Revista dos Bancários 63

nº 63 - nov/dez 2016

ano 6

PRIMAVERA SECUNDARISTA Mais de 1 mil escolas e universidades estão ocupadas por estudantes brasileiros, que lutam contra Reforma do Ensino Médio e a aprovação da PEC 55. Apesar da tentativa das instituições de criminalizar o movimento, os acampamentos resistem há mais de 30 dias em todo o País. As propostas apresentadas pelo governo Michel Temer ameaçam não só os estudantes, mas toda a sociedade.

Revista dos Bancários Publicação do Sindicato dos Bancários de Pernambuco

Redação Av. Manoel Borba, 564 - Boa Vista, Recife/PE - CEP 50070-00 Fone (81) 3316.4233 / 3316.4221 Site www.bancariospe.org.br Presidenta Suzineide Rodrigues Secretária de Comunicação Daniella Almeida Conselho Editorial Adeílton Filho, Cleonildo Cruz, Daniella Almeida e Suzineide Rodrigues Coordenação e supervisão Tempus Comunicação Jornalista responsável Micheline Américo Redação Beatriz Albuquerque, Camila Lima, Jonatas Campos e Wellington Correia Projeto gráfico e diagramação Bruno Lombardi - Studio Fundação Imagem de capa Movimento Ocupe UPE Impressão CCS Gráfica Tiragem 12.000 exemplares

Sindicato filiado a

/bancariospe

2

Revista dos Bancários

Editorial

Coração de Estudante O Brasil atravessa um dos mais difíceis momentos políticos de sua história. O atual governo de Michel Temer está impondo uma agenda de retrocessos sociais reclamada até por aqueles que, de certo modo, não fizeram objeção ao modo controverso como o tal chegou à Presidência da República. Seu projeto neoliberal inclui a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 55, antiga PEC 241, que pretende reduzir e congelar por 20 anos os investimentos sociais; a Medida Provisória 746 de reforma do Ensino Médio que impõe uma formação precária para quem advém de famílias pobres, buscando perenizar uma mão de obra barata ao mercado; o Projeto de Lei da “Escola Sem Partido” que cerceia a reflexão crítica nas escolas, além de propostas de reforma da previdência social com a ampliação para 65 anos o tempo de contribuição, precarização das condições de trabalho e privatização de empresas estatais.

Em protesto, os estudantes vêm ocupando mais de 1.190 instituições de ensino Brasil afora. O direito à manifestação é um princípio basilar do Estado Democrático que construímos a duras penas e se constitui como o mais poderoso instrumento de resistência e transformação social. É de se estranhar que a maioria da população ainda esteja paralisada diante das atrocidades cometidas contra nossa cidadania. É de assombrar ainda mais que a sociedade se deixe manipular por discursos de aparelhos de Estado e de televisão que tentam oprimir e criminalizar jovens que lutam legitimamente por uma educação pública de qualidade para todos e por um país justo.

O atual governo, apoiado pelas corporações de mídia, joga ardilosamente estudante contra estudante, pais contra pais, trabalhador contra trabalhador, para nos enfraquecer como sujeitos coletivos. Seguramente, não há conflito de interesses entre aqueles que desejam ir à aula, aqueles que precisam fazer o teste do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e aqueles que lutam por um sistema educacional de qualidade, já que a ocupação do espaço público é direito de todos. Aliás, é necessário compreender, que se as reformas neoliberais lograrem êxito, a educação será sucateada e universidades públicas voltarão a ser reduto da elite brasileira, como foi no nosso passado recente o qual não devemos esquecer.

Em nome da democracia brasileira, repudiamos veementemente a posição truculenta do Estado e a falácia midiática diante das ocupações e nos solidarizamos à luta nobre, legítima e justa do movimento Ocupe que deve ser assumida por todos nós com a coragem e a fé de um coração de estudante, como bem disse o poeta.

Fabiano Moura Presidente Interino do Sindicato dos Bancários de Pernambuco

RESISTÊNCIA Estudantes ocupam mais de 1 mil escolas e universidades em defesa da Educação ENTREVISTA A filósofa Márcia Tiburi avalia a conjuntura política do País após a consolidação do impeachment de Dilma Rousseff Página 6

04 HISTÓRIA Sindicato completa 85 anos de luta em defesa dos bancários Página 10

BANCÁRIO DE TALENTO Página 15

CIDADANIA Campanha do Laço Branco conscientiza homens sobre o combate a violência contra as mulheres Página 12

POLÍTICA PEC 55 limita teto dos gastos públicos por 20 anos

CONHEÇA PERNAMBUCO Vale do São Franscisco: um oásis no Sertão Página 16

Página 8 Novembro e Dezembro de 2016

3

Resistência

A primavera secundarista Estudantes ocupam mais de 1 mil escolas e universidades do País em defesa da educação pública.

A resistência é mantida contra a Reforma do Ensino Médio, a PEC 55 e a Lei da Mordaça

H

á mais de 30 dias, o movimento de ocupações de escolas e universidades públicas e privadas está mobilizando milhares de estudantes por todo o Brasil. A resistência estudantil surgiu como forma de protesto contra a Medida Provisória 746 da Reforma do Ensino Médio, o PL 867 da Escola Sem Partido e a PEC 241, agora PEC 55 em tramitação no Senado Federal.

A chamada “Primavera Secundarista” recebeu pouca visibilidade da mídia nacional, apesar de trazer como pauta de reivindicação temas de grande impacto para a Educação do País. Muitas pessoas, inclusive, só tomaram conhecimento sobre as ocupações quando o Tribunal Superior

4

Revista dos Bancários

Eleitoral (TSE) anunciou a mudança de locais de votação ou quando o Ministério da Educação (MEC) adiou a realização do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) para os estudantes que tinham como local de prova escolas ocupadas.

O ministro da Educação Mendonça Filho chegou a declarar que iria acionar a Advocacia Geral da União para cobrar das entidades estudantis os prejuízos gerados pelo adiamento das provas do ENEM. A União Nacional dos Estudantes (UNE), a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) e a Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG) repudiaram em nota pública a atitude do ministro, alegando que “ao adiar a realização do ENEM nas instituições ocupadas para o mês de dezembro, o ministério tenta lamentavelmente colocar os estudantes uns contra os outros. E, ao punir financeiramente as entidades, tenta criminalizar o movimento estudantil buscando enfraquecer o movimento legítimo das ocupações”.

Até o momento, 1.197 escolas estão ocupadas em todo o país de acordo com o levantamento da UBES. Em Pernambuco, os estudantes ocuparam prédios da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), da Universidade de Pernambuco (UPE), da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), do Instituto Federal de Pernambuco (IFPE), da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), além de escolas estaduais na Região Metropolitana, Sertão e Zona da Mata.

De acordo com a comissão do Ocupa UFPE, o movimento dos estudantes é autônomo e autogestionado. “Todas as nossas questões polêmicas e controversas são discutidas em assembleias, que fortalecem a nossa integração e a resolução das nossas diferenças. Além disso, nos distribuímos em comissões, tais como estrutura, comunicação, alimentação, cuidado e saúde, limpeza, segurança, etc., que nos ajudam a realizar nossas tarefas e objetivos”, explica.

A programação de atividades nos centros acadêmicos ocupados contam com aulas públicas, oficinas, debates e atividades culturais, que envolvem estudantes, professores, servidores e a população que apoia a causa. Os acampamentos estão sendo mantidos com doações de alimentação, água e materiais de limpeza.

As ocupações acontecem como ato de enfrentamento à PEC 55, que congelará investimentos públicos nos próximos 20 anos, impedindo a implementação do Plano Nacional de Educação e

“Ao final dos dez primeiros anos (a PEC 55) acabaria por encolher os serviços públicos, de modo que abriria espaço para o crescimento do setor privado” Movimento Ocupa UFPE a meta de atingir 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação. Para o Ocupa UFPE, as propostas apresentadas pelo Governo Federal para solucionar os problemas econômicos do País estão relacionadas a retomada de uma política neoliberal. “Esta medida constitui uma reforma do nosso Estado como não se via há décadas, e tudo feito num governo interino, ou seja, o que

eles querem fazer é criar uma situação na qual, a partir dos próximos dois governos, a saúde e educação pública sofram com uma falta de investimentos que ao final dos dez primeiros anos acabaria por encolher os serviços públicos, de modo que abriria espaço para o crescimento do setor privado”, afirma o movimento.

Os estudantes também criticam a Medida Provisória 746/2016, que altera trechos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) para adotar, entre outras coisas, o turno integral e o ensino profissionalizante. Além disso, a medida promove um enxugamento das disciplinas obrigatórias, que atualmente são 13, aplicando uma metodologia de ensino por módulos temáticos escolhidos a critério da escola. “A MP é uma deformação interessada apenas em formar mão de obra barata e tecnicista.

As ocupações denunciam a falta de democracia e o autoritarismo da MP que não condiz com o modelo de ensino médio que queremos”, explica a presidenta da UBES, Camila Lanes.

Novembro e Dezembro de 2016

5

Entrevista: Marcia Tiburi

“O Governo Temer se tornou sinônimo de retrocesso”

A

s primeiras medidas anunciadas pelo governo do presidente Michel Temer se colocam à serviço de um projeto neoliberal que ameaça os direitos conquistados pelos trabalhadores brasileiros. Para aprofundar a reflexão sobre a atual conjuntura política do País, entrevistamos a filósofa Marcia Tiburi.

Todas as medidas econômicas, mudanças nas políticas sociais e reviravolta na postura internacional nesses últimos seis meses de Governo Temer, podem ser considerados retrocessos para o País?

O Governo Temer se tornou sinônimo de retrocesso. Não por acaso a curiosa figura de Temer é associada a um vampiro, o tirano arcaico e ultrapassado, que só a ideia do morto-vivo é capaz de representar.

O próprio Temer deve sofrer a sua parte do “golpe” em breve, porque não é ele o inventor do golpe cujas cenas do próximo capítulo já se anunciam, é apenas mais um. Foi um

6

Revista dos Bancários

colaborador e sua própria vez está chegando. Como cidadãos, amargamos os efeitos da máquina autoritária que ele ajuda a fazer funcionar. Lá se vão seis meses que atualizam o que foi sinalizado nos primeiros dias desse governo ilegítimo. A PEC 241, atualmente no senado PEC 55, é um coroamento da desgraça política, social e econômica que assola o País. Ninguém pode acreditar que um congelamento de 20 anos dos investimentos em saúde e educação seja uma medida razoável. É o retrocesso lançado como uma bomba para o futuro. Espera-se que o país não cresça, que não se modifique? Perguntamo-nos estupefatos e sabemos que esse pacote não tem nada a ver com defender o país, que ele serve a interesses do grande capital internacional que sempre viu no Brasil a colônia que não conseguimos deixar de ser. A PEC em questão é apenas a parte que podemos ver de um programa neoliberal que espera o escoamento fácil do capital brasileiro para os fins do rentismo em voga, em palavras simples: para os cofres e bolsos do grande capital. Os trabalhadores e suas famílias, os jovens, os desfavorecidos pagarão a conta. No caso da educação, para não falar das ameaças sobre o campo da saúde, fica evidente o desmantelamento do País. A pergunta que fica é: que necessidade tinha esse governo de exterminar programas da educação, de propor o fim de tantas políticas, de propor uma MP tal como a que atinge o ensino médio? Ao mesmo tempo, sabemos que o programa neoliberal exige sua privatização.

Mas isso é garantia de desigualdade social e, inevitavelmente, de sofrimento econômico, social e inevitável insegurança para todos. O sonho do estado de bem-estar social torna-se o pesadelo de um mal estar nos próximos 20 anos como metáfora de uma país sem futuro.

A base de apoio ao Governo Temer na Câmara e no Senado, inclusive com deputados e senadores que se colocavam no campo progressista, vem aprovando em tempo recorde medida prejudiciais aos trabalhadores. A

senhora considera grave a dependência do parlamento brasileiro ao poder Executivo?

Mais grave ainda talvez seja o próprio parlamento brasileiro conservador, retrógrado, neoliberal, desonesto no pior sentido de usar a coisa pública para fins privados. Devemos voltar à fundamental separação entre os poderes. Essa separação é pro forma, ela é falsa. Se pensarmos no caso dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) nomeados pelo presidente, fica claro do que falamos. Devemos lembrar que o próprio Executivo não é livre do Legislativo. O governo de Dilma Rousseff trabalhou em termos de ingovernabilidade o tempo todo.

E isso tem a ver com o chamado “presidencialismo de coalizão” – a expressão que se tornou famosa a partir de um artigo acadêmico do sociólogo Sérgio Abranches - que apenas renova como um mecanismo repetitivo a tensão comum entre o fragmentado Legislativo e o Executivo amarrado aos interesses desse Legislativo caótico. Uma reforma política séria teria que rever essa estrutura.

Falta reflexão da sociedade brasileira sobre os impactos do impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff?

Falta, com certeza. Esse golpe é parte de um modelo cujos golpes anteriores são exemplo. A gente pode até dizer que o golpe tornou-se um método político no Brasil.

Devíamos perceber que o golpe é genealógico para as colônias.

Ele nasce e renasce, ele replica. E o Brasil é de todas as colônias do

Império, talvez a mais promissora.

Lembremos dos chamados golpes brandos, ou brancos, dados nos países latino-americanos recentemente (Haiti, Honduras, Paraguai) e também das tentativas de golpe (Equador, Venezuela, Bolívia). O que as pessoas não têm condições de ver está oculto sob véus ideológicos bem manipulados pelos meios de comunicação aos quais sua capacidade de perceber e pensar está entregue. Faz-se os brasileiros esquecerem da sua própria história e da própria história da América Latina. Não penso, evidentemente, que a pergunta e a resposta estejam simplesmente na história. Há uma construção contemporânea do golpe, o interesse que além de histórico, é também imediato sobre o Brasil como um manancial de riquezas naturais – que envolvem também as pessoas. Foi assim em 1500, com o ouro e a madeira e com a mão de obra, hoje com o nióbio, o pré-sal e os trabalhadores.

Hoje, ainda existe Estado Democrático de Direito no Brasil?

Temos o seu exoesqueleto, digamos assim. Do interior da democracia nasceu um monstro autoritário

que deixou uma casca. Contemplamos essa casca abandonada ao chão com saudade. Com os diversos atos de humilhação da Constituição de 1988 que temos visto, não podemos mais dizer que exista esse Estado Democrático de Direito senão como uma fachada que acoberta um profundo desrespeito dos próprios agentes jurídicos às próprias leis.

Garantias fundamentais e direitos humanos que constituíam o Estado Democrático de Direito perdem vez. Os atores jurídicos que hoje surgem como heróis autoritários provam o seu fim, pois eles mesmos agem como tiranos e não como sujeitos que também devem observar as leis, sobretudo a Constituição. O problema então é que se a Constituição não existe, tudo é permitido. É o que temos visto no Brasil. Dilma Rousseff sofreu um processo abusivo até que o fraco argumento do crime de responsabilidade perdeu lugar, mas mesmo assim foi a chave pelo qual o Legislativo e o Judiciário, bem como a mídia, conseguiu o que queriam. Prisões e outros atos policiais sobre cidadãos e políticos, num clima de evidente perseguição, completam o fim do Estado Democrático de Direitos.

Novembro e Dezembro de 2016

7

Política e Democracia

PEC 55 ameaça políticas públicas

A

aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que agora tramita no Senado como PEC 55, trará impactos devastadores para as políticas públicas do País. A constatação feita por especialistas aponta para consequências graves, como o estrangulamento dos investimentos para a Saúde e a Educação e a imposição de um projeto de Estado mínimo não referendado nas urnas.

8

Revista dos Bancários

A PEC 55 foi apresentada como uma das principais propostas do governo Michel Temer para reequilibrar as contas públicas e recuperar a economia brasileira. A medida prevê um limite anual de despesas para os três poderes ao longo dos próximos 20 anos.

Se aprovada, os limites mínimos constitucionais definidos para aplicação nas áreas de Saúde e Educação baseado no percentual das receitas, também serão corrigidos na forma estabelecida na PEC, ou seja, o limite total de gastos anual será estabelecido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do ano anterior.

Um estudo desenvolvido pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócioeconômicos (Dieese) simulou os efeitos da PEC 55, supondo um intervalo de dez anos (2006/2015), aplicando as regras previstas no projeto. Os resultados do relatório indicam: perda acumulada na despesa primária na ordem de R$ 2,2 trilhões (queda de 44% no orçamento após dez

anos); perda acumulada de R$ 111 bilhões no Ministério da Educação (queda de 62% no orçamento); perda acumulada de R$ 149,7 bilhões no Ministério da Saúde (queda de 36% no orçamento); e perda de R$ 79,2 bilhões no Ministério do Desenvolvimento Social (queda de 50,1% no orçamento).

De acordo com o relatório do Dieese: “no ajuste que está sendo conduzido, as despesas financeiras - pagamento de juros e amortização da dívida pública - que consomem aproximadamente 45% do orçamento geral da União, são desconsideradas pela nova equipe econômica. Despesas que de alguma forma têm impacto sobre a vida do trabalhador, como, por exemplo, as relacionadas à Previdência Social e aos sistemas de saúde e de educação públicos é que acabam servindo de margem para a nova política fiscal”.

Para a economista Tânia Bacelar, caso a PEC 55 seja aprovada, as políticas públicas não serão beneficiadas com impactos positivos quando a economia retomar o crescimento. “Todo o adicional

resultante do impacto positivo da dinâmica da economia sobre a receita pública vai para despesas com a dívida e, portanto, para os agentes econômicos que vivem de financiar o Governo, como bancos, aplicadores etc. e não para políticas públicas. Isso durante 20 anos, ao longo dos quais, por exemplo a população de idosos no País vai passar dos 12% atuais para 21,5% da população total em 2036. E todos sabemos que este crescimento dos idosos exercerá forte pressão para aumentar os gastos com a

saúde”, justifica a economista.

A nova regra não prevê nenhum mecanismo para lidar com crises econômicas. Ao contrário, tende a engessar a política fiscal por duas décadas. Segundo Bacelar, não há experiências de medidas semelhantes com um prazo de vigência tão longo quanto o da PEC 55.

Uma das alternativas de curto prazo apontadas pela especialista é a proposta que foi dada pelo Banco Mundial de fazer o ajuste sem tocar nas despesas que são direcionados aos 40% mais pobres, pois elas pesariam menos de 17% do total das despesas primárias.

Caso o Senado aprove a PEC do Teto, a participação democrática no processo orçamentário será reduzida. O parlamento e a sociedade não terão mais a prerrogativa de moldar o tamanho do orçamento público, que passará a ser definido por uma variável econômica. “A sociedade brasileira, ao sentir na pele os impactos da medida, vai pressionar para revê-la”, aposta Bacelar.

Novembro e Dezembro de 2016

9

História

Sindicato dos Bancários: 85 anos de luta

C

om uma trajetória de luta e forte mobilização em defesa dos direitos dos trabalhadores, o Sindicato dos Bancários de Pernambuco completa 85 anos de fundação. A entidade é uma das mais antigas do Estado e, atualmente, representa mais de 10 mil trabalhadores. A atuação combativa nos campos político e social fez do Sindicato uma referência para as demais categorias.

O Sindicato foi fundado oficialmente no Recife, em 9 de outubro de 1931, menos de um ano depois do golpe que levou Getúlio Vargas à Presidência do Brasil. A presidência da entidade foi assumida pelo funcionário do Banco do Brasil Adalberto Camargo e a composição da diretoria trouxe como primeira

10

Revista dos Bancários

secretária uma mulher, Elvira Souto. Os primeiros anos foram marcados por luta pela jornada das seis horas, estabelecimento do salário mínimo e eventos sociais.

Ainda na primeira década, ocorreu a primeira greve nacional bancária no País com duração de três dias. Entre as reivindicações, a aposentadoria aos 30 anos de serviço e 50 anos de idade e estabilidade no emprego a partir do primeiro ano de trabalho. No início da década de 50, o Sindicato mobilizou a categoria em uma forte paralisação que durou 40 dias contra a privatização dos bancos públicos. Os trabalhadores conquistaram a aposentadoria por tempo de serviço e, especificamente para a categoria bancária, o fim do trabalho aos sábados. Eram anos de reivindicações por reformas de base e contra a inflação.

Com a deflagração do Golpe em 1964, dirigentes sindicais foram perseguidos e o Sindicato sofreu intervenção militar afastando o então presidente Darcy Leite. Após a reabertura política, os bancários voltaram a se organizar. A entidade se fortaleceu, atuou fortemente durante o governo de Fernando Collor e resistiu à política de privatização da Era Fernando Henrique Cardoso.

Em 2016, o Sindicato mostrou mais uma vez a sua força e unidade.

A categoria realizou uma greve de mais de 30 dias, sob a liderança da presidenta Suzineide Rodrigues. E com o envolvimento da diretoria, dos bancários e dos funcionários da entidade, o Sindicato continuará cumprindo o seu papel na luta por melhores condições de trabalho, ganhos reais, fim do assédio nos bancos e fim das metas abusivas.

Homenagem

A combativa trajetória de Gilberto de Azevedo

E

x-presidente do Sindicato dos Bancários de Pernambuco (19591961) e Deputado Estadual cassado pela Ditadura Militar, Gilberto de Azevedo, deixou na história a marca da sua luta pelos direitos dos trabalhadores, tendo sido responsável por conquistas importantes para os bancários. O militante histórico morreu no dia 7 de setembro deste ano, aos 89 anos, em São Paulo.

Gilberto de Azevedo iniciou a carreira como bancário em 1947, no Banco do Brasil, e desde então passou a participar das atividades do Sindicato. Foi eleito Presidente da entidade em 1959, tendo conquistado em sua gestão a equiparação das 6h de carga horária para escriturários e serventes, além da extinção do trabalho aos sábados. Na última entrevista concedida à Revista dos Bancários, em virtude dos 80 anos do Sindicato, Gilberto relembrou o ano de 1961: “lembro de uma greve que aconteceu em 1961, que durou uma semana e nem o exército conseguia pagar seus soldados [...] Após a greve, teve intervenção no Sindicato, a gente não podia mais frequentar a entidade”.

Com o apoio dos bancários e do Partido Comunista, foi eleito Deputado Estadual em 1962, tendo sido o segundo mais votado

do Recife. Segundo um dos seus filhos, Ivan de Azevedo, a vitória nas urnas não era esperada. “Ele se candidatou extemporaneamente, há duas semanas das eleições. Não havia previsão de que ele seria eleito, mas conseguiu a segunda melhor votação do Recife. Tornou-se líder do Governo Arraes e, em função disso, ele foi preso”.

Em abril de 1964, após votação do plenário da Assembleia Legislativa, Gilberto de Azevedo teve o seu mandato cassado e foi preso pelo IV Exército de Guarda. Passou sete meses detido no arquipélago de Fernando de Noronha e depois foi encaminhado para a 2ª Companhia de Guarda, local onde atualmente está instalado o Ministério Público de Pernambuco, no Recife. Deixou a prisão em 1965, mas não conseguiu recuperar a sua liberdade plena, pois era recorrentemente convocado para prestar depoimento no Quartel Militar do Derby. “Ele resolveu fugir em exílio. Inicialmente, foi para a Europa Ocidental, onde passou dois anos. Depois foi para o Uruguai e lá pediu asilo político”, relata Ivan.

Gilberto de Azevedo conseguiu manter a família reunida por um ano no exílio no Uruguai. Em 1970, retornou clandestinamente ao Brasil, assumindo a identidade de Amauri Lages e só reassumiu sua identidade original três anos depois. Com a Anistia, em 1979, recuperou os seus direitos políticos e reencontrou a família na década de 90.

Nos últimos anos de vida, morou em São Paulo, cidade que adotou após os anos de exílio. Com a saúde fragilizada, Gilberto de Azevedo faleceu em decorrência de uma infecção generalizada.

Novembro e Dezembro de 2016

11

Combate ao feminicídio

Homens e mulheres unidos contra a violência de gênero

A

ssédio, exploração sexual, estupro, tortura, violência psicológica, agressões.

O Brasil convive ainda hoje com violências cotidianas contra as mulheres, sendo o 5º país com maior taxa de assassinatos femininos no mundo. O combate a recorrente violência de gênero que se perpetua nos espaços públicos e privados é reforçado no dia 25 de novembro, declarado Dia Internacional da Não-Violência Contra a Mulher.

A data combativa foi definida no Primeiro Encontro Feminista América Latina e Caribe, realizado na cidade de Bogotá (Colômbia) em 1981, como homenagem a “Las Mariposas”, codinome utilizado pelas irmãs Mirabal que foram brutalmente assassinadas na década de 1960, durante a ditadura de Rafael Leônidas Trujillo, na República Dominicana.

De acordo com o Dossiê Feminicídio, produzido pelo Instituto Patrícia Galvão, a taxa de homicídios de mulheres no Brasil é de 4,8 para cada 100 mil, uma taxa inferior apenas as de El Salvador, Colômbia, Guatemala e Federação Russa. “Se na última década os números de assassinato de mulheres brancas caiu cerca de 10%, o de mulheres negras aumentou 54%. Esses dados revelam que há políticas públicas

12

Revista dos Bancários

de enfrentamento à violência contra as mulheres, mas definitivamente essas políticas não chegam a todas elas da mesma maneira“, destaca a vice-diretora executiva do Instituto, Marilia Kayano.

Entre as ações apontadas para mudar este quadro, está a necessidade de envolver os homens na superação da violência de gênero. Na avaliação de Kayano, a cultura machista alimenta a cultura da violência contra as mulheres. “Os valores que moldaram historicamente o que é próprio das mulheres e dos homens estabeleceram relações muito desiguais e injustas de poder. Nesse sentido, os homens consideram-se autorizados a restringir a autonomia das mulheres nos mais diversos aspectos, desde o direito de ir e vir sem serem assediadas nas ruas, de estudar e trabalhar, de se relacionar ou não com alguém e de se tornarem mães ou não. São construções culturais muito arraigadas que culminam em violências quando a injustiça dessas relações de poder são questionadas pelas mulheres em busca da igualdade de direitos”, afirma.

Nesse sentido, também no mês de novembro, é realizada no Brasil a Campanha do Laço Branco que se propõe a sensibilizar, envolver e mobilizar os homens em ações pelo fim de todas as formas de violência contra a mulher. Em linhas gerais, a campanha promovida pelo Instituto Papai desenvolve estratégias de comunicação e ação política voltadas a homens, bem como palestras, ações comunitárias e distribuição de material alusivo à campanha em atos públicos.

Eleições 2016

Mulheres perdem representação política

A

pesar das mulheres representarem 52% do eleitorado brasileiro, o resultado das eleições deste ano revela que a sub-representação do gênero na política permanece.

Das 5.539 cidades, apenas 641 elegeram mulheres para o cargo de prefeita, o que representa 11,57% do total. O número apresentou queda em relação ao pleito de 2012, quando elas somavam 659 prefeitas eleitas.

A participação feminina na política ainda é pequena se comparada aos homens, que só neste ano elegeram 4.898 prefeitos (88,43%). O total de vereadoras também apresentou redução em 13 capitais, na comparação com o pleito anterior. Em 2016, foram eleitas 107 vereadoras e 704 vereadores em capitais.

Para Luciana Ramos, do grupo de Pesquisa em Direito, Gênero e Identidade da Fundação Getúlio Vargas (FGV), São Paulo, a instituição partidária é um dos entraves para a inserção das mulheres na política. “Os partidos políticos repetem a cultura machista da nossa sociedade. A maioria dos líderes partidários são homens, heterossexuais, com mais de 60 anos. Eles costumam indicar a candidatura de pessoas próximas e não dão uma fatia do fundo partidário para as

candidaturas femininas”, avalia.

Apesar do número de vereadoras eleitas em capitais ser maior que em 2012, quando ocuparam o cargo 103 mulheres, em apenas 24 municípios elas são maioria nas câmaras. Em 1.286 municípios brasileiros, todos os vereadores são do sexo masculino.

Segundo Ramos, a ausência das mulheres nas câmaras de vereadores tem impacto direto na sociedade. “É no âmbito local que são criadas as escolas, os hospitais e a presença da perspectiva das mulheres resultaria em outro desenho de política pública”, afirma.

Entre as soluções apontadas pela pesquisadora estão a educação política nas escolas, a criação de mecanismos de incentivo para os partidos que elegerem mulheres e uma Reforma Política.

Prefeitos (as) e vereadores (as) eleitos em 2016

Prefeito(a)

Vereador(a)

Homens

Homens

Mulheres

Mulheres

641

*

Homens

4.898

Mulheres

Mulheres

107 Homens

704

*capitais 0

1000

2000

3000

4000

5000

Novembro e Dezembro de 2016

13

Dicas de cultura »»Animação O Festival Animage 2016 acontece no Recife do dia 22 a 27 de novembro, trazendo filmes que conectam a arte da animação às principais inquietações da sociedade contemporânea. Questões como políticas urbanas, humanização das relações sociais e tolerância às diferenças individuais perpassam as mostras. Neste ano serão exibidos 84 curta-metragens de 29 países na Mostra Competitiva. A programação conta ainda com mostras especiais, oficinas, exibição de longas e exposição.Os locais escolhidos foram a Caixa Cultural Recife, o Cinema São Luiz, o Cinema do

Museu, a Aliança Francesa, além de espaços públicos como a Praça da Várzea, o Parque Dona Lindu e o Morro da Conceição. São cobrados R$ 5 por pessoa para

as sessões no Cinema São Luiz e Cinema do Museu; os demais locais têm entrada gratuita e ingressos disponibilizados com uma hora de antecedência.

»»DANÇA

Uma intervenção da Cia Deborah Colker será realizada no dia 24 de novembro, às 19h, no Recife Antigo. A apresentação integra o projeto de residência artística da pesquisa de criação do novo espetáculo do grupo, “O Cão Sem Plumas”, que tem parceria com o

14

Revista dos Bancários

cineasta Cláudio Assis.

A companhia mostrará cenas já ensaiadas do balé em uma balsa que navegará no Capibaribe até chegar ao Marco Zero, onde o público estará acompanhando em telões. A trilha sonora será executada ao vivo por Lira, Orchestra

Santa Massa, DJ Dolores e o grupo Frevotron.

O espetáculo é baseado na obra homônima de João Cabral de Melo Neto e surgiu do desejo da coreógrafa de transformar em movimento o poema que tem o rio Capibaribe como fio condutor.

Bancários de Talento

Formas e cores pelas mãos de Juzenildo Cardoso

A

arte sempre esteve presente na vida de Juzenildo Cardoso, bancário aposentado do Bandepe. Mas, só agora aos 77 anos que ele passou a se dedicar integralmente ao seu ofício de pintor e ceramista.

Nascido no município de Lagoa de Ouro, localizado no Agreste de Pernambuco, Cardoso passou a sua infância morando no sítio do avô. Foi lá que ainda garoto começou a se interessar pela criação de esculturas.

A cera de abelha que sobrava do trabalho de apicultura do avô se transformava em matéria-prima nas mãos de Cardoso, que modelava os seus primeiros bonecos na infância. “Essa experiência deixou uma raiz dentro de mim. Mas, depois vieram as responsabilidades, o trabalho, a família, e eu não tive tempo para desenvolver a minha arte”, afirma. Cardoso entrou no Banorte de Garanhuns em 1970, quatro anos depois passou a ser bancário do Bandepe, onde permaneceu trabalhando até 1994.

A paixão pela arte que estava adormecida foi reavivada na década de 80, quando ele fez em série 28 pinturas em óleo sobre tela.

“Em 1988 deixei os pincéis de lado.

Parei de pintar até chegar a minha aposentadoria. Foi só agora que me encontrei. Sinto prazer em fazer esse trabalho”, disse.

Desde 2003, Cardoso tem se dedicado a cursos de pintura e cerâmica. Em seu acervo pessoal possui telas com pinturas de flores e paisagens, além de cabeças, esculturas e bandeijas em cerâmica. “Minhas telas passaram a ser pintadas com tinta acrílica. Estou trabalhando para chegar a técnica de pinceladas soltas. Também pretendo começar trabalhos com cerâmica vitrificada”, explica.

O artista atualmente produz suas obras em Olinda, no ateliê da artista plástica Jacira Lucena. Mas, o projeto de um ateliê próprio já está em andamento. As obras do acervo pessoal de Cardoso podem ser vistas nas redes sociais dele, Facebook e Instagram.

Novembro e Dezembro de 2016

15

Conheça Pernambuco

Um oásis no Sertão

E

m meio à paisagem árida do Sertão pernambucano, o Vale do São Francisco torna-se um oásis de fertilidade. A região que compreende os municípios pernambucanos de Petrolina, Lagoa Grande e Santa Maria da Boa Vista – além de Casa Nova (BA) - é responsável pela segunda maior produção de vinhos, espumantes e sucos naturais de uva no Brasil. O potencial para o enoturismo tem atraído admiradores da bebida, que podem, literalmente, desfrutar dos parreirais.

Sete vinícolas fazem parte da Rota dos Vinhos e estão abertas para visitações. O passeio inclui conhecer o campo com degustação de uvas viníferas, a fábrica e sala de barricas e degustar os rótulos nas lojas. Uma das paradas da rota é a vitivinícola Santa Maria, em Lagoa Grande, a 40 minutos de Petrolina.

Ao final do dia uma boa pedida é contemplar a natureza e o pôr

16

Revista dos Bancários

do sol em um passeio de barco pelas águas do Rio São Francisco. Outra opção é sair de Petrolina e passar a noite na Ilha do Rodeadouro, onde há bares que oferecem comidas típicas da região.

O Vale do São Francisco surpreende com a sua biodiversidade. Na Trilha da Caatinga guias locais apresentam o bioma extremamente rico e resistente da região, com cerca de 2.500 espécies das quais 300 são exclusivas deste ecossistema.

Petrolina É a porta de entrada da região do Vale do São Francisco, com uma população de 320 mil habitantes, sendo o quinto maior município do Estado. Petrolina tem uma boa infraesturura, com bancos, farmácias, aeroporto, hotéis e bares. Não deixe de visitar o Museu do Sertão, a Catedral do Sagrado Coração de Jesus, o Ateliê Mestre Quincas e o Bodódromo.

Lagoa Grande É um município que une as paisagens características do semiárido nordestino ao belo cenário proporcionado pelas águas do Rio São Francisco. É uma região ideal para o lazer contemplativo, passeios de barco, pesca esportiva e banhos no “Velho Chico”, além do enoturismo.

Santa Maria da Boa Vista Os principais atrativos naturais do município são os mirantes do Vale, do Cruzeiro e do Carmelo - local onde está situado um pequeno santuário dedicado a Nossa Senhora do Carmelo, e o Rio São Francisco, com suas corredeiras, conjunto de ilhas fluviais de diferentes paisagens, passeios de barco e o pôr do sol.