília. A estrutura física das coordenadorias estaduais, que são os braços do órgão, está completamente sucateada. Em alguns casos, a fiação elétrica está aparente, só falta o forro cair na cabeça do servidor”, relata.
Mapas, projetos do órgão, obras raras e documentos relevantes sem qualquer cuidado. Alguns estavam amassados e outros, rasgados.
“Para sulistas, uma terra de ninguém” Cássio Borges lembra que o Departamento sofreu muitas estagnações em sua atuação face a irregularidade dos recursos financeiros. O rompimento do açude Orós, em 1960, é um exemplo de descontinuidade do fluxo de dinheiro. “Sempre houve um entendimento dos planejadores governamentais, geralmente sulistas, de que as obras construídas pelo Dnocs deveriam proporcionar o retorno do capital investido, ou seja, a prática da lavoura
irrigada. Para esses planejadores, embora este conceito tenha mudado mais recentemente, o Nordeste é um deserto que se apresenta irreversível, com uma população acabrunhada pela sede e pela fome, os rebanhos flagelados pela penúria da pastagem. E a solução, no seu entendimento, é a retirada em massa de todo o ser vivente, transformando a região em terras de ninguém”, pontua.
Moeda de troca
Uso político de diretorias e desintegrado à órgãos como BNB, Codevasf e Sudene H
istoricamente, o Dnocs sempre foi utilizado como moeda de troca e a sua direção indicada por políticos nordestinos. Nunca teve ações integradas a outros órgão de desenvolvimento regional, como a Sudene, a Codevasf e o Banco do Nordeste. “Não destoa muito da prática em outros órgãos no presente e no passado. Creio, todavia, que aos poucos a necessidade de se indicar dirigentes utilizando critérios técnicos vai se impondo, seja pela própria maturidade institucional do País, seja pela necessidade de quadros mais qualificados para compreender os problemas e propor soluções adequadas”, acrescenta Pomponet.
Para Cássio Borges, não se pode encobrir que o Dnocs, como outros organismos federais e, principalmente, os estaduais, sofre da nefasta interferência de maus políticos. “Infelizmente – e esta é a origem do problema –, os cargos mais importantes do órgão são preenchidos por indicações partidárias, em detrimento de técnicos com longo tempo de serviços prestados à instituição. Tenho observado que muitos engenheiros, administradores, técnicos, de uma forma geral, desempenhando funções de enorme responsabilidade, com idealismo e patriotismo, se contentam em receber uma fração de vencimento que poderiam ganhar na iniciativa privada”, completa.
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“Com FHC, extinção. Com Lula, inanição” B
orges argumenta que a visão distorcida dos sulistas em relação ao Nordeste em muito contribuiu para a imagem negativa da autarquia – como “órgão ineficiente”, sumidouro dos recursos financeiros da União. “Foi por isso que FHC, um paulistão de quatro costados, extinguiu não somente o Dnocs, como a Sudene”, comenta. O engenheiro teme que, com uma nova extinção do Dnocs, a problemática do semiárido nordestino seja transferida para Brasília, onde burocratas nada comprometidos com a região irão decidir seus rumos. No Governo FHC, relembra Pomponet, vivia-se uma onda liberal de vigência efêmera e de êxitos duvidosos. “O Dnocs acabou atingido duplamente: por ser um órgão público
– num período de ‘caça às bruxas’ ao setor público – e também por atuar numa região que não era priorizada economicamente e cujos beneficiários potenciais não necessariamente são grandes grupos empresariais”, argumenta Pomponet. “No Governo Lula”, prossegue ele, “as concessões políticas aos poderosos locais não cessaram e o órgão acaba afetado pela falta de clareza nas estratégias de longo prazo”. Daí, a ausência de concursos e de uma política institucional mais clara. Cássio Borges é mais enfático: “o Dnocs agora passa por momentos de incertezas em sua existência, pois está morrendo por inani-
ção”. Ele acrescenta que, infelizmente, mesmo com um presidente nordestino, a situação do órgão não mudou. “E nada foi feito, até agora, que vislumbre dias melhores para aquele operante departamento federal”, lamenta o engenheiro civil. Museu das Secas, antiga sede do Dnocs, em Fortaleza
Mea culpa
“Acho injusto ocupar este cargo” A
o confessar a frustração por não poder realizar mais no cargo – por conta da estrutura engessada –, o diretor administrativo, Albert Gradvhol, faz uma mea culpa: “acho injusto ocupar este cargo. O diretor administrativo deveria ser um servidor. É preciAlbert Gradvhol, diretor administrativo do Dnocs
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so que o Dnocs, assim como outros órgãos de desenvolvimento, tenha a menor interferência política possível. Que seja nomeado apenas o diretor geral. Todo o chamado segundo escalão deveria ser composto por servidores de carreira, que são a prata da casa, com conhecimento inestimável sobre a entidade, como acontece em organismos internacionais”, diz. Para o economista André Pomponet, a ausência de articulação entre instituições e órgãos públicos é um problema secular no Brasil. “O planejamento dos órgãos é paralelo e muitos esforços são inúteis, porque as políticas públicas concebidas não se articulam. Faltam diagnósticos sistêmicos, compreensões ao mes-
mo tempo amplas e profundas dos problemas da região”. Se há crédito, às vezes, não há acompanhamento técnico, sistemas de irrigação ou qualificação para os produtores ou até mesmo acesso aos mercados. “Se houvesse um esforço efetivo para articular políticas de bancos, órgãos, ministérios, esses problemas seriam menores, porque se saberia, com mais objetividade, o que é necessário fazer e como cada setor deve atuar”.
Tragédia da seca de 1877 com 500 mil mortes impulsionou criação de novo órgão
D. Pedro II e família, da esquerda para a direita: a imperatriz, D. Antonio, a princesa Isabel, o imperador, D. Pedro Augusto, D. Luís, o conde D’Eu e D. Pedro de Alcântara.
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história do Dnocs começou na época imperial brasileira. Em 1877, o Nordeste enfrentou a maior estiagem de todos os tempos: 500 mil pessoas morreram de fome e sede,
numa seca que se estendeu por três anos. Populações se deslocaram, famílias se separaram e epidemias se alastraram. A catástrofe sertaneja despertou o governo Imperial para a necessidade de encontrar alternativas e evitar novas desgraças. Profissionais de engenharia do Instituto Politécnico do Rio de Janeiro se reuniram sob a presidência do genro de D. Pedro II, Conde D’eu, e apresentaram sugestões sobre estudos e obras que permitissem o abastecimento de água à população e a manutenção da agricultura e pecuária durante as estiagens. O Império virou República e novas secas chegaram desafiando os técnicos, que avançaram nos estudos e experiências com equipamentos até então nunca usados na América Latina. Essas comissões, criadas no
Engenharia
Único ente federal em socorro do Nordeste até meados de 1945
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riado pelo então presidente Nilo Peçanha, por meio do Decreto nº 7.619, de 21 de outubro
Foto: Arquivo
Trabalhadores do Dnocs em obras
de 1909, com o nome de Inspetoria de Obras Contra as Secas (Iocs), e transformado em Inspetoria Federal
Retirantes da seca de 1877. Desenho especial de Percy Lau para o livro Geografia da Fome de Josué de Castro, 7ª. edição, 1961. O desenho foi baseado numa gravura original da época
Ceará e no Rio Grande do Norte, tornaram-se a raiz do órgão que seria o grande pensador, executor e gerenciador das mais importantes obras realizadas no Nordeste para a convivência com as estiagens.
em 1919, o Dnocs passou a ser um Departamento só em 1945, pelas mãos do presidente José Linhares. Desde a sua fundação até meados de 1945, órgão foi praticamente a única agência governamental federal executora de obras de engenharia no Nordeste. Cruzando vales, transpondo serras e montanhas, entrecortando a terra – na maioria das vezes seca e árida – em todas as direções, os engenheiros do Dnocs fizeram de tudo. Construíram açudes, estradas, pontes, portos, ferrovias, hospitais, campos de pouso e usinas hidrelétricas. Implantaram redes de energia elétrica e telegráfica. Até a criação da Sudene, em 1959, o órgão era o responsável único pelo socorro às populações atingidas pelas cíclicas secas que assolavam a região. Novembro/Dezembro n 2009
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No começo, o Dnocs concentrou-se em:
Estudos sobre uma região desconhecida. Para tanto, valeu-se de especialistas internacionais nas áreas de botânica, agronomia, geologia, hidrologia e engenharia.
A partir dos resultados, tratou de amenizar os pre-
juízos trazidos aos nordestinos pela irregularidade de chuvas na região, buscando não apenas acudir o homem mas também melhorar a capacidade de resistência do rebanho pecuário – principal suporte econômico do Nordeste semiárido à época.
Dar prioridade à construção de barragens para
acumulação de água. O órgão marcou o solo nordestino com ferrovias e estradas, para facilitar o Décadas de 50/60 acesso a centros urbanos. Antes da ditadura, uma Foi a partir daí que também passou a fazer obras mudança de foco: do de menor porte – perfuclima para a questão ração de poços tubulares sócioeconômica e instalação de pequenas hidrelétricas –, como gaSomente na década rantia de água potável nos principais grupamende 1950 se tentou tos urbanos nordestiabandonar o conceito nos. A cada seca, a mãode “combater” as secas de-obra desempregada e adotar a filosofia da (agricultores e pescadores, em sua maioria) era convivência com seus absorvida pelo Dnocs.
efeitos, deslocando a abordagem da questão da dimensão climática para a econômica e social – explica o economista André Pomponet. “Infelizmente, a longa ditadura que se seguiu terminou por sufocar essa discussão, que incluía o tema crucial da reforma agrária”, acrescenta. 16
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O instituto marcou solo com várias obras que iam de ferrovias e estradas a barragens e suporte a cultura de várias áreas como pecuária e piscicultura.
Maior empreiteira da América Latina Na época em que o Governo Federal construía suas obras por administração direta no Nordeste, o Dnocs chegou a ser “a maior empreiteira da América Latina”, com mais de 30 mil operários e funcionários. Nos períodos de seca, com os alistamentos para as frentes de serviço, os trabalhadores chegavam a 100 mil.
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lém de grandes reservatórios, como o Orós, o Banabuiú e o Araras, coube ao órgão a construção da rodovia Rio-Bahia e o início da barragem de Boa Esperança. Com a criação de órgãos especializados, o acervo de obras não hídricas – como rodovias, linhas de transmissão, ferrovias e portos – foi a estes transferido. Seria o começo do esvaziamento do órgão. O primeiro grande reservatório do Dnocs foi o Juscelino Kubitschek, inaugurado em 1961, no município cearense de Orós, com capacidade para dois bilhões de metros cúbicos de água. Em 1983, veio a construção do açude Armando Ribeiro Gonçalves, no Rio Grande do Norte. O Açu, capaz de armazenar 2,4 bilhões de metros cúbicos de água, passou a ser o maior reservatório da região, superado somente 20 anos depois, quando o Dnocs ergueu o Castanhão. O gigante do Vale Jaguaribano cearense, com capacidade para acumular 6,7 bilhões de metros cúbicos de água, marcou o ápice da engenharia de barragens no semiárido. O Castanhão é o maior açude para múltiplos usos do Brasil.
Banabuiú
Araras
Boa Esperança
Açude de Orós
Castanhão
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Reestruturação do órgão continua parada em gavetas de Ministérios O projeto de reestruturação do Dnocs parece seguir a passos de tartaruga, há mais de um ano. Há quem diga que permanece esquecido no fundo de alguma gaveta do Ministério da Integração ou do Planejamento, em Brasília. Segundo o diretor administrativo, Albert Gradvhol, já houve
tratativa com o ministro Geddel Vieira Lima para que o processo seja acelerado e levado à Câmara Federal para aprovação. “A reestruturação deve ser discutida o mais urgente possível e que sofra a menor influência política possível para que haja sucesso na sua revitalização”.
Esplanada dos Ministérios, em Brasília
Expectativas e decepções com o governo C
om a eleição do presidente Lula, havia a esperança para o órgão. No primeiro mandato, foram priorizadas as ações relacionadas à produção nas áreas da piscicultura e da irrigação, a conclusão das obras iniciadas e a construção do Centro de Referência do Semiárido. A nova investida de Lula está sendo marcado pela reestruturação de vários órgãos federais e o Dnocs continua esquecido. Para André Pomponet, o processo de transição da perspectiva meramente de engenharia civil do Dnocs, para a social e econômica ainda não se completou. “Mas, a tarefa de articular políticas de convivência com a seca, porém, transcende o Dnocs”, defende o economista. A grande questão que se coloca para o Nordeste, reflete o economista baiano, é como consolidar esse modelo de convivência com a seca, que seja economicamente viável, ambientalmente sustentável, socialmente justo e includente e politicamente
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Agora centenária, a entidade precisa renovar forças e energia para encarar os desafios que incluem a sua reestruturação e revitalização Roberto Morse, presidente da Assecas
equilibrado. “O enfrentamento desse desafio exige uma arquitetura institucional que envolve vários ministérios, mas que sem dúvida passa pelo Dnocs”, completa. Para Pomponet, o que falta à região, em linhas gerais, são diagnósticos mais adequados e sistêmicos dos seus problemas, foco nos segmentos sociais mais fragilizados e representa-
Cobrança por menos discurso e mais ação
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e acordo com Gradvhol, até hoje não existe um Plano de Cargos, Carreiras e Salários (Pccs) no Departamento, que conta com 13 mil aposentados, merecedores de respeito. Ele defende investimentos em gestão. “Tem gente que ainda pensa que o Dnocs é uma fábrica de furar poço. Temos aí a piscicultura, que poderia estar sendo mais bem desenvolvida, gerando divisas para o País através das exportações”. O diretor acrescenta que a falta de recursos é um dos maiores entraves ao fortalecimento do órgão. “Nossa conta de recursos próprios para investimento no reforço das regionais, por exemplo, é muito burocrática”, lamenta. Uma solução, segundo ele, seria leiloar a prestação do serviço da folha de pagamento dos servidores, que movimenta R$ 38 milhões. “Por que não negociar isto com um banco, que pode, em troca, oferecer serviços para este contingente de servidores?”, questiona, acrescentando falas sobre remuneração pelo uso da água dos reservatórios construídos. tividade política. “Quando houver clareza em termos de como se desenvolver a região, então surge o momento de mobilizar os diversos órgãos. Isso, todavia, implica em uma decisão política mais ampla, de se voltar a discutir a região. Como aconteceu nos anos 1950, com Celso Furtado e o Gtdn, que originou a Sudene”, frisa. Para Roberto Morse, a grande mudança em curso não é do cenário e sim do próprio Dnocs. “Agora centenária, a entidade precisa renovar forças e energia para encarar os desafios que incluem a sua reestruturação e revitalização. É fundamental que a Assecas participe deste processo e esteja preparada para opinar e orientar seus associados. Somos nós, os servidores, os agentes destas transformações”, frisa.
NÚMEROS DO PIONEIRISMO QUE FICOU PARA TRÁS
Frases Dom Pedro II, 1877
Venderei a última jóia da Coroa, mas não morrerá um cearense de fome
326 açudes públicos com capacidade de acumulação total de 25 bilhões de metros cúbicos de água
622 açudes executados em regime de cooperação com estados, municípios e particulares, com capacidade de acumulação de 1,5 bilhão de metros cúbicos de água
27 mil poços públicos e particulares perfurados, com índice de aproveitamento de 90% 177 sistemas de abastecimento público de água implantados em cidades, inclusive em algumas capitais nordestinas, beneficiando mais de 2 milhões de habitantes
8 usinas hidrelétricas de pequeno porte instaladas em açudes públicos, com capacidade total de 14.000 CV 22.600 km de rodovias construídos, que se constituíram na malha pioneira do que hoje é a rede rodoviária nordestina
4.000 km de rios perenizados, com cerca de 100 m³/s, volume suficiente para irrigar 65.000 ha (65%) e abastecer 18 milhões de habitantes (35%) 71.739 hectares irrigados implantados em 38 projetos públicos, entregues 41.271 ha para 7.197 pequenos irrigantes, 1.090 ha para 66 engenheiros agrônomos, 864 ha para 67 técnicos agrícolas e 20.097 ha para 335 empresas agropecuárias
8 estações de piscicultura construídas, além de 01 Centro de Pesquisas Ictiológicas e um Laboratório de Larvicultura de Camarões. 4 estações de piscicultura em fase de construção e/ ou início de operação.
181 açudes públicos monitorados para pesca. 1.555 km de adutoras regionais implantados, para atender uma população de 1,6 milhão de pessoas.
Thomaz Pompeu Sobrinho, engenheiro e antropólogo, 1953
Como de costume, os trabalhos da Inspetoria de secas sofreram sensível declínio com a paralisação de obras importantes, iniciadas sob a pressão dos flagelos que passavam paulatinamente Gustavo Krause, então ministro do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, 1997
Quem mais sabe de um recurso que será estratégico, quem mais conhece o semiárido, quem pode se abrir para a ciência, para a tecnologia, para a Universidade, é o Dnocs
Cássio Borges, engenheiro civil e diretor da Soad, 2009
O Dnocs agora passa por momentos de incertezas em sua existência, pois está morrendo por inanição
Albert Gradvhol, diretor Administrativo do Dnocs, 2009
Precisamos pegar aquela bancada política do Nordeste que não deixou o órgão ser extinto e trazer para a discussão atual, fazer o Pccs chegar ao bolso do servidor. Precisamos diminuir os discursos bonitos e provar à sociedade que somos soberanos. O Dnocs está precisando nascer de novo, sem amarras políticas e institucionais. O que ele tem é tão pouco, e precisa de tanto que a gente vai precisar fazer 200 anos Novembro/Dezembro n 2009
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Caleidoscópio redacao@nordestevinteum.com.br
Kariri Beach
semiárido
Cumbuco ganha hotel internacional
Nordeste VinteUm recebe carta de recomendação técnica da Icid 2010
A Praia do Cumbuco, em Caucaia, a 27 quilômetros de Fortaleza, acaba de ganhar seu primeiro hotel com características de resort ‘pé na areia’. É o Kariri Beach, um empreendimento de R$ 20 milhões investidos por empresários escandinavos. A denominação do hotel foi uma homenagem aos índios Cariris, primeiros habitantes daquele litoral. Segundo Nestor Munhoz, gerente geral, o hotel possui 187 apartamentos com vista para o mar e distribuídos em quatro categorias. As acomodações variam entre 30 e 66 metros quadrados. A piscina do hotel mede 600 metros quadrados e dispõe de cascata que inicia uma leve correnteza e forma um pequeno rio que desemboca na piscina semiolímpica com três raias, concebida para representar o Oceano Atlântico. O hotel é ainda equipado para receber eventos de empresas e festas. O Salão Karioca possui 110 metros quadrados de área climatizado, com capacidade para 100 pessoas e estrutura operacional de equipamentos próprios. O Kariri Beach Hotel oferece ainda aos hóspedes business center, internet, serviço de lavanderia, estacionamento coberto para 80 carros, agência de viagens com serviços de locação, passeios de buggy, quadriciclos, jangadas e cavalos, além de uma guardaria para material esportivo. O Manacá Restaurante tem cardápio regional e internacional, além de pratos exóticos. Ainda na área de alimentos e bebidas, destaque para o atendimento personalizado na beira da praia.
A revista Nordeste Vinte Um tem a honra de divulgar para seu público leitor que acaba de receber CARTA DE RECOMENDAÇÃO TÉCNICA da Direção da SEGUNDA CONFERÊNCIA INTERNACIONAL EM CLIMA, SUSTENTABILIDADE E DESENVOLVIMENTO EM REGIÕES SEMIÁRIDAS - ICID 2010. O documento, assinado pelo diretor da ICID, economista Antônio Rocha Magalhães, destaca que para tornar efetivas as discussões e participações no processo de difusão social da Conferência, julga-se necessária a construção de um veículo de mídia capaz de abordar com propriedade e abrangência as várias visões científicas, teses e projetos à luz de uma linguagem acessível, bem decodificada e desmistificadora de valores incutidos ao longo de anos sobre a inviabilidade de adaptações e desenvolvimento sustentável no “mundo” semiárido. Nesse sentido, a carta reforça o papel social que a Revista Nordeste VinteUm pretende desempenhar junto ao seu público preferencial, justamente aquele composto pelas comunidades acadêmicas, pesquisadores, decisores públicos e privados, terceiro setor e organismos nacionais e internacionais ligados ao evento. Por último, Rocha Magalhães considera digna de apoio a proposta da Revista Nordeste VinteUm, de publicar números especiais dedicados à ICID 2010, cobrindo temas relevantes para o desenvolvimento sustentável das regiões semiáridas do Nordeste e do Planeta.
COMITIVA DO SEMINÁRIO CARIRI CANGAÇO VISITA Nordeste VINTEUM
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A redação da Revista Nordeste Vinte Um recebeu a visita da comitiva coordenadora do Seminário Cariri Cangaço (cariricangaco.blogspot.com), realizado em setembro deste ano, nas cidades de Juazeiro do Norte, Crato, Barbalha e Missão Velha, no Ceará. Formado pelo curador Manoel Severo, as secretárias de Cultura do Crato, Danielle Esmeraldo, e de Juazeiro do Norte, Glória Tavares, além de representantes das prefeituras de Barbalha, Missão Velha e Aurora (Rodrigo Torres, Jussara Macedo de Aurora e Ingrid Alidiane) o grupo conversou com o editor-chefe, Wilton Bezerra Júnior, e o diretor administrativo-financeiro da Editora Assaré, Orlando Júnior. Na oportunidade, foram reafirmados os compromissos editoriais da publicação com as temáticas regionais e o desenvolvimentismo, ao mesmo tempo que elogiada a cobertura da Nordeste Vinte Um ao evento Cariri Cangaço. Na ocasião, destaques para as contribuições dos pesquisadores Antonio Vilela, Napoleão Tavares Neves, Antonio Amaury e Peixoto Júnior, em matéria escrita pelo do confrade Barros Alves.
Ciclo de deb ates
Energia em pauta no Recife O lançamento regional da Revista Nordeste Vinte Um acontece por intermédio da promoção do Ciclo de Debates Nordeste VinteUm. Para marcar a estreia de nossa iniciativa em caráter regional, a programação temática dos eventos convoca atenção de renomados pesquisadores, políticos, técnicos e decisores públicos, personalidades empresariais e acadêmicas da região. Em debates, atualidades sobre assuntos ligados ao desenvolvimento socioeconômico regional. Os eventos são realizados também como forma de aprofundar a discussão de temas em pauta nas edições da revista. Assim, no intuito maior de preservar na ordem do dia reflexões sobre como o Nordeste brasileiro permanece filho dileto da realidade histórica de um país 75º lugar (entre 182) do ranking de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas (IDH), é que hoje, levamos nossa revista aos quatro cantos da região. No mês de outubro, em Fortaleza, o lançamento da Nordeste VinteUm mobilizou figuras de expressão como o governador Wellington Dias, o presidente do BNB, Roberto Smith. Por último, programamos a vez de Pernambuco nos receber em Recife, através da Fundação Gilberto Freyre, para realização da segunda etapa do Ciclo, no último dia 6 de novembro, com representantes da Sudene, Chesf, Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste – (Etene/BNB), Instituto de Estudos, Pesquisas e Projetos da Universidade Estadual do Ceará (Iepro / Uece) e Secretaria de Ciência e Tecnologia de Pernambuco. Entre os palestrantes, o deputado federal Fernando Ferro (PTPE), a economista Fernanda Ferraro, diretora de Gestão da Informação para o Desenvolvimento da Sudene; o gerente de Informações do Etene, Francisco Diniz Bezerra e o secretário adjunto de Ciência e Tecnologia de Pernambuco, Anderson Stevens Gomes. Nosso objetivo era, especificamente na edição pernambucana, discutir energia elétrica e desenvolvimento. Em destaque, estudos que apontam para a autossuficiência nordestina no setor, num passeio pelas potencialidades de geração e transmissão, envolvendo matrizes hidrelétricas, termelétricas, eólicas e de biomassa. Oportunidades históricas de recolher, sistematizar, documentar e difundir informações a partir de embasados depoimentos, a programação o Ciclo de Debates Nordeste VinteUm prossegue nos próximos meses, pelas cidades de Teresina, Salvador e Juazeiro do Norte.
IPEA 45 anos
PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
Visão de longo prazo é possível na terra dos desiguais? Os avanços socioeconômicos obtidos nos últimos anos e o bom desempenho do Brasil diante da crise econômica mundial trouxeram de volta com mais força o tema do desenvolvimento ao centro da agenda do País. O desafio é, a partir de agora, retomar o diálogo sobre uma perspectiva nacional de longo prazo, esquecida desde o início dos anos 80. Para auxiliar nessa ampla e árdua tarefa, a nação conta com instituições de excelência como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que aproveita a ocasião dos seus 45 anos de fundação para animar o necessário debate acerca do assunto Por Marcel Bezerra / marcel@editoraassare.com.br
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ono de uma das dez maiores reservas globais de petróleo. Maior exportador mundial de ferro, café, soja, suco de laranja, carne bovina, frango, açúcar e etanol. Referência internacional na produção e no desenvolvimento de biocombustíveis. Sétimo maior fabricante de carros no mundo. Quarto maior fabricante mundial de aeronaves e líder na produção de modelos com capacidade de até 120 passageiros. Maior bacia hidrográfica do mundo, com 73% da matriz elétrica com origem hídrica. Citados assim, esses dados rapidamente permitiriam inferir: eis um perfil de país desenvolvido. Revelar que eles dizem respeito ao Brasil talvez possa frustrar a mais apressada conclusão, embora não seja justo deixar de reconhecer que, nos últimos anos, a nação tem experimentado um ciclo de expansão. Na Era Lula, o governo apostou suas fichas no controle da inflação, no equilíbrio das contas públicas e em um forte programa de inclusão social, que proporcionaram taxas de crescimento econômico médio de 5% nos dois últimos anos e estabilidade fiscal, com um superávit primário das contas públicas (4,1% do PIB em 2008). Por outro lado, é forçoso colocar que os desafios ainda são imensos
Desigualdade é nossa marca: a parcela 10% mais rica da população brasileira concentra 42,7% dos rendimentos do trabalho, enquanto os 10% mais pobres ficam com o 1,2% restante, naquilo que é mais básico para uma população. Divulgada em setembro, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) vai direto ao ponto. Desigualdade é nossa marca: a parcela 10% mais rica da população brasileira concentra 42,7% dos rendimentos do trabalho, enquanto os 10% mais pobres ficam com o 1,2% restante, afora os desequilíbrios entre regiões – proporcionalmente, a Centro-Oeste é a mais rica, e a Nordeste a mais pobre. Na educação, um em cada dez jovens de 18 anos ou mais não sabe ler nem escrever – e a média de analfabetismo do Nordeste é o dobro da nacional. Além disso, falta saneamento básico, já que um em cada quatro lares brasileiros não pos-
sui nenhum tipo de coleta de esgoto. No país, o acesso à internet ainda é baixo: 5,3 acessos em cada 100 mil habitantes, contra uma média de 30 acessos em países europeus. Equacionar problemas tão grandes, graves e históricos num país de dimensões continentais não é simples. O poder público intervém na vida econômica e social da nação e, dadas as proporções do Brasil, é difícil até mesmo esquadrinhar a complexa organização do Estado e seus intrincados processos decisórios que impactam diretamente da execução de políticas públicas governamentais. A finalidade última seria proporcionar o tão sonhado bem estar social. Afinal, entre os 182 países do mundo, figuramos entre as 20 maiores economias, mas ocupamos ainda o 75º lugar no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) divulgado no início de outubro pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). O Brasil se encontra longe do grupo de países de IDH muito elevado (índice acima de 0,90), como Noruega, Austrália, Islândia, Canadá e Irlanda, os cinco primeiros, respectivamente. Embora classificados como de IDH alto (0,813), à nossa frente temos Chile, Uruguai, Argentina, México e Costa Rica, por exemplo.
O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) 2008
IDH. Mede os avanços alcançados por um país em três aspectos: vida longa e saudável (baseado na esperança média de vida ao nascer), acesso ao conhecimento (baseado na alfabetização e na escolarização) e nível de vida digno (baseado no PIB per capita associado ao poder de compra em dólares americanos). Os países são classificados dentro desses aspectos em valores médios entre 0 e 1
70 com IDH alto - 85 com IDH médio - 21 com IDHbaixo Novembro/Dezembro n 2009
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GOVERNO E SOCIEDADE
desenvolvimentismo
Temática negligenciada a encomenda de Lula
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ara um país sempre vítima do “curto-prazismo” e que viveu até há poucos anos sob o medo do retorno de uma inflação galopante e de suas traumatizantes consequências, o governo comemora o desempenho do país diante da crise econômica mundial — variação positiva de 1,9% do PIB no segundo trimestre de 2009 — como sinal de solidez econômica e de que o Brasil está no caminho certo. Diante disso, voltou à tona com força o debate sobre a necessidade de um projeto orientador do desenvolvimento brasileiro que confira ao país muito mais do que crescimento econômico, visão, aliás, predominante nos debates sobre o assunto até o início dos anos 70. Qualquer debate sobre desenvolvimento nos dias atuais tem de tratar
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Entre os 182 países do mundo, figuramos entre as 20 maiores economias, mas ocupamos ainda o 75º lugar no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)
obrigatoriamente de dimensões relevantes e básicas. Primeiro, a inserção internacional do país e a condução das políticas macroeconômicas, seguido dos diversos desafios ligados às esferas da produção (primária, secundária e terciária), da inovação e competitividade das empresas e do país. Em terceiro lugar, os temas correlacionados à territorialização e à regionalização do desenvolvimento, onde ocupam espaço questões como os desequilíbrios regionais e seus impactos nos espaços urbanos e na sustentabilidade do meio ambiente, assim como a adequação da logística de base — discussões sobre matriz energética, telecomunicações, transportes — e infraestrutura econômica brasileira. Por último, a compreensão de que a garantia de direitos, a promoção da proteção social e a ge-
ração de oportunidades de inclusão são condições necessárias a qualquer projeto nacional. Trabalhar o desenvolvimento implica necessariamente construir um planejamento de longo prazo. E isso o Brasil tem deixado de lado, especialmente desde a crise da dívida externa do início dos anos 80. “O Brasil se contaminou com a lógica de curtíssimo prazo e relegou a um segundo plano a temática do desenvolvimento”, avalia o presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Márcio Pochmann. Esse “deixar de lado” contribuiu para certa descaracterização desta importante função pública. Porém, dada a evolução positiva que o país tem vivenciado – e apesar do arrefecimento provocado pela crise mundial –, estamos diante de uma boa oportunidade. Na visão do presidente do Ipea, é preciso um olhar que unifique governo e sociedade. Nesse sentido, o Ipea recebeu do governo Lula – através da Secretaria Nacional de Assuntos Estratégicos (SAE), à qual o instituto é vinculado – há cerca de dois anos a incumbência de elaborar um plano de desenvolvimento de médio prazo para
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O Brasil se contaminou com a lógica de curtíssimo prazo e relegou a um segundo plano a temática do desenvolvimento Márcio Pochmann, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)
o Brasil. Segundo Pochmann, o Ipea tem hoje cerca de 400 profissionais que trabalham a construção de uma agenda nacional de longo prazo.
No país, o acesso à internet ainda é baixo: 5,3 acessos em cada 100 mil habitantes, contra uma média de 30 acessos em países europeus Na educação, um em cada dez jovens de 18 anos ou mais não sabe ler nem escrever – e a média de analfabetismo do Nordeste é o dobro da nacional
Evolução do PIB através dos tempos Sarney
Collor
Itamar
FHC
Lula
6% 4% 2% 0% -2% -4% -6%
1986-1989
1990-1992
1993-1994
1995-2002
2003-2008
Fonte: Folha de S.Paulo – Vinicius Torres Freire: Um PIB cinco estrelas na eleição? – 18/09/2009
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Nascido na ditadura Sob a missão de produzir, articular e disseminar conhecimento
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á cerca de dois anos na atual função, Márcio Pochmam dirige uma das instituições nacionais mais importantes com a missão de produzir, articular e disseminar conhecimento para aperfeiçoar as políticas públicas e contribuir para o planejamento do desenvolvimento brasileiro. Nascido em plena Ditadura Militar, em 1964, o Ipea completou em setembro 45 anos de existência. Nesse sentido, o instituto vem realizando desde 16 de setembro uma série de eventos alusivos à data, com lançamentos de livros, seminários e debates sobre o futuro do país, abordando as temáticas do planejamento e da construção de um novo pensamento nacional. Cada diretoria do Ipea discute seus temas específicos em uma localidade diferente. No Nordeste, a agenda incluiu debates em Recife, Salvador e Aracaju. Segundo o Ipea, o processo deverá culminar na formulação de um documento-base que apresentará as propostas desta geração, que irão nortear a estratégia de desenvolvimento econômico social do Brasil para os próximos 45 anos. Conforme consta o site do instituto, as atividades de pesquisa do Ipea “fornecem suporte técnico e institucional às ações governamentais para a formulação e reformulação de políticas públicas e programas de desenvolvimento brasileiros”. Todo esse trabalho é posto à disposição de qualquer pessoa através de diversas e regulares publicações e seminários e, mais recentemente, via programa semanal de TV em canal fechado. Na esteira comemorativa, duas publicações importantes foram lançadas: Brasil em Desenvolvimento: Estado, Planejamento e Políticas Públicas (Série Brasil: estado de uma nação), um amplo estudo das políticas públicas brasileiras, e Da Pobreza ao Poder – Como Cidadãos Ativos e Estados Efetivos Podem Mudar o Mundo.
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maior instituição pública de pesquisa aplicada das Américas
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o dia 16 de setembro, o presidente Lula – primeiro chefe da nação a visitar a sede do instituto – participou da solenidade de comemoração dos 45 anos do Ipea. Na ocasião, ao discursar sobre o momento econômico do país e pedir mais pesquisas que contribuam para o conhecimento do país e o planejamento do futuro nacional, o presidente ressaltou a importância de o Ipea expandir a sua presença no território brasileiro, além de Brasília e Rio de Janeiro. Em entrevista exclusiva à Nordeste VinteUm, Márcio Pochmann afirmou que está nos planos da instituição ter representações do Ipea em cada região do país. O apelo do presidente Lula faz todo sentido. O Ipea é a maior instituição pública de pesquisa aplicada das Américas, visto internacionalmente como um espaço de excelência acadêmica. Desde o nascedouro, teve importância fundamental na organização do planejamento durante as décadas de 60 e 70. A partir do Plano Decenal de Desenvolvimento Econômico (1967-76), realizou trabalhos que culminaram com a criação de novas instituições como a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), assim como os estudos que estimularam a exploração agromineral
O presidente ressaltou a importância de o Ipea expandir a sua presença no território brasileiro, além de Brasília e Rio de Janeiro do Centro-Oeste naquelas duas décadas. Além de incentivar com apoio financeiro o sistema de pós-graduação nas áreas sociais e econômica que ainda dava os primeiros passos – Programa Nacional de Pesquisa em Economia (Pnpe) e de bolsas para estudos no exterior –, o Ipea contribuiu para a reforma bancária e tributária do país, e até mesmo a proposição e o
manejo público do planejamento e da gestão orçamentária tornaram-se possíveis em época mais recente a partir da modernização que o Brasil experimentou. Entretanto, como coloca Márcio Pochmann, os efeitos da crise da dívida externa do início dos anos 80 fez com que os projetos para o Brasil fossem sendo gradualmente postergados, “quando não acumulados e
empoeirados nas estantes das bibliotecas, cada vez mais somente disponíveis ao decrescente grupo minoritário de estudiosos e defensores do desenvolvimento nacional”. “A temática do desenvolvimento terminou sendo transformada em algo anacrônico, peça de descrédito”, assevera ele, ao acrescentar que o quadro atingiu também o Ipea. “A maior instituição do pensamento e do desenho de estratégias para o desenvolvimento nacional acusou o golpe, tendo que se acomodar ao contexto geral de restrição orçamentária, de competição com outras instituições de pesquisas, com esvaziamento, envelhecimento e não reposição de quadros técnicos”. Hoje, de acordo com seu presidente, o Ipea vive outra realidade. “Somente mais recentemente o orçamento do Ipea voltou a ser recuperado, interrompendo uma longa trajetória do seu definhamento”, conta. O instituto também celebra a realização do recente concurso público, que permitiu o ingresso de mais de 100 novos técnicos. Da mesma forma, Pochmann comemora a possibilidade de uma nova sede, o pluralismo de visões técnicas e a diversidade de formações acadêmicas que, alinhadas com a reorientação pela qual o instituto vem passando, vem “alargando a presença do Ipea no centro do debate nacional a respeito dos mais distintos temas”.
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“O Estado B precisa ser r
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Entrevista Márcio Pochmann, presidente do Ipea
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ma instituição preparada para fornecer assessoria especializada e direta ao governo, compatível com a necessária organização dos dissensos em torno do desatar dos complexos nós que entravam o desenvolvimento nacional. Esse é, na ótica de Márcio Pochmann, o perfil do Ipea atualmente. Bacharel em Ciências Econômicas pela Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Márcio Pochmann é professor da área de Economia Social e do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Especialista em Relações de Trabalho (Universidade de Bologna, Itália) e em Ciências Políticas (Associação de Ensino Superior do
Distrito Federal, Brasília), é também doutor em Economia pelo Instituto de Economia da Unicamp. Em seu currículo, constam experiências como Secretário Municipal do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade de São Paulo na gestão Marta Suplicy (2001 a 2004), diretor executivo no Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), junto ao Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas, de 1997
a 1998. entre os diversos livros publicados, estão Desafio da Inclusão Social no Brasil, Padrões de Relações de Trabalho e Sindicalismo no Brasil, Década dos Mitos e A batalha pelo primeiro emprego. Márcio Pochmann é autor de uma das mais interessantes análises sobre a atual crise econômica mundial. Em artigo publicado em abril deste ano, Pochmann defendia que a saída para a crise deveria ser política. “O Estado precisa ser refundado. Ele deve ser o meio necessário para o desenvolvimento do padrão civilizatório contemporâneo em
BRASILEIRO refundado”
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conformidade com as favoráveis possibilidades do século 21”, coloca. Para ele, o mundo está diante de novos e complexos desafios que exigem profundas reformas estatais. Nesse sentido, defende que três grandes eixos estruturadores do novo Estado precisam ser perseguidos com clareza e efetividade. O primeiro, segundo o presidente do Ipea, diz respeito à constituição de novas institucionalidades na relação do Estado com o mercado. De acordo com ele, com as bases de promoção da competição enfraquecidas pelo mercado através da monopolização, novas instituições portadoras de futuro devem ser “capazes de garantir a continuidade da inovação por meio da concorrência combinada com a cooperação entre empreendedores e da maior regulação das grandes corporações empresariais”. “O segundo grande eixo estruturador do novo Estado deve resultar da revolução na propriedade que impulsione uma relação mais transparente, democrática e justa com toda a sociedade”. Neste caso, acrescenta o economista, a ampliação do fundo público se faz necessária para sustentar o padrão civilizatório do século 21, a partir da tributação sobre o excedente adicional gerado por novas fontes de riqueza, “que por serem intangíveis escapam crescentemente das anacrônicas bases arrecadatórias vigentes na mais de 200 anos”. Por fim, Márcio Pochmann estabelece que o terceiro eixo reside na profunda transformação do padrão de gestão pública. “Políticas cada vez mais matriciais e intersetoriais pressupõem a organização do Estado em torno do enfrentamento de problemas estruturais e conjunturais. Noutras palavras, a meritocracia e o profissionalismo para conduzir ações públicas articuladas para lidar com problemas estruturais e políticas governamentais descentralizadas e compartilhadas com a sociedade e mercado para enfrentar diversos e específicos problemas conjunturais”. Em entrevista exclusiva à Nordeste VinteUm a propósito dos 45 anos do Ipea, Pochmman falou sobre as conquistas e desafios do instituto – como a construção de um projeto de desenvolvimento de longo prazo –, assim como analisou a importância do Nordeste dentro do contexto brasileiro e do papel que a região pode desempenhar na superação do subdesenvolvimento brasileiro. Confira a seguir os principais trechos: 30
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Nordeste VinteUm — Quais as grandes conquistas do Ipea até hoje? E os desafios a enfrentar de modo a atender a sua missão de contribuir rumo a um Brasil mais justo social, econômica e ambientalmente sustentável? Márcio Pochmann — O tema desenvolvimento voltou ao centro da agenda do país. Ela pressupõe a sua própria reestruturação, em termos de identificação dos nós e as condições necessárias para atingir o desenvolvimento. Digamos que o Ipea vem se recolocando. Tem feito três movimentos nos últimos dois anos. O primeiro diz respeito a uma reorganização temática mais ampla possível para poder dar conta do que não poderia ser apenas econômico. Constituímos duas diretorias para tratar dos aspectos relacionados à demografia, a instituições no Brasil. Tratamos de um desenvolvimento em tempos democráticos e não organizado entre quatro paredes. Também constituímos uma diretoria voltada para assuntos internacionais. Não é possível nos dias de hoje, pensarmos no desenvolvimento endógeno, exclusivamente nacional. Incorporamos o tema da sustentabilidade ambiental, que de certa forma emergiu muito rapidamente. Constituímos um plano de trabalho de forma coletiva, com o objetivo de ampliar áreas temáticas. Percebemos que não tínhamos quadros suficientes. Fizemos um concurso, que permitiu o ingresso de 117 colegas novos. Um desafio temático, organizado de forma matricial em diferentes diretorias. NVU — E quais as etapas seguintes? MP — O segundo passo foi organizar atividades cada vez mais institucionalizadas.
Constituímos uma diretoria voltada para assuntos internacionais. Não é possível, nos dias de hoje, pensarmos no desenvolvimento endógeno, exclusivamente nacional
Ou seja, o fortalecimento do Ipea junto aos gestores, formuladores de políticas públicas das esferas federal, estadual e municipal, bem como no Legislativo e Judiciário. Fizemos um conjunto muito grande de convênios, mais de 70, para oferecer análises sistemáticas, monitoramento, avaliação das políticas em curso. Desde avaliação da qualidade do gasto, em que medida as políticas de fato alteram a realidade do país. Temos um conjunto grande de publicações, estudos e comunicados que estão sendo divulgados praticamente todos os dias, semanas e meses. Organizamos ainda redes de gestão pública do conhecimento do tema do desenvolvimento. São parcerias com centros de pós-graduação, que formam quadros, tem expertise acadêmica. Nos aproximamos com um programa grande de bolsas. Constituímos redes com o setor produtivo, associações de pesquisadores nacionais e internacionais. E, agora, avançamos para representações nas principais regiões do Brasil. Queremos uma no Nordeste, no Norte, e no Sul, o que daria essa maior capacidade de compartilhar conhecimento, aprender e socializar. Ao mesmo tempo, também nos colocarmos em cooperação com outros países. Uma fase de internacionalização do Ipea para latinoamericanos e da África de Língua Portuguesa. O Ipea vem se fortalecendo no que tange a preparar quadros do serviço público. Para protagonizar as políticas de médio e longo prazo do planejamento do desenvolvimento brasileiro. O que nós perdemos. É uma marca muito presente do regime autoritário. O Ipea deve ter o papel não de construir um pensamento único em torno do desenvolvimento, mas sim organizar os dissensos em torno do tema. NVU — O presidente Lula solicitou ao Ipea um plano junto com a Secretaria de Assuntos Estratégicos para o desenvolvimento do Brasil a médio prazo, a ser apresentado até o ano que vem. Como está esse plano? MP — Temos atualmente cerca de
Uma demanda que o presidente nos fez, fez ao então ministro Mangabeira, e que certamente foi reafirmada agora com o ministro Samuel (Guimarães, da Secretaria de Assuntos Estratégicos). Vamos disponibilizar esse material a partir do ano que vem. De certa maneira, uma contribuição também no próprio debate eleitoral.
O Ipea vem se fortalecendo no que tange a preparar quadros do serviço público. Para protagonizar as políticas de médio e longo prazo do planejamento do desenvolvimento brasileiro
400 pesquisadores na construção da perspectiva do desenvolvimento brasileiro, da agenda nacional de longo prazo. É uma série com dez publicações. Duas já foram constituídas, a primeira tratando do que a gente chama de “nós do desenvolvimento nacional”. Feito por colegas que constituem o Conselho de Orientação do Ipea, personalidades históricas. O segundo volume trata das experiências recentes em termos internacionais, de alguns países que conseguiram avançar. Agora, teremos então sete publicações tratando dos aspectos temáticos. Tem discussão sobre sustentabilidade ambiental, proteção e geração de oportunidades, macroeconomia, inserção internacional, logística de base, dinâmicas regionais. Sete temas, sete publicações com estudos aprofundados. Com mais duas, são nove. A décima será uma síntese para esta agenda de longo prazo.
NVU — Como órgão que analisa políticas públicas e trabalha com a questão do desenvolvimento, o que significa dirigi-lo, num patamar de importância para o Brasil comparado a instituições como Bndes, CNPq e Ibge? MP — Do ponto de vista do continente americano, dificilmente a gente encontra uma instituição com a especificidade que tem o Ipea. Recentemente tivemos uma missão junto ao governo angolano, estreitando possibilidades de cooperação e até de criar uma representação do Ipea lá. Uma das demandas do governo angolano, que vive período de crescimento econômico superior ao da China, é constituir uma instituição como o Ipea. Acredito que ganhamos maior importância, não por produzir trabalhos acadêmicos, porque achamos que isso inclusive é papel das instituições de pesquisas acadêmicas, das universidades brasileiras. Não devemos competir neste âmbito. Devemos justamente complementar com análises aplicadas, que permitam ao gestor público poder fazer escolhas. Oferecer cenários, alternativas a respeito do entendimento da realidade e de projeções caso seja tomada uma ou outra decisão. Nosso papel é o de assessorar o governo, evidentemente, mas também a sociedade. NVU — O ex-ministro Mangabeira chegou a elaborar o esboço do que ficou conhecido como Projeto Nordeste. Ele saiu, deixando a iniciativa aparentemente no éter. O projeto estaria no âmbito da Casa Civil e seria lançado ainda este ano, pela ministra Dilma Rousseff. Nessa perspectiva, que Novembro/Dezembro n 2009
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tipos de instituições deveriam ser fortalecidas ou criadas, e que outros atores devem ser incorporados para dar vida a um projeto como esse? O senhor acredita nesse tipo de tentativa de construção orientadora? MP — Sim, acredito. Acredito até que nós estamos tendo a possibilidade de transitar naquilo que de certa maneira era um dos eixos organizadores da ideia do desenvolvimento regional. Que era reproduzir a realidade e a trajetória, evitando a região Sudeste, da industrialização. No geral, cada estado, nas mais diferentes regiões, tendia a procurar reproduzir o que foi São Paulo. E eu vejo que essa perspectiva está superada. Precisamos ter uma visão, a partir da questão regional, e entendendo sua dinâmica. Isso implica não a construção, a partir de Brasília, mas sobretudo um envolvimento com os diferentes saberes que existem nas regiões. E esses saberes possibilitam valorizar possibilidades. Muitas vezes, elas não estão colocadas quando a perspectiva é abandonar o que existe de potencializador localmente e trazer de fora aquilo que foi uma realidade para a experiência do Sudeste. Entendemos sim, que o Brasil não terá futuro sem resolver regiões que ainda estão na expectativa de melhor potencializar as suas expertises, como é o caso do Nordeste, do Norte e do Centro-Oeste. São regiões que ainda não resolveram as suas especificidades. Mas, não há dúvidas de que o Brasil de amanhã dependerá das saídas que essas regiões devam encontrar. E suas saídas não poderão depender estritamente da solução. Ela pressupõe, na verdade, um amparo e uma condução compartilhada nacionalmente. Então, nossa preocupação em ajudar a montar essa agenda é confluir o interesse nacional com as possibilidades de potencializar as regiões. NVU — Qual o papel que a região Nordeste pode desempenhar em um novo modelo de desenvolvimento para o Brasil?
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Agora, para 2010, possivelmente teremos um crescimento virtuoso, não apenas nas decisões de gastos das empresas, mas sobretudo nos investimentos. O que não está muito claro é justamente esse crescimento e sua sustentação em termos ambientais MP — Acreditamos que nós temos uma via que é a de explorar o que já é conhecido. O setor primário, o secundário, da indústria, agropecuária. Mas, acredito que o Nordeste poderá colaborar cada vez mais com o desenvolvimento do trabalho imaterial. Quer dizer, no setor terciário. Isso obviamente implica um grande esforço de aprofundar o ensino e a aprendizagem. O trabalho material vai depender cada vez mais de uma infraestrutura que não está associada ao padrão desenvolvimento que o Brasil percorreu dos anos 30 aos anos 80 do século passado. Isso significa uma valorização do povo em novas bases. Isso é plenamente possível, porque nós podemos con-
formar novas formas de trabalho. Ao mesmo tempo um padrão de bem estar social coletivo quando políticas públicas são desenvolvidas e articuladas pelos governos federal, estadual e municipal. Nessa perspectiva, moldar o futuro da região sem desvalorizar aquilo que lhe dá sustentação, que é a enorme disponibilidade de recursos humanos. Embora com a qualificação ainda contida. A região vive um momento talvez sem paralelo desde o início do século vinte, que é a forte contenção migratória. De maneira geral, foi uma grande região de mobilização de mão-de-obra para outras regiões. Hoje, nós percebemos uma inflexão no movimento migratório e até mesmo o retorno de migrantes. Então, o diferencial: é a única área territorial do Brasil que se identifica como um conceito. De nordestino. Porque não existe em outra região o conceito nortista, centroísta, sulista. NVU — Já é possível avaliar com mais clareza a conjuntura nacional e internacional após o ponto alto da crise econômica? O senhor falou que a saída seria política. Nesse sentido, qual a percepção sobre a postura política do governo brasileiro, e quais as perspectivas daqui em diante? MP — A crise da dívida interna, a crise internacional impôs uma inflexão na trajetória brasileira, que é puxada pelos investimentos e fortemente para o mercado interno. A crise, no último trimestre, interrompeu esse movimento, mas não representou seu fim. Estamos observando já desde a saída do primeiro trimestre deste ano, uma recuperação das decisões de investimento das empresas. Mas, isso é insuficiente para fazer com que o Brasil cresça no mesmo ritmo que vinha desde o ano passado. Agora, para 2010, possivelmente teremos um crescimento virtuoso, não apenas nas decisões de gastos das empresas, mas sobretudo nos investimentos. O que não está muito claro é justamente esse crescimento e sua sustentação em ter-
mos ambientais. Uma problemática não apenas brasileira. A perspectiva desse crescimento nos coloca diante de decisões importantes no que diz respeito ao território internacional. Se o Brasil continuará um país cuja população se concentra fundamentalmente na parte litorânea ou avançará para o fortalecimento das cidades médias e pequenas, que dependem basicamente de infraestrutura, mas também de serviços modernos. Isso é que vai permitir o fluxo de mão-de-obra mais qualificada, de médicos, entre outros profissionais, elevando o padrão de bem estar que se tem nas regiões metropolitanas. O crescimento econômico é a válvula necessária para o país poder andar, mas exige, e isso depende da própria democracia, da capacidade de organização da sociedade, de decidir qual o perfil desse crescimento. De que maneira ele seja mais includente e menos dependente do exterior. NVU — No contexto de crise, ganhou força a interpretação de que o Nordeste foi bem menos afetado devido à sua condição de subdesenvolvimento e da força da presença estatal na região. Diante do atual cenário de obras estruturantes que podem transformar completamente o perfil da região, e dessa necessidade de se fortalecer o ensino, como o senhor avalia a região nesse contexto? MP — A região Nordeste está submetida a um pacote de investimentos significativos, que não apenas
remodelam sua infraestrutura física, mas também sustentam uma característica de crescimento em base industrial avançada. Agora, há dificuldades, pela herança que temos, do ponto de vista da brutal desigualdade e exclusão que marcam a trajetória do país, das exigências de se organizar e construir um amparo em políticas públicas frente à emergência colocada pelo crescimento. O Estado precisaria ser refundado, pois a forma de atuação ainda remonta ao século XX. Olhamos os problemas tão somente do ponto de vista setorial. Os problemas hoje são cada vez mais totalizantes. Não é um problema só na Saúde, quando ela está vinculada à Educação, que está vinculado ao trabalho, que está vinculado ao transporte. Portanto, essa emergência de investimentos que protagonizem um padrão de políticas públicas que concebem a totalidade é algo que mereceria um apoio da classe política e também da sociedade. Do movimento social organizado. Porque a reprodução do passado não nos é suficiente para dar conta da complexidade colocada hoje em todo o país, sobretudo na região Nordeste. NVU — O Ipea se caracteriza pela postura de certa independência em relação aos governos. Como o senhor avalia seu comportamento hoje, em relação ao governo Lula? Dá para fazer um trabalho técnico-científico livre de interferências políticas? Como o Ipea lida com isso? MP — Optamos por um tripé de
posicionamento. Primeiro, no que tange à defesa do pluralismo de agendas, de visões. De tal forma que garantíssemos, através do contraditório, do debate, a maior conquista em termos de produção e difusão do conhecimento. O segundo pressuposto é o cosmopolitismo, quer dizer, a possibilidade de termos um intercâmbio crescente com colegas, pesquisadores, investigadores, estudiosos, gente de instituições nacionais e internacionais. No mundo de hoje, a endogenia não nos é saudável. Com a possibilidade desse intercâmbio, criamos um programa de bolsas de grande expressão. E o terceiro pressuposto é a garantia da democracia dentro da instituição. Uma democracia, evidentemente, responsável. Cada um faz o que quer, mas toma uma decisão de forma coletiva. Dentro de um plano estratégico de longo prazo. A instituição passou a ter um plano de trabalho anualmente. É organizado e planejado no último trimestre e apresentado no ano subseqüente. A partir desse plano, passamos a ter metas institucionais publicadas no Diário Oficial. Garantimos a democracia e a transparência do uso de recursos e do que se faz no âmbito do Ipea. O nosso sítio coloca todas as publicações, que podem ser baixadas gratuitamente.
Samuel Guimarães é um quadro de excelência nacional, referência internacional. É alguém que pode ser considerado um patrono do tema de relações internacionais, um homem público com serviços prestados, muito valorizados interna e externamente Márcio Pochmann
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NVU – O ministro Samuel Guimarães falou em sua posse que queria ver o Ipea planejando o Brasil, um envolvimento do instituto em projetos de até doze anos para a frente. Quais as suas expectativas em relação ao Ipea diante desse discurso e quanto à condução da pasta? MP — As expectativas são bastante alvissareiras, porque, a exemplo do ministro Mangabeira, Samuel Guimarães é um quadro de excelência nacional, referência internacional. É alguém que pode ser considerado um patrono do tema de relações internacionais, um homem público com serviços prestados,
econômico, social, cultural, ambiental, para que se possa construir democracia plena com sustentabilidade? É possível listar esses desafios de maneira resumida, sem ser simplista? MP – Temos duas questões que nos levam a avaliar as decisões em relação a uma perspectiva do futuro. A primeira são as mudanças demográficas do Brasil. Muito rápidas que alteram a própria expansão populacional. Vamos entrar numa quadra de redução da população brasileira depois de 2030, que está muito próximo. Isso implica o envelhecimento da população. Precisamos repensar as políticas que
NVU — Como os parlamentares e governadores nordestinos podem contribuir para um repensar de um modelo de desenvolvimento, incorporando o Nordeste como uma variável positiva, como solução, e não um problema? De que forma o senhor encara o preparo dessas pessoas para discutir desenvolvimento? É uma temática ainda muito distante em função dos interesses imediatos? MP — Não tenho dúvidas. Ficamos mais de duas décadas submetidos à pressão do curto-
muito valorizados interna e externamente. Ajudou a conduzir a reorientação do Ministério das Relações Exteriores, cujos resultados são muito evidentes. Entendemos que a vinda dele fortalece ainda mais a própria agenda que o ministro Mangabeira constituiu. Uma agenda de levar ao Ipea um esforço gigantesco de oferecer à sociedade uma visão de mais longo prazo, a ser discutida, compartilhada com os brasileiros.
não são mais apenas para crianças e jovens, mas para segmentos mais envelhecidos. Precisamos considerar as mudanças da população, sua ressocialização no espaço nacional. Um país continental com uma população relativamente pequena. Segundo: questão da refundação do Estado brasileiro. Achamos que o Estado que temos hoje não está à altura do desafio de construção da sociedade pósindustrial, para onde estamos caminhando. Precisamos de um estado de ação matricial que reinvente a competição no mercado, que ajude a reorganizar
prazismo. É da mão para a boca, digamos assim. Só muito recentemente nós voltamos a começar a sonhar com o longo prazo. Agora, esse sonho precisa se tornar uma realidade quando há elementos que tornam presente aquilo que está muito longe do futuro. Significa levar a sociedade a ter que decidir quais os caminhos. É um desafio a contar com a inteligência brasileira, os diferentes saberes. Não apenas o acadêmico, mas também na instituição patronal, de trabalhadores, nas associações de bairros, na comunidade. Tem saberes que não podem ser negligenciados.
NVU — Quais seriam os dilemas, gargalos que precisam ser superados, nos campos
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uma estrutura mais compatível com a sociedade que temos.
Caderno especial
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Carta do Editor
tecnologia antiapagão e modernização Judiciária
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ma tecnologia de proteção à transmissão de energia elétrica gerada pelo Instituto Federal de Educação (Ifce) serve de exemplo para o país como prevenção à ocorrência de apagões. A Chesf, parceira do projeto de pesquisa e desenvolvimento do Cpqt, já encomendou o protótipo para a produção em escala industrial – primeiro passo para a adoção da tecnologia em âmbito nacional, tema de reportagem nesta edição. Outro texto aborda o projeto de modernização do Tribunal de Justiça do Ceará, (TJ-DE) que investe em tecnologia da informação e virtualização com objetivo de agilizar e dar maior qualidade aos serviços jurisdicionais. Um Judiciário forte é requisito para o fortalecimento da democracia, como destacou o coordenador da bancada federal do Ceará, José Guimarães (PT), ao conhecer o projeto. A implantação da proposta inovadora terá positiva influência sobre a economia e toda a sociedade cearense. A edição mostra também a força da inteligência da mulher cearense que é destaque no Instituto Atlântico. A conquista do certificado CMMI5 dá cores mais fortes à presença do Ceará no mapa mundial da qualidade na produção de soluções da tecnologia da informação e telecomunicações.
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Software inteligente reduz gastos com telecomunicações
Chesf investe em tecnologia do Ifce para evitar apagões no Nordeste
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Liderança feminina na certificação internacional do Instituto Atlântico Gabriela Telles. Gerente Técnica do Instituto Atlântico
Sebrae registra casos de sucesso das incubadoras
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Tome scientia!
Por Flamínio Araripe flaminio.a@gmail.com
Bahia e Pernambuco, únicos do NORDESTE no mapa de inovação Ibge Únicos estados no Nordeste com Produto Interno Bruto (PIB) acima de 1% do nacional, Ceará, Bahia e Pernambuco foram incluídos na Pesquisa de Inovação Tecnológica (Pintec) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Ibge) em 2009. Os estados do Sul e Sudeste, além de Goiás e o Distrito Federal compreendem o universo com cerca de 16 mil empresas. Esta é a quarta edição da Pintec, que é bianual, mas demorou três anos por atraso no repasse de recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).
Informática e telecomunicações do Ceará ficam fora da Pintec No Ceará, a Pintec foi iniciada em agosto de 2009, em todo o Estado, e será concluída no final de janeiro de 2010. A informação é da coordenadora local do estudo, Daniele Viana. Nas empresas com mais de 500 funcionários, a entrevista da pesquisa
é realizada de modo presencial. Nas empresas com menos de 500 colaboradores, escolhidas por amostragem, a entrevista é feita por telefone. A Pintec cobre indústrias, empresas de informática e telecomunicações. No Ceará, é realizada apenas com indústrias.
IFCE ensina informática básica sobre rodas
Inclusão digital sobre rodas. É o que faz o Laboratório Móvel de Informática do Instituto Federal de Educação (Ifce), um ônibus com 10 computadores e equipamentos de multimídia como LCD/Telão. Os cursos de informática básica são ministrados por alunos do Ifce sob a supervisão de um professor da instituição. Este ano atende a populações carentes da Região Metropolitana de Fortaleza em um projeto de capacitação executado pelo Ifce em parceria com a Secretaria de Trabalho e Desenvolvimento Social do Estado (Stds).
Mercado de TI no Ceará atrai empresa de Brasília Depois de estudar os mercados de Recife e Salvador, a empresa SW/ti, de Brasília, optou por instalar escritório em Fortaleza. É especializada em segurança da informação, armazenamento de dados, gerenciamento de redes, telefonia IP e disponibilidade com melhoria de desempenho. A apresentação da companhia ao mercado cearense foi feita em jantar da Sociedade de Usuários de Informática e Telecomunicações (Sucesu) com palestra deste repórter sobre o tema “Imprensa e Tecnologia da Informação”. Diretor da empresa, Marcos Santos fez a saudação aos convidados e apresentou o gerente local, Luiz Eduardo Junqueira.
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Software compara contas e reduz gastos com telecomunicações Um software faz a gestão inteligente dos recursos de telecomunicações da empresa. Mede o consumo e confronta os valores com as contas das operadoras, para derrubar os gastos. Essa é a função principal da solução CPqD Gestão de Recursos de Telecomunicações, desenvolvida pelo CPqD, de Campinas-SP, parceiro do Instituto Atlântico. O programa possui um tarifador convergente, similar ao utilizado pelas operadoras, que permite conferir as faturas levando em conta as cláusulas de descontos e benefícios tarifários estabelecidos nos contratos. Com a organização e o gerenciamento eficiente de seus recursos – não só de telefonia fixa, mas também de celular, linhas VoIP, de transmissão de dados, etc. –, a empresa pode obter resultados surpreendentes em pouco tempo. Foi o que ocorreu com a empresa Suzano Papel e Celulose, de São Paulo, que reduziu em até 40% seus gastos anuais com Telecom. O Banco do Brasil adotou a solução do CPqD em 2004; em apenas quatro meses de utilização, economizou R$ 15 milhões em despesas de telefonia.
Finep: 35,65% das empresas do Brasil são inovadoras A Pintec 2005 contabiliza 34.983 empresas inovadoras e os investimentos com inovação representam 2,8% da receita líquida das indústrias no Brasil. De acordo com reportagem da revista Inovação, da Finep, 35,62% das empresas no Brasil são inovadoras. O resultado da nova Pintec sai em julho de 2010. Leia mais em: www.pintec.ibge.gov.br.
Inovação Rede de Sensores Sem Fio
Tecnologia do CPQT usada na Chesf para evitar APAGÃO Projeto vai entrar na linha de produção em série para ser aplicado em toda a rede da companhia já com a perspectiva de abranger o sistema elétrico nacional. A rede será capaz de fazer monitoramento e detectar falhas em tempo real
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ma tecnologia desenvolvida no Ceestudo do protótipo que já tem garantidos R$ ará vai ser implantada na rede 300 mil de investimento para ser desenvolde energia elétrica da Comvido em escala industrial. panhia Hidro elétrica Vale O projeto com duração de dois anos do São Francisco (Chesf) para prever deverá estar concluído no início de falhas no sistema e evitar apagões. 2010 com a preservação do conheciDenominada “Rede de Sensores Sem mento assegurada por pedido de paFio” (Rssf) para detecção de fuga a tertente, informa Reginaldo Leitão. O esra nos circuitos de corrente contínua tudo percorreu as etapas de P&D e já de subestações e usinas, a inovação foi está na fase de testes e protótipo. “Das gerada em pesquisa e desenvolvimento falhas que ocorrem no sistema elétrico, (P&D) do Centro de Pesquisa e Qualificacerca de 45% são causadas por problemas ção Tecnológica (Cpqt) do Instituto Federal associados a fuga à terra”, observa o pesquide Educação (Ifce), em parceria com a Chesf sador. Reginaldo Leitão gerencia o e Agência Nacional de Energia Elétrica (Ane- projeto de pesquisa das Redes A tecnologia de Rssf faz a identificação de el). falha causada por fugas à terra e o monitoraSem Fio do Ifce para a Chesf A tese de mestrado em Computação mento em tempo real da rede de energia. Profissional Aplicada, de Reginaldo Bezerra Leitão, técnico da Chesf em SAÍDA PARA ALTO RISCO DE AÇÕES Fortaleza e gerente do projeto aprovado pela Aneel, gerou o RASTREADORAS E CORRETIVAS
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Integração Eletroenergética
s procedimentos para detecção de problemas deste tipo são considerados de alto risco. As intervenções em sistemas de proteção e automação envolvem a integração de todos os circuitos de manobra de equipamentos e subsistemas presentes dentro da instalação sem a possibilidade de isolamento ou bloqueio das suas funções. “Como os circuitos contínuos são segmentados em diversos ramais, se ocorre este problema em um, os demais são afetados pelo mesmo fato”, explica Reginaldo Leitão. Para o monitoramento e detecção do evento de fuga à terra é usada a tecnologia de Rssf em intervenções corretivas otimizadas. “Sem a necessidade de recorrer à busca convencional aleatória, o foco é centrado em ações corretivas otimizadas na área afetada pela anormalidade. A rede autônoma de sensores sem fio deve proporcionar o monitoramento em tempo real de todas as cargas do sistema auxiliar de corrente contínua. Deve ser totalmente portável para o sistema de monitoramento já existente da Chesf, além de oferecer baixo custo para a viabilidade do projeto”, afirma o pesquisador.
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INOVAÇÃO DESLIGAMENTOS
Dimensões e heterogeneidade das redes originaram problemas
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s sistemas elétricos de potência estão na base de todo o desenvolvimento das sociedades modernas. Sua função básica é o atendimento da demanda de energia dos consumidores da maneira mais econômica possível, dentro de padrões de continuidade e qualidade contratados. Porém, com os avanços tecnológicos e econômicos, esses sistemas foram ampliados para se adequarem ao atendimento das demandas de produtores e consumidores. Surgiu, assim, uma grande rede de interligações complexas que chega a ter dimensões nacionais e continentais, composta de usinas geradoras, linhas de transmissão e subestações. A maioria das instalações de potência possui um parque bastante heterogêneo de relés de proteção e dispositivos de controle, comando e regulação, que para se manterem ligados ininterruptamente utilizam fontes de corrente contínua de energia em forma de banco de baterias. Contudo, problemas podem ocorrer nestes sistemas de alimentação, a exemplo da fuga à terra em potenciais sistemas de corrente contínua.
O que é FUGA À TERRA Fuga à terra em potenciais de controle de sistemas de corrente contínua — explica Reginaldo Leitão — é caracterizada como um desequilíbrio entre resistências das barras positiva e negativa, provocado pelo surgimento de cargas não previstas entre estas barras e a terra. Podem surgir de diversas formas, como a degradação natural dos equipamentos elétricos ou de forma acidental, através de conexões mal elaboradas por erro de projeto. As consequências deste tipo de fuga à terra são os disparos incorretos de relé digitais rápidos e sensíveis, introduzindo risco de desligamentos indevidos em subestações e usinas, que podem ser graves para todo o sistema elétrico interligado.
P&D
ANEEL E CHESF: PATROCÍNIO DE SOLUÇÕES CIENTÍFICAS
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utros dois trabalhos de P&D estão sendo desenvolvidos no Ifce / Cpqt em parceria com a Chesf e Aneel. O “detector de fuga à terra em instalações elétricas de potência utilizando Rssf”, já está em fase conclusiva e tem cinco protótipos instalados na subestação de Fortaleza da Chesf, inclusive com a aprovação para elaboração de um “cabeça de série”, início de produção industrial, pela Chesf/Aneel. O outro projeto que também tem Reginaldo Leitão como gestor é o “Sistema de Rastreabilidade de Funções Lógicas em Relés Digitais”, ora em fase de estudos e de consolidação do modelo abor-
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dado. A participação do autor em ambos trabalhos vai desde a criação da ideia, na defesa da proposta junto aos órgãos patrocinadores (Chesf/Aneel), na participação efetiva do desenvolvimento acadêmico, até a busca de soluções científicas ao lado de pesquisadores da equipe e a gestão técnico-financeira para viabilizar os empreendimentos. Para Reginaldo Leitão, a P&D com inovação é uma forma de estimular a aproximação da ciência presente nas academias e centros de pesquisa com a tecnologia instalada nas indústrias e outros locais afins. “Busco juntar esforços, fazendo parcerias e contatos, neste sentido, para a melhoria do conhecimento no Ceará”, afirma.
Capacitação
ENSINO A DISTÂNCIA VAI ATENDER POPULAÇÃO CARCERÁRIA DO CEARÁ As 14 grandes prisões de Ceará, com cerca de seis mil detentos, vão ser dotadas de salas de videoconferência para ensino a distância pela internet. A programação dos cursos está sendo montada pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (Ifce) para a Secretaria da Justiça e Cidadania do Ceará (Sejus). A proposta foi formulada pelo deputado Ariosto Holanda (PSB-CE) e incluída no projeto de Modernização do TJ-CE, apresentado à bancada federal para emenda ao Orçamento da União
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ara começar de imediato os cursos, o secretário da Justiça e Cidadania, Marcos Cals, indicou as duas Casas de Privação Provisória de Liberdade localizadas no município de Itaitinga, a 25 quilômetros de Fortaleza. As duas unidades são monitoradas da sua sala pela internet, cada uma com capacidade para 952 presos. Também foi dada prioridade à escola penitenciária montada na secretaria, para a realização de cursos para os servidores do órgão, que irá indicar os conteúdos de interesse. “No local, será instalado um polo presencial”, informa o reitor do Ifce, Cláudio Ricardo Gomes de Lima, que participou da reunião com Cals e o deputado para discussão do projeto. Pesquisa de Elionaldo Julião, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Ufrj, apontou uma ociosidade de 76% dos presidiários no Brasil. No Ceará, segundo cita, apenas 2,75% da população penitenciária trabalha.
IFCE DESENVOLVE PLATAFORMAS, PESQUISAS E CURSOS O reitor Cláudio Ricardo diz que o Ifce ministra cursos de graduação a distância pela Universidade Aberta do Brasil (UAB) do Ministério da Educação, e também oferta cursos técnicos por meio da Escola Técnica Aberta do Brasil (E-Tec). O Ifce desenvolve plataforma para educação a distância, realiza pesquisas na área e irá formatar uma proposta pedagógica de cursos de diferentes níveis para a Secretaria da Justiça e Cidadania. A proposta incluirá cursos profissionais de formação inicial e continuada de 120 a 160 horas, cursos de nível técnico, graduação e até pós-graduação.
Marcos Cals discute proposta de Ariosto Holanda com Cláudio Ricardo e Leandro Vasques
Propostas
Videoconferências, Centros de Inclusão Digital e Tecnológicos para a Sejus
A
riosto Holanda informa que o projeto de instalação de salas de videoconferência nas penitenciárias do Ceará atende também a interesse do presidente do Tribunal de Justiça do Ceará, Ernani Barreira, que pretende evitar deslocamento de presos com audiência a distância prevista por lei. Em visita às instalações da Sejus, Ariosto Holanda propôs a implantação de um Centro de Inclusão Digital (CID) no auditório da secretaria, a ser dotado de sala multimeios com videoconferência com link para o Ifce , espaço para biblioteca e sala de informática com 12 computadores conectados à internet. Foi decidida também a implantação de um Centro Vocacional Tecnológico na sede do antigo Ippo, na avenida Expedicionários, em Fortaleza, para atender os presos do regime semiaberto.
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Capacitação
CURSOS “PRONTA-ENTREGA” PARA CAPACITAÇÃO
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secretário de Justiça, Marcos Cals, demonstrou interesse em cursos “pronta-entrega”. O Ifce ofereceu cursos prontos nas áreas de segurança do trabalho, informática com ênfase no desenvolvimento de softwares, edificações e eletrotécnica, cujos conteúdos estão disponíveis com material impresso, apoio de internet, CD-Rom e videoconferência. Na área dos cursos de educação inicial e continuada, foram mencionados os módulos de saúde pública, hotelaria, línguas (inglês e
espanhol); na graduação, curso de segurança e justiça e especializações: educação para a diversidade, jovens e adultos na diversidade e práticas leitoras, ler e escrever. No encontro, ficou acertado que as necessidades de capacitação da Sejus serão apresentadas, assim como o Ifce irá formular a sua oferta. “Nas áreas de interesse da Sejus que o Ifce ainda não tem conteúdo pronto, o instituto irá formatar proposta de cursos novos para atender a demanda”, disse Cláudio Ricardo.
O deputado Ariosto Holanda propôs convidar o secretário de Nacional de Política de Informática do Ministério da Ciência e Tecnologia, Augusto Gadelha, — ele trata dos fundos setoriais que, por lei, não podem ser contingenciados —, para conhecer o projeto do Tribunal de Justiça do Ceará. “Tenho certeza de que a bancada vai fechar com este projeto”, adiantou o parlamentar, ao pedir um cronograma das etapas sequenciais da implantação da proposta.
Informatização PROCESSUAL
Tribunal de Justiça do Ceará quer a maior virtualização das Américas
Bancada federal assiste a apresentação de como funciona a Justiça Virtualizada
A
Corte quer avançar na substituição da burocracia dos papéis pela agilidade informatizada na tramitação dos processos. É o que pretende com o projeto Inovação e Modernização do Poder Judiciário do Ceará, apresentado este mês a parlamentares da bancada federal do Estado, com vistas à captação de recursos de emendas. “Com este projeto, o TJ Ceará vai ser o primeiro absolutamente virtualizado nas Américas”, disse o desembargador Ernani Barreira, presidente do Judiciário cearense. A falta de transparência, a morosidade e falta de previsibilidade nas decisões, para o presidente do TJ, são problemas que estarão resolvidos com a implantação do projeto que possibilitará canais de fiscalização das partes e rapidez
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na tramitação dos processos. Casos que duram três anos não devem durar mais que seis meses, assinala Barreira ao anunciar que o projeto irá introduzir regras básicas nos processos. Segundo o desembargador, com um simples toque no computador, uma parte vai ter a noção exata de quem é o responsável pela morosidade e, assim, poder cobrar. Participaram da reunião com os desembargadores os deputados José Guimarães (PT), líder da bancada no Congresso Nacional, José Arnon, Ariosto Holanda, José Airton, Eugênio Rabelo e Paulo Henrique Lustosa. Ao reconhecer que a Justiça precisa se modernizar, Guimarães entende que é chegada a hora de dar a merecida atenção especial a esse projeto. “Não tem estado de direito sem uma Justiça forte”. O coordenador solicitou a indicação de um interlocutor do TJ com a bancada para adequar o projeto ao formato de emendas. Conforme a apresentação técnica, a proposta foi orçada em cerca de R$ 75 milhões. Existem no Judiciário 890 mil processos em andamento para serem digitalizados, 373 unidades jurisdicionais do primeiro grau instaladas nos 184 municípios e 33 unidades jurisdicionais do segundo grau na capital a serem virtualizadas.
virtualização do judiciário
PRINCIPAIS METAS DO PROJETO DE MODERNIZAÇÃO
99 Informatizar a prestação
de serviços jurisdicionais e administrativos;
99 Gestão de risco e segurança da informação;
99 Investimento na adequação da
infraestrutura física do Judiciário, e sobretudo nas áreas de tecnologia da informação e de telecomunicação.
99 Integração do Tribunal de
Justiça na Gigafor — Redes Comunitárias de Educação e Pesquisa da Região Metropolitana de Fortaleza — e, em seguida, ao Cinturão Digital do Ceará, a infraestrutura de fibra óptica que está sendo implantada pelo governo cearense em todo o interior, prevista para ser entregue em maio de 2010;
99 Integração à Secretaria da
Fazenda, Procuradoria Geral do Estado, Secretaria de Finanças de Fortaleza, Procuradoria Geral do Município e Varas de Execuções Fiscais para maior agilidade no recebimento de recursos a que o Estado tem direito;
99 Implantação das tecnologias de
videoconferência, educação e audiência à distância em presídios, controle da progressão penal, correio eletrônico corporativo, o Serviço de Mensageiria Judicial (SMS), gravação de audiências (voz e imagem), degravação assistida por computador e certificação digital para magistrados e servidores.
Segurança e sustentabilidade
EQUÍVOCOS DE OUTROS TRIBUNAIS SERVEM PARA APERFEIÇOAR MODELO
N
a reunião com a bancada federal, foi mostrado o vídeo de como funciona a Justiça Virtualizada, uma prestação de serviços jurisdicionais célere, absolutamente sem papel. A primeira etapa visa a informatização da comarca de Fortaleza e das quatro principais comarcas do interior, no prazo de 10 meses e um ano e meio, no máximo, para as demais do interior. “Temos a tecnologia, e estamos aperfeiçoados, corrigindo os equívocos das experiências anteriores de outros tribunais”, afirmou o secretário de Tecnologia da Informação do TJ, José Montenegro. No aspecto dos custos, Montenegro observou que com a celeridade nas decisões haverá resultados que tornam o projeto de modernização totalmente sustentável. A primeira etapa da implantação, a ser realizada em quatro meses, prevê a definição de como os processos tramitarão com a virtualização. Em paralelo, é encaminhada a parte de infraestrutura do projeto. A segurança da informação é um ponto importante no projeto. Foram especificados projetos para governança, gerenciamento de risco e conformidade da TI, ambiente, processos e pessoas; gestão da infraestrutura computacional, gestão de acesso a internet (web), segurança corporativa, antivírus e servidor de arquivos corporativo criptografado. O up grade na infraestrutura exigirá também espaço físico da informática, novo datacenter para o Tribunal, datacenter para o Fórum da capital e melhorias na rede de energia, de dados e de telefonia em ambos os prédios. nov/dez de 2009 / ciência &tecnologia
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TI com qualidade CMMI5 é do Ceará
Liderança feminina na conquista de certificado para Instituto Atlântico
Predomínio feminino na gestão da qualidade (CMMI5) no Atlântico (da esquerda para a direita): Joice Barbosa, Luciana Trindade, Gabriela Telles, Carla Ilane, Walter Costenaro, Paula Luciana, Thais Araújo Ocupação de cargos de liderança na área de tecnologia do Ceará era assunto tabu até pouco tempo, resvalando em questões de gênero. Uma espécie de “clube do Bolinha” ou área privativa de homens já se impunha quando um exemplo de destaque na área foi dado pela gerente técnica do Instituto Atlântico, Gabriela Telles. Cearense formada em Ciência da Computação pela Universidade Federal do Ceará (19931997), ela liderou quase 200 pessoas da instituição, uma sociedade civil sem fins lucrativos — na conquista do nível máximo da certificação de desenvolvimento de software, a mais importante do mercado internacional, o CMMI5 (Capability Maturity Model Integration).
D
R$ 1 milhão na conquista do CMMI 2 ois anos de dedicação inem 2005 e do Nível 3 em 2006, que tegral e apelos inusitados Empresas com também tiveram a participação de Gaaos colegas do ambiente certificado CMMI5 briela Telles. de trabalho. Coisas como Após concluir o curso na UFC, a pedir às pessoas que comandavam no Brasil hoje executiva teve uma experiência equipes para não brigarem com o ma- • Instituto Atlântico (Ceará) de trabalho internacional em 2000 e rido ou esposa nem ficar doente. Tudo • Accenture Brazil (São Paulo) em nome do exclusivo foco no traba- • Ci&T Software S.A (São Paulo) 2002 em Portugal, quando soube da instalação do Instituto Atlântico em lho, do cumprimento das etapas do • CPM Braxis (Bahia) Fortaleza, no ano de 2001, o que posprocesso e atendimento aos prazos. • EDS (São Paulo) sibilitou a sua volta ao Brasil com o Ao receber o anúncio oficial do certificado, Gabriela confessou que foi aten- • Unisys Brazil Solution Center marido, Carlo Giovano, hoje colega na (Minas Gerais) dida em suas invocações. mesma empresa. Entre 2004 e 2006, Na conquista do certificado Gabriela Telles concluiu mestrado em CMMI5 — ostentado por apenas seis empresas no BraCiência da Computação na Unifor. sil — o Instituto Atlântico investiu R$ 2 milhões, além de Como líder da preparação do Atlântico em todo
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TI com qualidade
o processo de reconhecimento do seu nível de maturidade e qualificação no desenvolvimento de software, Gabriela está sendo requisitada para palestras sobre a experiência. Já fez uma apresentação para executivos em São Paulo e outra em Curitiba para um grande banco multinacional. De 22 a 25 de março, em Savannah, na Georgia (EUA), apresenta o artigo Agile with High Maturity Levels: An innovation approach. (Agilidade com Altos Níveis de Maturidade: Uma abordagem inovadora) que aprovou e publicou no congresso anual de engenharia de software, SEPG North America 2010.
Gabriella Teles diz que no CMMI Nível 3 foram definidos e estabelecidos os processos. Agora, com o nível 5, os processos serão continuamente melhorados. O controle estatístico é um pré-requisito para essa melhoria. Seis mulheres e um homem integraram a equipe do Atlântico na conquista do CMMI5: Paula Luciana, Luciana Trindade, Gabriela Telles, Carla Ilane, Walter Costenaro, Joice Barbosa e Thais Araújo. O presidente do Instituto Atlântico, Cláudio Violato, e o superintendente José Eduardo Martins confiaram a missão a esta equipe, e contam com uma outra mulher no quadro gerencial, Vitória Damasceno Matos, gerente técnica.
ISD
Consultoria internacional atesta melhoria na qualidade de processos nível de qualidade, um conjunto de melhores práticas utilizadas pela organização para levar seus projetos adiante”, disse a consultora ao entregar a placa ao superintendente do Atlântico, José Eduardo Martins. “A organização demonstra um compromisso claro para melhoria de processos”, afirmou Joseph Morin, líder da ISD, que conduziu a avaliação. O que move o Atlântico no processo da obtenção do CMMI5 é, segundo Martins, o sentimento de que a organização precisa ter qualidade de processos, condições de previsibilidade em termos de prazo, de custo e de volume de trabalho a ser fei-
Cláudia Mendonça Camargo entrega a placa alusiva ao reconhecimento ao superintendente do Atlântico, José Eduardo Martins
a
avaliação de qualidade foi feita pela empresa ISD (Integrated System Diagnostics Brasil S/C Ltda), consultoria internacional com foco exclusivo em qualidade de processos, e publicada no site da empresa. Uma placa alusiva ao reconhecimento foi entregue em outubro pela consultora da ISD, Cláudia Mendonça Camargo, que acompanhou todo o processo de preparação do Atlântico desde o CMMI nível 2 até o CMMI5. “O CMMI5 é um diferencial nacional e internacional. Pouquíssimas empresas no Brasil têm este
to para que consiga satisfazer o cliente. “Estamos sempre melhorando para atender as exigências do mercado cada vez mais competitivo. Com o CMMI5, temos condições de comprovar que realmente melhoramos, medir a melhoria e poder dizer que estamos em um outro nível de excelência em termos de controle de processos”, assinala. José Eduardo observou que para um processo longo teve de ser feito um planejamento detalhado passo a passo até chegar ao CMMI5. “O grande mérito do CMMI5 é envolver toda a organização; não se aplica a um só setor, mas a todos. Isso exige um trabalho de motivação, de trazer todas as pessoas, principalmente as que estão liderando o processo”, disse, ao lembrar que o trabalho de qualidade está voltado para o mercado interno e externo. nov/dez de 2009 / ciência &tecnologia
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TI com qualidade Oito anos
Maturidade, expansão e aposta nos talentos locais
A CONQUISTA DO CMMI5 EXIGIU DEDICAÇÃO, MAS TAMBÉM
INVESTIMENTO DE MAIS DE R$ 3 MILHÕES. As MULHERES compõem 29%
Presidente do Instituto Atlântico, Cláudio Violato, vice-presidente de Tecnologia do CPqD
DO CORPO FUNCIONAL DO ATLÂNTICO, conforme levantamento do GUIA VOCÊ S/A EXAME que, em 2009, incluiu a instituição NA LISTA
O Instituto Atlântico, que faz parte do universo CPqD, foi incluído no guia da revista Você S/A Exame, considerado uma das melhores empresas para trabalhar no Brasil
O
Instituto Atlântico atua no Ceará há oito anos. Hoje, vive um momento de estabilidade na trajetória de crescimento institucional. O início foi caracterizado pelos acordos e apoios recebidos do Governo do Estado, que viabilizaram a ideia com a participação decisiva do CPqD (Centro Nacional de Pesquisas e Telecomunicações) para trazer a instituição à Fortaleza. “Nos primeiros anos não sabíamos do celeiro de talentos que o Ceará e Fortaleza têm. Apostamos muito nos talentos locais”, relata o superintendente. A conquista do CMMI5 dá a certeza e a segurança de que o Atlântico consolidou uma base forte formada para propiciar os novos passos. “O momento político-econômico atual aponta para conjuntura da crise mundial sendo debelada aos poucos, mas ainda é difícil prever. O mundo hoje e a tecnologia mudam muito rápido”, assinala Martins. Para ele, os últimos dois anos foram de significativo crescimento. Agora, é a vez de expandir. Como exemplo, diz que as filiais nos municípios de Sobral e São Paulo estão funcionando dentro da característica de métodos e processos maduros desen-
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volvidas na matriz em Fortaleza, que foram transferidas, exportadas e absorvidas. O planejamento leva em conta o mercado nacional e o mercado internacional. A operação de exportação, que já responde por 12% da receita do Instituto, é realizada pelo CPQi, a parceria do Atlântico com a empresa Firm economics, da Inglaterra. O site www.cpqi.com, totalmente em inglês, tem linguagem voltada para o mercado internacional do segmento de outsourcing e offshore, o foco do CPQi. “Encapsulados, criamos, demos corpo e, agora, estamos prontos para fazer um spin-off (destacar o CPQi do Atlântico para concentrar o foco no que vai desempenhar). A idéia é que o CPQi tenha sede própria, que evolua da mesma forma que o Atlântico ao longo dos anos”, informa. O Atlântico é uma instituição científicotecnológica. Não se dedica àquela pesquisa básica do âmbito da universidade.“No posicionamento mais estratégico, o Atlântico fica situado entre a universidade e o mercado”, define José Eduardo, acrescentando que essa situação cria uma cultura institucional na organização que demanda um perfil de profissional.
DE 150 MELHORES EMPRESAS PARA VOCÊ TRABALHAR. Conforme a avaliação, ali o ÍNDICE DE
FELICIDADE NO TRABALHO É DE 77,9% (NOTA FINAL) E 89,4% DOS 113 FUNCIONÁRIOS REGISTRADOS SE IDENTIFICAM COM A EMPRESA. A APROVAÇÃO DOS LÍDERES FICOU EM 86,8%. Outro indicador: 80,6% dos funcionários declararam acreditar que têm desenvolvimento na instituição que aprovou plano de cargos e carreira.
TI com qualidade
Filiais em São Paulo e Sobral
Filial do Instituto Atlântico em Sobral
Equipe do Instituto Atlântico em Sobral
U
m crescimento vertiginoso em São Paulo. De seis para 100 pessoas, entre três e quatro meses. Motivo: o desenvolvimento de software para o mercado financeiro. “Essa maturidade que temos e foi transferida para São Paulo hoje garante que façamos isso sem grandes turbulências na instituição como um todo”, afirma o superintendente do Atlântico. Para 2010, José Eduardo disse que está previsto crescimento numa taxa normal de mercado, com a possibilidade de atração de novas receitas e novos clientes. Hoje, a
filial Sobral tem uma capacitação a permitir que todos os recursos de desenvolvimento sejam cumpridos na unidade. Primeiro a filial recebia partes do projeto, desenvolveu especialidade em algumas áreas, mas depois de um programa de capacitação, transferência de métodos, processos e conhecimento chegou ao ponto que agora permite desenvolver um projeto completo na unidade. José Eduardo observa que a tecnologia possibilita que hoje os projetos sejam controlados e gerenciados remotamente. “As reuniões presenciais são importantes, acontecem periodicamente. Mas hoje temos um arcabouço tecnológico que permite fazer de modo remoto em diversas localidades. Desde que se tenha formação e mentes brilhantes disponíveis”, afirma.
Perspectivas
Inteligência e centros de formação nas regiões
“A
característica principal dessa indústria em que nós trabalhamos é a inteligência das pessoas. Não sobrevivemos sem ter pessoas com qualificação e competência, que se propõem a enfrentar desafios de uma forma muito bem preparada”, assinala José Eduardo. Para ele, onde há centros de formação como Fortaleza com suas universidades e institutos existe essa característica”. No Ceará, o superintendente avalia que a região Norte também conta com esse aspecto, embora em menor escala, que justifica a existência da unidade em Sobral. Ele vê potencial também na região do Cariri, no Sul, que está se desenvolvendo. José Eduardo conta que já visitou o Cariri numa prospecção junto a autoridades locais, mas os contatos ainda não deram resultado.
João Dilmar, Jorge Guimarães, Ariosto Holanda, José Eduardo e Cláudio Ricardo Gomes de Lima em Limoeiro do Norte Na região Central, ele vê potencial em Quixadá, dotado de bacharelado da UFC em sistemas de informação. O superintendente visitou Limoeiro do Norte com o deputado Ariosto Holanda, o presidente da Capes, Jorge Guimarães, e o reitor do IFCE, Cláudio Ricardo Gomes de Lima, onde vê possibilidade de parceria com o campus do IFCE. Esteve também em Tauá a convite do presidente da Assembléia Legislativa, Domingos Filho.
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Inovação para consumo externo
banco de dados com exemplos
Sebrae registra casos de sucesso das incubadoras
A SK Bombas é uma das sete empresas do Ceará, todas incubadas na Intece, a incubadora do Instituto Centec, convidadas pela Unidade de Acesso à Inovação e Tecnologia do Sebrae nacional para fornecer informações de suas histórias e negócio para o Banco de Dados “Casos de Sucesso de Inovação”. Também autorizaram o Sebrae a documentar suas histórias a JM Máquinas, de Juazeiro do Norte; Doce Delícia, de Crateús; Tina Condimentos, de Crateús; Serraria São Francisco, de Solonópole; Ortobral, de Sobral e Ceará Designer, de Quixeramobim.
O
Desirée Bezerra. s relatos destacam o desempenho das emO Sebrae aprovou o projeto do Ceará para duplipresas no tocante à inovação — em produto, car o número de empresas incubadas da Intece seleprocesso, marketing ou gestão organizaciocionada em edital com direito a R$ 590 mil a serem nal. A divulgação dos casos de sucesso visa aplicados em dois anos no apoio às empresas. Já foproporcionar maior visibilidade às ações do Sistema ram escolhidas 23 empresas que apresentaSebrae, que é o principal parceiro financeiro da ram planos de negócios e as outras têm Intece no apoio tecnológico e à inovação prazo para serem selecionadas até das micro e pequenas empresas. março de 2010, disse Sueli VasconA Intece coordena seis incubacelos. Cerca de R$ 120 mil serão doras em Quixeramobim, Aracati, destinados a cada incubadora, Crateús, Juazeiro do Norte e Liexceto a de Limoeiro do Norte. moeiro do Norte com 50 empreA incubadora de Limoeiro sas incubadas que geram 232 do Norte, segundo ela, teve empregos diretos. Na incubaaprovado edital do Sebrae dora, as empresas recebem nacional de R$ 120 mil apreorientação de consultoria e sentado pela Intece para fazer treinamentos na área de gestão atendimento descentralizado a e marketing, informa a coordenaempreendedores que não estão dora da Intece, Sueli Vasconcelos, no processo de incubação em 10 presidente da Rede de Incubadoras municípios do Vale do Jaguaribe. Já do Ceará (RIC). A incubadora integra SK Bombas King a diretoria de Pesquisa e Inovação do foram atendidas 1.304 pessoas físicas e 354 pessoas jurídicas. Instituto Centec sob responsabilidade de
Wilton Bezerra Júnior Editor Executivo n editor@editoraassare.com.br n wiltonbezerrajunior@gmail.com Marcel Bezerra Diretor Editor Adjunto n marcel@editoraassare.com.br Flamínio Araripe Editor Adjunto de Ciência e Tecnologia n flaminio.a@gmail.com Apoio Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (ETENE) / Banco do Nordeste do Brasil (BNB) Apoio Técnico Centro de Pesquisa e Qualificação Tecnológica (CPQT) Diretor-Executivo Edson da Silva Almeida Colaboração Assessoria de Comunicação Social do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) / Jornalista Marlen Danúsia
Editora Assaré Ltda ME - Rua Waldery Uchôa, 567 A n Benfica, Fortaleza, Ceará n CEP: 60020-110 e-mail: assare@editoraassare.com.br - Fone/fax: (85) 3254.4469
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ENSAIO
Caldeirão de Santa Cruz do Deserto
história e a memória, a rebeldia da tradição no Cariri cearense Entre a
Cena 13 da Taula de Sant Miquel (séc. XIII) do mestre de Soriguerola (Baixa Cerdanha - Catalunha) – detalhe: O Caldeirão dos Supliciados
Uma dívida não honrada com nosso passado. Um precioso objeto de pesquisa daquilo que, na academia, se convenciona chamar de “o Brasil profundo”. Um fenômeno sóciopolítico e religioso que ainda passa longe de prescindir dos fôlegos de curiosidade e saberes interpretativos capazes de fazer com que as nossas ditas “elites” reconheçam-no como história social genuína. Movimento messiânico de romeiros e migrantes surgido na segunda década do século XX em terras do município de Crato, no Ceará, pautado no trabalho e fraternidade, o Caldeirão de Santa Cruz do Deserto, teima contra seu o aniquilamento nas contendas da história. Atormenta o sono daqueles que sabem muito bem distinguir em nossa vida institucional, aqui incluídos sobejamente Estado, Igreja e latifúndio, o que sejam “memórias do poder” e “o poder da memória”. Por Francisco Régis Lopes
Doutor em História Social (PUC-SP), professor do Departamento de História da Universidade Federal do Ceará (UFC)
redacao@nordestevinteum.com.br Fotos livro Caldeirão de Régis Lopes/Eduece 1991
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O início de tudo. Juazeiro, para todo sempre
Depois que o bispo o proibiu de pregar na igreja, Padre Cícero passou a falar aos devotos na própria janela de casa
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o princípio, foi um mistério: a hóstia transformou-se em sangue. Depois veio a infindável legião de romeiros, para confirmar o milagre e em busca de solução para toda sorte de sofrimentos e desventuras. Foi assim que, em 1889, nasceu o chão sagrado de Juazeiro. Rebento de fé nos poderes do sangue que jorrou quando a Beata Maria de Araújo comungava pelas mãos do Padre Cícero. Afirmando que tudo não passava de fanatismo, a Igreja desenvolveu uma prolongada repressão ao movimento, mas o efeito esperado não se realizou. Com o passar do tempo, apareceram novos adeptos e as romarias cresceram. Mesmo suspenso de ordens e proibido de fazer pregações, Padre Cícero assumiu, na crença dos sertanejos, o papel de protetor milagroso. JOSÉ LOURENÇO não foi o único que chegou. O seu grupo de romeiros também não era único que chegava ao sagrado Juazeiro. Por outro lado, Juazeiro não era a única opção para quem fazia romaria. Eram muitas as paragens do sagrado e o que não faltava era o trânsito de romeiros. Além
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de Juazeiro, tinha Bom Jesus da Lapa no sertão da Bahia, Canindé no sertão do Ceará e vários outros recantos de menor destaque. E vale lembrar que Canudos era também um centro de peregrinos. José Lourenço chegou a Juazeiro por volta de 1890 e por lá ficou. Era romeiro, mas a fé aumentou e ele se transformou em beato. Além da fé, desenvolveu a sensibilidade do líder. Tornou-se conselheiro, pregador e fundou uma pequena comunidade de camponeses, em um pedaço de terra que ele mesmo arrendara, o Sítio Baixa Danta. Baseado em princípios da religiosidade católica, liderava sertanejos e sertanejas que trabalhavam na agricultura e dividiam os frutos da labuta. Ao assumir a condição de Beato, começou a fazer pregações que possuíam três princípios: a fraternidade, a oração e o trabalho. Existiam muitos outros beatos e beatas, que moravam em Juazeiro ou por lá passavam para renovar a fé nos
poderes do Padre Cícero. Mas a sua opção foi peculiar: além da reza e da penitência, ele fez uma comunidade de agricultores. Nada muito grande, porém lá se colocava em prática a tradição que em outros lugares só estava na palavra: a igualdade entre os filhos de Deus. Nesse caso, a tradição tornava-se rebelde, feria os interesses dos que praticavam a religião como forma de legitimar a desigualdade. O sossego foi abalado de modo mais profundo em 1914, durante a chamada “Sedição de Juazeiro”, e alguns anos depois, quando o beato foi acusado de alimentar o fanatismo do povo em torno do “Boi Mansinho”. Preocupado com a imagem do Padre Cícero, o deputado Floro Bartolomeu agiu sem delongas, em perfeita sintonia com sua determinação de evitar qualquer coisa que pudesse macular a “modernidade de Juazeiro”: ordenou a prisão do beato e mandou matar o “Boi Santo”. Depois da morte do “Boi Mansinho”, José Lourenço ainda ficou algum tempo detido na cadeia pública de Juazeiro. Quando se viu fora das grades seu destino foi voltar para Baixa Danta. Retomou o cotidiano de oração e trabalho, mas em 1926 foi obrigado a procurar outras terras para o seu povo. O Sítio Baixa Dantas foi vendido e o novo dono exigiu a posse do terreno. Para resolver o impasse, José Lourenço conseguiu com o Padre Cícero outro espaço para dar continuidade ao trabalho comunitário: o “Caldeirão dos Jesuítas”, um terreno irrigado e fértil, circunscrito no sopé da Serra do Araripe. O líder do Sítio Baixa Danta, beato José Lourenço, preso sob a acusação de promover um boi a santo milagreiro. Foto livro Caldeirão Régis Lopes/Eduece
Tudo era de todos, nada era de ninguém
Legitimidade pelo jeito de bem “dizer” exemplos do bom viver
Camponeses do Caldeirão
No Caldeirão a terra dava frutos e os frutos eram divididos. O líder dizia: nada era de ninguém e tudo era de todos. E assim se fez uma irmandade de agricultores. Irmãos, pois eram filhos de Deus e eram filhos de Deus porque conheciam a mensagem igualitária da Bíblia. Na seca de 1932, muitos escaparam da fome com as reservas da comunidade e alguns dos que por lá passaram lá ficaram. O Caldeirão crescia. Em 1934, com a morte do Padre Cícero, começaram a usar roupa preta, em memória do santo que dava o alívio para as dores da vida.
A
o assumir a condição de beato, sob influência da movimentação de peregrinos de Juazeiro, José Lourenço começou a fazer pregações que possuíam três princípios: a fraternidade, a oração e o trabalho. As relações entre os seres humanos deveriam ser fraternas, pois todos eram filhos de Deus, todos eram iguais. A oração deveria estar sempre presente: como forma de agradecer a Deus por mais um dia de vida; de pedir ajuda aos poderes do Além; ou de fazer penitência, ritual que martiriza o corpo para purificar o espírito. O trabalho era, também, uma penitência: cada um deveria tirar o sustento com o suor do seu rosto. Em outros termos: tudo era velho
e novo, ao mesmo tempo. Velho porque tudo já estava na Bíblia, ou nas tradições da oralidade católica. Novo porque pouca era a fraternidade que saía da palavra para a ação. Todos eram filhos de Deus, sobre isso havia unanimidade, mas sobre a igualdade entre todos os irmãos não havia consenso. Afinal, a Igreja Católica estava cheia de comprometimentos com as classes dominantes, que viam na
igualdade uma coisa do demônio ou de um ser semelhante. O que importava, nas pregações do beato, não era somente o dito, mas sobretudo o jeito de dizer, a presença de uma vida que, de maneira explícita, envolvia-se com a experiência religiosa. Quem falava era um homem de oração e isso fazia a diferença para quem escutava. Entre os anos de 1988 e 2002, gravei vários depoimentos com sobreviventes. Perguntei sobre o que ele pregava e ouvi uma longa seqüência de narrativas, “exemplos do bom viver”, como sempre ressaltava Marina Gurgel. Mas havia muitas maneiras de falar. O senhor João Silva, em seus depoimentos, repetiu inúmeras vezes: “o que ele dizia, ele dizia com a vida dele”. Do que o beato gostava de cantar, dona Marina lembra de um velho refrão, repetido morosamente na calada da noite, quando se reuniam para rezar: “Dai-me meu Jesus / um doce coração / pelas cinco chagas / da vossa paixão”. É claro que no curto espaço desse artigo não tenho condições para reproduzir o que escutei sobre os conselhos e as narrativas do beato, mas não posso deixar de citar um pedaço do depoimento de dona Maria Lourença: “Ele falava da pessoa que quer ser grande. Quer ser grande, mas pra Deus não valia nada. Que o péde-pau quanto mais alto, mais a queda é grande.” Habitantes do Caldeirão usavam roupas pretas
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Tramas e dramas da destruição
Tragédia de uma utopia de equidade, justiça e autossuficiência A polícia não gostou. O Governo do Estado, a Igreja Católica e os latifundiários também não gostaram, pelo mesmo motivo. A solução foi simples e corriqueira: em setembro de 1936, um destacamento militar invadiu e destruiu o Caldeirão. Diante das baionetas, todos os habitantes foram expulsos do chão de onde tiravam o sustento de cada dia. Mais uma vez, o beato foi perseguido pela polícia. Passou mais de um ano procurando refúgio pelas matas da Serra do Araripe.
O
momento de maior aperreio foi em março de 1937, quando o capitão Bezerra e mais três militares morreram em luta com o grupo de ex-habitantes do Caldeirão que estava liderado pelo Beato Severino Tavares, também morto no embate. Logo depois do conflito, uma tropa de militares vasculhou os arredores do lugar, a fim de prender e torturar os que andavam com roupa preta. Até hoje, não se sabe a quantidade de mortos. O Caldeirão era uma irmandade. A vida de cada dia seguia a tradição: trabalhavam, rezavam, cantavam, faziam penitência, gostavam de contar sobre coisas de outro mundo e nunca esqueciam de dar graças ao Padre Cícero. Se aqueles camponeses eram tão tradicionais, por que a polícia resolveu destruílos? Porque, a partir dos costumes, foram rebeldes. Afirmavam, com base na Bíblia, que todos eram iguais. Transformaram a utopia cristã em realidade concreta. A Igreja se zangou e o bispo do Crato chegou a dizer que o Caldeirão instalava o inferno na Terra. Era a reação institucional diante daquilo que o historiador inglês Edward Thompson chamou de rebeldia da tradição.
Sobre memórias e ameaças
Uma nova “ordem de penitentes”, um novo “Canudos” a ser destruído
Camponeses do Caldeirão durante o ataque policial de 1936
M
as, há outro fator que deve ser levado em consideração, quando se avalia a circunstância que arrumou o fim do Caldeirão em setembro de 1936: as memórias em torno de Canudos. Na cabeça das elites, tinha ficado o exemplo de uma revolta que não poderia se repetir. A destruição da comunidade do Caldeirão foi um ato preventivo, mobilizado pela assombrosa lembrança das derrotas que o Exército brasileiro sofrera em Canudos. A rigor, não havia acusação concreta para a intervenção policial no Caldeirão. O próprio tenente Góes de Campos Barros reconheceu isso publicamente, em seu
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relatório divulgado na imprensa da época e no livro ‘A Ordem dos Penitentes’. O que existia, de fato, era uma mentalidade preventiva, pronta para identificar o problema antes de o problema existir. O Caldeirão não foi destruído porque era um núcleo fora-da-lei, mas porque poderia ser um novo Canudos. Para os poderes institucionais, a memória serve de alerta, tem utilidade pública, para manter a ordem dos privilégios. Os que gostam das idas e vindas de deferimentos e licitações sabem que o jogo da memória tem seu valor, na medida em que faz e desfaz legitimidades. Diante do pretérito, os vampiros inventam, ao sabor de interesses particulares, rupturas e permanências. Mas, tem sempre mais um lado na história, que, apesar dos burocratas de plantão, desmancha o penteado. Hoje, Canudos e Caldeirão fertilizam outras memórias, em conexão com a renovação dos estudos históricos. Mortos no tempo, escaparam nas pelejas da História, mostrando que, apesar da memória do poder, existe o poder da memória. Por outro lado, percebe-se que, sobre os dois episódios, há poucos estudos de qualidade e uma enjoada safra de cópias não-confessadas. Os procedimentos de interpretação e o fôlego de pesquisa ainda estão longe de produzir obras de maior densidade. A dívida com o nosso passado continua.
O acerto de contas
“Relembrar o passado é sofrer duas vezes...” F
oi assim que dona Marina e o senhor Eleutério responderam quando lhes perguntei, pela primeira vez, sobre a vida no Caldeirão. Só depois de prosear sobre as virtudes do Padrinho Cícero foi que eles começaram a falar sobre o Beato José Lourenço: “era um homem humilde, só pensava em fazer o bem...”. Juntamente com outros devotos, dona Marina lembrava a abundância e a fraternidade em contraste com a escassez depois da expulsão em setembro de 1936. A certeza de ter vivido “no caminho certo” entrava em contradição com as acusações que faziam da experiência comunitária um ato criminoso. Em certas situações, as operações da memória desenvolveram-se em forma de denúncia, ou no intuito mostrar que, apesar de tudo e antes de tudo, o beato e seus seguidores não perderam a dignidade. João Silva contou que seu pai, durante a expulsão, não levara nada do armazém, afirmando para os comandantes que tudo era de todos: “o Capitão José Bezerra ofereceu cinco burro para ele trazer carregado de mantimento do jeito que ele quisesse. Ele agradeceu, sabia que meu padrim (José Lourenço) tava pro mato passando fome. ‘Aí, também eu não vou querer nada de você’ - ele disse”. (João Silva, 1989) Em seus depoimentos, os devotos fizeram um acerto de contas: do presente com o passado. Enfrentaram, com a voz, as letras estampadas em jornais que, nos anos 30, haviam criminalizado os habitantes do Caldeirão. Falaram o que fora abafado nas malhas da história oficial, colocaram-se diante de outras memórias, construindo o pretérito como exigência do devir, não só para curiosos como eu, mas sobretudo para eles mesmos. Através de suas lembranças, ficaram diante de espelhos e se viram como partícipes de uma história exemplar. Marina Gurgel
Não houve reação
Diante do ataque da polícia, o gesto pela preservação da vida A Nesse sentido, a perseguição foi quase uma provação. Nas palavras de dona Marina, o beato aparece encarnado na “imagem cristológica”. Assim como Cristo, o beato também anunciou: “eles não sabem o que fazem”. O respeito, mesmo diante da polícia, era a orientação: “Então, chegou um rapaz e disse: meu padrinho, o Caldeirão está cercado com 200 praça. Aí ele disse: ‘tá?’ Ele respondeu: ‘tá’. Aí, ele foi e sentou. E disse: ‘Olhe, o que eu tinha de dizer, eu já disse, ensinei a todos, dei o bom conselho, saibam responder bem a polícia, respeitar...’.” Além de rememorar a mensagem dos evangelhos, o Beato Lourenço estava propondo uma tática de preservação da vida. Afinal, a experiência mostrava que reagir diante da polícia significava grande perigo.
Capa do relatório sobre o ataque policial ao Caldeirão
s rememorações atualizam o direito de explicar o que foi mal entendido. As operações da memória abrem mais espaço para uma autoafirmação ou uma auto-valorização diante das acusações que giravam em torno dos devotos do Padre Cícero. Por outro lado, fica uma certa incompreensão diante desses curiosos que o pensar acadêmico chama de pesquisadores: “O que é isso? Eu num sei... Você vem aqui e faz as perguntas e a gente começa a lembrar. Veio aqui um professor e me levou numa sala
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cheia de foto do Beato que eu nem conhecia. Chega jornalista e pergunta. É bom, é um povo educado. Às vezes eu penso que essas entrevista é um meio de vida... Eu num sei...” (Marina Gurgel, 1990). O senhor Eleutério, certa ocasião, me disse: “tem coisa que nem adianta eu explicar. Não adianta. Eu entendo porque eu tenho a crença e a fé. O Padre Cícero era um espírito de luz!” Logo depois, explicou o seguinte: “Esses livro que escrevem, eu nem olho. Tudo é mentira... Agora, eu sei! A gente vê as histórias do Padre Cícero nos livro. Eu que conheço e pego um livro. E vejo: tem umas parte até mais ou menos, mas logo vem uma mentira”. O Caldeirão acabou, mas continua. Sua importância para a nossa história se torna cada vez mais atual, sobretudo quando se vê que não temos a reforma agrária que já deveríamos ter. E, como se isso não bastasse, ainda não desapareceram as notícias de trabalhadores rurais assassinados pelo poder do latifúndio. Mas, afinal o que fazer? Antes de
O Caldeirão acabou, mas continua. Sua importância para a nossa história se torna cada vez mais atual, sobretudo quando se vê que não temos a reforma agrária que já deveríamos ter tudo, escutar os poetas, em uma escuta que não pode esquecer Thiago de Mello em O Tempo dentro do espelho: “O tempo passa? Ai, que me dera! O tempo / fica dentro de mim, cantando fica / ou me queimando, mas sou eu quem canto / eu que me queimo, o tempo nada faz / sem mim que lhe permito a minha vida. / De mim depende, sou sua matéria, / esterco e flor do chão da minha mente, / o tempo é o meu pecado original”.
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Exemplo ecológico. Por João Alves Araújo *
A origem do termo Caldeirão e os méritos do beato na sustentabilidade do lugar
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ermo “Caldeirão”, antes de dar nome ao sítio que abrigou a irmandade liderada pelo beato José Lourenço, já designava uma falha geológica formada por pedras que se enchia de água do riacho que por ali passava. Essa estrutura natural foi muito importante para o desenvolvimento da comunidade, porque a água ficava acumulada no “caldeirão” mesmo em tempos de seca. O clima na região do Cariri é semiárido, com chuvas concentradas nos quatro primeiros meses do ano. Depois desse curto período, nem uma gota cai do céu. Por isso o desafio maior para o pessoal do sítio era irrigar as plantações, uma vez que o solo não possibilitava a retenção de água. “Como é possível sustentar toda uma comunidade dependendo de um solo que tem restrições agrícolas? O grande mérito do beato foi exatamente este: ele soube utilizar os recursos e os ecossistemas do semiárido”, afirma o geógrafo Arlindo Siebra. Além do modus vivendi igualitário, o Caldeirão foi um exemplo ecológico para o Nordeste. Segundo Siebra, a comunidade construiu várias microbarragens e dois açudes. Faziam também um tipo de cisterna, que cobriam para evitar a evaporação, armazenando a água no subsolo. Outra característica importante frisada por Siebra era o não-desmatamento da “coroa da serra” - como são chamadas as partes mais altas da fazenda. Normalmente os agricultores trabalham com rotação de culturas, ou seja, queimam a vegetação para adubar o solo e depois plantam durante cerca de três anos. Posteriormente, abandonam a área – deixam a vegetação brotar de novo, o que chamam de “encapoeiramento” – para repetir o processo após três ou cinco anos. A falta de espaço, porém, impedia José Lourenço de fazer as rotações. Segundo Siebra, o beato “só plantava abaixo da ‘coroa da serra’, e apenas em um trecho por ano, passando depois para outro. Como a cobertura vegetal da coroa permanecia intacta, quando chovia as sementes eram dispersadas de cima para baixo. Dessa maneira, utilizando a força da gravidade, a área encapoeirava mais rápido que um terreno plano”. Com esse manejo agrícola, somado à criação de peixes e de gado, as quase duas mil bocas da irmandade não sentiam falta de comida. (Trecho da matéria Sopro de liberdade - A tragédia de uma utopia de igualdade e autossuficiência) Revista Problemas Brasileiros, nº 370, julho/agosto 2005, editada pelo Sesc/SP.)
SOS Direitos Humanos – 1.000 mortos
Ação Civil para achar cova coletiva na Serra do Araripe
Integrantes da irmandade mortos após ataque
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ação criminosa contra a comunidade de camponeses do Sítio Santa Cruz do Deserto foi efetivada de diversas formas, desde bombardeios aéreos e no solo, à utilização de fuzis, revólveres, pistolas, facas e facões contra mulheres, crianças, idosos, doentes e a tantas outras vítimas da ação ensandecida das forças do Exército e da Polícia Militar do Ceará no ano de 1937. Uma ação caracterizada pela legislação brasileira e pelos Acordos e Convenções Internacionais como crime de Lesa Humanidade / Genocídio / Crime contra a Humanidade. Portanto, considerado imprescritível. Com base nisso, a ONG SOS – Direitos Humanos, com sede em Fortaleza, ajuizou em 2008 uma Ação Civil Pública na Justiça Federal contra a União Federal e o Estado do Ceará, requerendo a localização exata da cova coletiva onde foram enterrados os corpos dos camponeses católicos assassinados em 1937. Pelas informa-
ções populares, a vala fica localizada em cima da Serra do Araripe, nos arredores de um lugar conhecido como Mata dos Cavalos. De acordo com o presidente da SOS – Direitos Humanos, Otoniel Ajala Dourado, paira uma dúvida sobre as razões pelas quais as autoridades não procurem a cova coletiva. Em nota enviada à redação da NE VinteUm, há a seguinte indagação: “Seria descaso ou discriminação por serem ‘meros nordestinos católicos’?” O texto comenta ainda que a Universidade Regional do Cariri (Urca) poderia utilizar tecnologia avançada e pessoal qualificado, para, através da Pró-Reitoria de Pós Graduação e Pesquisa (Prpgp), do Grupo de Pesquisa Chapada do Araripe (Gpca) e do Laboratório de Pesquisa Paleontológica (Lppu), encontrar a cova. Ainda conforme o texto, a Universidade Federal do Ceará (UFC), no início de 2009, enviou pessoal para auxiliar nas buscas dos restos dos corpos dos guerrilheiros mortos no Araguaia, esquecendo-se de procurar na Chapada do Araripe, interior do Ceará, uma cova com 1.000 camponeses. Diante disso, a ONG realiza uma campanha com base na Ação Civil, para que o crime do Caldeirão não seja esquecido e que as vítimas sejam, enfim, enterradas com dignidade. “Para que as vítimas ou descendentes do massacre sejam beneficiadas pela ação, devem entrar em contato com a SOS - Direitos Humanos para fornecerem por escrito e em vídeo seus depoimentos sobre o período em que participaram da comunidade do Caldeirão, sobre como escaparam da ação militar, e informações relevantes sobre o evento”, ressalta Otoniel Ajala Dourado. Mais informações pelo telefone (85) 8613.1197, ou através do site www.sosdireitoshumanos.org.br
Seria descaso ou discriminação por serem ‘meros nordestinos católicos’? presidente da SOS – Direitos Humanos, Otoniel Ajala Dourado
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CAPA
Gilberto Freyre
“De Menino a Homem” O anarquista construtivo vai mobilizar Paraty (Flip) em 2010 O ano de 2010 será marcante para a memória e obra de Gilberto Freyre. Em agosto, o pernambucano que revolucionou o estudo da Sociologia e da Antropologia em escala mundial figura como principal homenageado do evento literário brasileiro de maior prestígio no exterior, a Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), no Rio de Janeiro. Antes, em julho, será lançada uma obra inédita, De Menino a Homem, pela Global Editora. Conjunto de reflexões biográficas, o livro se coloca como uma continuação de Tempo Morto e Outros Tempos, publicado pela primeira vez em 1975, que traz as memórias do autor entre os anos de 1915 e 1930. A nova publicação, que permaneceu por vários anos na Fundação Gilberto Freyre (FGF), no Recife, compreende o período do ano da revolução que levou Getúlio Vargas ao poder pela primeira vez até 1984, três anos antes da morte do sociólogo
Por Marcel Bezerra marcel@editoraassare.com.br Ilustração: Marcos Aurélio
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mbora o contrato entre a Fundação Gilberto Freyre e a Global Editora não permita um adiantamento mais denso do novo lançamento, há algum tempo os críticos, estudiosos e admiradores da obra do autor já têm alguma ideia do que virá. Entre as passagens principais, está o relato que Freyre faz da elaboração e lançamento de um de seus três clássicos mais importantes, Casa Grande & Senzala, ocorrido em 1933 – os outros são Sobrados e Mucambos (1936) e Ordem e Progresso (1959). 42
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Considerado uma “redescoberta” da nação brasileira, Casa Grande & Senzala foi lançado após a experiência de Gilberto no exílio devido à Revolução de 1930. Trata-se na primeira parte de uma vasta obra sobre a sociedade patriarcal no Brasil. Tida por gente da categoria de um Darcy Ribeiro como “uma espécie de fundação do Brasil” no plano cultural. A própria relação tumultuada de Gilberto com Getúlio Vargas, cujo episódio maior se deu com o convite – declinado – do ditador a Freyre para ser ministro da Agricultura, também está na nova publicação. “Ele já percebia o declínio político de Vargas e não aceitou o convite”, comentou há cerca de dois anos, no Jornal do Commercio, Gustavo Henrique Tuna, especialista na obra freyreana e um dos responsáveis pela preparação da edição. Segundo Gilberto Freyre Neto, superintendente da FGF e um dos poucos privilegiados por já ter lido o livro, nas andanças da memória, o avô escreve sobre atos e fatos acontecidos durante a vida. “É um livro interessante, porque vai desmistificar alguma coisa pautada, criada por ele mesmo em livros anteriores e interpretadas de uma forma, e que ele, com o humor que lhe era peculiar, não desmentiu. Agora, no livro, ele explica melhor. São construções e desconstruções de imaginários, o que é a cara de Gilberto Freyre”, interpreta. Gilberto Neto considera que De Menino a Homem será ainda mais interessante para quem leu o primeiro livro de memórias do autor. “Quem leu Tempo Morto e Outros Tempos vai perceber que as interpretações podem ser diferentes. Na hora que você completa com a leitura do segundo livro, pode ter uma visão diferente de como o fato que ele citou no primeiro ocorreu”. Seriam, então, retificações? Ao que Gilberto Neto, ressalva, atiçando curiosidades: “Não vou dizer que muda, mas reforça muita coisa na vida de Gilberto que os críticos vão adorar”. Em antológica entrevista à revista Playboy, quando chegou aos 80 anos, Gilberto Freyre disse: “Eu temo ser considerado um bonzinho que agrada a todo mundo, um convencional que não arrepia nenhuma convenção. Creio que quem tem atitudes precisa se conformar com o fato de desagradar a alguns”. Não é preciso ser profundo conhecedor da personalidade e da produção
intelectual dele para deduzir que sua história foi permeada de polêmicas, muitas vezes, até por ele próprio fomentadas e protagonizadas. “Certamente, vai ser possível perceber como Gilberto se divertiu com a crítica em relação a essa obra, as passagens da vida dele”, coloca Gilberto Neto. Outro trecho polêmico do novo livro diz respeito ao plano pessoal. De acordo com matéria do jornal Folha de S. Paulo, Gilberto conta passagens curiosas, como um caso homossexual que teve na Alemanha, nos anos 1920. Além disso, Tuna se referiu também a “um encontro com uma ‘loirinha germanicamente loira’. Sem qualquer alarde”. Essas particularidades do novo li-
vro já foram inclusive comentadas pela filha de Freyre, Sônia, também no Jornal do Commercio. “É claro que para um filho ler sobre isso é meio chocante. Mas, se ele próprio assinou embaixo, se contou ter feito o que fez, não sou eu que vou desmenti-lo”, disse em 2007, ao acrescentar que “é comum que os filhos não pensem sobre a vida sexual dos pais. Muito menos sobre aspectos menos convencionais”. Na mesma entrevista à Playboy, o próprio Gilberto explicou a experiência. “Você pode imaginar alguém como eu, interessado em tudo o que é humano... e, portanto, tive a curiosidade de ver o que era o amor não heterossexual, umas poucas e não satisfatórias aventuras”.
“Um quase polItico” À margem de tudo, uma ótica pessoal dos cenários e da gestao do Estado
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ilberto Freyre se proclamava um “anarquista construtivo”, uma forma interessante como se colocava, segundo o neto. “Era porque ele tinha uma ótica pessoal em relação ao Estado, ao governo, a coisas desse tipo, à forma como o poder é representado, é emanado. Então, o anarquista construtivo é um pouco isso, uma forma de você se colocar à margem para poder analisar melhor o cenário político, da gestão do Estado, da gestão de todos os processos que o Estado coloca”, explica o superintendente geral da FGF, ao deixar escapar que esse aspecto não é abordado com tanta profundidade pelo autor no livro. O viés político de Gilberto Freyre, aliás, é pouco trabalhado, especialmente no Brasil, na visão de Gilberto Neto. “Seria um desafio grande para qualquer crítico da obra dele tentar trabalhar isso. Acho que é um mundo a ser descoberto. Ele teve uma participação política interessante, e que precisa ser descoberta”, sugere, ao contrapor que a fase “é pouco retratada por ele mesmo, que não considerou uma passagem gratificante. Foi muito dura”, recorda. Por outro lado, o novo livro não cita o regime militar nem sua posição simpática aos militares na década de 70, o que lhe custou, segundo a Folha, muitos desafetos na academia brasileira. Embora se denominasse um “quase político”, Freyre elegeu-se deputado federal em 1946, foi constituinte e teve uma intensa atividade
parlamentar, notadamente no campo da intelectualidade. Proferiu palestras e conferências, chegando a ter seu nome indicado para o Prêmio Nobel de Literatura. Naquele período, participou em Paris, do Conclave dos Oito Sábios do Mundo, sendo ele um dos citados na lista, o único sul-americano presente a esse nível. Também delegado parlamentar do Brasil junto à 4ª Conferência Internacional da ONU em Nova Iorque, Gilberto teve na proposta e luta pela criação do Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais – hoje fundação (Fundaj) – o marco principal de sua atuação. De acordo com a matéria da Folha, Gustavo Henrique Tuna coloca que De Menino a Homem, de certa forma, “humaniza” a figura de Gilberto Freyre. Para quem é da família, essa noção é fruto de uma concepção não totalizante sobre o escritor. “Poucos são os críticos que conseguem penetrar e tomar como base a visão de que Gilberto foi uma pessoa, e como pessoa ele tem virtudes e pecados . Em cima disso, cunhou uma obra que é a percepção sua em relação a um país em construção, um país que estava buscando sua identidade. Se humaniza ou se não humaniza, eu prefiro ficar à margem da discussão”, diz Neto, que tinha 13 anos quando o avô faleceu. “Minha vida com Gilberto foi uma vida de avô para neto. Falar de humanizar Gilberto Freyre... Bom, eu só conheci o lado humano dele”, complementa. Novembro/Dezembro n 2009
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Flip 2010
Brasil em efervescencia justa homenagem
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momento vivido pelo Brasil foi o mote principal para a escolha de Gilberto Freyre como personagem a ser homenageado pela Flip em 2010, ano do 110º aniversário de nascimento do autor. “A idéia é trazer para o primeiro plano o debate sobre os rumos do Brasil. A tentativa de fixar uma ‘identidade brasileira’, a volta do ufanismo nesses últimos anos de era Lula, as aspirações de protagonismo do país no cenário internacional. Todos esses temas me parecem dignos de discussão no âmbito dessa homenagem”, justifica o diretor de programação da festa, Flávio Moura. Em sua oitava edição ano que vem, a Flip já homenageou expoentes das letras brasileiras, como Vinicius de Moraes, João Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Jorge Amado, Nelson Rodrigues, Machado de Assis e Manuel Bandeira. Em 2008, ano do centenário da morte de Machado de Assis (1839-1908), a Flip presta homenagem ao grande escritor carioca. Desde o centenário de Gilberto Freyre, em 2000, o debate sobre o autor e sua obra ganharam maior movimentação. “A homenagem da Flip é mais uma ação nesse cenário bem mais amplo de recuperação e reavaliação de seu legado”, julga o diretor. Para Gilberto Neto, por ser um festival popular que aproxima autores e público, a Flip com o tema Gilberto Freyre pode contribuir para desmistificar concepções acerca da sua produção intelectual. “Notadamente, sua obra é colocada como elitista, ou seja, poucas pessoas tem acesso a ela. Mas, tem deficiência nesse acesso simplesmente porque existe, posso dizer, um certo preconceito em relação a Gilberto Freyre, porque se conhece pouco da obra dele no Brasil. Isso é uma grande verdade”, argumenta.
A riqueza de uma existência em livros, acervos e títulos A produção de Freyre é vasta. São mais de 80 livros publicados, inúmeros artigos, discursos, palestras, poesias, prefácios, um acervo que conta com uma biblioteca pessoal de mais de 42 mil títulos – maior biblioteca privada do Brasil, segundo Neto –, mais de oito mil fotografias, dez mil correspondências e um imenso arquivo com recortes de jornal que guardam grande parte de uma das trajetórias mais ricas que um ser humano possa ter tido. Por mais de sete décadas, sua obra tem sido analisada, discutida e criticada, sobretudo como teoria da formação da sociedade brasileira e na compreensão e interpretação de sua realidade social. Ela lhe rendeu diversas láureas e reconhecimento pelo mundo, como os títulos de doutor Honoris Causa pela Sorbonne (Paris) e pelas universidades de Münster (Alemanha) e Sussex (Inglaterra). Em 1971, recebeu, da rainha Elizabeth II, o título de Sir. Muitas de suas obras foram publicadas no exterior. Gilberto Neto acrescenta ainda Nordeste (1937) e Assucar (1939) ao rol das cinco obras fundamentais da lavra de Gilberto Freyre. Mas, outras como Um Engenheiro Francês no Brasil (1940), Região e Tradição (1941), Sociologia (1945), Aventura e Rotina (1953), Guia Prático, Histórico e Sentimental da Cidade do Recife (1934), Além do Apenas Moderno (1973) e Tempo Morto e Outros Tempos (1975), “retratam a terra, a vida, as coisas, os animais e os fatos do cotidiano de luta pela organização de uma civilização nos trópicos”, diz o site da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj).
Precursor do que seja “Patrimônio Imaterial” Inovacoes pelos metodos e avaliacao
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s métodos de avaliação de Gilberto Freyre revolucionaram o estudo da sociologia e da antropologia ao introduzir confrontos com muitas formas até então vigentes. Apesar de muito debatido, criticado e não unânime, seu trabalho é referência para a compreensão do Brasil, na visão de Fernando Henrique Cardoso. Na sua interpretação de país, Gilberto Freyre advertia, já em 1947, que “a inteira subordinação de diferenças históricas e geográficas a um rígido ideal de uniformidade levaria a uma forma de unidade estreita demais para um continente cultural tão complexo como o Brasil”. “Ele foi o precursor do conceito de patrimônio imaterial, conceito este que se concretizou com enorme sucesso”, afirmou Antonio Carlos Sartini, superintendente-executivo do Museu da Língua Portuguesa, no site da Fundação Gilberto Freyre. “Outra contribuição da obra de Freyre foi a tentativa de
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desmistificar a noção de determinação racial na formação de um povo, apontando a miscigenação conferida no país como elemento positivo. Em Casa-Grande, o papel de índios e negros na formação do povo brasileiro é valorizado de forma praticamente inédita”, escreveu a jornalista Rosane Araújo. “Gilberto Freyre escreveu livros sobre moda, gastronomia, imaginário, assombrações, turismo. O primeiro guia turístico brasileiro é dele. Então, você tem aí uma série de informações da vida e da obra de Gilberto que um festival literário como a Flip certamente vai abrir, do ponto de vista da abrangência, espaços para discussões das mais sinceras em relação à obra dele”, antevê Gilberto Neto. Na sua concepção é a obra de Gilberto Freyre “que cria métodos para analisar as diferenças e mostrar que existe um caminho que foi percorrido pelo Brasil para se criar a identidade nacional, inclusive muito pacífico”.
Personalidade internacional em grandes centros acadEmicos
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importância internacional de Gilberto Freyre pode ser medida com dois exemplos citados por seu neto, que esteve recentemente nos Estados Unidos e na Inglaterra. No primeiro participou de debate sobre o avô na conferência Brazil and the Future (O Brasil e o Futuro), realizada em parceria entre a Columbia University de Nova Iorque, o Jornal do Brasil e a Casa Brasil. Já na Inglaterra, Gilberto Neto esteve na King’s College, que com a colaboração da Embaixada do Brasil em Londres, promoveu a “Semana Gilberto Freyre”, onde cerca de dez
pensadores de língua inglesa, de universidades como Cambridge, do próprio King’s College e da Universidade da Flórida (EUA), catedráticos sobre o Brasil e a América Latina, por exemplo, debateram a obra do brasileiro. “E o organizador disso: Peter Burke, hoje, em nível global, talvez o mais importante historiador inglês de todos os tempos”, aponta. Professor aposentado recentemente da Universidade de Cambridge, Burke, casado com a brasileira Maria Lúcia Tavares, é hoje um dos grandes escritores em língua inglesa sobre a vida do pernambucano. Juntos, eles
lançaram Gilberto Freyre: Social Theory in the Tropics. “Ele fez uma comparação da vida de Gilberto Freyre para os ingleses conhecerem esse pensador brasileiro”, detalha Neto. Em entrevista ao Jornal do Commercio no ano passado, o inglês disse que sua missão é divulgar o sociólogo. Gilberto Freyre Neto, superintendente da FGF
Fundacao preserva memOria e obra do escritor
Fundação Gilberto Freyre: funciona na casa onde residia o sociólogo e escritor, em Apipucos, Recife
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ilberto Freyre nasceu no Recife (PE), em 1900. Iniciou seus estudos no Colégio Americano Gilreath e completou a sua formação nos Estados Unidos, onde freqüentou as universidades de Baylor (Texas) e
Columbia (Nova York). Retornou ao Recife em 1923, passando a residir posteriormente em Apipucos, antigo bairro da capital pernambucana, onde exerceu diversas atividades no âmbito da cultura e do ensino no Brasil e no exterior.
Ocupou o cargo de deputado federal (1946-1950), quando criou o Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais. Dedicou-se aos estudos sobre cultura e sociedade brasileiras, organizou congressos e realizou diversas conferências. Pouco antes de falecer, em 1987, preocupado com a manutenção e difusão de seu legado, o sociólogo criou na Vivenda Santo Antonio de Apipucos, a fundação que leva seu nome. “Uma Fundação que não apenas reunisse o seu patrimônio cultural, seus bens e acervos, mas que também pudesse estimular a continuidade dos seus estudos e de suas idéias, voltados para a compreensão e interpretação da realidade social brasileira”, como diz o site da instituição, que abriga ainda a Biblioteca Virtual Gilberto Freyre (bvgf.fgf.org.br), onde estão diversas informações sobre sua trajetória e obra. Novembro/Dezembro n 2009
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redacao@nordestevinteum.com.br
Conterrâneos, a revista de quem é do Banco do Nordeste Dirigida a funcionários e aposentados do Banco do Nordeste, a revista Conterrâneos, editada pelo Ambiente de Comunicação do BNB desde julho de 2006, fechou o ano com uma novidade para seu público. Na edição n.º 21, novembro/dezembro de 2009, a publicação brindou seus leitores com o papercraft de um presépio, símbolo da cristandade transformado em presente para a família benebeana. Com linguagem leve e bom espaço iconográfico, a revista aborda temas de interesse geral, mas procurando sempre um link com a realidade e o universo dos colaboradores, assim como assuntos sobre o Nordeste do país. Nesse aspecto,“a revista de quem é do Banco do Nordeste”aproveita a chegada das férias escolares e faz, na última edição deste ano, um passeio por Jericoacoara, pelo Delta do Parnaíba e pelos Lençóis Maranhenses, mostrando a“rota das emoções”, um dos maiores potenciais turísticos da Região. Impressa totalmente em papel reciclado e produzida pela equipe de comunicação do Banco, a Conterrâneos tornou-se relevante instrumento de comunicação da organização, dando visibilidade ainda a projetos culturais apoiados pela Instituição. Um exemplo é a pesquisa sobre o cofo patrocinada pelo Programa BNB de Cultura. O tradicional artesanato utilizado por muitas comunidades do Maranhão, transformado em elemento decorativo ou instrumento para acondicionar ou comercializar diferentes artigos, tem 40 tipos e modelos variados.
Ai de ti, cultura!
MIS do Ceará à base de SOS dos Amigos A quantas anda a política cultural do Estado do Ceará? Pergunta sempre incômoda e oportuna que se impõe, por exemplo, quando se tem notícia das dificuldades de financiamento às ações do Museu da Imagem e do Som (MIS-CE). Em 2010, a instituição comemora 30 anos de existência. E, como diria Ariano Suassuna,“não adianta ficar com cara de jumento olhando pra uma igreja”, o jeito foi formar um Conselho Curador para o museu com profissionais e acadêmicos que atuam nas diversas áreas do acervo. Gente de rádio, televisão, jornal e instituições de memória e patrimônio, acadêmicos de História, Antropologia, Comunicação, Sociologia e Arquitetura. Primeira missão: fundar uma Associação de Amigos, entidade sem fins lucrativos, com perspectiva plural e inclusiva, que pudesse angariar recursos para o MIS através de patrocínios, apoios, doações, venda de souvenires, entre outros. Hoje, o museu sofre com problemas de espaço e de indefinição do perfil institucional, de formação profissional e de condições para a preservação de seu grande acervo. A eleição da primeira diretoria da Associação aconteceu no último dia 8 de dezembro na atual sede do MIS, situada na avenida Barão de Studart, 410, um dos pontos mais tradicionais de Fortaleza. A casa que hoje o abriga foi projetada pelo arquiteto José Barros Maia (Mainha) para ser residência do senador Fausto Augusto Borges Cabral, sendo inaugurada em novembro de 1951.
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AGÊNCIA ESTADO
CINEMA ENVOLVIDO PELO SUCESSO DA BIOGRAFIA DE LIRA NETO “O livro (Padre Cícero - Poder, Fé e Guerra no Sertão, de Lira Neto), envolvente e detalhista, já entrou nas listas dos mais vendidos deste final de ano e seu ritmo chamou a atenção do cinema. A produtora brasileira RT/features comprou os direitos para a tela grande e o diretor será Sérgio Machado (de Cidade Baixa). A obra chega em momento chave do processo de reabilitação histórico-eclesial do padre pelo Vaticano, conforme afirmou à reportagem o bispo italiano Fernando Panico, da Diocese do Crato. Cícero foi alvo de um tumultuado processo eclesiástico, que resultou em sua suspensão das ordens sacerdotais e, mais tarde, em um decreto de excomunhão do Santo Ofício, em Roma. À época, ele foi acusado de desobediência e de insubordinação pela alta cúpula do clero. Morreu proscrito pela Igreja, aos 90 anos. Para Lira Neto, a reabilitação canônica do Padre Cícero precisa ser compreendida dentro do contexto da ‘guerra santa’ entre católicos e neopentecostais. ‘A Igreja, tardiamente, percebeu que o fenômeno Padre Cícero é forte demais para ser combatido ou esquecido.’ O historiador americano Ralph della Cava (autor de ‘Milagre em Joaseiro’, primeira obra fundamental sobre o religioso, publicada nos anos 70) diz que, ao contrário de Canudos, que teve a sorte de ter um grande historiador debruçado sobre o tema (José Calasans), sempre houve pouca produção acadêmica e literária sobre o Padre Cícero. Para Lira Neto, essa situação começou a mudar há duas décadas. ‘O próprio livro de Ralph abriu caminho para uma vasta produção subsequente, o que demonstra que não há qualquer preconceito intelectual quanto ao personagem. Longe disso. O problema é que essa bibliografia ficou restrita, de modo geral, ao interior dos muros das universidades, sem conseguir provocar um diálogo efetivo com um público mais amplo.’ (Jotabê Medeiros -Agência Estado)
PARA A ESTANTE “Conselheiro do Sertão”
A SABEDORIA DO PADRE CÍCERO, POR DANIEL WALKER Uma obra que reúne textos sobre o Padre Cícero como resultado de pesquisas que em 2009 completam exatos 40 anos. Onde se percebe o quanto avançaram os estudos e as investigações sobre o grande personagem, desenvolvidos por historiadores locais e de fora, em iniciativa própria ou a serviço de alguma instituição acadêmica. Com Padre Cícero, A Sabedoria do Conselheiro do Sertão, o historiador, biólogo, jornalista e escritor Daniel Walker busca esclarecer que, ao contrário de opiniões propagadas por muitos escritores, de fato, Cícero Romão Batista era um homem de estudo e dotado de extraordinária sabedoria. Um excelente conselheiro para os seus milhares de afilhados e admiradores. Na parte Entrevista-biográfica Daniel lança mão de um curioso recurso jornalístico conhecido como entrevista-montagem, na qual o entrevistado responde a perguntas a partir de textos por ele mesmo produzidos. O conteúdo das respostas foi extraído das cartas escritas pelo padre e do seu testamento, obedecendo-se à
originalidade dos textos. Uma espécie de Padre Cícero por ele mesmo. É, portanto, sua autobiografia. O livro traz também uma biografia já publicada por Daniel, mas agora revisada e ampliada. Ali, dois assuntos mereceram atenção especial: a visita de Lampião a Juazeiro, oportunidade em que ele se encontrou com o padre e lá recebeu a famigerada patente de Capitão; e a questão do milagre da hóstia. A polêmica da patente ao cangaceiro é retratada em versão nova, pouco divulgada. Quanto à questão do milagre, mais detalhes foram acrescentados. O livro pode ser comprado pela internet através de depósito bancário no valor de R$ 20,00 (já incluída a despesa de Correio) conforme os seguintes dados: Conta para depósito - Banco do Brasil / Conta Corrente nº 6852-7 Agência: 1598-9 – Bradesco / Conta Corrente nº 10072-2 / Agência: 692. Contato com o autor através do e-mail: danielwalker@oi.com.br
imigrantes
BERNADETE BESERRA E OUTRAS POSSIBILIDADES DE SER BRASILEIRO Publicado primeiramente nos Estados Unidos, o livro Brasileiros nos Estados Unidos: Hollywood e outros sonhos tem como foco a imigração brasileira na terra do “Tio Sam”. Escrito pela pesquisadora da Universidade Federal do Ceará (UFC), Bernadete Beserra, a obra conta em 275 páginas “as diversas formas como os brasileiros se enredam no empreendimento de visitar ou migrar para os Estados Unidos”. As dificuldades e desafios que os imigrantes brasileiros enfrentam na adaptação ao país e as dúvidas sobre voltar ou não à pátria são pontos apresentados ao leitor por meio de trechos e entrevistas instigantes e reveladoras. Uma profunda viagem sobre a imigração num mundo que se diz “global”. Segundo o professor Ruben George Oliven, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, “à medida em que analisa a relação entre globalização, fronteiras nacionais e imigração, Bernandete nos permite lançar um olhar para o imigrante, menos como um outro estranho e mais como um de nós que sonha e tenta sobreviver num mundo cada vez mais complexo”.
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HISTÓRIA Comissão Científica de Exploração – Sesquicentenário – Ceará
Por Marcel Bezerra / marcel@editoraassare.com.br
urante dois anos e meio, entre 1859 e 1861, o Ceará foi palco de um dos mais controvertidos episódios do Brasil Imperial (1822-1889). Embora muitas vezes ignorada por historiadores e por estudiosos locais e regionais, a Comissão Científica de Exploração constitui capítulo importante da história de um Brasil “de ciência balbuciante, sem modelo e tradição”, conforme afirma o professor Renato Braga em seu livro História da Comissão Científica de Exploração, lançado pela primeira vez em 1962 e reeditado em 2004 pelas Edições Demócrito Rocha. A Comissão Científica de Exploração foi criada pelo governo imperial no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (Ihgb) em 1856. Incumbida de organizar uma expedição às províncias do “Norte”, a comissão tinha o objetivo de “conhecer o interior do 48
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território e suas riquezas, coletar material para o Museu Nacional e promover a pesquisa científica no País”, como coloca a professora Maria Sylvia Porto Alegre em Comissão das Borboletas – A ciência do império entre o Ceará e a corte (Museu do Ceará/Secult, 2003). Oficialmente batizada de “Imperial Comissão Científica” e “Comissão Exploradora das Províncias do Norte”, decidiu iniciar seus trabalhos percorrendo a então província do Ceará. Em seu livro, Sylvia Porto Alegre afirma que “a história da expedição ao Ceará foi bastante conturbada, gerou críticas veementes da imprensa, acusações políticas ao governo, desentendimentos entre os membros componentes da comissão e conflitos com os grupos locais. Os incidentes da viagem foram amplamente explorados.
que era um plano otimista no início foi se transformando, paulatinamente, em ambiente negativo e, finalmente, hostil”. Segundo Sylvia Porto Alegre, a comissão acabou sendo alvo de anedotário e chacotas, e chegou a ser apelidada de “Comissão das borboletas” e “Comissão defloradora”. O fato também foi explorado politicamente pelos opositores ao governo Imperial de Dom Pedro II, que nela não viam proveito concreto e acusaram de ser apenas “mais uma forma de desperdício dos recursos públicos”. O professor Renato Braga, hoje falecido, considera em seu trabalho que a comissão “viveu e se foi sem quase deixar rastros de sua existência”, não passando de um belo plano frustrado em suas esperanças, apesar da generosidade da ideia. Por outro lado, Sylvia Porto Alegre observa que um exame mais acurado do episódio atenua o malogro. “Ela representou, na verdade, um momento importante de transição, revelador das inquietações nacionalistas que caracte-
rizaram o período de consolidação do Estado Imperial, assim como ponto de inflexão significativo na gestação do pensamento científico no Brasil”, pontua. De fato, conhecer a história da Comissão Científica implica necessariamente entender o contexto histórico e político do Brasil de então. O século XIX caracterizou-se como época de profundas mudanças no país. Naquela metade de século, o Brasil já havia visto a chegada da família real portuguesa em 1808 e seu retorno em 1821. No ano seguinte, nos tornávamos independentes de Portugal. A partir de então, tinha início o Primeiro Reinado, que durou até Dom Pedro I abdicar ao trono em favor do filho, Dom Pedro II, dando início ao Segundo Reinado e ao Período Regencial, este um dos mais conturbados da história do país, marcado por crise econômica, instabilidade política e revoltas por todo o território. De acordo com Sylvia Porto Alegre, em meados do século XIX, estava em curso, no Brasil, um projeto científico e cultural
alicerçado em torno do regime monárquico, “ansioso por fortalecerse internamente e projetar, alémfronteiras, a imagem de um país promissor”. O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (Ihgb) havia sido fundado em 1838. À sua sombra, como conta Renato Braga, foram-se acolhendo as figuras mais expressivas da cultura literária, artística e científica do país, o que deu ao Ihgb fisionomia amplamente generalizada, mas sem prejuízo do setor historiográfico. Após uma primeira década acanhada apesar dos esforços de seus fundadores, o Ihgb vê outros ventos lhe soprarem através de um patronato especial. “A partir de 15 de dezembro de 1849, o Imperador abre as portas do Paço às sessões do instituto e desce do trono para presidir regularmente os trabalhos”, conta Braga.
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ntitulado protetor do instituto, Dom Pedro II chegou a comandar mais de 500 sessões, incentivou e financiou pesquisas, fez doações valiosas e até tomou parte em debates, além de ceder sala no Paço Imperial para sede. Estimulado pelo patrocínio régio, o Ihgb se projetou como instituição nacional, e virou uma espécie de centro polarizador das atividades intelectuais do império, “notadamente no que toca aos estudos brasileiros”, ressalta o autor. Foi exatamente no Ihgb que nasceu e proliferou a ideia de uma expedição nacional, que mais tarde viraria a Comissão Científica de Exploração. Após épocas conturbadas,
o começo de 1859, Dom Pedro II anunciou a intenção de materializar ações para promover melhoramentos nas províncias do Império. Ele próprio resolveu visitar as regiões mais distantes, sendo recebido com festa, em outubro, no Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Alagoas, Paraíba e Pernambuco. Meses antes – em fevereiro – outra comitiva havia partido rumo ao Norte. A Comissão Científica de Exploração, como foi denominada,
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Dom Pedro II em 1851. Retrato de João Maximiano Mafra
Aracati
o Brasil Imperial passou a uma fase de consolidação. “Os principais expoentes da nossa cultura letrada empenhavam-se na busca das origens da brasilidade, no autoconhecimento da história e do território, enquanto a ciência ocupava-se em descrever, catalogar e classificar os recursos da natureza, as riquezas do solo e do subsolo, as populações, o desenvolvimento moral e material. O progresso estava na ordem do dia”, afirma Sylvia Porto Alegre. Nesse clima de otimismo, avalia Renato Braga, “impunha-se à dignidade nacional também colaborar no reconhecimento científico da pátria. Daí a receptividade do projeto e as fundadas esperanças nas investigações programadas”.
precisou de três anos para se preparar. Apesar da rápida acolhida que teve a ideia do Império em “nomear uma comissão de engenheiros e naturalistas que explorem o interior de algumas províncias, devendo fazer coleções de produtos naturais para o Museu Nacional, e para os das províncias”, como atesta a Lei nº 884 – que fixava a despesa para o exercício financeiro de 1857-1858. Mas, esse desejo de explorar o interior do Brasil não surgiu de
repente. Desde a chegada da corte portuguesa ao Rio de Janeiro, muitos viajantes estrangeiros se propuseram a desbravar intensa e continuamente o território brasileiro. Estimulados pelo próprio Estado, que, ao dar guarida e incentivo às expedições, ia ao encontro das instituições científicas e museológicas que se multiplicavam nos centros europeus como fruto da ilustração. “Entre 1808 e 1840, o governo Imperial patrocinou o estabelecimento de várias instituições ligadas à cultura, às ciências e às artes no Rio de Janeiro, como a Imprensa Régia, a Biblioteca Real, o Jardim Botânico, a Academia Real de Belas Artes, o Real Arquivo Militar, a Academia Médico Cirúrgica, o Conservatório Dramático, a Academia de Ópera Lírica, o Museu Nacional e o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro”, destaca Sylvia Porto Alegre.
O IHGB resolveu dividir os trabalhos pertinentes à Comissão em cinco seções, e indicou ao titular da pasta do Império as pessoas que deveriam chefiá-la. Todas membros do instituto. Francisco Freire Alemão, também presidente da comissão, ficou encarregado da seção Botânica; Guilherme Schüch de Capanema, da Geológica e Mineralógica; Manuel Ferreira Lagos, da Zoológica; Giacomo Raja Gabaglia, da Astronômica e Geográfica; e Antônio Gonçalves Dias, da Etnográfica e Narrativa da Viagem. Como desenhista da expedição, o pintor José dos Reis Carvalho acompanhou o grupo, além dos diversos auxiliares. Sylvia Porto Alegre destaca ainda que esta foi a primeira expedição científica formada exclusivamente por brasileiros. Antônio Gonçalves Dias
iante a perspectiva de enfrentar longa viagem – por terra e por água – através de sertões carentes de tudo, os membros da Comissão Científica, mesmo não tendo estabelecido ainda o itinerário, trataram de equipá-la. O material foi selecionado com acuidade, e abrangia itens de acampamento, farmácia, transporte, defesa, instrumental adequado às seções e bibliográfico. Para este último, foram
adquiridos mais de mil livros que continham conhecimentos sobre geologia, botânica e zoologia brasileiras, todos ainda desconhecidos das bibliotecas do Rio de Janeiro – e que mais tarde iriam compor o acervo da Biblioteca do Museu Nacional. Os aparelhos vieram das melhores firmas francesas, inglesas, alemãs e austríacas, e em alguns casos, a demora da chegada destes foi responsável, em parte, pelo
atraso da partida da comissão. Embora mais tarde os resultados não tenham atingido o patamar planejado, a Comissão de Exploração tentou justificar seus propósitos baseada nos princípios dominantes da época, impregnada tanto pelo nacionalismo romântico como pela ideologia do progresso material, através da ciência e da técnica, pela valorização da racionalidade no estudo da realidade.
Lugar chamado Fortaleza em Sobral
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enato Braga revela que aos “científicos” caberia também coletar “tudo quanto possa servir de prova do estado de civilização, indústria, usos e costumes dos nossos indígenas”, assim como recuperar as tradições orais e populares, para as quais deviam estar atentos os membros da seção de etnologia. Também, na visão de Sylvia Porto Alegre, havia a expectativa de que o estudo dos hábitos sociais e do temperamento individual revelasse a propensão ao trabalho. Pois “o ocioso tem atitudes bem diferentes do trabalhador”, diz Renato Braga. “Em um período de desagregação do trabalho escravo, logo após a proibição do tráfico de africanos, o debate em torno do trabalho livre fazia-se sentir. A ciência ‘a serviço da civilização’ colaborava com as classes dominantes para aumentar a oferta de mão de obra e o sistema produtivo” afirma a pesquisadora. Ao mesmo tempo, ela interpreta que entrava novamente em foco a velha ideologia de combate à “ociosidade” do índio e do caboclo, “tão profundamente enraizada no pensamento social brasileiro e nas relações de trabalho, desde os tempos coloniais”. Nos itens referentes à investigação lingüística, acrescenta a professora, propunha-se a elaboração de gramáticas para as línguas ainda não conhecidas e dicionários para as conhecidas, bem como tabelas comparativas entre as várias línguas indígenas.
esmo não tendo sido feita logo de início, a escolha do Ceará como província a ser explorada não se guiou por princípios, digamos, patrióticos.
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“Preferiram o Ceará por causa das suas supostas riquezas minerais”, decreta Renato Braga em seu livro, baseado na observação de amostras de minérios de fer-
ro e carvão, abundantes no solo, colecionadas nos mostruários do Museu Nacional. O regimento aprovado pelo ministro do Império, Sérgio Teixeira
de Macedo, é claro: “Se, porventura, a Comissão descobrir alguma mina, cuja exploração seja vantajosa para o estado, com o maior segredo, sendo possível, expedirá logo para esta corte um portador seguro, dando conta da descoberta, acompanhada de todas as informações que julgar necessárias, e fará ao Presidente da Província as participações convenientes a tal respeito”. O vapor Tocantins com a Comissão Científica de Exploração deixou o Rio de Janeiro no final do primeiro mês de 1859 rumo a Fortaleza, então uma cidadezinha de 15 a 16 mil moradores. “Contava pouco mais de 800 casas de tijolos, das quais 60 assobradadas, raras, porém, as de dois andares. Na sua maioria, eram casas pequenas, baixas, escuras, de beira e bica, aconchegadas umas às outras por medida de economia”, descreve Renato Braga em seu livro, ao acrescer os cerca de 1.600 casebres de palha situados nos arredores do riacho Pajeú, “onde vegetavam dois terços da população de Fortaleza”.
comissão empolgou Fortaleza, onde permaneceu durante os seis primeiros meses, aguardando a chegada do material e seguindo o conselho de personalidades locais de não adentrar o interior durante o período das chuvas, dadas as más condições das estradas atingidas pelas cheias. Os integrantes da expedição permaneceram trabalhando nos arredores de Fortaleza até enfrentarem os sertões a partir da segunda quinzena de agosto. “Por onde passavam, os ‘científicos’, esquadrinharam a província de
Igreja matriz em Aracati
Igreja N. S. da Conceição Fortaleza, Ceará
norte a sul, litoral, serra e sertão. Caminharam em várias direções, ora em conjunto, ora dividindose em pequenos grupos”, assinala Sylvia Porto Alegre. A partir daí, já se verificavam desentendimentos entre seus integrantes e desregramentos comportamentais – bebedeiras, farras noturnas e assédio às moças bonitas – que lhes renderam a alcunha de “Comissão defloradora”. Alguns episódios chegaram inclusive a ecoar na corte distante, convertendo-se em munição para a oposição política ao imperador.
Vista de Fortaleza
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ma passagem chamou de fato a atenção dada a repercussão negativa alcançada. A importação de 14 camelos vindos de Argel, acontecimento que abalou Fortaleza e causou pasmo à população. A tentativa desastrada de aclimatação dos ruminantes como animais de transporte de carga foi a gota d’água a cobrir de ridículo a “Comissão das Borboletas”, abalando de vez o seu prestígio já minado, descreve a professora Sylvia Porto Algre. Mesmo no interior houve casos em que a visita da comissão vinha precedida pela má fama de seus integrantes, causando a desconfiança dos sertanejos. O incidente mais grave, conhecido como “processo Abel”, ocorreu com a força policial de Icó, no sertão Sul do Ceará, que culminou na prisão de um dos guias da expedição, e envolveu a comitiva em processo explorado pela imprensa. Na visão
de Sylvia Porto Alegre, “as disputas políticas e o anedotário desviaram a atenção dos contemporâneos e mesmo dos estudiosos quanto à real contribuição da viagem”. INCIDENTES E DESPRESTÍGIO No início de 1860, a Comissão Científica reuniu-se quase totalmente no Crato, região do Cariri, onde foi bem acolhida por onde passou. Em fins de abril, os responsáveis pela comissão já se encontravam em Fortaleza. “Tinham perdido a altanaria dos primeiros dias. Os empeços administrativos, as desavenças internas, a incompreensão pública e a certeza do pouco que haviam conseguido, mormente no setor mineral, fizeram esma-
ecer aquela radiosa esperança que os iluminava ao tocarem a terra cearense”, considera Renato Braga, ao adiantar que o pensamento corrente na corte e na província era o de que a iniciativa fracassara por não haver encontrado os tesouros ansiosamente esperados. Mesmo assim há de se reconhecer o espírito desbravador dos integrantes da expedição na longa e penosa travessia dos sertões. Para agravar ainda mais a situação, os repasses para custeio das viagens já não eram mais tão regrados, e a expedição passou a contar com a ajuda do presidente da Província do Ceará, Antônio Marcelino Nunes Gonçalves. A 23 de março de 1961, encerrou-se o ciclo das jornadas da Comissão Científica.
Igreja Nossa Senhora do Ó em Cascavel Capela pertencente a freguesia do Riacho do Sangue
Pesca das piranhas em Russas
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Serra da Pedregosa em Sobral
e acordo com a professora Sylvia Porto Alegre em Comissão das Borboletas, o que descobriram e fizeram os membros da Comissão Científica de Exploração ficou registrado em documentos que podem ser consultados, nos acervos públicos e também nas coleções particulares. “Trata-se de material raro e valioso para o trabalho de estudiosos das mais diversas áreas e um testemunho precioso para a história das ciências no Brasil, nos primórdios de suas expansão e consolidação”, declara. Na ótica da professora, para além do conteúdo específico dos trabalhos produzidos, a análise dos resultados da iniciativa permite uma série de reflexões relevantes para a história do pensamento social no Brasil, em meados do século XIX. Por exemplo, a discussão de temas como a questão da nacionalidade e da identidade nacional, a representação da categoria do “outro” no interior da nação, as perspectivas que as chamadas “an-
tropologias nativas” desenvolvem a respeito de si mesmas, a problemática da modernidade e do progresso e a recorrente questão das “redescobertas” do Brasil. DOCUMENTAÇÃO NAUFRAGADA Por outro lado, sob o prisma da história da antropologia e de seus precursores, a expedição ao Ceará ainda não teve seu contributo devidamente estudado. Ao final da viagem, foi organizada uma
exposição, no Museu Nacional, de produtos coletados no Ceará. “Com isso, procurava-se demonstrar os recursos do território, fazer ver suas possibilidades, o potencial natural e industrial da nação, mesmo nas regiões mais afastadas da corte, e calar a oposição política”, sublinha Sylvia. Para culminar, parte da documentação recolhida por Capanema e Gonçalves Dias teria sido perdida ao final da viagem, em mal explicado naufrágio do iate Palpite, que transportava a carga do norte da província para Fortaleza, contribuindo para sua condenação pela opinião pública. A comissão regressou ao Rio, à exceção de Gonçalves Dias, que dirigiu-se depois ao Amazonas. A continuidade dos trabalhos foi também ameaçada pelas desavenças entre os membros, depois do retorno. A experiência extinguiu-se por volta de 1864, embora oficialmente os trabalhos da Comissão continuassem a constar dos relatórios oficiais até 1867. Moinho de Carnaúba, Aracati (Reis Carvalho)
Estação de carros no sertão (Reis Carvalho)
Igreja N. S. dos Prazeres, Aracati
Serra do Areré
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Resultados da Comissão Científica de Exploração
>> Materiais das seções de botânica, geologia e zoologia foram recolhidos ao Museu Nacional. O herbário incluía 14 mil amostras de plantas, mas ficou por quase um século vedado à consulta, armazenado em latas e inacessível aos pesquisadores; >> Coleções zoológicas excediam a quatro mil exemplares de aves, cerca de 80 espécies de répteis, 12 mil insetos e mais de cem animais vivos vindos do Cariri; >> Foram encontrados 32 desenhos de aquarelas identificadas como de autoria de José dos Reis Carvalho, cuja coleção faz parte do acervo do Museu Histórico Nacional. Dois trabalhos de Reis encontram-se no Museu do Crato e outros pertencem a coleções particulares; >> Cerca de 660 desenhos acompanham a Flora Cearense, atualmente depositada na Coleção Freire Alemão da Biblioteca Nacional; >> Uma série de 89 estampas etnográficas foram litografadas e coloridas à mão, por Henrique Fleiuss, figurando na Exposição Antropológica organizada por Ladislau Neto no Museu Nacional, em 1882; >> Objetos da cultura indígena coletados por Gonçalves Dias foram destinados ao Ihgb, formando a Coleção Amazônica; >> Quanto aos textos escritos deixados por essa verdadeira “descoberta dos sertões”, as principais fontes documentais são os relatos de Freire Alemão, Capanema e Lagos lidos no Ihgb entre outubro e dezembro de 1861 e publicados nos Trabalhos da Comissão Científica de Exploração, em 1862; >> Guilherme Capanema publicou Apontamentos sobre secas no Ceará (1878) e A seca no Norte (1901); >> Giacomo Raja Gabaglia também dedicou-se ao problema da seca, publicando A questão das secas no Ceará (1861) e Ensaio sobre alguns melhoramentos tendentes à prosperidade da Província do Ceará (1877);
>> Quanto às questões etnográficas, Capanema fez a leitura dos Apontamentos acerca das bebidas fermentadas usadas pelos indígenas do Ceará, festas e mitos religiosos e transmigrações tribais no IHGB (1862); >> Manoel Ferreira Lagos leu as Observações de costumes, de preconceitos, de usos, de festas populares e até de palavras especialíssimas e de significação exclusiva da população menos civilizada do Ceará, que infelizmente não foi entregue ao instituto; >> A Principal contribuição, contudo, foi dada pela seção de botânica. Entre os manuscritos de Francisco Freire Alemão, adquiridos pela Biblioteca Nacional, encontram-se os Estudos Botânicos (1834-1866), em 17 volumes, e a Flora Cearense (1859-1861), em nove volumes; >> Além do relatório da seção botânica, há a descrição das plantas colhidas no Ceará, em três folhetos, publicada nos Trabalhos da Comissão Científica de Exploração (1862-1863); >> Os papéis da expedição ao Ceará incluem o diário de viagem e notas pormenorizadas de Francisco Freire Alemão, nos padrões dos relatos feitos pelos viajantes estrangeiros contemporâneos do botânico. Além da descrição das espécies da natureza, há informações as mais variadas de tudo que era observado pelo caminho: a arquitetura do sertão, os materiais de construção das casas, a economia dos engenhos de açúcar, o fabrico de farinha, a agricultura e criação de gado, o povoamento e desenvolvimento das vilas e cidades, o clima, hábitos e costumes da população, a alimentação e o trabalho, as crenças, as festas e os divertimentos; >> Utilizando material coletado por Manoel Ferreira Lagos, teve lugar a primeira exposição de produtos industriais realizada no Brasil, a Exposição do Ceará, aberta no Museu Nacional em 1861, primeiro contato direto da corte do Rio de Janeiro com a cultura do sertão distante.
Fonte: Comissão das Borboletas e História da Comissão Científica de Exploração
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Em tese
squisador, Gilmar de Carvalho. Pe escritor e o ári jornalista, publicit
redacao@nordestevinteum.com.br ue mais impressiona, hoje, quando se foca a Comissão Científica de Exploração, é a determinação, a disciplina e o espírito de aventura que revestia o espírito cientificista vigente. Curioso como este grupo conseguiu mapear um Ceará sem estradas, se aventurando por trilhas, picadas, veredas e abrindo seu próprio caminho. Pode-se pensar nas tralhas que levavam e na dificuldade de equilibrar mantimentos e equipamentos em lombo de burro. Francisco Sousa e eu refazemos estes
Q
Foto: Francisco Sousa
percursos hoje, com estradas esburacadas, cidades sem cobertura de celular e reclamamos das dificuldades. Imaginem há 150 anos! Primeiro fomos a Tauá. O Liceu nos acolheu e as fotos dos alunos foram feitas no Parque da Cidade, uma lagoa urbanizada. A exposição que mistura as aquarelas do Reis Carvalho, as fotos que Francisco vem fazendo pelo Ceará e o resultado das oficinas básicas de fotografia digital, dos vinte alunos do Liceu, foi visitada por Dona Dolores Feitosa, referência da questão ambiental dos Inhamuns e diretora do Museu Bernardo Feitosa, que funciona na antiga Casa de Câmara e Cadeia de Tauá. Dos Inhamuns, nossa “caravana” subiu a Ibiapaba e
se instalou em Guaraciaba do Norte. Mesma gentil acolhida, mesmo entusiasmo dos alunos e, desta vez, “baixamos” no Colégio Municipal D. Pedro I. Os alunos tiveram a possibilidade de cercar melhor a natureza e de estabelecer relações com a cultura. Depois de uma semana, era a vez de partir para Sobral. O Liceu nos esperava e a acolhida foi ainda mais calorosa. Os alunos tiveram direito a um ônibus que os levaram à Serra da Meruoca para as fotografias que seriam exibidas no final da temporada. Fizemos uma escala rápida em Fortaleza e o Crato nos esperava. O Fiat Uno da locadora Sefor marchava intrépido pela Estrada do Algodão, que parecia interminável. A sensação de que não chegariamos lá aumentava o cansaço e nos dava uma idéia de pesadelo. Outro Liceu, nova (boa) acolhida, mais uma oficina e as fotos desta vez seriam feitas na Chapada do Araripe. Interessante como os olhares se renovam e como as fotos dos alunos dialogam com as imagens do Ceará e com as aquarelas de cento e cinqüenta anos. Libélulas azuis, flores, folhagem, troncos retorcidos, era o território mágico aprisionado pela tecnologia digital. Com muito esforço, o calor insuportável dos “bro” (meses que terminam com esta sílaba), estava concluída a primeira etapa da viagem. Agora, era comemorar o Natal, revisitar os planos e voltar em 2010 para fazer Icó, Aracati, Cascavel e terminar em Fortaleza, mais precisamente em abril, no Museu do Ceará, onde todo este material ancorará no fecho das comemorações dos 150 anos da Comissão Científica. Cada um faz suas escolhas. A homenagem à Comissão se dá aqui pelo lado das imagens. Não perdemos de vista que este é um projeto aprovado (premiado) por um Edital da Secult (Secretaria da Cultura do Ceará) e que um dos objetivos é chamar a atenção para a importância do olhar para o Ceará. A exposição traz três camadas deste olhar: a do aquarelista Reis Carvalho, a do fotógrafo Francisco Sousa e a dos alunos e alunas das escolas públicas que surpreendem pelo vigor e ineditismo com que mostram o que não fomos capazes de ver antes. Novembro/Dezembro n 2009
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Poder local&cidadania Aprendizagem cooperativa
PRECE de
gratidĂŁo a incluir jovens na
UNIVERSIDADE
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Por LucĂlio Lessa/redacao@nordestevinteum.com.br
Oportunizar uma experiência de protagonismo estudantil que leva centenas de universitários a retornar voluntariamente à cidade natal para auxiliar mais estudantes a entrarem na universidade. Este é o grande mérito do Programa de Educação em Células Cooperativas (Prece). Surgido em uma comunidade rural localizada em Pentecoste, interior do Ceará, a iniciativa já atendeu cerca de dois mil estudantes e ingressou 350 alunos da rede pública na universidade. Destes, 40 já concluíram a graduação e 10 encontram-se na pós-graduação “Até pouco tempo atrás a gente nunca tinha visto uma universidade. Ninguém conhecia nem universitário”. A frase é do agricultor José de Paula Souza, 49 anos, hoje concludente do curso de agronomia na Universidade Federal do Ceará (UFC). Há pouco mais de uma década, mais um trabalhador a engrossar a legião de analfabetos no sertão de Pentecoste. O tom de superação também faz parte do discurso do pedagogo Edílson da Costa, 27 anos. “Eu cresci num contexto no qual a violência e as drogas estavam muito presentes. Muitos amigos meus foram mortos. Hoje, estou me preparando para o mestrado”, diz. Ambos, José e Edílson, são personagens de uma experiência de protagonismo estudantil surgida em Pentecoste, município distante 89 quilômetros da capital cearense. Paralelamente a desvantagens de caráter sócio-econômico, o lugar carrega o peso estatístico de uma taxa anual média de 25 homicídios por 100 mil habitantes, conforme o Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros 2008. A experiência, a despeito dos números desfavoráveis à região, permitiu que 350 estudantes de Pentecoste e de outros sete municípios ingressassem no ensino superior através de um método de aprendizagem coletiva que se detém na troca de conhecimentos, o Programa de Educação em Células Cooperativas (Prece). Estratégia de estudo iniciada há 15 anos, o Prece possui uma dinâmica inovadora. Todo o capital intelectual surgido da iniciativa é
Eu cresci num contexto no qual a violência e as drogas estavam muito presentes. Muitos amigos meus foram mortos. Hoje, estou me preparando para o mestrado Edílson da Costa, pedagogo
Nós criamos uma contracultura. Aqui, só passava no vestibular quem era filho de comerciante. Por sua vez, este só voltava para comer peixe na beira do açude. No Prece, os estudantes têm um sentimento grande de pertença. Nós não somos um cursinho. É pobre ajudando pobre Manoel Andrade, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e idealizador do projeto
voluntariamente reinvestido no desenvolvimento coletivo. Trocando em miúdos, quem entra na faculdade retorna ao município nos fins de semana para auxiliar outros estudantes a se tornarem universitários. “Nós criamos uma contracultura. Aqui, só passava no vestibular quem era filho de comerciante. Por sua vez, este só voltava para comer peixe na beira do açude. No Prece, os estudantes têm um sentimento grande de pertença. Nós não somos um cursinho. É pobre ajudando pobre”, considera o professor da Universidade Federal do Ceará (UFC), Manoel Andrade, idealizador do projeto. O programa já atendeu cerca de dois mil estudantes, dos quais 40 já se graduaram e dez ingressaram na pós-graduação (mestrado ou doutorado). O reconhecimento da iniciativa ganhou dimensões internacionais.
reconhecimento cepal / onu Em 2005, o Prece foi reconhecido pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), da Onu, como uma das 42 melhores experiências de inovação social no continente latino americano, dentre 1.300 projetos de 33 países Novembro/Dezembro n 2009
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No Cipó, o início
Aula à luz de vela em casa de farinha dá primeiro lugar na Pedagogia da UFC
Pintura em homenagem aos pioneiros
N
ascido em Cipó, distrito de Pentecoste, o professor Manoel Andrade pretendia inovar e mobilizar ações no sentido da melhoria de vida da comunidade. “De início, criei um campeonato de futebol. A ideia era que as pessoas se organizassem. Cinco anos depois, estava exausto. Precisavam de mim para tudo. Não havia sustentabilidade. O único benefício é que a violência havia diminuído”, revela. Após essa primeira tentativa, Andrade decidiu, em 1994, que faria um projeto educacional. “Percebi que a educação teria
outra força”. O primeiro passo foi montar um grupo de pessoas dispostas a estudar. Sete jovens fora de faixa etária no ensino fundamental e médio decidiram investir exclusivamente no sonho de entrar na universidade. As condições não eram nada favoráveis. Embora Andrade garantisse o material de pesquisa, o grupo tinha que estudar no galpão mal iluminado de uma casa de farinha abandonada. As reuniões ocorriam a luz de velas, pois não havia energia elétrica. “As pessoas diziam que a gente não queria nada, que nós não queríamos ajudar nossos pais”, lembra o hoje agrônomo Carlos Alberto Souza, 30 anos. Dois anos depois do primeiro encontro, um belo susto na comunidade: Francisco Antônio Alves Rodrigues, integrante do grupo, conseguiu o primeiro lugar no vestibular para a Faculdade de Pedagogia, na UFC. “Eu ouvi o resultado na casa de
farinha. Nunca vou esquecer”, lembra Antônio, hoje professor da rede pública. A aprovação no vestibular de um membro da comunidade rural foi um marco na cidade e garantiu a popularização do projeto. Dos sete pioneiros, seis entraram na faculdade. Era o início do Prece.
As pessoas diziam que a gente não queria nada, que nós não queríamos ajudar nossos pais Carlos Alberto Souza, agrônomo, 30 anos
Sucesso, novos alunos, pau-de-arara e fim de semana imerso em estudo A
pós as primeiras vitórias, os estudantes aprovados lideraram a criação do Prece, que inicialmente significava Projeto Educacional Coração de Estudante, inspirado na música de Milton Nascimento. Todos os fins de semana, os alunos voltavam à casa de farinha e compartilhavam o que tinham aprendido para o vestibular com outros jovens das comunidades rurais. Não demorou muito para alunos da sede aderirem à proposta. Mas a rotina não era fácil. Toda sexta-feira saía de Pentecoste um caminhão “pau-de-arara”, sem coberta, com destino a Cipó, com cerca de 50 pessoas. Os jovens passavam todo o fim de semana estudando na casa de farinha que, pelo menos, já possuía energia.
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Histórias de superação “A viagem durava de 45 minutos a uma hora. A aula começava às 19h e terminava às 22h. No sábado, era aula o dia todo e à noite a gente tinha um culto. No domingo: estudo. Retornávamos só na segunda”, informa a universitária Liliane Cavalcante Oliveira, 25 anos, aprovada para o curso de secretariado da UFC. Da sua época, Liliane lembra momentos difíceis. “Não passei de primeira. Meus pais me alertaram que se não passasse no vestibular seguinte teria que abandonar os estudos para trabalhar. Chorava todas as noites. Nas viagens para o Prece, não tinha dinheiro para comer. Passava o fim de semana inteiro com água e bolacha ‘creamcracker’. Hoje, sou a primeira pessoa de toda a minha família a entrar em uma universidade”, revela. Quem também recorda do período pré-universitário é o estudante de Ciências Sociais e coordenador técnico do Prece, Tony Souza Ramos, 26 anos. “Quando terminei o ensino médio, fiquei sem perspectiva. Passei quatro anos longe dos estudos. Foi a partir do Prece que retomei meus objetivos”, diz. Para Tony, o maior legado do projeto é que a aprovação de um parente no vestibular faz com que outras pessoas da família invistam no próprio potencial. “Minhas irmãs mais novas participam do Prece. Uma delas cursa duas faculdades”, comemora. Liliane e seu pai
EPCs
Escolas Populares Cooperativas já instaladas em mais seis municípios D
iante da procura de jovens de outras comunidades à pequena Cipó, o local se estabeleceu como uma incubadora de células de aprendizagem cooperativa. Dali, para se multiplicar para a sede foi um pulo. Os próprios estudantes fizeram a primeira multiplicação da iniciativa ao criar um núcleo em Pentecoste. A notoriedade foi tamanha que não tardou para tomar corpo e ultrapassar fronteiras: núcleos de estudo, denominados Escolas Populares Cooperativas (EPCs), podem ser encontrados nos municípios de Apuiarés, General Sampaio, Paramoti, Fortaleza, Maracanaú e Paracuru, além de Pentecoste. O projeto conta hoje, com 13 Epcs. “Todas elas são independentes. O que temos aqui não é necessariamente um projeto, é uma visão de trabalho. É claro que estamos ligados ‘emocionalmente’, mas não institucionalmente”, esclarece Manoel Andrade. Novembro/Dezembro n 2009
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DEPOIMENTOS
Camaradagem, interesse pelo estudo e abnegação A
s histórias de vida nesses núcleos são parecidas e o discurso afinado. Que o diga o estudante do segundo ano do ensino médio Jorge Rodrigues de Oliveira. Filho de uma doméstica e de um auxiliar de escritório, o jovem, de 15 anos, já se imagina voltando da universidade para ajudar os amigos. “Essa é a minha oportunidade de entrar na faculdade. E vou retribuir ajudando futuros ‘precistas’”, afirma. Prestes a fazer seu primeiro vestibular, Kátia Maria Pires da Silva, 20 anos, é outra que não vê a hora de passar para a próxima etapa: a universidade. “Nunca tinha estudado tanto. Entrei aqui mais pelas amizades, mas fui contaminada pelo conhecimento. A gente até brinca que nos fins de semana tem ‘esquema’, mas não é namoro, é o estudo”, diz. Os grupos de aprendizagem do Prece não se limitam às aulas com os universitários nos fins de semana. Todos os dias os estudantes se reúnem para ensinar o que aprenderam. Nessa dinâmica, os que mais se destacam são escolhidos como monitores. É o caso da pré-universitária Joélia Dantas Guimarães. “Sou coordenadora de Português. É legal por que passar o que a gente aprendeu para os demais fortalece o aprendizado e é muito bom para a auto-estima. Todo mundo se interessa. A gente não é obrigado a nada. Vem quem quer passar no vestibular”, avalia Joélia.
Dos 150 alunos pentecostenses que ingressaram na universidade, pelo menos 130 voltaram para trabalhar no prece. Os depoimentos individuais reforçam a teoria do foco no coletivo. É o que se constata também no depoimento do estudante de engenharia de pesca Francisco Hélio Pires da Silva, 23 anos. “Todos os meus fins de semana são dedicados ao Prece. Muitas vezes, deixo a minha vida social por esse compromisso. Até entrar aqui eu não sabia direito nem o que era o vestibular. Retribuir essa chance é a essência do nosso trabalho”, enfatiza. Quanto à casa de farinha, foi transformada em “estudantório”, uma homenagem aos sete primeiros estudantes. O local abriga alunos de várias localidades, inclusive de Fortaleza.
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Essa é a minha oportunidade de entrar na faculdade. E vou retribuir ajudando futuros ‘precistas’ Jorge Rodrigues de Oliveira
Todos os meus fins de semana são dedicados ao Prece. Muitas vezes, deixo a minha vida social por esse compromisso. Até entrar aqui eu não sabia direito nem o que era o vestibular. Retribuir essa chance é a essência do nosso trabalho Hélio Pires da Silva, 23 anos
Nunca tinha estudado tanto. Entrei aqui mais pelas amizades, mas fui contaminada pelo conhecimento. A gente até brinca que nos fins de semana tem ‘esquema’, mas não é namoro, é Kátia Maria Pires da Silva, 20 anos o estudo
Residência e transporte
Falta apoio do poder público municipal M
as nem tudo são flores. Por mais que as declarações sejam inspiradoras, o fato é que o desenrolar do projeto é bem complicado. E o motivo é a falta de apoio do poder público, que acaba por transformar os resultados expressivos em transtornos. Por exemplo: devido ao grande número de aprovados no Prece, as residências universitárias ficaram abarrotadas de alunos “precistas”, prejudicando o ingresso dos demais. A solução encontrada, em Pentecoste, foi tentar, através de uma emenda parlamentar, possibilitar aos estudantes uma residência a ser mantida pela Prefeitura. De acordo com Manoel Andrade, uma emenda para transporte dos estudantes também já havia sido colocada no orçamento do município. No entanto, só foram contemplados os estudantes da sede, ficando de fora as comunidades rurais. “Quem está colaborando com esse público é o Governo do Estado, através de uma articulação nossa. O município não cumpriu a emenda”, revela.
Visão “Precista”
Vencer no lugar onde se vive é projetar mudanças de realidade
Observatório do eleitor em ação durante evento político
É
provável que ainda demore para que o poder público se sensibilize com a importância do Prece. Só não quer dizer que os “precistas” estejam aguardando de braços cruzados. “Queremos criar condições para que essas pessoas possam vencer no lugar onde vivem. Não estamos fazendo isso ‘porque o interior não presta’. Isso aqui não é um êxodo rural de elite, muito menos uma fuga de cérebros”, ressalta Manoel Andrade. Segundo o professor, a visão política do Prece é diferente da que emprega o terceiro setor. “Não queremos assumir o espaço do governo. A gente luta para que ele apenas assuma o seu papel. Será uma grande derrota para nós se isso não vier a aconte-
cer”, teoriza. A busca por ações que tragam esse novo perfil governamental fez com que o Prece estabelecesse três eixos de atuação: Educação Básica, Empoderamento Comunitário e Desenvolvimento Econômico. Enquanto o primeiro foca iniciativas para o desenvolvimento intelectual, justamente a pedra fundamental do projeto, os demais auxiliam os “precistas” na mudança de mentalidade política da sociedade local e no surgimento de oportunidades de trabalho na região. Em Pentecoste, onde ocorre boa parte das ações destaca-se, no eixo II, o observatório do leitor. Tratase do monitoramento e fiscalização do poder público por meio dos estudantes nas sessões da Câmara Municipal. Toda discussão é informada através de um programa de rádio, o “Coração de Estudante”. O município de Apuiares também adotou a estratégia.
Queremos criar condições para que essas pessoas possam vencer no lugar onde vivem. Não estamos fazendo isso ‘porque o interior não presta’. Isso aqui não é um êxodo rural, de elite, muito menos uma fuga de cérebros Manoel Andrade
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PARCERIA
Escola de Governantes do Ceará leva formação política e de gestão Antes, existia J um núcleo de á em parceria com a Escola de Formação de Governantes (EFG), Pentecoste recebe a cada 15 dias a visita de palestrantes que tratam de temas como planejamento urbano, orçamento participativo e sustentabilidade. Encabeçada pelo professor e diretor da Escola, Alberto Teixeira e pelo coordenador do Prece, Tony Souza Ramos, a ação, que começou em setembro, realiza até dezembro um ciclo de formação política. Para 2010 estão programados cursos de formação em gestão de prevenção à corrupção, em função das próximas eleições. No quesito Desenvolvimento Econômico, o Prece conta com a Associação de Desenvolvimento Econômico Local (Adel), criada em 2007. “Antes, existia um núcleo
assessoria ao pequeno produtor rural, mas os agricultores tinham dificuldade de se fixar na região porque não possuíam uma instituição que desse suporte jurídico para captar recursos
Antônio Adriano Batista de Souza, presidente da Adel
de assessoria ao pequeno produtor rural, mas os agricultores tinham dificuldade de se fixar na região
porque não possuíam uma instituição que desse suporte jurídico para captar recursos”, considera o presidente da Adel, Antônio Adriano Batista de Souza. Instituição originária do Prece, mas independente deste, a Adel atua em três municípios: Pentecoste, Apuiarés e Tejuçuoca. O foco é o trabalho com ovinocaprinocultura, apicultura e agroecologia. “O principal objetivo é criar formas para potencializar e desenvolver as associações, que só em Pentecoste são 12”, informa Adriano. Alberto Teixeira, Diretor da EFG
EDUCAÇÃO BÁSICA Educação de jovens e adultos Pre-vestibular cooperativo Incubadora de células educacionais Estudante cooperativo Ações de apoio ao estudante
EMPODERAMENTO COMUNITÁRIO
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO - ADEL
Observatório do eleitor Programa de rádio Jornal comunitário Debates nas eleições Organização de fóruns Movimento em defesa da Escola Pública Participação em conselhos municipais
Célula Social Produtiva Difusão tecnologias agroecológicas Jovens empreendedores rurais Fundo rotativo solidário Apicultura integrada Caprinovinocultura de corte
Economia Solidária
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ICE centraliza ações
Instituto Coração de Estudante, um escritório de apoio a projetos
Sede do Instituto Coração de Estudante
D
esde 1998, mesma época que a sigla Prece passou a ter o significado atual, funciona em Fortaleza, o Instituto Coração de Estudante (ICE). Entidade fundada pelos pioneiros para coordenar as ações do programa, o ICE é uma espécie de es-
critório do Prece, e também agrega os projetos que se originaram a partir do programa, como a Adel. “O Prece e os demais projetos não possuem folha de pagamento. Contratado, mesmo, temos apenas um contador. O ICE é, sobretudo, uma forma de organizar a captação dos recursos para projetos e conseguir incluir os nossos estudantes em bolsas de pesquisa”, informa Andrade. De acordo com a relatora da coordenadoria do instituto, Arneide Andrade, além dos escritórios de apoio aos projetos, a estrutura conta ainda com dois quartos para hospedar alunos. Para executar a coordenação do Prece, o ICE realiza parceria com a Igreja Presbiteriana Independente de Fortaleza, Fundação Mary Speers, Brazil Foundation, Ashoka Empreendedores Sociais, Ceja de Itapipoca e UFC.
José de Paula Souza, 49, agricultor
Agronomia, dois filhos graduados, dois na faculdade e uma escola F oi no meio da caatinga, na mais rural das rurais, que a Nordeste VinteUm encontrou o agricultor, exanalfabeto e hoje estudante de agronomia José de Paula Souza. “Quando decidi fazer supletivo e depois o vestibular, muita gente me criticou. Diziam que eu não iria em frente e que deveria investir apenas na educação dos filhos”, relembra. Hoje, o universitário cala a boca Quando decidi de muita gente. Aprovado no vestibufazer supletivo e lar juntamente com uma das filhas, ele conseguiu iniciar uma bem sucedida depois o vestibular, muita trajetória estudantil e plantou essa se- gente me criticou. Diziam mente no restante da família. Dos oito filhos de José, dois estão graduados, que eu não iria em frente e dois cursam faculdade e os pequenos que deveria investir apenas já perceberam que o negócio é estudar. na educação dos filhos “Quando vejo meu pai na faculdade, fazendo cadeiras comigo, tenho um or- José de Paula Souza
gulho enorme”, diz o estudante de agronomia, Paulo Glaydson, 26 anos. Não contente em apenas possibilitar a educação dos filhos, José de Paula foi além e fundou em 2005 uma EPC. “Começamos com cinco estudantes. Houve uma época em que tivemos que estudar embaixo de uma palhoça improvisada. Depois, a gente ganhou um recurso e hoje já possuímos o nosso teto. Já aprovamos 11 estudantes”, comemora. Entre os jovens que se reúnem no local, está a pré-universitária Maria Lucineide Gomes do Nascimento, 20 anos. “Vou fazer vestibular para Letras, e isso já é uma grande vitória, já que antes talvez só me restasse ser bordadeira. E por mais que toda profissão seja digna, fico feliz em saber que agora posso escolher o que quero ser”. Novembro/Dezembro n 2009
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Totonho Laprovitera - Álbum de família, retrato nº 1 - 2007 - AST - 160 x 160 cm
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Nossa
a diferença entre seu veículo impresso e os outros
nordestina A blindagem olvimento no subdesenv
Crise
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Edição Nº 01
— Ano I —
Revista Maio/2009 —
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Região ensina o que fazer pelos excluídos do crédito
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Mangabeira Unger: “Nordeste precisa se rebelar!”
Josué de Castro e Fome:
Persistência onde mais falta educação
nordeSte, Século XXi
Sonho e deSpertar Sem fim pelo deSenvolvimento
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