Turismo - Paranapiacaba

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[ turismo ] Ao abrigar um rico patrimônio histórico, arquitetônico e natural, a vila de Paranapiacaba, hoje pertencente ao município de Santo André-SP, busca conservar a herança inglesa e convida os turistas a percorrerem as memórias dos trilhos da primeira ferrovia do Estado de São Paulo Por: Bárbara Blas | Fotos: Inácio Teixeira | Arte: Glauco Dias | mapa: kid ocelos

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[ turismo ]

P

ouco antes de chegar a Paranapiacaba, o apito de uma locomotiva recepciona os visitantes à história da vila ferroviária ingle-

sa do século 19. Para quem vai de carro, após cruzar os trilhos em direção à Parte Baixa, onde se concentra a maioria das atrações, é preciso andar por uma estrada de terra batida em meio à mata, ao ar frio da serra — que demora a dissipar devido à neblina típica da região — e aos raios de Sol que dão bom-dia timidamente. Na entrada da vila localizada no alto da Serra do Mar, já é possível avistar a igreja, o relógio e alguns resquícios dos trens que outrora desfilavam até o porto de Santos. A seguir, notam-se algumas casas marrom-avermelhadas, todas iguais aos olhares leigos. A cor não é a original da época em que a vila foi construída, mas há uma explicação: era um hábito da extinta Rede Ferroviária reutilizar materiais, então a tinta que sobrava da pintura das locomotivas passou a colorir também as habitações da Parte Baixa. Somente ao chegar mais perto das construções é que são avistadas pequenas placas que distinguem restaurantes e pousadas das moradias. Isso porque há restrições quanto à sinalização para não destoar do patrimô-

Os vagões abandonados pertencem à inventariança da extinta Rede Ferroviária e à ABPF (Associação Brasileira de Patrimônio Ferroviário). A Prefeitura de Santo André aguarda o resultado de uma ação civil-pública para que seja dada uma destinação aos equipamentos A Igreja Bom Jesus de Paranapiacaba (1889) foi construída na Parte Alta para atender aos católicos, pois os ingleses, que eram protestantes, não permitiam outra instituição religiosa, senão a sua, na Parte Baixa

Após um levantamento histórico no qual ficou evidente que, antigamente, as casas eram coloridas por blocos, a Prefeitura busca um parceiro para a pintura nas cores originais

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nio histórico e natural tombado em nível federal pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), estadual pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo) e municipal pelo Condephapaasa (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico Artístico Arquitetônico-Urbanístico e Paisagístico de Santo André).

O passeio de maria-fumaça é operado pela ABPF aos domingos e feriados em uma locomotiva a vapor inglesa de 1867, acoplada a um vagão de passageiros (1914) de primeira classe da SPR. O percurso é de um quilômetro na área do atual Museu Ferroviário, onde funcionava o quinto patamar da ferrovia

foto: Edmilson Magalhaes/Prefeitura de santo André

O Clube União Lyra Serrano, que hoje recebe eventos culturais, era o local de lazer dos trabalhadores, onde ocorriam os bailes, jogos de salão, teatro e exibição de filmes. O campo do Serrano foi o primeiro a ter medidas oficiais de competição graças a Charles Miller — pai do futebol no Brasil e ex-ferroviário da SPR

À esquerda, tanques do sistema de abastecimento de água da Parte Baixa construídos pelos ingleses. À direita, um trole, o único meio de transporte disponível para descer a serra quando o trem falhava

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O percurso de pouco mais de um quilômetro na Trilha do Mirante termina com a vista do polo industrial de Cubatão-SP [foto]. De lá, é possível avistar, também, o Pico do Jaraguá, a Serra da Cantareira e a Baixada Santista Local onde é guardada a maria-fumaça

O “lugar de onde se vê o mar” — signi-

região ficou conhecida como Alto da Ser-

ficado de Paranapiacaba para os índios

ra — só em 1907 o nome Paranapiacaba

tupis, os primeiros a povoar o local —

passou a ser utilizado — e foi escolhida

começou a ser habitado por brasileiros

estrategicamente para a instalação dos

e estrangeiros a partir de 1860 devido

trabalhadores por estar no topo da serra

aos acampamentos de trabalhadores

e ser próxima às obras. Com o incenti-

empregados na construção da ferrovia,

vo do Barão de Mauá, a empresa ingle-

que pretendia ligar Santos ao planalto. A

sa São Paulo Railway Company (SPR)

O Castelinho (1897) está localizado em um ponto estratégico da vila, do qual o engenheiro-chefe da SPR tinha visão de tudo o que acontecia. No auge da ferrovia, ele comandava cerca de 5 mil pessoas entre trabalhadores e familiares. O local onde foi sua residência e escritório hoje abriga um museu

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ganhou o direito de construir e a con-

A fim de abrigar os trabalhadores

cessão de 90 anos para operar a ferro-

que permaneceriam para a manu-

via, que entrou em funcionamento em

tenção e a operação da ferrovia, foi

fevereiro de 1867. Naqueles trilhos, a

construída a chamada Parte Baixa,

produção brasileira, que antes viajava

uma vila planejada com sistema de

dias no lombo de burros para chegar ao

abastecimento de água, viela sanitária

porto, ganhava a agilidade de poucas

e casas de madeira com arquitetura

horas e passava a ser transportada em

inglesa agrupadas de acordo com os

uma quantidade que só aquela máqui-

cargos dos empregados. Do outro lado

na de alta tecnologia podia carregar. O

da linha, na Parte Alta, as construções

café era o carro-chefe da época, mas as

portuguesas serviam de moradia aos

locomotivas levavam todo tipo de carga

comerciantes e, com o passar do tem-

para outros países.

po, aos aposentados.

Inspirada no Big Ben britânico, a torre do relógio foi o único monumento que restou após o incêndio da estação de trem da Serra Velha, em 1981. O atual símbolo da vila era o marca-passo da pontualidade britânica dos trens

O sucesso da ferrovia e do café, bem A passarela (1899) é a ligação entre as partes Alta e Baixa para pedestres. Automóveis têm que percorrer um trecho de 12km de estrada por fora da vila

como a necessidade de expansão, levou à construção de uma segunda linha, a Serra Nova, e de um novo núcleo de moradia, a vila nova ou vila Martin Smith, em homenagem ao presidente da companhia inglesa. Com a fim da concessão em 1946, a SPR foi encampada pela União e mudou de nome para Estrada de Ferro Santos-Jundiaí. O CDARQ (Centro de Documentação em Arquitetura e Urbanismo de Paranapiacaba) abriga uma exposição permanente sobre a formação urbana da vila, com maquetes e explicações sobre os diferentes tipos de casas concedidas de acordo com o cargo do trabalhador

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[ turismo ] A história da vila por um ferroviário Nascido na vila próximo ao final da concessão da SPR, o ex-ferroviário e aposentado Claudio Maria Marques acompanhou boa parte da história da ferrovia. Aos 69 anos, o filho de portugueses garante: “Sem menosprezar nenhum, não tem lugar melhor do que Paranapiacaba”. Sobre a estação, afirma que, na sua juventude, era a mais bonita da linha Santos-Jundiaí.

Atualmente, a MRS Logística possui a licença de uso da linha

Curiosamente, ele e o irmão são casados com duas irmãs, e o sogro, ferroviário, é quem o levou para o trabalho. Bolão, como era conhecido por gostar muito de jogar futebol — aliás, os ferroviários só eram identificados pelos apelidos —, começou a estagiar em 1971 e, sobre os trilhos, passou 28 anos de sua vida, tempo no qual a linha já era administrada pela RFFSA (Rede Ferroviária Federal S.A.). Criada em 1957, ela consolidou 18 ferrovias brasileiras com o objetivo de promover e gerir os interesses do Estado no setor de transportes ferroviários. Entre elas, estava a Santos-Jundiaí. Vista do pátio da ferrovia

Claudio Maria Marques conta sobre o seu tempo de ferroviário

Claudio, como muitos adolescentes que cursaram o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) a partir dos anos 1940, saiu com emprego garantido na ferrovia. E ele era muito dedicado: “Às vezes, voltava para casa com 15 horas de trabalho e, no dia seguinte, estava de volta ao posto”, conta. Sempre teve orgulho da sua função de maquinista, muito respeitada na época, mas também não se esquece do coleguismo entre os ferroviários. Bolão aposentou-se três anos após a desestatização da linha, ocorrida em 1996. Desde então, a empresa MRS Logística S.A. é que opera no transporte de carga, e o ex-ferroviário vive na Parte Alta da vila.

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Novo Distrito de Santo André Em 2002, a Prefeitura de Santo André comprou a vila, que pertencia à RFFSA, e passou a dar novos rumos à administração de Paranapiacaba — degradada por mais de meio século —, a fim de preservar seu patrimônio histórico e natural, bem como incentivar o turismo. Desde então, foram feitas diversas restaurações com o

Dona Zilda Bergamini, de 59 anos, é proprietária de um dos points gastronômicos de Paranapiacaba, o Bar da Zilda. Moradora desde 1970, a ex-ferroviária atualmente se dedica ao estabelecimento comercial e ao cambuci — frutinha muito utilizada na região em doces e cachaças

investimento público e de parceiros. Aos domingos, é possível ir a Paranapiacaba de expresso turístico

[veja mais sobre o cambuci na pág. 96]

De acordo com o secretário de Gestão de Recursos Naturais de Paranapiacaba e Parque Andreense, Eduardo Sélio Mendes Junior, a pasta, criada há três anos, tem desenvolvido diversas ações para o fomento do turismo, como a volta do expresso turístico à vila, que hoje é um sucesso, a troca da iluminação pública, a organização de uma equipe de manutenção, a instalação de bases permanentes da Polícia Militar e da Guarda Municipal, cursos para profissionalizar os trabalhadores das pousadas e restaurantes, investimento nos foto: Norberto da Silva/Prefeitura de santo André

Conhecido como Antigo Mercado (1899), ele era, de fato, o centro comercial da vila. Hoje em dia, é utilizado principalmente durante os festivais

principais eventos — os festivais do Cambuci (em abril) e de Inverno (em julho) — e

foto: Guilherme Lazzarini/Prefeitura de santo André

projetos de restauros em andamento. Os principais eventos da vila são os festivais do Cambuci — fruta típica da região — e de Inverno. Este último atrai metade dos 200 mil turistas que visitam Paranapiacaba durante o ano

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[ turismo ] A evolução da ferrovia Em 1867, foi inaugurado o primeiro sistema funicular (Serra Velha), no qual a tração dos trens era feita por cabos. Possuía dez quilômetros e cinco patamares, o primeiro na baixada e o quinto em Alto da Serra — como era chamada a estação em Paranapiacaba. “Quando começou a operar o cabo de aço, era utilizado o serrabreque, e depois, para atender a demanda e sanar os defeitos da primeira experiência, veio o locobreque, então houve uma evolução da própria ferrovia”, conta Luis Carlos Machado Fernandes, ex-ferroviário do setor de eletrotécnica (manutenção elétrica de residências e pátio da estação) entre os anos 1979 e 1996. Carlos, que atualmente trabalha na gerência de turismo, explica que, no serrabreque, a locomotiva puxava a carga, mas ocorriam muitas perdas e acidentes, pois os vagões se desprendiam com solavancos. Por isso, foi criado o locobreque, no qual a carga ficava na frente.

Ecoturismo Além do patrimônio histórico, a vila está circundada por recursos naturais de Mata Atlântica do Parque Natural Municipal Nascentes de Paranapiacaba e do Parque Estadual da Serra do Mar. Só no municipal, são quatro milhões de metros quadrados, nos quais habitam cedros, bromélias, orquídeas, beija-flores, jararacas, pica-paus, entre outros animais e plantas que compõem o ecossistema. O parque administrado pela Prefeitura possui seis trilhas abertas ao público: dos gravatás, das hortênsias, do mirante, da comunidade, da pontinha e água fria.

O segundo sistema funicular, ou Serra Nova, entrou em funcionamento em 1900. Já a partir de 1974, passou a operar a cremalheiraaderência, construída sobre a Serra Velha com a utilização de uma tecnologia japonesa. Com oito quilômetros e quatro patamares, é a via utilizada até os dias de hoje. O Sr. Claudio Marques conta que, antigamente, a viagem de Santos a São Paulo demorava cerca de três horas. Com a cremalheira, o tempo foi diminuído para 23 minutos na subida e 27 no sentido inverso, diferença ocasionada pela frenagem da descida. A estação Alto da Serra, do primeiro sistema funicular, foi desativada em 1977 e completamente destruída quatro anos mais tarde por um incêndio. A Serra Nova parou de funcionar comercialmente em 1982.

De acordo com a gerente de recursos naturais Daniela Freire, um decreto municipal proíbe o camping em toda área verde de Santo André

Para garantir a conservação ambiental e a segurança dos visitantes, todos têm que ser acompanhados por monitores ambientais cadastrados pela Prefeitura. O período da manhã é o melhor para percorrer as trilhas, já que, por volta das 16 horas — quando boa parte do comércio fecha as portas —, a neblina característica da região começa a tomar conta da mata e da vila. O arvorismo, que está desativado temporariamente e em processo de licitação, é outra opção que O arvorismo está temporariamente desativado

deve ser reaberta em breve. O agente ambiental Ingo Grantsau apresenta a vista do mirante

Luis Carlos Fernandes

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Serviços Onde ficar A Prefeitura de Santo André disponibiliza em seu site (www.santoandre.sp.gov.br) uma lista de todos os estabelecimentos comerciais, como pousadas e restaurantes. Mais informações podem ser solicitadas no Centro de Informações Turísticas. Tel.: (11) 4439-0237

Como chegar De carro Seguir pela Rod. Anchieta até o Km 29, entrar na SP148 (Estrada Velha de Santos) até o Km 33 e pegar a Rod. Índio Tibiriçá (SP-031) até o Km 45,5, onde há um acesso à SP-122 (Rod. Dep. Antônio Adib Chammas). Depois de passar por Rio Grande da Serra, há uma placa “Paranapiacaba 5km”. Logo em seguida, há outra indicando o caminho para a Parte Alta e Parte Baixa da cidade. Como a maioria das atrações está na Parte Baixa, saia da estrada à esquerda, cruze a ferrovia e siga pela estrada de terra por cerca de 5km para chegar à vila. Vale a pena destacar que a sinalização é boa, porém, com chuva e neblina, a visibilidade na estrada fica muito prejudicada.

De expresso turístico Aos domingos, com exceção do segundo do mês, é possível ir a Paranapiacaba de trem, operado pela CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). A saída é às 8h30 da Estação da Luz, em São Paulo, ou às 9h da Estação Celso Daniel, em Santo André, e o retorno de Paranapiacaba ocorre às 16h30. A compra do bilhete é realizada nas bilheterias de ambas as estações. Para mais informações, acesse o site www.cptm.sp.gov.br

Sob nova direção.

Estrada do Enxadão, 800 Juquitiba - São Paulo - SP

Ônibus/trem No Terminal Rodoviário de Santo André, a linha 040 - Paranapiacaba, da Viação Ribeirão Pires, vai até a vila. Outra opção é embarcar na linha da CPTM Luz-Rio Grande da Serra e, nesta última, pegar um ônibus da Viação Ribeirão Pires. Tel.: (11) 4828-1019

O lugar ideal para você e toda a sua família praticar a pesca esportiva ou simplesmente se desligar da correria do dia a dia.

Tel.: (11) 4683-9110 /4683-2310 Quinta a segunda e feriados, das 7h às 18h.

Agora com pescaria noturna!


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