AS REDES DE RELAÇÕES: O PLANEJAMENTO REGIONAL COMO ESTRATÉGIA PARA O DESENVOLVIMENTO LOCAL – ESTUDO SOBRE CIDADES DOS VALES DO JEQUITINHONHA, MUCURI E RIO DOCE – MINAS GERAIS, BRASIL. B. L. BARBOSA1 , F. J. M. de LIMA2
RESUMO O presente trabalho visa levantar as relações existentes, as relações em potencial e algumas possibilidades e diretrizes para a efetivação do planejamento pensado sobre uma rede de cidades. A área, escolhida para tal reflexão e proposta, se insere no nordeste de Minas Gerais e consiste em um recorte de municípios pertencentes aos vales do Jequitinhonha, Mucuri e Rio Doce, que já possuem certo nível de relação intrarregional. As questões aqui discutidas referem-se às atividades econômicas, turísticas e principalmente culturais deste recorte. A proposta apresentada configura-se em uma rede organizada de municípios que, através do planejamento regional e do fortalecimento dos fluxos entre eles, visa o desenvolvimento urbano conjunto, onde as especificidades locais são respeitadas e consideradas. Esta proposta de articulação é feita através de diretrizes gerais de administração e facilitação de trocas entre os municípios, além de propor equipamentos relacionados à produção local de alguns dos núcleos urbanos envolvidos. O trabalho se insere nas atividades do grupo de pesquisa Urbanismo em Minas Gerais com o apoio da CAPES, CNPQ e FAPEMIG.
1 APRESENTAÇÃO O presente trabalho visa levantar as relações existentes, as relações em potencial e algumas possibilidades e diretrizes para a efetivação do planejamento pensado sobre uma rede de cidades, diante da possibilidade das cidades se desenvolverem na forma de municípios centrais onde os serviços e equipamentos se concentram, ou na condição de rede de cidades, onde a cooperação traz o desenvolvimento conjunto. A área escolhida para tal reflexão e proposta se insere no nordeste de Minas Gerais e consiste em um recorte de municípios pertencentes aos vales do Jequitinhonha, Mucuri e Rio Doce, que já possuem certo nível de relação intrarregional. As questões aqui discutidas referem-se às atividades econômicas, turísticas e principalmente culturais deste recorte. A proposta apresentada configura-se em uma rede organizada de municípios que, através do planejamento regional e do fortalecimento dos fluxos entre eles, visa o desenvolvimento urbano conjunto, onde as especificidades locais são respeitadas e consideradas. Esta proposta de articulação é feita através de diretrizes gerais de administração e facilitação de trocas entre os municípios, além de propor equipamentos relacionados à produção local de 1
Afiliação: Pesquisadora colaboradora do Grupo Urbanismomg da Universidade Federal de Juiz de Fora ; babilopesb@gmail.com 2 Afiliação: Professor, coordenador do Grupo Urbanismomg da Universidade Federal de Juiz de Fora ; fabio.lima@ufjf.edu.br * Esta pesquisa foi desenvolvida durante o Trabalho Final de Graduação da então acadêmica Bárbara Lopes Barbosa, intitulado As redes de relações: O Planejamento Regional como Estratégia para o Desenvolvimento Local, no curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Juiz de Fora, sob orientação do Prof. Antônio Agenor Barbosa e coorientação do Prof. Fabio Jose M. de Lima que me acompanha nesta abordagem.
alguns dos núcleos urbanos envolvidos. O trabalho se insere nas atividades do grupo de pesquisa Urbanismo em Minas Gerais com o apoio da CAPES, CNPQ e FAPEMIG. O trabalho se coloca como continuidade das atividades desenvolvidas durante o curso de Arquitetura e Urbanismo da UFJF da Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF. Além das disciplinas cursadas, vale mencionar a vinculação aos grupos de pesquisa Urbanismo em Minas Gerais e Grandes Projetos Urbanos e, particularmente a pesquisa final durante a disciplina “Trabalho Final de Graduação 1 e 2”, do referido curso de Arquitetura e Urbanismo. No âmbito dos grupos mencionados se colocam atividades de pesquisa e extensão relacionadas com o urbanismo e o planejamento urbano, com aproximações sobre comunidades e realidades distintas, bem como incursões em acervos documentais. O enfoque aqui exposto envolveu pesquisa sobre referenciais bibliográficos, visitas locais com entrevistas e levantamentos nas secretarias e instituições locais do município de Capelinha/MG, ponto de partida do trabalho, e pesquisas em órgãos e institutos de planejamento, como a Fundação João Pinheiro, em Belo Horizonte, entre outros acervos. Este referencial permitiu desenvolver propostas de diretrizes de intervenção no recorte regional aqui apresentadas. O artigo aborda inicialmente, a questão da escala regional e os problemas urbanos, em seguida a constituição das redes urbanas. No seguimento o enfoque sobre o recorte regional com prioridade para a área de estudo, relacionada com o município de Capelinha e a definição das diretrizes de planejamento que buscam a integração entre os municípios para o fortalecimento da região, estabelecendo um recorte regional que mescle as divisões espaciais estabelecidas por questões físicas, econômicas, sociais e culturais, de forma a criar uma rede de cooperações em diversos aspectos do desenvolvimento urbano e rural, através do planejamento conjunto. Por fim, algumas considerações que não se interrompem nesta abordagem.
2 INTRODUÇÃO 2.1 A ESCALA REGIONAL E OS PROBLEMAS URBANOS [...] como observa Offner (2000), atualmente convivem dois tipos de sistema urbano - o sistema de localidades centrais, com regiões formadas no entorno dos centros, e o sistema reticular, em que a cidade funciona como nó de uma rede mundial. Especialmente em um país como o Brasil, marcado por profundas desigualdades de renda e de acesso a mercados consumidores, a rede urbana divide-se entre uma arquitetura clássica desenhada pelos fluxos materiais muitas vezes limitada aos níveis hierárquicos mais elementares para parcela significativa da população (CORRÊA, 1996) – e os pontos inseridos nas redes globais, mais dinâmicos economicamente. (IBGE – Regiões de Influência das cidades 2007) A organização espacial dos lugares na forma de sistema de localidades centrais é uma evidência das regiões metropolitanas. Os centros regionais e cidades de entorno, que geralmente ficam muito dependentes destes, podem tornar-se, muitas vezes, cidades dormitório, posicionando-se como apoio àquele centro. Entretanto, este núcleo central pode fazer parte de uma rede maior, ou seja, ser um ponto inserido nas redes globais. Isto
pode acontecer quando o acesso aos serviços para suprir as necessidades de uma população são encontrados somente neste núcleo regional, fazendo com que o entorno fique a mercê do que o pólo centralizador lhe oferece. A expansão sem planejamento dos núcleos urbanos brasileiros atinge principalmente os maiores centros, aumentando assim os problemas habitacionais, de infraestrutura básica, de inserção social, entre outros. Isto ocorre pelo fato de não conseguirem antecipar e ajustarse na mesma velocidade em que o crescimento acontece. O acesso aos bens de consumo coletivos, que constituem o direito à cidade, acaba por não ser cumprido pela falta de administração de políticas públicas. A relação existente entre os grandes centros e pequenos municípios, anteriormente destacada, potencializa estes problemas, já que a convergência de demandas nos grandes centros torna ainda mais precário o acesso aos bens e serviços disponíveis à população. É neste momento que é possível perceber que a falta de articulação entre as cidades de pequeno porte pode ser uma das principais causas do aumento desta condição de dependência quase absoluta. O planejamento regional e cooperativo pode contribuir para amenizar esta situação, dando melhores condições não somente aos pequenos municípios, mas também aos grandes centros, que podem ter seus serviços menos saturados. O planejamento trabalhado regionalmente tem inicio entre 1950 e 1964, de forma incipiente, e insere-se, a princípio, nos grandes centros, devido ao crescente processo de urbanização e consequente conturbação com a metropolização das grandes cidades. Em Minas Gerais a questão regional comparece também neste período, assim, [...] a visão de planejamento voltada para a cidade e sua região viria com a própria ampliação da complexidade dos problemas urbanos. Em Belo Horizonte, a proposta da criação de um Serviço do Plano Diretor, veio em 1951, junto à administração de Renê Américo Giannetti. Já no final dos anos 1950, o processo de metropolização que perpassa o desenvolvimento da Capital do Estado, torna necessária a aglutinação de outros olhares, além da visão de engenheiros e de arquitetos. Assim teremos estudos interdisciplinares, como foram aqueles desenvolvidos para Belo Horizonte pela Sociedade para Análise Gráfica e Mecanográfica Aplicada aos Complexos Sociais - SAGMACS, estudos estes encomendados pela prefeitura em 1958. Esta pesquisa com foco sobre a estrutura urbana de Belo Horizonte serviu para a fundamentação do Plano Diretor de- senvolvido pela mesma SAGMACS, em 1961. (LIMA : 2010) Nos anos 1980, os princípios do planejamento estratégico de caráter competitivo entre as cidades se inserem. Na citação abaixo, Pedro Novais, ao tratar o tema planejamento estratégico no capítulo: Competitividade, Estratégia e Políticas Urbanas de seu livro, esclarece a questão do funcionamento das cidades neste sistema de planejamento e desenvolvimento urbano. [...] Da empresa privada assimilam-se lógicas e técnicas até então estranhas à administração pública. Apelou-se, com frequência, para sua eficiência e para a objetividade, flexibilidade e eficácia de suas
decisões, apontando como padrão a ser perseguido. Ter a empresa como parâmetro sugeria gerir a cidade como a iniciativa privada, do que resultava uma mudança na forma da ação governamental e nos seus resultados tangíveis: a maneira como está institucionalizado o processo decisório determina quais objetivos e temas têm condições de emergir na agenda política. (OFFE,1975). A referência à empresa também foi fundamental na concepção e afirmação do planejamento estratégico em cidades. A óptica que assinalava a abrangência planetária da empresa contemporânea ao ser adotada no planejamento de cidades, demandava que as unidades urbanas fossem concebidas em relação de concorrência. (NOVAIS, 2010. P. 28) Além disso, a emergência do planejamento em escala regional no Brasil esteve, desde o princípio, ligada à evolução histórica do federalismo no país. Maria Regina Nabuco, em “A (des)institucionalização das políticas regionais no Brasil” 3, destaca a necessidade, desde o princípio, de acomodação dos interesses políticos e econômicos das elites políticas regionais e locais, o chamado “coronelismo”, presente até hoje na administração pública brasileira. Hoje existe uma ampliação da organização em rede, graças às transformações decorrentes das novas e mais eficientes formas de comunicação. Não se trata de disseminar funções dentro de uma área, mas sim que as cidades trabalhem suas necessidades em forma de rede, onde os nós nunca são totalmente semelhantes, levando-se em conta as especificidades locais. Para tal análise, é necessário partir das possibilidades de relações interestaduais, inter-regionais e intermunicipais, do grau de influência e da abrangência das relações já existentes. Os consórcios intermunicipais têm sido apresentados como os exemplos mais claros de políticas de desenvolvimento regional que podem contribuir para fazer convergir interesses de municípios – uma construção coletiva de interesses – permitindo melhorias conjuntas. A possibilidade de uma ação articulada está prevista na Constituição de 1988. No art. 23 em parágrafo único, consta que: “Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios , tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)”. Em complemento, a Lei 11.107/2005, dispõe sobre a implantação e funcionamento dos consórcios públicos. Na Constituição de 1988, também está determinado que os estados podem, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas e aglomerações urbanas como instâncias administrativas, as quais, apesar de instâncias administrativas estaduais, têm regime jurídico próprio, possuindo, portanto, um órgão gestor diferenciado. Na prática, quando existentes, os consórcios têm sido firmados, em sua maioria, tendo em vista políticas específicas de saneamento, transporte, saúde, e, em poucos casos, relacionados à administração e planejamento comuns. 2.2 AS REDES URBANAS 3
A (des)institucionalização das políticas regionais no Brasil. NABUCO, Maria Regina. etc, espaço, tempo e crítica. Revista Eletrônia de Ciências Humanas e Sociais e outras coisas. 15 de Setembro de 2007, n° 2 (6), vol. 1
O IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – realiza, desde 1966, um estudo acerca das relações entre os municípios brasileiros. No inicio tratava-se de um estudo sobre a Divisão do Brasil em Regiões Funcionais Urbanas, e hoje este estudo é conhecido como REGIC – Regiões de Influência entre as Cidades. Esta análise tem como objetivo conhecer os relacionamentos entre as cidades brasileiras com base na análise dos fluxos de bens e serviços. Através da pesquisa de campo, o REGIC permite vislumbrar os diferentes tipos de centros gestores e a relação entre estes municípios integrantes deste campo. A definição destes centros classificados pelo IBGE segue alguns quesitos, como: Subordinação administrativa no setor público federal, gestão federal; Localização das sedes e filiais de empresas, gestão empresarial; Oferta de equipamentos e serviços: Informações de ligações aéreas, deslocamento para atendimentos hospitalares, áreas de cobertura das emissoras de TV, oferta de ensino superior, diversidade de atividades comerciais e serviços bancários, presença de domínios de internet, entre outros. Depois de definidos os principais centros da rede urbana, que são os principais nós da rede, a análise passa para a definição das regiões de influência destes centros. É importante salientar que nesta classificação alguns municípios localizados em regiões menos adensadas, devido a fatores demográficos e econômicos, apresentam indicativos de centralidades mais fortes que outros em regiões mais adensadas, assumindo na hierarquia um nível de centralidade mais elevado.
Mapa 1: Relações entre os ESTADOS BRASILEIROS. Fonte: IBGE - Regiões de Influência das Cidades [2007]. Ao analisar a rede de influências dentro do estado de Minas Gerais, tomando como base o Mapa 2 apresentados abaixo, é possível notar as diferentes relações das regiões de Minas Gerais entre si e com relação aos demais estados. Nota-se uma clara dispersão dos raios na região mais a norte e nordeste do Estado.
O Vale do Jequitinhonha, principalmente, região situada no nordeste do território de Minas Gerais, como mostra o mapa 4, carrega o estigma de ser uma região miserável. Estigma baseado no lento desenvolvimento em questões materiais dos municípios da região, que compõe os paradoxos formados por esta pobreza e a riqueza cultural existente no Vale. Assim, justifica-se a diminuição das redes de influência quando se considera esta região do estado, visto que o levantamento elaborado pelo IBGE no REGIC baseia-se em fluxos materiais e de interesse mercadológico, principalmente. Da mesma forma, as regiões do Vale do Mucuri e Rio Doce também possuem uma diminuição de fluxos materiais, principalmente na divisa entre estes três vales.
Mapa 2: Rede de influência dos centros de Minas Gerais com ênfase no pólo de Belo Horizonte. Fonte: IBGE [2007] Regiões de Influências das cidades. Acesso em: março de 2011.
Mapa 3: Divisão das Mesorregiões de Minas Gerais. Fonte: Base do IBGE, desenhista BOSCARIOL, A.C. Uma peculiaridade importante que merece menção é que, se comparada às outras regiões do estado, a região destacada, do Vale do Jequitinhonha, Mucuri e Rio Doce, em sua maior parte, mostra-se formada por municípios com grande extensão territorial, e, por isso, com núcleos urbanos distantes entre si. O afastamento físico acaba por dificultar a relação de cooperação entre estes municípios. Voltando à análise para a comparação das regiões do estado, as cidades mais próximas da zona de maior fluxo representada no Mapa 2 tendem a conter maior disponibilidade de serviços e equipamentos. Ou seja, quanto mais localizadas ao sudeste do estado, maior o
vínculo estabelecido entre as cidades e maior a capacidade de atendimento às necessidades da população. A definição de região pode suscitar diversas interpretações e não é objetivo deste trabalho questionar a definição correta para um conceito tão complexo. A priori, este texto busca definir um espaço enquanto região, e, para isto, trabalha as dependências entre municípios, suas particularidades e semelhanças, para chegar enfim em um recorte regional que possa ser trabalhado através de estratégias de planejamento e rede de relações, fluxos e trocas. 3 O RECORTE REGIONAL – ÁREA DE ESTUDO O primeiro passo para o desenvolvimento deste trabalho foi uma visita de campo para coleta de informações em diferentes órgãos e instâncias do município de Capelinha/MG, que se situa no Vale do Jequitinhonha, muito próxima da divisa entre os três Vales, Mucuri, Rio Doce e Jequitinhonha. Esta visita foi tomada como prioridade, visto que, para se especular qualquer intervenção ou diretriz de planejamento, é necessário um diagnóstico com o máximo de informações, ainda que este diagnóstico baseie-se na percepção empírica do espaço, depoimentos dos agentes envolvidos e observação da dinâmica local. As principais bases de dados foram pesquisas já realizadas na região, como da Fundação João Pinheiro, em Belo Horizonte, dados de institutos de pesquisa, como o IBGE, e nas secretarias municipais e empresas publicas do município de Capelinha especificamente, como EMATER, Cooperativas de Crédito Rural, Secretarias de Saúde e Obras, e o Plano Diretor da cidade, que permite uma análise regional importante para o trabalho. O material levantado é em grande parte qualitativo, por se tratar de dados já trabalhados nos projetos e planos analisados, além de conclusões tiradas pelos entrevistados envolvidos nas áreas administrativas e de pesquisa. Os materiais estudados serão citados posteriormente. Foi possível notar este potencial de expansão de relações na produção rural, principalmente de café e eucalipto, e nas características e bens culturais, de patrimônios materiais, móveis e imóveis, além da riqueza em patrimônios naturais, que não são aproveitadas pelos municípios pela falta de recursos financeiros. Porém, esta dificuldade, quando trabalhada em âmbito regional, pode ser amenizada com diferentes estratégias de cooperação intrarregional. Para se chegar a uma classificação de núcleos que poderiam servir como matriz para o desenvolvimento de ações foram feitos alguns levantamentos relacionados à relação entre os municípios dentro dos quesitos econômicos, culturais e dependência por equipamentos públicos de saúde e educação. A primeira classificação foi feita tomando por base dados estatísticos e demográficos do IBGE, delimitando assim as principais cidades próximas à região eleita para o estudo, e após este momento, as demais cidades que formariam o recorte. Por exemplo, na classificação do IBGE, Capelinha é considerada Centro de Zona “A” através do REGIC4 (que significa que ela exerce influência nos centros locais de seu entorno e que sofre influência direta da metrópole – Belo Horizonte). Assumindo-se a semelhança entre os municípios da região, Capelinha aparece como pólo centralizador, 4
REGIC – Região de Influência entre as cidades. Instituto de Geografia e Estatística Brasileiro.
integrando as cidades do entorno imediato, assim como Diamantina aparece como pólo centralizador de maior abrangência, integrando um maior número de cidades, que também foram listadas. A hierarquia neste caso funciona da seguinte forma:
Belo Horizonte
Capelinha
Água Boa, Angelândia, Aricanduva, Minas Novas e Setubinha
Mapa 4: Zona de influência de Capelinha, segundo REGIC - IBGE 2007. Fonte: Elaborado por BARBOSA, B. a partir de base cartográfica e informações do IBGE Ao se tratar das relações existentes, a cultura regional ganha destaque dentre os demais aspectos. As tradições, costumes, crenças e produtos com características peculiares do povo da região, apesar de não receberem a atenção necessária, formam um patrimônio repassado por muitos anos e que deve ser lembrado como grande movimentador da economia, tendo como base o turismo. Esta análise, portanto, objetivou ultrapassar as relações apresentadas pelo REGIC, por buscar valorizar as relações que são mais peculiares a essa região. Assim, é neste momento que os levantamentos qualitativos e empíricos, buscados junto aos representantes dos poderes públicos, empresas publicas e pesquisadores da região, se fez mais necessário. Voltando ao exemplo de Capelinha, a feira livre que se realiza no mercado municipal aos sábados conta com uma enorme variedade de produtos, que inclui, além dos gêneros triviais, artesanato em cerâmica, madeira, palha, taquara, couro, fumo de rolo, cachaça, carnes variadas e muitos outros artigos e objetos produzidos principalmente pelos moradores da zona rural de Capelinha e de municípios adjacentes. Visitantes de inúmeros lugares vêm à cidade em busca de tais artigos, que não são encontrados em outras regiões. Bares e restaurantes servem pratos da culinária local, dando ainda mais vitalidade a este espaço de experimentação cultural. Outros pólos de efervescência cultural e geradores de turismo semelhantes à feira estão em outras cidades da região, como Diamantina e Minas Novas, com importante participação na história do estado. Elas guardam importante acervo arquitetônico originário do ciclo da mineração, além das tradições regionais, como festas tradicionais e, mais especificamente nestas duas cidades, o carnaval. O artesanato em cerâmica é produzido principalmente nas cidades de Carbonita, Minas Novas, Araçuaí, Berílo, entre outras (todas as cidades inseridas no recorte dos Vales do Mucuri, Jequitinhonha e Rio Doce – MG), entrando
também como um elemento turístico com grande potencial, visto que esta produção já é bastante conhecida, inclusive em âmbito nacional. Além disso, existe a singularidade e beleza das manifestações culturais da região, como festas, grupos de música e dança, produtos, dentre outras, que formam um conjunto que se configura na autêntica cultura popular brasileira. Há um estudo que trata especificamente deste aspecto, no “Plano de desenvolvimento Integrado do Turismo Sustentável do Pólo Turístico do Vale do Jequitinhonha – PIDTS”, da Fundação João Pinheiro, no qual se faz um levantamento detalhado destas questões e especificam-se algumas diretrizes a este respeito. Destaca-se a importância que deve ser dada ao patrimônio ligado ao modo de viver e fazer do povo pertencente ao Vale do Jequitinhonha. Para a delimitação espacial, buscou-se destacar os municípios que já se relacionam por questões comerciais, dependência por equipamentos de saúde, educação, entre outros, e ainda a facilidade de acesso, ou por semelhanças e trocas culturais. Foi determinada então uma possível região de planejamento destacada no Mapa 5, que pode sofrer mutações, de acordo com o interesse de cada município. Portanto, não caracteriza um limite exato, somente municípios com uma potencial facilidade de relação com os demais.
Mapa 5: Criação do recorte região de influências com base nas relações já estabelecidas entre os municípios. Fonte: Elaborado por BARBOSA, B. a partir de base cartográfica do IBGE. 3. DIRETRIZES DE PLANEJAMENTO A priori, este trabalho busca a integração entre os municípios para o fortalecimento da região, estabelecendo um recorte regional que mescle as divisões espaciais estabelecidas por questões físicas, econômicas, sociais e culturais, de forma a criar uma rede de cooperações em diversos aspectos do desenvolvimento urbano e rural, através do planejamento conjunto.
Serão levantadas aqui apenas algumas das possibilidades e oportunidades de interação entre os municípios destacados, bem como melhorias nas soluções já existentes para alcance do mesmo objetivo. As intervenções foram divididas em “Ações para o Planejamento Regional – MACRO e MICRO”. Considerando as ações de planejamento com abrangência MACRO, para que a rede de cidades tenha suas medidas apoiadas nas necessidades coletivas efetivamente, a primeira diretriz busca integrar as ações das instituições, a fim de consolidar a gestão do Planejamento Regional com a participação popular. Dentro disto, as ações prioritárias são a criação de uma ou mais comissões consultivas para assuntos relacionados às políticas de desenvolvimento regional – Comissão de Assuntos Regionais – e a capacitação, elaboração e implantação de planos diretores nos municípios em questão que ainda não possuem a lei. Muitas das medidas levantadas podem ser consolidadas através de consórcios entre os municípios, entre outros instrumentos ainda não explorados. Com relação às questões ambientais, visto o constante aumento da monocultura do eucalipto na região, foi proposto o desenvolvimento de ações que visem à educação ambiental e à recuperação dos biomas da mata atlântica e cerrado da região, além da promoção de políticas públicas de saneamento ambiental e infraestrutura para os municípios da área urbana e rural, através da criação de uma legislação ambiental que cobre ações compensatórias das empresas que contribuem com esta degradação ambiental. Para que o fluxo entre os municípios aconteça, é necessário buscar soluções para a infraestrutura, almejando a maior acessibilidade entre os municípios da rede dos três vales e desta com as demais regiões do estado de Minas Gerais. Para isto, as medidas prioritárias concentram-se na melhoria das condições dos acessos rodoviários, relacionados ao calçamento, na manutenção da vegetação adjacente às vias, acostamentos, no incentivo à implantação de equipamentos de uso condizente, na melhoria do atendimento do transporte público, na melhoria dos aeroportos em municípios de maior fluxo e na maior exploração do potencial dos aeroportos já equipados. No que se refere às questões econômicas, foram colocadas diretrizes no sentido de incentivar a produção alimentícia como opção de sustento familiar, incentivando também a diversificação de culturas de alimentos associadas à monocultura existente de forma sustentável, e o fortalecimento do associativismo voltado para a produção e comercialização da produção rural. Assim, torna-se necessária a criação de políticas públicas que facilitem a venda dos produtos na região, consultorias técnicas para indicação dos melhores investimentos na produção rural e acesso facilitado ao crédito, além de dar condições ao produtor de acesso à água. Quanto às ações para o Planejamento Regional – MICRO foram propostos alguns equipamentos com o intuito de incentivar o desenvolvimento dos municípios. Pensando na relação entre o ensino e a cultura, foi colocado um Centro de Pesquisa e Extensão do Patrimônio Cultural Regional, tomando por base a existência da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, com pólos de atuação em três cidades do recorte da Rede dos Três Vales. A proposta tem como um dos objetivos a aproximação do aprendizado acadêmico com as práticas e conhecimentos populares, e ainda o reconhecimento da história local através da oralidade popular. Assim, ela se constitui em um Centro de Pesquisa e Extensão voltado para o conhecimento e manutenção da cultura regional. Para a instalação deste equipamento, foram proposta as sedes em Diamantina, por ser o principal
polo da UFVJM e ainda ponto referencial de cultura e patrimônio da região, e em Minas Novas, por já haver na cidade uma organização dos artesãos na forma de associações, além de sua importância na história do estado como um todo e no surgimento de núcleos urbanos na região.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS No desenvolvimento deste trabalho, algumas questões foram tratadas por vezes superficialmente, mas ainda assim merecem ser ressaltadas como “nós” essenciais para o entendimento geral da proposta e pelas abordagens mais específicas feitas. Fica então ressaltada a importância da multidisciplinaridade para a abordagem do tema aqui discutido, relacionado ao planejamento como um todo e, em especial, à questão do espaço regional. Principalmente por parte dos arquitetos e dos profissionais de outras áreas envolvidas no planejamento regional, é necessário um maior aprofundamento do debate e encarar o pensamento acerca do espaço macro, que é o regional, como uma medida que pode antecipar as soluções dos problemas locais, o espaço micro. Muitas dificuldades foram encontradas na abordagem temática que não está presente, ou é tratada de forma extremamente superficial, na maioria dos referenciais existentes, quando se trata de planejamento urbano no Brasil. Este é o caso do Estatuto da Cidade, que regulamenta o ordenamento territorial do país com grande ênfase na organização municipal, e, por consequente, os materiais daí provindos. Isto se deve também ao fato de não existir organizações regionais no Brasil, sendo, portanto, as questões e soluções tratadas nos âmbitos municipal, estadual e federal. Nota-se que, na tentativa de refazer um recorte regional, as divisões existentes desconsideram muitas relações, sendo, portanto, possível e positivo que rearranjos sejam feitos para melhor atender às necessidades e parcerias entre municípios. Assim, as regiões se sobrepõem de acordo com as necessidades particulares de cada aliança feita. Dentro das diretrizes apontadas, a organização administrativa é colocada como questão primordial para que o planejamento regional aconteça. O recorte regional dos três vales, Mucuri, Rio doce e Jequitinhonha serve como exemplo para um prática que pode ser aplicada em muitas outras realidades e regiões brasileiras. Entretanto, muitas dificuldades podem ser encontradas na aplicabilidade destas diretrizes, desde a dificuldade de uma administração neutra, até o contorno sobre os interesses particulares de cada município e a relação de concorrência ainda muito presente entre cidades de mesmo porte ou vizinhas. A cultura regional é apontada como elo entre as cidades, sendo um possível vinculo para a valorização dos produtos desenvolvidos em cada município. A efetivação de diretrizes aqui apontadas pode trazer melhorias na qualidade de vida dos moradores da cada sítio, assim como trazer para as vistas de quem não faz parte daquela região uma parte da cultura brasileira que geralmente não é notada. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Plano Diretor do Município de Belo Horizonte. (1996). Belo Horizonte:
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