DOS
Revista Bancários Ano IV - Nº 40 - Março de 2014
Publicada pelo Sindicato dos Bancários de Pernambuco
www.bancariospe.org.br
O abismo continua
A discriminação contra as mulheres no mercado de trabalho continua firme e forte. Nos bancos, por exemplo, as bancárias ganham salários bem menores que os homens e ocupam os cargos mais baixos. Mas a busca pela igualdade de oportunidades ganha, agora no Mês da Mulher, um novo aliado: o Censo da Diversidade nos Bancos, que começa a ser aplicado no dia 17
Editorial
A bancária e a carreira No Mês da Mulher, a Revista dos Bancários apresenta uma reportagem especial sobre a situação feminina nos bancos. Para quem acha que não existe discriminação, aí vão alguns números: a remuneração das bancárias é, em média, 23% menor que a dos homens, ocupando as mesmas funções; nos bancos privados, esta diferença é ainda maior: 29%; a desigualdade cresce na medida em que elas ampliam sua formação - um homem com doutorado chega a ganhar 56,5% a mais que Para quem acha uma mulher com doutorado; que não existe apenas 13,9% das bancárias discriminação têm mais de 40 anos. nos bancos, Para acabar com a discriminação contra as mubasta pesquisar lheres (e contra os negros, e verificar que as bancárias ganham, os gays e os portadores de deficiência), os bancários em média, 23% conquistaram a realização a menos que do II Censo da Diversidade, os bancários e que começa a ser aplicado ocupam os cargos nos próximos dias. A ideia mais baixos é traçar um Raio-X do perfil dos bancários para negociar com os bancos soluções para alcançar a igualdade de oportunidades. Além do Dia Internacional da Mulher, há outras datas importantes no calendário de março: o aniversário de Recife e Olinda, comemorado no dia 12, e a Data Magna, no dia 06. São quase cinco séculos de uma história marcada por batalhas, resistência e repressão. Uma história que matou incontáveis lideranças, mutilou grande parte do território de Pernambuco e que tentou varrer as lembranças, apagando os registros de luta dos livros oficiais. Para marcar a data – e refrescar a memória –, a Revista dos Bancários convidou três historiadores para a apontar importantes locais, nas duas cidades, para a História de Pernambuco – e do Brasil. E já que este mês também é de carnaval, entrevistamos uma conhecida figura da festa em Olinda: Dona Dá, que inventou um prêmio só para ver os blocos desfilarem debaixo de sua janela. Dona Dá também foi a primeira mulher homenageada no Carnaval de Olinda e, aos 75 anos, guarda histórias que se confundem com as da cidade.
2 REVISTA DOS BANCÁRIOS
Índice Censo da Diversidade
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Histórias de Recife e Olinda
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Entrevista: Dona Dá
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Dicas de cultura
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Bancário artista
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Conheça Pernambuco
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Revista Bancários DOS
Opinião
Informativo do Sindicato dos Bancários de Pernambuco Redação: Av. Manoel Borba, 564 - Boa Vista, Recife/PE - CEP 50070-00 Fone: 3316.4233 / 3316.4221 Correio eletrônico: imprensa@bancariospe.org.br Sítio na rede: www.bancariospe.org.br Presidenta: Jaqueline Mello Secretária de Comunicação: Anabele Silva Jornalista responsável: Fábio Jammal Makhoul Conselho editorial: Anabele Silva, Geraldo Times, Jaqueline Mello e João Rufino Redação: Fabiana Coelho e Fábio Jammal Makhoul Diagramação: Studio Fundação Design & Editorial Foto da capa: ©DepositPhotos / William Attard McCarthy Impressão: NGE Gráfica Tiragem: 11.000 exemplares
Dia da Mulher
Censo da Diversidade
Uma jornada de percalços
Em pleno século 21, a mulher ainda é discriminada nos bancos – ganha salários menores que os homens e ocupa cargos mais baixos. Nos próximos dias, os sindicatos e as instituições financeiras começam a aplicar o II Censo da Diversidade para traçar um Raio-X do perfil dos bancários e negociar soluções para alcançar a igualdade de oportunidades
A
partir de 17 de março, bancários e bancárias de todo país já podem acessar, no site da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), o II Censo da Diversidade. Conquistado na Campanha Nacional de 2012, ele deve ser aplicado em um universo de 486 mil bancários, de 19 bancos. “É muito importante que todos respondam o questionário pois, quanto maior o número
de participantes, melhor se desenhará o perfil da categoria, para que se possa combater as desigualdades”, afirma a presidenta do Sindicato, Jaqueline Mello. Para ela, o censo é fundamental porque vai detalhar e oficializar uma realidade que já está exposta em outras pesquisas. É o caso do diagnóstico feito pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos), levando em conta a Relação Anual de Informações Sociais de 2012 (RAIS). Segundo os dados, no final daquele ano, 48,7% da categoria bancária era composta por mulheres – ou 46% em Pernambuco. Apesar desta presença ter crescido ano após ano, o percentual ainda é menor que a participação feminina na População Economicamente Ativa. REVISTA DOS BANCÁRIOS 3
Dia da Mulher
Censo da Diversidade
SANDRA TRAJANO: A BANCÁRIA TEM QUE SE ESFORÇAR MUITO MAIS PARA CONSEGUIR ASCENDER NA CARREIRA
BANCÁRIAS OU VENDEDORAS? Se há cinquenta anos, a porta de entrada das mulheres nas instituições financeiras foi a dos bancos públicos, hoje são os privados que mais as contratam e onde elas são maioria. “A partir do momento em que os bancos passaram a ter um perfil de venda de produtos e serviços, as mulheres começaram a ser incorporadas. A impressão que fica é que, para as empresas, as características femininas, incluindo a imagem, são mais adequadas para os serviços de vendas e relacionamentos”, opina a secretária de Comunicação do Sindicato, Anabele Silva. Tal constatação fica evidente quando se observa os cargos que as mulheres ocupam e a disparidade de salários entre bancárias e bancários. Em cargos de direção, por exemplo, elas são apenas 20%. No entanto, o percentual sobe para 72% quando se trata de operadores de telemarketing e telefonistas. Por outro lado, já são maioria (52,5%) nos cargos
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de gerência – uma função que, cada vez mais, amplia o foco para vendas e negócios. No entanto, a remuneração das bancárias é, em média, 23% menor que a dos homens, ocupando as mesmas funções. Nos bancos privados, esta diferença é ainda maior: 29%. E a desigualdade cresce na medida em que elas ampliam sua formação. Um homem com doutorado chega a ganhar 56,5% a mais que uma mulher com a mesma formação. Para Sandra Trajano, responsável pela Secretaria da Mulher do Sindicato, a bancária tem que se esforçar muito mais para conseguir ascender na carreira. “Se um homem tem um MBA, a mulher tem que ter dois ou três”. Não é à toa que o nível de formação delas é bem mais alto: 72,8% dos empregados que tem curso superior completo nos bancos são mulheres. “E a impressão que eu tenho é que as avaliações profissionais não são tão rigorosas para eles quanto para nós”, completa Sandra. Ela conta que, quando assumiu a função de assistente de negócios no
Banco do Brasil, foi porque um homem ascendeu, o cargo ficou vago e não tinha outra pessoa que tivesse a mesma experiência que ela, que estava há mais tempo na agência. IMAGEM PADRÃO Para outras, a comissão não chega. E a dificuldade torna-se ainda maior quando se trata de bancárias negras. Diretora do Sindicato, Eleonora Costa é bancária há 24 anos. Nunca foi promovida. “Eu via colegas ascenderem mesmo com rendimento inferior ao meu... Só posso crer que era por conta da cor da minha pele”, afirma. A idade também pesa mais para as mulheres. Nos bancos privados, por exemplo, apenas 3,4% das bancárias têm mais de 50 anos; e apenas 13,9% têm mais de 40. Nos bancos públicos, o percentual é um pouquinho maior: 8,3% tem mais de 50 e 19,8% tem mais de 40 anos. “Isso mostra o quanto, para os bancos, a imagem da mulher importa mais que sua qualificação e experiência”, critica
Dia da Mulher a secretária de Finanças do Sindicato, Suzineide Rodrigues. Suzi foi uma das que tiveram que se redobrar em conhecimentos para compensar o fato de não ter a imagem exigida pelo banco. Ela ainda era aluna da Fundação Bradesco quando ouviu de uma diretora: “Desse jeito, você nunca vai ser contratada pelo banco”. Referia-se ao fato dela não ser magra, ter cabelos encaracolados, não usar maquiagem e ter um estilo próprio de se vestir. Apesar disso, ela conseguiu ser contratada. Mas foi mandada para o terceiro andar, onde não há atendimento ao público. Teve que aprender a se maquiar e se vestir como as outras, além de investir fortemente em sua capacitação. DUPLAS JORNADAS As responsabilidades familiares são outra grande dificuldade para as mulheres bancárias ascenderem em sua carreira profissional. “Há alguns anos, a mulher ficava em casa, garantindo todo o arcabouço para que o homem pudesse brilhar. Hoje elas estão no mercado de trabalho, mas continuam tendo que dar conta das mesmas responsabilidades”, ressalta Sandra.
Censo da Diversidade
SUZINEIDE RODRIGUES TEVE QUE INVESTIR MUITO EM SUA FORMAÇÃO PARA COMPENSAR O FATO DE NÃO TER A IMAGEM EXIGIDA PELO BRADESCO
Sílvia Natália, funcionária do Banco do Brasil há seis anos, sabe disso. Abdicou de uma comissão para se dedicar à família. O marido é empresário, precisava viajar ao interior, ela estava com um bebê de poucos meses... optou por abrir mão de sua função de assistente, voltar a ser escriturária, acompanhar o marido e ter um tempo a mais para cuidar da criança. “Alguém tem que abrir mão, né? Principalmente nos primeiros anos JAQUELINE MELLO, A PRIMEIRA MULHER A PRESIDIR O SINDICATO, AVISA: É MUITO IMPORTANTE QUE TODOS OS BANCÁRIOS RESPONDAM O QUESTIONÁRIO DO CENSO DA DIVERSIDADE. “PRECISAMOS TRAÇAR UM BOM PERFIL DA CATEGORIA PARA QUE A GENTE POSSA COMBATER AS DESIGUALDADES”
de vida, a criança precisa da mãe. E a mulher, tradicionalmente, tem esse apego maior à família”, diz Natália. Formada em Administração, ela também foi forçada a desistir de duas pós-graduações. “Tentei duas vezes. Cheguei a pagar a mensalidade e começar o curso, à distância. Mas não consegui conciliar o trabalho, a família e a formação”, conta. Atualmente, a criança está com dez meses. Enquanto a mãe trabalha, ela fica com uma babá. Mas quando ela volta, exige atenção redobrada. E, se depender de Natália, a carreira vai ter que esperar mais um pouco porque um novo bebê está chegando. O diretor do Sindicato Geraldo Times tem três filhos pequenos, mas ele a esposa Vivian dividem – por igual – as responsabilidades pela criação e educação das crianças. “Hoje em dia não existem mais tarefas de mulher e tarefas de homem em casa. Ambos devem ser responsáveis por tudo para que os dois tenham tempo de investir no trabalho e aproveitar a vida”, afirma. Para mais informações sobre o Censo da Diversidade acesse www.bancariospe.org.br. REVISTA DOS BANCÁRIOS 5
Memória
Recife e Olinda
Paisagens da história FOTOS DE IVALDO BEZERRA
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No mês de aniversário de Recife e Olinda, a Revista dos Bancários conversou com três historiadores, que elegeram os lugares mais importantes das duas cidades
Memória
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o dia 12 de março, as cidades-irmãs de Olinda e Recife completam, respectivamente, 479 e 477 anos. São quase cinco séculos de uma história marcada por batalhas e lutas; resistência e repressão. Uma repressão que matou incontáveis
lideranças, que tiveram suas cabeças e partes do corpo retalhadas e expostas em praça pública. Uma repressão que mutilou Pernambuco de grande parte de seu território. E o pior: que tentou varrer as lembranças, apagando os registros de luta dos livros oficiais. Por isso, neste mês de março, a Re-
Recife e Olinda
vista dos Bancários celebra o aniversário do Recife e de Olinda revisitando algumas de suas paisagens, à luz da história. Convidamos, para isso, três historiadores, que escolheram lugares de Olinda e de Recife que representam muito para a memória de nosso povo.
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Memória
Recife e Olinda
PAULO SANTOS Historiador, jornalista e escritor; autor dos livros “A noiva da Revolução”, sobre a Revolução de 1817 e “O general das Massas”, biografia de Abreu e Lima, além de ser responsável pela reedição de “Guerra dos Mascates”, de José Alencar. EM RECIFE: PRAÇA DA REPÚBLICA
Em 1817, não existia o Teatro de Santa Isabel e, no lugar onde hoje é o Palácio do Governo, havia restos das torres de Maurício de Nassau. Foi justamente onde se reuniram as lideranças da Revolução de 1817, que no dia 06 de março completa 197 anos, e onde foi instalado o primeiro governo brasileiro independente – com exército, marinha, bandeira e até embaixador nos Estados Unidos.
EM OLINDA: SEMINÁRIO DE OLINDA
Fundado em 1800, como um colégio jesuíta, ele tinha à frente o Padre Azevedo Coutinho, que era um intelectual, afeiçoado às artes e ao conhecimento. Por conta disso, o local virou um centro de estudos e de reflexão política. Passou por lá uma geração inteira de brasileiros, que se tornaram personagens marcantes de nossa história de luta, a exemplo de Frei Caneca.
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Memória
Recife e Olinda
LUCIANO CERQUEIRA Historiador, professor da Universidade Federal de Pernambuco, onde já foi coordenador da graduação e da pós-graduação e diretor do Centro de Filosofia. Atualmente, leciona diversas disciplinas, entre as quais História Antiga. EM RECIFE: PERCURSO ENTRE A RUA DA SOLEDADE E RUA DO PRÍNCIPE
Junto à Igreja da Soledade, em 1930, havia um arsenal do exército. O tenente Eli Coutinho havia convocado seus alunos para uma demonstração, mas trocou as balas de festim por balas de verdade e convidou os alunos a se somarem a ele. O grupo invadiu o arsenal do exército e, com as armas em mãos, seguiu até a Rua do Príncipe, onde funcionava uma empresa de transportes. Lá, convidaram os operários a se juntar ao grupo, distribuíram as armas e, no dia seguinte, os combates tomaram as ruas. No fim do dia, teve até bloco de carnaval para comemorar o sucesso da Revolução.
EM OLINDA: RUÍNAS DO SENADO DA CÂMARA, NA RIBEIRA
No local onde hoje restam as ruínas de um muro, em frente ao Mercado da Ribeira, funcionou entre os séculos XVII e XVIII, o Prédio do Senado da Câmara de Olinda. Foi lá que, em novembro de 1710, antes mesmo da Revolução Francesa e da Independência dos Estados Unidos, o vereador Bernardo Vieira de Melo deu o primeiro grito de República no Brasil. Os senhores de engenho de Olinda, revoltaram-se contra os comerciantes portugueses que moravam no Recife, que impunham preços altíssimos para as mercadorias e compravam a matéria-prima a custos baixos. Foi a Guerra dos Mascates, que passou a ser um grito de revolta contra o Império e suas regras comerciais.
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Memória
Recife e Olinda
JOSÉ ERNANI SOUTO ANDRADE Bacharel em filosofia e direito; com licenciatura em história e especialização em História de Pernambuco. Foi professor da Universidade Católica de Pernambuco durante vários anos e, atualmente, leciona na Funeso.
EM RECIFE: PERCURSO DO ARQUIVO PÚBLICO AO FORTE DAS CINCO PONTAS
No Arquivo Público, da Rua do Imperador, instalava-se a cadeia onde foi preso Frei Caneca. De lá, ele foi conduzido em direção ao Forte, onde fora montado o espetáculo para o enforcamento. No Pátio do Terço, tiraram suas vestes sacerdotais. Mas ao chegar ao Forte das Cinco Pontas, três carrascos recusaram-se a enforcá-lo. Ele foi então amarrado a uma das hastes da forca e fuzilado.
EM OLINDA: ALTO DA SÉ
Além de ter sido o ponto onde teve origem a cidade, foi também um marco na luta contra os invasores holandeses. Ali, onde fica a Academia Santa Gertrudes, morava o Capitão Temudo. Ao observar o movimento dos holandeses, que depois de invadir o local, tinham saqueado igrejas e comemoravam festivamente, ele saiu armado para combater os invasores. Matou um bocado de holandês e terminou sendo morto na calçada da Ladeira da Misericórdia, onde hoje há uma placa lembrando o fato.
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Dona Dá
FOTOS: IVALDO BEZERRA
Entrevista
A Dona da Folia Dona Dá, primeira mulher homenageada no Carnaval de Olinda, deu um jeito da folia sempre passar em sua janela
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ão 75 anos de carnaval. Afinal, a vida de Dona Dá, ou melhor, de Jodecilda Airola da Silva, sempre esteve ligada a Momo. “Eu brinco desde que me entendo por gente...”, diz. Seu amor pelo Carnaval é tão grande que há quase trinta anos ela arrumou um jeitinho da folia, em Olinda, sempre passar em sua janela. Toda troça ou bloco que passe em frente ao número 207 da Rua da Boa Hora é premiado, com troféus confeccionados por diversos artesãos. Dona Dá ama cada agremiação, cada clube, cada troça. Chegou a brigar com a diretoria do Homem da Meia Noite quando ele deixou de passar pela Rua da Boa Hora, por questões de segurança. Mas arrumou um jeito de vê-lo passar. Toda quarta-feira de cinzas, sua casa também vira a mo-
TODA TROÇA OU BLOCO QUE PASSE EM FRENTE AO NÚMERO 207 DA RUA DA BOA HORA É PREMIADO POR DONA DÁ
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Entrevista
Dona Dá
“Eu começo a brincar carnaval no dia primeiro de janeiro e só paro depois do Bacalhau do Batata”
rada dos bois: dezenas deles chegam, de várias partes do estado, para o Encontro de Bois da Rua da Boa Hora. Não é por acaso que ela, Dona Dá, foi a primeira mulher homenageada no Carnaval de Olinda. E nesta edição de março – mês da mulher e dos festejos de Momo – é a Revista dos Bancários quem presta sua homenagem. Como surgiu essa ideia de premiar as troças? Foi em 85. Eu tinha me mudado da Rua Henrique Dias para a Rua da Boa Hora. E, nesta época, no Carnaval, não passava troça nenhuma por lá. Diziam os mais antigos que, muitos anos antes, não era assim, que a rua era bem animada. Então, os vizinhos se juntaram e decidiram que tinham que fazer alguma coisa – porque todo mundo gostava muito de carnaval. A gente fez então uma festinha: vendeu os convites, fez um sarapatel e, com o dinheiro, come-
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çamos a fazer prêmios para distribuir às troças que passassem por aqui. Eu fiquei responsável por levar o ofício às agremiações, para comunicar a existência do prêmio. Hoje em dia, não precisa mais disso: todo mundo já sabe, faz parte do calendário de carnaval... E quem confecciona os prêmios? Os artistas. Cada ano, é um artista diferente, um troféu diferente. Já teve em formato de caranguejo pra lembrar Chico Science; em homenagem ao Homem da Meia Noite, a Luiz Gonzaga... Já deu pra perceber que a senhora gosta muito de carnaval... Sempre foi assim? A senhora nasceu em Olinda? Eu sou recifense, mas passei minha infância em Olinda. Eu e meu irmão fomos criados na casa de meu tio. E minha avó era zeladora da igreja evangélica que fica na Rua 13 de Maio. Morava num espaço nos fundos da igreja. Então
passei minha infância inteira aqui. E o carnaval, como era? Ah, era bom demais. Mas eu não tinha a liberdade que tenho hoje... Sempre gostei demais de carnaval. Em toda minha vida, acho que teve só uns quatro anos que eu não brinquei. A primeira vez, eu nunca esqueço, eu era adolescente e, nesta época, tinha exame de admissão para cursar o ginásio. Eu fui reprovada e me deram o pior castigo que podia existir pra mim: ficar sem carnaval. Depois, eu casei, fiquei grávida e, no carnaval, a menina estava prestes a nascer. Depois veio a outra que eu tinha acabado de botar no mundo... e assim foram três carnavais. Quando veio o de 64, eu tirei o atraso: deixei as crianças com a avó, saí na sexta e só voltei na noite da quarta-feira de cinzas. Eu e umas dezoito pessoas, todo mundo vestido de palhaço, a cara toda pintada... Quando as meninas ficaram adolescentes, a gente brincava de dia em
Entrevista Olinda, mas quando chegava de noite elas queriam ir pro clube. Eu ia. Mas aquilo pra mim era um tormento. Para quem gosta de carnaval de rua, não tem coisa pior que passar a noite arrodeando o salão de um clube. E a senhora ainda brinca? Brinco. Só paro depois do Bacalhau do Batata. Quando chega na quarta-feira de cinzas, eu acordo logo cedo, deixo as frutas e tudo preparado para o Encontro de Bois, e vou me embora pro Bacalhau. E o Encontro de Bois? Fala um pouquinho sobre ele. Como surgiu? Foi no carnaval de 2000. A gente conseguiu aprovar um projeto, no Incentivo à Cultura do governo, e organizou uma festa muito boa. A gente prestou homenagem e entregou premiações a dez pessoas – entre artistas, políticos e autoridades que tivessem importância para o carnaval. Uma destas pessoas era Antônio Carlos da Nóbrega, que diziam que ele tinha tido um boi lá na Rua da Hora. Ele justificou e disse que não poderia estar presente no dia da festa. Mas falou que passaria aqui na quarta-feira de cinzas. Então a gente resolveu fazer uma mesinha de frutas e chamar também outras pessoas conhecidas, que tivessem boi. Um foi avisando o outro, Zé da Macuca ajudou muito e, quando chegou a quarta-feira, tinha um bocado de boi por aqui. Só Antônio Carlos Nóbrega não veio. Mas o encontro ficou e, todo ano, a rua da Boa Hora se enche de bois na quarta-feira de cinzas... A senhora, que homenageia tanta gente, já foi homenageada? Fui a primeira mulher homenageada no Carnaval de Olinda, em 2004. E fui homenageada do Homem da Meia Noite em 2011. E a senhora acompanha o Homem da Meia Noite?
E eu sou doida de perder o Homem? No ano passado, eu fiquei brigada com a direção, porque ele deixou de descer pela Rua da Boa Hora. Eu até entendo: tem a questão da segurança. Mas fiquei chateada. Só que não deixei de ver o Homem não... Juntamos um grupo e alugamos um espaço lá nos Quatro Cantos pra poder vê-lo passar. Olinda inteira ama o Homem da Meia Noite. No ano em que ele saiu com uma ala de alegorias, minha neta foi um dos destaques. Depois, ela chegou pra mim e disse: - Vó, meu sonho é entregar o Homem em casa e tirar o Cariri da sede. Quando foi nos quinze anos dela, fomos juntas até o final, quando o Homem entrega a chave do carnaval pro Cariri, volta pra casa e o Cariri sai pras ruas... Nas prévias, a senhora também brinca? Eu começo a brincar carnaval no dia primeiro de janeiro. Tinha uma troça, chamada “Mole não entra”, que saía às
Dona Dá
seis horas da manhã do dia primeiro. Só que eles deixaram de sair. Disseram que começou a ter muita confusão, insegurança... Mas no Guadalupe tem um bar, o Bar do Ró, que bem cedinho, no dia primeiro de janeiro, serve um sopão e puxa a troça. Todo ano, eu junto o pessoal e a gente vai. Sábado passado (15 de fevereiro) o Cariri passou por aqui, com estandarte novo, comemorando aniversário... Foi aquela alegria, aquela troca de carinhos... toda troça que passa por aqui é assim: o maior amor. E qual a diferença do carnaval de sua infância e do de hoje? Ah! Hoje em dia tem muito vandalismo, muita confusão... gente que vai pra rua pra arrumar briga. Antigamente, tinha aquelas desavenças entre os blocos quando cruzava Vassourinhas e Elefante, por exemplo. Mas era uma briga mais saudável, não é como hoje. Às vezes tenho até pena do pessoal que gosta de brincar e não consegue.
“Hoje em dia tem muito
vandalismo, muita confusão... Antigamente, até a briga era mais saudável” REVISTA DOS BANCÁRIOS 13
Cultura
Dicas
Março é das mulheres
O SINDICATO VAI LEVAR MÚSICA AO AMBIENTE DE TRABALHO PARA HOMENAGEAR AS BANCÁRIAS
FILIP LUNDEHOLM / SXC.HU
O Sindicato tem uma programação especial para as mulheres neste mês de março. De 11 a 14, os diretores estarão nas agências, acompanhados por um dueto de flauta e violino, para homenagear as bancárias e presenteá-las com um brinde especial. No Dia Internacional da Mulher, 8 de março, bancários e bancárias estão convidados para o Passeio Ciclístico em homenagem à Mulher. O mês encerra com reflexão e discussão: no dia 31, haverá debate, no auditório do Sindicato, sobre a reforma política e as mulheres, com a deputada federal Érika Kokay (PT-DF).
PASSEIO CICLÍSTICO EM HOMENAGEM À MULHER
TROUBLES8 /SXC.HU
Oito de Março, Dia Internacional da Mulher, é dia de passear de bicicleta pelas ruas do Recife. O Sindicato firmou parceria com a Apcef (Associação de Pessoal da Caixa) e garantiu que trabalhadores de todos os bancos, e seus dependentes, possam participar do passeio. A saída é em frente ao Círculo Militar, a partir das 15 horas. Os ciclistas podem ir com sua bicicleta ou alugar uma no local. As inscrições podem ser feitas, de 24 a 28 de fevereiro, pelo site do Sindicato, ou no próprio local, no dia da atividade.
LITERATURA RECOMENDADOS Olho Morto Amarelo
O livro de contos do escritor goiano, radicado em Petrolina, Bruno Liberal, foi o grande vencedor do Prêmio Pernambuco de Literatura. Olho Morto Amarelo, além de ganhar na categoria geral, foi também o vencedor do Sertão. O lançamento das obras premiadas está previsto para o dia 13, no Museu do Estado.
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Recife, no hay
Da Região Metropolitana, o vencedor do Prêmio Pernambuco de Literatura é um bancário. Delmo Montenegro, do BB, é poeta de longa trajetória. Foi um dos organizadores da antologia Invenção Recife, tem dois livros publicados e é um dos editores da revista de literatura Entretanto.
Bancário Artista
GABRIEL NEGREIROS / SXC.HU
Cultura
BRUNO ROSENDO
Samba desde criancinha Bancário do Bradesco, Bruno Rosendo sempre amou o samba. Por causa disso, aprendeu, sozinho, a tocar cavaquinho, banjo, teclado, pandeiro...
B
runo Rosendo, funcionário do Bradesco há cinco anos, sempre gostou de música. Mesmo sendo uma pessoa caseira, que não costuma frequentar rodas de samba, ele tinha paixão especial pelo ritmo desde criança. Tanto que, aos dez anos de idade, por iniciativa própria, decidiu aprender a tocar cavaquinho com um professor do bairro onde morava, Maranguape. Teve aulas durante seis meses. Depois, tornou-se autodidata. Sozinho, aprendeu a tocar, além de cavaquinho, banjo, teclado, pandeiro, entre outros instrumentos. Na adolescência, junto com os colegas do bairro, criou o grupo de pagode Suingue Malícia, com o qual tocou durante três a quatro anos. Então se converteu. Passou a frequentar a igreja e, para exercer sua fé junto com sua arte, teve que aprender novos instrumentos, como o violão e a guitarra. Passou a tocar no Ministério Dominical. Há cerca de quatro meses, retornou à sua paixão antiga, sem deixar de lado
sua fé. Passou a integrar um grupo de samba gospel, chamado “Infinitamente Mais”. Com o grupo, passou a tocar em eventos como a Marcha para Jesus, em casas de recuperação para drogados, além de igrejas. A maioria das canções tocadas são de outros cantores de música secular, já reconhecidos nacionalmente. Mas o “Infinitamente Mais” tem também seis músicas autorais. “Em nossas canções, exaltamos o amor de Deus, o poder de Cristo na luta contra as drogas e dificuldades da vida, e a importância da fé para a afirmação do caráter”, diz Bruno. REVISTA DOS BANCÁRIOS 15
Turismo
Conheça Pernambuco
VITÓRIA DE SANTO ANTÃO
Onde a memória não se perde
E
ra março de 1817. Há vários meses, um grupo de conhecidos se reunia, secretamente, para planejar o movimento que libertaria o Brasil de Portugal e o tornaria um país independente. A ordem de prisão para as lideranças chegou antes que a ideia se alastrasse nacionalmente. Mas, no dia 6 de março, ao receber a ordem de prisão, o Capitão José de Barros Lima desembainhou a espada e reagiu, conclamando os colegas a se unirem a ele no que seria a Revolução Pernambucana de 1817. Pouco se fala sobre isso nos livros de história. Mas, na cidade de Vitória de Santo Antão, um monumento no centro de uma praça impede que o fato, que deu origem à Data Magna do Estado de Pernambuco, caia no esquecimento. É o Monumento ao Leão Coroado – alcunha pela qual ficou conhecido o Capitão Barros Lima. Vitória é, aliás, farta em lições de história. O Sítio Monte das Tabocas, por
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exemplo, foi palco de célebre batalha entre os luso-brasileiros, liderados por Antônio Dias e João Fernandes Vieira, e os invasores holandeses. Após a vitória, Fernandes Vieira prometeu construir no lugar uma igreja – o que só aconteceu três séculos depois, em 1945, quando foi inaugurada a Capela de Nossa Senhora de Nazaré – toda construída com pedras do local. É lá também que fica o prédio que serviu de hospedagem para o imperador Dom Pedro II e Dona Teresa Cristina, em visita ao Estado no ano de 1859. Hoje, ele abriga o Instituto Histórico e Geográfico, mas sua arquitetura chama a atenção, com revestimento em azulejo decorado. Na Estação Ferroviária, que um dia foi a primeira parada de desembarque de passageiros e cargas do destino Recife-Caruaru, hoje funciona uma biblioteca e algumas oficinas culturais. O apreço da cidade pela preservação de sua memória fica evidente no número de monumentos construídos. Nenhuma cidade do interior do estado tem tantos monumentos quanto Vitória de Santo Antão. São quatorze estátuas, erguidas em praças e avenidas, que simbolizam momentos marcantes da história – como é o caso do Anjo da Vitória – uma coluna com cerca de cinco metros de altura, encimada pela estátua de um anjo, com aproximadamente dois metros: homenagem aos que lutaram na Batalha das Tabocas. O mais recente monumento foi erguido na passagem dos 500 anos de descobrimento do Brasil pelos europeus. Na Praça do Livramento, um índio, arco e flecha na mão, celebra os primeiros habitantes do país.