Mais planejamento, menos desperdĂcio na construção civil
A questão dos Resíduos da Construção Civil deve ocupar um espaço crescente na lista das preocupações dos empresários do setor da construção civil. Há uma série de fatores que servem de base para essa afirmação: a) A legislação ambiental e as normas relativas ao descarte adequado de resíduos sólidos tendem a se tornar cada vez mais rígidas. b) Os consumidores estão mais atentos às questões de sustentabilidade e as empresas, mais expostas a crises de imagem. c) A sustentabilidade é diferencial competitivo das empresas modernas. d) Excesso de resíduo é sinônimo de desperdício. Desperdício é sinônimo de ineficiência, perda de competitividade e retração dos lucros.
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O que são Resíduos da Construção Civil A Lei n.o 12.305, de agosto de 2010, “Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei n.o 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências” e define que são resíduos da Construção civil: os gerados nas construções, reformas, reparos e demolições de obras de construção civil, incluídos os resultantes da preparação e escavação de terrenos para obras civis A mesma regra trata ainda do chamado Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos e define, no artigo 20: “Estão sujeitos à elaboração de plano de gerenciamento de resíduos sólidos: III — as empresas de construção civil, nos termos do regulamento ou de normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama;” O plano deverá trazer, entre outras informações, “as metas e procedimentos relacionados à minimização da geração de resíduos sólidos e, observadas as normas estabelecidas pelos órgãos do Sisnama, do SNVS e do Suasa, à reutilização e reciclagem; VII — se couber, ações relativas à responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, na forma do art. 31;”
A responsabilidade compartilhada exigirá das empresas ações que aumentem a eficiência no uso de matérias primas e a redução do volume de resíduos gerados.
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O tamanho do problema Por enquanto, os números indicam que as perdas de material ainda crescem. Dados do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil — 2012, levantamento feito pela Abrelpe, indicam que no ano passado foram coletados no País 35,02 milhões de toneladas de Resíduos da Construção Civil. Em 2011 o volume havia sido de 33,24 milhões de toneladas. Houve um crescimento, portanto, de 5,3% no total de resíduos coletados em apenas um ano. No Sul do País, é como se cada habitante despejasse no meio ambiente, por dia, 648 gramas de rejeitos de construção civil. A maior parte do rejeito produzido é composta por argamassa, tijolos, concreto, solos, metais, madeira, gessos e plástico. Uma pesquisa do Programa Habitare, desenvolvido por universidades de todo o País e financiado pela Finep, identificou que a construção civil gasta, em média, 56% a mais, em peso, de cimento do que seria o previsto para uma obra. O índice é de 44% para a areia e de 15% para tubos de PVC e Eletrodutos. As razões do desperdício são variadas. Uma das causas mais simples é a perda no transporte de material dentro do canteiro de obras. Mas há prejuízos ainda mais significativos provocados por imprevistos que surgem durante a obra e obrigam os operários a quebrar algo já concluído e refazer o trabalho de forma diferente. Um dos itens avaliados na pesquisa “Alternativas para a redução do desperdício de ma-
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teriais nos canteiros de obras”, também parte do Programa Habitare, foi a instalação de água fria com uso de tubos de PVC de 25 milímetros de diâmetro. As perdas de material, segundo a avaliação, foram de 19%. Os pesquisadores explicaram no trabalho: “a instalação hidrossanitária sofreu diversas alterações depois de parte do serviço ter sido executada. Este fato não aumenta de forma exorbitante o consumo de tubo. O mesmo não pode ser dito quando se trata de conexões e mão de obra”. Já houve quem afirmasse, sem embasamento científico, que em cada obra há desperdício de um terço do material comprado. Não é verdade. Em média, o impacto financeiro da perda de material transformado em resíduo chega a até 8% do custo do projeto. O número não é tão alarmante quanto previam os mais pessimistas. Mas “jogar no lixo” o equivalente a 5%, 8% do total gasto em uma obra pode causar comprometimento significativo dos lucros de qualquer construtora.
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Tempo também se desperdiça As perdas de material podem ser medidas em quilos e toneladas e, por isso, são mais facilmente traduzidas em valor financeiro. Muitas vezes, porém, o desperdício de material está associado ao retrabalho. O profissional no canteiro de obras é obrigado a quebrar paredes e refazer serviços que já pareciam concluídos. Isso gera perda de cimento, tijolos, revestimentos, entre outros materiais, e também consome tempo das equipes. Esse desperdício dificilmente pode ter seu valor calculado, mas certamente tem impacto negativo sobre os custos das construtoras.
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Construção civil, setor essencial da economia O fortalecimento da indústria da construção civil é essencial para o crescimento da economia. Ao mesmo tempo, a atividade nos canteiros de obras é uma espécie de termômetro do que ocorre em todo o mercado: quanto maior o poder de consumo da população, mais aquecida fica a construção civil. O segmento é ainda grande gerador de emprego e renda, com a vantagem de gerar empregos também para a mão de obra com pouco preparo escolar, infelizmente ainda em grande número no Brasil. A Pesquisa Anual da Indústria da Construção (PAIC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indica que em 2011 o setor reunia 92,7 mil empresas que movimentaram R$ 286,6 bilhões, um crescimento de 4,5% na comparação com o ano anterior. As empresas empregaram 2,7 milhões de pessoas. Em 2010 foram 2,5 milhões de postos de trabalho na construção civil. E em 2007, primeiro ano da pesquisa IBGE com a atual metodologia, 1,6 milhão. Com o pagamento de salários, retiradas e outras remunerações, as empresas do setor garantiram a injeção de R$ 49,9 bilhões na economia brasileira em 2011. A participação do segmento no PIB brasileiro é de 5,8%. Qualquer ganho para a indústria da construção civil, portanto, tem impacto significativo sobre toda a economia do País.
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A busca de soluções Muitas pessoas, principalmente aquelas que não têm vivência dentro de um canteiro de obras, relacionam desperdício apenas às perdas que ocorrem durante o transporte de material de um lado para o outro. Mas o problema é muito mais abrangente e profundo — e por isso deve ser enfrentado desde o início da obra, na fase de projetos. É fácil entender porque a antecipação é importante. No trabalho Qualidade: cada erro tem seu preço (HAMMARLUND, Y.; JOSEPHSON, P.E.) mostram como a possibilidade de interferências que reduzem os custos do empreendimento diminuem a medida que a obra avança.
Fonte: Qualidade: cada erro tem seu preço (HAMMARLUND, Y.; JOSEPHSON, P.E.).
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Segundo a arquiteta Patrizia Chippari, o raciocínio expresso no gráfico parece óbvio: “é evidente que antes do início da obra a possibilidade de consertar problemas de planejamento é enorme. Também é claro que, concluídos os trabalhos, não há conserto, apenas a possibilidade de quebrar o que está inadequado e refazer o serviço. Infelizmente, porém, ainda é preciso avançar na cultura do planejamento prévio e do investimento em projeto — e não do reparo”. Na dissertação de mestrado em engenharia civil “Compatibilização de Projetos em Edifícios de Múltiplos Andares” Francisco Jesus de Sousa cita estudos que apontam a fase de concepção e projeto como principal fator de origem de 46% das patologias em uma obra. A fase de execução é ligada a 22% desses problemas.
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Alguns exemplos de patologias que provocam desperdício Problemas com mão-de-obra — paredes erguidas fora do prumo são sinônimo de desperdício de argamassa. Quando o problema ocorre, o operário costuma usar excesso de material para alinhar a parede e minimizar o problema Falta de paginação dos materiais da fachada do edifício — quando não há um “desenho” detalhado e anterior da fachada, com a definição da quantidade de peças que serão usadas e de sua colocação, pode haver desperdício durante cortes. Além disso, sem a definição prévia do volume a ser utilizado, podem ocorrer compras em excesso ou falta de insumo, gerando atrasos. “Encontros” não planejados entre tubulações de hidráulica e a estrutura de concreto — a necessidade de preservar a estrutura do imóvel pode obrigar os operários a quebrar paredes que já eram dadas como prontas para a aplicação de reboco, gerando entulho e perda de tempo. Falta de paginação prévia dos pisos cerâmicos e azulejos — nesse caso a decisão de como o piso será assentado é tomada na obra, o que pode provocar desperdício de material até que seja encontrada a solução ideal Uma das fontes mais comuns de problemas patológicos em prédios em construção são as interferências entre instalações (dutos para fiação elétrica, canalização de água quente ou fria e tubulação de escoamento da chuva) e o projeto estrutural da edificação.
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O que é compatibilização A compatibilização é, de forma bastante simplificada, um processo executado por uma equipe de arquitetos que fazem a sobreposição harmônica dos diversos projetos necessários para uma construção: topográfico, estrutural, hidrosanitário, elétrico, de refrigeração, arquitetônico, entre outros. Isso permite que, antes do início da construção, todos já saibam o local exato de cada parede, tubulação ou interruptor de luz. O processo evita que ocorram “surpresas” durante a obra e evita o retrabalho. incorporadora / construtora
projeto arquitetônico legal aprovado
• Define produto
• Aprova eventuais alterações • Disponibiliza informações sobre o projeto • Responde aos relatórios
• Estipula prazos • Define entradas de projeto • Baliza custos • Montagem e controle do crono de projetos e etapas • Apresenta checklists • Orienta metodologia mais eficiente • Emite relatórios quinzenais • Informações sobre atrasos
• Emite relatórios caso haja alteração • Avalia se atende necessidades engenharias • Garante as premissas do projeto
gestão do processo / compatibilização com arquitetura • Controle e administração dos cronogramas • Garante as premissas do produto e custos • Compatibiliza com arquitetura • Gera relatório de interferências • Gera detalhamento arquitetônico para obra (opcional) • Emite relatórios semanais de pendências • Analisa soluções técnicas • Poder de aprovação das soluções
• Respondem às necessidades do produto • Proposta da melhor solução técnica • Solicitam adaptações técnicas • Levantamentos quantitativos
projetos de angenharia (compabilizados entre si)
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• Determina diretrizes • Disponibiliza informações sobre o projeto
Essa é a parte “física” do trabalho. Antes, durante e depois, compatibilizar exige ainda um intenso esforço de gestão. O profissional responsável pela compatibilização também coordena equipes de projetistas, acompanha cronogramas e orienta mudanças. Estudos indicam que a compatibilização pode reduzir de 5% a 10% do custo de uma obra.
Compatibilização Esses dois desenhos da mesma fachada de um edifício ajudam a compreender a importância da compatibilização de projetos. O primeiro deles, sem detalhes, mostra o projeto simplificado da edificação, normalmente utilizado para aprovação da Prefeitura. O segundo apresenta o mesmo prédio, no projeto executivo, depois do trabalho de compatibilização e detalhamento de projetos. As construtoras podem economizar tempo e dinheiro se, ao iniciarem uma construção, tiverem em mãos não somente o projeto utilizado para aprovação da prefeitura, mas também o projeto executivo. A falta de uma análise prévia detalhada do que se vai construir gera retrabalho, atrasos no cronograma e mudanças inesperadas no orçamento. Quando fazem a compatibilização, os construtores sabem exatamente o que será feito em cada etapa do projeto. Eles conhecem detalhes da obra e contam com a especificação prévia do material que será utilizado. Isso facilita o trabalho dos responsáveis pelos orçamentos e evita que surjam “surpresas” desagradáveis no canteiro de obras.
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Das pranchetas para o computador A arquiteta Patrizia Chippari, da Espaço Livre Arquitetura, completou o curso na Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, em 1996. Antes mesmo da formatura, ela começou a atuar como estagiária na equipe de engenharia e arquitetura de uma construtora paulistana que desenvolvia internamente os projetos arquitetônicos de seus edifícios. A compatibilização já era usada pela empresa como forma de diminuir custos e desperdício e economizar tempo no canteiro de obras. “Em comparação ao que é feito hoje, na época o trabalho ainda era um desenvolvido na prancheta. Os projetistas usavam “papel manteiga” para visualizar os diferentes projetos sobrepostos e identificar atritos que pudessem causar problemas na execução da obra. Então tinham de desenhar no papel as soluções que harmonizassem todos os projetos da melhor forma. O serviço braçal de colocar no papel o que havia sido planejado era uma etapa importante de um trabalho que exigia muita atenção aos detalhes e conhecimento técnico para garantir que as mudanças eventualmente feitas durante a compatibilização garantissem benefícios tanto na execução quanto depois, no uso do imóvel pelo futuro proprietário”, diz Patrizia. O uso da tecnologia da informação mudou bastante a rotina dos profissionais que compatibilizam projetos. As plantas em papel ainda são numerosas nos escritórios e necessárias na obra, mas servem para facilitar a visualização de cada projeto e a anotação de mudanças que precisam ser
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executadas. Mas hoje, o trabalho de sobreposição dos projetos, o planejamento de mudanças e os desenhos de ajustes são todos feitos no computador, em programas específicos. Ainda mais importante é a mudança na forma de gestão das equipes envolvidas. “É um equívoco imaginar que a compatibilização se restringe à sobreposição e análise das interferências entre os projetos. Essa é a etapa visível do trabalho. Mas há também muita gestão envolvida no processo”, diz Patrizia. “E nesse trabalho o impacto da tecnologia da informação também é muito grande”, completa. A gestão pode iniciar ainda na etapa de estudos preliminares do projeto, quando a construtora decide pela aquisição do terreno e determina a ocupação do solo e até a posição do edifício. O trabalho continua com a análise de viabilidade do empreendimento e segue para a fase de anteprojetos. Depois, tomada a decisão do perfil do empreendimento, o profissional da compatibilização coordena os projetistas responsáveis pelos diferentes estudos — estrutural, hidro-sanitário, elétrico, de climatização, entre outros. “A tecnologia da informação permite a criação de ambientes virtuais (extranets com acesso restrito) nos quais essas equipes trabalham em contato permanente”, diz Patrizia. O ambiente virtual possibilita aos envolvidos dispor de recursos de gerenciamento de documentos, controle de revisões, visualização de arquivos, envio de informações registradas, entrega de notificações, monitoramento, fórum de discussões, arquivamento, entre outros. “A atenção aos detalhes e o conhecimento técnico ainda são essenciais no trabalho, mas a tecnologia facilitou bastante a gestão da compatibilização”, diz a diretora da Espaço Livre Arquitetura.
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tecnologia e custo aliados para produzir belos espaços de convívio.
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